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THYMELI ESCOLA DE TEATRO, MÚSICA E DANÇA

A FÉ CÊNICA E VISUALIZAÇÃO INTERNA EM “A COR PÚRPURA”

Adailton dos Santos Junior


5N
Curso Técnico em Teatro Musical
Professora Mestre Fernanda Camargo

Abril de 2020
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INTRODUÇÃO
Baseado no livro e longa metragem de mesmo nome, o musical “A Cor
Púrpura” conta a história da vida de Celie, uma mulher afro-americana que mora no
sul dos Estados Unidos com sua irmã Nettie e seu pai, que abusa dela. Depois de
ser forçada pelo seu pai a casa com o repugnante Sr. Albert Johnson, a vida de
Celie começa a piorar: ela é proibida por seu marido de ver sua irmã, iniciando um
momento de solidão na vida da mulher que começa procurar companhia,
principalmente de Deus.

Sendo um musical da Broadway, podemos esperar desse musical um cenário


impecável, grande, uma boa iluminação e bons figurinos. Porém, mesmo com toda a
excelente produção, nenhum elemento cenográfico consegue cumprir o papel do
ator de viver e apresentar uma personagem. Para que seu trabalho possa ser
cumprido, é necessário o uso de técnicas, desde corporais a vocais. Nesse trabalho
dissertar sobre duas técnicas entrelaçadas: a visualização ativa e a fé cênica no
trabalho do ator segundo os pensamentos de Stanislavski.
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DESENVOLVIMENTO
Por anos na história do teatro não houve uma forma de estudo ou método
para as artes dramáticas, em especial, o realismo. Foi apenas no século XIX que, na
Rússia, o ator, diretor, pedagogo e escritor, Constantin Stanislavski através de
relatos do seu processo como ator e diretor, criou algo semelhante a um método de
interpretação para atores.

Algo que o escritor da bastante ênfase é que o trabalho do ator consiste em


convencer o público de uma verdade, sendo essa verdade, a da realidade e lógica
do personagem. Uma grande frase dele é: “A arte dramática é a capacidade de
representar a vida do espírito humano em público e em forma estética”, em outras
palavras, o ator deve representar seu personagem como se ele o mesmo fosse ele
ali, em vida. A crença do ator em seu personagem é chamada por Stanislavski de fé
cênica, ou seja, o acreditar que sua personagem é você, utilizando do artifício
trazido pelo ator Eugênio Kusnet em seu livro “Ator e Método”, o mágico Se Fosse.

Nisso surge a teoria do convencimento, sendo o ato de convencer, a chave do


trabalho do ator. O ator deve acreditar naquilo que está fazendo para que assim
possa convencer seu público, fazendo com que o espectador acredite também
naquela história.

A fé cênica acaba gerando também outro fator no trabalho da interpretação: a


visualização interna. A visualização é o simples fato de enxergar algo em cena que
não está ali, mas habita a realidade do personagem ou o imaginário do ator. Um
claro exemplo visto no musical. Um bom exemplo desse conceito que é usado na
peça em questão é visto logo no começo quando Cellie tem seu filho. A criança é
representada por um longo tecido vermelho. A principio, pelo signo usado, o
espectador pode acreditar que a personagem sofreu um aborto (pela cor remeter ao
sangue), porém pelo olhar da irmã de Cellie, Nettie, que realiza o parto,
conseguimos enxergar a criança nos braços dela.

O trabalho de visualização é extremamente importante para que assim gere


um convencimento de sua personagem, assim sendo atrelada bastante a fé cênica.
Um ator que não visualiza, que simplesmente não acredita no que o personagem
está enxergando, acaba entregando uma atuação frágil e fazendo com que o público
não compre o seu trabalho.
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Outro momento é quando a personagem Sofia apanha por policiais e é presa.


A atriz é vestida com algo semelhante a um saco de batata e posta no centro do
palco. Embora não haja grades nem nada que remeta a prisão, o olhar de Cellie
(que entra em cena para visitar a amiga) e o trabalho corporal da atriz que interpreta
Sofia conseguem construir a atmosfera da cena e fazer com que o público não só
enxergue o cenário, mas também o sinta.

Mesmo aqui apresentando momentos onde a visualização é utilizada para


artifícios físicos, ela também pode ser utilizada para criação de atmosferas (como
visto um pouco no elemento anterior) e também para questões psicológicas, como
visto na música “I’m Here”, interpretada pela personagem Cellie. Na música, Cellie
passa, de forma simbólica por toda sua vida e agradece a si mesma e ao universo
por simplesmente estar ali. Durante a música, através da visualização da atriz,
conseguimos enxergar, através do olhar, a trajetória feita pela personagem para
chegar ao final e se empoderar do seu discurso.
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CONCLUSÃO

A fé cênica é um elemento da interpretação do ator que o faz acreditar nas


circunstâncias propostas da personagem, fazendo o espectador também acreditar
na realidade que o ator propõe. Ao crer na realidade do personagem, o ator acaba
por realizar a chamada visualização interna, ator de visualizar com o olhar do
personagem algo que não está presente no espaço físico, mas sim no intelecto do
ator.

Embora A Cor Púrpura nos traga elementos cenográficos grandes, figurinos e


iluminação, a visualização ativa se faz necessária ao compor a cena trazendo
verdade e fé cênica para o personagem em momentos onde uma linguagem
simbólica é optada pela direção. Além disso, nessa peça, ela consegue nos mostrar
a trajetória de personagens, principalmente em suas músicas que funcionam quase
como devaneios. Assim, a fé cênica e visualização ativa, elencados por Stanislavski
no séc. XIX continuam sendo artifícios necessários para a composição de uma
personagem pelo ator, se mostrando ferramentas imprescindíveis para que o fazer
teatral possa ser realizado com sucesso.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Knebel, Maria. Análise-ação: Práticas das Ideias Teatrais de Stanislavski.
Editora 34, São Paulo, 2016

KUSNET, Eugênio. Ator e método. Serviço nacional de teatro, 1975,Rio de Janeiro

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