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PROTOCOLOS DE ATUAÇÃO

Manual de Referenciação

ENDOCRINOLOGIA

AUTORES

Marisa Barros; Catarina Rocha Vieira; Daniel Canelas;

Joana Cirne; Teresa Rebello de Andrade; Lúcia Almeida…

REVISORES

Dra. Marta Ferreira – Endocrinologista no Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho

Prof. Dra. Luciana Couto – Assistente MGF na USF Camélias

JUNHO DE 2019

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Introdução:

A articulação entre Cuidados de Saúde Primários e Cuidados de Saúde Secundários é


de enorme importância de forma a garantir a qualidade dos cuidados prestados aos
nossos utentes.

Cada protocolo será organizado numa breve introdução teórica, um algoritmo de


abordagem nos CSP (saber que estudo analítico pedir e como/quando devem ser
realizados) e quais os critérios de referenciação para Endocrinologia.

Pretende-se, assim, que este documento seja um manual para consulta rápida, que
permita aumentar o conhecimento científico na área da Endocrinologia e possibilite
uma melhoria das referenciações.

2
Índice
Tiróide................................................................................................... 3

Patologia nodular da tiroide......................................................................... 3

Hipotiroidismo........................................................................................ 9

Hipertiroidismo..................................................................................... 15

Metabolismo do Fósforo e do Cálcio.................................................................21

Hipocalcémia........................................................................................ 21

Hipercalcémia....................................................................................... 22

Osteoporose: causa secundária....................................................................22

Displipidemias familiares.............................................................................. 26

Hipercolesterolemia Familiar....................................................................... 26

Obesidade.............................................................................................. 31

Hipoglicemias.......................................................................................... 36

Sistema Reprodutor e alterações relacionadas......................................................36

Atraso Pubertário................................................................................... 36

Hirsutismo........................................................................................... 40

Amenorreia.......................................................................................... 45

Ginecomastia........................................................................................ 45

Galactorreia......................................................................................... 45
Síndrome do Ovário Poliquístico................................................................... 48

Patologia hipofisária................................................................................... 52

Indidentalomas hipofisários........................................................................ 52

Hiperprolactinémia................................................................................. 52

Patologia da suprarrenal.............................................................................. 52

Incidentaloma da suprarrenal...................................................................... 52

Hipertensão Arterial – Causas Secundárias...........................................................52

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Tiróide
Patologia nodular da tiroide

Introdução
A patologia nodular da tiroide é frequentemente detetada ao nível dos cuidados de
saúde primários, sobretudo no sexo feminino, idosos e em zonas com carência de iodo.
À palpação a prevalência dos nódulos tiroideus é de 3 a 7%, no entanto este valor
1
aumenta para os 20-76% quando detetados por ecografia. Embora se verifique
discrepância entre estes valores, o rastreio ecográfico da patologia nodular da tiroide
não está aconselhado de forma sistemática na população geral. Apesar da prevalência
de nódulos ser elevada, a neoplasia da tiróide corresponde apenas a 5-15% dos
nódulos.

Em vários países, nomeadamente Portugal, tem-se vindo a assistir a um aumento da


incidência de neoplasias da tiroide, no entanto esse aumento ocorre em grande parte
à custa de carcinomas de baixo risco - 90% são carcinomas diferenciados (papilar e
folicular).1

Sempre que haja suspeita clínica de nódulo da tiroide ou nódulo identificado por outro
método de imagem deve ser efetuada ecografia da tiroide para confirmação e
avaliação global da glândula e das cadeias ganglionares cervicais.

Diagnóstico e Abordagem clínica


História clínica Cintigrafia
Exame objetivo Tireoglobulina sérica
Ecografia Calcitonina sérica
Função Tiroideia Citologia aspirativa com agulha fina (CAAF)
Tabela 1- Abordagem clínica aos nódulos tiroideus

A história clínica e o exame objetivo constituem a primeira abordagem na suspeita de


patologia nodular.

Ecografia: O diagnóstico clínico implica a realização de ecografia da tiroide para


confirmação.

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Função Tiroideia: Perante a confirmação de patologia nodular é necessário o estudo
da função tiroidia através da Hormona Estimulante da Tiroide (TSH).

Cintigrafia: Por sistema a cintigrafia não deve ser realizada a todos os doentes com
nódulos. Os doentes com TSH baixa devem efetuar cintigrafia da tiroide para confirmar
ou excluir nódulo hiperfixante (nódulo quente).

Tireoglobulina sérica: Não tem indicação no estudo de nódulos tiroideus.

Calcitonina sérica: Tem indicação em algumas situações: idades inferiores a 18 anos,


suspeita clínica, citológica ou antecedentes familiares de carcinoma medular da tiroide
ou de neoplasia endócrina múltipla tipo 2 (NEM2).

Citologia aspirativa com agulha fina (CAAF): Após a confirmação nodular por ecografia
é necessário proceder à decisão de realizar ou não de CAAF, uma vez que é o exame de
eleição para apurar o risco efetivo do nódulo em estudo.

A indicação para a realização de CAAF obedece a critérios ecográficos que se baseiam


fundamentalmente na DIMENSÃO, ecoestrutura interna (sólida, mista ou quística),
presença de risco CLÍNICO de malignidade aumentado e/ou critérios ECOGRÁFICOS
suspeitos.

Critérios Ecográficos suspeitos


Nódulo sólido hipoecogénico
Microcalcificações
Hipervascularização intramodular
Margens irregulares/mal definidas;
Diâmetro AP>transversal
Invasão de tecidos extratiroideus
Adenopatias cervicais
Tabela 2- Critérios ecográficos suspeitos

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Situações de risco clínico aumentado para malignidade
Idade <14A
Exposição a radiação da região tiroideia na infância/adolescência
Antecedente pessoalde patologia com risco acrescido de Ca tiroide (PAF, complexo de
Carney, S. de Cowden ou S. de McCune-Albright)
Antecedente pessoal de cirurgia prévia por Ca tiroide
Antecedente familiar (1º grau) de Ca tiroide ou NEM 2
Hiperfixação focal em localização tiroideia na PET 18F-FDG ou na cintigrafia das
glândulas paratiroideias
Nódulo duro e aderente à palpação
Crescimento nodular rápido e progressivo
Sintomatologia compressiva/infiltrativa cervical incluindo paresia/paralisia de cordas
vocais, ex disfonia persistente, disfagia e dispneia
Adenomegalia cervical suspeita
Elevação da calcitonina
Tabela 3- Risco clínico aumentado para malignidade

Os nódulos <10 mm sem critérios ecográficos suspeitos ou sem risco clínico


aumentado não têm indicação para CAAF.1,2,3

Na ausência de critérios ecográficos suspeitos e de risco clínico aumentado, a CAAF


apresenta indicação nos seguintes casos:

Nódulos sólidos com maior dimensão ≥10-15 mm


Nódulos mistos com maior dimensão ≥15-20 mm
Nódulos quísticos puros com maior dimensão ≥40 mm e principalmente por indicação
terapêutica (redução de volume).
Tabela 4- Indicação para CAAF

Os nódulos com critérios ecográficos suspeitos e/ou risco clínico aumentado têm
indicação para CAAF se dimensão ≥10 mm. 1,2

Nos nódulos<10 mm, com critérios ecográficos suspeitos e/ou risco clínico aumentado
pode ainda ser considerada a CAAF se tecnicamente possível e sempre de acordo com
critério clínicodevidamente justificado no processo clínico. 1,2

Embora não haja contraindicações absolutas para CAAF, há algumas contraindicações


relativas que devem ser tidas em consideração no momento da decisão:

- Coagulopatia significativa de difícil correção.

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- Compromisso cardiorrespiratório severo, instabilidade hemodinâmica ou estádio
terminal de doença.

- Ausência de um trajeto seguro entre a pele e a lesão.

- Impossibilidade de obter a colaboração do doente ou de o posicionar


adequadamente.

Em doentes com indicação para CAAF e sob terapêutica hipocoagulante poderá ser
ponderada a prescrição da interrupção temporária do hipocoagulante e a introdução
de heparina de baixo peso molecular.

A realização de CAAF implica a assinatura do consentimento informado ESCRITO de


TODOS os doentes submetidos a CAAF da tiroide, integrado no processo clínico.

Referenciação
Deverão ser referenciados para Endocrinologia em contexto hospitalar, num prazo
máximo de 30 dias, os doentes com alterações citológicas compatíveis com: 2,3

Critérios de referenciação hospitalar


Não diagnóstica após repetição
Lesão folicular de significado indeterminado
Tumor folicular
Suspeita de malignidade
Diagnóstico de malignidade

Tabela 5 - Critérios citológicos para referenciação hospitalar

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Algoritmo resumo da investigação do nódulo tiroideu

Figura 1- Fluxograma de atuação na investigação do nódulo tiroideu

Referências
1. Norma DGS 2013 - Abordagem Diagnóstica do Nódulo da Tiroide em Idade Pediátrica e no Adulto.
2. Cooper DS e col. Revised American Thyroid Association Management Guidelines for Patients with
Thyroid Nodules and Differentiated Thyroid Cancer. The American Thyroid Association (ATA).
Guidelines Taskforce on Thyroid Nodules and Differentiated Thyroid Cancer. Thyroid, 2009;
19(11):1167-1214.
3. Guidelines of the French Society of Endocrinology for the management of thyroid nodules. Annales
d’Endocrinologie 2011;72: 255-281.

Hipotiroidismo

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Introdução

O hipotiroidismo é uma endocrinopatia relativamente frequente, que se define pelo


défice de hormonas tiroideias, quer por diminuição da sua secreção, quer por
resistência à sua ação. A sua prevalência na população geral ronda os 4-10%. Esta que
aumenta com a idade (pode chegar aos 20% na população idosa) e é superior na raça
caucasiana, em mulheres (até 8 vezes superior) e em áreas com carência de iodo.

Classifica-se em primário (95% dos casos de hipotiroidismo, por disfunção da glândula


tiroideia), secundário (por deficiência de TSH) ou terciário (por deficiência de TRH).
Hipotiroidismo central inclui o hipotiroidismo secundário e o terciário.

Etiologia
A tabela 1 apresenta as causas mais frequentes do hipotiroidismo primário e do
hipotiroidismo central.

Hipotiroidismo primário Hipotiroidismo central


Défice de iodo Adenoma da hipófise
Tiroidite crónica auto-imune (tiroidite de Neoplasia com efeito de massa sobre o
Hashimoto) hipotálamo
Tiroidite pós-parto Iatrogenia (farmacológica – lítio,
dopamina; radioterapia)
Tiroidite subaguda granulomatosa Hipofisite linfocítica
Iatrogenia (farmacológica - amiodarona, Síndrome de Sheehan
interferão-alfa, lítio, talidomida, estavudina;
agentes de contraste; iodo radioativo;
radioterapia cervical; cirurgia da tiróide)
Hipotiroidismo congénito Doenças congénitas
Neoplasia (primária ou secundária) Doenças infiltrativas
Tabela 1. Causas mais frequentes de hipotiroidismo.

Manifestações Clínicas

O hipotiroidismo pode ser assintomático ou sintomático, com manifestações clínicas


sistémicas, pouco específicas, que variam num espetro clínico amplo e que refletem a
carência de hormonas tiroideias nos tecidos metabolicamente ativos. Globalmente,

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existe diminuição da atividade física e mental e deposição de glicosaminoglicanos nos
tecidos moles.

A tabela 2 sumaria as manifestações clínicas e alterações laboratoriais mais comuns do


hipotiroidismo.

Sintomas Sinais Alterações Laboratoriais


Intolerância ao frio, Hipotermia Hipotiroidismo subclínico – TSH
diminuição da sudorese alta e T4L N
Astenia, letargia, sonolência Pele seca, grossa, áspera, Hipotiroidismo primário - - TSH
macilenta alta e T4 L baixa
Anorexia Cabelo grosso, mas frágil Hipotiroidismo secundário e
terciário – TSH baixa/normal/alta
e T4L baixa/normal/alta
Obstipação Perda capilar Hipotiroidismo congénito – TSH >
20 mU/L e T4L baixa
Mialgias, artralgias Edema: duro (mixedema) Anemia
ou depressível,
periorbicular, nos
membros inferiores, ascite
ou generalizado
Parestesias Aumento ponderal Dislipidemia
Visão turva Galactorreia Hiponatremia (diluição)
Hipoacúsia Oligomenorreia, Elevação (reversível) da creatinina
infertilidade
Labilidade emocional, Síndrome do túnel cárpico Hiperprolactinemia
perturbação depressiva,
perturbação mnésica
Sensação de globo cervical, Lentificação do discurso e Hiperhomocisteinemia
dor cervical, disfonia motora, hiporreflexia
Inexpressividade facial,
fácies grosseira,
macroglossia
Bócio
Diminuição da pressão
arterial sistólica e
elevação da pressão

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arterial diastólica,
bradicardia
Derrame perciárdico
Aumento do risco de
hemorragia (Doença de
von Willebrand adquirida)
Défice cognitivo ligeiro
Tabela 2. Manifestações clínicas e laboratoriais de hipotiroidismo.

Legenda: N – Normal Nota: No caso da tiroidite crónica auto-imune (tiroidite de Hashimoto), são frequentes as
queixas de astenia marcada, sensação de globo cervical, dor cervical, disfonia. No caso do hipotiroidismo congénito,
apatia, letargia, macroglossia, atraso do crescimento e atraso cognitivo.

Diagnóstico

A história clínica e o exame objetivo constituem o primeiro passo na abordagem da


suspeita de hipotiroidismo, cujo diagnóstico implica o doseamento da hormona
tiroestimulante (TSH) e da T4 livre (L).

No hipotiroidismo primário há diminuição dos níveis de T4 L e aumento de TSH. A


diminuição dos níveis de T4 L é anterior à diminuição da T3 L, porque há aumento da
conversão periférica de T4 L em T3 L. Na suspeita de causa auto-imune, pede-se o
doseamento dos anticorpos antiperoxidase (anti-TPO) e antitiroglobulina (anti-Tg), que
são positivos em 95% dos doentes com tiroidite autoimune (mas são-no também em
quase 1/5 da população normal, principalmente no sexo feminino e em idosos). A
tiroidite autoimune associa-se a uma incidência superior de nódulos tiroideus, de
neoplasia maligna e de outras doenças auto-imunes. Quando o paciente já está
medicado e há dúvidas no que respeita ao diagnóstico, dever-se-á suspender ou
reduzir para metade a dose da medicação durante 6 semanas, ao fim das quais se
pedirá o doseamento de TSH e de T4 L.

No hipotiroidismo secundário ou terciário há diminuição dos níveis de T4L e não há


uma relevação adequada de TSH. Nos casos em que há resistência à ação da hormona
tiroideia, pode haver aumento das T4L e T3L, com TSH inapropriadamente normal ou
elevada.

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Na síndrome  de  doença  não tiroideia há redução dos níveis de TSH e T4L/T3L no
contexto de doença aguda grave, com recuperação após resolução do quadro clínico
(deve-se repetir o doseamento de TSH e de T4L 4-6 semanas depois).

Notar que o pedido de ecografia da tiróide tem lugar essencialmente nos casos
sintomáticos (como a presença de bócio) e nos de tiroidite crónica auto-imune.

A tabela 3 apresenta as alterações da função tiroideia mais comuns e a(s) suspeita(s)


clínica(s) mais provável(is).

Alteração da Função Tiroideia Suspeita clínica


TSH alta + T4L N Hipotiroidismo primário subclínico
(avaliar critérios para iniciar tratamento)
TSH alta + T4L baixa Hipotiroidismo primário
(iniciar tratamento)
TSH N/baixa + T4 baixa Hipotiroidismo central
TSH alta + T4L alta Tirotrofinoma
Síndrome de resistência às hormonas tiroideias
TSH baixa + T4L N/alta Tirotoxicose
Tabela 3. Suspeita clínica de acordo com alteração da função tiroideia.

Tratamento

Na tabela 4 estão representadas as formas mais adequadas de tratamento. Os


objetivos do tratamento são a melhoria do quadro clínico e o estado eutiroideu. No
geral, será um tratamento crónico, com exceção dos casos de doença não tiroideia ou
do hipotiroidismo reversível, induzido por fármacos.

Hipotiroidismo em Hipotiroidismo e paciente Hipotiroidismo subclínico


paciente não idoso idoso/com cardiopatia
isquémica/DPOC
- Levotiroxina 1,6 – 1,8 - ¼ a ½ da dose prevista de - Tratar se:
μg /Kg/dia levotiroxina (25-50 μg/dia) - TSH>10 mUI/L
- Reavaliação em 4-6 - Reavaliação em 4-6 - TSH 5-10 mUI/L +
semanas após início e 8 semanas após início e 8 anticorpos anti-tiroideus,
semanas após alteração da semanas após alteração sintomas, doença

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dose da dose aterosclerótica,
- Vigilância anual - Vigilância anual insuficiência cardíaca ou
fatores de risco para
doença vascular
- Dose:
- Sem cardiopatia:
1,5μg/Kg/dia
- Com cardiopatia
e/ou idoso: 25 a 50 μg/dia
e dose titulada
- Vigilância:
- Pacientes sob
tratamento: anual
- Pacientes não
tratados: 6 meses nos 1.os
2 anos e depois
anualmente (Em 6-35%
dos pacientes haverá
normalização do valor de
TSH, dependendo do seu
valor inicial, dos auto-
anticorpos tiroideus e do
tempo de seguimento)
Tabela 4. Tratamento de hipotiroidismo.

Referenciação

A referenciação dos pacientes à consulta de Endocrinologia está descrita na tabela 5.

Tabela 5. Motivos de referenciação à consulta de Endocrinologia


Idade inferior a 18 anos
Refratariedade à terapêutica
Pré-conceção ou gravidez
Patologia cardíaca
Bócio, nódulos ou outras alterações estruturais da glândula tiroideia?
Hipotiroidismo induzido por fármacos
Hipotiroidismo central
Causas raras de disfunção tiroideia
Outras alterações da função tiroideia (além das descritas)
Outras endocrinopatias

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Referências
1. XXII curso Pós-graduado de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo. Porto: Syllabus; 2016
2. Orlander et al. Hypothyroidism. 2018, acedido em 22/08/2018. Disponível em:
https://emedicine.medscape.com
3. Ross D et al. Diagnosis of and screening for hypothyroidism in nonpregnant adults. 2017,
acedido em 24/08/2018. Disponível em: https://www.uptodate.com
4. Surks M et al. Clinical manifestations of hypothyroidism. 2017, acedido em 24/08/2018.
Disponível em: https://www.uptodate.com
5. Ross D et al. Treatment of primary hypothyroidism in adults. 2017, acedido em 24/08/2018.
Disponível em: https://www.uptodate.com

Hipertiroidismo

Introdução

Ao excesso de hormonas tiroideias dá-se o nome de hipertiroidismo. Ao conjunto de


manifestações bioquímicas e fisiológicas resultantes do excesso das hormonas
tiroideias nos tecidos tirotoxicose dá-se o nome de tirotoxicose.

Este aumento de hormonas tiroideias resulta da síntese pela glândula tireoideia ou


ectópica; pela destruição da glândula tiroideia, com consequente libertação das
hormonas; ou pela administração exógena de hormona tiroideia.

A prevalência de hipertiroidismo varia entre 1% a 4-5%, sendo mais elevada em


mulheres (relação de 5:1), em idosos e em fumadores.

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Etiologia
A tabela 1 apresenta causas de hipertiroidismo. Na população jovem, a causa mais
frequente é a doença de Graves e, na população idosa, o bócio multinodular.

Causas de hipertiroidismo:
Doença de Graves
Bócio tóxico difuso/multinodular (BMN)
Adenoma tóxico
Tiroidite subaguda
Tiroidite silenciosa (incluindo tiroidite linfocítica e pós-parto)
Iatrogénico (hormona tiroideia, farmacológica – ex. com iodo)
Tumor hipofisário secretor de TSH
Doença trofoblástica
Tabela 1. Causas mais frequentes de hipotiroidismo.
Legenda: BMN – Bócio multinodular; TSH – Hormona tiroestimulante.

Manifestações Clínicas

Tal como no hipotiroidismo, as manifestações clínicas do hipertiroidismo são diversas e


pouco específicas e nem sempre correspondem à extensão da alteração bioquímica. A
tabela 2 enumera os sintomas mais comuns da tirotoxicose.

Existem sinais e sintomas isolados que devem motivar investigação diagnóstica de


hipertiroidismo:
- Perda de peso inexplicada;
- Fibrilação auricular de novo;
- Miopatia;
- Desregulação menstrual;
- Ginecomastia.
Os pacientes mais jovens apresentam comummente sintomas de ativação simpática
(tremor, ansiedade, hiperatividade).

Na população idosa predominam os sintomas cardiopulmonares (por exemplo,


dispneia, fibrilação auricular) e perda de peso inexplicada. A osteoporose e a
hipercalcemia são distúrbios que se podem associar a hipertiroidismo.

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Sintomas Sinais
Intolerância ao calor, hipersudorese, Hipertermia
mãos húmidas
Fadiga, fraqueza muscular Perda de peso e aumento do apetite
Apetite normal ou aumentado Cabelo fino e frágil
Aumento da frequência defecatória e Pele quente, húmida e macia
urinária
Tremor, palpitações Tremor das mãos
Alterações da visão (fotofobia, diplopia) Taquiarritimia, fibrilação auricular
ou exoftalmia
Ansiedade, labilidade emocional Choque da ponta
Aumento da pressão arterial sistólica e da
pressão de pulso
Fraqueza muscular
Oligomenorreia, infertilidade,
ginecomastia, disfunção erétil
Tabela 2. Manifestações clínicas de hipertiroidismo.

A doença de Graves, a principal causa de hipertiroidismo, é um distúrbio auto-imune


de etiologia não esclarecida, mas que se acredita ser de origem multifatorial e com
predisposição genética. Inclui manifestações clínicas que não são devidas ao excesso
de hormonas tiroideias, como a oftalmopatia de Graves (edema periorbitário, dipolpia,
proptose) e a dermatopatia infiltrativa. Estes pacientes apresentam frequentemente
antecedentes pessoais de outras doenças auto-imune e são geralmente mais
sintomáticos do que pacientes com tirotoxicose por outras causas (porque tendem
também a apresentar níveis mais elevados de hormona tiroideia). Na doença de
Graves, o anticorpo anti-TPO está elevado em cerca de 8% dos casos e o anticorpo
antirrecetor da TSH (anti-TRABS) em até cerca de 80% dos casos.

O bócio multinodular tóxico é comum em emigrantes de regiões do mundo com


ingestão baixa de iodo e com história familiar de bócio não tóxico.

Diagnóstico

A história clínica deve incluir:

- Descrição e duração dos sintomas;

- Medicação e suplementos dietéticos: expetorantes, amiodarona, contraste com iodo;

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- Antecedentes pessoais (ex. doenças auto-imunes, como vitiligo, anemia perniciosa
ou diabetes mellitus tipo 1);

- Antecedentes familiares (ex. bócio multinodular);

- Antecedentes sociais (como locais de residência). O exame objetivo constitui o


primeiro passo na abordagem da suspeita de hipertiroidismo. Deve ser completo para
ajudar a orientar para as hipóteses de diagnóstico mais prováveis, devendo incluir:

- Exame tiroideu (dor à palpação, nódulos tiroideus, bócio difuso, sopro e frémito
tiroideus);

- Exame oftalmológico

- Exame dermatológico.

Os exames complementares de diagnóstico devem incluir:

- TSH: muitas vezes imensurável;

- T3 L (livre) e T4 L: os seus níveis nem sempre se relacionam com a gravidade dos


sintomas. Os pacientes com doença de Graves e no bócio multinodular apresentam
uma elevação superior de T3 em relação à T4, o que reflete maior secreção tiroideia e
conversão extra-tiroideia de T4 em T3; assim, a tirotoxicose a T3 ocorre numa fase
mais precoce da doença. Nestas patologias há geralmente um aumento superior de
hormonas tiroideias do que na presença de nódulo quente da tiróide;

- Anticorpos anti-TRABS: se positivos, diagnostica-se doença de Graves, pois são muito


sensíveis e específicos;

- Anticorpo antitiroideu anti-TPO: o anticorpo mais específico, ainda que possa estar
ligeiramente elevado em pessoas sem patologia tiroideia. Habitualmente, observam-se
níveis elevados na tirotoxicose de Graves e baixos ou ausentes no BMN e no adenoma
tóxico;

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- Ecografia da tiróide: avalia a morfologia e a vascularização da glândula tiroideia. Na
doença de Graves, observa-se geralmente bócio difuso com hipervascularização; no
adenoma tóxico ou BMN, observam-se um ou vários nódulos.

- Cintigrafia da tiróide: se, após a colheita dos dados prévios, a etiologia permanecer
desconhecida. O grau e padrão de captação do isótopo indica o tipo de patologia
tiroideia. A hipercaptação sugere hipertiroidismo: se difusa, doença de Graves; se
focal, adenoma ou BMN tóxico. A hipocaptação sugere outras causas de tirotoxicose
com origem extra-tiroideia.

A tabela 3 apresenta as alterações da função tiroideia mais comuns e a(s) suspeita(s)


clínica(s) mais provável(is).

Alteração da Função Tiroideia Suspeita clínica


TSH baixa + T4 L e T3 L normais Hipertiroidismo subclínico
(Repetir doseamento dentro de 3-6 meses e tratar
se fatores de risco)
TSH baixa + T4L e T3 L baixas Síndrome de doença não tiroideia
(iniciar tratamento)
TSH baixa + T4 L baixa + T3 L alta Tireotoxicose a T3
TSH baixa + T4L alta Hipertiroidismo
(Ecografia da tiróide – se achados sugestivos de
DG, tratar; se achados não sugestivos de DG,
cintigrafia: se hipercaptação difusa, DG; se focos
de hipercaptação: adenoma ou BMN; se
hipocaptação: tiroidite subaguda, tirotoxicose
factícia, strumaovari, hipertiroidismo previamente
exposto a altas doses de iodo)

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Tabela 3. Suspeita clínica de acordo com alteração da função tiroideia.

Tratamento

O tratamento do hipertiroidismo é dirirgido ao sintomas (com beta-bloqueadores,


como o propranolol ou o atenolol) e à etiopatogenia, com recurso a fármacos (como o
metamizole ou o propiltiouracilo, sendo que o primeiro é mais bem tolerado, mas
contra-indicado na grávida por ser teratogénico), iodo radioativo ou cirurgia.

A idade, a etiologia e a preferência do paciente são fatores que influenciam a seleção


do método mais adequado. Na maior parte das vezes preferem-se os fármacos ou o
iodo radiotivo à cirurgia, exceto se: bócio volumoso a provocar sintomas compressivos,
intolerância aos fármacos, suspeita de malignidade, hiperparatiroidismo primário a
requerer cirurgia, mulheres que planeiem engravidar em menos de 4-6meses,
pacientes com orbitopatia ativa moderada a grave.

Referenciação

Recomenda-se a referenciação dos pacientes à consulta de Endocrinologia após o


diagnóstico e tratamento sintomático de hipertiroidismo.

Referências
1. XXII curso Pós-graduado de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo. Porto: Syllabus; 2016
2. Lee S et al. Hyperthyroidism and Thyrotoxicosis. 2018, acedido em 16/09/2018. Disponível em:
https://emedicine.medscape.com
3. Ross D. Diagnosis of hyperthyroidism. 2018, acedido em 02/09/2018. Disponível em:
https://www.uptodate.com
4. Bahn RS et al. Hyperthyroidism and other causes of thyrotoxicoses: Management Guidelines of
the American Thyroid Association and American Association of Clinical Endocrinologists.
Endocrine Practice, 2016.

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Metabolismo do Fósforo e do Cálcio

Hipocalcémia

Introdução
As concentrações de cálcio sérico ionizado mantêm-se estáveis e sem variações
significativas pela mecanismo de homeostase existente entre o cálcio ionizado, a PTH e
a vitamina D (homeostase do cálcio).
Define-se por concentrações de cálcio sérico ionizado <4,5 mg/dL ou concentrações de
cálcio sérico total <8,6 mg/dL com albumina sérica normal.

Causas de hipocalcémia (Ca2+< 4,5 mg/dl)


- Produção e/ou secreção inadequadas de PTH
- Resistência à PTH, défice e/ou,
- Resistência à acção da vitamina D
- Metabolismo anómalo do magnésio ou,
- Deposição extravascular do cálcio, Anomalias estas que ocorrem em diversas
patologias.
De todas as causas, as mais comuns são o hipoparatiroidismo pós-cirúrgico e
autoimune (PTH diminuída) e o défice de vitamina D (PTH aumentada).

Abordagem de hipocalcémia:
- Confirmar o valor obtido, repetindo o doseamento de cálcio sérico
- Determinar o cálcio ionizado (correcção do cálcio total com albumina sérica)
- O doseamento da PTH é essencial
- Outros parâmetros analíticos a pedir: Magnésio e fosfato séricos, metabolitos da
vitamina D (25-hidroxi vitamina D), creatinina plasmática e fosfatase alcalina.

Referenciação
Referenciar para Endocrinologia se hipocalcémia.

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Hipercalcémia

Introdução
As concentrações de cálcio sérico ionizado mantêm-se estáveis e sem variações
significativas pela mecanismo de homeostase existente entre o cálcio ionizado, a PTH e
a vitamina D (homeostase do cálcio).
Define-se por concentrações de cálcio sérico ionizado >5,1 mg/dl ou concentrações de
cálcio sérico total >10,3 mg/dl com albumina sérica normal.

Causas de hipocalcémia (Ca2+>5,1 mg/dl)


A hipercalcémia é um problema clínico comum. O hiperparatirodismo primário e a
patologia maligna são as causas mais comuns (>90%).

Abordagem de hipercalcémia
- Avaliação clínica e laboratorial para distinguir hiperparatiroidismo de patologia
maligna
- Confirmar o valor obtido, repetindo o doseamento de cálcio sérico
- Determinar o cálcio ionizado (correcção do cálcio total com albumina sérica) -
Determinar presença/ausência d sintomas, história familiar, fármacos
O doseamento da PTH é essencial.

Referenciação
Referenciar para Endocrinologia se hipercalcémia.

21
Osteoporose: causa secundária

Introdução/Manifestações clínicas:
A osteoporose secundária deve ser tida em conta:

 Na presença de condições que induzam osteoporose (Quadro 1)


 Fracturas de fragilidade <70 anos nos homens e antes da menopausa nas
mulheres com Z-scores «-2,0.

O hiperparatiroidismo primário é uma das principais causas de osteoporose


secundária. O diagnóstico é bioquímico (hipercalcémia, PTH elevada ou
inapropriadamente normal).

Factores de risco para fragilidade óssea e causas de osteoporose secundária:

Condições Artrite reumatóide, lupus eritematoso sistémico, espondilite


Inflamatórias anquilosante, doença inflamatória intestinal, sarcoidose, HIV.
Causas Síndrome de Cushing, hipertiroidismo, hiperparatiroidismo
metabólicas ou primário, hiperprolactinemia, menopausa prematura (auto-imune,
endocrinológicas cirúrgica, farmacológica), hipogonadismo masculino, acromegalia,
deficiência de hormona de crescimento, DM tipo I e II, porfiria,
hipofosfatasia, gravidez.
Condições Doença hepática crónica, cirrose biliar primária, bypass ou
gastro- ressecção gastro-intestinal, doença celíaca, malabsorção,
intestinais e intolerância a lactose, insuficiência pancreática, nutrição
hepáticas/ parentérica total, alcoolismo, anorexia nervosa, deficiência de
nutrição cálcio.
Condições Mieloma múltiplo e gamopatia monoclonal de significado
hematológicas indeterminado (MGUS), doenças mieloproliferativas, mastocitose
sistémica, talassemia, hemofilia, anemia falciforme.
Condições renais Doença renal crónica, transplantação renal, hipercalciúria renal
idiopática, acidose tubular renal
Condições Osteogenesis imperfecta, S. Marfan, S. Ehler-Danlos,
genéticas homocistinuria, pseudoxantoma elasticum, doença de Gaucher,
hipofosfatasia, hemocromatose.

22
Fármacos Glicocorticóides, antiepiléticos, hipoglicemiantes
(tiazolidinedionas), inibidores da lipase, SSRIs, suplementação
excessiva de tiroxina, inibidores da aromatase, agonistas GnRH,
depot de acetato de medroxiprogesterona, tamoxifeno,
quimoterapia, imunossupressores (ciclosporina, tacrolimus),
furosemida, lítio, heparina, IBPs, antiácidos com alumínio,
antipsicóticos, anti-retrovirais.

Diagnóstico
Exame Físico: Baixa estatura e IMC <18,5 Kg/m2, inflamação articular, cifose, escleras
azuladas.

Estudo analítico:

□ Cálcio sérico
□ Cálcio urina 24h
□ Fósforo
□ PTH
□ Vitamina D
□ Glicose em jejum
□ TSH
□ Testosterona livre, LH e FSH
□ Cortisol sérico
□ Fosfatase alcalina
□ Electroforese de proteínas
□ Creatinina, hemograma, PCR, enzimas hepáticas, anti-transglutaminase.

Tratamento
- Tratar causa secundária

- Tratar osteoporose, na prevenção de fracturas (Ver Osteoporose).

Referenciação

23
Devem ser referenciados para Endocrinologia os doentes em que se suspeita de causa
endócrina de osteoporose secundária.

Referências

1. McGill JB et al: The Washington Manual of Endocrinology Subspecialty Consult, 3 rd


edition, set 2012.
2. Rodrigues AM et al: Portuguese recommendations for the prevention, diagnosis
and management of primary osteoporosis – 2018 update, Ata Reumatologia. Port
2018; 43: 10-31.

24
Displipidemias familiares

Hipercolesterolemia Familiar

Introdução
A hipercolesterolemia familiar (FH) é uma doença genética, autossómica dominante,
com uma prevalência da forma heterozigótica de 1:500 na maioria das populações
europeias, o que a torna uma das patologias genéticas mais comuns. Pelo contrário, a
forma homozigótica da FH é rara (1:1000000).
A síndrome clínica é caracterizada por níveis extremamente elevados de colesterol de
lipoproteína de baixa densidade (C-LDL) e maior risco de doença cardiovascular
aterosclerótica prematura. Os homozigotos geralmente manifestam a doença ainda na
infância.

Etiologia
Na FH foram identificadas mutações em três genes: o receptor de lipoproteína de
baixa densidade (LDLR), mutações de ganho de função do gene da PCSK9 e do gene da
apolipoproteina B (ApoB).
No entanto, a frequência de mutações detetáveis em doentes com HF heterozigótica,
clinicamente definida ou provável, é apenas de 60-70%. Isto significa que, um
considerável número de doentes com HF terá uma forma poligénica da doença. Podem
ainda haver outros genes não identificados na base desta patologia.

Clínica
A FH é caracterizada por níveis elevados de colesterol total (CT) e de C-LDL, acima do
percentil 95% para o sexo e a idade, com valores de colesterol das lipoproteínas de alta
densidade (C-HDL) e de triglicéridos (TG) dentro do intervalo de referência considerado
normal, associados a uma história familiar de hipercolesterolemia e de doença
cardiovascular prematura.

25
Clinicamente, a forma homozigótica da FH tem um fenótipo mais severo do que a
heterozigótica, sendo que quando não diagnosticada, os indivíduos desenvolvem
doença cardiovascular aterosclerótica grave e prematura, com eventos fatais em
idades precoces.
O CT na HF heterozigótica varia entre 290 e 500 mg/dL e na forma homozigótica
habitualmente encontra-se entre os 600 mg/dL e os 1000 mg/dL. Estes níveis elevados
resultam frequentemente em depósitos de colesterol nos tecidos extravasculares, sob
a forma de xantomas, xantelasmas e arco corneano antes dos 45 anos.
A presença de xantomas tendinosos é geralmente considerada patognomónica da FH,
pois embora possam estar presentes noutras patologias (hiperlipoproteinemia tipo III,
fitoesterolemia e xantomatose cerebrotendinosa), estas são muito raras. Os xantomas
tendinosos são facilmente observados no tendão de Aquiles e nos tendões extensores
dos dedos das mãos.

Abordagem Diagnóstica
Deve suspeitar-se de HF (Classe I, Nível C):
- Doentes com doença coronária antes dos 55 anos nos homens e antes dos 60 anos
nas mulheres;
- Indivíduos com familiares com doença cardiovascular precoce fatal ou não fatal;
- Indivíduos com familiares com xantomas tendinosos;
- Indivíduos com C-LDL elevado [adultos >190 mg/dL (5mmol/L); crianças >150 mg/dL
(4 mmol/L)].

Recomenda-se a confirmação do diagnóstico com critérios clínicos e, quando possível,


com análise do DNA (Classe I, Nível C).
Recomenda-se que o rastreio familiar em cascata seja realizado quando um caso
índice de HF for diagnosticado (Classe I, Nível C). Define-se como caso índice se
presença dos seguintes critérios:
- CT ≥ 310 mg/dL (8 mmol/L) num adulto ou num membro adulto da família (ou >
percentil 95 por idade e género por país);
- Doença coronária precoce em indivíduos ou membro(s) da família;
- Xantomas tendinosos em indivíduo ou membro(s) da família;

26
- Morte súbita cardíaca precoce num membro da família.

O diagnóstico de HF é realizado de acordo os “Dutch Clinic Network Criteria”


seguidamente descritos:
GRUPO 1: HISTÓRIA FAMILIAR Pontos
Familiar em 1º grau com doença coronária prematura (Homens: <55 anos;
Mulheres: <60 anos) ou 1
Familiar em 1º grau com C-LDL no percentil ≥ 95 para a idade e género
Familiar em 1º grau com xantoma tendinoso e/ou arco corneano ou crianças
2
(<18 anos) com C-LDL no percentil ≥ 95 para a idade e género
GRUPO 2: HISTÓRIA CLÍNICA
Doente com doença coronária prematura (Homens: <55 anos; Mulheres: <60 2
anos)
Doente com doença vascular periférica ou cerebral precoce (Homens: <55 anos; 1
Mulheres: <60 anos)
GRUPO 3: EXAME FÍSICO
Xantoma tendinoso 6
Arco corneano antes dos 45 anos 4
GRUPO 4: ANÁLISES BIOQUIMICAS (C-LDL)
>325mg/dL (>8.5 mmol/L) 8
251-325 mg/dL (6.5 – 8.4 mmol/L) 5
191-250 mg/dL (5.0 – 6.4 mmo/L) 3
155-190 mg/dL (4.0 – 4.9 mmol/L) 1
GRUPO 5: TESTE GENÉTICO MOLECULAR (ANÁLISE DNA)
Mutação identificada nos genes RLDL, apoB ou PCSK9 8

Diagnósti co HF:
“Defi niti vo” - score de > 8 pontos.
“Provável” - score de 6-8 pontos.
“Possível” - score de 3-5 pontos.
“Improvável” - score de 0-2 pontos.
[Nota: Só pode ser escolhido um valor por grupo, sendo o maior dos aplicáveis.]

Assim, o diagnóstico clínico de HF heterozigótica baseia-se na história familiar de


hipercolesterolemia ou de doença coronária precoce, na história pessoal de doença
cardiovascular e no valor de C-LDL. No final o diagnóstico pode ser confirmado,
demonstrando as mutações causadoras nos três genes patogénicos.

27
Abordagem Clínica

História Familiar Exame Físico Estudo Analítico

Doença arterial Xantomas tendinosos Perfil lipídico em


jejum:
coronária prematura - (++ tendão de Aquiles,
C-LDL 
<55 anos no sexo dorso das mãos) C-HDL  ou N
masculino e <65 anos Xantelasmas (+ TG N * ( podem estar
no sexo feminino  se obesidade,
pálpebra medial)
diabtes ou mutações
(enfarte agudo do Arco corneano (anel nos genes reguladores )
miocárdio, morte branco ou cinza ao
súbita) redor da córnea) Crianças: perfil lipídico
Xantomas tendinosos a partir dos 5 anos, ou
antes se houver
Níveis elevados de CT suspeita de HF
(sobretudo se na homozigótica (Classe I,
infância) Nível C).

Teste Genético
Mutações nos genes LDLR, APOB e PCSK9
Nos homozigotos, o teste genético pode ajudar na tomada de decisão em relação
aos agentes PCSK9.

*Nota: Níveis elevados de TG não excluem o diagnóstico de HF; no entanto, outras causas
potenciais de hipertrigliceridemia devem ser consideradas.

Tratamento
As modificações do estilo de vida, como a alimentação equilibrada e a pática de
exercício físico, são essenciais. Também a cessação tabágica está recomendada.
Os doentes com HF devem ser tratados com uma dose terapêutica de Estatinas, de
elevada potência, muitas vezes em combinação com a ezetimiba (Classe I, Nível C).
Objetivos terapêuticos de C-LDL:
- Crianças <135 mg/dL (3,5 mmol/L);
- Adultos < 100 mg/dL (2,6 mmol/L);
- Adultos com doença cardiovascular < 70 mg/dL (1,8 mmol/L).
Se os alvos não forem atingidos, deve ser considerada uma redução máxima do C-LDL
utilizando combinações farmacológicas apropriadas (Classe IIa, Nível C).
Deve ser considerada a terapêutica com um anticorpo da PCSK9 nos doentes com HF
com doença cardiovascular ou com outros fatores que os colocam numa situação de

28
risco muito elevado de doença coronária, tais como outros fatores de risco
cardiovascular, história familiar, Lipoprotéina (a) elevada ou intolerância às estatinas
(Classe IIa, Nível C).
As crianças com HF devem ser ensinadas a adotar uma dieta adequada e devem ser
tratadas com estatinas a partir dos 8 - 10 anos. Os alvos terapêuticos devem ser de C-
LDL <135 mg/dL (3,5 mmol/L) se idade > 10 anos (Classe IIa, Nível C).

Referenciação
Todos doentes com suspeita de HF devem ser referenciados para confirmação com
teste genético, estratificação do risco e o estudo da doença cardiovascular
assintomática.
Distúrbios primários do metabolismo do C-LDL que permaneçam acima do seu alvo
terapêutico, apesar da dose máxima tolerada de estatina.

Referências
1. Bourbon M et al. Estudo Português de Hipercolesterolemia Familiar: Apresentação
do Estudo e Resultados Preliminare.; Rev Port Cardiol 2006; 25 (11): 999-1013
2. Catapano Aet al. 2016 ESC/EAS Guidelines for the Management of Dyslipidaemias.
European Heart Journal, October 2016, Pages 2999–3058,
doi.org/10.1093/eurheartj/ehw272
3. Rosenson R et al. Familial hypercholesterolemia in adults: Overview. 2018, acedido
em 23/01/2019. Disponível em: https://www.uptodate.com
4. Nordestgaard B et al. Familial hypercholesterolaemia is underdiagnosed and
undertreated in the general population: guidance for clinicians to prevent coronary
heart disease. Consensus Statement of the European Atherosclerosis Society.
European Heart Journal. 2013. doi:10.1093/eurheartj/eht273

Obesidade

Introdução

A obesidade é um dos principais problemas de saúde pública em Portugal, afetando


mais de 50% da população adulta, tendo implicações sérias em várias patologias. É
crucial criar consensos sobre as melhores estratégias terapêuticas e nutricionais para

29
esta patologia, à luz da mais recente evidência científica e uniformizar os critérios de
referenciação à consulta hospitalar de Endocrinologia. 1

Etiologia
A um nível individual, a combinação de uma ingestão alimentar excessiva e a
inactividade física explicam a maior parte dos casos de obesidade. Um número
limitado de casos poderá dever-se a causas genéticas, médicas ou doença psiquiátrica.
As causas mais frequentes desta patologia estão representadas na Tabela1. 2

Causas de Obesidade:
Ingestão alimentar excessiva
Inactividade física
Genética e hereditariedade
Hipotiroidismo, síndrome de Cushing, défice da hormona de crescimento, alterações
do metabolismo lipídico
Perturbações do sono e do comportamento alimentar
Iatrogenia (e.g., fármacos como antipsicóticos atípicos, antidepressivos, insulina,
sulfonilureias, tiazidas, esteróides, anticonvulsivantes e contracepção hormonal
Tabela 1. Causas mais frequentes de obesidade.

Diagnóstico e Classificação

O impacto da obesidade na saúde deriva da proporção excessiva de massa gorda


corporal e, sobretudo, da sua distribuição morfológica. Para avaliar com precisão a
presença de obesidade dever-se-ia recorrer a métodos de avaliação direta da
proporção de massa gorda corporal (e.g., a densidade corporal, densitometria,
ressonância magnética nuclear, medição do potássio corporal total, bioimpedância).
Tratando-se de métodos dispendiosos e relativamente complexos, na avaliação da
obesidade, é mais habitual o recurso à avaliação antropométrica e, particularmente, a
fórmulas que combinam o peso, altura e/ou os perímetros corporais. Neste caso,

30
destaca-se o Índice de Massa Corporal (IMC) que corresponde à razão entre o peso e o
quadrado da estatura. A tabela 2 apresenta a classificação de excesso de peso /
obesidade com base neste índice.1

Classificação IMC (kg/m2)


Peso baixo < 18,50
Intervalo normal 18,50 – 24,99
Pré-obesidade 25,00 – 29,99
Obeso classe I 30,00 – 34,99
Obeso classe II 35,00 – 39,99
Obeso classe III ≥ 40,00
Tabela 2. Categorização da corpulência baseada no IMC.

O impacto desta patologia pode ainda ser aumentado de forma significativa se


estivermos na presença da Síndrome Metabólica. Na tabela 3, apresentam-se os
critérios harmonizados para diagnóstico desta síndrome, incluindo a obesidade central
como um dos cinco critérios/fatores de risco, sendo que a presença concomitante de
três deles constitui critério de diagnóstico da Síndrome Metabólica.3

Ainda no que concerne ao risco de morbilidade e mortalidade, sobretudo do ponto de


vista cardiovascular, foi também proposta a razão cintura/estatura >0,5 como sendo o
indicador antropométrico mais fiável a ter em conta.

Medida Pontos de corte categóricos


Perímetro da cintura - ≥80cm ou ≥88cm em mulheres
aumentado - ≥94cm ou ≥102cm em homens
Triglicéridos elevados ≥150 mg/dL*
Colesterol HDL baixo <40 mg/dL em homens e <50 mg/dL em
mulheres*
Pressão arterial aumentada Sistólica ≥130 e/ou diastólica ≥85 mm Hg*
Alteração da glicemia de jejum ≥100 mg/dL*

31
Tabela 3. Critérios harmonizados para diagnóstico da Síndrome Metabólica.
Nota: *ou terapêutica direccionada à alteração

Abordagem Clínica

A mudança dos estilos de vida, nomeadamente a melhoria do padrão alimentar, a


prática de actividade física e uma boa higiene do sono são componentes
imprescindíveis da terapêutica do excesso de peso ou obesidade, independentemente
do grau e do recurso concomitante a fármacos ou à cirurgia bariátrica. Na tabela 4
resumem-se as principais medidas de intervenção nutricional na obesidade. 3

Objetivo Estratégia
Diminuir a densidade - Substituir os alimentos com elevada densidade energética por porções
energética da dieta equivalentes de alimentos de elevada densidade nutricional.
- Reduzir a ingestão de açúcares, evitando o açúcar de adição e as
bebidas açucaradas.
- Controlar a ingestão de gordura, evitando alimentos gordos e
controlando a gordura de adição (para barrar, como condimento e
tempero)
- Aumentar a proporção de legumes nas refeições, através das sopas de
legumes, como guarnição e como ingrediente adicional nas receitas
habituais.
- Utilizar uma metodologia de confeção “tipo” mediterrânico: utilizando
ingredientes com baixo teor de gordura, controlando a gordura nos
cozinhados (salteados, estufados, assados) e utilizando ervas
aromáticas em detrimento do sal.
Adotar padrões de - Manter um padrão estável de, pelo menos, três refeições.
refeição regulares - Ponderar a inclusão de refeições intermédias, visando o controlo do

32
apetite as escolhas alimentares adequadas (por exemplo, planeando os
snacks).
Diminuir a velocidade Diminuir o “tamanho” de cada garfada, pousar talheres entre garfadas
da ingestão e/ou acompanhar um comensal que coma devagar.
Ter actividade física - Diminuir o sedentarismo (tempo de ecrã, sentado…)
regular - Aumentar a atividade física não-estruturada, por exemplo, caminhar
para a escola/trabalho, usar escadas (em vez do elevador), fazer
trabalhos domésticos e de jardinagem, etc.
- Fazer exercício físico orientado se possível.
Tabela 4. Objetivos, estratégias e evidência de suporte da intervenção nutricional.

Tratamento

O tratamento farmacológico da obesidade deve realizar-se na presença de


comorbilidades associadas que justifiquem a necessidade de terapêutica. Iniciar e
otimizar a terapêutica da hipertensão arterial, diabetes Mellitus, asma, dislipidemia,
apneia do sono, insuficiência cardíaca, doença arterial coronária e doença arterial
periférica, entre outras.

Referenciação

Recomenda-se a referenciação dos doentes à consulta de Endocrinologia no caso de


falência da intervenção nutricional e tratamento farmacológico optimizado da
obesidade e, se existirem das disfunções metabólicas. Esta referenciação deverá
acontecer apenas nos doentes que apresentem um IMC >30 e comorbilidades
associadas que justifiquem a necessidade de intervenção terapêutica. Deverá
ponderar-se a referenciação para Cirurgia Bariátrica nos doentes com IMC >40 e
comorbilidades associadas que justifiquem a necessidade de terapêutica.

Referências

33
1. Fernando Batista, Isabel Do Carmo, J. Garcia E Costa, A. Galvão-Teles. Obesidade E
Dislipidemia. Lisboa: Núcleo de Endocrinologia, Hospital de Santa Maria; 1991
2. Ross D. Obesity in adults: Prevalence, screening, and evaluation. 2019, acedido em
30/01/2019. Disponível em: https://www.uptodate.com
3. Direcção Geral de Saúde. Obesidade: Otimização Da Abordagem Terapêutica No
Serviço Nacional De Saúde. Lisboa: Programa Nacional para a Promoção da
Alimentação Saudável; 2017
4. XXIV curso Pós-graduado de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo. Porto:
Associação dos Amigos do Serviço de Endocrinologia do Hospital de São João; 2018

34
Hipoglicemias

35
Sistema Reprodutor e alterações relacionadas

Atraso Pubertário

Introdução
A puberdade é uma fase do desenvolvimento do ser humano caracterizada por
maturação da gametogénese, secreção de hormonas sexuais, desenvolvimento dos
caracteres sexuais secundários e início da função reprodutiva. O evento fundamental
para o seu início ocorre a nível hipotalâmico pelo aumento da secreção pulsátil das
gonadotropinas hipofisárias (LH- Hormona Luteinizante- e FSH-Hormona Estimuladora
dos Folículos-). Esta cascata hormonal resulta na maturação das gónadas, com
consequente produção das hormonas sexuais (testosterona ou estrogénio) e
gametogénese.1

Definição
A puberdade tem início em média aos 10 anos nas raparigas e dois anos mais tarde nos
rapazes, mas os limites do normal são bastante variáveis. Todo o processo da
puberdade, desde os primeiros sinais até à plena maturidade física, desenrola-se num
espaço de tempo que pode variar entre 18 meses e 5 anos, em geral três a quatro
anos. Habitualmente, nos casos em que se inicia mais cedo, a duração é maior. 2
Considera-se atraso pubertário a ausência ou desenvolvimento incompleto dos
caracteres sexuais numa idade em que 95% das crianças do mesmo sexo e cultura já
tenham iniciado a sua maturação sexual.3
Deve suspeitar-se de atraso pubertário quando não existem sinais pubertários aos 13
anos nas raparigas e aos 14 anos nos rapazes, ou quando as raparigas permanecem
amenorreicas aos 16 anos. 2 Pelo contrário, considera-se que a puberdade é precoce
quando surgem sinais pubertários antes dos 8 anos nas raparigas e dos 9 anos nos
rapazes.2
De acordo com as orientações da Direção Geral de Saúde, no Programa de Saúde
Infantil e Juvenil, a monitorização do desenvolvimento pubertário deve ser realizada
através dos estádios de Tanner (Figura 1).1

36
Figura 2 – Estádios Pubertários de Tanner (Tanner, 1962)

Etiologia
As causas de atraso pubertário encontram-se descritas na Tabela 1.
O atraso constitucional do crescimento e puberdade (ACCP) corresponde à principal
causa de atraso pubertário, sendo mais comum no sexo masculino e em casos de
história familiar de atraso pubertário. Apesar da sua frequência, o diagnóstico de ACCP
apenas pode ser estabelecido após exclusão de outras patologias. 3-5
O hipogonadismo hipogonadotrófico (também designado de secundário) resulta de
disfunção do sistema nervoso central. Pode ser classificado em congénito, adquirido
ou constitucional, neste último caso secundário a anorexia, exercício extenuante,
stress ou doenças crónicas.3-5
Já o hipogonadismo hipergonadotrófico (primário) está associado a patologia gonadal,
caracterizando por níveis de gonadoprofinas hipofisárias elevadas (LH e FSH).3-5

37
Tabela 6. Causas de Atraso Pubertário3
Hipogonadismo primário (FSH e LH altas)
Adquirido Congénito
Autoimune ou pós-infecciosa Alterações cromossómicas (S. Turner - 45,
Após trauma ou cirurgia XO; S. Klinefelter - 47, XXY)
Quimioterapia, radioterapia Anorquia bilateral

Hipogonadismo secundário ( FSH e LH baixas a normais)


Adquirido Congénito
Tumores intracranianos Deficiência isolada de GnRH (idiopático)
Doenças infiltrativas S. Kallman (com anosmia/ hiposmia),
Hipoplasia congénita da supra-renal
Síndrome de Prader-Willi 
Malformações congénitas cerebrais
Funcional
Atraso constitucional de crescimento e Diabetes mellitus
puberdade (ACCP) Doença de Cushing
Doença crónica Hipotireoidismo
Malnutrição Anorexia nervosa
Hiperprolactinemia Bulimia
Doença inflamatória intestinal Atividade física excessiva
Doença celíaca

38
Algoritmo Clínico: História Clínica Exame objetivo
Antecedentes familiares de atraso pubertário Curva de crescimento
Antecedentes pessoais de doença crónica, anosmia, Estádio de Tanner
anorexia, criptorquidia, radioterapia ou quimioterapia Volume testicular (<4mL)

MCDT
Bioquímica (hemograma, VS, creatinina, ionograma, perfil hepático)
TSH, T4L
LH, FSH (testosterona ; estradiol )
Fator de crescimento IGF-1
Rx mão e punho (idade óssea)
Ecografia Escrotal | Ecografia Pélvica

LH e FSH N ou  : LH e FSH :
Hipogonadismo hipogonadotrófico Hipogonadismo
hipergonadotrófico

Crescimento pré-pubertário N Crescimento pré-pubertário  Cariótipo


Níveis de Inibina B ( )

Deficiência de GnRG Funcional


Atraso Constitucional (ACCP) Permanente/Hipopituarismo Tratamento com esteróides sexuais

Teste GnRH IMC baixo: DII, Doença Celíaca, Anorexia,


Teste hCG ( ) Desnutrição
Niveis de Inibina B IMC Normal: Hiperprolactinemia; Défice de hormonas
Teste genético
RMN cerebral (excluir lesão hipofisárias
hipotalâ-mica/hipófise) IMC Elevado: Excesso de Glucocorticóides
Iatrogénico; S. Cushing; Hipotiroidismo;

Vigilância Tratamento da patologia


Indução de caracteres secundários subjacente
39
Referenciação
Recomenda-se referenciação a consulta hospitalar de Endocrinologia Pediátrica para
avaliação do eixo hipotálamos-hipófise-gonadas para exclusão de patologia orgânica e
necessidade de tratamento dirigido, em crianças/adolescentes com atraso pubertário,
nomeadamente:
Raparigas: ausência de sinais pubertários aos 13 anos, ou amenorreica aos 16 anos;
Rapazes: ausência de sinais pubertários aos 14 anos nos rapazes.

Referências
1. XXII curso Pós-graduado de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo. Porto:
Syllabus; 2016.
2. Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil, 2013, DGS.
3. Crowley W et al. Approach to the patient with delayed puberty. Uptodate 2018.
Acedido em 23/01/2019. Disponível em https://www.uptodate.com
4. Kaplowitz PB. Delayed puberty. Pediatrics in review 2010; 31: 189-95.
5. Cañete Estrada R, Mata Rodrígues C, Aguilar Quintero M. Retraso puberal.
Hipogonadismos. Protoc diagn ter pediatr 2011; 1: 205-17.

Hirsutismo
40
Introdução
O hirsutismo resulta da interação entre os androgénios plasmáticos e a sensibilidade
1,2
dos folículos pilosos aos mesmos . Esta é determinada pelo metabolismo local de
androgénios, em particular pela conversão da testosterona em dihidrotestosterona
pela 5α-redutase, e posterior ligação destas moléculas ao receptor androgénico 2.
Define-se, então, como o excesso de crescimento terminal de pêlos em áreas
dependentes de androgéneos, com crescimento num padrão de distribuição
tipicamente masculino. Afeta 5-10% das mulheres em idade reprodutiva.
A síndrome do ovário poliquístico (SOP) e o hirsutismo idiopático são as causas mais
frequentes.

Etiologia
Síndrome do  Causa mais frequente de hirsutismo (70-80%)
Ovário  Tipicamente, a clínica desenvolve-se durante a puberdade
Poliquístico  Caraterizado por:
(SOP)
Irregularidade menstruais (oliomenorreia; amenorreia secundária)
Evidência de hiperandroginismo clínico (hirsutismo, acne, alopécia) ou
bioquímico (elevação concentração sérica de androgénios)
Alterações ecográficas dos ovários
Síndrome de  Resulta de um excesso de produção de ACTH, habitualmente secundária a
Cushing adenoma hipofisário.
Hirsutismo  Associa-se a ciclos menstruais regulares, fertilidade preservada e níveis
Idiopático séricos de androgénios normais
 Aumento da sensibilidade da unidade pilossebácea aos androgéneos e a
aumento da atividade da 5-alfa-reductase
 Geralmente um diagnóstico de exclusão
Hiperplasia  Deficiência da atividade de uma das enzimas adrenocorticais necessárias
adrenal para a biossíntese dos corticoides (a deficiência de 21-hidroxilase é a forma
congénita mais comum)
 Pouco frequente
 As formas clássicas geralmente são reconhecidos ao nascimento ou início da
infância. As formas não clássicas surgem mais tarde na vida, habitualmente
na pré-puberdade, puberdade ou até mais tarde, quando se estuda uma
infertilidade.
 Sinais são similares aos do SOP
Tumores  São raros.

41
 Podem localizar-se no ovário ou nas supra-renais
 Suspeitar quando:
 Rápido aparecimento e progressão (especialmente após puberdade)
 Evidência de virilização(↑massa muscular, voz grave, clitoromegália)
 Massa abdominal ou pélvica
Medicamento Esteróides anabolizantes, fenotiazidas, ciclosporina, minoxidil, ácido
s valpróico, escitalopram.
Tabela: Principais causas de hirsutismo3,4

Clínica
Há 2 tipos de pêlo distintos: pêlo veloso (fino, não pigmentado) e pêlo terminal (longo,
áspero e pigmentado). O excesso de androgénios nas mulheres leva a aumento do
crescimento piloso nas regiões mais sensíveis aos androgénios (lábio superior, mento,
região esternal, abdómen superior, dorso e nádegas). O aparecimento de alopécia
androgénica e o surgimento de acne podem-se associar como manifestações de
hiperandrogenismo. É importante distinguir hirsutismo de hipertricose (aumento
difuso do crescimento de pêlo veloso). A hipertricose refere-se ao excessivo
crescimento de pelos de uma forma generalizada, que pode ser hereditária ou
resultante de alguns tipos de fármacos (p.ex: fenitoína, minoxidil, glucocorticoides e
1,2
ciclosporina) ou doenças (p.ex: anorexia nervosa) . Este tipo de aumento do
crescimento piloso não está relacionado com o aumento de androgénios, embora este,
quando presente, possa agravar o primeiro1,2.
Para a sua avaliação é geralmente utilizada a escala de Ferriman-Gallwey que
avalia o crescimento piloso em 9 áreas diferentes. Nove áreas corporais (lábio
superior, queixo, peito, braço, abdómen superior, costas, zona lombar e coxas) são
pontuadas de 1 (presença mínima de pelos terminais) até 4 (presença de pelos
terminais equivalente a um homem). Se não se identificam pelos terminais na zona
observada, atribui-se uma pontuação de 0. O crescimento piloso em algumas destas
áreas é considerado normal nas mulheres. A pontuação normal é menor em algumas
populações asiáticas e maior nas populações do Mediterrâneo (mulheres hispânicas e
do médio oriente ≥ 9 a 10; sul-americanas ≥ 6; asiáticas ≥ 2; chineses ≥ 6). 1
Geralmente, na grande maioria das situações, na nossa população, o estudo é

42
solicitado a partir de um score ≥ 8 a 10. Embora amplamente utilizado, este score
apresenta algumas limitações, nomeadamente a subjetividade da avaliação.

43
Abordagem diagnóstica

História clínica Se início rápido, agravamento progressivo ou início tardio/ não perto da pu
Duração dos sintomas Suspeitar de tumores secretores de andrógenos!
Localização
História menstrual
Fertilidade
Etnia
História Familiar de hirsutismo, infertilidade e obesidade
Medicação – descontinuar medicamentos associados, se possível

e resistência à insulina (acantose nigricans, síndrome Cushing – fácies em lua cheia, obesidade troncular, pele fina, estrias violáceas abdominais)
e virilização - Voz grave, acne, aumento da massa muscular, alopécia e clitoromegália

Score Ferriman-Gallwey

EXAMES COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO:


tosterona total:
ear de manhã cedo entre o 3º e 6º dia do ciclo menstrual (fase folicular precoce) – contracetivos orais interferem com estes doseamentos!
ores superiores a 150 ng/dl sugerem neoplasia
EA-S (sulfato de dehidroepiandrosterona)
cador de hiperandrogenismo adrenal
00 μg /dl – sugestivo tumor SR
OH-progesterona
e as 07h00 e as 08h00 na fase folicular do ciclo menstrual – para exclusão de hiperandrogenismo suprarrenal
actina
citar quando presença concomitante de irregularidades menstruais
monas tiroideias (TSH e T4 livre)
e FSH
tisol urina 24h
ndo existe suspeita elevada de S. Cushing (irregularidades menstruais, estrias violáceas e obesidade central)
grafia pélvica
uspeita de SOP ou massa pélvica

Não solicitar níveis de androgénios em mulheres com hirsutismo ligeiro!


Solicitar apenas quando:
Hirsutismo moderado a grave, início súbito ou rapidamente progressivo 44
Tratamento
O tratamento do hirsutismo deve ser dirigido à sua causa.
É importante ter em consideração o crescimento piloso. A fase de crescimento varia
com a área do corpo e é de 4 meses para o pelo facial. Devido ao longo ciclo de
crescimento do pelo são necessários 6 meses par detetar os efeitos da terapia
hormonal e aproximadamente 9 meses para se obter o efeito máximo. 1
A primeira linha de tratamento do Síndrome de Ovário Poliquístico é o uso de
contraceptivo oral estroprogestativo contendo progestativo com acção anti-
androgénica, evitando os que têm acção androgénica. Caso o hirsutismo permaneça
apesar do contraceptivo oral durante 6 meses, um fármaco anti-androgénico pode ser
associado, nomeadamente a espironolactona. Podem ser necessários 9-18 meses para
que o tratamento tenha efeito. 7,8
Técnicas diretas ou mecânicas de remoção do pêlo (incluindo a depilação a laser)
devem ser usadas, se o problema tiver muito impacto na pessoa em causa,
concomitantemente como tratamento cosmético.7,8

Referenciação
Devemos referenciar para consulta hospitalar de Endocrinologia se suspeita de uma
causa endócrina ou se hirsutismo moderado a grave.

Referências
1. Martin K, Anderson R, Chang RJ, Ehrmann D, et al. Evaluation and treatment of
hirsutism in premenopausal women: an endocrine society clinical practice
guideline. The Journal of clinical endocrinology and metabolism. April 2018,
103(4):1–25
2. Escobar-Morreale HF, Carmina E, Dewailly D, Gambineri A, Kelestimur F, Moghetti
P, et al. Epidemiology, diagnosis and management of hirsutism: a consensus
statement by the Androgen Excess and Polycystic Ovary Syndrome Society. Human
reproduction update. 2012;18(2):146–70.
3. Barbieri RL, Ehrmann DA. Pathogenesis and causes of hirsutism. In: UpToDate, Post
TW (Ed), UpToDate,Waltham, MA. 2015.
4. Mihailidis J. et al. Endocrine evaluation of hirsutism. International Journal of
Women’s Dermatology 3. 2017. S6 – S10
5. Hohl A. et al. Hirsutism: diagnosis and treatment. Arq Bras Endocrinol Metabol.
2014 Mar;58(2):97-107.

45
6. Barbieri RL, Ehrmann DA. Evaluation of premenopausal women with hirsutism. In:
UpToDate, Post TW (Ed), UpToDate, Waltham, MA. 2015.
7. Barbieri RL. Treatment of hirsutism. In: UpToDate, Post TW (Ed), UpToDate,
Waltham, MA. 2015.
8. Pasquali R. et al. Treatment of hirsutism in the polycystic ovary syndrome.
European Journal of Endocrinology. 2014. 170, R75–R90

46
Amenorreia
Ginecomastia

47
Galactorreia

Introdução
A galactorreia define-se como a secreção láctea da glândula mamária, fora do
puerpério (> 6 meses pós-parto na mulher não lactante).

Geralmente é causada pela perturbação na secreção da prolactina (PRL), mas nem


sempre corresponde a uma doença. A PRL é uma hormona secretada de forma pulsátil

48
pelas células lactotrófcas da hipófise anterior, que é essencial para o desenvolvimento
mamário e para a lactação.

É mais comum em mulheres dos 20 aos 35 anos, é geralmente bilateral e benigna.


Cerca de 20% das mulheres saudáveis, com níveis de PRL normal, têm galactorreia
isolada em algum momento da sua vida.

Deve ser diferenciada de:

- secreção purulenta (ex.: infeção);


- secreção serosanguinolenta (ex.: neoplasia);
- secreção verde ou mucosa (ex.: doença fibrocística);
- secreção sebácea (ex.: pseudo-secreção)

Etiologia
Idiopática  Diagnóstico de exclusão
(50%)

Fármacos  Antidepressivos ( SSRI, tricíclicos, IMAO)


 Ansiolíticos (Alprazolam, buspirona)
 Antipsicóticos (risperidona, olanzapina, haloperidol)
 Antihipertensivo (atenolol, metildopa, verapamil)
 Opiáceos (codeína, mordina)
 Antieméticos (metoclopramida, domperidona)

49
 Antihistamínicos (cimetidina, ranitidina)
 IBP (lansoprazol)
 Contracetivos orais de alta dosagem
 Ácido valpróico, isoniazida, danazol, sumatriptano,
octreotido…
Tumoral  Tumores hipofisários produtores de PRL (prolactinomas – 25%
dos casos)
 Tumores hipotalâmicos
 Tumor produtor de prolactina no pulmão ou rim
Fisiológica  Estimulação mecânica repetida, puberdade, neonatal

Doenças  Hipotiroidismo - o aumento da TRH estimula a secreção de


sistémicas PRL, quer diretamente, quer indiretamente através da
regulação da libertação de dopamina pelo hipotálamo.
 Insuficiência renal/insuficiência hepática – pela diminuição da
clearance da PRL
Outras Trauma ou cirurgia torácica (por um provável mecanismo de
estimulação

neuronal), sarcoidose, tuberculose..

Clínica
A galactorreia é geralmente bilateral, multiductal, leitosa, mas pode também ter
coloração amarelada ou acastanhada.

50
Abordagem diagnóstica

História clínica e Exame Físico


Assegurar que é secreção láctea Fármacos
Estimulação excessiva
Gravidez

estimulação do mamilo devem ser evitados 30 min antes de verificar os níveis de PRL

Abordar segundo a causa


Determinar níveis de Prolactina
Aos 0 e 20 min) – colheita não traumática e a 1 hora de qualquer alimento, manipulação ou desperta

Elevados

Normais

Hipotiroidismo
Doseamento TSH, creatinina, perfil hepático
Cirrose hepática
Insuficiência Renal

Tranquilizar
Excluir causas prováveis Tratar/Referenciar
Vigiar

Causa não identificada


Referenciar

 Pode existir galactorreia na presença de PRL normal e a hiperprolactinemia nem sempre é


acompanhada de galactorreia.
 A RMN será feita a nível hospitalar. Ter em atenção que se for normal, poderá ser feito o
diagnóstico de hiperprolactinemia idiopática. Mas, por vezes, os microadenomas de dimensões
muito reduzidas que não são visíveis na RMN são a causa da hiperprolactinemia idiopática.
 Quando um doente desenvolve galactorreia sem outra sintomatologia associada, os níveis de PRL
estão habitualmente normais. Perante níveis normais de PRL, ausência de dor/alteração mamária e
inexistência de incómodo no doente, este deverá ser tranquilizado, não sendo necessárias mais
avaliações, nomeadamente testes hormonais ou realização de RM cerebral. A galactorreia
normoprolactinémica não resulta de nenhuma doença.

51
Tratamento
Dose baixa de um agonista da dopamina se a galactorreia for incómoda para o doente.
Na presença de uma doença sistémica, o tratamento da patologia de base irá reverter
a hiperprolactinemia, como acontece por exemplo na hiperprolactinema associada ao
hipotiroidismo.

Referenciação
Os doentes devem ser referenciados para consulta hospitalar de Endocrinologia se for
colocada a hipótese de uma lesão intra-craniana e não existir uma causa aparente da
galactorreia quer pela anamnese, quer pelo exame físico, quer nos exames
laboratoriais ou se for necessário tratamento.

Referências
1. Evaluation and management of galactorrhea. American Family Physician. Volume
85, Number 11. June 1, 2012
2. http://www.fisterra.com/guias-clinicas/galactorrea. Acedido em 12/04/2019
3. Livro Endocrinologia São Joao
http://portobiomedicaljournal.com/content/uploads/maingallery/75_1470059297.
pdf

52
Síndrome do Ovário Poliquístico

Introdução

O Síndrome do Ovário Poliquístico (SOP) é uma endocrinopatia frequente em mulheres


em idade fértil, assumindo uma prevalência mundial de 5 a 10% nesta faixa etária. 2 É
fundamental que o diagnóstico seja precoce, quando surgem os primeiros sinais e
3
sintomas. Há um padrão familiar em alguns casos, o que pode sugerir um
componente genético da doença.

Manifestações clínicas

O hiperandrogenismo é a base do SOP. Como resultado desse hiperandrogenismo


surgem alguns sinais e sintomas que devem aumentar o grau suspeição, apesar da
sintomatologia ser muitas vezes inespecífica e algumas dessas queixas serem comuns
na adolescência.2

Principais manifestações clínicas do SOP


Hirsutismo Irregularidades menstruais
Acne Síndrome Metabólico
Alopécia
Tabela 7- Principais manifestações clínicas do SOP

- O hisutismo é considerado um marcador clínico de hiperandroginismo nas


adolescentes, visto que o acne é uma manifestação frequente nesta faixa etária.
Ocorre uma distribuição pilosa masculina, com aumento da frequência dos pêlos nos
lábios, mento, em torno dos mamilos e ao longo da linha alba.

- O acne tem tendência a ser exuberante e com sinais inflamatórios, sobre a forma de
pápulas e pústulas.

- A alopécia é predominantemente no vértice da cabeça, semelhante ao que se verifica


na alopécia masculina.

- As irregularidades menstruais são frequentes sob a forma de oligomenorreia e a


amenorreia secundária.

53
- O Síndrome Metabólico inclui diferentes fatores de risco cardiovasculares associados
a resistência à Insulina como a intolerância à glicose, hipertrigliceridemia, diminuição
do HDL, hipertensão arterial e obesidade central.

Embora se saiba que mulheres com SOP apresentem infertilidade, a ocorrência de


ovulações é documentada podendo ocorrer gestações espontâneas.

Devido à estimulação constante, a SOP é responsável pela maior parte das neoplasias
de endométrio que ocorrem em mulheres jovens, sendo a probabilidade de
desenvolver neoplasia de endométrio superior à da população geral.

Abordagem Diagnóstica

Figura 3- Fluxograma de atuação nos Cuidados de Saúde Primários

Abordagem clínica

A história clínica (incluindo antecedentes pessoais e familiares) e o exame objetivo


constituem a primeira abordagem na suspeita de síndrome de ovários poliquísticos. 1

- Estudo analítico: testosterona total, Sulfato de desidroepiandrosterona (DHEAS),


testosterona livre, 17-hidroxiprogesterona, prolactina, TSH, FSH, LH e estradiol.
Este estudo deverá ser realizado em fase folicular, idealmente entre o 3 e 5º dias do
ciclo e com suspensão de contraceção hormonal nos 3 meses anteriores. A glicemia em
jejum e o perfil dislipidémico devem ser igualmente avaliados.
- Ecografia endovaginal: ovário aumentado e policístico.

54
Tratamento
O tratamento do SOP baseia-se fundamentalmente na sintomatologia apresentada, na
prevenção de alterações metabólicas e na redução de fatores de risco
cardiovasculares.6

Contraceção hormonal Antiandrogênios Antidiabético se necessário


combinada (Espironolactona e (Metformina)
Ciproterona)

Progestativos Cuidados cosméticos dieta equilibrada e


exercício físico moderado
Tabela 8- Opções terapêuticas do SOP

Com o tratamento é expectável que ocorra uma regularização dos ciclos menstruais,
diminuição do volume e distribuição pilosa, acne e outras manifestações androgénicas.
O benefício é aparente por volta dos 6 meses de tratamento.

Referências
1. Merino PM, Codner E, Cassoria F. A rational approach to the diagnosis of polycystic
ovary syndrome during adolescence. Arq Bras Endocrino Metabo 2011; 55(8).
2. Shannon M, Wang Y. Polycystic Ovary Syndrome: A Common But Often
Unrecognized Condition. Journal of Midwifery and Women’s Health 2012; 57: 221-
230.
3. Franks S. Polycystic ovary syndrome in adolescents. International Journal of Obesity
2008; 32: 1035-1041.
4. Bekx MT, Connor EC, Allen DB. Characteristics of Adolescents Presenting to a
Multidisciplinary Clinic for Polycystic Ovarian Syndrome. J Pediatr Adolesc Gynecol
2012; 23:7-10.
5. Diamanti-Kandarakis E. PCOS in adolescents. Best Practice and Research Clinical
Obstetrics and Gynaecology 2010; 24:173-183.
6. Ornstein RM, Copperman NM, Jacobson MS. Effect of Weight Loss on Menstrual
Function in Adolescents with Polycystic Ovary Syndrome. J Pediatr Adolesc Gynecol
2011; 24: 161-165.

55
Patologia hipofisária
Indidentalomas hipofisários
Hiperprolactinémia

Patologia da suprarrenal
Incidentaloma da suprarrenal

56
Hipertensão Arterial – Causas Secundárias

Introdução

Na maioria dos casos de Hipertensão Arterial (HTA), não é possível identificar uma
etiologia clara, sendo a hipertensão classificada como primária ou essencial. Uma
causa específica, potencialmente reversível, de elevação da pressão arterial (PA)
poderá ser identificada numa proporção reduzida de adultos com HTA (entre 5 a 10%
dos hipertensos adultos). Se corretamente diagnosticados e tratados, os indivíduos
com uma forma secundária de HTA poderão ser curados, ou, pelo menos, apresentar
melhoria no controlo da PA e redução do risco cardiovascular. 1,2

Abordagem Clínica

Avaliação inicial do doente com HTA


Todos os indivíduos com diagnóstico de HTA deverão realizar um rastreio inicial
simples de formas secundárias de hipertensão, baseado na história clínica, exame
físico e exames laboratoriais.1 No final deste capítulo é fornecido um fluxograma sobre
a abordagem clínica do doente com suspeita de HTA de causas secundárias.

História clínica detalhada, incluindo:


o Revisão de hábitos alimentares, alcoólicos e medicamentosos (ex.
contraceptivos orais, anti-inflamatórios, determinados anti-depressivos,
esteróides como a Prednisona, entre outros)
o Avaliação de Fatores de Risco Cardiovascular

Exame físico dirigido


o Avaliação de sinais ou sintomas de HTA secundária (ver quadro II)

57
Exames Complementares de diagnóstico
o Hemograma, glicose, ácido úrico*, perfil lipídico, creatinina, ionograma e
TSH
o Exame sumário de urina
o ECG e radiografia do tórax*

(*) Avaliação de necessidade caso a caso

Etiologia
A prevalência de HTA secundária e as etiologias mais comuns variam de acordo com
grupos etários (Quadro I):

Quadro I. Causas mais frequentes de hipertensão secundaria, por escalão etário

PERCENTAGEM DE
GRUPOS ETÁRIOS CASOS DE HTA COM ETIOLOGIAS MAIS FREQUENTES †
CAUSA 2ª *

Disfunção tiroideia
Adultos jovens (19- Estenose da artéria renal associada a
5%
39 anos) displasia fibromuscular
Doença parenquimatosa renal

Hiperaldosteronismo
Disfunção tiroideia
Adultos
8-12% Síndrome Apneia Sono
(40-64 anos)
Síndrome Cushing
Feocromocitoma

Estenose artéria renal aterosclerótica


Idosos
17% Insuficiência renal
( >65 anos)
Hipotiroidismo

Adaptado de Vieira AJ, Neutze DM - Diagnosis of Secondary Hypertension: An Age-Based Approach,


American Family Physicinan 2010
* Excluindo causas dietéticas e medicamentosas e o fator de risco obesidade

58
† Listagem de acordo com ordem de frequência aproximada; categorias não absolutas, podendo existir
sobreposição de causas entre grupos

Quando suspeitar de hipertensão arterial secundária?


 Idade de início < 40 anos em indivíduos não obesos, de raça não negra e sem
história familiar de HTA;
 Início súbito da HTA, agravamento súbito da pressão arterial em doentes
hipertensos com PA prévia estável, ou HTA acelerada (PA > 180/110 mmHg com
sinais de edema da papila e/ou hemorragia retiniana);
 História ou sintomatologia sugestiva de uma causa secundária (história de
Síndrome da Apneia do Sono, flushing facial no feocromocitoma e/ou palpitações,
sudação, cefaleias);
 Resposta reduzida ao tratamento farmacológico ou HTA resistente (quando uma
estratégia terapêutica que inclui medidas adequadas de alteração de estilo de vida
+ 3 hipertensores de classes diferentes em doses adequadas, sendo um deles um
diurético em dose máxima, falha na descida da PA para valores < 140/90 mmHg);
 Lesão de órgão-alvo desproporcional à duração da HTA;
 Avaliação inicial do doente hipertenso com achados sugestivos de HTA
secundária.

Apenas nestes casos deverão ser investigadas causas secundárias específicas de HTA.
Não é necessário pesquisar sistematicamente todas as doenças secundárias, e a
procura deve ser dirigida em função do doente (Quadro II em anexo).

Referenciação

Recomenda-se a referenciação dos pacientes à consulta de Endocrinologia após o


diagnóstico e tratamento sintomático da HTA de causa secundária.

Referências
1. Vieira AJ, Neutze DM. Diagnosis of Secondary Hypertension: An Age-Based
Approach. American Family Physician 2010; Vol 82, Num 12: 1471-8

59
2. European Society of Hypertension (ESH)/European Society of Cardiology. 2013
ESH/ESC Guidelines for the management of arterial hypertension. Journal of
Hypertension 2013, 31: 1281-1357
3. Norma da Direcção Geral da Saúde – Abordagem terapêutica da Hipertensão
Arterial – nº 026/2011

60
Quadro II: Indicações clínicas e exames complementares de diagnóstico na investigação de causas secundárias de HTA

INDICAÇÕES CLÍNICAS
DIAGNÓSTICO
HISTÓRIA CLÍNICA EXAME FÍSICO ECD

História de ITU ou
Massas Presença de 1ª linha: ecografia renal
Doença obstrução, hematúria,
abdominais proteínas, eritrócitos
parenquimatosa abuso de analgésicos
(doença renal ou leucócitos na Confirmação: investigação detalhada de doença
renal História familiar de
poliquística) urina; redução da TFG renal
doença poliquística
Displasia fibromuscular: Diferença de
início em idade jovem (+ tamanho > 1.5 cm
++ mulheres) entre os rins, rápida
Estenose aterosclerótica: deterioração da
1ª linha: ecografia renal com doppler
Hipertensão início agudo, função renal
renovascular agravamento súbito ou Sopro (espontânea ou em
(Realização em CSS)
(estenose artéria controlo da HTA abdominal resposta a
Confirmação: angiorressonância, angio-TC,
renal) progressiva/ mais difícil; antagonistas do SRAA;
angiografia
episódios recorrentes de aumento do valor de
edema agudo do pulmão creatinina sérica ≥ 0.5
não explicados por outra a 1 mg/dL após início
causa de IECA/ARA)
Fraqueza muscular;
Hipocaliemia (Realização em CSS)
história familiar de HTA
Arritmias (espontânea ou 1ª linha: níveis de renina e aldosterona, cálculo do
Aldosteronismo em idade jovem e
(se hipocaliemia induzida por ratio aldosterona/renina em condições standard
primário eventos
grave) diuréticos) (correcção da hipocaliemia e suspensão de
cerebrovasculares <40
Massa suprarenal antagonistas do SRAA)
anos

61
HTA paroxística ou crise
hipertensiva em doente Estigmas
(Realização em CSS)
com HTA sustentada (PA cutâneos de
1ª linha: metanefrinas fraccionadas em urina de
lábil); flushing, cefaleias, neurofibromato Massa glândula supra-
Feocromocitoma 24h ou metanefrinas plasmáticas
palidez, palpitações, se (manchas renal
Confirmação: TC ou RM pélvica entre outros
hipersudorese, síncope café-com-leite,
exames de imagem; estudo genético
História familiar de neurofibromas)
feocomocitoma
Obesidade
central, face lua-
cheia,
hirsutismo, 1ª linha: excreção urinária de cortisol em urina de
Ganho de peso rápido,
estrias de cor 24h
Síndrome de poliúria, polidipsia,
avermelhada ou Hiperglicemia
Cushing perturbações
violeta, Confirmação: teste de supressão com
psicológicas
deposição de dexametasona
gordura na
região posterior
do pescoço
Coartação da Diferença (Realização em CSS)
aorta acentuada da RM
PA entre os 2
membros
superiores
Pulsos femorais
ausentes ou
com delay

62
Sopro
Bradicardia/
Taquicardia
Intolerância ao frio/calor Hipotiroidismo:
Obstipação/diarreia elevação da PA
Patologia
Irregularidades diastólica TSH
tiroideia
menstruais, menorragias Hipertiroidismo:
ou amenorreia elevação isolada
da PA sistólica

Episódios de apneia
Síndrome Apneia durante o sono (Realização em CSS)
Sono Sonolência diurna Polissonografia
Roncopatia
Adaptado de ESH/ESC Guidelines for the management of arterial hypertension, 2013 e Adaptado de Vieira AJ, Neutze DM - Diagnosis of
Secondary Hypertension: An Age-Based Approach

Siglas/Acrónimos: CSS – Cuidados de Saúde Secundários; ECD - Exames Complementares de Diagnóstico; ITU – Infecções do trato urinário; TGF
– Taxa de Filtração Glomerular; HTA – Hipertensão arterial; PA – Pressão Arterial; IECA – Inibidores da enzima conversora da angiotensina; ARA
– Antagonistas do receptor da angiotensina;
TC – Tomografia Computadorizada; SRAA – Sistema Renina/Angiotensina/Aldosterona; RM – Ressonância Magnética

63
Fluxograma
Hemograma
Glicose
Verificar precisão das medições da PA Perfil lipídico
Creatinina
Excluir elevação da PA secundária a erros Ionograma
alimentares, fármacos/drogas TSH
SU2
ECG
Radiografia do
História clínica, exame físico e testes laboratoriais tórax*
Ácido Úrico*

Pistas clínicas Sem pistas clínicas, suspeita de HTA 2ª mantém-se

Ver Quadro II

Adulto jovem Adulto Idoso

Ecografia renal Ecografia renal


com doppler com doppler
TSH* TSH*
Análise sumária
Ecocardiograma de urina*

Referenciação para Cuidados de Saúde Secundários

Figura 1: Fluxograma de abordagem inicial de doentes com suspeita de Hipertensão


arterial secundária
(Adaptado de Vieira AJ, Neutze DM - Diagnosis of Secondary Hypertension: An Age-
Based Approac, American Family Physician 2010)
*Se não realizada no estudo inicial
Nota: a linha a tracejado indica a necessidade de considerar estudos adicionais caso
não tenha sido identificada uma causa e persista a suspeita de HTA 2ª

64

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