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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

SEBENTA DE DIREITO ADMINISTRATIVO III

DANIEL VIEIRA LOURENÇO

LISBOA

2019

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

PLANO DE ESTUDOS

TEMA BASE: (in)Sustentabilidade da Contratação Pública

⎯ Resenha Histórica e Evolução Legislativa no Âmbito da Contratação Pública;

⎯ Âmbito de Aplicação do Código dos Contratos Públicos;

⎯ Procedimentos de Formação dos Contratos;

⎯ Execução dos Contratos Públicos;

⎯ Contratos em Especial;

⎯ Governança da Contratação Pública;

AVALIAÇÃO:

⎯ Teste;

⎯ Participação nas Aulas;

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PARTE I
NOÇÕES INTRODUTORIAS

1. APROXIMAÇÃO AOS CONTRATOS PÚBLICOS

No contexto do século XIX, numa lógica liberal, foram celebrados uma série de
contratos de concessão de obras públicas. Num contexto pós-guerra foram celebrados
vários contratos de empreitada (reconstrução). Numa lógica de estado intervencionista, os
Estados assumiram através da empreitada de obras publicas, o pagamento da obra.
Nos anos 80 há sinais de mudança, sinais de viragem do ponto de vista das tarefas
assumidas pelo Estado, o modelo de relação entre o Estado e o privado e essas mudanças
têm repercussões nos tipos de contratos. O Estado social entra em crise. No caso
português, podemos relembrar as revisões constitucionais com vista a abrir às
privatizações, lógica de reestruturação da administração pública. O Estado tornou-se
ineficiente, cresceu de mais.
Ao mesmo tempo que há um repensar da estrutura da administração pública, do
ponto de vista dos contratos temos várias implicações. Por exemplo, a redescoberta das
concessões. No caso português, nos anos 90, celebram-se uma séria de concessões de
obra pública (EXPO 98, Ponte Vasco da Gama). Em bom rigor, ao longo do século XX,
durante o Estado novo, já tinha existido a concessão de obra pública.
Transferia-se para o privado, o encargo de concessão da obra, uma transferência
de risco. Nos anos 90, séc. XX, o particular assume o risco. Esse risco, em muitos casos,
não foi tao grande quanto isso. Depois de 2012 houve a renegociação das concessões dos
anos 90 e 2000. Em bom rigor, as concessões dos anos 90 são PPP. Ou seja, contratos de
concessão mas associados a outros contratos. Que contratos? Eram contratos, por
exemplo, financeiros, com a banca para suportar a concessão. Não são os concessionários
que à moda do séc. XIX vão pagar do seu bolso.
Um outro aspeto, é o sinal exterior que estas construções não eram iguais às do
séc XIX. No séc. XIX o concessionário construía do seu bolso e depois pagava-se através
das portagens, por exemplo. Sinal exterior que isto era diferente foi que as auto-estradas

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para o utente – SCUTs – sem custos para o utilizador. Se os utilizadores não pagavam
portagem, quem suportou os custos? Estamos a falar de portagens virtuais.
Em termos europeus também houve esta redescoberta.
As compras publicas também foram variadas, houve um crescimento notório. As
administrações vão comprando cada vez mais bens. Associada à reestruturação da
Administração Pública, a Administração teve que emagrecer, tinha crescido muito e era
necessária eficiência e uma nova estrutura. Do ponto de vista dos contratos, o Estado
querendo ter menos serviços na logica institucional pública, celebrou cada vez mais
contratos tendo a vista a transferência para o privado as tarefas do Estado (contratos de
prestação de serviços – jardinagem, escolas, etc.). Também nesta fase, celebram-se cada
vez mais contratos, diversificando-se o tipo de contratos.
Dos anos 80 em diante, para além destes contratos de colaboração, cada vez mais
há contratos substitutivos de atos administrativos (contratos de atribuição) – substitui-se
um ato administrativo por um acordo com um particular. São contratos públicos,
contratos que substituem atos administrativos. se são contratos públicos em Portugal há
um código mas não há praticamente nada sobre isto, remete-se para o CPA. De remissão
para remissão muito se perde. É uma área bastante problemática porque está em causa a
negociação com particulares, uma zona bastante sensível do ordenamento jurídico.

2. DIREITO EUROPEU DOS CONTRATOS PÚBLICOS


O Direito Português, nesta matéria, é marcado profundamente pelo Direito
Europeu. O CCP foi revisto em 2018 e surgiu em 2008 pela primeira vez, de facto, na
sequência da transposição das diretivas de 2004. As diretivas de 2014 foram transpostas
através da revisão de 2018.
O CCP trata de muitíssimos outros aspetos que não estão nas diretivas mas há
uma ligação muito estreita com as diretivas.
Existem alguns marcos fundamentais na transposição destas diretivas. Convém
perceber o fio condutor em termos europeus, a ratio das diretivas. Utilizando o mote da
sustentabilidade, estas diretivas mais recentes utilizam este mesmo mote.
As primeiras diretivas surgiram nos anos 60 e não se falava ainda em
sustentabilidade. As diretivas apareceram nos anos 60 (1961/1962), Portugal não estava

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ainda na União Europeia, estamos em pleno Estado Novo, quando falamos aqui falamos
em Europa, falamos na CEE inicial (Tratado de Roma – 1957). Falamos no contexto da
Europa dos 6 e estamos muito próximos do Final da Segunda Guerra, estamos perante
uma Europa destruída, estamos no pós-Segunda Guerra. Os primeiros problemas tratados
pelas diretivas são as de empreitada, as instancias europeias preocuparam-se em regular
as empreitadas de obras públicas, eram os contratos mais celebrados na altura. Com o quê
que se preocupou? Estabelecer regras, impor regras aos Estados no procedimento de
escolha do empreiteiro. Isso explica que a primeira diretiva seja sobre ordens publicas e
que se preocupe com procedimento pré-contratual (procedimentos a seguir para escolher
com quem se celebrava o contrato). Estamos na altura forte do Estado social. Invocam-se
os princípios do Tratado de Roma, a grande preocupação é a construção de um mercado
único, impor e estimular as liberdades, acabar com as barreiras. Em nome dessas
liberdades e da concorrência (entre os operadores económicos dos vários Estados da
CEE) os Estados tinham uma obrigação de abrir concurso público à escala europeia
(Europa dos 6), não poderia haver uma escolha simplesmente tendo como critério o país.
Havia uma aceitação da concorrência dos operadores económicos dos vários países. Estas
diretivas foram utilizadas como um instrumento importantíssimo para obrigar a abertura
dos Estados e para aceitarem empreiteiros de diferentes países.
Quando se diz obrigar os Estados ou entidades públicas, falamos das entidades
clássicas (Estados, autarquias, etc.).
Estas diretivas tinham regras de procedimento pré-contratual e relativamente
poucas.
O que interessa salientar, essencialmente, são os contratos que preocuparam a
Europa, que Entidades estão sujeitas a estas diretivas aquando da celebração e que regras.
Inicialmente existiam poucas regras, essencialmente procedimentais.
Quanto aos contratos, primeiro foram as empreitadas, depois, os Estados
preocuparam-se com as compras, aquisições de bens, compras públicas e, já nos anos 70,
aquisições de serviços (prestações de serviços). A Europa preocupou-se com
relativamente poucas espécies de contratos mas, sem duvida, os mais relevantes. Na
transição do milénio, houve uma acrescida preocupação coma as concessões. Quando se

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prepararam as diretivas de 2004 existiram grandes discussões. Só surge pela primeira vez
uma diretiva para concessões em 2014, que até deu direito a uma diretiva especial.
O ritmo das diretivas, de 10 em 10 anos há um pacote de diretivas, que respeitam
sempre o seu contexto histórico e as necessidades sentidas.
Nos anos 60 a preocupação foi com as obras publicas (reconstrução das cidades);
depois as compras e mais tarde as concessões. As concessões começaram a ser objeto de
regulação do direito europeu. Já em 2000 o TJUE se pronunciou sobre saber se as
concessões estavam ou não submetidas ao Direito Europeu. O acórdão Telaustria veio
retirar dos Tratados da UE implicações para a celebração de contratos de concessão na
Europa. O Direito Europeu dos contratos públicos começa nos princípios que estão nos
Tratados e dai retira implicações. Porquê em 2000? Os anos 80/90 correspondem a um
paradigma de grande mudança para a Administração Pública, as Administrações Públicas
vão redescobrir as concessões e vão passar a celebrar vários contratos de concessão, por
exemplo, de obras públicas.
Qual era a consequência antes do acórdão? Em Portugal, como nos outros países,
uma das consequências de se aceitar a concessão em vez da empreitada seria a não
aplicação do direito europeu, visto que não havia regulação jurídica seria aplicado o
Direito Nacional. Não havia uma sujeição a diretivas europeias porque, efetivamente, não
havia, cada um dos Estados celebravam esses contratos de acordo com as regras
nacionais. basicamente isto significavam que os Estados podem escolher livremente
Entidades Nacionais para a feitura dessas obras (o procedimento pré-contratual seria a
principal preocupação das diretivas, nomeadamente, o mercado único). Acaba por ser o
jogo do gato e do rato, Estados fogem aos contratos regulados nas diretivas para
escolher entidades nacionais. TJUE acaba com a brincadeira vem obrigar à aplicação
dos princípios basilares da livre concorrência e da igualdade de tratamento.
Quanto à segunda linha de evolução, trata-se das entidades previstas no Direito
Europeu. Que entidades ficam sujeitas? Nos anos 60/70 (Estado social) as entidades que
celebram contratos públicos correspondem à Administração orgânica em sentido clássico
(pessoas coletivas de Direito Público) – entidades organicamente públicas.
Nos anos 80, começamos a assistir às transformações da Administração Pública –
entidades públicas transformam-se em entidades sob forma de direito privado. Nos finais

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dos anos 80, uma das consequências, do ponto de vista da contratação publica,
nomeadamente dos regimes europeus, seria a inaplicabilidade do Direito Europeu, teria
de existir uma sujeição às regras da contratação pública. A própria natureza das
transformações da Administração também tiveram consequências nos regimes da
contratação pública no âmbito de aplicação. Nos anos 90 vai consagrar-se que,
independentemente do nome, da designação, são estabelecidos um conjunto de critérios –
organismos de direito público (podem ser pessoas coletivas de direito privado) – que
abarcam estas novas entidades.
Nos anos 90 aparece também uma nova diretiva sobre os sectores especiais.
Porquê? Até aos anos 90 certos setores ficavam excluídos, a partir deste momento esses
setores passam a ser regulados. Esses setores são setores como o da energia, águas,
transportes e serviços postais. São setores económicos bastante relevantes. Isto cruza as
duas linhas de evolução (objetivo e subjetivo/ que contratos e que entidades). Na diretiva
dos setores especiais há uma evolução interessante sobre as entidades; há um alargamento
para verdadeiras entidades privadas, um alargamento das entidades sujeitas ao direito
europeu dos contratos públicos na medida em que atuem nos setores especiais. Como
quando chegamos aos anos 90 já estamos na Europa das privatizações e há um conjunto
de variedades a desempenhar tarefas de serviço público (fornecimento de água, energia,
etc.) essas entidades também vão, em parte, estar sujeitas a essas regras, ainda que sejam
menos exigentes.
Quando chegamos a 2014 temos:
⎯ 3 diretivas sobre setores clássicos, setores especiais e concessões;
⎯ Diretiva Recursos – garantias no âmbito da contratação publica;
Esta ultima diretiva prende-se com a terceira via de evolução. Qual é o conteúdo
das diretivas? Qual a preocupação? Nos anos 60 são muito minimalistas, aparecimento
de regras de procedimento pré-contratual, regras sobre a celebração de contratos e
escolha daquele com quem se devia celebrar contratos públicos. Desta perspetiva
europeia, o que se pretende é abolir barreiras, impor liberdades económicas (CEE),
construção do mercado único, obrigar à abertura de procedimento à escala europeia, não
criar entraves ao principio da concorrência. Será que deve ser essa a preocupação atual
em termos europeus? O quê que é importante hoje no âmbito dos contratos públicos?

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Podemos ler as diretivas atuais à luz do fundamento e opções das primeiras diretivas?
Ou há uma lógica de futuro e uma necessária alteração da reflexão das escolhas
europeias sobre estas matérias?
Em 1989 surge a primeira Diretiva Recursos. A Europa chegou à conclusão que
havia pouca eficácia do Direito Europeu nesta matéria, não havia mecanismos de
verificação de incumprimento das diretivas. A Diretiva Recursos procurou impor aos
Estados membros mecanismos de garantia do cumprimento dessas regras. O Direito
Europeu passou a ter como preocupação a garantia do cumprimento das regras impostas
aos diversos contratos.
As diretivas assumem claramente o lema da sustentabilidade, a ideia de outras
finalidades que não as tradicionais a justificar os regimes da contratação pública. As
preocupações mudaram, tratamos sobretudo de preocupações ambientais, sociais. Os
regimes da contratação publica devem prosseguir esses fins. Estas diretivas, pela primeira
vez, têm regras sobre a execução dos contratos, já não se trata apenas do procedimento
pré-contratual.
A questão que se coloca hoje é a de olhar para as diretivas atuais e ver se existem
ou não sinais de mudança e quais esses sinais. Temos desde 2008 um Código dos
Contratos Públicos, anteriormente a esta data tínhamos apenas diplomas legais dispersos.
A partir dos anos 80 aos diplomas sobre empreitadas de ordem publica foram sendo
adicionados outros diplomas sobre despesa pública, a celebração de contratos implica
despesa pública.
Em termos de relação entre Portugal e a UE, entramos nos anos 80; nos anos 90,
pela primeira vez, há transposição de diretivas sobre esta matéria para o ordenamento
jurídico português.
Verdadeiramente, só as diretivas de 2004 foram totalmente transportas com o
CCP. As de 2014 foram transpostas mediante a revisão do CCP. Estes dois pacotes de
diretivas foram transpostos mediante a feitura e revisão do Código.

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3. NOVOS PARADIGMAS NO DIREITO EUROPEU DOS CONTRATOS


PÚBLICOS – o que muda nos regimes jurídicos e intenção do legislador
O ponto de contacto é sempre a transposição. O Código de 2008 foi feito a
pretexto da transposição das diretivas de 2004. O Código tem muitos aspetos de
dissonância.
A primeira diferença é o âmbito de aplicação. O Código trata de todos os contrato
das entidades públicas, tem uma vocação muito mais abrangente, quando comparado com
as diretivas. Todavia, no Direito Europeu, o TJUE tem alertado que o Direito Europeu
não se reduz às diretivas.
Em sentido contrário, se o CCP parece muito ambicioso e abrangente, como se
verá, relativamente ao âmbito de aplicação, há imensas exceções; o próprio CCP começa
por excluir do seu âmbito variados contratos.
A opção de se fazer um Código não foi original. Por exemplo, em França havia
Código desde os anos 60. Este é um dos aspetos que explica a dificuldade em fazer o
Código. Legislador pretendeu tratar de tudo e teve dificuldade em gerir a transposição
escrita e aquilo que iria mais longe das diretivas.
O legislador procurou Codificar. Em cada uma das partes do Código há uma serie
de artigos redigidos de forma extremamente complexa, por ter sido criada uma mistura
entre as exigências europeias e as soluções portuguesas.
As diretivas de 2004 invocaram a necessidade de flexibilizar procedimentos. As
diretivas procuram simplificar, desburocratizar. Sempre que o legislador nos preâmbulos
invoca estas necessidades, olhamos para o texto legislativo e temos 500 artigos recheados
de problemas e complexidades, escrito de uma forma incompreensível, é um labirinto
jurídico do ponto de vista do âmbito de aplicação, procedimento, logística.
A regra geral do concurso publico desapareceu. Em nome da transposição das
diretivas europeias (principio da concorrência) conseguiu fazer as regras do concurso
público. Estabeleceu um principio de alternatividade entre concurso publico, concurso
limita e ajuste direto. Como é que podem ser alternativos? Até se falava, na altura, uma
liberdade de escolha da Administração.
Outro lema das diretivas de 2014 foi a da inovação. As diretivas surgem em pleno
período de crises e a necessidade de revitalizar a economia europeia estava muito em

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voga. Estas diretivas surgiram em nome da inovação, aparecem nos programas da Europa
2020. Não é possível dizer-se que há flexibilização, igualdade, inovação sem perceber o
contexto em que isso surge e sem tirar consequências. A estratégia Europa 2020 surgiu
como fomento à igualdade, sustentabilidade, ideia de para superar as crises económicas e
sociais devem ser promovidas politicas públicas Europeias mas pautadas por estes
objetivos. O interessante é ver como é que os contratos públicos podem/devem, a
celebração deve servir para promover politicas pulicas pautadas por estes objetivos.
Quando uma entidade pública compra mesas, compra em grande escala, há um
significado para o dinheiro publico, a provocação será a de levar as entidades publicas a
ter de consciência de que quando escolhem as tal mesas, as escolhas devem ser pautadas
por estas lógicas, não está em causa apenas a compra das mesas mas também a de
conseguir.

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PARTE II
ATIVIDADE CONTRATUAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – breve síntese e
panorama geral

1. A ATIVIDADE CONTRATUAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Uma forma de atuação administrativa que tem vindo a adquirir uma importância
crescente é o contrato administrativo. Com efeito, é cada vez mais frequente a
Administração Público, para prosseguir os fins de interesse público, procure a
colaboração dos particulares, acordando com estes a complexificação da própria
administração.

A utilização da via contratual pela Administração Pública pode traduzir-se na


utilização de 2 tipos de contratos, cfr. art.200.º/1 CPA:

⎯ Se está a exercer atividades de gestão privada, lançará mão de um contrato


civil, de trabalho ou comercial;

⎯ Se está a exercer atividades de gestão pública, lançará mão do contrato


administrativo

2. A PSEUDO-DISTINÇÃO ENTRE CONTRATOS ADMINISTRATIVOS E


CONTRATOS DA ADMINISTRAÇÃO

São contratos administrativos todos os contratos que, à luz do direito


administrativo, criem, modifiquem ou extingam relações jurídicas administrativas.

São contratos públicos os contratos celebrados pela Administração Pública, quer


sejam regulados pelo Direito Administrativo, quer a lei os submeter a um especial
procedimento de formação.

Assim, quase todos os contratos administrativos são públicos, nem todos os


contratos públicos são administrativos, pois há contratos de direito privado celebrados
pela Administração.

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2.1. A “contratualização” da atividade administrativa

A importância do contrato administrativo decorre, desde logo, do seu âmbito de


aplicação, ou seja, dos tipos contratuais admissíveis e das condições em que a
Administração, para prosseguir as suas atribuições, pode recorrer à via contratual.

Quanto ao conceito de contrato administrativo, passamos de uma enumeração


taxativa, para um sistema de cláusula geral.

Acresce que o recurso à via contratual passou a ser admitido genericamente,


mesmo como alternativa à prática de atos administrativos ou à celebração de contratos de
direito privado.

Se não existir nenhuma disposição legal que proíba expressamente ou


implicitamente (através da imposição do ato administrativo) o recurso à figura do
contrato administrativo e se, por outro lado, a natureza da relação a estabelecer for
compatível com tal forma de atuação, a Administração pode utilizar o módulo contratual

Assim, o contrato administrativo é um modo de exercício da função


administrativa. Logo, o respetivo regime é traçada pelo Direito Administrativo. Nesse
sentido, segundo o Professor FREITAS DO AMARAL, este é o acordo de vontades pelo
qual é constituída, modificada ou extinta uma relação jurídica administrativa.1

2.1.1. Classificações dos contratos administrativos

2.1.1.1. Contratos entre a AP e particulares, entre


entidades públicas e só entre particulares

Esta é uma classificação que atende aos sujeitos do contrato administrativo.

Os contratos mais característicos são entre a Administração e os particulares: de


um lado, o contraente público (uma pessoa coletiva pública ou uma entidade no exercício

1
Era este o conceito consagrado no art.178.º do CPA velho.

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da função administrativa) e, do outro lado, o cocontratante particular (um individuo ou


uma pessoa coletiva privada).

Se o contratante público for uma entidade privada no exercício de funções


materialmente administrativa, podemos ter contratos entre particulares.

Já os contratos entre entidades públicas são aqueles cujos sujeitos são apenas
pessoas coletivas públicas ou entidades que, apesar da sua forma jurídica privada,
integram a AP: o Estado e um município ou o Estado e uma empresa pública, 2
municípios entre si, vários municípios e uma associação, etc.

2.1.1.2. Contratos de colaboração e atribuição

Atende-se aqui à sua causa-função.

Os contratos de colaboração são aqueles pelos quais uma das partes se obriga a
proporcionar à outra uma colaboração temporária no desempenho de atribuições
administrativas, mediante renumeração. Aqui a prestação fundamental é a do
cocontratante da pessoa coletiva.

Os contratos de atribuição são aqueles contratos que têm por causa-função atribuir
uma certa vantagem ao cocontratante da Administração. Nestes contratos, a prestação da
Administração é que é essencial e caracterizadora e a do administrado é apenas a
contrapartida ou uma consequência. Um exemplo é o contrato de urbanização.

A relevância desta classificação é o facto de os procedimentos pré-contratuais


disciplinados no CCP só serem obrigatórios no tocante aos contratos de colaboração.

2.1.1.3. Contratos de subordinação e de cooperação

Esta classificação atende à posição relativa dos contraentes no equilíbrio


contratual.

Nuns casos, o contraente público pode dirigir o modo de execução das prestações,
fiscalizá-las, modifica-las e aplicar sanções, são os contratos de colaboração subordinada,
os quais constituem a regra nas relações contratuais entre contraentes públicos e
particulares.

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Por outro lado, o contrato administrativo faz nascer relações de igualdade entre as
partes, que cooperam no mesmo plano, são os contratos de cooperação paritária e que
existem muito entre entidades privadas.

2.1.1.4. Contratos primários e secundários

São primários os contratos que regulam diretamente as situações da vida


(concessões, empreitadas, fornecimentos). São secundários os que versam sobre
anteriores contratos administrativos, modificando-os ou extinguindo-os (revogação ou
subconcessão).

2.1.1.5. Contratos administrativos típicos e atípicos

Consideram-se típicos aqueles contratos administrativos que se encontram


definidos e caracterizados por lei (empreitadas públicas). São, pelo contrário, atípicos
aqueles contratos administrativos que a lei não define nem caracteriza, mas que a AP
pode legalmente configurar ex novo, no exercício da sua autonomia contratual.

2.1.1.6. Contratos administrativos com objeto passível


de ato administrativo ou passível de contrato de
direito privado

Esta classificação é proposta por SÉRVULO CORREIA em relação aos contratos


atípicos.

Enquanto uns contratos têm por objeto uma situação que podia ser regulada por
um ato administrativo (concessão de obras públicas), outros têm por objeto situações
jurídicas passíveis de contrato de direito privado (empréstimo ou arrendamento).

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2.1.2. Tipos legais de contratos administrativos

2.1.2.1. Empreitada de obras públicas

A Administração Pública quando realiza obras públicas tem 3 formas de as


empreender:

⎯ Ou as faz por administração direta, e então são os próprios serviços


da Administração que executam a obra;

⎯ Ou as faz por empreitada;

⎯ Ou recorre à concessão.

Este é o contrato oneroso pelo qual a Administração encomenda, mediante


renumeração a pagar por si, quer a execução, quer, conjuntamente, a conceção e
execução da obra pública, a um particular devidamente licenciado.

Este é o modo escolhido para as obras públicas de pequena e média dimensão,


pois é o processo de maior economia e rendimento.

Este distingue-se da empreitada do Direito Civil, porque o contraente público tem


mais poderes sobre o empreiteiro do que o dono da obra numa empreitada civil.

3.1.2.2. Concessão de obras públicas

Para obras maiores, de avultados capitais, e cuja realização possa, pela sua
natureza, beneficiar dos capitais da agilidade empresarial própria da iniciativa privada,
emprega-se de preferência o contrato de concessão, pois o Estado não tem capacidade
técnica para tal.

Este é o contrato pelo qual o cocontratante se obriga à execução ou à conceção e


execução de obras públicas, adquirindo em contrapartida o direito de proceder, durante
um determinado período de tempo, à respeitva exploração ou o direito de pagamento ao
preço.

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Esta afasta-se da empreitada, pelo facto de na concessão a contrapartida do


cocontratante privado ser o direito de exploração da obra, eventualmente acompanhado
de um pagamento, ao passo que na empreitada o particular é sempre pago pela
Administração, através de fundos públicos, ficando a pertencer a esta.

3.1.2.3. Concessão de serviços públicos

Uma das suas características fundamentais é a atribuição ao concessionário da


competência, por certo período de tempo, de gestão do serviço concedido.

Este é o contrato pelo qual o cocontratante se obriga a gerir, em nome próprio e


sob a sua responsabilidade, uma atividade de serviço público, durante um determinado
período de tempo, sendo renumerado pelos resultados financeiros dessa gestão.

É, ainda, caracterizado pela sua continuidade e por serem essenciais à vida


quotidiana dos cidadãos.

3.1.2.4. Locação e aquisição de bens móveis e aquisição de


serviços

A locação de bens móveis é o contrato pelo qual um locador se obriga a


proporcionar a um contraente público o gozo temporário de bens móveis, mediante
retribuição.

A aquisição de bens móveis é o contrato pelo qual um contraente público compra


bens móveis a um fornecedor.

A aquisição de serviços é o contrato pelo qual um contraente público adquire a


prestação de um ou vários tipos de serviços mediante o pagamento de um preço.

3.1.2.5. Concessão de uso privativo do domínio público

Este é o contrato administrativo pelo qual a Administração faculta a um sujeito de


direito privado a utilização económica exclusiva de uma coisa ou parcela do domínio
público para fins particulares de utilidade pública.

Estas não se devem confundir com a concessão de exploração, pois estas investem
o particular na função de gerir e explorar, por sua conta e risco, todo um conjunto

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dominial como se fosse a própria Administração; enquanto a concessão de uso privativo,


apenas consentem a particulares, com base num título jurídico individual, o uso e fruição
de parcelas dominiais, para fins particulares.

3.1.2.6. Concessão de exploração de jogos de fortuna e azar

Este é o contrato administrativo pelo qual a Administração encarrega um


particular de estabelecer e explorar um casino de jogo, sendo retribuído pelo lucro
auferido pelas receitas dos jogos.

4. LINHAS GERAIS DO CÓDIGO DA CONTRATAÇÃO PÚBLICA

Em 2008, foi publicado e entrou em vigor, em Portugal, um CCP.

Trata-se da primeira lei deste tipo, que reúne um conjunto de disposições que, por
um lado, regulam os procedimentos de formação da generalidade dos contratos públicos
e, por outro lado, estabelecem o regime aplicável à generalidade dos contratos
administrativos.

Como resulta do art.1.º/1, o CCP tem, na verdade, um duplo objeto de regulação.

Com efeito, após uma breve Parte I, dedicada à delimitação do seu âmbito de apli-
cação, integra uma Parte II, que estabelece a disciplina aplicável à contratação pública,
isto é, aos procedimentos de formação dos contratos que o Código qualifica como
contratos públicos; e uma Parte III, que estabelece o regime substantivo aplicável aos
contratos que, nos termos do Código, revestem a natureza de contratos administrativos.

O CCP assume, assim, com carácter inovador, a distinção entre contratos públicos
e contratos administrativos, nos termos que se passam a enunciar.

Na senda do Direito da União Europeia, o CCP designa por contratos públicos os


contratos que são submetidos à aplicação dos regimes procedimentais de contratação
pública previstos na Parte II, isto é, cujo procedimento de formação é conformado por
regras que, nos seus aspetos essenciais, se conformam com as Diretivas da União
Europeia (a Diretiva 2014/24) dirigidas a assegurar a transparência, publicidade e não

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discriminação na seleção das empresas com quem as entidades públicas celebram os seus
contratos de mais elevado valor económico.

Como resulta da referida Diretiva europeia, o CCP equipara a entidades públicas


as entidades formalmente privadas que satisfaçam necessidades de interesse geral sem
obedecerem a uma lógica de mercado e que tenham capital maioritariamente público,
sejam maioritariamente financiadas por entidades públicas ou tenham órgãos de
fiscalização ou gestão constituídos por elementos maioritariamente designados por
entidades públicas (cfr. art.2.º e 7.º do CCP), submetendo aos mesmos procedimentos de
formação os contratos de obras públicas, concessão de serviços públicos e locação ou
aquisição de bens móveis e serviços a celebrar por estas entidades (cfr. art.6.º e 11.º do
CCP).

4.1. A Formação do Contrato Administrativo

Um dos principais objetivos do CCP é o estabelecimento de uma disciplina


aplicável à contratação público em conformidade com o Direito Europeu (no caso, a
Diretiva 2014/24).

Com efeito o conceito legal de contrato administrativo pressupõe a presença de


um contraente público e este conceito contempla 3 tipos de entidades:

⎯ As entidades adjudicantes referidas no art.2.º/1 do CCP: quaisquer pessoas


coletivas públicas com exceção das que tenham carácter empresarial, e
fundações ou associações privadas controladas por uma ou mais pessoas
coletivas públicas;

⎯ Os organismos de direito público, na medida em que celebrem contratos


como tal qualificados pelas partes ou por elas submetidos a um regime de
direito público.

Estas são pessoas coletivas que tenham sido criadas especificamente para
satisfazer necessidades de interesse geral, sem carácter industrial ou comercial e que
sejam maioritariamente financiadas pelas entidades adjudicantes, estejam sujeitas ao seu

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controlo de gestão ou tenham um órgão de administração, direção ou fiscalização cujos


membros sejam, em mais de metade, designados pelas mesmas entidades.

- As entidades que, independentemente da sua natureza pública ou


privada, celebrem contratos no exercício de funções materialmente administrativas.

Deste modo, na medida em que o contraente público seja também uma entidade
adjudicante, o regime da contratação pública é, em princípio, aplicável à formação dos
contratos administrativos que aquela pretenda celebrar.

Entre a contratação excluída da contratação públicas temos:

- Os casos de celebração de contratos cujo objeto abranja prestações que


não estão nem sejam suscetíveis de estar submetidas à concorrência no mercado,
desingdamente em razão da sua natureza ou das suas características, bem como da
posição relativa às partes no contrato ou do contexto da sua própria formação (art.5.º/1
CCP);

- As situações de contratação in house (art.5.º/2 CCP).

3.1.1. Princípios gerais

Aos procedimentos adjudicatórios são aplicáveis os princípios gerais de direito


administrativo (art.266.º CRP e art.2.º/3 CPA). No entanto, estes não apontam soluções
concretas aos órgãos decisórios, mas antes orientam os órgãos no percurso que conduz à
celebração do contrato.

O desrespeito de algum destes princípios inquina todo o procedimento e,


consequentemente, o ato final (art.283.º CCP).

À garantia de legalidade de um Procedimento Adjudicatório de Contratação


Pública não basta o cumprimento da Lei, mas também dos Princípios Normativos da
Contratação Pública, designadamente, o Princípio da Igualdade de Tratamento, da
Proibição de Discriminação em razão da Nacionalidade, da Imparcialidade,
Proporcionalidade, Reconhecimento Mútuo, Tutela Jurisdicional Efetiva e, o mais
relevante, in casu, o Princípio da Concorrência.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Neste sentido, é seguro afirmar, que os Princípios Jurídicos são “uma fonte de
direito fundamental no sistema da contratação pública”. Para ANA FERNANDA
NEVES, “ Os princípios da contratação pública conformam a definição concreta e a
realização dos procedimentos de contratação pública, assim como a atuação do
cocontraente público na relação jurídica, constituindo padrões de controlo da sua
correção jurídica”.

Será, pois, seguro afirmar que a Contratação Pública será uma das áreas onde
mais se sente o “peso” e a relevância concreta ou prática dos princípios jurídicos. Com
efeito, quer os nossos Tribunais Administrativos, quer a Jurisprudência do TJUE fazem,
frequentemente, referência aos Princípios, convocando-os como fundamento direto e
autónomo para a resolução de casos de contratação pública.

No caso de não haver uma regra no sistema ou se a regra existente foi afastada
(por inconstitucionalidade, por violação do direito comunitário ou por ilegalidade), ou o
intérprete recorre a uma regra existente no sistema que regule um caso análogo (extensão
analógica) ou convoca um princípio que resolva o caso concreto (o princípio fornece por
si só a “norma-do-caso”) – função regulativa do caso em que os princípios revelam
capacidade de fundar direta e autonomamente a solução de casos concretos. Aqui, o
princípio assumirá uma “função positiva”, contribuindo decisiva e positivamente para a
elaboração da norma que regulará a hipótese em concreto.

Ainda no que concerne à “função positiva” dos princípios, no caso de haver uma
regra no sistema, esta ser legítima (não contrária à fonte de direito hierarquicamente
superior) e estando em causa uma norma aberta ou atributiva de juízos discricionários, é
ela que se aplica em colaboração com o princípio, assumindo este uma “função
integrativa”, contribuindo para a densificação desses espaços normativos em aberto.

No entanto, mesmo tratando-se de uma regra existente fechada/vinculada e não


atributiva de poder discricionário, ainda assim a função positiva do princípio interessa
para a resolução do caso, na medida em que aqui, este assumirá uma “função
interpretativa, de “Green Light”, ajudando a interpretar as regras constantes das Diretivas
Europeias ou da legislação interna.

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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Ao invés, na hipótese de existir uma regra que lhe esteja infra — ordenada e que
com ele seja desconforme ou incompatível, o Princípio convocado terá uma força
paramétrica, regulativa, de aplicabilidade direta, ou seja, situar-se-á num patamar
hierárquico superior ao das regras, na medida em que aquele provém do Direito
Comunitário e da CRP, assumindo um valor supra legal na hierarquia normativa. Neste
caso, o princípio assumirá uma “função negativa”, de “red light” afastando, na regulação
do caso, a aplicação de uma certa regra que viole aquele, dispondo em sentido divergente.
Posteriormente, poder-se-á procurar no sistema, uma nova regra análoga àquela que fora
excluída da resolução do caso, ou então o princípio assumirá neste segundo momento
uma “função positiva”, que supra e oportunamente explicamos.

Por fim, citando o Professor Doutor RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, os


Princípios exercem, igualmente, uma função de legitimação — de “sanção” ou de “sinal
verde” – das regras constantes da lei ou dos regulamentos, modelando as soluções deles
contantes. Pelo que, a solução será juridicamente válida na medida em que não viole um
princípio situado num patamar hierárquico-normativo inferior

No concurso público temos como princípios orientadores: o princípio da


concorrência, da igualdade, da publicidade e da transparência.

O princípio da concorrência condiciona a própria aplicabilidade dos


procedimentos pré-contratuais: estes apenas devem ser adotados para a formação de
contratos cujo objeto abranja prestações suscetíveis de estar submetidas à concorrência
no mercado (art.5.º/1 e 16.º CCP). Trata-se de assegurar a otimização dos interesses da
entidade adjudicante em termos de preço e qualidade das prestações a adquirir pela
mesma.

Este traduz o reconhecimento da liberdade de iniciativa económica privada e da


economia de mercado como modo principal de satisfação das necessidades económicas
gerais e colocando-as ao serviço do interesse público ao permitir que a escolha da
Administração recaia sobre a melhor proposta, em vez de privilegiar nacionais, os amigos
ou os mais poderosos.

Assim, é um umbrella principle.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Até à entrada em vigor do CCP, o concurso público era considerado o princípio


adjudicatório por excelência. Com o Código, faz mais sentido em princípio do acesso
público, i.e., qualquer interessado pode apresentar-se a um procedimento com vista a
celebrar um contrato com uma entidade adjudicante. Olhando para os procedimentos pré-
contratuais tipificados no CCP, a única exceção a este princípio é o ajuste direto.

No artigo 1.º, n.º 4, do CCP faz expressa menção do princípio da concorrência,


ao lado dos princípios da igualdade e da transparência, como princípio da contratação
pública, ao contrário do que sucede com as Directivas 2004/18/CE e 2004/17/CE, que
não contêm qualquer referência expressa a este princípio.

De resto, não é apenas o artigo 1.º a conter esta referência expressa à concorrência
como princípio fundamental da contratação pública. Assim, o artigo 5.º, n.º 1, estabelece
que a parte II do Código «não é aplicável à formação de contratos a celebrar por
entidades adjudicantes cujo objecto abranja prestações que não estão nem sejam
susceptíveis de estar submetidas à concorrência de mercado, designadamente em razão da
sua natureza ou das suas características, bem como da posição relativa das partes no
contrato ou do contexto da sua própria formação».

O artigo 16.º, n.º 1, refere que os procedimentos nele indicados devem ser
adoptados «para a formação de contratos cujo objecto abranja prestações que estão ou
sejam susceptíveis de estar submetidas à concorrência de mercado».

O artigo 42.º, n.º 3, estabelece que «as cláusulas do caderno de encargos relativas
aos aspectos da execução do contrato submetidos à concorrência podem fixar os
respectivos parâmetros base a que as propostas estão vinculadas», consignando o n.º 5 da
mesma disposição que «o caderno de encargos pode também descrever aspectos da
execução do contrato não submetidos à concorrência, nomeadamente mediante a fixação
de limites mínimos ou máximos a que as propostas estão vinculadas».

O artigo 49.º, n.º 1, mencionada que «as especificações técnicas devem constar do
caderno de encargos e são fixadas por forma a permitir a participação dos concorrentes
em condições de igualdade e a promoção da concorrência».

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Nos termos do artigo 56.º, n.º 2, «entende -se por atributo da proposta qualquer
elemento ou característica da mesma que diga respeito a um aspecto da execução do
contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos».

Quanto à fixação do prazo para apresentação de propostas, prevê o artigo 63.º, n.º
2, que «na fixação do prazo para a apresentação das propostas, deve ser tido em conta o
tempo necessário à sua elaboração, em função da natureza, das características, do volume
e da complexidade das prestações objecto do contrato a celebrar, em especial dos
aspectos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, bem
como a necessidade de prévia inspecção ou visita a locais ou equipamentos, por forma a
permitir a sua elaboração em condições adequadas e de efectiva concorrência».

O artigo 70.º, n.º 2, alínea g) determina a exclusão das propostas cuja análise
revele «a existência de fortes indícios de actos, acordos, práticas ou informações
susceptíveis de falsear as regras de concorrência».

O artigo 74.º, n.º 2, refere que «só pode ser adoptado o critério de adjudicação do
mais baixo preço quando o caderno de encargos defina todos os restantes aspectos da
execução do contrato a celebrar, submetendo apenas à concorrência o preço a pagar pela
entidade adjudicante pela execução de todas as prestações que constituem o objecto
daquele». Por seu turno, o artigo 75.º, n.º 1, consigna que «os factores e os eventuais
subfactores que densificam o critério de adjudicação da proposta economicamente mais
vantajosa devem abranger todos, e apenas, os aspectos da execução do contrato a celebrar
submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, não podendo dizer respeito, directa
ou indirectamente, a situações, qualidades, características ou outros elementos de facto
relativos aos concorrentes».

O artigo 132.º, n.º 4, menciona que «o programa do concurso pode ainda conter
quaisquer regras específicas sobre o procedimento de concurso público consideradas
convenientes pela entidade adjudicante, desde que não tenham por efeito impedir,
restringir ou falsear a concorrência».

De acordo com o artigo 140.º, n.º 3, «a entidade adjudicante não pode utilizar o
leilão electrónico de forma abusiva ou de modo a impedir, restringir ou falsear a

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concorrência». Regras idênticas surgem no artigo 189.º, n.º 4, quanto ao convite; no


artigo 226.º, n.º 3, quanto aos termos de referência, no artigo 239.º, n.º 4, quanto à
instituição de um sistema de aquisição dinâmico, no artigo 252.º, n.º 2, quanto à
celebração de acordos quadro; no artigo 287.º, n.º 2, alínea c), quanto à atribuição de
eficácia retroactiva ao contrato.

O artigo 313.º, n.º 1, estabelece que a modificação do contrato não pode


«configurar uma forma de impedir, restringir ou falsear a concorrência garantida pelo
disposto no presente Código relativamente à formação do contrato». Clarificando o n.º 2
que «a modificação só é permitida quando seja objectivamente demonstrável que a
ordenação das propostas avaliadas no procedimento de formação do contrato não seria
alterada se o caderno de encargos tivesse contemplado essa modificação».

Sobre o princípio da igualdade, este impõe a abertura no acesso ao


procedimento e que os candidatos se mantenham sempre numa situação de igualdade no
decurso do concurso, o que significa que as regras do jogo devem estar claramente
definidas antes e devem manter-se imutáveis após a abertura do procedimento. Proíbe,
ainda, qualquer discriminação injustificada entre os candidatos.

O princípio da igualdade de tratamento é central na estruturação de todas as fases


do procedimento adjudicatório, podendo mesmo dizer-se que reveste importância
absolutamente fundamental na estruturação do direito interno e do direito da União em
matéria de contratação pública.

É possível ir até mais longe e afirmar que em certa medida a própria existência de
procedimentos concursais constitui uma manifestação do princípio da igualdade. Nesta
medida, muitos dos princípios específicos que vamos abordar constituem emanações da
ideia de igualdade. Assim sucede com quase todos os princípios considerados no âmbito
do princípio da concorrência, podendo em certa medida afirmar-se que a igualdade é um
instrumento da concorrência.

Desde logo, a proibição da discriminação em razão da nacionalidade, prevista no


artigo 12.º do Tratado CE, constitui, evidentemente, um afloramento da ideia de

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igualdade, a ponto de os termos «igualdade» e «não discriminação» surgirem


indiferenciadamente empregados na jurisprudência comunitária.

A este propósito importa aqui referir que o favorecimento dos nacionais não é
aferido apenas directamente, mas também através de outros indícios, como o recurso a
factores de adjudicação ou habilitação ligados à exigência de utilizar desempregados de
longa duração, a exigência de dispor, no momento de apresentação da proposta, de um
estabelecimento aberto ao público no local onde o serviço será prestado, etc. Por outro
lado, a proibição do favorecimento nacional encerra na verdade a ideia de proibição de
favorecimento da circunscrição territorial em que actua a entidade adjudicante, podendo
falar-se também de uma proibição de favorecimento regional ou autárquico.

Existe ainda um aspecto importante no tratamento do princípio da igualdade e que


consiste na sua articulação com os auxílios de Estado e subvenções públicas a
particulares, o que lhes permite apresentar propostas mais baixas do que os restantes
concorrentes no âmbito de procedimentos de adjudicação. Aqui há que distinguir: caso os
auxílios e subvenções sejam conformes ao direito da União e ao direito interno não
haverá violação do princípio da igualdade, pelo menos se o concorrente subvencionado
não tiver a mesma nacionalidade do Estado membro a que pertence a entidade
adjudicante ou a respectiva sede no mesmo Estado.

É, em abstracto, possível retirar as seguintes consequências imediatas deste


princípio no plano da actuação do legislador e da Administração no domínio da
contratação pública: i) a proibição de utilização de critérios pessoais na avaliação das
propostas; ii) a proibição do arbítrio; iii) a proibição de as entidades adjudicantes se
desviarem da sua prática administrativa, na medida em que esta releva de um poder de
auto-vinculação; iv) a imposição da igualdade na ilegalidade. Uma vez que a primeira
delas será adiante tratada mais especificamente a propósito dos princípios da
comparabilidade e da objectividade, interessam-nos agora as restantes.

Assim, as entidades adjudicantes não podem tratar arbitrariamente os


concorrentes, convidando uns a esclarecerem as suas propostas e outros não, excluindo
uns concorrentes e admitindo outros com base na mesma norma. Pelo contrário, as
entidades adjudicantes encontram-se vinculadas pela sua própria prática administrativa,

DANIEL LOURENÇO
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pelo menos quando esta releve da sua capacidade para a auto-vinculação. Aliás, pode
mesmo afirmar-se que a auto-vinculação das entidades adjudicantes (a qual pressupõe é
claro que as mesmas actuem no exercício de poderes discricionários ou no âmbito de uma
margem de livre apreciação) tem o seu fundamento directo no princípio constitucional da
igualdade. Mas poderá já aceitar-se a última consequência, de acordo com a qual a prática
de uma ilegalidade impõe, em homenagem ao princípio da igualdade, a sua perpetuação
em casos futuros idênticos? A resposta é, em princípio, negativa e a sua razão de ser já
está dada: fora dos casos de exercício de poderes discricionários não há lugar para uma
imposição autónoma do princípio da igualdade, que não deva já ter sido efectuada no
plano legislativo.

O artigo 317.º veda a cessão da posição contratual e a subcontratação sempre que


«existam fortes indícios de que a cessão da posição contratual ou a subcontratação
resultem de actos, acordos, práticas ou informações susceptíveis de falsear as regras de
concorrência». O artigo 318.º, n.º 5, consigna que a estipulação contratual proibindo a
subcontratação «não pode ter por efeito restringir, limitar ou falsear a concorrência
garantida pelo disposto no presente Código relativamente à formação do contrato, não
podendo, designadamente, limitar a possibilidade de recurso à capacidade técnica de
terceiras entidades que se afigure essencial para efeitos de qualificação do co–
contratante».

Sustenta-se, por vezes, que o princípio da concorrência não incide apenas na


relação entre a entidade adjudicante e concorrentes ou candidatos, mas tem também
importantes projecções nas relações entre concorrentes ou candidatos entre si. Parece, no
entanto, que no âmbito da contratação pública o princípio da concorrência se manifesta
sobretudo nas relações entre a entidade adjudicante e os concorrentes ou candidatos, o
que alias se revela de modo especial no sistema instituído pelo Código. Com efeito, de
acordo com tal sistema a proposta apresentada por um concorrente não é avaliada por
comparação com as propostas dos demais concorrentes, mas apenas à luz do modelo
gizado pela entidade adjudicante, em termos de se poder dizer que cada concorrente pode
saber, em termos muito aproximados, quando apresenta a sua proposta, qual a pontuação
que esta irá obter. Assim, revela-se inteiramente acertado sustentar que a concorrência,

DANIEL LOURENÇO
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em sede de contratação pública, é um resultado que se obtém através da concretização


dos princípios da igualdade e das liberdades comunitárias, enquanto regras que vinculam
os Estados nas suas relações com os particulares. Seja como for, parece também acertado
sustentar que o princípio da concorrência se exprime também, de forma significativa,
através deveres dirigidos aos concorrentes, enquanto dos princípios da igualdade e da
imparcialidade, por exemplo, se retiram sobretudo deveres dirigidos às entidades
adjudicantes.

O princípio da concorrência não se manifesta apenas nas regras do procedimento


concursal, mas é também tutelado no decurso da execução do contrato, como decorre do
disposto no artigo 313.º, n.º 2, do CCP, atrás transcrito. Com efeito, a concorrência só é
respeitada quando a proposta que mostrou ser a melhor no confronto com as restantes e
está na base do contrato a celebrar não pode depois ser subvertida por via da modificação
deste último. Daí falar-se de um congelamento ou manutenção da equação adjudicatória
durante a execução do contrato.

Já no plano procedimental, o princípio da concorrência surge em estreita conexão


com o princípio da proporcionalidade, ao exigir que a entidade adjudicante não defina os
requisitos de acesso ao procedimento em termos excessivamente restritivos de acesso ao
mercado em causa.

Em última análise, o princípio da concorrência consiste na ideia de acesso


público de todos os interessados aos procedimentos da contratação. Por outras palavras,
está em causa a ideia de que o universo concorrencial não é definido pela entidade
adjudicante, antes se verificando uma apresentação pública de propostas (no concurso
público) ou de candidaturas (no concurso limitado, no procedimento de negociação e no
diálogo concorrencial.

O princípio da concorrência subdivide-se em vários subprincípios, que analisarei


sucessivamente na exposição subsequente: o princípio da objectividade dos critérios de
adjudicação; o princípio da proposta única; o princípio da livre associação dos
concorrentes; o princípio da comparabilidade das propostas; o princípio da
intangibilidade das propostas; o princípio da estabilidade das regras dos procedimentos; o

DANIEL LOURENÇO
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princípio da estabilidade dos concorrentes ou candidatos; o princípio da estabilidade dos


contratos públicos; o princípio da estabilidade do contrato e dos co-contratantes.

O princípio da publicidade determina que quaisquer decisões ou deliberações


dos órgãos da entidade adjudicante devem ser dadas a conhecer a todos os que nele
possam a vir a estar ou estejam já interessados no procedimento concursal. Este
manifesta-se, ainda, no facto de os atos ou as fases em que se verifica qual a concorrência
existente, ou em que se fixam as principais condições documentais e materiais de cada
candidatura ou proposta, terem de decorrer publicamente perante os interessados.

O princípio da transparência postula que a Administração Pública deve


fundamentar os seus atos e garantir a cabal audiência dos particulares interessados, não
lhes podendo sonegar informação quer sobre o andamento dos processos em que seja
diretamente interessados, quer sobre as resoluções definitivas que sobre eles forem
tomadas.

O direito à tutela jurisdicional efectiva é, como se sabe, expressão de um


princípio comum às tradições constitucionais dos diversos Estados membros, estando
ainda consagrado na CEDH (artigos 6.º e 13.º) e sendo proclamado pelo Tribunal de
Justiça como um princípio de direito comunitário. Sem prejuízo da densificação
legislativa específica deste princípio no âmbito das designadas «directivas-recursos», de
que aqui não me vou ocupar, coloca-se o problema de saber se não fará sentido
estabelecer uma diferenciação entre a incidência deste princípio consoante esteja em
causa a formação de contratos situados acima, ou abaixo, dos valores a partir dos quais
essa mesma formação está sujeita a requisitos procedimentais específicos. Assim sucede
em muitos países, em que é possível afirmar que os limiares da contratação pública
separam uma relevância sobretudo da protecção jurídica secundária (isto é, assente
essencialmente em pretensões indemnizatórias), quando estejam em causa contratos de
valores situados abaixo daqueles limiares, de uma relevância também da protecção
jurídica primária (dirigida antes de mais à eliminação do acto ilegal), quando estejam em
causa, pelo contrário, contratos de valores acima dos limiares e, nessa medida, sujeitos a
um procedimento concursal específico.

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Em Portugal, também assim acontece com os sectores especiais. Com efeito, aos
procedimentos de formação de contratos celebrados pelas entidades adjudicantes dos
sectores especiais acima dos limiares comunitários são, sem dúvida, aplicáveis as
disposições relativas ao contencioso pré-contratual previstas nos artigos 100.º e seguintes
do CPTA. Mas que dizer da formação de contratos de valores inferiores aos limiares de
direito interno e do direito comunitário? Muito embora, as disposições do CPTA
mencionadas não excluam a sua aplicação, à partida, a tais casos, torna-se mais difícil
descortinar aí a presença de actos administrativos impugnáveis à luz de um bloco de
legalidade claramente definido. Assim, também aqui será sobretudo relevante a protecção
jurídica secundária. Neste sentido, pode dizer-se que um dos méritos do nosso CCP é o
de estender a tutela jurisdicional efectiva a todos os procedimento de formação de
contratos públicos, pelo menos no domínio dos sectores clássicos. Especialmente
relevante na perspectiva da tutela jurisdicional efectiva é o regime do artigo 51.º, n.º 2, do
CPTA, de acordo com o qual a circunstância de não ter impugnado qualquer acto
procedimental não impede o interessado de impugnar o acto final com fundamento em
ilegalidade cometidas ao longo do procedimento.

O princípio da proporcionalidade é hoje assumido como parâmetro de


constitucionalidade não apenas de intervenções legislativas restritivas de direitos,
liberdades e garantias (artigo 18.º, n.º 3, da Constituição), mas também de quaisquer actos
do poder (artigo 2.º da Constituição) e especificamente do poder administrativo (artigo
266.º, n.º 2, da Constituição). Este princípio tem especial incidência na definição do
universal concorrencial admitido a participar no procedimento, dele decorrendo que, à luz
da função e objectivos do procedimento em causa, não sejam adoptadas medidas
restritivas da concorrência sem justificação suficiente e adequada para o efeito. Já no
plano da condução do procedimento, o princípio dirige-se especialmente às decisões das
entidades adjudicantes, exigindo que as respectivas decisões em matérias tão diversas
quanto as prorrogações de prazos, a valorização de irregularidades das propostas, a
aplicação dos critérios de adjudicação, a concessão dos períodos de tempo necessários à
consulta ou obtenção de documentos e à elaboração de reclamações, etc., sejam
adoptadas com base nos subprincípios da proporcionalidade (adequação, necessidade e
ponderação).

DANIEL LOURENÇO
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São estas características do princípio da proporcionalidade que o tornam


especialmente próximo do princípio do mútuo reconhecimento, ao abrigo do qual um
operador económico tem o direito de transaccionar livremente os seus produtos e serviços
no mercado de qualquer Estado-membro, se aqueles tiverem sido produzidos,
comercializados ou fornecidos legalmente no Estado-membro de origem. São também
estas características que o tornam especialmente apto a uma ponderação em face de
outros princípios que se apresentem conflituantes com ele.

Princípio da objectividade. De acordo com o CCP, existem dois critérios


possíveis de adjudicação no âmbito de um procedimento de contratação: o mais baixo
preço e a proposta economicamente mais vantajosa (artigo 74.º do CCP). É fácil de
compreender as razões que levam uma entidade adjudicante a escolher o critério do mais
baixo preço: simplicidade, celeridade, menos apreciação qualitativa durante a avaliação
das propostas.

A avaliação daquilo que é uma proposta mais vantajosa baseia-se numa série de
factores escolhidos pela entidade adjudicante para o contrato em questão. Estes factores
incluem, de acordo com o disposto no artigo 53.º, n.º 1, alínea a), da Directiva
2004/18/CE: qualidade, preço, valor técnico, características estéticas e funcionais,
características ambientais, custo de utilização, rendibilidade, assistência técnica e serviço
pós-venda, data de entrega e prazo de entrega ou de execução. O princípio da
objectividade encontra consagração expressa no artigo 75.º, n.º 1, de acordo com o qual
«os factores e os eventuais subfactores que densificam o critério de adjudicação da
proposta economicamente mais vantajosa devem abranger todos, e apenas, os aspectos da
execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, não
podendo dizer respeito, directa ou indirectamente, a situações, qualidades, características
ou outros elementos de facto relativos aos concorrentes».

Uma questão que se pode colocar é de saber se um critério de adjudicação que


inclua como factor a composição da equipa técnica afectada pelo concorrente à execução
de uma obra, por exemplo, se conforma com o princípio da objectividade. No Acórdão
Lianakis considerou-se que critérios relativos às «qualificações e aos meios susceptíveis
de garantir uma boa execução do contrato em questão são critérios que dizem respeito à

DANIEL LOURENÇO
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aptidão dos proponentes para executar esse contrato» e que, portanto, não têm a
qualidade de «critérios de adjudicação», na acepção do direito comunitário27. Embora a
questão colocada se situe na fronteira dos critérios objectivos, afigura-se excessivo
considerá-lo já como um puro critério de selecção qualitativa e não como critério de
adjudicação. E, todavia, a formulação do citado artigo 75.º, n.º 1, do CCP é certamente
congruente com esta leitura maximalista do princípio da objectividade.

O princípio da imparcialidade, consagrado em termos genéricos para a


actividade da administração nos artigos 266.º, n.º 2, da Constituição e no artigo 6.º do
CPA. Num plano eminentemente orgânico e preventivo estão em causa as figuras dos
impedimentos, escusas e suspeições. Por outro lado, há ainda que considerar as situações
das relações empresariais de grupo ou domínio entre entidade adjudicante e concorrente
ou candidato. No plano procedimental está em causa a ponderação apenas dos factores
que se integram nos critérios de adjudicação.

No nosso direito verifica-se uma tendência para entender a imparcialidade como


norma de perigo e não como norma de resultado. Assim sucede com a norma do artigo 24
55.º, alínea j), de acordo com a qual não podem ser candidatos, concorrentes ou integrar
qualquer agrupamento, as entidades que tenham prestado a qualquer título, directa ou
indirectamente, assessoria ou apoio técnico na preparação e elaboração das peças do
procedimento. De resto, este modo de ver já antes havia sido adoptado pela nossa
jurisprudência. Assim, o Ac TCA Norte de 16 de Novembro de 2006, proferido no
Processo 00545/05.6BECBR, entendeu, em relação a um caso idêntico, que ocorre
violação do princípio da imparcialidade sempre que sejam levados a cabo procedimentos
que contenham o risco de consubstanciarem actuações parciais, independentemente da
demonstração efectiva de ter ocorrido uma actuação destinada a favorecer algum dos
interessados em concurso, com prejuízo de outros. De acordo como a mesma decisão,
«tal entendimento dispensa a existência de provas concretas bem como o respectivo ónus
de alegação, bastando-se com a existência de um mero risco de uma actuação parcial
independentemente de demonstração efectiva, em ordem à ocorrência de violação do
princípio da imparcialidade».

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Do mesmo modo, não podem também ser definidos os factores ou subfactores de


adjudicação em momento posterior à abertura das propostas [artigo 132.º, n.º 1, alínea
n)]. Este aspecto tem grande concretização na nossa jurisprudência administrativa,
sobretudo no domínio do emprego público.

Quanto ao primeiro aspecto, o nosso legislador foi mais longe do que o impunham
os princípios do direito comunitário, uma vez que aí se admite dar ao concorrente a
oportunidade de provar que «nas circunstâncias do caso concreto, a experiência adquirida
não pode ter falseado a concorrência». Por outras palavras, no direito comunitário o
princípio da imparcialidade tende a ser entendido como norma de resultado.

O princípio da transparência é afirmado como um dos princípios da contratação


pública, quer no artigo 1.º, n.º 4, do CCP, quer no artigo 2.º da Directiva 2004/18/CE e no
artigo 10.º da Directiva 2004/17/CE.

Quais as implicações da transparência? Em primeiro lugar, um dever de publicitar


a intenção de contratar e as principais condições do contrato a celebrar. Em segundo
lugar, a publicitação das regras do procedimento. Em terceiro lugar a definição clara dos
critérios de adjudicação. A este propósito, a introdução do modelo de avaliação [artigos
132.º, n.º 1, alínea n), e 139.º] é, sem dúvida, uma manifestação do princípio da
transparência, na medida em que permite ao concorrente saber de antemão com grau de
certeza qual vai ser o seu posicionamento na ordenação das propostas ou candidaturas.
Em quarto lugar, a transparência concretiza-se na existência de meios destinados a
controlar a tramitação procedimental, como a exigência de fundamentação e a audiência
prévia.

Apresentando uma evidente conexão com o princípio da transparência, o


princípio da publicidade representa como que a face externa daquele. Enquanto a
transparência se destina a dar a conhecer a todos os interessados e, depois, participantes
no procedimento o sentido, conteúdo e propósito de todas as fases deste último, a
publicidade alarga o círculo dos destinatários quanto a este desvendar do procedimento.

A violação da publicidade tem diferentes consequências: estando em causa a


decisão de contratar relativamente à qual se imponha a publicação de anúncios no Diário

DANIEL LOURENÇO
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da República e no JOUE a consequência será a nulidade; tratando-se da falta de


publicidade, a consequência será em regra a anulabilidade; em alguns casos poderá estar
em causa a ineficácia, como sucede quando não seja publicitado o contrato celebrado na
sequência de um procedimento de ajuste directo, de acordo com o disposto no artigo
127.º do CCP.

O princípio da tipicidade. Este princípio significa que as entidades adjudicantes


estão obrigadas a adoptar determinados procedimentos para a celebração dos contratos,
tal como previsto designadamente no artigo 16.º do CCP. Isto significa que as entidades
adjudicantes não podem adoptar um procedimento não previsto na lei ou adoptar um
procedimento legalmente previsto sem que se verifiquem os respectivos pressupostos. Se
o fizerem, o procedimento será ilegal, podendo essa ilegalidade redundar mesmo numa
nulidade, como já teve o STA oportunidade de decidir no acórdão de 11 de Novembro de
2003, proferido no Processo n.º 01084/03.

Segundo o STA:

«(…) enferma de nulidade a adjudicação em crise neste processo, por


praticada em procedimento pré-contratual de concurso limitado sem
apresentação de candidaturas quando, atento o valor da adjudicação, se exigia,
nos termos do DL 55/95, que tivesse sido seguido, pelo menos, o procedimento
por negociação com publicação prévia de anúncio. 2.2.9. Finalmente, ainda que
não se concordasse com a linha de princípio que se enuncia, radicada na diversa
natureza do vício de falta de procedimento devido, face ao vício de falta de
formalidade num dado procedimento, a solução do caso concreto haveria de ser
a mesma quando, como ocorre, a partir da omissão do elemento inicial e
essencial, que é o da 26 publicidade, se põem em crise, de forma flagrante e
grave, todos os princípios a seguir pela Administração na formação dos
contratos, quais sejam os da legalidade e da prossecução do interesse público, da
transparência e da publicidade, da igualdade, da concorrência, da
imparcialidade, da proporcionalidade e da boa-fé, presentemente expressamente
elencados na lei, mas já antes vinculantes.»

DANIEL LOURENÇO
33
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Até agora temos falado na tipicidade de procedimentos. Coloca-se, no entanto, a


questão de saber se não fará sentido admitir também um princípio de tipicidade dos
contratos a celebrar na sequência dos procedimentos de contratação pública. O problema
coloca-se atendendo à formulação do artigo 16.º do CCP de acordo com o qual os
procedimentos previstos no código devem ser adoptado para a formação de contratos cujo
objecto abranja prestações que estão ou sejam susceptíveis de estar submetidas à
concorrência de mercado, entendendo-se como tal, designadamente, as prestações típicas
abrangidas pelos contratos de empreitada de obras públicas, de concessão de obras
públicas, de concessão de serviços públicos, de locação ou aquisição de bens móveis, de
aquisição de serviços e de sociedade. Como se sabe, as directivas são nesta matéria
bastantes mais modestas, uma vez que excluem a respectiva aplicabilidade aos contratos
de concessões de serviços (mas não às concessões de obras públicas) e de sociedade e
sobretudo porque não o regime procedimental nelas previstos não se aplica a contratos
cujo objecto abranja prestações que estão ou sejam susceptíveis de estar submetidas à
concorrência de mercado. Os procedimentos previstos nas directivas são aplicáveis aos
contratos nelas previstos; no mais aplicam-se os princípios do Tratado CE. Importa, pois,
ter consciência de que à tipicidade das directivas opõe-se o sistema de cláusula geral do
nosso Código. O problema torna-se ainda mais complexo se considerarmos o alcance da
norma revogatória do artigo 14.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro,
diploma que aprovou o Código. De acordo com tal norma, é revogada toda a legislação
relativa às matérias reguladas pelo Código dos Contratos Públicos, seja ou não com ele
incompatível. Por outras palavras, opera-se uma verdadeira revogação global.

Julgo que terá de haver aqui um entendimento restritivo: considerando as diversas


alíneas do n.º 2 do artigo 16.º do CCP a cláusula geral do mesmo número deverá ser
entendida como referida apenas aos contratos da procura, isto é, os contratos em que o
Estado e outras entidades adjudicantes procuram bens ou serviços no mercado. Não se
põe em causa que todo o contrato administrativo deva ser antecedido de um
procedimento adjudicatório, apenas se questiona que os procedimentos previstos no CCP
possam ou devam ter a vocação de procedimentos verdadeiramente gerais aplicáveis a
toda a actividade da Administração Pública.

DANIEL LOURENÇO
34
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

3.1.2. Regime procedimental

As regras sobre a formação dos contratos administrativos são particularmente


apertadas e constituem um exemplo claro de como a Administração Pública está, por
vezes, sujeita a restrições e obrigações muito maiores do que aquelas que impedem sobre
os particulares.

A formação do contrato administrativo envolve, em regra, a adoção de um


procedimento tendente à escolha do cocontrante e à definição do conteúdo do contrato.

A sequência, em termos simplificados é:

- 1.º - Procedimento pré-contratual;

- 2.º - Adjudicação

- 3.º - Celebração do contrato

Com o CCP, a regra geral é a de que a escolha do tipo de procedimento


condiciona o valor do contrato a celebrar em virtude do princípio da concorrência. Ou
seja, de acordo com o art.17.º e seguintes do CCP, sendo adotado um determinado tipo de
procedimento, este vai determinar o valor máximo do benefício económico que pode ser
obtido pelo adjudicatário com a execução de todas as prestações que constituem o objeto
do contrato a celebrar.

No art.18.º são estabelecidos os valores até os quais podemos escolher o


procedimento de ajuste direto, concurso público ou concurso limitado por prévia
qualificação.

A. Tipos de procedimento

A pessoa coletiva qualificada como entidade adjudicante fica sujeita à obrigação


de subordinar a formação dos seus contratos a procedimentos de contratação pública. O
art.16.º/1, para a formação de contratos cujo objeto abrange prestações suscetíveis de
estarem submetidas à concorrência no mercado, obriga a adotar ou o ajuste direito, ou o
concurso público, ou o concurso limitado por prévia qualificação, ou o procedimento de
negociação ou o diálogo concorrencial.

DANIEL LOURENÇO
35
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Em síntese temos:

- Procedimento fechado – ajuste direto;

- Procedimento aberto – concurso público

-Procedimentos semiabertos - concurso limitado por prévia qualificação,


o procedimento de negociação e o diálogo concorrencial.

Além dos referidos, constam ainda do CCP os instrumentos procedimentais


especiais:

- O concurso de conceção;

- Os sistemas de aquisição dinâmicos;

- Os sistemas de qualificação.

E ainda existem outras figuras que não constituem procedimentos pré-contratuais,


mas que com eles se articulam:

- Os acordos quadro, que correspondem a contratos celebrados entre uma


ou várias entidades adjudicantes e um ou mais entidades, com o objetivo de disciplinar as
relações contratuais futuras, a estabelecer ao longo de determinado período de tempo,
mediante fixação antecipada dos seus termos;

- As centrais de compras, que são entidades adjudicantes constituídas para


centralizar a contratação de empreitadas de obras públicas, locação e aquisição de bens
móveis e aquisição de serviços.

A.1. Ajuste direto

Está regulado nos art.112.º a 119.º do CCP e é um procedimento fechado, mas


que depende de iniciativa pública, o que significa que só podem apresentar propostas
aqueles que tenham sido convidados a fazê-lo pela entidade adjudicante.

É o procedimento em que a entidade adjudicante convida diretamente uma ou


várias entidades à sua escolha a apresentar proposta, podendo com elas negociar alguns
aspetos da execução do contrato a celebrar (art.112.º).

DANIEL LOURENÇO
36
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É um procedimento que está pensado para contratos de baixo valor ou em que,


independentemente do valor, ocorra uma razão material, que deve ser devidamente
fundamentada, que justifique a preterição do princípio da concorrência.

No ajuste direto, o programa do procedimento é substituído pelo convite a


contrato regulado no art.115.º. Este procedimento tanto pode comportar uma consulta
prévia a cárias entidades, como não.

A.2. O concurso público

Está regulado no art.130.º a 161.º do CCP e é o procedimento de iniciativa pública


aberto à livre competição dos interessados admitidos a fazer valer a sua pretensão de
contratar com a Administração em condições de plena igualdade entre as respetivas
propostas, para que aquela possa escolher a que melhor satisfaça o interesse público.

A característica primeira do concurso é a de não se saber à partida que pessoas ou


entidades vão concorrer e, bem assim, a de não haver limite ao número de concorrentes,
pois são admitidos a concorrer todos os concorrentes cujas propostas preencham os
requisitos.

É um procedimento aberto por excelência.

Este pode prever, eventualmente, uma fase destinada à modificação de alguns


aspetos das propostas, o que revela o cariz abrangente e diálogo no caso de concessões de
obras públicas e serviços, traduzindo-se numa verdadeira fase de negociação, mas no
caso das locações ou de aquisições de bens, é limitada à alteração aspetos quantitativos
das propostas, através de um processo eletrónico, designado por leilão eletrónico.

A.3. Concurso limitado por prévia qualificação

Está regulado nos art.162.º a 192.º CCP.

Este procedimento, conjuntamente com o procedimento de negociação e com o


diálogo concorrencial, constitui um procedimento semiaberto, i.e., a ele podem
candidatar-se quaisquer interessados que preencham os requisitos exigidos, mas apenas

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

poderão apresentar propostas os candidatos que sejam qualificados numa primeira fase
(art.163.º/a/b CCP).

Este tem por matriz as regras do concurso público, mas difere deste porque só são
admitidos a apresentar propostas os candidatos para o efeito selecionados pela entidade
adjudicante (art.189.º/1 CCP)

A.4. Procedimento de negociação

Regulado no art.193.º a 203.º do CCP é uma figura recente, originária do direito


europeu, e que surgiu a par do “procedimento aberto” (open procedure) e do
“procedimento restrito” (restricted procedure).

Aqui a peculiaridade dos interesses em jogo em determinadas relações contratuais


e certo tipo de vicissitudes ocorridas no momento da celebração de determinados
contratos são as principais razões da consagração dos “procedimentos de negociação”
(negotiated procedures).

Este tipo de procedimento implica que, apara além da apresentação das


candidaturas e da qualificação dos candidatos, a que se segue a apresentação de propostas
iniciais pelos candidatos qualificados, haja ainda uma negociação das propostas
apresentadas e uma análise da versão final das propostas.

Ao procedimento de negociação são subsidiariamente aplicáveis as disposições


que regulam o concurso limitado por prévia qualificação (art.193.º CCP).

A.5. O diálogo concorrencial

Está regulado nos art.204.º a 218.º do CCP e tem origem no Direito Europeu.

Este procedimento pode ser adotado quando o contrato a celebrar, qualquer que
seja o seu objeto, seja particularmente complexo, impossibilitando a adoção do concurso
público ou do concurso limitado por prévia qualificação.

Aqui a entidade adjudicante discute com os candidatos qualificados os aspetos


complexos ainda por definir, só procedendo à elaboração do caderno de encargos, com as
cláusulas a incluir no contrato a celebrar, após tal diálogo.

DANIEL LOURENÇO
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B. Fases e trâmites comuns aos diferentes tipos de procedimentos pré-


contratuais

Os tipos de procedimentos pré-contratuais têm em comum várias fases e alguns


trâmites, daí que o CCP comece por disciplinar a fase de formação do contrato e, só
depois, a tramitação correspondente a cada tipo procedimental.

O procedimento inicia-se com a decisão de contratar, que é muitas vezes uma


decisão implícita, estando frequentemente associado, no mesmo despacho, às decisões de
autorização da despesa e de escolha do procedimento, a qual compete ao órgão
competente para autorizar a despesa inerente ao contrato a celebrar (art.36.º/1).

Compete igualmente a este órgão:

- Escolher o tipo de procedimento a adotar (art.38.º);

- Aprovar as peças do procedimento (art.40.º/2), que são o convite à apresentação


de propostas (no ajuste direito, concurso limitado por prévia qualificação, ou o
procedimento de negociação), à apresentação de soluções (no diálogo concorrencial), o
programa de procedimento2 (em todos os procedimentos, com exceção do ajuste) e o
caderno de encargos3 (em todos os procedimento, com exceção do ajuste).

- Designar os membros do júri (art.67.º/1);

- Adjudicar ou não adjudicar (art.73.º/1 e 79.º);

- Aprovar a minuta do contrato (art.98.º/1);

- Representar a entidade adjudicante na outorga do contrato (art.106.º/1).

As regras de participação respeitam ao como da participação, cumprindo


distinguir entre candidatos e concorrentes. Quaisquer pessoas singulares ou coletivas,

2
Este é o regulamento que define os termos a que obedece a fase de formação do
contrato até à sua celebração (art.41.º) e que determina o critério de adjudicação.
3
É a peça que contem as clausulas a incluir no contrato a celebrar.

DANIEL LOURENÇO
39
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podem ser candidatos ou concorrentes desde que não se encontrem legalmente


impedidos.

É candidato a entidade que participa na fase de qualificação de procedimentos


semiabertos, nestas as candidaturas são analisadas pelo júri, que elabora um relatório
preliminar com a proposta de ordenação de candidatos a submeter à audiência dos
interessados. Posteriormente, é elaborador um relatório final, a submeter à apreciação do
órgão competente para a decisão de contratar.

É concorrente a entidade que participar em qualquer procedimento de formação


de um contrato mediante a apresentação de uma proposta. A proposta é a declaração pela
qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e indica o
modo pelo qual se dispõe a fazê-lo.

O júri do procedimento é um órgão ad hoc que dirige a instrução do


procedimento pré-contratual, competindo-lhe:

- Apreciar as candidaturas e propostas;

- Elaborar os relatórios de análise das candidaturas e propostas;

- Exercer a competência que lhe seja delegada pelo órgão competente para
a decisão de contratar, não sendo delegável a competência para a decisão de qualificação
dos candidatos ou para a decisão de adjudicação.

O júri inicia as suas funções no primeiro dia útil subsequente ao do envio do


anuncio para publicação ou do convite (art.68.º/1). As suas deliberações devem ser
sempre fundamentadas e são tomadas por maioria, não sendo admitida a abstenção.

As propostas são analisadas para efeitos de verificação da sua conformidade com


os parâmetros jurídicos do procedimento. O júri do procedimento pode pedir
esclarecimentos sobre as propostas (art.72.º). E estas são posteriormente avaliadas quanto
ao seu mérito relativo. Cumpridos os trâmites da audiência dos interessados, o júri ordena
definitivamente as propostas em ordem à adjudicação pelo órgão competente para a
decisão de contratar.

DANIEL LOURENÇO
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A adjudicação é o ato pelo qual é aceite a única proposta apresenta ou escolhida


uma de entre as propostas apresentadas (art.73.º/1). Em princípio, existe um dever de
adjudicação, mas são admitidas causas de não adjudicação (art.76.º/1 e 79.º). A decisão
de adjudicação é notificada, em simultâneo, a todos os concorrentes (art.77.º/1).

O critério de adjudicação é o determinado no programa de procedimento, tal


critério pode ser o da proposta economicamente mais vantajosa, o que oferece uma maior
discricionariedade, ou o do mais baixo preço, que só pode ser adotado quando apenas
estiver submetido à concorrência o preço a pagar pela entidade adjudicante pela execução
do contrato a celebrar. Na verdade, quem apresenta o preço mais baixo pode não oferecer
a solução economicamente mais vantajosa.

O adjudicatário deve demostrar estar em condições de celebrar e executar o


contrato, apresentado os documentos de habilitação (art.83.º), que tem que ver com a
definição de requisitos de idoneidade e de status profissional do participante.

A habilitação distingue-se da qualificação. A última define-se por requisitos de


aptidão técnica e financeira do candidato para a execução das prestações que constituem
o objeto do contrato.

A não apresentação dos documentos determina a não adjudicação e a posterior


caducidade da ação.

Segue-se a fase de celebração do contrato, regulado no art.94.º e seguintes, que


culmina com a outorga d contrato, que se traduz na assinatura do mesmo, tanto pela
entidade adjudicante, representada pelo órgão competente para a decisão de contratar,
como pelo adjudicatário.

O CCP tem ainda garantias administrativas relativas aos procedimentos pré-


contratuais (o recurso e a reclamação administrativa), a que é subsidariamente aplicável o
CPA. A impugnação não suspende a realização das operações subsequentes do
procedimento.

DANIEL LOURENÇO
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3.2. Forma e interpretação do contrato administrativo

3.2.1. A forma do contrato administrativo

Existem razões de solenidade, de reflexão e de prova, para que, no entendimento


da doutrina, se justifique a sujeição de certos contratos administrativos a uma forma
especial. Em concreto, subsistem razões de:

- Solenidade - uma vez que certos negócios só surtem plenamente os seus efeitos
quando sejam conhecidos ou cognoscíveis (i.e., conhecíveis) pela comunidade;

- Reflexão - porque a exigência de forma, normalmente associada ao decurso de


um certo lapso de tempo, possibilita às partes o amadurecer das soluções que, pelo
contrato administrativo, se irão constituir, modificar, ou extinguir;

- Prova - uma vez que a existência de um documento escrito facilita a


demonstração ulterior da ocorrência (ou verificação do facto).

No domínio dos contratos administrativos a regra geral deve ser, à semelhança


dos atos administrativos, a regra de que:

- Os contratos administrativos devem ser celebrados por escrito.

A este respeito, ao art.º 94.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos (CCP)
estabelece a obrigação de reduzir a escrito o futuro contrato «através da elaboração de
um clausulado em suporte de papel, ou em suporte eletrónico, com a aposição de
assinaturas eletrónicas.» Mas esta obrigação pode ser dispensada numa amplo leque de
situações cfr. previsto no art.º 95.º do CCP. Por exemplo, a redução a escrito pode ser
dispensada mediante decisão fundamentada do órgão competente para a decisão de
contratar, quando a segurança pública interna ou externa o justifique, ou quando seja
adotado um concurso público urgente. Não obstante, mesmo que o contrato qua tale (i.e.,
como tal) não seja reduzido a escrito, os elementos essenciais do contrato devem constar
de documentos escritos (cfr. art.º 96.º, n.º 2, do CCP). E esta solução legal justifica-se por
razões de segurança jurídica. Assim, não há, em regra, contratos administrativos verbais.

Do mesmo modo, os contratos administrativos com objeto passível de ato


administrativo, ou sobre o exercício de poderes públicos, devem revestir a mesma forma

DANIEL LOURENÇO
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dos atos que substituem. Por outro lado, os atos administrativos relativos à execução do
contrato são praticados por escrito. Já os contratos modificativos, ou extintivos, não
podem revestir uma forma menos solene do que a os contratos modificados ou extintos
(cfr. art.º 311.º, n.º 1 alínea a) e art.º 330.º, alínea b), do CCP).

3.2.2. A interpretação e a integração do contrato administrativo.

Como o contrato administrativo é uma fonte de relações jurídicas administrativas


(cfr. art.º 279.º do CCP), a aplicação subsidiária (i.e., auxiliar) a tais relações das leis
administrativas especiais, do CCP, dos princípios gerais de direito administrativo e das
restantes normas de direito administrativo (ex vi, art.º 280 do CCP) é de facto, uma
realidade. Somente na falta destas [leis princípios e normas] tem lugar a aplicação
subsidiária do Direito civil (ex vi, art.º 280, n.º 4, in fine, do CCP).

O contrato administrativo é, na verdade, um instrumento ao serviço do interesse


público, posto por lei a cargo do contraente público, pelo que é, primeiro que tudo, à luz
de tal interesse que se tem de definir o equilíbrio contratual (ex vi, artigos 281.º e 282.º,
n,º 2, in fine, do CCP).

O contrato administrativo é, em regra, fruto de um processo de comunicação


transparente e juridicamente regulado, pelo que o sentido das declarações é naturalmente
um sentido objetivamente determinável - nomeadamente, se for caso disso, por um
tribunal -.

Assim, será da combinação dos princípios e regras gerais de direito


administrativo, com as regras aplicáveis à generalidade dos contratos, incluindo as regras
que constam dos artigos 236.º a 239.º do Código Civil (CC) que resultarão as diretrizes a
observar na interpretação do contrato administrativo. A este respeito vale a pena recordar,
nos termos do n.º 1 do art.º 236.º do CC, que:

- «A declaração vale com o sentido de um declaratário normal, colocado na


posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante.»

E o recurso ao padrão do «declaratário normal» impõe ainda a conformação da


interpretação com os ditames da boa-fé e a necessidade de atender à globalidade do

DANIEL LOURENÇO
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contrato e à totalidade do comportamento das partes. Já a este respeito referia


MARCELLO CAETANO:

- “As dúvidas sobre o que foi definitivamente estipulado, quando as cláusulas


contratuais sejam obscuras, podem nesses casos ser esclarecidas através do exame do
anúncio do concurso, e do respetivo programa, do caderno de encargos, da ata da
sessão de abertura das propostas, do texto da proposta sobre a qual recaiu a
adjudicação definitiva, das reclamações formuladas no processo pelo adjudicatário e
decisões sobre elas tomadas, da minuta do contrato…”.

Caso, porém, se conclua pela existência de uma lacuna contratual, há que


proceder à integração de tal lacuna, valendo para o efeito as diretrizes estabelecidas no
art.º 239.º do CC, em concreto:

a) A «vontade hipotética» das partes, se não for contrária à boa-fé;

b) Se a «vontade hipotética» das partes for contrária à boa-fé, recorre-se


diretamente aos «ditames da boa-fé».

3.3. Invalidade do contrato administrativo

A matéria da invalidade do contrato administrativo vem disciplinada nos artigos


283.º a 285.º do CCP. Mas neste domínio das invalidades (do contrato administrativo) é
possível fazer a seguinte divisão:

a) - Invalidades derivadas ou decorrentes da invalidade de atos procedimentais;

b) - Invalidades originárias (ou próprias) do contrato administrativo

3.3.1. As invalidades derivadas (ou decorrentes da invalidade de atos


procedimentais).

O princípio da invalidade derivada, ou consequencial, vale para todos os contratos


administrativos, independentemente da natureza do respetivo objeto. Já os atos
procedimentais (vide título supra) em causa, referem-se todas as decisões do
procedimento pré-contratual que possam ser objeto de impugnação administrativa e que

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

sejam, de algum modo, suscetíveis de condicionar o conteúdo do contrato a celebrar, ou


então que sejam suscetíveis de condicionar a escolha do co-contratante.

Não obstante, o n.º 3 do art.º 283.º do CCP ressalva da relação de invalidade


consequente os casos em que o ato procedimental se tenha consolidado na ordem jurídica,
tenha sido convalidado, ou tenha sido renovado sem reincidência nas mesmas causas de
invalidade.

Já o n.º 4 do art.º 283.º do CCP prevê a possibilidade de limitação de efeitos da


anulação do ato procedimental (isto depois e ponderados os interesses públicos e
privados, bem como ponderada a gravidade da ofensa geradora do vício do ato
procedimental).

3.3.2. A invalidade própria do contato administrativo.

Nesta matéria rege o art.º 284.º do CCP, o qual determina que a invalidade própria
do contrato pode ser causada por vícios do contrato em si mesmo considerado, vícios
esses que se traduzem na preterição de requisitos relativamente às partes, à formação e
expressão da vontade de contratar e, ainda, vícios de outros requisitos formais e
substanciais do próprio contrato.

Pode-se dizer que a regra geral, no direito administrativo, é a da anulabilidade.

Só ocorrerá a nulidade do contrato administrativo quando estiver em causa algum


dos fundamentos de nulidade previstos no CPA.

No caso da falta e vícios da vontade, a solução do legislador vale para todos os


contratos administrativos independentemente do seu objeto, recebendo as soluções
consagradas na lei civil. E esta remissão para o Direito Civil compreende-se bem. Por um
lado e do ponto de vista teórico, o direito administrativo não tem uma teoria geral da
vontade administrativa e, por outro lado, o contrato administrativo é, tal como o contrato
civil, um acordo de vontades, podendo-lhe, assim, ser aplicadas as normas do Código
Civil. Em síntese:

- a) O regime da invalidade dos contratos administrativos (cfr. art.º 285.º do CCP)


tem, regra geral, um caráter duplo. Assim, se o contrato tiver um objeto passível de:

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

(1) - ato administrativo - aplica-se o regime dos atos administrativos;

(2) - contrato privado - aplica-se o regime de invalidade dos contratos de direito


privado, com um prazo de 6 meses.

b) Excetua-se da regra geral (anteriormente referida) a invalidade de contratos


administrativos que seja determinada por falta de vontade ou por vícios da vontade.
Nestas hipóteses, o regime da invalidade é o estabelecido no CC para idênticas situações
em contratos de direito privado. Isto porque o direito administrativo não dispõe de uma
teoria própria da falta ou vícios da vontade, havendo, nesta matéria, analogia com a
matéria do Direito Civil.

3.4. Execução do contrato administrativo

Dois dos aspetos caraterísticos dos contratos administrativos que assumem


particular relevância são:

a) - Os poderes de conformação da relação contratual, reconhecidos por lei à


Administração Pública (AP), cfr. art.º 279.º do CCP;

b) - A salvaguarda do equilíbrio económico e financeiro do contrato (no caso das


alterações dos pressupostos do valor, ou do conteúdo da prestação, a que o contraente
privado se obrigou).

Os principais poderes de conformação de que o contraente público goza durante a


execução do contrato administrativo são 5 (cfr. art.º 302.º do CCP). São eles o poder de:

(1) - Direção;

(2) - Fiscalização;

(3) - Modificação unilateral;

(4) - Aplicar sanções;

(5) - Resolução unilateral.

DANIEL LOURENÇO
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3.4.1. Natureza das declarações do contraente público.

As declarações do contraente público sobre a interpretação e validade do contrato


administrativo, ou sobre a sua execução, são meras declarações negociais.

Tal significa que a Administração não goza (neste domínio) de autotutela


declarativa. I.e., na falta de acordo do cocontratante, o contraente público apenas pode
obter os efeitos pretendidos através de um ação declarativa (cfr. art.º 307.º, n.º 2, do
CCP).

No entanto existem declarações do contraente público, referentes à execução do


contrato administrativo, que revestem a natureza de ato administrativo, nomeadamente
quando está em causa o exercício dos poderes de conformação contratual. É o caso:

a) Das ordens, diretivas ou instruções dadas no exercício dos poderes de direção e


de fiscalização;

b) Da modificação unilateral das cláusulas respeitantes ao conteúdo e ao modo de


execução das prestações previstas no contrato administrativo, por razões de
interesse público;

c) Da aplicação de sanções previstas por inexecução do contrato;

d) Da resolução unilateral do contrato.

Estes atos administrativos contratuais ou endocontratuais [os tais que poderão


ocorrer na execução do contrato como declarações do contraente público] obedecem, na
sua formação e eficácia, a regras especiais. Isto porque:

1.º - A sua formação não está sujeita ao regime estabelecido no CPA, devendo
contudo a aplicação de sanções ser precedida da audiência prévia do cocontratante (cfr.
art.º 308.º, do CCP);

2.º - Os atos em apreço, embora constituam título executivo - i.e., são dotados de
executividade -, não podem no entanto ser executados coercivamente pelo contraente
público (ou seja, não são executórios), salvo quando se trate de atos que determinem, em

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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

geral, a resolução do contrato ou, em especial, determinem o sequestro e o resgate de


concessões, ou outras situações expressamente previstas na lei (cfr. art.º 309.º, do CCP).

3.4.2. O poder de direção do modo de execução das prestações.

Uma vez celerado o contrato a Administração tem o direito de exigir a respetiva


execução pelo cocontratante particular. Mais, o contratante público não tem de assistir
passivamente à execução levada a cabo pela parte privada, nem esta tem o direito de a ela
(execução) proceder à margem de qualquer tipo de ingerência por parte da
Administração.

Recorda-se que o contrato administrativo corresponde a um modo de prosseguir o


interesse público e, nesse sentido, a lei incumbe o contraente público de «assegurar,
mediante o exercício dos poderes de direção e de fiscalização, a funcionalidade da
execução do contrato quanto à realização do interesse público visado pela decisão de
contatar», cfr. art.º 303.º, n.º 1, do CCP.

I.e., o contraente público deve poder dizer, em última instância, «como quer o
trabalho feito»: é isto o poder de direção.

Como é próprio da sua natureza, o poder de direção concretiza-se na emissão de


«ordens, diretivas ou instruções» sobre o sentido das escolhas necessárias nos domínios
da execução técnica, financeira ou jurídica das prestações contratuais (cfr. art.º 304.º, n.º
2, do CCP). E tais comandos (ordens ou diretivas) devem ser emitidos por escrito ou,
quando as circunstâncias o impuserem, sob a forma oral (a qual deve ser posteriormente
reduzida a escrito e notificada ao cocontratante (cfr. art.º 304.º, n.º 2, do CCP).

Contudo, se uma ordem, diretiva ou instrução do contraente público não for


acatada, aquele não a pode impor coercivamente ao contraente privado.

O poder de fiscalização do modo de execução do contrato consiste na faculdade


do contratante público de vigiar e controlar a execução do contrato, para saber ao certo
como este está a ser executado pelo contraente particular.

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Há todo um conjunto de regras que definem e delimitam este poder, bem como
estabelecem os deveres e sujeições que impendem, em consequência dele, sobre o
contraente particular. E este último não pode, obviamente (ex vi interesse público),
recusar-se à realização pela Administração das diligências que esta entenda (de modo
legítimo e justificado) levar a cabo. O exercício do poder de fiscalização deve ainda ficar
documentado em autos, relatórios ou livros próprios (cfr. art.º 305.º, n.º 3, do CCP).

3.4.3. O poder de modificação unilateral.

Muitos contratos administrativos são contratos de longa duração (v.g., os


contratos de concessão). Assim, as condições, ou circunstâncias, em que foram
celebrados têm tendência a alterar-se com o decurso da sua execução, de tal forma que, o
conteúdo do contrato, tal como ficou estatuído ab initio pelas partes, pode já não
representar, com o decurso do tempo, à melhor forma de prosseguir o interesse público.

Há muito que se reconhece à Administração o poder de modificar unilateralmente


o conteúdo do contrato, com vista a ajustá-lo às novas exigências do interesse público.

O art.º 302.º, alínea c), do CCP, prevê a possibilidade de o contraente público


«modificar unilateralmente as cláusulas respeitantes ao conteúdo e ao modo de execução
das prestações previstas no contrato por razões de interesse público.» Esta modificação
objetiva é, como referimos, determinada por ato administrativo e as razões de interesse
público que a fundamentam decorrem de «necessidade novas ou de uma nova
ponderação das circunstâncias existentes» (cfr. art.º 311.º, n.º 2 e art.º 312.º alínea b), do
CCP).

Mas a modificação referida não pode conduzir à alteração das prestações


principais que constituam, em si mesmas, o objeto do contrato, nem pode configurar uma
forma de impedir, restringir ou falsear a concorrência.

Mais, os atos administrativos que impliquem modificações objetivas do contrato,


ou que representem um valor acumulado superior a 15% do preço contratual, devem, sob
pena de ineficácia, ser imediatamente publicitados pelo contraente público.

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Lapidarmente o que poderá acontecer é o seguinte:

- A Administração pode mudar o contrato, mas não pode mudar de contrato. Se a


Administração quiser mudar de contrato, deverá fazer uso do «poder de resolução
contratual» por motivo de interesse público e, depois celebrar outro contrato. Isto
acontece não só para proteger os interesses do cocontratante, mas também para
salvaguardar os interesses públicos da transparência, da objetividade e da neutralidade
que regem o procedimento administrativo tendente à celebração do contrato.

De facto, o art.º 314.º, n.º 1, alínea b) do CCP, estatui que o cocontratante tem
direito à reposição do equilíbrio financeiro, sempre que o contratante público modifique
unilateralmente o contrato por razões de interesse público. Em qualquer caso, a reposição
do equilíbrio financeiro não pode colocar qualquer das partes em situação mais favorável
do que a que resultava do equilíbrio financeiro inicialmente estabelecido, nem pode
cobrir eventuais perdas que já decorriam desse equilíbrio ou eram inerentes ao risco do
próprio contrato (cfr. art.º 282.º, n.º 6, do CCP).

Em face do que antecede, é legítimo afirmar que estamos perante uma


característica essencial do Direito Administrativo, no caso:

- A procura do permanente equilíbrio entre as exigências do interesse público e a


garantia dos direitos dos articulares.

Ou seja: o interesse público exige um poder de autoridade que não tem paralelo do
direito privado? Pois exige! Só que a lei confere esse poder à Administração não para
sacrificar injustamente os contraentes particulares (que, se assim fosse, seriam levados à
ruína), mas sim impõe (a lei) que se respeite o objeto do contrato e o equilíbrio financeiro
deste - o qual pode levar, nomeadamente, ou à alteração das condições contratuais (por
exemplo, preços), ou à atribuição de uma indemnização compensatória pela
Administração ao contraente particular. As próprias diretivas europeias desde 2014 (a
este respeito) desenvolvem, de forma significativa, na esteira da jurisprudência do TJUE,
a matéria da modificação dos contratos públicos.

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3.4.4. O poder de aplicar sanções.

O 4.º poder que a Administração dispõe em matéria de execução do contrato


administrativo é:

- O poder de aplicar sanções ao contraente particular - seja devido à inexecução


(total ou parcial) do contrato, seja em razão do atraso na sua execução, seja ainda por
qualquer outra forma de execução imperfeita ou defeituosa ou, ainda, porque o contraente
particular trespassou o contrato para outrem sem a devida autorização da Administração
(cfr. art.º 302.º, alínea d) e art.º 329.º, n.º 1, do CCP).

A modalidades típicas do poder de aplicar sanções, são:

a) - A resolução sancionatória;

b) - A aplicação de multas;

c) - O sequestro.

A resolução sancionatória - consiste na extinção do contrato por decisão


unilateral;

A aplicação de multas - tanto pode consistir numa penalidade, como numa medida
compulsória (a tanto por dia, até o faltoso cumprir);

O sequestro - acontece quando o contraente particular abandona o exercício do


poder público que lhe foi conferido pelo contrato administrativo, ou o gere mal, tendo
nestas situações a Administração o direito (se considerar que à luz do interesse público
que essa é a melhor solução) de assumir para si mesma o exercício desse poder e as
obrigações do particular relativamente ao contrato; ficando porém a cargo do contraente
particular todas as despesas que a Administração fizer enquanto a situação durar. A
Administração substitui-se, pois, ao contraente particular no desempenho das obrigações
deste, passando a executar ela própria o contrato, mas despesas que a esse título fizer
devem ser suportadas pelo património do contraente particular.

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3.4.5. O caso imprevisto.

Antes da abordagem do caso imprevisto, é útil (até para seu melhor entendimento)
atendermos a alguma terminologia que não deixa de estar com este relacionada. Assim:

a) O «caso de força maior» - é a situação que impede, em absoluto, o


cumprimento do contrato (v.g., porque ardeu/ruiu o edifício, ou morreu o
devedor de uma prestação infungível). A sua consequência típica é o devedor
ficar exonerado da obrigação;

b) O «caso imprevisto» - é a situação em que ocorre uma alteração de


circunstâncias tão profunda, em relação à base inicial do negócio, que a
execução deste se torna demasiado onerosa e contrária à boa fé para uma das
partes. Pode conduzir à indeminização, ou à revisão dos preços, ou a outra
forma de restabelecimento do equilíbrio financeiro do contrato;

c) O «facto do Príncipe» - é tipicamente a situação em que o Estado soberano, por


ato político-legislativo ou regulamentar, torna impossível, ou excessivamente
onerosa, a prestação do cocontratante privado. A sua consequência típica é uma
das situações das 2 alíneas anteriores;

d) A «modificação unilateral do contrato» - é a situação em que o contraente


público impõe (ou obtém) alterações no objeto ou no conteúdo do contrato,
ficando o cocontratante privado com o direito a uma indemnização, ou à revisão
dos preços, ou - em face da lei atual - à resolução do contrato, em certos casos.

Assim, e tal como ensinava MARCELLO CAETANO, o caso imprevisto é o facto


estranho à vontade dos contraentes que, determinando a modificação das circunstâncias
económicas gerais, torna a execução do contrato muito mais onerosa para uma das
partes do que caberia no risco normalmente considerado.

Neste sentido, se o contrato administrativo tiver de ser executado numa conjuntura


económica que subverta o equilíbrio financeiro estabelecido e que não tivesse sido
prevista [tal conjuntura] no momento da celebração do contrato, por regra, a
Administração deve partilhar os prejuízos verificados, ou deve rever o contrato, tendo em

DANIEL LOURENÇO
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vista (ou por forma) a restabelecer a base de justiça comutativa, essencial ao


reconhecimento legal da respetiva validade.

3.5. Extinção do contrato administrativo

Também no âmbito da «extinção do contrato administrativo» a Administração


Pública possui alguns poderes de autoridade. Assim, merecem-nos destaque a extinção do
contrato por impossibilidade não imputável às partes - o denominado “caso de força
maior” -, bem como as causas especialmente disciplinadas, nas quais são de destacar, a:

- Extinção por acordo das partes («revogação», cfr. art.º 330.º al. b) do CCP);

- Extinção por iniciativa de uma das partes («resolução», cfr. art.º 330.º al. c) do
CCP).

3.5.1. O caso de força maior.

O “caso de forma maior” (“an act of God”, na sugestiva terminologia anglo-


saxónica), consiste no facto imprevisível e estranho à vontade dos contraentes que
impossibilita absolutamente o cumprimento das obrigações contratuais (cfr.
MARCELLO CAETANO). Os casos de força maior parcial podem ainda dar origem a
modificações objetivas do contrato.

É claro que o efeito liberatório do caso de força maior só se verifica depois de a


Administração o aceitar como tal, ou o tribunal, acionado para o efeito, decretar a
cessação da responsabilidade do particular contratante.

3.5.2. A revogação.

O contrato administrativo pode extinguir-se por «revogação», ou seja, por


“acordo mediante o qual as partes extinguem o contrato” (cfr. art.º 331.º do CCP). Este
acordo pode ser celebrado em qualquer momento e deve ele próprio fixar os efeitos

DANIEL LOURENÇO
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associados à extinção do contrato. A revogação não pode revestir forma mesnos solene
do que aquela que a celebração do contrato exigiu.

3.5.3. A resolução por iniciativa do cocontratante.

O direito de resolução é um direito potestativo que, em princípio, só pode ser


exercido por via judicial ou mediante recurso à arbitragem (cfr. art.º 332.º n.º 3 do CCP).

O direito de resolução com fundamento na alteração anormal e imprevisível das


circunstâncias só existe quando a mesma «não implique grave prejuízo para a realização
do interesse público subjacente à relação jurídica contratual ou, caso implique tal
prejuízo, quando a manutenção do contrato ponha manifestamente em causa a viabilidade
económica-financeira do cocontratante ou se revele excessivamente onerosa, devendo,
neste último caso, ser devidamente ponderados os interesses públicos e privados em
presença» cfr. art.º 332.º n.º 3 do CCP).

3.5.4. A resolução por decisão do contraente público.

O contraente público pode, por sua decisão - a qual reveste a natureza de ato
administrativo, cfr. art.º 307.º, n.º 2, do CCP - resolver o contrato administrativo com
base em 3 tipos de fundamentos. Neste sentido, tal resolução pode acontecer por:

a) Incumprimentos contratuais graves ou reiterados do contratante privado;

b) Razões de interesse público;

c) Alteração anormal e imprevisível das circunstâncias.

A “resolução sancionatória” - a resolução do contrato, a título de sanção, é a


mais severa e mais grave sanção em que o contratante privado pode incorrer. Verifica-se
quando o contraente particular não cumpre, ou não cumpre plenamente, de forma
culposa, as suas obrigações por modo a determinar grave prejuízo para o interesse
público.

DANIEL LOURENÇO
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Quando acontece uma violação menos grave, a mesma dará lugar, em principio,
apenas a “multas contratuais”.

O contraente público pode resolver o contrato a título sancionatório, sem prejuízo


do direito de indeminização nos termos gerais, nos casos expressamente mencionados as
alíneas a) a h) do n.º 1 do artigo 333.º (Resolução sancionatória), do CCP.

A “resolução por razões de interesse público” - o contraente público pode


resolver o contrato administrativo por razões de interesse público, devidamente
fundamentadas e mediante pagamento ao cocontratante de justa indemnização (cfr. art.º
334.º do CCP).

Nesta situação, o contraente público pode optar, à luz do princípio da


proporcionalidade, entre a resolução e a modificação equitativa do contrato.

Um caso típico de resolução do contrato administrativo por motivo de interesse


público é o “resgate”, instituto próprio das concessões. Aqui e mediante o “resgate” a
Administração recupera o exercício dos poderes públicos que tinha transferido para o
particular, embora deva, à luz do principio da justiça e do direito fundamental à
propriedade privada (cfr. art.º 62.º da CRP), indemniza-lo por isso, uma vez que o resgate
envolve um sacrifício económico para o concessionário. A indemnização do resgate visa
exatamente restabelecer o “equilíbrio perturbado”.

A “resolução com fundamento na alteração anormal e imprevisível das


circunstâncias” - em caso de alteração anormal e imprevisível das circunstâncias em que
as partes fundaram a decisão de contratar, e desde que a exigência das obrigações afete
gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato
administrativo, o contraente público também pode optar entre a modificação do contrato
e a sua resolução (cfr. art.º 335.º do CCP).

4. As operações materiais administrativas.

Desde muito tempo, a teoria jurídica da atuação administrativa - ou do exercício


do poder administrativo - compreendia apenas 3 categorias:

- A do ato unilateral normativo (ou do «regulamento»);

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- A da decisão unilateral de um caso concreto (ou do «ato administrativo»);

- A do acordo bilateral produtor de efeitos jurídicos (ou do «contrato


administrativo»).

Mais recentemente, a doutrina do Direito Administrativo descobriu uma nova


categoria, ou modalidade de atuação administrativa, de grande importância prática:

- A das «operações materiais administrativas».

São «operações materiais administrativas» - quaisquer tipos de atuação física


levada a cabo pela Administração Pública, em seu nome ou por sua conta, para
conservar ou modificar uma dada situação de facto no mundo real. Exemplos:

- trabalhos de construção civil realizados para a construção de uma obra pública;

- demolição coerciva de um prédio que ameace ruína;

- etc.

As «operações materiais administrativas» têm sempre por objeto uma atuação


física no mundo real. São levadas a cabo por agentes da Administração Pública (polícias,
militares, técnicos de engenharia do Estado, ou municipais, etc.), ou então por
particulares que atuem em seu nome (concessionários) ou por sua conta (empreiteiros de
obras públicas).

4.1. Espécies de operações materiais administrativas.

Existem, pelo menos, 5 espécies de operações materiais administrativas. No caso:

a) - Em razão da sua estrutura - estas operações materiais administrativas podem


ser instantâneas ou continuadas. Neste sentido:

(1) - São instantâneas - aquelas que ocorrem num único momento (por exemplo
a edificação pela polícia de um indivíduo);

(2) - São continuadas - aquelas que se prolongam no tempo, quer através de


uma atuação única (por exemplo a demolição de um edifício), quer através

DANIEL LOURENÇO
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de prestações periódicas (por exemplo o pagamento mensal do vencimento


aos funcionários públicos).

b) Em razão do seu fim - estas podem visar a conservação de uma dada situação de
facto (é o caso da defesa militar, da manutenção da ordem pública, etc.), como
podem ter em vista a modificação de uma situação existente (demolição de
edifícios, abate de árvores, etc.).

c) Em razão do regime jurídico que as regula - as operações materiais


administrativas podem incluir-se no âmbito de 2 atividades de gestão do Estado.
No caso:

(1) - No âmbito da atividade administrativa de gestão pública - é o caso


daquelas operações que são efetuadas no exercício de poderes públicos ou
no cumprimento de deveres públicos, tais como aquelas que impliquem o
exercício de poderes execução coerciva, também denominadas “operações
materiais coativas” (v.g., a atuação da GNR, PSP, SEF, Corpos de
Bombeiros, ASAE, etc.);

(2) - No âmbito da atividade administrativa de gestão privada - são aquelas que


decorrem sob a égide do Direito Privado (v.g., a exploração de florestas, as
atividades técnicas de empresas públicas, etc.).

d) Em razão do seu significado e alcance - as operações materiais administrativas


podem ser:

(1) - Internas - se se efetivam dentro do âmbito da entidade pública que as


promove (v.g., as obras de pequena reparação feitas num edifício público
por técnicos do próprio serviço);

(2) Externas - se as operações materiais administrativas atingem fisicamente a


pessoa, ou o património, de outro ou outros sujeitos de direito.

e) Em razão da sua conformidade com as leis em vigor - as operações materiais


administrativas podem ser:

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(1) - Legais - se respeitarem as leis aplicáveis (por exemplo a demolição de


um edifício que ameace ruir será legal se tiver sido precedida d todas as
formalidades exigidas por lei e cumprir todos os requisitos legais);

(2) - Ilegais - No caso contrário do exemplo que antecede. Sendo que as


operações ilegais podem também ser ilícitas, isto caso violem, ou
sacrificarem, sem fundamento jurídico bastante, os direitos de terceiro,
nomeadamente os direitos dos particulares.

A ilegalidade de uma operação material administrativa, quando não acompanhada


de danos para outrem, em regra só tem consequências disciplinares (ou, nos casos mis
graves, poderá ter consequências criminais ou contra-ordenacionais).

Já se a operação material administrativa for ilícita por ter causado danos


indemnizáveis, a mesma será fonte de responsabilidade civil, sem embargo de outras
formas de responsabilidade que no caso couberem.

4.2. Regime jurídico substantivo das operações materiais administrativas.

Do ponto de vista do Direito Administrativo substantivo as operações materiais


administrativas estão sujeitas aos 3 princípios basilares a que toda a Administração
Pública se encontra submetida, por força do art.º 198.º, n.º 1, da CRA. A saber:

a) - O princípio da prossecução do interesse público;

b) - O princípio da legalidade;

c) - O princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos


particulares.

Destes 3 importantes princípios, resultam, entre outros, os seguintes corolários


que devem ser, também eles, respeitados:

(1) - As operações materiais da Administração Pública devem sempre assentar


numa habilitação legal prévia e desenvolver-se em obediência à lei e ao Direito,
respeitando também os atos ou contratos que devam ser tidos em conta;

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(2) - As operações materiais da Administração Pública só podem se ordenadas


pelos órgãos ou agentes legalmente competentes para o efeito;

(3) - Em harmonia com o princípio da separação de poderes os agentes da


Administração Pública não podem imiscuir-se na resolução de conflitos entre os
particulares que careçam de intervenção do poder judicial, nem realizar
operações materiais de execução de sentenças do âmbito de processos judiciais;

(4) - Na realização de operações materiais a Administração Pública está sujeita a


todos os princípios constitucionais do Direito Administrativo, nomeadamente
aos princípios:

i) Da legalidade da justiça;

ii) Da proporcionalidade;

iii) Do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos


particulares.

(5) - A licitude de quaisquer operações materiais administrativas efetuadas por


agentes ou representantes da Administração Pública depende ainda da estrita
observância das «normas técnicas» e das «regras de prudência comum» que
deviam ser tidas em conta em função dos tipos concretos de operações matérias
de que, em cada caso, se trata.

4.3. Regime jurídico procedimental das operações materiais administrativas.

Se é uma verdade que as operações materiais administrativas podem ser efetuadas


no quadro de um procedimento administrativo executivo destinado à execução coerciva
de um ato administrativo, ou ainda no quadro de execução de um contrato administrativo
(duas situações já atrás destacadas), facto é que, pode também suceder, que a
Administração Pública esteja também habilitada a efetuar operações materiais
administrativas no caso exigidas pelo dever legal de prosseguir os fins de interesse
público, sem que para tanto possa ou tenha de adotar qualquer procedimento
administrativo.

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Os principais tipos de situações onde tal poerá acontecer, são:

a) - Atuação em estado de necessidade - a validade e a licitude das operações


levadas a cabo em “estado de necessidade”, sem serem precedidas de ato
administrativo, nem efetuadas segundo qualquer procedimento regulado por lei
, baseia-se no principio geral de direito necessitas non habet legem (i.e., a
necessidade não tem lei. Aforismo latino que indica a cessação da lei diante da
necessidade). É o caso da atuação dos serviços de bombeiros, da proteção civil,
etc.

b) - Atuação no âmbito de medidas policiais de ação direta - estas medidas estão


previstas na legislação reguladora das forças policiais de segurança, as quais,
maioritariamente, não são precedidas de ato administrativo nem seguem os
trâmites de um procedimento administrativo escrito. É o que acontece quando
um polícia, em ação de vigilância rotineira, tem de intervir de imediato a fim de
acautelar uma ilicitude ou a prática de um crime.

Nestas situações, a urgência como fundamento da ação administrativa imediata


decorre, como diz sugestivamente a doutrina norte-americana, com base no princípio
«now or never».

c) - Atuação n âmbito de operações de prestação de serviços públicos - toda a


atividade dos serviços públicos de transportes coletivos, de distribuição de
água, eletricidade e gás aos domicílios, assistência hospitalar, etc., é composta
de operações materiais (v.g., a condução de veículos, a instalação e conservação
de redes de equipamentos, etc.), as quais não precedidas de atos
administrativos, nem se enquadram em modelos legalmente aprovados de
atuação. Ainda assim, essas operações obedecem a «regras técnicas» que
podem ser fontes de direito e, em certos termos, obrigam os respetivos
profissionais como se fossem normas jurídicas.

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PARTE III
ÂMBITO DE APLICAÇÃO SUBJETIVO DO CÓDIGO DOS CONTRATOS
PÚBLICOS

1. ÂMBITO SUBJETIVO
Embora o Código dos Contratos Públicos pressuponha um conceito amplíssimo
de contrato público (art.1º/2CCP), o CCP não se aplica, nem tem a pretensão de se aplicar
à formação de todos os contratos públicos. Na secção I do CCP recorta-se o âmbito
subjetivo, ou seja, a identificação das entidades que se encontram obrigadas a adjudicar
contratos segundo as regras estabelecidas no CCP (entidades adjudicantes; na Secção II
delimita-se o âmbito objetivo (identificação dos contratos das entidades adjudicantes cuja
formação tem de observar os procedimentos previstos no CCP).
Primeiramente, cabe recapitular conceitos e estruturas básicas de Direito
Administrativo Geral.
Para o Professor VASCO PEREIRA DA SILVA podemos retractar a
Administração Pública com a seguinte ilustração:

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Para o Professor DIOGO FREITAS DO AMARAL temos a seguinte ilustração:

1.1. Entidades Adjudicantes


O CCP aplica-se a entidades adjudicantes. O conceito de entidade adjudicante está
associado à situação funcional em que, no âmbito de um procedimento de adjudicação, se
encontram as entidades como tais indicadas na lei; trata-se das entidades a quem, através
dos órgãos competentes para o efeito, cabe tomar no desfecho do referido procedimento,
a decisão de adjudicação (decisão que consiste em aceitar a única proposta apresentada
ou de escolher uma de entre as propostas apresentadas: art.73ºCCP) ou a designada
decisão de não adjudicação (art.79ºCCP).
O conceito de entidades adjudicantes associa-se, portanto, ao conceito de
adjudicação.
Se atentarmos ao elenco legal das entidades adjudicantes (art.2º/1 e 2 e art.7º
CCP) verificamos que quase todas dispõe de personalidade jurídica. Cumpre, porém,
observar que a revisão do CCP de 2017 acrescentou ao elenco inicial as entidades

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administrativas independentes, as quais não têm, em todos os casos, personalidade


jurídica: assim sucede, por exemplo, com a Comissão de Acesso aos Documentos
Administrativos, que, embora qualificada como entidade administrativa independente,
não tem personalidade jurídica (como a Comissão Nacional de Proteção de Dados;
Comissão Nacional de Eleições, etc.).
Além disso, há uma categoria de entidades adjudicantes que a lei admite poderem
não ter personalidade jurídica: é o caso das centrais de compras.
A consideração de que um organismo desprovido de personalidade jurídica como
a entidade adjudicante não conhece efetivamente qualquer impedimento de ordem
dogmática. Na verdade, o que está em causa é a indicação de uma entidade que fica
obrigada a cumprir regras que disciplinam certas decisões, como a decisão de contratar,
de autorização de despesa inerente ao contrato a celebrar ou de escolha do procedimento
de adjudicação. Ora, em todos os casos, e assim é em relação a todo o ciclo de formação
dos contratos que antecede a respetiva celebração, trata-se em rigor, de regular o
exercício de uma competência para proferir decisões por parte dos órgãos, que não
envolve e não pressupõe a capacidade para contratar, esta sim, ligada à personalidade
jurídica e que reclama a presença de um sujeito de direito, de uma pessoa, singular ou
coletiva.
Em síntese, o conceito de entidade adjudicante não requer a personalidade
jurídica, embora, nos casos de entidades adjudicantes sem personalidade jurídica, se
revele indispensável enquadrar essa entidade na pessoa coletiva a que pertence (art.10º/3
CPTA) e definir qual a pessoa coletiva, dotada de capacidade para contratar, em nome de
quem aquela entidade vai celebrar o contrato adjudicado.
Numa sistematização possível, o Professor PEDRO COSTA GONÇALVES
distingue quatro tipos ou categorias de entidades adjudicantes:
⎯ Entidades adjudicantes institucionais;
⎯ Organismos de direito público;
⎯ Operadores de serviços de rede;
⎯ Centrais de compras.

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1.2. Entidades adjudicantes institucionais (artigo 2º/1 CCP)


Neste âmbito definimos como entidades adjudicantes institucionais aquelas
entidades que, em razão da sua tipificação ou qualificação jurídica geral e originária, o
CCP reconduz de forma imediata e automática à categoria de entidades adjudicantes,
independentemente do tipo de missões que desempenham e das condições em que o
façam (situação que ocorre com todas as entidades com exceção da alínea i)).

1.2.1. Estado
O Estado é a entidade adjudicante indicada em primeiro lugar: assim é no CCP,
bem como nas diretivas europeias da contratação pública.
Em regra, em relação à generalidade dos contratos de compras públicas, o Estado
(Estado-Administração) conduz os procedimentos de adjudicação e contrata através dos
serviços da administração direta integrados nos vários ministérios (serviços centrais e
periféricos) e com base em decisões de órgãos que dirigem esses serviços.
Além desses serviços, naturalmente também contrata em nome do Estado o
próprio Governo, através dos seus membros (ministros, secretários de Estado) e dos
respetivos gabinetes.
Ora, já se sabe que as centrais de compras são entidades adjudicantes (art.2º/3 DL
nº200/2008): em relação aos bens e serviços que adquiram do Estado (destinados ao
Estado), são as centrais e serviços que em, larga medida, atuam como entidades
adjudicantes (adjudicam propostas para contratos a celebrar pelo Estado e acordos-quadro
que dão lugar a contratos a celebrar pelo Estado).

1.2.2. Regiões Autónomas


Enquanto pessoas coletivas publicas, que prosseguem, com autonomia, os
interesses das respetivas populações, as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira
são, para efeitos do CCP, entidades adjudicantes.

1.2.3. Autarquias locais


As autarquias locais são os municípios e as freguesias. Na condição de entidades
adjudicantes, os municípios e as freguesias lançam e conduzem procedimentos de

DANIEL LOURENÇO
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adjudicação através dos respetivos serviços, com base em decisões dos órgãos
competentes (presidente da câmara, conselho de administração dos serviços
municipalizados, câmara municipal e junta de freguesia).

1.2.4. Institutos Públicos


Nos termos da Lei-Quadro dos Institutos Públicos, consideram-se institutos
Públicos, independentemente da sua designação, os serviços e fundos do Estado e das
Regiões Autónomas, quando dotados de personalidade jurídica. Aqui se incluem os
institutos públicos de regime especial, como as universidades e os institutos politécnicos.

1.2.5. Entidades Administrativas Independentes


Não é fácil a descrição do que são entidades administrativas independentes.
Assim, a partir dos dados resultantes dos vários diplomas legais, podemos concluir que o
conceito genérico de entidades administrativas independentes indica órgãos ou
organismos sem personalidade jurídica, como a Comissão de Acesso aos Documentos
Administrativos ou a Comissão Nacional de Proteção de Dados, mas também abrange
entidades com personalidade jurídica, como entidades com funções de regulação da
economia (Autoridade da Concorrência, ANACOM; CMVM, etc.).

1.2.6. Banco de Portugal


Com a revisão de 2017º o Banco de Portugal foi incluído mas com a ressalva do
artigo 5º/8 , ou seja, só se sujeita o Banco de Portugal aos contratos abrangidos pelas
diretivas.

1.2.7. Fundações Públicas


Tendo em consideração o disposto na Lei-Quadro das Fundações, as fundações
públicas podem ser de direito público ou de direito privado. Todas se encontram
abrangidas pelo conceito legal de fundação pública.

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1.2.8. Associações Públicas


A maior parte das associações são entidades privadas. Mas algumas associações
há que a lei cria ou reconhece com o objetivo de assegurar a prossecução de certos fins
ou interesses coletivos, chegando mesmo a atribuir-lhes para o efeito um conjunto de
poderes públicos, ao mesmo tempo que as sujeita a especiais restrições de carácter
público.
Segundo o professor FREITAS DO AMARAL, podemos definir as associações
públicas como sendo as pessoas coletivas públicas, de tipo associativo, destinadas a
assegurar autonomamente a prossecução de determinados interesses públicos
pertencentes a um grupo de pessoas que se organiza com esse fim.
Toda a associação pública tem sempre como base tem sempre como base, por
natureza, um substrato pessoal e associativo, i.e., um agrupamento de sujeitos de direito
organizado em torno de um fim e que tanto pode ser constituído por indivíduos como por
pessoas coletivas.

São 3 as espécies de associações públicas:

1.2.8.1. Associações de entidades públicas

Por vezes, para se designar este tipo de associações utiliza-se a expressão


consórcios públicos.

É a categoria menos controversa. Trata-se de entidades que resultam da


associação, união ou federação de entidades públicas menores e, especialmente, de
autarquias locais. Trata-se também de entidades que, nos últimos anos, se têm
desenvolvido e multiplicado de uma forma muito intensa, sobretudo devido ao sucessivo
adiamento da criação das regiões administrativas.

Os exemplos mais relevantes deste tipo de entidades são:

▪ As áreas metropolitanas, que correspondem a pessoas coletivas públicas


de natureza associativa e âmbito territorial, que visam a prossecução de
interesses públicos, comuns aos municípios que as integram. Segundo o
diploma que as rege estas são “livremente instituídas pelos municípios

DANIEL LOURENÇO
66
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

integrantes das áreas geográficas” da grande Lisboa e do grande Porto,


sendo-lhe cometido um significativo conjunto de atribuições que, por sua
vez, são transformadas em competências dos respetivos órgãos: o
conselho metropolitano, a comissão executiva e o conselho estratégico.

▪ As comunidades intermunicipais, que são constituídas por um contrato,


outorgado pelos presentes dos órgãos executivos dos municípios
envolvidos e celebrado em conformidade com a lei civil. Os estatutos da
associação, que são assim instrumentos jurídicos de direito privado, têm o
seu conteúdo mínimo definido por lei: denominação, sede composição,
fins, bens, etc. No entanto, a mesma lei é clara ao estabelecer que as
comunidades intermunicipais destinam-se à prossecução de fins públicos.

- As associações de municípios e de freguesias de fins específicos, que são


constituídas por contrato, que deve incluir os estatutos da nova entidade, nos
termos da lei civil. Aqui a liberdade constituição e adesão é bastante maior do que
no caso das áreas metropolitanas e das comunidades intermunicipais, sem
prejuízo de se aplicar também o mesmo sistema de desincentivo ao abandono por
parte dos seus membros

1.2.8.2. Associações públicas de entidades privadas

Estas, segundo o professor FREITAS DO AMARAL, são o paradigma das


associações públicas.

Como exemplos podemos apontar as ordens profissionais que basicamente


começaram por ser associações de profissões liberais, embora hoje muitos dos
profissionais inscritos sejam trabalhadores subordinados; e as camaras profissionais. A
diferença entre as duas tem a ver com o grau académico dos associados: curso superior
no caso das ordens e curso intermédio no caso das câmaras (art.11.º da LAPP).

Temos ainda como exemplo as academias científicas e culturais, que são


qualificadas como instituições de utilidade pública, dotadas de personalidade jurídica e
autonomia administrativa e, nalguns casos, estão sob a tutela do Governo ou são órgão

DANIEL LOURENÇO
67
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

consultivo do Governo. Estas são associações públicas por terem atribuições na área do
desenvolvimento, aprofundamento e divulgação do conhecimento científico das artes e da
cultura portuguesa.

1.2.8.3. Associações de carácter misto

Nestas numa mesma associação agrupam-se uma ou mais pessoas coletivas


+públicas e indivíduos ou pessoas coletivas privadas. Nestes casos, há associados
públicos e particulares, uns e outros com direito a participar na assembleia geral ou num
órgão deliberativo equivalente, em proporções variáveis. E nos órgãos executivos estão
também presentes, em conjunto, tanto os representantes do Estado ou de outras pessoas
coletivas públicas, como os representantes dos associados particulares.

Como exemplos temos as Entidades Regionais de Turismo, os centros de


formação profissional de formação profissional partilhada e as cooperativas de interesse
público, que desenvolvem as suas atividades em áreas tão díspares como a música, o
apoio social ou a gestão de matas nacionais.

1.2.9. Associações com participação de entidades adjudicantes do


artigo 2º/1 e sob a influência determinante destas entidades
O preceito refere-se às associações com participação de entidades adjudicantes
institucionais – na qualidade de associadas -, e sob a influencia determinante destas
entidades: a influencia determinante assenta na verificação de, pelo menos, um dos três
fatores que a lei indica. Essencial aqui é, pois, a conjugação entre a participação de uma
entidade adjudicante do artigo 2º/1, na condição de membro da associação ou associado,
e a sua influência determinante sobre a associação.

1.3. Organismos de Direito Público (art.2º/2 CCP)


Além das entidades adjudicantes institucionais, são também entidades
adjudicantes, nos termos do nº2 do art.2º, alínea a), os organismos de direito público.
Organismos de direito público são quaisquer pessoas coletivas que,
independentemente da sua natureza pública ou privada:

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

⎯ Tenham sido criadas especificamente para satisfazer necessidades de


interesse geral, sem carácter industrial ou comercial, entendendo-se como
tal aquelas cuja atividade económica se não submeta à lógica do mercado e
da livre concorrência, designadamente por não terem fins lucrativos ou por
não assumirem os prejuízos resultantes da sua atividade; e,
⎯ Sejam maioritariamente financiadas pelas entidades referidas no número
anterior, estejam sujeitas ao seu controlo de gestão ou tenham um órgão de
administração, de direcção ou de fiscalização cuja maioria dos titulares
seja, direta ou indiretamente, designada por aquelas entidades;
O conceito jurídico de organismo de direito público é uma construção do direito
da União Europeia, idealizada originariamente para prevenir o fenómeno da fuga ao
direito da contratação pública pelas entidades adjudicantes institucionais. A figura
responde, assim, a uma exigência de recorte funcional, e abrange quaisquer entidades,
independentemente da respetiva natureza jurídica, que se dediquem a missões sem caráter
comercial e que apresentem sinais de dependência económica ou jurídica em relação às
entidades adjudicantes institucionais.
O conceito indica entidades ou organismos que conjugam quatro elementos (o
Professor PEDRO COSTA GONÇALVES defende apenas 3 elementos; seguimos o
critério defendido pela Professora ANA GOUVEIA MARTINS, em sede de aula
prática):
⎯ Tratar-se de pessoas coletivas;
⎯ Criadas especificamente para satisfazer necessidades de interesse geral;
⎯ Sem caráter industrial ou comercial;
⎯ Sob a estreita dependência de entidades adjudicantes do artigo 2º/1.
Estes quatro requisitos correspondem a requisitos de verificação cumulativa.
Como critério a seguir na ponderação sobre a recondução de uma entidade em
concreto ao conceito de organismo de direito público, importa atender ao facto de estar
em causa uma qualificação jurídica que determina a sujeição da entidade em causa à
aplicação das regras da contratação pública, razão pela qual, di-lo o TJ sem surpresa, se
trata de uma noção que deve ser entendida em sentido amplo (cf. Acórdão de 27/02/2003,
Adolf Truley, Proc. C-373/00).

DANIEL LOURENÇO
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1.3.1. Pessoas Coletivas


Como as diretivas, o CCP determina que são organismos de direito público
pessoas coletivas. É irrelevante que se trate de pessoas coletivas de direito público ou de
direito privado; afastadas do conceito ficam as pessoas singulares, bem como as
entidades sem personalidade jurídica.
A condição de organismo de direito público não é fonte, nem critério de
atribuição da personalidade jurídica. Trata-se, antes, de uma qualificação que se aplica a
uma entidade que tem personalidade jurídica.

1.3.2. Satisfazer necessidades de interesse geral


A expressão utilizada pelo artigo parece dar muita relevância ao ato constitutivo.
Apesar desta referencia, a jurisprudência do TJUE já esclareceu há muito tempo que, para
este efeito, o que conta não é exatamente o que consta do ato constitutivo de uma
entidade, mas a atividade por esta efetivamente exercida. Assim é, pelo menos, desde que
no Acórdão de 12/12/2002, Universale Bau, Proc. C-470/99, decidiu que uma entidade
que não foi criada para satisfazer de um modo especifico necessidades de interesse geral
mas que posteriormente veio a assumir essas necessidades, cuja satisfação assegura
efetivamente desde então, satisfaz a condição (…) para poder ser qualificada de
organismo de direito público (…), desde que o facto de assumir a satisfação dessas
necessidades possa objetivamente ser verificado. Ficou claro, também, que o que releva
não é o que está inscrito nos estatutos mas a atividade efetivamente exercida.
Por outro lado, o facto de uma entidade ter sido criada e dedicar-se a atividades
sem interesse geral ou com caráter industrial ou comercial não obsta à sua qualificação
como organismo de direito público. Precisamente a este respeito, o TJ estabeleceu uma
teoria que viria a ser baptizada teoria do contágio, segundo a qual, para qualificar uma
entidade como organismo de direito público, não é necessário que a entidade se dedique
de modo exclusivo, nem tão-pouco predominante à satisfação de necessidades de
interesse geral sem caráter industrial ou comercial (Acórdão de 15/01/9, Mannesmann).
Na génese da referência ao elemento da prossecução de missões ou atividades que
satisfazem necessidades de interesse geral encontra-se o objetivo de não deixar escapar

DANIEL LOURENÇO
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da aplicação das regras da contratação pública atividades que pertencem originariamente


ao Estado Administrativo e por cuja execução este é responsável.
A interpretação do TJUE em definir se determinada atividade visa ou não
satisfazer o interesse geral tem sido bastante generosa.

1.3.3. Sem natureza comercial ou industrial


O que agora está em causa é a definição das condições de mercado em que um
determinado organismo exerce as suas missões, para o efeito de o submeter, ou não, às
regras da adjudicação de contratos públicos. Assim, quando uma certa entidade exercer
uma atividade em condições normais de mercado concorrencial, com o objetivo do lucro
e exposta ao risco de perdas, é natural e normal que oriente as suas compras por
considerações económicas, como faz qualquer operador económico, qualquer empresa.
Ou seja, em condições normais de mercado e atuando como operador económico comum,
qualquer entidade efetua as suas compras de acordo com critérios de racionalidade
económica. Não se exige aqui a aplicação das regras da contratação pública, as quais têm
precisamente o objetivo de impor a racionalidade económica nos processos de compras.
Ora, nesse caso, não haverá necessidade de impor um resultado que o operador
económico vai procurar naturalmente obter.
Como foi definido no Acórdão Taitotalo, o considerado da Diretiva indica que a
qualificação de uma entidade como organismo de direito público reclama uma
ponderação assente na consideração de três fatores principais: determinar se essa
entidade:
⎯ Opera em condições normais de mercado (exposto à concorrência, não
tem o monopólio da atividade)
⎯ Prossegue um fim lucrativo (na jurisprudência do TJUE não é
determinante);
⎯ Suporta as perdas associadas à atividade (o exercício de uma atividade
económica em condições normais de mercado envolve o risco de perdas e,
a final, o risco da falência do operador; ora, se um organismo atua no
mercado protegido por um regime jurídico que transfere para outrem as
perdas ou prejuízos ou que pressupõe que um terceiro vai cobrir as perdas

DANIEL LOURENÇO
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da sua atividade e proceder à sua recapitalização, podemos concluir que


não está exposto ao risco de mercado e tem assegurada a sua existência
sejam quais forem os seus resultados económicos).

1.3.4. Sob a estreita dependência de entidades adjudicantes do


artigo 2º/1.
Um ultimo requisito depende da verificação de que a mesma entidade se encontra
sob a influencia determinante de uma ou mais entidades adjudicantes do art.2º/1 ou de
outros organismos de direito público.
A situação de influencia determinante/estreita dependência verifica-se por força
da presença de um ou de mais do que um de três fatores:
⎯ O financiamento maioritário das suas atividades;
⎯ Controlo da sua gestão;
⎯ Designação de mais de metade dos seus dirigentes por uma qualquer
entidade adjudicante do artigo 2º/1 ou por um outro organismo de direito
público.
É suficiente a verificação de um destes três fatores.

1.4. Entidades adjudicantes dos setores especiais (art.7º CCP)


O artigo 7º ocupa-se das entidades adjudicantes que desenvolvam certas
atividades no âmbito dos designados setores especiais: atividades nos setores da água,
energia, transportes e serviços postais. Ali se indica que são ainda entidades adjudicantes
as seguintes:

1.4.1. Quaisquer pessoas colectivas não abrangidas pelo artigo 2.º,


ainda que criadas especificamente para satisfazer necessidades de interesse
geral, com carácter industrial ou comercial, que exerçam uma ou várias
actividades nos sectores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais
e em relação às quais qualquer das entidades adjudicantes referidas no artigo 2.º
possa exercer, directa ou indirectamente, uma influência dominante;

DANIEL LOURENÇO
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O artigo 7º/2 esclarece que o sentido do conceito de influencia dominante


utilizado na alínea a) do seu nº1: considera-se que uma entidade adjudicante pode exercer
influencia dominante quando detiver, nomeadamente, (i) a maioria do capital social; (ii) a
maioria dos direitos de voto; (iii) o controlo de gestão ou (iv) o direito de designar, direta
ou indiretamente, a maioria dos titulares de um órgão de administração, de direção ou de
fiscalização.
São abrangidas, por exemplo, empresas públicas e empresas municipais que
atuem nos setores especiais, expostas ou não à concorrência.

1.4.2. Quaisquer pessoas colectivas não abrangidas pelo artigo 2.º que
gozem de direitos especiais ou exclusivos não atribuídos no âmbito de um
procedimento de formação de contrato com publicidade internacional e que
tenham por efeito:
i) Reservar-lhes, isolada ou conjuntamente com outras entidades, o
exercício de uma ou várias actividades nos sectores da água, da energia, dos
transportes e dos serviços postais; e,
ii) Afectar substancialmente a capacidade de quaisquer outras entidades
exercerem uma ou várias dessas actividades;

Em conformidade com este preceito seriam entidades adjudicantes as empresas


concessionárias que explorem atividades dos setores especiais. Dizemos que seriam e não
que são, dado que, em regra, as concessões, que atribuem direitos exclusivos, são
contratos adjudicados no âmbito do procedimento publicados no JOUE. Neste caso, as
empresas concessionárias que exerçam atividades nos setores especiais não se qualifica
como entidades adjudicantes, pois gozam de direitos especiais ou exclusivos atribuídos
no âmbito de um procedimento de formação do contrato com publicidade internacional.

1.4.3. Quaisquer pessoas colectivas constituídas exclusivamente por


entidades adjudicantes referidas nas alíneas anteriores ou que sejam por elas
maioritariamente financiadas, estejam sujeitas ao seu controlo de gestão ou
tenham um órgão de administração, de direcção ou de fiscalização cuja maioria

DANIEL LOURENÇO
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dos titulares seja, directa ou indirectamente, designada por aquelas entidades,


desde que se destinem ao exercício em comum de actividade nos sectores da água,
da energia, dos transportes e dos serviços postais.

1.5. Centrais de compras


Nos termos do artigo 260º/1, as entidades adjudicantes referidas nos nº1 e 2 do
artigo 2º CCP podem constituir centrais de compras para centralizar a contratação de
empreitadas de obras públicas, de locação e de aquisição de bens móveis ou de aquisição
de serviços.
Embora a lista do artigo 2º não o indique, as centrais de compras constituídas
pelas entidades adjudicantes desse art.2º são entidades adjudicantes: além de isto resultar
da sua própria natureza, di-lo expressamente o artigo 2º/3 do DL 200/2008. No
desenvolvimento de atuaçoes enquanto entidades adjudicantes, as centrais de compras
estão sujeitas ao CCP: art.261º/2.
Conforme dispõe o artigo 2º/2 do DL nº200/2008, as centrais de compras podem
ser quaisquer entidades, públicas ou privadas, ou serviços públicos ainda que desprovidos
de personalidade jurídica.
Em termos gerais, as centrais de compras desenvolvem dois tipos fundamentais de
missões ou atividades: (i) atuam como compradoras grossistas, comprando no mercado
grandes quantidades de produtos ou serviços para posterior revenda às entidades
adjudicantes e (ii) desempenham um papel de intermediação nos processos de
contratação entre as entidades adjudicantes e os operadores económicos.

1.6. Variabilidade dos termos da aplicação da Parte II do CCP em função


da entidade adjudicante
O facto de uma entidade se qualificar como entidade adjudicante não responde
logo à questão de saber em que termos precisos se lhe aplica a Parte II do CCP. Com
efeito, os termos dessa aplicação variam em função da localização da entidade
adjudicante, no art.2º/1, no art2º/2 ou no art.7º. O CCP revela-se um código de aplicação
de geometria variável, em função do tipo de entidades adjudicantes, combinado com o
tipo de contratos que as mesmas celebram.

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Em relação às entidades do art.2º/1 (exceto o Banco de Portugal), temos a


aplicação mais exigente da Parte II do CCP, pois, com a ressalva dos contratos excluídos,
todos os contratos dessas entidades cujo objeto abranja prestações que estão ou sejam
suscetiveis de estar submetidas à concorrência de mercado ficam sujeitos à incidência da
Parte II: art.5º/1, a contrario, e art.16º/1. Por outro lado, os contratos a celebrar por essas
entidades que digam direta e principalmente respeito a atividades dos setores especiais
não beneficiam do regime especifico de formação desses contratos (art.12, a contrario).
Em relação às entidades do art.2º/2 (organismos de direito público) e ao Banco de
Portugal, a Parte II do CCP não se aplica aos contratos que não abranjam prestações
típicas dos contratos de empreitada de obras públicas, de aquisição de serviços, de
aquisição de bens móveis, de concessão de obras públicas e de concessão de serviços
públicos (art.5º/8). Por outro lado, estas mesmas entidades beneficiam do regime de
contratação nos setores especiais, relativamente aos seus contratos que digam direta e
principalmente respeito a uma ou várias atividades dos setores especiais (art.12º e 33º).
Quanto às entidades adjudicantes do art.7º, bem como aos organismos de direito
público em relação aos contratos que celebrem no âmbito dos setores especiais, a Parte II
do CCP só se aplica nos termos do designado regime da contratação nos setores
especiais.

1.7. Extensão do âmbito de aplicação da Parte II do CCP


Os artigos 275º e 276º procedem a uma extensão do âmbito de aplicação da Parte
II do CCP.

1.7.1. Entidades com contratos subsidiados


Nos termos do artigo 275º/1, a Parte II do CCP aplica-se à formação de
determinados contratos de empreitadas de obras, bem como de contratos de aquisição de
serviços associados a essas empreitadas, quando celebrados por entidades não previstas
no artigo 2º e no artigo 7º, ou seja, quando celebrados por entidades não adjudicantes.

DANIEL LOURENÇO
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17.1.1. Contratos abrangidos em razão do objeto e do valor


Nos termos da lei, mais concretamente, do artigo 275º CCP, são abrangidos pelo
regime dos contratos subsidiados:
⎯ Contratos de empreitada de obras subsidiados diretamente em mais de
50 % do respetivo preço contratual por entidades adjudicantes, sendo o
referido preço contratual igual ou superior ao limiar previsto na alínea a)
do n.º 3 do artigo 474.º, caso envolvam uma das seguintes atividades:
a) Atividades de construção civil enumeradas no anexo xi ao presente
Código, do qual faz parte integrante;
b) Obras de construção de hospitais, instalações desportivas, recreativas
e de ocupação de tempos livres, estabelecimentos escolares e
universitários e edifícios para uso administrativo;
Os contratos subsidiados são contratos de empreitada de obras, mas não de obras
públicas; não têm por objeto a execução de obras por conta de um contraente público
(art.343/2), nem no interesse económico direto do contraente público; abrangidas são,
pois, as obras privadas, executadas por conta de uma entidade não adjudicante, embora
com apoios financeiros de entidades adjudicantes.
⎯ Contratos de serviços subsidiados diretamente em mais de 50 % do
respetivo preço contratual por entidades adjudicantes, sendo o referido
preço igual ou superior ao limiar previsto na alínea c) do n.º 3 do artigo
474.º, quando estejam associados a um contrato de empreitada de obras
na aceção da alínea anterior.
O artigo 275º não estabelece um regime geral de adjudicação de contratos
subsidiados por entidades adjudicantes, pelo que os contratos subsidiados que não tenham
por objeto empreitadas de obras indicadas na lei ou serviços associados a essas
empreitadas não são abrangidos pela extensão do âmbito de aplicação do CCP.
Por fim, abrangidos pelo conceito de contratos subsidiados são apenas os que têm
um valor estimado superior aos limiares europeus: 5.548.000EUR, no caso de
empreitadas, e 221.000EUR no caso de aquisições de serviços. Estes montantes referem-
se ao valor estimado dos contratos.

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17.1.2. Contratos subsidiados diretamente por entidades


adjudicantes
As entidades adjudicantes a que o artigo 275º se refere, que concedem os
subsídios, são, naturalmente, as entidades adjudicantes indicadas nos artigos 2º a 7º CCP.
Nos termos da lei, os subsídios deverão ser concedidos diretamente em vista da
celebração de um determinado contrato: não estão aqui envolvidos subsídios concedidos,
em geral, a uma certa entidade, para esta aplicar genericamente no desenvolvimento das
suas missões, mas a atribuição de um subsidio para a execução de um projeto definido e,
neste sentido, para a celebração do contrato que, em especial, se destina a pôr em marcha
a execução desse projeto.
Relativamente ao conceito de subsidio, o TJ já decidiu que pode tratar-se de
prestações positivas, como a transferência de dinheiro, mas também negativas, como a
redução de impostos ou taxas diretamente associados à execução de um projeto. Portanto,
regra geral, este termo não se limita a prestações positivas. Assim, segundo o TJ, os
benefícios fiscais podem ser considerados subsídios. Essencial é, pois, que esteja em
causa a concessão de apoio ou atribuição de uma vantagem económica à qual possa ser
atribuído um valor monetário e a que não corresponde qualquer contrapartida especifica a
realizar pelo beneficiário.

DANIEL LOURENÇO
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PARTE III
ÂMBITO DE APLICAÇÃO SUBJETIVO DO CÓDIGO DOS CONTRATOS
PÚBLICOS

2. CONTRATOS ABRANGIDOS
2.1. Contratos de Procura Pública
O CCP noa se aplica a todos os contratos públicos mas apenas a contratos de
procura pública (com interesse concorrencial) pela insistência do artigo 1º/2: aqui se
começa por aludir ao regime da contratação pública estabelecido na Parte II, indicando
que é esse o regime aplicável aos contratos públicos que não sejam excluídos.
No modelo idealizado pelo legislador, o contrato surge como o resultado de um
procedimento que se inicia com uma decisão de contratar da entidade adjudicante: a
iniciativa pertence à entidade adjudicante, por ser esta que se depara com uma
determinada necessidade a satisfazer e que tem, de seguida, de avaliar a oportunidade de
contratar e decidir se deve fazê-lo. A referência à decisão de contratar e toda a lógica do
procedimento de adjudicação como um procedimento de iniciativa oficiosa inscrevem-se
na compreensão do contrato a celebrar nesse âmbito como um instrumento de satisfação
de uma necessidade própria da entidade adjudicante e, por outro lado, na compreensão
geral do contratante seleccionado como um colaborador da entidade adjudicante.
O modelo da tramitação procedimental delineado em cada um dos procedimentos
de adjudicação regulados na Parte II do CCP não deixa duvidas de que a sujeição a essa
disciplina só faz sentido em relação a contratos de procura pública.
Na verdade, todo o dispositivo da Parte II está baseado na idealização de um
procedimento desencadeado pela entidade adjudicante e ordenado para a ajudicação de
um contrato em que o contraente privado se vê convocado a executar, a desenvolver uma
atividade em execução do contrato; neste sentido, todo o contexto normativo, sem
qualquer exceção, aponta para um tipo de contratação de colaboração, que atribui a
execução ao contratante privado; são, por conseguinte, as prestações que este se obriga a
efetuar em execução do contrato, que correspondem à razão de ser do próprio contrato.

DANIEL LOURENÇO
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2.1.1. Interesse Concorrencial


A Parte II do CCP visa disciplinar a formação de contratos de procura pública.
Mas, nem todos os contratos de procura pública se devem considerar abrangidos. Com
efeito, submetidos à disciplina da contratação pública encontram-se os contratos de
procura pública com interesse concorrencial.
No entendimento do Professor PEDRO COSTA GONÇALVES, o enunciado do
nº1 do art.16º pretende traduzir a ideia de contratos com interesse concorrencial. Do que
se trata, pois, é de basear o critério de sujeição de contratos aos procedimentos de
adjudicação regulados no CCP na existência possível, provável ou eventual de uma
pluralidade de interessados em celebrar cada um daqueles contratos.
A lei segue, portanto, uma orientação que atende ao potencial interesse ou À
eventual aspiração, comum a vários operadores de mercado, em alcançar o beneficio
económico resultante de um contrato público. Interesse e aspiração de facto, que, por
força do principio da igualdade de acesso à contratação, que vincula a entidade
adjudicante, pode transformar-se em interesse legitimo em participar no procedimento de
adjudicação.
O interesse dos operadores económicos em participar no procedimento de
adjudicação, de seleção concorrencial, e, desse modo, em concorrer ou competir pela
celebração do contrato corresponde ao respetivo interesse em vender o bem ou o serviço
e em obter, como resultado dessa venda, um beneficio económico.
Quando isto sucede, o contrato público surge como um bem escasso e disputado,
que suscita a competição entre os vários interessados na obtenção das vantagens que dele
decorrem: estamos, então, perante um contrato com interesse concorrencial, um contrato
cujo objeto abrange prestações que estão ou são suscetiveis de ser submetidas à
concorrência de mercado

2.1.1.1. Interesse concorrencial: o benefício económico


O contrato de procura pública é um objeto disputado, e tem interesse
concorrencial, pelo facto de produzir ou gerar uma vantagem, um beneficio económico
para quem vier a celebrá-lo. Esta vantagem ou beneficio económico pode ser medida em
função do respetivo valor: neste sentido, e considerando a perspetiva do beneficiário

DANIEL LOURENÇO
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(adjudicatário), podemos definir o valor do contrato como o valor do beneficio que o


contrato gera para o adjudicatário.
É precisamente esse o propósito do art.17º/1, ao estabelecer que o valor do
contrato a celebrar é o valor máximo do beneficio económico que (…) pode ser obtido
pelo adjudicatário com a execução de todas as prestações que constituem o objeto.
Importa, então, perceber em que pode consistir este valor máximo do beneficio
económico para o adjudicatário. Ora, conforme a lei indica, o beneficiário económico
pode corresponder: (a) ao preço contratual e, ou ao valor de quaisquer contraprestações
da entidade adjudicante em favor do adjudicatário; (b) ao valor das vantagens que
decorrem diretamente para o adjudicatário da execução do contrato e que possam ser
configuradas como contrapartida das prestações que lhe incumbem.

a) Beneficio económico correspondente ao preço contratual e, ou ao


valor de quaisquer contraprestações da entidade adjudicante
A referência ao benefício económico resultante da celebração de um contrato liga-
se, em geral, à onerosidade do contrato para a entidade adjudicante. Em regra, a
celebração do contrato público representa um encargo para a entidade adjudicante, que
envolve, em princípio, a mobilização de recursos financeiros públicos, e, portanto, o
pagamento de um preço. Neste caso, o benefício económico a alcançar pelo contratante
privado resulta precisamente da remuneração que aufere, o preço, que é a contrapartida
da prestação que ele próprio realiza. Veja-se, a este respeito, o art.17º/1 e parte inicial do
nº2, ao indicar que o benefício económico inclui o preço a pagar pela entidade
adjudicante.
O interesse concorrencial e, portanto, o benefício económico não se confundem
com o lucro, nem residem na realização de um lucro. Isto é assim porque a prestação da
entidade adjudicante, o preço, pode limitar-se a cobrir os custos incorridos na execução
do contrato pelo contratante. Apesar da ausência de escopo lucrativo, está presente um
interesse concorrencial em obter o contrato e em alcançar o valor do benefício económico
que do mesmo resulta, ou seja, o preço.

DANIEL LOURENÇO
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O interesse concorrencial e a procura de um benefício económico estão presentes


em contratos em que a entidade adjudicante não assume um encargo de remunerar o
contratante.
Como se esclarece no nº2 do art.17º, o benefício económico pode resultar de
outras contraprestações a efetuar pela entidade adjudicante em favor do adjudicatário. Eis
o que se verifica quando o contrato é um processo pela qual a entidade adjudicante atribui
ao adjudicatário o direito ao exercício de uma atividade geradora de receitas: assim
sucede com as concessões de obras públicas, em que o contratante é remunerado por
terceiros, utentes ou utilizadores dos serviços. Não se exclui sequer que, em contratos de
procura pública como esses ou análogos, recaia sobre o contratante o dever de efetuar
pagamentos à entidade adjudicante: é o que se verifica nos contratos em que o contratante
privado, por exemplo, o concessionário de uma obra pública, paga rendas, v.g., porque se
estima que o que vai receber dos utilizadores excede o necessário para assegurar o
equilíbrio financeiro do contrato. Nestas situações, o benefício económico do
adjudicatário traduz-se em o mesmo assumir a titularidade de um direito exclusivo ao
exercício de uma atividade económica que via gerar um lucro. Por sua vez, o caráter
oneroso para a entidade adjudicante decorre da transmissão do direito ao exercício dessa
atividade para o adjudicatário.
A contrapartida da entidade adjudicante pode ainda consistir noutras prestações,
como por exemplo, a cedência gratuita de bens ou a dispensa de pagamento de taxas.

b) Beneficio económico assente em vantagens diretas decorrentes da


execução do contrato pelo contratante que não correspondem a
contraprestações da entidade adjudicante
Nos casos a que se refere a alínea anterior, subsiste uma correspondência entre o
conceito de contratos com interesse concorrencial e de onerosidade: são abrangidos
contratos sinalagmáticos, que envolvem a presença de uma prestação da entidade
adjudicante que é uma contrapartida da prestação do contratante. A prestação da entidade
adjudicante pode consistir num preço ou em quaisquer contraprestações a efetuar em
favor do adjudicatário, como, por exemplo, a transmissão de um direito ao exercício de
uma atividade.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Todavia, o direito português ignora a exigência de onerosidade como elemento


constitutivo do contrato público e admite existir interesse concorrencial em contratos de
procura pública que não envolvem qualquer encargo a suportar pelo contraente público.
Com efeito, o art.17/2 considera que o benefício económico pode consistir no valor das
vantagens que decorram diretamente para o adjudicatário da execução do contrato e que
possam ser configuradas como contrapartidas das prestações que lhe incumbem:
suponha-se o contrato de fornecimento gratuito de equipamento para deficientes com o
mero propósito de incremento das vendas por via da publicidade feita a partir desse
fornecimento gratuito.
Na medida em que se possa estabelecer um link entre a execução de um contrato
público e a produção de quaisquer vantagens diretas para o adjudicatário que se possam
configurar como contrapartidas das suas prestações, a lei assume que o contrato nessas
condições, embora não oneroso (portanto, gratuito) para a entidade adjudicante, produz
um beneficio económico para o contratante, e corresponde a um contrato com interesse
concorrencial, logo tem de ser sujeito ao CCP. Ou seja, num contrato com estas
características, o adjudicatário não atua com um espirito de liberalidade, mas em busca de
uma utilidade ou benefício económico, com o objetivo de alcançar vantagens que
decorram diretamente (…) da execução do contrato e que possam ser configuradas como
contrapartidas das prestações que lhe incumbem.
Em síntese, na delimitação dos contratos submetidos à Parte II, a lei segue uma
orientação que acaba por se revelar indiferente ao facto de os mesmos envolverem, ou
não, encargos para a entidade adjudicante e reclamarem desta, ou não, uma
contraprestação: por isso, o CCP prescinde do requisito da onerosidade. Neste domínio,
repete-se a lógica do CCP inspira-se, não no caráter oneroso do contrato para a entidade
adjudicante, mas no benefício económico que o contrato proporciona ao adjudicatário.
Uma vez que o interesse em alcançar este benefício económico é partilhado por vários
agentes, podemos falar em interesse concorrencial: assim se explica que a Parte II do
CCP tenha o propósito de regular a formação dos contratos de procura pública cujo
objeto abranja prestações que estão ou sejam suscetiveis de estar submetidas à
concorrência de mercado, o legislador percepciona, pois, o contrato submetido à Parte II

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do CCP como um bem jurídico escasso que interessa ou pode interessar a uma
pluralidade de entidades.
A submissão de contratos gratuitos às regras dos procedimentos de adjudicação de
contratos públicos, idealizadas para contratos onerosos, coloca algumas dificuldades, por
exemplo, quanto à decisão de escolha do procedimento em razão do valor (trata-se de
contratos que não têm custos para a entidade adjudicante) ou quanto à definição de
critérios de adjudicação.

2.1.1.2. Contratos sem interesse concorrencial


Os contratos sem interesse concorrencial, que não produzem um beneficio
económico para um agente determinado com exclusão de todos os outros, não são
abrangidos pela incidência do CCP. Trata-se, pois, de contratos não incluídos, porque não
abrangidos pelo âmbito de incidência do CCP. Assim, parece suceder, em regra, com os
contratos sem valor, que não geram qualquer beneficio económico ou vantagem que se
possa configurar como contrapartida das prestações efetuadas pelos contratantes: a
produzir-se alguma, tratar-se-á de uma vantagem de minimis, indireta e residual.
Não obstante a ausência de interesse concorrencial, o CCP estabelece regras
aplicáveis aos contratos sem valor, incluindo-os, assim, na sua esfera de intervenção:
art.21/2, aplicável a quaisquer contratos sem valor, com exceção dos contratos de
concessão de obras públicas ou de serviços públicos e dos contratos de sociedade
(art.31/2).

2.2. Delimitação em Função das Entidades Adjudicantes


O conceito de contratos públicos com interesse concorrencial delimita o âmbito
da incidência objetiva máxima da Parte II do CCP. Mas, em termos práticos, a Parte II do
CCP acaba por não atingir uma incidência efetiva em relação a todos os contratos
abstractamente atingidos, desde logo por força de exclusões efetuadas pelo próprio CCP:
art.4º, 5º, 5º-A e 6º-A. Além desta circunstancia, deve ainda recordar-se que,
precisamente em relação a este ponto, o âmbito de incidência objetiva do CCP não atinge
nos mesmos termos todas as entidades adjudicantes.

DANIEL LOURENÇO
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2.2.1. Entidades adjudicantes institucionais


Em relação às entidades adjudicantes institucionais (art.2º/1) o CCP aplica-se com
a sua intensidade máxima. Assim, todos os contratos dessas entidades que correspondam
a contratos de procura pública com interesse concorrencial, nos termos indicados, são
abrangidos. Por isso mesmo, a menos que sejam expressamente excluídos do âmbito de
aplicação do CCP, a formação de todos esses contratos de tais entidades tem de se
afeiçoar às regras de adjudicação estabelecidas na Parte II do CCP.

2.2.2. Organismos de Direito Público e Banco de Portugal


Dispõe-se no art.5º/8 que a parte II do presente Código não é aplicável aos
contratos celebrados pelas entidades referidas no nº2 do art.2º, e pelo Banco de
Portugal, que não abranja prestações típicas de empreitada de obras públicas,
concessão de obras públicas, concessão de serviços públicos, locação e aquisição de
bens móveis ou aquisição de serviços.
Quer dizer, o CCP determina a sua aplicação, não em razão da presença de um
contrato com as notas constitutivas de um contrato de empreitada de obras públicas, de
concessão de obras públicas, de concessão de serviços públicos, de locação de bens
móveis, de aquisição de bens móveis ou de aquisição de serviços, mas em função da
presença de um qualquer contrato que inclua prestações próprias destes contratos.
Não obstante o que acaba de se expor, deve entender-se que a qualificação típica
do contrato é determinada pelo respetivo objeto principal, o qual, por sua vez, é
caracterizado pelas respetivas prestações essenciais: neste sentido, cf. art.32º/2. De resto,
a referencia de cada contrato a um tipo contratual revela-se essencial no quadro de
aplicação das diretivas, as quais se aplicam a tipos de contratos.

2.2.3. Entidades adjudicantes dos setores especiais e organismos


de direito público que exercem atividades dos setores
especiais
Em relação às entidades adjudicantes indicadas no art.7º e diferentemente da
opção que adotou no art.5º/8, o CCP seguiu um sistema de inclusão taxativa e
identificou os contratos abrangidos. Assim, nos termos do art.11/1, a Parte II do CCP só

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é aplicável aos contratos que preencham cumulativamente determinada condições ou


requisitos
a) Contratos relativos a atividades dos setores especiais
O designado regime dos setores especiais aplica-se aos contratos das entidades
adjudicantes do art.7º e do art.2º/2 que digam direta e principalmente respeito a uma ou
a várias das atividades por elas exercidas nos setores da água, da energia, dos
transportes e dos serviços postais.
O CCP delimita o âmbito de aplicação do regime de contratação dos setores
especiais, para os contratos das entidades adjudicantes do art.7º que digam direta e
principalmente respeito a uma atividade dos setores especiais.
Impõe-se, pois, dilucidar as circunstancias em que se pode considerar que um
determinado contrato diz direta e principalmente respeito a uma atividade dos setores
especiais.
Ora, deve dizer-se que a formulação acolhida no CCP, desde a versão originária
não se apresenta acertada. Diferentemente do que acontece no CCP, a formulação das
Diretivas aponta, de forma clara, no sentido de se dever considerar que as regras
particulares dos setores especiais se aplicam aos contratos adjudicados para o exercício
dessas atividades. Exatamente nesta linha, o TJ esclareceu que só estão abrangidos pelo
âmbito de aplicação da Diretiva os contratos que uma entidades, que tenha a qualidade
de entidade adjudicante na aceção desta diretiva, celebre no contexto e para o
exercício de atividades nos setores previstos nos artigos 3º a 7º da referida diretiva. A
fórmula correta, do ponto de vista do direito europeu, conduz, pois, a considerarem-se
abrangidos pelas regras dos setores especiais contratos celebrados para o exercício de
atividades desenvolvidas nesses setores.
Por força do imperativo de respeito pelo direito europeu que transpõe, é a esta
luz que o CCP tem de ser interpretado e aplicado. Assim, a fórmula contratos que dizem
direta e principalmente respeito a uma atividade nos setores especiais são todos os que
uma entidade adjudicante celebra no contexto e para o exercício dessa atividade. Numa
outra fórmula, que, no Acórdão há pouco citado, o TJ também utiliza, as regras dos
setores especiais aplicam-se aos contratos celebrados por entidades adjudicantes na

DANIEL LOURENÇO
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medida em que estão relacionados com a atividade que a mesma exerce nos setores
referidos.
b) Contratos que abranjam certas prestações típicas
O regime dos setores especiais só é aplicável na medida em que o objeto dos
contratos relativos a atividades dos setores especiais abranjam prestações típicas dos
contratos de empreitada de obras públicas, de aquisição de serviços, de locação ou
aquisição de bens móveis, de concessão de obras públicas e de concessão de serviços
públicos.
c) Contratos de valor igual ou superior aos limiares europeus
O ultimo requisito de aplicação do regime da contratação dos setores especiais
tem a ver com o valor dos contratos; esse regime só é aplicável, no caso de contratos de
empreitada de obras públicas, de aquisição ou locação de bens móveis e de aquisição de
serviços, desde que o respetivo valor se situe acima do limiar de aplicação do CCP que
existe neste caso: 443.000 EUR para as aquisições de serviços e aquisição e locação de
bens móveis, 1000000 EUR para as aquisições de serviços sociais e outros serviços
específicos indicados no Anexo IX ao CCP e 5548000 EUR para as empreitadas de obras
públicas.

d) Notas sobre o art.11º/2


Nos termos do art.11º/2, a Parte II do CCP é sempre aplicável à formação de
contratos, a celebrar por quaisquer entidades adjudicantes, quando digam direta e
principalmente respeito a uma ou a várias das atividades por elas exercidas nos setores
da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais, nos seguintes casos:
⎯ Contratos de aquisição de serviços de caráter financeiro prestados pelo
Banco de Portugal;
⎯ Contratos relativos à aquisição, ao desenvolvimento, à produção ou à
co-produção de programas destinados a emissão por parte de entidades
de radiodifusão ou relativos a tempos de emissão.

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2.3. Atos Administrativos substitutivos de contratos sujeitos à Parte II


CCP
Estabelece o nº3 do art.1º CCP que o presente Código é igualmente aplicável,
com as necessárias adaptações, aos procedimentos destinados à atribuição unilateral,
pelas entidades adjudicantes referidas no artigo 2.º, de quaisquer vantagens ou
benefícios, através de ato administrativo ou equiparado, em substituição da celebração
de um contrato público. Assim por força desta norma, a Parte II do CCP também se
aplica a atos administrativos ou equiparados praticados em substituição da celebração do
contrato público.
Conclui-se, portanto, que se submetem aos procedimentos da Parte II do CCP os
atos administrativos que, em termos práticos, substituam contratos de procura pública
com interesse concorrencial.
O objetivo da lei não constitui, por esta via, a aplicação do CCP, mas antes e
como se apresenta óbvio, em evitar que as entidades adjudicantes sigam a via do
aproveitamento da forma do ato administrativo para fugir aos procedimentos de
contratação – trata-se pois de prevenir o risco de uma fuga para o ato administrativo e da
utilização perversa das formas juridicas da ação administrativa; no direito alemão, alude-
se, em situação análoga, ao fenómeno, curiosa e sugestivamente formulado, de uma fuga
para o direito público.

2.4. Acordos-Quadro (art.251-266 CCP)


Acordo-quadro é o contrato celebrado entre uma ou várias entidades adjudicantes
e uma ou mais entidades, com vista a disciplinar relações contratuais futuras a estabelecer
ao longo de um determinado período de tempo, mediante a fixação antecipada dos
respetivos termos.
Os acordos-quadro constituem um instrumento importante no aprovisionamento
público desde logo nos casos em que as entidades adjudicantes sabem de antemão que
têm de comprar certos bens e serviços, mas desconhecem as quantidades exatas de que
vão precisar em cada momento. A celebração de acordos-quadro apresenta uma vantagem
de poupar tempo à entidade adjudicante, que, no momento em que precisa dos bens ou
dos serviços objeto do acordo-quadro, envia aos contratantes convites para contratar.

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Trata-se de um contrato celebrado, por um lado, entre uma ou várias entidades


adjudicantes.
Por outro lado, o acordo-quadro pode ser celebrado por um ou mais operadores
económicos.
O acordo quadro pode ser:
⎯ Acordo-quadro individual (celebrado entre uma entidade adjudicante e um
operador económico);
⎯ Acordo-quadro plural (celebrado entre a entidade adjudicante e vários
operadores económicos.
Segundo um outro critério é possível distinguir entre:
⎯ Acordo-quadro completo – o acordo especifica suficientemente todos os
aspetos da execução dos contratos a celebrar ao seu abrigo. O conteúdo dos
contratos a celebrar está fechado e definido no acordo-quadro. Isto não
exige, porém, que, por exemplo, o preço seja logo fixado num montante
determinado em termos finais no acordo-quadro: pode estabelecer-se que o
preço seja definido por referência a índice de preços. Em razão do caráter
completo do acordo-quadro, a conclusão dos contratos a celebrar ao sua
abrigo dispensa uma proposta e negociações; o conteúdo do contrato está
definido. Este tipo de acordo-quadro pode ser celebrado com um ou vários
contratantes.
⎯ Acordo-quadro incompleto – esta segunda modalidade é sempre plural –
celebrado com, pelo menos, dois contratantes -, que se caracteriza por não
contemplar totalmente ou por não especificar suficientemente todos os
aspetos da execução dos contratos a celebrar ao eu abrigo; assim, por
exemplo, o preço ou o prazo de entrega podem não ficar definidos. O
acordo remete para o contrato posterior a fixação do conteúdo final de
algumas cláusulas contratuais
A dualidade de modalidades que o CCP acolhe no art.252º CCP segue o critério
de completude do acordo-quadro na relação com os contratos a celebrar ao seu abrigo.
A cada uma destas modalidades corresponde um regime quanto à celebração de
contratos ao abrigo dos acordos-quadro: art.258º e 259º.

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O artigo 253º/1 manda a aplicar ao procedimento de formação dos acordos-quadro


o regime geral da contratação pública dos Títulos I, II e III da Parte II do CCP, com
exceção do Capítulo I do Título II.
Estabelece-se no art.253º/2 que a escolha do procedimento de formação do
acordo-quadro nos termos do disposto nos artigos 19º a 21º só permite a celebração de
contratos ao seu abrigo enquanto o somatório dos respetivos preços contratuais seja
inferior aos valores correspondentemente aplicáveis nos termos do artigo 474º. Nos
termos em que se encontra formulado, o preceito parece conduzir ao resultado de não
serem possíveis acordos-quadro de valor superior aos limiares europeus, pois, diz-se lá
expressamente, só permite a celebração de contratos ao seu abrigo enquanto o
somatório dos respetivos preços contratuais seja inferior aos valores
correspondentemente aplicáveis nos termos do art.474º, quer dizer, inferior aos
montantes dos limites que ali se estabelecem.
Assim, deverá interpretar-se o nº2 do art.253º no sentido de que, para a celebração
de acordo-quadro, podem adotar-se os procedimentos indicados nos artigos 19º a 21º, e,
em cada caso, o valor a tomar em consideração como valor do estimado do acordo-
quadro é o valor máximo de todos os contratos previstos ao seu abrigo durante a
vigência do acordo-quadro, como resulta do art.17º/4.
Enquanto contrato, o acordo-quadro assume natureza de contrato administrativo,
por força do art.280º/1/a). Em razão dessa qualificação e pelo facto de se tratar de um
contrato sujeito à Parte II do CCP, fica submetido ao regime substantivo da Parte III do
CCP: eis o que resulta do meso art.280/1.

2.4.1. Caráter Vinculativo dos acordos-quadro


Os acordos-quadro, em razão do seu caráter normativo, especificam sempre, de
forma mais ou menos detalhada, aspetos de execução dos contratos a celebrar ao seu
abrigo (art.252º/1), e, por consequência, destes contratos não podem resultar alterações
substanciais das condições consagradas nos acordos-quadro (art.257/2). O grau de
vinculação aumenta nos acordos-quadro completos: estabelece-se no nº3 do art.258º que
o conteúdo desses contratos deve corresponder às condições contratuais estabelecidas no
acordo-quadro, não sendo necessária a elaboração de um caderno de encargos.

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Nos acordos quadro incompletos, a vinculação não atinge os aspetos da execução


do contrato que não tenham sido contemplados. Mas, claro, abrange todos os aspetos de
execução do contrato que tenham sido contemplados ou especificados nos acordo-quadro.
Nos termos vistos, os acordos-quadro podem prever cláusulas de modificação:
neste caso, a modificação pode ser introduzida no acordo-quadro ou projetar-se
imediatamente no contrato.
Dos acordos-quadro emerge para os cocontratantes a obrigação de celebrar
contratos nas condições naqueles previstas à medida que a entidade adjudicante parte no
acordo-quadro o requeira: art.255º/1. A recusa dos cocontratantes à celebração de
acordos-quadro corresponde a um ilícito contratual e, na medida em que vai conduzir à
não comparência do adjudicatário à outorga do contrato, corresponde também a um ilícito
contra-ordenacional (457º/b)).
A obrigação de contratar ao abrigo de acordos-quadro onera os contraentes, mas,
em geral o mesmo não se verifica em relação às entidades adjudicantes: estas não são
obrigadas a celebrar contratos ao abrigo dos acordos-quadro que tenham celebrado e
estejam em vigo, salvo se houver disposição em contrário no caderno de encargos.
Assim, em regra, as entidades podem contratar livremente fora do acordo-quadro.

2.4.2. Celebração de contratos ao abrigo de acordos quadro


(art.º 257.º)
Em síntese, podemos clarificar alguns pontos no âmbito desta matéria:
⎯ Só podem celebrar contratos ao abrigo de um acordo quadro, as partes
nesse acordo quadro.
⎯ Da celebração de contratos ao abrigo de acordos quadro não podem resultar
alterações substanciais das condições consagradas nestes últimos.
⎯ Quando expressamente previsto no caderno de encargos relativo ao acordo
quadro, a entidade adjudicante pode actualizar as características dos bens
ou dos serviços a adquirir ao abrigo do acordo quadro, modificando-as ou
substituindo-as por outras, desde que se mantenha o tipo de prestação e os
objetivos das especificações fixadas no procedimento de formação do

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acordo quadro e desde que tal se justifique em função da ocorrência de


inovações tecnológicas.
A celebração de contratos ao abrigo de acordo quadro pode seguir tramitação
distinta consoante os seus termos abranjam ou não todos os seus aspetos submetidos à
concorrência (artigos 258.º e 259.º CPP).

Artigoº 258
⎯ Deve adotar-se o ajuste direto para a formação de contratos a celebrar ao abrigo
de acordos quadro celebrados na modalidade prevista na alínea a) do n.º 1 do
artigo 252.º (com uma única entidade).
⎯ O conteúdo dos contratos a que se refere o número anterior deve corresponder às
condições contratuais estabelecidas no acordo quadro, não sendo necessária a
elaboração de um caderno de encargos.
⎯ Caso tal se revele necessário, a entidade adjudicante pode solicitar, por escrito, ao
cocontratante do acordo quadro, que pormenorize, igualmente por escrito, aspetos
constantes da sua proposta.

Artigo 259.º
⎯ Para a formação de contratos a celebrar ao abrigo de acordos quadro celebrados
com várias entidades, a entidade adjudicante deve dirigir aos cocontratantes do
acordo quadro que reúnam as condições necessárias para a execução das
prestações objeto desses contratos um convite à apresentação de propostas
circunscritas:
a) Aos termos do acordo quadro a concretizar, a desenvolver ou a
complementar em virtude das particularidades da necessidade cuja
satisfação se visa com a celebração do contrato; ou
b) Aos aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à
concorrência pelo caderno de encargos do acordo quadro para os efeitos
do procedimento de formação do contrato a celebrar ao seu abrigo.
⎯ O convite deve indicar o prazo e o modo de apresentação das propostas, bem
como os termos ou os aspetos referidos no número anterior e, ainda, o modelo de

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avaliação das propostas com base nos fatores e eventuais subfactores que
densificaram o critério de adjudicação previamente previsto no programa do
procedimento de formação do acordo quadro.
⎯ Ao procedimento previsto no presente artigo é aplicável, com as necessárias
adaptações, o disposto nos artigos 139.º e seguintes.

2.4.3. Adjudicação de contratos ao abrigo de acordos-quadro


individuais
No caso de acordos-quadro individuais celebrados com apenas um operador
económico (trata-se necessariamente de um acordo-quadro completo), o ajuste direto
impõe-se por força da natureza das coisas: art.258º/1.

2.4.4. Adjudicação de contratos no abrigo de acordos-quadro


plurais
Em relação aos acordos-quadro celebrados com vários operadores económicos, há
que distinguir entre os casos de acordos-quadro completos e os acordos-quadro
incompletos.

2.4.4.1. Acordos-quadro completos


No caso de acordos-quadro completos, a entidade adjudicante pode escolher
contratar por ajuste direto, e, portanto, contratar com qualquer cocontratante do acordo-
quadro, sem que haja, neste caso, lugar à reabertura da concorrência. Dispensa-se o
miniconcurso ou a minicompetição, entre os cocontratantes do acordo-quadro, porque o
acordo-quadro definiu todos os aspetos de execução do contrato a celebrar – art.258º/2.
O cocontratante deve ser seleccionado de acordo com critérios objetivos
estabelecidos no caderno de encargos do acordo-quadro. Também neste âmbito releva o
facto de o acordo-quadro definir todas as condições de execução do contrato. Por essa
razão, o CCP determina que o caderno de encargos do acordo-quadro deve indicar as
regras para os procedimentos a realizar ao abrigo do mesmo, incluindo os critérios
objetivos que permitem seleccionar o ou os cocontratantes do acordo-quadro a convidar.
Os ditos critérios objetivos podem assentar, por exemplo, num método de cascata ou

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rotação em sorteio ou em qualquer critério que se revele transparente e não


discriminatório.
O conteúdo dos contratos a celebrar neste âmbito deve corresponder às condições
contratuais estabelecidas no acordo-quadro, dispensando-se a elaboração de um caderno
de encargos (art.258/3).

2.4.4.2. Acordos-quadro incompletos


Se o acordo-quadro não especifica todos os aspetos da execução dos contratos a
celebrar, caso em que é necessariamente plural, a adjudicação dos contratos faz-se com
base num procedimento competitivo, que deve seguir as regras gerais de consulta prévia
(art.259/1): assim se processa uma reabertura do processo à concorrência, limitada ao
universo dos cocontratantes do acordo-quadro que venham a ser convidados a apresentar
a proposta; a remissão para o procedimento de consulta prévia significa que a entidade
adjudicante terá de convidar, pelo menos, três cocontratantes a apresentar a proposta.
Uma vez que nem todos têm de ser convidados, o caderno de encargos do acordo-
quadro deve prever as regras quando aos cocontratantes a convidar em cada
procedimento, designadamente em função do lote, se existente, ou do valor do contrato a
celebrar (art.259º/2). Também aqui se exige a fixação, no caderno de encargos, de
critérios objetivos, nos termos do art.252º/3.
Nos termos do nº3 do art.259º quando o caderno de encargos do acordo-quadro
preveja que a adjudicação da proposta seja determinada apenas com base no preço ou
custo e a aquisição seja realizada através de sistemas de informação disponibilizados pela
própria entidade adjudicante, ficam dispensadas outras formalidades previstas para o
procedimento de consulta prévia, designadamente a elaboração de relatórios preliminar e
final e audiência prévia.
A entidade adjudicante deve convidar os cocontratantes do acordo-quadro a
apresentar propostas circunscritas:
⎯ Aos termos do acordo-quadro, concretizando, desenvolvendo ou
complementando em virtude das particularidades da necessidade cuja
satisfação se visa com a celebração do contrato ou

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⎯ Aos aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência


pelo caderno de encargos do acordo-quadro para os efeitos do
procedimento de formação do contrato a celebrar ao seu abrigo.
Sempre que o critério de adjudicação adotado em função do disposto no caderno
de encargos do acordo-quadro seja o da proposta economicamente mais vantajosa, na
modalidade prevista na alínea a) do nº1 do art.74º, é ainda aplicável o disposto no
art.139º, pelo que a entidade adjudicante deve elaborar um modelo de avaliação de
propostas.

2.4.5. Acordos-quadro celebrados por centrais de compras


Os acordos-quadro celebrados pelas centrais de compras designam-se contratos
públicos de aprovisionamento (art.263/1 e 261/1/c)) e estão sujeitos às regras gerais;
contudo, há algumas regras específicas a considerar: art.263º e 265º.

2.5. Contratos de Alienação de bens móveis


Vide páginas 249-256 Manual de Direito dos Contratos Públicos.

3. CONTRATOS EXCLUIDOS
3.1. Contratos Excluídos e Contratação Excluída
Após a revisão de 2017, o CCP continua a distinguir duas situações: a dos
contratos excluídos, para indicar que se trata de contratos a que o CCP não se aplica de
todo, e a de contratação excluída, para indicar os contratos a que não se aplica a sua Parte
II (art.4º, 5º e 5º-A).
Sucede que a opção de restringir a aplicação da Parte III do CCP aos contratos
sujeitos à Parte II que configurem relações juridicas contratuais administrativas teve o
efeito prático de eliminar o sentido da distinção entre contratos excluídos e contratação
excluída.
Na verdade, atualmente, por força da lei, o contrato excluído da incidência da
Parte II do CCP fica também excluído da incidência direta da Parte III. A lei adota uma
lógica de dupla exclusão. A dupla exclusão vale para todos os contratos, incluindo, pois,
os contratos administrativos, ou, na nova gramática, os contratos que configurem relações

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juridicas administrativas. O critério da sujeição à Parte III reside na sujeição do contrato à


Parte II. A adoção deste critério na revisão de 2017 teve o efeito de estreitar o campo de
aplicação da Parte III do CCP.

3.2. Contratos celebrados ao abrigo de regras internacionais


O CCP não é aplicável aos contratos celebrados ao abrigo:
⎯ De convenção internacional previamente comunicada à Comissão
Europeia, e concluída nos termos dos Tratados da União Europeia, entre a
República Portuguesa, e um ou mais Estados terceiros, respeitantes a
obras, bens ou serviços destinados à realização ou exploração conjunta de
um projeto pelos seus signatários;
⎯ De procedimento específico de uma organização internacional de que a
República Portuguesa seja parte;
⎯ Das regras aplicáveis aos contratos públicos determinadas por uma
organização internacional ou instituição financeira internacional, quando
os contratos em questão sejam financiados na íntegra por essa organização
ou instituição;
⎯ De instrumentos de cooperação para o desenvolvimento, com uma
entidade sediada num dos Estados dele signatários e em benefício desse
mesmo Estado, desde que este não seja signatário do Acordo sobre o
Espaço Económico Europeu;
⎯ Do disposto no artigo 346.º do Tratado sobre o Funcionamento da União
Europeia;
⎯ De acordo ou convénio internacional relativo ao estacionamento de tropas
e que envolva empresas de um Estado-Membro ou de um país terceiro.

Em todos estes casos, a não aplicação do CCP decorre de os contratos indicados


deverem ser adjudicados nos termos estabelecidos em regras internacionais.

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3.3. Contratos de trabalho em funções públicas e contratos individuais de


trabalho
O CCP não se aplica aos contratos de pessoal: contratos de trabalho em funções
públicas e os contratos individuais de trabalho (regulados, respetivamente, pela Lei Geral
do Trabalho em Funções Públicas e pelo Código do Trabalho.
O CCP já se aplica, porém, à formação dos contratos de prestação de serviço para
o exercício de funções públicas (art.280/3).

3.4. Contratos de doação de bens móveis a favor de entidades


adjudicantes
No art.4º/2/b), o CCP exclui do seu âmbito de aplicação os contratos de doação de
bens móveis a favor de qualquer entidade adjudicante (a doação de bens imóveis está
excluída na alínea subsequente). Na perspetiva da entidade adjudicante, estes contratos
correspondem a aquisições gratuitas.

3.5. Contratos de compre e venda, de doação, de permuta e de


arrendamento de bens imóveis ou contratos similares
Por força da aliena c) do nº2 do art.4º, são excluídos da aplicação do CCP, em
geral, os contratos relativos a imóveis, quer na perspetiva da compra, quer na da
alienação, incluindo, além do mais, contratos de cedência de utilização, de locação, de
constituição de direito de superfície ou outros direitos sobre imóveis.
Embora a função literal do CCP não seja totalmente clara, o sentido dela aponta
para se considerarem excluídos de todos os contratos relativos ao comércio jurídico sobre
imóveis do domínio privado da Administração Pública ou das entidades adjudicantes.
Mas a norma pretende abranger apenas esses contratos relativos a imóveis e já não os
contratos que tenham como objeto bens do domínio público, aos quais alude no art.280/1,
alínea c): contratos que confiram ao cocontratante direitos especiais sobre coisas
públicas.

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3.6. Contratos adjudicados por prestadores de serviços de comunicação


social
Os prestadores de serviços de comunicação social podem ser entidades
adjudicantes, em principio, na condição de organismos de direito público (é o caso da
RTP). Os seus contratos de aquisição de serviços estão sujeitos ao CCP. Mas, o
art.4º/2/d) exclui do seu âmbito de aplicação os contratos relativos à aquisição,
desenvolvimento, produção ou coprodução de programas destinados a serviços de
comunicação social audiovisuais ou radiofónicos, adjudicados por prestadores de
serviços de comunicação social audiovisuais ou radiofónicos.
A exclusão abrange apenas os contratos indicados, e, como tal, logo a seguir,
sublinha o considerando acabado de transcrever, à coprodução e à emissão de tais
programas.

3.7. Contratos adjudicados a prestadores de serviços de comunicação


social
O art.4º/2/d) exclui da incidência do CCP os contratos de tempo de antena ou de
fornecimento de programas adjudicados aos prestadores de serviços de comunicação
social, audiovisuais ou radiofónicos. Trata-se, neste caso, de contratos adjudicados por
quaisquer entidades adjudicantes a organismos de comunicação social (sejam ou não
entidades adjudicantes), e destinados à emissão por estes, desde que se refiram a tempos
de antena ou ao fornecimento de programas.

3.8. Contratos excluídos por invocação do art.346º TFUE


O art.4º/1/e) vem autorizar a exclusão da aplicação do CCP com a invocação do
art.346 TFUE, quando, num caso concreto, o procedimento de adjudicação ou a execução
de um contrato obrigue o Estado a divulgar informação contrária aos interesses essenciais
da segurança do Estado.

3.9. Contratos que não podem ser submetidos à concorrência


O artigo 5º/1 CCP vem retirar do âmbito da incidência do CCP contratos com
interesse concorrencial (que proporcionam beneficio económico), mas que não podem ser

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

submetidos à concorrência de mercado, em razão da sua (i) natureza, (ii) das suas
características, (iii) da posição relativa das partes ou (iv) do contexto da sua formação.

3.10. Contratos no âmbito do setor público


O simples facto de ambas as partes num acordo serem autoridades públicas não
exclui, por si só, a aplicação das regras da contratação pública.
Por isso, a lei deve esclarecer que certos contratos entre entidades adjudicantes –
contratos no âmbito do setor público -, com aptidão, pelo menos numa primeira leitura,
para serem abrangidos, se encontram excluídos do âmbito de aplicação do CCP. E há
toda a conveniência em demarcar as possibilidades de cooperação público-publica, que se
processam no interior do sistema administrativo e sem que as entidades públicas se vejam
constrangidas a fazerem apelos ao mercado. Ou seja, importa definir em que condições
podem as entidades do setor público estabelecer formas de cooperação entre si, dentro do
setor público, sem terem de abrir concursos para o mercado.

3.10.1. Contratos de delegação entre entidades adjudicantes


O art.5º/2 CCP considera abrangidos pela exclusão do nº1, os acordos ou outros
instrumentos jurídicos que organizem a transferência ou a delegação de poderes e
responsabilidades pela execução de missões públicas entre entidades adjudicantes ou
agrupamentos de entidades adjudicantes, e que não prevejam uma remuneração.
Trata-se, neste caso, de uma delegação para a prática de atos administrativos que
pode ocorrer entre órgãos da mesmas pessoa coletiva ou de diferentes pessoas coletivas.
Pois bem, estas delegações estão excluídas inequivocamente da aplicação do CCP por
aplicação do critério geral do art.5º/1, já que nenhum operador económico pode invocar a
titularidade de um interesse em disputar a delegação de poderes que um órgão de uma
entidade pública faz em outro órgão de uma outra entidade pública. Uma delegação com
esse objeto é uma providência ligada ao exercício da autoridade pública (art.51º TFUE) e
diz respeito a prestações que estão fora do mercado e das transações económicas.
A situação já reclama algum cuidado nos casos em que a delegação tem por
objeto, não a competência isolada para a prática de atos jurídicos (decisões

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

administrativas), mas antes a execução de operações materiais, de natureza técnica ou


outra – v.g., limpeza de ruas e edifícios, recolha de resíduos, arranjo de jardins, etc.
Neste caso, o ato de delegação, que opera entre entidades públicas, tem como
objeto um bem transaccionável, que suscita um interesse concorrencial e, por isso
mesmo, suscita-se a questão de saber se essa delegação, sobretudo se acompanhada de
um pagamento, não corresponde, afinal, à compra de um serviço dentro do setor público
Numa situação enquadrada nestes parâmetros, no Ac. Piepenbrock, o TJUE
decidiu que o contrato estava sujeito às regas da contratação pública, tendo em
consideração, designadamente, os seguintes elementos:
⎯ O seu objeto envolvia a execução de meras operações materiais;
⎯ O controlo da execução das operações materiais cabia à entidade que
encomendou o serviço;
⎯ Existia uma remuneração, ainda que apenas destinada a cobrir os custos(o
que segundo a jurisprudência do TJUE pode confirmar o caráter
oneroso).

Mais uma vez, no tocante ao caráter oneroso, o Ac. Remondis vem esclarecer que,
para ficarem fora das regras das diretivas, esses contratos não devem ser onerosos, no
sentido de não corresponderem a um interesse económico direto da entidade pública que
promove a delegação. Esta entidade não poderá ter um interesse económico direto.

3.10.2. Contratos de sociedade entre entidades adjudicantes


O art.5º/4/d) CCP exclui ao âmbito de aplicação da Parte II do CCP a formação de
contratos de sociedade cujo capital social se destine a ser exclusivamente detido pelas
entidades adjudicantes referidas no nº1 do art.2º. Essencial é que a sociedade não conte
com sócios que não sejam entidades adjudicantes do art.2º/1.

3.10.3. Contratos com entidades adjudicantes titulares de


direitos exclusivos
Os contratos que uma entidade adjudicante tenha de celebrar com uma entidade
que beneficia de um direito exclusivo são, em regra, abrangidos pela Parte II do CCP,

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

apesar de poderem ser adjudicados por ajuste direto (art.24º/1/e)/iii)). Contudo, se a


entidade titular dos direitos exclusivos e prestadora do serviço é, ela mesma, uma
entidade adjudicante, o CCP não se aplica.

3.10.4. Contratos com centrais de compras


Nos termos do art.5º/4/g), o CCP não se aplica à formação dos contratos de
aquisição (por entidades adjudicantes) de serviços de compras celebrados com centrais de
compras públicas

3.10.5. Contratos in house


O art.5-A/1 CCP estabelece que a parte II do CCP não é aplicável à formação dos
contratos, independentemente do seu objeto, a celebrar por entidades adjudicantes com
uma outra entidade, quando se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições:
⎯ A entidade adjudicante exerça, direta ou indiretamente, sobre a atividade
da outra pessoa coletiva, isoladamente ou em conjunto com outras
entidades adjudicantes, um controlo análogo ao que exerce sobre os seus
próprios serviços – requisito do controlo;
⎯ A entidade controlada desenvolva mais de 80 % da sua atividade no
desempenho de funções que lhe foram confiadas pela entidade adjudicante
ou entidades adjudicantes que a controlam, ou por outra ou outras
entidades controladas por aquela ou aquelas entidades adjudicantes,
consoante se trate de controlo isolado ou conjunto – requisito do destino
da atividade;
⎯ Não haja participação direta de capital privado na pessoa coletiva
controlada, com exceção de formas de participação de capital privado sem
poderes de controlo e sem bloqueio eventualmente exigidas por
disposições especiais, em conformidade com os Tratados da União
Europeia, e que não exerçam influência decisiva na pessoa coletiva
controlada – requisito da não participação direta do capital privado.

DANIEL LOURENÇO
100
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Abrange-se aqui a designada contratação interna, que se refere a contratos


celebrados entre entidades formalmente autónomas (com personalidade jurídica própria),
mas, em regra, ligadas entre si por laços de dependência jurídica ou organizativa
(controlo análogo) e de dependência económica (destino da atividade).

3.10.6. Contratos de cooperação entre entidades adjudicantes


A ultima espécie de contratos no âmbito do setor público cuja formação se
encontra expressamente isenta da aplicação da Parte II do CCP (e que se estende à
aplicação da Parte III) é a dos designados contratos de cooperação horizontal (a ideia de
cooperação horizontal surgiu em contraposição à de cooperação no quadro das relações
verticais, de controlo, presente in house).
Assim, dispõe-se no nº5 do art.5-A que a Parte II do CCP não é aplicável à
formação dos contratos celebrados exclusivamente entre duas ou mais entidades quando
se verifiquem, as seguintes condições:
⎯ O contrato estabelece uma cooperação entre as entidades adjudicantes, no
âmbito de tarefas públicas que lhes estão atribuídas e que apresentam uma
conexão relevante entre si;
⎯ A cooperação é regida exclusivamente por considerações de interesse
público; e
⎯ As entidades adjudicantes não exercem no mercado livre mais de 20 % das
atividades abrangidas pelo contrato de cooperação.

3.11. Contratos de atribuição de subsídios ou subvenções


O art.5/4/c) exclui da aplicação do CCP (Parte II e, portanto, também da Parte III)
os contratos cujo objeto principal consista na atribuição, por qualquer das entidades
adjudicantes referidas no nº1 do art.2º, de subsídios ou de subvenções de qualquer
natureza.
Sabemos que o subsidio ou subvenção é toda e qualquer vantagem financeira
atribuída, direta ou indiretamente, a partir de verbas do orçamento de uma entidade
pública ou que envolva uma renuncia a receitas que ingressariam nesse orçamento,
qualquer que seja a designação ou modalidade adotada, a que não corresponde uma

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

contrapartida especifica ou uma prestação determinada a efetuar pelo beneficiário no


interesse direto da entidade pública que o concede.
Assim, o contrato pelo qual uma entidade adjudicante financia uma atividade de
interesse geral e que não prevê a realização ou a organização de eventos específicos ou a
produção de resultados que correspondam à satisfação de um interesse próprio da
entidade adjudicante é um contrato de subsidio ou de subvenção. Mas uma prestação
atribuída por uma entidade em contrapartida de um serviço especifico a prestar pelo
beneficiário ou de uma prestação que produz um resultado determinado no interesse
económico direto daquela entidade não é um subsidio, mas um preço (uma remuneração)
e, então, a Parte II do CCP já deverá, em principio, aplicar-se à formação desse contrato
de aquisição de serviços.

3.12. Contratos de aquisição de serviços financeiros


Fica excluída da sujeição à Parte II do CCP a formação dos contratos de aquisição
de serviços financeiros relativos à emissão, compra, venda ou transferência de valores
mobiliários ou outros instrumentos financeiros.

3.13. Contratos no domínio da defesa e da segurança


Por força da alínea h) do nº4 do art.5ºCCP não se aplica aos contratos celebrados
ao abrigo do disposto no regime jurídico dos contratos públicos no domínio da defesa e
da segurança, designadamente do Decreto-Lei nº104/2011, de 6 de Outubro.

3.14. Contratos secretos e contratos cuja execução deva ser acompanhada


de medidas especiais de segurança
Nos termos da primeira parte da alínea i) do nº4 do artigo 5º, o CCP não é
aplicável aos contratos que, nos termos da lei, sejam declarados secretos ou cuja
execução deva ser acompanhada de medidas especiais de segurança.
Além da Lei de Segredo de Estado, podem fundamentar legalmente a declaração
de um contrato como secreto outros regimes legais relativos à classificação de
informações.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Na medida em que a declaração da adjudicação ou da execução do contrato está,


em muitos casos, relacionada com questões militares e de segurança, esta especifica
causa de exclusão da aplicação do CCP conhece uma relevância limitada, porquanto tais
contratos já estariam em principio excluídos, por força da alínea h) do nº4 do artigo 5º.
O segundo tipo de situações abrangidas refere-se a contratos cuja execução deva
ser acompanhada de medidas especiais de segurança. Como fonte de exclusão autónoma
podemos ter aqui contratos que possam pôr em causa a privacidade, na medida em que,
por exemplo, dêem ao contratante acesso a detalhes sobre a vida privada dos cidadãos ou
sobre matérias reservadas de interesse nacional.

3.15. Contratação excluída para proteção de interesses essenciais de defesa


e segurança do Estado
No contexto do art.5/4/1), interesses essenciais da defesa e da segurança não são
apenas interesses de natureza militar ou até de segurança interna (policias); com efeito,
para a segurança do Estado podem revelar interesses ligados por exemplo à impressão de
certos documentos oficiais. Contudo, a margem de que dispõe o Estado, enquanto
entidade adjudicante, de considerar a necessidade de proteção dos interesses essenciais da
defesa e segurança apenas o autoriza a derrogar a aplicação do CCP em termos
excecionais, que se revelem suscetiveis de justificar a exclusão da adjudicação
concorrencial de um contrato, num quadro que evidencie a impossibilidade de adoção de
medidas menos radicais.

3.16. Contratos de aquisição de serviços de investigação e desenvolvimento


Nos termos do artigo 5º/4/j), estão excluídos da aplicação do CCP os contratos de
aquisição de serviços de investigação e desenvolvimento abrangidos pelos códigos CPV
referidos no anexo VIII ao presente Código, que dele faz parte integrante, desde que se
verifiquem cumulativamente as seguintes condições:
⎯ Os resultados obtidos com os respetivos serviços não revertam exclusivamente a
favor da entidade adjudicante, para utilização no exercício da sua própria
atividade;

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

⎯ O pagamento dos serviços em causa não seja integralmente suportado pela


entidade adjudicante, designadamente por se tratar de projeto cofinanciado por
fundos nacionais ou europeus.

3.17. Contratos de organismos de direito público e do Banco de Portugal


Estabelece o art.5º/8, que a Parte II do CCP não é aplicável aos contratos
celebrados pelas entidades referidas no nº2 do art.2º, e pelo Banco de Portugal, que não
abranjam prestações típicas da empreitada de obras públicas, concessão de obras
públicas, concessão de serviços públicos, locação e aquisição de bens móveis ou
aquisição de serviços.

3.18. Contratos de serviços sociais e outros serviços específicos de valor


inferior a 750 000 EUR
Nos termos do artigo 6º-A/1, a Parte II do CCP não é aplicável à formação dos
contratos públicos que tenham por objeto a aquisição de serviços sociais e de outros
serviços específicos referidos no Anexo IX ao CCP, salvo quando o valor de cada
contrato for superior a 750 000 EUR: neste caso, aplica-se o disposto nos artigos 250º-A
e seguintes, os quais, por sua vez, mandam aplicar a Parte II, mas com adaptações
(regime simplificado de contratação).

3.19. Regime da contratação excluída


Depois da revisão do CCP em 2017, perdeu sentido a distinção entre contratos
excluídos e contratação excluída: os casos de contratação excluída (contratos a que não se
aplica a Parte II do CCP) correspondem também a casos de contratos excluídos, segundo
a regra da dupla exclusão contemplada no art.280º/1. Contudo, a distinção entre as duas
categorias mantém-se no CCP e, de certo modo, apresenta-se relevante no quadro da
aplicação do artigo 5º-B: este preceito define o regime da contratação excluída, que
atinge os contratos referidos no artigo 5º (contratação excluída) e no artigo 5º-A
(contratos no âmbito do setor público).
O regime jurídico aplicável à contratação pública pelos artigos 5º, 5º-A e 6º-A/1
encontra-se indicado em 3 preceitos.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Em dois deles (5º-B/1 e 2) estipula-se o regime aplicável à contratação excluída


nos termos do art.5º e 5º-A. Um terceiro (art.6º-A/2) indica o regime aplicável à
contratação excluída nos termos do art.6º-A/1.
Ainda que as indicações do art.5º-B/1 e 6º-A/2, se apresentem próximas,
praticamente equivalentes, afigura-se, porém, de grande utilidade a tarefa consistente em
distinguir as duas situações.

3.19.1. Regime da contratação excluída pelo art.5º e 5º-A


Do regime da contratação excluída pelos artigos 5º e 5º-A ocupa-se o artigo 5º-B:
o nº1 define o regime aplicável aos contratos em geral não sujeitos à Parte II; o nº2 define
o regime aplicável aos contratos com objetivo passível de ato administrativo e demais
contratos sobre o exercício de poderes públicos que sejam abrangidos pelos artigos 5º e
5º-A.

3.19.1.1. Regime aplicável à generalidade dos contratos


Estabelece o artigo 5º-B/1, que a celebração dos contratos a que se referem os
artigos 5 e 5º-A fica sujeita aos princípios gerais da atividade administrativa, bem como,
com as devidas adaptações face à natureza do contrato, aos princípios gerais da
contratação pública previstos no nº1 do art.1º-A, devendo sempre ser feita menção à
norma que fundamenta a não aplicação da Parte II ao contrato em causa.4

3.19.1.2. Regime aplicável aos contratos sobre o exercício


de poderes públicos
O artigo 5º-B/2 estabelece que os contratos com objeto passível de ato
administrativo e demais contratos sobre o exercício de poderes públicos ficam sujeitos às
normas constantes do CPA, com as necessárias adaptações. O preceito está alinhado
com o art.201/3 CPA e o seu sentido reside em submeter a formação destes contratos às

4
Para mais desenvolvimentos, vide, PEDRO COSTA GONÇALVES, Direito dos
Contratos Públicos.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

regras da formação dos atos administrativos (regras que seriam aplicáveis se, em vez de
contrato, fosse praticado um ato administrativo).

3.19.2. Regime dos contratos excluídos pelo art.6º-A/1


O artigo 6º-A/1 estabelece que a Parte II do CCP não é aplicável à formação de
contratos públicos que tenham por objeto a aquisição de serviços sociais e de outros
serviços específicos referidos no Anexo IX ao CCP, salvo quando o valor de cada
contrato for igual ou superior a 750 000 EUR, caso em que se aplica o disposto nos
artigos 250º-A e seguintes.
Ora, o nº2 do mesmo artigo estipula que, à celebração dos contratos referidos no
número anterior (presume-se que se trata dos contratos referidos no Anexo IX quando de
valor não superior a 750 000 EUR), são aplicáveis, com as devidas adaptações, os
princípios gerais da contratação pública previstos no artigo 1º-A.

3.20. Regime jurídico da formação dos contratos mistos com prestações de


contratos excluídos e de contratos abrangidos pela Parte II do CCP
Para os casos em que as prestações de um contrato misto correspondam, em parte,
a prestações de contratos abrangidos e, em outra parte, a prestações de contratos não
abrangidos, o nº4 do artigo 32º dispõe no sentido da aplicação a todo o contrato do
regime correspondente da Parte II, relevando para o efeito o valor do contrato. Ou seja,
o CCP não estende a estes casos a possibilidade de se identificar o objeto principal do
contrato para o efeito d se determinar o regime aplicável. Deste modo, o CCP afasta
qualquer risco de manipulação, excluindo quaisquer vantagens de um eventual
agrupamento artificial no mesmo contrato de prestações abrangidas e prestações não
abrangidas pela sua Parte II.

3.21. Exclusões específicas dos setores especiais


Em relação aos contratos dos setores especiais (art.11º e 12º), o art.13º estabelece
uma restrição e, portanto, a não aplicação do CCP. Neste contexto, chama-se
especialmente a atenção para a exclusão dos contratos celebrados entre entidades
adjudicantes (operadores de rede) e empresas associadas bem como para os contratos a

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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

celebrar por uma entidade adjudicante cuja atividade esteja diretamente exposta à
concorrência em mercado de acesso não limitado, desde que tal seja reconhecido pela
Comissão Europeia, a pedido da República Portuguesa, da entidade adjudicante em causa
ou por iniciativa da própria Comissão Europeia, nos termos do disposto no artigo 34º da
Diretiva 2014/25/UE. Trata-se, neste último caso, de se atribuir relevância ao facto, que
terá de ser comprovado, de as entidades adjudicantes dos setores especiais desenvolverem
as suas atividades em ambiente de mercado e, portanto, expostas à concorrência. Isto
determina que não devem ser ordenadas com a sujeição às regras da contratação pública,
em particular porque o ambiente de mercado em que atuam oferece garantias de que as
suas compras sejam efetuadas segundo uma lógica comercial.

4. CONTRATAÇÃO IN HOUSE E INTERADMINISTRATIVA APÓS A


REVISÃO DO CCP
4.1. Enquadramento: a contratação dentro do universo público no
contexto do Direito da Contratação Pública e das novas Directivas de
2014
O Direito da União Europeia tem tradicionalmente reconhecido a autonomia que
cada Estado-membro mantém na escolha do modelo de organização da sua própria
Administração Pública, respeitando, em especial, a opção de adopção de modelos
jusprivatistas ou societários de organização para efeitos de prossecução instrumental do
interesse público. Preservando um certo agnosticismo quanto aos métodos nacionais de
concentração ou dispersão de entidades materialmente administrativas, sob forma pública
ou privada, o legislador europeu apenas tem tido em vista a preocupação de assegurar que
as opções internas não constituem uma estratégia encapotada de fraude às vinculações
impostas pelo mercado interno, em especial no tocante ao respeito pelos princípios da
concorrência, da igualdade e da não discriminação.
Naturalmente, o respeito por essa liberdade de escolha não pode deixar de
produzir consequências sobre as exigências procedimentais tendentes à formação
concorrencial dos contratos públicos. Se o ordenamento europeu não formulasse uma
permissão específica para que as especificidades das relações interadministrativas
justificassem a desaplicação das regras gerais de contratação pública, a Administração

DANIEL LOURENÇO
107
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

continuaria a precisar de se dirigir ao mercado para adquirir as prestações que lhe podem
ser asseguradas no contexto de uma colaboração interna. O reconhecimento das
especificidades da colaboração horizontal e vertical entre entidades materialmente
administrativas constitui, por isso, uma condição imprescindível para que cada Estado-
Membro mantenha a necessária margem de liberdade na eleição dos instrumentos mais
apropriados para a prossecução do interesse público, incluindo, se for o caso, a liberdade
de eleição dos seus meios próprios ou de outros entes públicos que lhe estão associados.
Ora, a aprovação das novas Directivas Europeias de Contratos Públicos, de
20145, que constituiu o fundamento principal da última Revisão do Código dos Contratos
Públicos (CCP), agora concretizada pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de Agosto,
representou, precisamente, um marco decisivo na evolução histórica da contratação
interadministrativa, ao alargar – aproveitando alguma jurisprudência favorável dos anos
anteriores –, até fronteiras antes desconhecidas, a permissão concedida às entidades
adjudicantes para se socorrerem de prestações obtidas dentro do universo público.
Deve reconhecer-se, desde logo, que esta flexibilização implica uma mudança
parcial do paradigma que vinha presidindo ao regime de contratação dentro do universo
público. Tradicionalmente, o ordenamento europeu não considerava credível a ideia
(aliás, tantas vezes pré-concebida) de que a especial relação que se forma entre duas
entidades públicas – resultante do simples facto de terem como característica comum a
prossecução eficaz do interesse público – ajude cada uma delas a contratar em melhores
condições contratuais do que as condições que obteria se recorresse ao mercado. Pelo
contrário, sabe-se que – mesmo abstraindo das vantagens (privadas) obtidas com a
promoção da concorrência no mercado – a própria Administração só tem a ganhar com a
criação de competição entre interessados (públicos ou privados) na celebração do
contrato: o procedimento competitivo é que permite seleccionar a proposta que melhor
satisfaça as necessidades de interesse geral visadas com a decisão de contratar,
maximizando as possibilidades de encontrar um bom contratante e as condições
contratuais mais adequadas.
Dito de outro modo, é precisamente a abertura da competição que permitirá
demonstrar se a contratação dentro do universo público será ou não a melhor opção para
a satisfação das necessidades subjacentes ao contrato: se o parceiro público for

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

efectivamente o co-contratante adequado para a entidade adjudicante, então esta


seguramente não relutará em adoptar um procedimento concorrencial que, através do
critério de adjudicação, confirme a superior atractividade da proposta elaborada por um
parceiro público; se, pelo contrário, a aplicação do critério de adjudicação concluir com a
selecção de uma proposta diferente, então isso apenas revelará que a contratação inter-
administrativa não constituía a solução mais sábia, tendo a abertura de concorrência
justamente libertado a entidade adjudicante de adjudicar a proposta menos vantajosa para
o interesse público a seu cargo.
Foi esta a filosofia subjacente à aprovação do n.º 1 do artigo 6.º do CCP de 2008:
para a generalidade dos contratos que suscitam maior interesse económico no mercado
(os chamados «contratos comunitários», por serem objecto de regulação expressa pelas
Directivas Europeias), a contratação entre entidades adjudicantes abrangidas pelo n.º 1 do
artigo 2.º ficou submetida à Parte II do CCP nos mesmos termos aplicáveis à contratação
com qualquer entidade privada. Com essa disposição, o legislador do CCP reafirmou,
pois, a sua crença no mérito dos mecanismos da concorrência para seleccionar a proposta
mais vantajosa para o interesse público, independentemente da natureza (pública ou
privada) dos interessados em contratar.
Foi justamente esse paradigma que, na linha de avanços jurisprudenciais mais
recentes, as Directivas de 2014 começaram a alterar, embora sem inteiramente o
abandonarem. Essa inflexão pode ser discernida, desde logo, no texto justificativo
presente no relevantíssimo Considerando 31 da Directiva 2014/24, no qual,
aparentemente, o legislador terá pretendido inculcar a ideia de que a nova regulação dos
“contratos celebrados entre entidades do sector público” conteria um intuito meramente
“clarificador”, e não inovador, não querendo impor qualquer revolução legislativa no
tratamento dessa matéria e limitando-se a fornecer critérios mais seguros para combater a
“considerável insegurança jurídica” que reinaria neste domínio. Mais: numa curiosa
expressão de cortesia institucional para com o TJUE, o legislador atribuiu aos “Estados-
Membros e mesmo [às] autoridades adjudicantes” a culpa por tal “insegurança jurídica”,
responsabilizando-os por terem “interpretado de forma diferente” a “jurisprudência
pertinente do Tribunal de Justiça”, como se porventura não tivesse justamente cabido a

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

esta jurisprudência uma parte da responsabilidade por flutuações decisórias que, essas
sim, reduziram os pontos seguros de apoio para a interpretação pelos Estados-Membros.
Numa palavra, o legislador não pretenderia mais do que “clarificar em que casos
os contratos celebrados dentro do sector público não estão sujeitos à aplicação das regras
da contratação pública”, o que faria sempre no respeito “pelos princípios definidos na
jurisprudência pertinente do Tribunal de Justiça da União Europeia”.
Sucede, todavia, que, no mesmo Considerando 31, as linhas orientadoras da nova
disciplina legislativa não puderam ser escondidas: apesar de ainda reproduzir a premissa
genérica que vinha orientando o regime anterior – “o simples facto de ambas as partes
num acordo serem autoridades públicas não exclui, por si só, a aplicação das regras acima
referidas” –, logo o legislador acrescentou que, “contudo, a aplicação das regras da
contratação pública não deverá interferir na liberdade das autoridades públicas para
desempenharem as suas missões de serviço público utilizando os seus próprios recursos,
o que inclui a possibilidade de cooperação com outras autoridades públicas”.
Ora, apesar de esta última afirmação não implicar um completo repúdio da
premissa anterior, o certo é que a simples hipótese de o legislador europeu evitar
qualquer “interferência na liberdade” que as “autoridades públicas” deveriam receber
para escolherem utilizar “os seus próprios recursos” ou para escolherem a “cooperação
com outras autoridades públicas” – em substituição do puro e simples recurso ao mercado
concorrencial – não poderia deixar intacto o paradigma clássico de sujeição dos contratos
interadministrativos à plena concorrência de mercado. Para viabilizar essa liberdade,
sublinhe-se, não bastaria sequer admitir a tradicional excepção provida pela contratação
in house (v. infra); o reconhecimento de uma tal liberdade de cooperação público-pública,
a ser levado a sério, obrigaria a alargar os casos de dispensa de procedimentos
concorrenciais até novos patamares antes desconhecidos.
Assim, em concretização das permissões jurisprudenciais anteriores, o legislador
europeu consolidou três vias de contratação público-pública, que coube ao legislador
português, pela Revisão do CCP, adaptar para o ordenamento nacional.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

4.2. Primeira hipótese de contratação público-pública: transferência ou


delegação não remunerada de missões públicas
Desde a sua versão original de 2008, o CCP incluiu, no n.º 1 do seu artigo 5.º,
uma cláusula genérica de inaplicabilidade do regime de contratação pública no caso de
contratos “cujo objecto abranja prestações que não estão nem sejam susceptíveis de estar
submetidas à concorrência de mercado, designadamente em razão da sua natureza ou das
suas características, bem como da posição relativa das partes no contrato ou do contexto
da sua própria formação”. Embora essa exclusão fosse principalmente pensada para
prestações cuja natureza seja sempre, em abstracto, incompatível com uma escolha
concorrencial – porque a lei se refere a uma insusceptibilidade por natureza de submissão
à concorrência (v.g., contratos de urbanização), e não a uma dificuldade concreta e
pontual –, a referência adicional à “posição relativa das partes” permitia também incluir
certos instrumentos jurídicos que, embora sob forma contratual, se destinassem
unicamente a reger o exercício conjunto ou a transferência ou delegação de atribuições
públicas entre os co-contratantes.
Sabe-se, com efeito, que, desde que tal foi reconhecido pela jurisprudência do
Conseil d’État francês a partir da década de 30 do século passado, a organização
administrativa do Estado de tipo europeu não mais deixou de assistir ao incremento de
um princípio geral de admissibilidade de contratualização do exercício de tarefas públicas
– o que passou a incluir i) o exercício conjunto de tarefas públicas por entidades públicas,
ii) o exercício simultâneo de tarefas públicas por co-contratantes públicos e privados e,
até, iii) a pura e simples delegação ou transferência dessas tarefas para os co-contratantes
privados da Administração Pública, no quadro de uma estratégia organizatória pela qual
esta abandona, pelo menos temporariamente, o exercício directo e pessoal das tarefas
contratualizadas. Evidentemente, a circunstância de um dado contrato ter por objecto a
transferência negociada e a disciplina do exercício de tarefas administrativas não tem de
implicar, só por si, uma dificuldade na aplicação do regime de contratação pública e na
escolha concorrencial do co-contratante da Administração. Aliás, é isso mesmo que
caracteriza dois dos tipos contratuais que o n.º 2 do artigo 16.º do CCP sujeita à Parte II
do mesmo Código – as concessões de obras públicas e de serviços públicos –, os quais,
entre outras notas distintivas, se destacam justamente pela circunstância de a própria

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exploração de uma obra relevante para a satisfação de uma necessidade de interesse geral
ou a gestão de um serviço público ficarem a cargo do adjudicatário por um período
predeterminado de tempo.
Porém, alguns dos contratos que regem a transferência ou o exercício em comum
de tarefas públicas distinguem-se pelo traço de as partes escolherem mutuamente o seu
co-contratante em razão da específica posição jurídica ou do estatuto que lhe é
reconhecido por uma disposição constitucional, legal ou regulamentar que o identifica
nominativamente como entidade habilitada para o exercício de tarefas públicas
determinadas.
Sublinhe-se: não se trata aí de qualquer fenómeno semelhante àquele previsto na
alínea a) do n.º 4 do artigo 5.º do CCP, que admite a ausência de concorrência em razão
da detenção de um direito exclusivo para a prestação de um serviço: nesse caso, o serviço
poderia, em abstracto, ser integrado no conceito de “prestações susceptíveis de estar
submetidas à concorrência de mercado” – não beneficiando da excepção prevista no n.º 1
do mesmo artigo 5.º –, apenas se verificando que, in concreto, tal prestação foi
juridicamente subtraída da concorrência em virtude da atribuição do direito exclusivo.
Ao invés, nos casos agora em análise, os contraentes que acordam a transferência
ou o exercício em comum de tarefas públicas reconhecem que uma disposição
constitucional ou legal (trata-se então de uma delegação legal de tarefas públicas:
gesetzliche Delegation) ou regulamentar (esta, evidentemente, após habilitação legal,
ainda que de carácter mais genérico, cabendo ao regulamento proceder precisamente à
sua especificação e detalhe: administrative Delegation) já identificou uma entidade, ou
um tipo de entidades, de natureza pública ou privada, com responsabilidades específicas a
gestão de um ou mais interesses públicos, sendo pois forçoso que as pessoas colectivas
que partilham tais responsabilidades cheguem a acordo sobre o seu exercício, revelando-
se o contrato, por isso mesmo, o modo por excelência de concretização dessa regulação.
O exemplo típico desse fenómeno resulta da concretização das políticas de
descentralização administrativa e de transferência de atribuições do Estado para os
demais entes públicos territoriais ou destes últimos para outros entes de menor dimensão.
Ora, apesar de se ter visto já que o ordenamento europeu não pretenderia, à
partida, interferir com o modo concreto de organização interna da Administração de cada

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Estado-Membro, incluindo com eventuais estratégias de delegação pública ou de


cooperação inter-administrativa, a verdade é que alguma jurisprudência recente veio
suscitando sérias dúvidas acerca da sensibilidade do TJUE quanto a tais fenómenos
organizativos.
Um exemplo significativo foi provido pelo Acórdão Piepenbrock, referente a um contrato
destinado à transferência, para uma circunscrição municipal, da missão pública de
limpeza de um certo conjunto de edifícios públicos mediante uma compensação
financeira que se cingia rigorosamente à cobertura dos custos incorridos na realização
dessa prestação, sem qualquer remuneração adicional. Apesar de o transmitente da
missão pública e o próprio Tribunal de reenvio terem recordado que um tal acordo
poderia ser reconduzido a “actos de organização administrativa interna”, a qual “não é da
competência da União Europeia” (cfr. n.os 17 e 23), o TJUE limitou-se a observar que
este contrato se não enquadraria em qualquer dos “dois tipos de contratos” “celebrados
[entre] entidades públicas” que vêm sendo excluídos do regime de contratação pública –
os contratos in house e os casos de cooperação público-pública que seguidamente se
abordarão (cfr. n.os 33-40) –, pelo que, tratando-se ainda de um contrato “a título
oneroso” – porque mesmo uma remuneração reduzida à cobertura de custos não prejudica
tal carácter oneroso (cfr. n.º 31) –, a adopção de um procedimento concorrencial não
estaria dispensada.
Foi neste contexto dubitativo que, procurando consolidar um regime mais estável
para a transferência de missões públicas entre entidades adjudicantes, o n.º 6 do artigo 1.º
da Directiva 2014/2419 esclareceu que “os acordos, decisões ou outros instrumentos
jurídicos que organizem a transferência de poderes e responsabilidades pela execução de
missões públicas entre autoridades adjudicantes ou agrupamentos de autoridades
adjudicantes, e que não prevejam uma remuneração pela execução dos contratos, são
considerados uma questão de organização interna dos Estados-Membros em causa e,
como tal, não são de forma alguma afectados pela presente directiva”.
Tendo em conta as potencialidades contidas na cláusula prevista no n.º 1 do artigo
5.º do CCP de 2008, compreende-se bem que o legislador de revisão tenha escolhido
proceder à transposição daquela disposição europeia através da inserção de um novo n.º 2
nesse artigo 5.º, o que implica, na prática, entender que uma tal figura de transferência de

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poderes, longe de representar uma inovação, constitui uma mera densificação da


permissão mais genérica que já advinha de 2008.
Porém, como se compreenderá, a dúvida que ainda subsiste – tanto à luz da
redacção europeia quanto à luz da redacção portuguesa adoptada naquelas disposições –
reside em saber qual o alcance a conceder ao requisito de inexistência de “remuneração”
a pagar ao transmissário das tarefas públicas: sendo certo que a proibição de
remuneração, como requisito para a dispensa de consulta concorrencial ao mercado,
procura vir de encontro à posição restritiva formulada pelo TJUE, o intérprete não pode
deixar de questionar se tal proibição abrangerá uma mera transferência das verbas
orçamentais de que o transmitente dispunha para a execução das tarefas transferidas e que
necessariamente devem acompanhar esta contratualização. É que, se essa mera
transferência orçamental também ficar prejudicada pela proibição de remuneração, bem
se vê que esta autorização para a dispensa de procedimentos concorrenciais perderá
qualquer efeito útil, visto que dificilmente o transmissário aceitaria encarregar-se de
tarefas públicas sem receber sequer as correspondentes verbas orçamentais para o efeito.
Esta é, pois, uma dúvida que apenas a jurisprudência posterior poderá dissipar.

4.3. Segunda hipótese de contratação público-pública: cooperação entre


entidades adjudicantes
No contexto da mencionada tendência evolutiva do ordenamento europeu, que
veio alargando as possibilidades de cooperação entre entidades públicas para a
prossecução de missões ou interesses comuns, coube ao TJUE encontrar vias alternativas
de contratualização que ultrapassassem as insuficiências do instituto da contratação in
house. Sendo evidente que o recurso a este instituto sempre dependeria da demonstração
de uma particular relação de controlo e dependência entre os dois co-contratantes ou
entre estes e uma terceira pessoa colectiva (v. infra), o juiz europeu discerniu que
precisaria de buscar um enquadramento para outros fenómenos de relações de cooperação
entre entidades que, embora não relacionadas por tais vínculos de dependência,
partilhassem interesses em comum na prossecução de tarefas públicas e carecessem de
uma contratualização para o desempenho conjunto ou coordenado dessas tarefas.

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Em tais casos, essa contratualização não respondia a quaisquer considerações de


tipo económico ou lucrativo, pretendendo unicamente facilitar o exercício de tarefas que
aconselhavam uma coordenação de esforços. Por isso, seria contraproducente o apelo ao
mercado para a selecção de um co-contratante cuja identidade só seria conhecida através
do processo concorrencial: ficava claro que cada entidade adjudicante já conhecia de
antemão a identidade do ente a quem pretendia contratar; e essa predeterminação não
decorria de qualquer intuito de defraudar a concorrência, antes resultando do objectivo
específico de um acordo que visava unir esforços entre contraentes públicos e que
perderia a sua razão de ser se não tivesse como partes justamente os titulares das
responsabilidades públicas em apreço.
Foi para responder a esta necessidade que o TJUE, no Acórdão Comissão vs.
Alemanha, alargou as hipóteses de formação não concorrencial de parcerias público-
públicas a situações não abrangidas pela contratação in house.
No caso em apreço, após observar que as relações estabelecidas entre quatro
Landkreise e os Serviços de Limpeza da Cidade de Hamburgo não implicavam qualquer
“controlo” associado a uma relação in house (cfr. n.º 36), o TJUE afirmou, porém, que
esse contrato se destinava unicamente a instituir uma “cooperação entre autarquias locais,
que tem por objectivo assegurar a realização de uma missão de serviço público comum” –
e não uma prestação de serviços associada a uma relação contratual comum –,
constituindo “quer o fundamento quer o quadro jurídico” para aquela missão, a
prosseguir somente “por autoridades públicas, sem a participação de privados” (cfr. n.os
37-44); ora, a pura proibição de uma tal cooperação chocaria com o princípio,
reconhecido pelo próprio TJUE, de que “uma autoridade pública pode desempenhar as
missões de interesse público que lhe incumbem, através dos seus próprios meios, sem ser
obrigada a recorrer a entidades externas que não pertençam aos seus serviços, e que pode
fazê-lo em colaboração com outras autoridades públicas” (cfr. n.º 45).
Sobretudo, a dispensa de um procedimento concorrencial não deveria ser vedada
uma vez demonstrado “que a realização desta cooperação seja regida unicamente por
considerações e exigências próprias à prossecução de objectivos de interesse público e
que o princípio da igualdade de tratamento dos interessados [...] seja garantido, de modo

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que nenhuma empresa privada seja colocada numa situação privilegiada relativamente
aos seus concorrentes” (cfr. n.º 47).
No Acórdão Ordine degli Ingegneri, o TJUE confirmou e sistematizou os
requisitos formulados para este tipo de cooperação não concorrencial: exigir-se-ia que
“[i)] tais contratos sejam celebrados exclusivamente por entidades públicas, sem a
participação de privados, [ii)] nenhum prestador privado seja colocado numa situação
privilegiada em relação aos seus concorrentes e [iii)] a cooperação que instituem seja
regida unicamente por considerações e exigências próprias à prossecução de objectivos
de interesse público”.
Foi esta via adicional de contratualização público-pública que a Directiva
2014/24, no n.º 4 do seu artigo 12.º, veio a acolher, procedendo a esta adaptação dos três
requisitos formulados pelo TJUE: “a) O contrato estabelece ou executa uma cooperação
entre as autoridades adjudicantes participantes, a fim de assegurar que os serviços
públicos que lhes cabe executar sejam prestados com o propósito de alcançar os
objectivos que têm em comum; b) A execução da referida cooperação é unicamente
regida por considerações de interesse público; e c) As autoridades adjudicantes
participantes exercem no mercado livre menos de 20% das actividades abrangidas pela
cooperação”.
É esta redacção que, no essencial, o n.º 5 do novo artigo 5.º-A do CCP passa a
acolher.
Com esta redacção, incumbe aos co-contratantes demonstrar:
⎯ Primeiro, a existência de uma ou mais tarefas que lhes estão atribuídas por um
instrumento público (lei, regulamento, acto ou contrato) e que são identicamente
atribuídas a ambos ou que, não sendo idênticas, pelo menos apresentam uma
conexão relevante entre si, justificando que a contratualização não possa ser
submetida ao mercado concorrencial em busca de um outro co-contratante;
⎯ Segundo, que a contratualização tem unicamente em vista a maximização da
eficiência na prossecução das tarefas públicas comuns, e não – nem mesmo
acessoriamente – a obtenção de lucros ou de qualquer outra vantagem económica;
⎯ Terceiro, para que a cooperação não seja usada para privilegiar qualquer actor no
mercado ou para a distorção de uma concorrência efectiva, que, caso qualquer

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actividade abrangida pela cooperação seja exercida no mercado concorrencial,


esse exercício não ultrapassa 20% da globalidade das actividades abrangidas.

Em contrapartida, não se requer já a demonstração de uma ausência de


remuneração entre os co-contratantes – o que supõe um flagrante contraste com o
supramencionado caso de transferência entre missões públicas previsto no n.º 6 do artigo
1.º da Directiva. É que, sublinhe-se, o legislador optou, neste ponto, por suprimir o
requisito adicional que a Comissão havia plasmado na sua proposta de 2011 e que fazia
depender a dispensa de adopção de procedimentos concorrenciais da prévia demonstração
de que “o acordo não envolve transferências financeiras entre as autoridades adjudicantes
participantes”. Mais: numa clara manifestação da flexibilidade aqui reconhecida pelo
legislador europeu, não foi sequer considerada satisfatória a hipótese, que se encontrava
incluída nessa proposta pela Comissão, de proibir apenas as transferências que fossem
“além das correspondentes ao reembolso dos custos efetivos das obras, serviços ou
produtos”, embora permitindo, pelo menos, estas últimas. Ao invés, ao exigir a total
supressão desse requisito, o legislador contempla mesmo a previsão de uma remuneração
adequada que extravase a cobertura de custos e assegure uma margem de lucro a um dos
co-contratantes, bastando-se com a referida demonstração de que, mesmo no contexto de
tal remuneração, a cooperação continua a ser “unicamente regida por considerações de
interesse público”.

4.4. Terceira hipótese de contratação público-pública: contratação in


house
4.4.1. Enquadramento
. É sabido, porém, que sempre residiu no fenómeno da contratação in house a mais
importante excepção à aplicação do regime de contratação pública no contexto interno do
universo público. Se, como acima se disse, o ordenamento europeu não nega que o
Estado possa redistribuir algumas das suas atribuições, previamente confiadas aos seus
serviços, remetendo-as para entidades distintas de si próprio e a quem atribuiu
personalidade jurídica, tem também de contemplar a possibilidade de o Estado-Criador
dessas novas entidades não ter ainda permitido que estas deixem a sua esfera de

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influência, mantendo a capacidade de controlar as suas decisões e a sua autonomia de


vontade.
Ora, essa relação de dependência pode tornar desadequada a exigência de adopção
de procedimentos de contratação pública. Se, na verdade, o controlo que a entidade
adjudicante exerce sobre uma outra pessoa colectiva é tão intenso que permite “anular
por inteiro a vontade negocial e a autonomia” desta última, a relação entre tais duas
entidades (apenas) formalmente autónomas é afinal idêntica àquela que resulta, dentro da
própria Administração Pública, de uma mera “delegação interorgânica”.
Foi nesse contexto que, desde o célebre Acórdão Teckal, e através de uma
sequência de arestos onde pontificaram os Acórdãos Stadt Halle, Coname, Parking
Brixen, Comissão c. Áustria (Mödling), ANAV, Carbotermo, Asemfo c. Tragsa,
Comissão c. Itália, Coditel, Sea e Econord, o TJUE veio a fixar os dois requisitos
(cumulativos) que não mais abandonou para autorizar o apelo à contratação in house: i) a
entidade adjudicante deve exercer sobre o adjudicatário um controlo análogo ao que
exerce sobre os seus próprios serviços; e ii) o adjudicatário deve realizar o essencial da
sua actividade em benefício da entidade adjudicante.
Nestes casos, a relação “contratual” reduz-se a uma relação interna da
Administração, no âmbito da qual a entidade criadora se limita a beneficiar das
prestações realizadas pela sua criação instrumental – mesmo que a tenha dotado de
personalidade jurídica (seja ela pública ou privada) própria e autónoma. Nesse cenário,
seja por se considerar que não existe, nesses casos, um verdadeiro contrato, seja por se
defender que o adjudicatário, ainda que com personalidade distinta, representa um
simples prolongamento da entidade adjudicante no âmbito da autonomia organizativa de
que esta dispõe, fica prejudicada a aplicação das regras de formação de contratos
públicos.
Visto que, à data de 2008, a contratação in house não era expressamente
reconhecida por qualquer norma europeia de Direito escrito dotada de um âmbito geral –
essa figura apenas era admitida no contexto da Directiva 2004/17/CE, aplicável
unicamente aos «sectores especiais» –, antes constituindo uma construção puramente
pretoriana, o legislador português, ao aprovar o CCP, preferiu, por isso, recorrer a esta

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formulação jurisprudencial para a enunciação dos dois requisitos formulados desde o


Acórdão Teckal. Fez isso através das duas alíneas do n.º 2 do artigo 5.º do CCP.

4.4.2. A estabilização do primeiro requisito referente ao


“controlo análogo”
Ao pretender regular, pela primeira vez, por normas escritas dotadas de carácter
transversal, o instituto da contratação in house, o legislador da Directiva 2014/24 teve a
oportunidade de consolidar alguns avanços jurisprudenciais que permitiram modelar ou
adaptar aqueles dois requisitos.
Desde logo, era sabido que o primeiro daqueles dois requisitos havia sido
rapidamente estabilizado pelo TJUE: desde cedo este esclareceu que, se a entidade
adjudicante deve exercer sobre o adjudicatário um “controlo análogo” àquele que exerce
sobre os seus próprios serviços, tal deve ser entendido como significando a “possibilidade
de influência determinante quer sobre os objectivos estratégicos quer sobre as decisões
importantes”.
A doutrina europeia sintetizou bem este critério: a adopção de procedimentos
concorrenciais só é dispensada se, na relação entre entidade adjudicante e adjudicatário,
“só há uma vontade decisória que ordena a realização de uma determinada actividade a
um apêndice próprio [...]. O ente que recebe o mandato deve realizar o encargo sem que
possa negar-se. A sua vontade não importa. O seu consentimento não é necessário”. Se o
adjudicatário não pode representar mais do que uma parte da “estrutura interna” da
entidade adjudicante46, então não há relação in house quando ele ainda dispõe de “uma
margem de autonomia decisória sobre aspetos relevantes da sua vida, relacionados, por
exemplo, com a estratégia comercial a seguir, as actividades a desenvolver, os
endividamentos a contrair, etc.”.
Este esclarecimento foi plenamente aproveitado pela alínea a) do n.º 1 do artigo
12.º da Directiva 2014/2448, transposto pela alínea a) do n.º 1 e pelo n.° 3 do artigo 5.º-A
do CCP revisto, que densificam o conceito de “controlo análogo”, justamente, como uma
“influência decisiva sobre os objectivos estratégicos e as decisões relevantes da entidade
controlada”.

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Tratou-se aqui, em qualquer caso, de um mero esclarecimento que não carecia de


inovar perante uma jurisprudência já há muito estabilizada.

4.4.3. A clarificação do segundo requisito referente ao


“essencial da actividade”
Era totalmente distinta a situação relativa ao segundo requisito enunciado pela
jurisprudência do TJUE e consagrado na alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º do CCP: a
confirmação de que o essencial da actividade do adjudicatário é realizado em benefício
da entidade adjudicante. Neste ponto, urgia uma intervenção legislativa pacificadora para
pôr termo à censurável indefinição revelada pelo juiz europeu.
Compreendia-se bem a razão subjacente à exigência desse segundo requisito:
como foi apontado pelo Advogado-Geral PHILIPPE LÉGER, “uma entidade não é
necessariamente privada de liberdade de acção apenas pelo facto de as decisões que lhe
dizem respeito serem tomadas pela colectividade que a detém, se ela ainda puder exercer
uma parte importante da sua actividade económica junto de outros operadores”. Para que
seja aceitável a dispensa de procedimentos concorrenciais, é pois necessário confirmar
que a relação entre o adjudicatário e a entidade adjudicante “se reveste de uma quase
exclusividade, em benefício desta última, dos serviços que presta”.
Porém, a jurisprudência das últimas duas décadas vinha oferecendo uma radical
divisão entre duas teses opostas acerca do entendimento a oferecer a esse segundo
requisito.
De acordo com um entendimento quantitativo, destinado a evitar deixar o
intérprete sujeito a conceitos excessivamente indeterminados, o TJUE chegou a recorrer à
fixação de uma percentagem mínima do volume de negócios que o adjudicatário deveria
realizar com a entidade adjudicante.
Para isso, chegou mesmo a usar como referência a uma disposição paralela – a
disposição constante da Directiva 93/38 (depois da Directiva 2004/17), que, contudo, só
era aplicável no âmbito dos «sectores especiais» – que previa que o adjudicatário
realizasse mais de 80% da actividade em benefício da entidade adjudicante.
Ora, o próprio TJUE veio reconhecendo que, não obstante a segurança jurídica
que poderia resultar da aplicação de um tal limite quantitativo, esse critério poderia

DANIEL LOURENÇO
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conduzir o intérprete a desconsiderar factores qualitativos que também indiciassem uma


efectiva dependência económica em face da entidade adjudicante. A simples averiguação
da origem do volume de negócios do adjudicatário poderia não reproduzir o controlo
realmente exercido pela entidade adjudicante sobre o seu prolongamento administrativo.
No dizer da Advogada-Geral CHRISTINE STIX-HACKL, que mais combateu contra
aquele tese quantitativa, o juiz deveria “averiguar o «essencial da actividade» com base
em circunstâncias quantitativas e qualitativas”, sendo que, “no que respeita aos aspectos
qualitativos, há que determinar como e para quem a entidade controlada em questão
realiza as suas actividades”. É evidente a razão para o recurso a um tal critério composto:
aquilo que cabe aferir é se o controlo exercido pela entidade adjudicante é tão intenso que
“anula por inteiro a vontade negocial e a autonomia” da sua criação, o que permitiria
confirmar – reitere-se – que a relação (alegadamente) contratual se reduz, afinal, a uma
relação administrativa interna.
Sucede que, para que esse cenário se verifique, bem pode ocorrer que, tendo a
entidade adjudicante determinado que a sua “criação” proceda à satisfação de uma tarefa
pública, preveja também que sejam os particulares ou outros terceiros que aproveitam tais
prestações a suportar a sua remuneração; podem tais terceiros constituir os destinatários
imediatos das prestações da entidade tutelada e, em consequência, ser os responsáveis
pelo seu financiamento – o que não impede que se conclua que, afinal, este
“prolongamento administrativo” só realizou tais prestações e celebrou os pertinentes
contratos porque a isso foi forçado pela sua dominadora, sem que dispusesse de qualquer
“autonomia de vontade” ou devesse dar o seu consentimento para esse efeito.
Nesse sentido, um sector da jurisprudência do TJUE veio a reconhecer que, se a
relação in house depende de se confirmar a total dependência da “entidade filha” em face
da sua criadora, devem então ser contabilizadas todas as actividades que lhe sejam
impostas em razão da “vontade decisória única” da “Administração-mãe”: “é indiferente
saber quem remunera a empresa em questão, quer se trate da [entidade] que a controla ou
dos terceiros utilizadores das prestações fornecidas em virtude das concessões ou de
outras relações jurídicas constituídas pela referida [entidade]. É também irrelevante saber
em que território são fornecidas as referidas prestações”.

DANIEL LOURENÇO
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Entende-se, pois, que o legislador da Directiva 2014/24 fosse chamado a findar


essa querela e a fixar uma solução definitiva para o apuramento deste segundo requisito.
Crê-se que a solução adoptada foi muito meritória, ao promover aquilo que constitui uma
verdadeira conjugação das teses quantitativa e qualitativa do TJUE para extrair o
elemento mais importante de cada uma delas: nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo
12.º dessa Directiva – transposta pela alínea b) do n.º 1 do artigo 5.º-A do CCP revisto –,
prevê-se que “a entidade controlada desenvolva mais de 80% da sua actividade no
desempenho de funções que lhe foram confia- das pela entidade adjudicante”.
Deve notar-se a postura conciliadora – e eficaz – adoptada pelo legislador. Por um
lado, não ignora as vantagens de um critério quantitativo para a eliminação de uma
excessiva insegurança jurídica; por isso, o limite de 80%, que vinha sendo adoptado nas
Directivas dos «sectores especiais”, é agora alargado transversalmente para os «sectores
comuns». Contudo, discernindo as insuficiências de um apuramento meramente
automático desse requisito, o legislador faz incluir dentro desses 80% todas e quaisquer
prestações realizadas “no desempenho de funções” que lhe foram confiadas pela entidade
adjudicante ou por outras entidades que esta controla. Assim, aproveitando o melhor dos
ensinamentos da jurisprudência Carbotermo, o legislador confirma ser irrelevante se os
proveitos obtidos no exercício dessas funções resultam ou não directamente de uma
remuneração da entidade adjudicante ou, no limite, quem são os utilizadores das
prestações do adjudicatário, desde que tais prestações tenham sido especificamente
determinadas no contexto da relação com a entidade adjudicante ou com outras pessoas
colectivas por ela controladas.
Por sua vez, para o apuramento desse limite de 80%, o n.º 5 do artigo 12.º da
Directiva 2014/24 – bem como o n.º 6 do artigo 5.º-A do CCP revisto – determinam o
recurso ao “volume médio total de negócios, ou uma medida alternativa adequada,
baseada na actividade, tais como os custos suportados pela pessoa colectiva em causa no
que diz respeito a serviços, fornecimentos ou obras, nos três anos anteriores ou, quando
não tenha três anos de actividade concluídos, a projecção de actividades a desenvolver”.

DANIEL LOURENÇO
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4.4.4. A formalização de um terceiro requisito referente à


proibição de participação privada na relação in house
A actualização legislativa do regime da contratação in house não podia, todavia,
bastar-se com a consolidação daqueles dois requisitos. Com efeito, logo desde 2005, pelo
mencionado Acórdão Stadt Halle, num ponto em que ainda não pretendia fazer mais do
que densificar o (primeiro) requisito referente ao “controlo análogo”, o TJUE acabou por
propor um critério adicional de despistagem da existência dessa “influência
determinante” da entidade adjudicante sobre o adjudicatário, que se prestou a sérios
equívocos e que suscitou dúvidas nos operadores jurídicos quanto à sua justificação à luz
do princípio da concorrência.
Esse critério foi identificado quando o TJUE sustentou que qualquer participação
– mesmo que minoritária – de uma empresa privada no capital social do adjudicatário
afasta a existência daquele “controlo análogo”. Tal tese estaria fundamentada, primeiro,
no facto de qualquer investimento privado obedecer a juízos guiados por interesses
privados, os quais se não confundem com os interesses públicos que guiam a entidade
adjudicante, não se podendo pois alegar a existência de uma vontade decisória única entre
os dois co-contratantes. E estaria também fundamentada no facto de uma adjudicação de
um contrato a uma empresa onde, mesmo marginalmente, militam capitais privados
poder equivaler a atribuir um benefício ilegítimo ao titular da participação privada, que
ficaria colocado numa posição de vantagem em relação aos demais atores de mercado.
Assim, a presença de qualquer participação privada no capital da empresa
adjudicatária seria considerada um factor automaticamente excludente de uma relação in
house. Esta tese foi replicada, no essencial, nos Acórdãos Coname, Comissão c. Áustria
(Mödling), ANAV, Jean Auroux, Comissão c. Itália, Coditel, Sea, Acoset e Mehiläinen.
Não surpreendeu que essa tese jurisprudencial suscitasse grande controvérsia,
acabando mesmo a provocar a oposição de Advogados-Gerais. Se, na verdade, o regime
da contratação pública vem constituindo o palco ideal para o surgimento de uma
jurisprudência do TJUE que se mostra particularmente avessa à formulação de critérios
automáticos para decisão apriorística de casos, preferindo obrigar os aplicadores a uma
verificação casuística de todos os factores envolvidos numa situação concreta – recorde-
se, desde logo, a polémica que se acaba de relatar quanto ao segundo requisito para a

DANIEL LOURENÇO
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verificação de uma relação in house –, é claro que a questão relativa à participação


privada na relação in house representaria justamente um dos exemplos que reclamariam
uma tal ponderação casuística e se oporiam à formulação de qualquer critério automático.
Na verdade, será, no mínimo, temerário afiançar que sempre, em todos os casos em que
uma empresa tenha algum tipo de participação privada, ela ficará, sem excepção, sob o
risco de obedecer a critérios de actuação distintos do interesse público prosseguido pela
entidade adjudicante.
Todavia, ao aprovar as Directivas de 2014, o legislador europeu não podia
desconhecer a firmeza com que o TJUE abraçou esta bandeira em nome do princípio da
concorrência. Na verdade, já depois dessa aprovação, o TJUE acabou mesmo por levar
essa tese a um ponto extremo – que nunca antes atingira nestes moldes –, quando, pelo
Acórdão SUCH, incluiu nessa proibição qualquer participação directa de uma entidade
não pública, ainda que de natureza social. Alegando que os eventuais entes privados
presentes num adjudicatário – mesmo, sublinhe-se, que pertencendo ao «terceiro sector»
– “prosseguem interesses e finalidades que, por mais meritórias que possam ser do ponto
de vista social, são de natureza diferente da dos objectivos de interesse público
prosseguidos pelas entidades adjudicantes”, podendo “realizar actividades económicas
em concorrência com outros operadores económicos” e podendo assim “proporcionar aos
seus associados privados uma vantagem concorrencial”, o TJUE acabou por vedar a
relação in house em qualquer caso de participação não pública no adjudicatário – e não
apenas nos casos estritos em que essa participação se materialize através de “capital
privado”.
Assim, aceitando a postura restritiva que o TJUE vinha mantendo desde 2005, o
legislador europeu autonomizou um terceiro requisito, de natureza negativa, para a
presença de uma relação in house, em cujos termos não pode haver “participação directa
de capital privado na pessoa colectiva controlada” (cfr. alínea c) do n.º 1 do artigo 12.º da
Directiva 2014/2475; alínea c) do n.º 1 do artigo 5.º-A do CCP revisto).
A participação privada fica agora autorizada, excepcionalmente, apenas quando
decorra de uma exigência de “disposições legislativas nacionais”, desde que “em
conformidade com os Tratados”, e ressalvada a garantia de que ela não acarrete quaisquer

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

“poderes de controlo” e “bloqueio” ou qualquer “influência decisiva na pessoa colectiva


controlada”.
Tal como o próprio legislador europeu esclarece através do Considerando 32 da
Directiva 2014/24, esta excepção somente pretende salvaguardar os casos de “organismos
públicos de participação obrigatória, como as organizações responsáveis pela gestão ou o
exercício de determinados serviços públicos”, em que a participação privada, resultando
de uma imposição pública e não de uma opção privada, em nada interfere com o
funcionamento e a actividade do adjudicatário.
Observa-se, todavia, que uma tal rigidez quanto à proibição de interferência
privada na relação in house não deixou de sofrer uma brecha ao finalizar o processo de
elaboração das Directivas: é que a já citada proposta apresentada pela Comissão em
dezembro de 2011 revelava um evidente desejo de abarcar qualquer fenómeno de
participação directa ou indirecta de privados em contratos in house, exigindo-se a
demonstração de que “não existe nenhuma participação privada na pessoa coletiva
controlada”.
Porém, o texto final de 2014 viria a bastar-se com a inexistência de “participação
directa de capital privado na pessoa colectiva controlada”. E nesses termos foi transposto
para o já citado preceito do CCP revisto. Isso implica, pois, que, numa relevantíssima
excepção, a interposição de um ou mais entes numa cadeia de participações entre a
entidade adjudicante e o adjudicatário pode acabar por viabilizar a conclusão de
adjudicações não concorrenciais.

4.4.5. Alargamento do conceito de relação in house numa


perspectiva multidireccional
Em compensação pela restrição imposta por este terceiro requisito, o fenómeno da
contratação in house obtém um alargamento resultante de uma verdadeira mudança de
perspectiva acerca da sua natureza e do seu alcance na contratação pública.
Poderia admitir-se que, na formulação clássica oriunda do Acórdão Teckal e ainda
plasmada no n.º 2 do artigo 5.º do CCP de 2008, o relacionamento relevante para a
dispensa da adopção de um procedimento concorrencial consistisse unicamente naquele
que derivasse de uma conexão vertical, em sentido descendente, pela qual a entidade

DANIEL LOURENÇO
125
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

criadora se socorresse das prestações colocadas à sua disposição pela sua criação. A
criadora assumiria obrigatoriamente a posição de entidade adjudicante; o adjudicatário
seria o seu prolongamento administrativo; e o instituto da contratação in house ficaria
reduzido a esta relação inter-administrativa.
Era sabido, todavia, que o ordenamento europeu não desconhecia outras
perspectivas substancialmente mais amplas do fenómeno in house. Mesmo abstraindo de
certas formulações jurisprudenciais progressivamente mais flexíveis, o regime plasmado
pelo artigo 23.º da Directiva 2014/17 para os «sectores especiais» continha uma visão
qualitativamente distinta, privilegiando a dispensa de concorrência para a formação de
contratos celebrados no contexto de uma mera relação de grupo estabelecida entre
empresas associadas que exercessem entre si uma influência dominante ou que se
submetessem à influência dominante de uma empresa comum. Nesse plano, o legislador
mostrava-se já sensível à possibilidade de obtenção de mais-valias resultantes da
contratação cruzada entre todas as pessoas colectivas abrangidas num universo mais
amplo de entidades sujeitas ao domínio de uma entidade comum – desde que,
naturalmente, para cada uma delas, se encontrasse cumprido o mencionado requisito
quantitativo de demonstração de que um mínimo de 80% do volume de negócios proviria
de vendas ou prestações realizadas intra-grupo.
O legislador da Directiva 2014/24, ao ponderar a consagração formal de um
regime de contratação in house também para os «sectores comuns», não ignorou as mais-
valias resultantes desta concepção ampliativa do fenómeno in house.
Por isso, no n.º 2 do seu artigo 12.º – transposto pelo n.º 2 do artigo 5.º-A do CCP
revisto –, as relações in house são agora acolhidas numa perspectiva multidireccional,
permitindo-se a dispensa de concorrência na formação de contratos adjudicados i) pela
entidade controladora à entidade controlada (relação vertical descendente), ii) pela
entidade controlada à entidade controladora (relação vertical ascendente ou relação in
house invertida); e, ainda, iii) por uma entidade controlada a outra entidade controlada,
quando ambas estejam sujeitas à influência determinante da mesma pessoa colectiva
controladora (relação horizontal).
É óbvio que, para tanto, sempre se exigirá a manutenção dos três requisitos
cumulativos que inerem a qualquer relação in house.

DANIEL LOURENÇO
126
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

. Por último, numa facilitação adicional deste alargamento do fenómeno in house, o


n.º 3 do artigo 12.º da Directiva 2014/24 – transposto pelo n.º 4 do artigo 5.º-A do CCP
revisto – permite que o intérprete considere verificado o primeiro requisito – referente à
influência determinante a exercer pela entidade controladora sobre a entidade controlada
– também nos casos de controlo análogo conjunto.
Para esse efeito, devem estar confirmadas as seguintes três exigências:
a) “Os órgãos de decisão da pessoa colectiva controlada são compostos por
representantes de todas as entidades adjudicantes participantes;
b) As entidades adjudicantes podem exercer conjuntamente uma influência decisiva
sobre os objectivos estratégicos e as decisões relevantes da pessoa colectiva
controlada;
c) A pessoa colectiva controlada não prossegue quaisquer interesses contrários aos
interesses das entidades adjudicantes que a controlam”.

Por via deste alargamento adicional, ficam, em especial, salvaguardados os casos


– comuns no âmbito da cooperação intermunicipal – de congregação de distintas
entidades públicas para a criação de uma nova entidade, sujeita à sua influência
dominante conjunta, destinada a auxiliá-las, de forma descentralizada, na prossecução de
atribuições comuns, o que, necessariamente, pressupõe a autorização para a livre
contratação, à margem de qualquer procedimento concorrencial, entre a nova criação e
qualquer uma das suas entidades criadoras.
Em suma, através de três distintas hipóteses de contratação inter-administrativa
fora do contexto de qualquer procedimento concorrencial, o ordenamento europeu – e, na
sua sequência, o novo regime português de contratos públicos – confirma levar a sério,
até fronteiras nunca antes conhecidas, o seu agnosticismo quanto aos métodos nacionais
escolhidos por cada Estado-Membro para prossecução contratualizada do interesse
público, incluindo, se for o caso, a liberdade de eleição dos seus meios próprios ou de
outros entes públicos que lhe estão associados.

DANIEL LOURENÇO
127
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

PARTE III
PROCEDIMENTO DE ADJUDICAÇÃO DE CONTRATOS PÚBLICOS

1.7.8.3. SUJEITOS DO PROCEDIMENTO DE


ADJUDICAÇÃO
1.1. Entidades adjudicantes
Naturalmente, a primeira categoria de sujeitos do procedimento de adjudicação é
constituída pelas entidades adjudicantes. Encontram-se indicadas nos artigos 2º a 7º CCP
e, como vimos, trata-se, em regra, de entidades com personalidade jurídica. Só não é
necessariamente assim no caso das centrais de compras, entidades adjudicantes que, nos
termos da lei, podem ter natureza de serviços públicos ainda que desprovidos de
personalidade jurídica.

1.2. Agrupamentos de entidades adjudicantes


Para adquirirem os bens e os serviços de que carecem para o desenvolvimento das
respetivas missões, as entidades adjudicantes dispõem das possibilidades seguintes:
a) Lançamento de procedimentos de adjudicação em seu nome e através
dos seus órgãos, eventualmente com a colaboração de prestadores de
serviços na preparação de atos do procedimento;
b) Realização de adjudicações no âmbito de acordos-quadro celebrados
por outras entidades, como as centrais de compras;
c) Realização das aquisições através de centrais de compras ou de outras
entidades mandatadas, cabendo a estas efetuar a aquisição a pedido e
em representação das entidades adjudicantes;
d) Em associação informal (agrupamento) com outras entidades.

Nos termos do artigo 39º/1CCP, as entidades adjudicantes podem agrupar-se com


vista a:
⎯ Formação de contratos cuja execução seja do interesse de todas;
⎯ Formação de um acordo-quadro de que todas possam beneficiar;
⎯ Gestão conjunta de sistemas de aquisição dinâmicos;

DANIEL LOURENÇO
128
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

⎯ Aquisição conjunta utilizando catálogos eletrónicos.


As situações que podem originar a contratação conjunta, radicadas num interesse
comum às entidades que se agrupam, apresentam feições muito variadas: podem resultar
da presença de interesses indivisíveis (contratos de aluguer do equipamento de duas
entidades que se juntam para realizar uma feira), mas também de interesses
convergentes ou paralelos (contrato de empreitada de duas freguesias para
pavimentação de um troço de estradas que pertence, em parte, a uma e, noutra parte, a
outra).
O agrupamento de entidades adjudicantes representa, simplesmente, o conjunto
ou a agregação das entidades que se agrupam, ao qual não corresponde qualquer
exigência de formalização. O agrupamento não tem órgãos, nem estruturas próprias,
limitando-se o CCP a exigir, de entre as entidades agrupadas, a designação de uma delas
como representante do agrupamento.
Nos termos em que o CCP os concebe, os agrupamentos de entidades
adjudicantes formam-se livremente, e têm fundamento num acordo entre as entidades
constituintes de um agrupamento – o acordo poderá não ter uma existência formal
autónoma, mas deverão existir atos jurídicos dos órgãos de cada entidade adjudicante
com a decisão de adesão ao agrupamento.
Em todos os casos, e desde logo nos dois primeiros indicados no artigo 39º/1,
apresenta-se claro que o agrupamento de entidades adjudicantes surge concebido numa
ótica essencialmente procedimental: é constituído para a formação de contratos cuja
execução seja do interesse de todas ou para a formação de acordos-quadro de que todas
possam beneficiar.
O CCP não contém qualquer disciplina aplicável após a adjudicação de contratos
por agrupamento de entidades adjudicantes. Desde logo, nada se diz sobre se todas as
entidades que constituem o agrupamento têm de subscrever, em conjunto, o contrato ou o
acordo-quadro que resulte do procedimento. Seja como for quanto a isso, não há duvidas
de que a lei não exige que, em vista da celebração do contrato ou do acordo-quadro, as
entidades adjudicantes se associem formalmente.
Conforme estabelece o 39º/2 CCP, as entidades adjudicantes devem designar qual
delas constitui o representante do agrupamento para efeitos de condução do procedimento

DANIEL LOURENÇO
129
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

de formação do contrato ou do acordo-quadro a celebrar. A lei limita-se a indicar que à


entidade adjudicante com a função de representação do agrupamento cabe a condução do
procedimento, o que nos parece significar que uma das entidades tem a responsabilidade
de, através dos seus serviços e órgãos, organizar a sequência do procedimento, dar o
impulso para a realização dos respetivos trâmites e, em geral, gerir o andamento do
procedimento na plataforma eletrónica. As responsabilidades da entidade adjudicante
com função de representação do agrupamento estão balizadas por dois limites:
⎯ Por um lado, as competências que devem ser exercidas conjuntamente
(39º/3);
⎯ Por outro lado, pelas competências próprias do júri.
Em geral, o que sobra, e se situa entre esses limites, são poderes internos ou
instrumentais, destituídos de caráter decisório, associados à promoção e ao impulso
burocrático da marcha do procedimento.
Todas as decisões que, nos termos gerais do CCP, são da competência do órgão
com competência para a decisão de contratar devem ser tomadas conjuntamente pelos
órgãos competentes de todas as entidades que integram o agrupamento, eventualmente
através de conferencia procedimental (art.77CPA).
Quanto à escolha do procedimento de adjudicação, destaca-se o disposto nos
números 4 e 5 do artigo 39ºCCP.
Estabelece o nº6 do artigo 39ºCCP que as entidades adjudicantes que integram o
agrupamento só são solidariamente responsáveis pelo cumprimento das obrigações por si
assumidas quando tais obrigações o sejam na sua totalidade pelo conjunto dos seus
membros. O preceito foi introduzido pela revisão de 2017 e na opinião do Professor
PEDRO COSTA GONÇALVES não faz qualquer sentido.
Devemos seguir o entendimento da Diretiva 2014/24/UE: entendendo-se que não
há qualquer impossibilidade de constituição de agrupamentos de entidades adjudicantes
para a realização de apenas uma parte ou uma fase do procedimento de adjudicação,
mantendo autonomia e soberania sobre algumas decisões, que não querem tomar em
conjunto, mas antes isoladamente, devemos também entender que a repartição de
responsabilidade pelo cumprimento das obrigações impostas pelo CCP em matéria

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

procedimental faz-se segundo os critérios naturais da Diretiva: responsabilidade solidária


nas decisões conjuntas e responsabilidade individual no caso de decisões individuais.
1.3. Órgão adjudicante: órgão competente para a decisão de contratar
O órgão competente para a decisão de contratar é o órgão da entidade adjudicante
ao qual o CCP atribui a responsabilidade de proferir todas as decisões fundamentais e a
maior parte das decisões do procedimento de adjudicação.
Competente para a decisão de contratar é o órgão indicado na lei orgânica ou nos
estatutos da entidade adjudicante: art.36º/2. Quando o contrato envolva o pagamento de
um preço, o CCP esclarece que essa competência cabe então ao órgão competente para
autorizar a despesa inerente ao contrato a celebrar:art.36º/1.
Como se compreende, ao CCP não cabe indicar o órgão de cada entidade
adjudicante com competência para decidir contratar – é a lei orgânica ou estatutária da
entidade adjudicante que cabe fornecer essa indicação; neste sentido, o nº1 do artigo 36º
deve ser interpretado como uma norma facilitadora ou de esclarecimento mas não como
preceito de atribuição de uma competência nova aos órgãos competentes para autorizar
despesas. No silêncio do CCP, sempre se haveria de entender que a competência para a
decisão de contratar cabe ao órgão competente para autorizar a despesa. Mas claro, na
medida em que a lei orgânica da entidade adjudicante estabeleça um outro regime, é esse
regime especifico que se aplica e não a indicação do CCP. Por outro lado, há inúmeras
entidades adjudicantes que não dispõe de um órgão especificamente competente, nos
termos da lei, para autorizar despesas, caso em que o nº1 do artigo 36º, não tem
aplicação.
O órgão adjudicante é, claramente, o órgão principal do procedimento de
adjudicação, ao qual cabe, em geral, todo o universo de competências administrativas de
decisão com projeção externa, adotadas no processo de relacionamento jurídico com
todos os interessados. Fora da esfera própria e exclusiva do órgão adjudicante ficam, num
primeiro momento, apenas as competências próprias do júri do procedimento.
Inserido num capitulo sobre a delegação de competências, o nº1 do artigo 109º,
dispõe que todas as competências atribuídas pelo CCP ao órgão competente para a
decisão de contratar podem ser delegadas. O preceito não indica possíveis órgãos
delegatários, ao contrário do que sucede com a delegação prevista no respetivo nº2. Mas,

DANIEL LOURENÇO
131
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

além dos subalternos do órgão adjudicante, um dos destinatários possíveis dessa


delegação, é, naturalmente, o júri do procedimento: neste sentido, veja-se o nº2 do artigo
69ºCCP.

1.4. Júri do Procedimento


O júri do procedimento é um órgão administrativo temporário (art.20º/2 CPA),
constituído ad hoc, caso a caso, para cada procedimento, a quem é confiada a
incumbência, formulada em termos genéricos, de conduzir o procedimento (art.67º/1).
Embora não se revele inteiramente clara a sua natureza, o júri pode considerar.se
o órgão instrutor do procedimento de adjudicação, cabendo-lhe, por conseguinte, a
direção da instrução do procedimento, ou melhor, de uma parte da instrução do
procedimento.
Enquanto órgão responsável pela instrução, o júri é, em regra, um mero órgão
interno, que não exerce uma função decisória final, não lhe cabendo, no quadro das suas
competências próprias, adotar decisões com efeitos jurídicos externos, que resolvam, em
termos finais qualquer assunto ou matéria que afete de forma direta e imediata a situação
jurídica dos intervenientes no procedimento. Ao júri cabe uma tarefa procedimental, que,
na sua essência, reside na preparação de decisões finais e externas que outro órgão da
entidade adjudicante irá tomar.
No exercício das suas competências, o júri do procedimento apresenta-se como
um órgão finalmente independente, pois não integra qualquer cadeia hierárquica de
órgãos da entidade adjudicante; não te, portanto, o dever de acatar ordens, instruções ou
diretivas sobre o modo como substancialmente exerce as suas competências próprias de
instrução do procedimento.
O júri surge configurado, em rega, como órgão de existência obrigatória em todos
os procedimentos de adjudicação.
A primeira, correspondente a uma exceção legal, contemplada no artigo 67º/1, é a
do procedimento de ajuste direto. A justificação para esta exceção encontra-se no facto de
o ajuste direto ser um procedimento em que apenas uma entidade é convidada e em que,
por isso, haverá lugar à apresentação de apenas uma proposta (art.112º/2), facto que
dispensa várias diligências procedimentais da competência normal do júri.

DANIEL LOURENÇO
132
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À segunda exceção, já não ex lege, mas fundada na decisão do órgão adjudicante,


refere-se o nº3 do artigo 67º: na consulta prévia e no concurso público urgente, o órgão
adjudicante pode decidir que os procedimentos sejam conduzidos pelos serviços da
entidade adjudicante. Nestes casos, o serviço da entidade adjudicante – ou o responsável
do procedimento – substitui o júri e todas as referências do CCP ao júri devem
considerar-se feitas aos serviços. O propósito da lei residir em aligeirar a exigência
formal de instituição de um órgão para a condução do procedimento: percebe-se melhor
esse propósito no caso do concurso público urgente do que na consulta prévia.
Por fim, uma terceira exceção, de âmbito geral, aplicável em todos os
procedimentos: o júri pode ser dispensado nos procedimentos em que tenha sido
apresentada uma única proposta (Art.67º/4). A decisão de dispensar o júri neste caso
ocorre já dentro do procedimento, após o decurso do prazo de apresentação de propostas.
Essa decisão não altera a tramitação procedimental, que segue o curso normal, salvo no
caso do artigo 125º/2 (procedimento de consulta prévia). Também aqui o júri é
substituído pelos serviços da entidade adjudicante (125º/1), podendo ser designado um
responsável pelo procedimento.
O júri apresenta-se como um órgão plural, composto, sempre em número impar,
por um mínimo de três membros efetivos, um dos quais preside, e dois suplentes, todos
designados pelo órgão adjudicante (Art.67º/1CCP).
Apesar de exigir a instituição de um júri, com o propósito de separar
organicamente os momentos procedimentais de instrução e de decisão, a lei, em aparente
contradição com a referida ideia de separação, permite que os titulares do órgão
adjudicante possam ser designados membros do júri (art.67º/2). Trata-se uma opção
legitima de politica legislativa, que terá a seguinte consequência: o titular do órgão
adjudicante que tenha integrado o júri fica impedido de participar, naquela condição, na
tomada de decisões sobre as propostas do júri, por analogia com o caso previsto no artigo
69º/1/d) CPA.
O júri do procedimento detém as competências próprias. Mas além dessas, pode
ser investido, por ato de delegação, no exercício de competências do órgão adjudicante.
Neste sentido, o artigo 69º/2, estabelece que cabe ainda ao júri exercer a
competência que lhe seja delegada pelo órgão competente para a decisão de contratar.

DANIEL LOURENÇO
133
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Existem um conjunto de competências que são indelegáveis no júri do


procedimento:
⎯ Competência para a rectificação (alteração) das peças do procedimento
(suprimento de erros ou omissões detetados pelos interessados e aceites ou
detetados e rectificados oficiosamente por este (50º/5);
⎯ Competência para a tomada de decisões sobre erros ou omissões
identificados pelos interessados (art.50ºCCP);
⎯ Competência para a decisão sobre a qualificação dos candidatos (art.187º e
188º);
⎯ Competência para a decisão de adjudicação (124º/4 e 148º/4);
⎯ Competência para a decisão de selecção das propostas ou dos concorrentes
para a fase de negociação (art.148/4 e 149/2);
⎯ Competência do órgão adjudicante para decidir sobre a revelação de
impedimentos, nos termos do artigo 55º-A/3;
⎯ Competência para a tomada de decisão antes da entrada em funções do júri
ou após a cessação das suas funções.
A revisão de 2017 veio exigir que, antes do inicio de funções, os membros do júri
e todos os demais intervenientes no processo de avaliação de propostas subscrevam uma
declaração de inexistência de conflitos de interesses, conforme modelo previsto no anexo
XIII ao CCP.
Os membros do júri estão, nesta condição, abrangidos pelo sistema de
impedimentos do artigo 69º do CPA e, em concreto, pelas causas de impedimento
previstas nas várias alíneas desse preceito: assim, por exemplo, o membro de um júri está
impedido de intervir no procedimento de adjudicação para a aquisição de serviços em que
participa, como concorrente, o seu cônjuge, nos termos do artigo 69º/1/b) CPA. De resto,
tendo em consideração a natureza ad hoc do júri, uma situação deste tipo deve conduzir à
substituição do referido membro do júri, já que o impedimento o exclui de qualquer
participação relevante não apenas no procedimento, mas em geral na atuação enquanto
membro do júri.

DANIEL LOURENÇO
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1.5. Entidades gestoras e plataformas eletrónicas


Com exceção do ajuste direto e da consulta prévia, a regra instituída pelo CCP é a
da tramitação eletrónica obrigatória dos procedimentos de adjudicação. Em vez do
suporte físico, a lei impõe, como regra, o emprego de meios informáticos e eletrónicos na
tramitação do procedimento de adjudicação: por força disso, todos s atos de incidência
procedimental dos sujeitos do procedimento têm de ser comunicados, divulgados ou
publicitados com recurso a meios eletrónicos.
A opção legislativa de desmaterialização dos procedimentos de adjudicação
implica a utilização de infraestruturas eletrónicas especificas. Neste sentido, quando
pretendam celebrar contratos, as entidades adjudicante não têm de aceder, de utilizar e de
disponibilizar aos interessados o acesso a essas infraestruturas.
As empresas gestoras são entidades privadas (em regra, sociedades comerciais)
que desenvolvem a sua atividade com base em licenciamento administrativo.
As empresas gestoras de plataformas eletrónicas não intervêm nos procedimentos
pré-contratuais enquanto entidades autónomas, com um estatuto procedimental próprio.
A responsabilidade pela condução do procedimento pré-contratual permanece
exclusivamente na esfera da entidade adjudicante. As empresas apenas gerem e exploram
a infraestrutura tecnológica na qual aquele procedimento se desenvolve (art.60º da Lei
das Plataformas Eletrónicas)

1.6. Interessados
Ao contrário do CPA, em que o conceito de interessados ocupa lugar central,
identificando todas as entidades titulares de direitos ou interesses legalmente protegidos,
deveres, encargos, ónus ou sujeições no âmbito das decisões que no procedimento forem
ou possam ser tomadas, bem como outras entidades com legitimidade procedimental
(art.65º/2), no CCP, os conceitos jurídicos mais comuns para referencia os atores
principais do procedimento de adjudicação são os de candidatos e de concorrentes.
Sucede, porém, que do ponto de vista procedimental, os candidatos e concorrentes
constituem, em rigor, apenas duas categorias de interessados, que aliás se assumem nessa
vertente apenas a partir de um certo momento (art.52º e 53º).

DANIEL LOURENÇO
135
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Mas o universo de interessados no procedimento de adjudicação não se esgota nas


duas referidas categorias; eis a razão por que o CCP também se socorre do conceito de
interessados, para identificar quaisquer entidades que têm a pretensão de intervir e que
intervêm mesmo no procedimento de adjudicação. De resto, a Lei das Plataformas
Eletrónicas define interessados precisamente como todos os que manifestam interesse nos
procedimentos através da inscrição nos mesmos (art.2º/c)).

1.7. Candidatos e Concorrentes; agrupamentos


Os candidatos e os concorrentes são interessados com estatuto especifico nos
procedimentos de adjudicação de contratos públicos.
Entre outras classificações possíveis, os procedimentos de adjudicação previstos
no CCP dividem-se entre procedimentos unifásicos e procedimentos bifásicos, consoante,
respetivamente, não contem ou contem, com uma fase de qualificação prévia. Os
procedimentos bifásicos têm, pois, uma fase de candidatura e qualificação e, de seguida,
uma fase de proposta e adjudicação, na qual participam os operadores económicos que
tenham sido qualificados na primeira fase.
Assim, nos procedimentos bifásicos, os interessados apresentam uma candidatura
e são, portanto, candidatos.
O artigo 52º define, precisamente, como candidato qualquer entidade, pessoa
singular ou colética, que participa na fase de qualificação de um concurso limitado por
prévia qualificação, de um procedimento de negociação ou de um diálogo concorrencial,
mediante a apresentação de uma candidatura.
Ao contrário da figura dos candidatos, privativa dos procedimentos bifásicos, em
todos os procedimentos de adjudicação de contratos há concorrentes (nos procedimentos
bifásicos, os concorrentes são os candidatos qualificados e convidados a apresentarem
propostas). Nos termos do artigo 53º, concorrente é a entidade, pessoa singular ou
coletiva, que participa em qualquer procedimento de formação de um contrato mediante
a apresentação de uma proposta.
Como se viu, os candidatos e os concorrentes são pessoas, quer dizer, entidades
com personalidade jurídica; em geral, podem ser pessoas singulares ou coletivas. Além
destas, também podem participar nos procedimentos de contratação os designados

DANIEL LOURENÇO
136
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

agrupamentos. Eis o que prescreve o artigo 54ºCCP: podem ser candidatos ou


concorrentes agrupamentos de pessoas singulares ou coletivas, qualquer que seja a
atividade por elas exercida, sem que entre as mesmas exista qualquer modalidade
jurídica de associação.

1.8. Adjudicatário
O adjudicatário é o concorrente cuja proposta foi aceite ou escolhida pelo órgão
adjudicante. Em principio, o adjudicatário será a outra parte do contrato a celebrar com a
entidade adjudicante, o co-contratante.
É, pois, com o adjudicatário que se realiza a outorga ou assinatura do contrato
(art.104º). Esta regra conhece exceções, em virtude, por exemplo, de o adjudicatário não
comparecer à outorga do contrato ou de outras causas de caducidade da adjudicação
(artigos 86º, 87º. 87º-A, 91º, 93º, 105º).
Por outro lado, nos casos em que o adjudicatário é um agrupamento, o contrato
pode vir a celebrar-se com uma entidade nova, constituída entre os membros do
agrupamento (art.54º/4): assim sucede, em regra, na sequência da adjudicação de
concessões, pois, como resulta do artigo 411º/2, o concessionário deve dedicar-se em
exclusivo às atividades integradas na concessão.

2. PREPARAÇÃO DO PROCEDIMENTO
2.1. Anúncios Pré-procedimentais
Além dos anúncios que publicitam o inicio de cada procedimento de adjudicação
(art.130º, 167º, 197º, 208º e 218º-A), e que, por isso, mesmo, pressupõem um
procedimento já iniciado, o CCP prevê figuras de anúncios que não correspondem ao
inicio, nem ao lançamento de um especifico procedimento. Trata-se de anúncios
voluntários que, em geral, têm a função de indicar os procedimentos que a entidade
adjudicante estima lançar num determinado âmbito temporal. A publicação não
representa o cumprimento de uma obrigação, nem o compromisso da entidade
adjudicante quanto ao lançamento efetivo desses procedimentos, e funciona como uma
espécie de divulgação ao mercado dos planos ou intenções de compras para um
determinado período de tempo.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

A este modelo de anuncio se reconduz, em primeiro lugar, o designado anuncio


de pré-informação.
Nos termos do artigo 34º/1, as entidades adjudicantes referidas no artigo 2º
enviam ou podem enviar para publicação no JOUE em anuncio de pré-informaçao, no
qual indicam:
⎯ No caso de contratos de locação ou de aquisição de bens móveis ou de
contratos de aquisição de serviços, o preço contratual estimado de todos os
contratos a celebrar durante os 12 meses seguintes e cujo preço seja igual
ou superior ao limiar aplicável nos termos do artigo 474.º;
⎯ No caso de contratos de empreitada ou concessão de obras públicas ou
concessão de serviço público, as respetivas características essenciais,
quando o preço ou valor contratual estimado de todos os contratos a
celebrar durante os 12 meses seguintes seja igual ou superior ao limiar
aplicável nos termos do artigo 474.º.
⎯ No caso de contratos de concessão de serviços sociais ou outros serviços
específicos enumerados no Anexo IV da Diretiva de 2014.

A publicação do anuncio de pré-informação previsto no artigo 34º tem o efeito de


diminuir o prazo mínimo e apresentação de propostas, se estiverem verificadas certas
condições (136º/2 e 191/2).
Análogo a esse anuncio periódico indicativo, que, contudo, se aplica apenas
quando os contratos a celebrar digam direta e principalmente respeito a uma ou várias das
atividades exercidas nos setores da água, da energias, dos transportes e dos serviços
postais pelas entidades adjudicantes referidas no art.7º/1. A publicação do anuncio tem o
efeito de diminuir o prazo mínimo de apresentação de propostas, nos termos do 136º/2.

2.2. Consulta preliminar ao mercado


A consulta preliminar permite que a entidade adjudicante, antes de um
procedimento de contratação realize consultas informais ao mercado a fim de preparar o
procedimento, fixando mecanismo para que isso não se traduza na perda de transparência
ou prejuízo para a concorrência.

DANIEL LOURENÇO
138
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Assim, nos termos do artigo 35º-A/1, antes da abertura de um procedimento de


formação do contrato público, a entidade adjudicante pode realizar consultas formais ao
mercado, designadamente através da solicitação de informações ou pareceres de peritos,
autoridades independentes ou agentes económicos, que possam ser utilizados no
planeamento da contratação.
A consulta do mercado pode constituir um importante instrumento de
planeamento da contratação e até da procura de soluções para necessidades especificas
que a entidade adjudicante enfrenta. Neste ponto, trata-se de um instrumento que pode
gerar soluções que a entidade adjudicante aproveitará.
Por outro lado, a consulta ao mercado fornece informações que permitem à
entidade adjudicante fundamentar algumas decisões ou critérios de decisão, como a
fixação do preço base (art.47º/3 ou do preço ou custo anormalmente baixo (art.71º/2).
De certo modo mais do que permitir a realização de consultas preliminares, o
propósito fundamental da regulamentação do artigo 35º-A reside em definir as regras de
gestão do risco que se lhes associa, designadamente o risco de contaminação do
procedimento de adjudicação que a entidade adjudicante institua a seguir. esta
preocupação está bem patente no nº2 do art.35-A, quando refere que a consulta
preliminar não pode ter por efeito distorcer a concorrência, nem resulta em qualquer
violação dos princípios da não discriminação e da transparência.
De resto, a preocupação aparece logo na parte final do nº1 do artigo 35-A, ao
estabelecer que a entidade adjudicante pode realizar consultas informais ao mercado, sem
prejuízo do disposto na alínea i) do nº1 do artigo 55º. Nos termos deste preceito, não
podem ser candidatos, concorrentes ou integrar quaisquer agrupamentos as entidades que
tenham, a qualquer titulo, prestado, direta ou indiretamente, assessoria ou apoio técnico
na preparação e elaboração das pelas do procedimento que lhes confira vantagem que
falseie as condições normais de concorrência.
Mas, claro, a propósito fundamental da regulamentação dos efeitos da
participação em consultas preliminares não pode, certamente, residir na definição de uma
situação de impedimento decorrente daquela participação; tem de consistir, antes em
evitar essa mesma situação, pois, de outro modo, inutiliza-se o interesse da figura da
consulta preliminar ao mercado, já que nenhum operador económico estará disposto a

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

correr o risco de se ver impedido de entrar num procedimento pelo facto de ter prestado
informações à entidade adjudicante. A consulta preliminar ao mercado perderá todo o seu
valor como mecanismo de recolha de informação e de obtenção pela entidade adjudicante
do conhecimento actualizado sobre as tendências e as novidades do mercado para definir
a sua estratégia de compras, se os operadores económicos percecionarem esse
mecanismo, não como uma oportunidade mas como um risco.
De resto, a preocupação aparece logo na parte final do nº1 do artigo 35-A, ao
estabelecer que a entidade adjudicante pode realizar consultas informais ao mercado, sem
prejuízo do disposto na alínea i) do nº1 do artigo 55º. Nos termos deste preceito, não
podem ser candidatos, concorrentes ou integrar quaisquer agrupamentos as entidades que
tenham, a qualquer titulo, prestado, direta ou indiretamente, assessoria ou apoio técnico
na preparação e elaboração das pelas do procedimento que lhes confira vantagem que
falseie as condições normais de concorrência.
Mais claro, o propósito fundamental da regulamentação dos efeitos da
participação em consultas preliminares não pode, certamente, residir na definição de uma
situação de impedimento decorrente daquela participação; tem de consistir, antes, em
evitar essa mesma situação, pois, de outro modo, inutiliza-se o interesse da figura da
consulta preliminar ao mercado, já que nenhum operador económico estará disposto a
correr o risco de se ver impedido de entrar num procedimento pelo facto de ter prestado
informações à entidade adjudicante. A consulta preliminar ao mercado perderá todo o seu
valor como mecanismo de recolha de informação e de obtenção pela entidade adjudicante
do conhecimento actualizado sobre as tendências e as novidades do mercado para definir
a sua estratégia de compras, se os operadores económico percecionarem esse mecanismo,
não como uma oportunidade, mas como um risco.
No sentido de evitar situações de impedimento, compreende-se o nº3 do artigo 35-
A, que prescreve o seguinte: quando um candidato ou concorrente, ou uma empresa
associada a um candidato ou concorrente, tiver apresentado informação ou parecer à
entidade adjudicante ou tiver sido consultado ou tiver participado de qualquer outra
forma na preparação do procedimento de formação do contrato, a entidade adjudicante
deve tomar as medidas adequadas para evitar qualquer distorção da concorrência em
virtude dessa participação. O nº4 indica que são consideradas medidas adequadas, entre

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

outras, a comunicação aos restantes candidatos ou concorrentes de todas as informações


pertinentes trocadas no âmbito da participação do candidato ou concorrente na
preparação do procedimento de formação do contrato, com inclusão dessas informações
nas peças do procedimento.

2.3. Anotação da Professora MARIA JOÃO ESTORNINHO


Nos artigos 34º e 35º-A são admitidos momentos anteriores à decisão de
contratar. Está patente a ideia das entidades adjudicantes publicarem anúncios avisando o
mercado da possível celebração dos contratos. Esta ideia de programação também é
importante, quer do ponto de vista das entidades públicas quer do ponto de vista de uma
contratação sustentável. No artigo 35º-A há a consulta preliminar ao mercado. Antes de
abrir um procedimento pode ser consultado o mercado, consultas informais, esta figura
tendo as suas vantagens também pode causar alguns problemas.
Para além dos aspetos patológicos, há que encarar os institutos pela positiva, a
Administração Pública não deve comprar o que não precisa, faz sentido que olhe para o
mercado. O contrato não deve surgir do nada, o contrato deve ser bem preparado. Esta
lógica de uma boa contratação pública implica programação e preparação, implica saber
daquilo que se precisa. Esta fase pré-procedimental é extremamente importante.
Não podemos olhar para estes artigos sem ter em conta o que está em causa; o que
está em causa é a decisão da celebração do contrato, está em causa a prossecução do
interesse público. Não há contrato publico que não decorra de uma necessidade coletiva,
de uma necessidade sentida no âmbito daquela atividade. A primeira coisa a saber é qual
a necessidade publica. É preciso identificar a necessidade publica. Isto obriga a entidade
publica a recentrar a perspetiva, saber qual a função do contrato publica que vai celebrar.
A decisão de contratar corresponde, no fundo, a um ato administrativo, não é o contrato
em si, é a decisão de o fazer.

3. DECISÃO DE CONTRATA E DECISÃO DE AUTORIZAÇÃO DA DESPESA


No artigo 36º o legislador associa a ideia de contratar à decisão de autorização de
despesa. O nº1 exige a fundamentação da decisão. Aqui temos uma decisão da
administração, quem, em nome da entidade publica, decide avançar para a celebração de

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

um contrato, tem que explicar a decisão de contratar. A decisão de contratar tem que ser
fundamentada, tem que explicar qual é a necessidade de interesse publico, qual o fim do
contrato, para que serve.
O aspeto perverso do nº3 do art.36 é pensar que só com 5000000 euros é que é
necessária a fundamentação. A avaliação custo/beneficio não é aquilo que está na base
de qualquer decisão? Qualquer contrato parte disso.
A decisão de contratar é acompanhada da decisão de escolha do procedimento
(art.38º). A decisão de escolha do procedimento tem que ser feito com as regras do
Código e também tem que ser fundamentada e cabe ao mesmo órgão competente para a
decisão de contratar.
Nos termos do artigo 36º/1, o procedimento de formação de qualquer contrato
inicia-se com a decisão de contratar, a qual deve ser fundamentada e cabe ao órgão
competente para autorizar a despesa inerente ao contrato a celebrar. A consagração da
decisão de contratar como ato inicial do procedimento é o corolário de que toda a
regulamentação da Parte II do CCP tem em vista os contratos de procura pública.
Com a decisão de contratar, o órgão competente da entidade adjudicante inicia,
quer dizer, põe em marcha o procedimento de formação de um contrato público. A
decisão de contratar apresenta-se como o primeiro momento e o primeiro ato de uma
série de atos e de diligências que vão ser praticados em vista da celebração do contrato.
Trata-se de um ato inicial. Mas a decisão de contratar é mais do que isso, e surge também
como um ato final, uma vez que se apresenta igualmente como um momento conclusivo,
e final, de um procedimento em que a entidade adjudicante atesta ou verifica a existência
de uma determinada necessidade que tem de satisfazer, assegura-se que não dispõe de
recursos internos para o efeito e decide satisfazê-la através da prestação a efetuar por um
contratante.
Em função do que acaba por se expor, compreende-se que o procedimento da
decisão de contratar se apresente como um procedimento de iniciativa oficiosa, nascido
de um impulso interior com origem nos serviços e órgãos da entidade adjudicante.
A decisão de contratar deve delimitar o conteúdo do contrato a celebrar. Veja-se,
neste ponto, o artigo 98º/3, estabelecendo um imperativo de conformidade entre o
conteúdo do contrato em vias de celebração e a decisão de contratar.

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Proferida expressamente ou implícita em outra decisão, a decisão de contratar tem


de existir; o desenvolvimento da tramitação de um procedimento de adjudicação na falta
de decisão de contratar corresponde a uma situação de preterição total do procedimento
legalmente exigido, nos termos do artigo 161º/2/l) CPA.

3.1. Preparação da Decisão de contratar


Além da necessária consideração de eventuais exigências financeiras e
orçamentais, relativas à despesa que o contrato pretendido vai provocar, a decisão de
contratar pressupõe ainda uma avalização sobre a necessidade de contratar, bem como
sobre a idoneidade do contrato projetado ou idealizado para a satisfação daquela mesma
necessidade.
A decisão de contratar deve ser tomada no contexto de um procedimento racional
e consistente, não podendo concluir-se que o simples facto de se detetar a presença de
uma necessidade da entidade adjudicante envolve, sem mais, uma exigência de
contratação fora de portas. Impõe-se, portanto, a correta operação de identificação e
avaliação das necessidades a satisfazer, mas, além disso, a formulação de um correto
juízo sobre a adequação, no caso de uma solução de contracting out.
O exposto já nos permite perceber que a decisão de contratar é proferida em regra,
no exercício de um poder discricionário da entidade adjudicante. Trata-se de uma forma
de discricionariedade de decisão, com projeção no plano organizativo, que, em regra,
envolve uma escolha por exercer uma determinada missão com recursos externos em vez
de utilizar recursos próprios. Este poder discricionário conhece, contudo, limites: por um
lado, há casos em que a entidade adjudicante em concreto não dispõe do poder de
escolher entre contratar ou, porque, para desempenhar uma determinada missão que lhe
está confiada, não dispõe de recursos próprios. Por outro lado, a decisão de contratar não
repousa numa discricionariedade livre da entidade adjudicante (quando se trate de ma
entidade adjudicante pública), porquanto, por força do principio da proteção do interesse
público-financeiro e de acordo com o principio de boa administração e de
economicidade, aquela só deve poder contratar para satisfazer necessidades reais.

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⎯ Determinação das necessidades a satisfazer e da possibilidade de


contratar e delineação do objeto e do tipo de contrato a celebrar
Apesar do silêncio do CCP, não se suscita dúvidas sobre a exigência jurídica de as
entidades adjudicantes determinarem e avaliarem as necessidades especificas que visam
satisfazer com os contratos a celebrar. De resto, quando se trata de entidades adjudicantes
abrangidas pela incidência das regras financeiras do Estado, aplicam-se os critérios
estabelecidos no artigo 18º da Lei de Enquadramento Orçamental, que sujeita a assunção
de compromissos e a realização de despesas ao principio da economia, eficiência e
eficácia. O nº2 do preceito estabelece que a economia, a eficiência e a eficácia constituem
na:
a) Utilização do mínimo de recursos que asseguremos adequados padrões
de qualidade do serviço público;
b) Promoção do acréscimo de produtividade pelo alcance de resultados
semelhantes com menor despesa;
c) Utilização de recursos mais adequados para atingir o resultado que se
pretende alcançar.
Por outro lado, a decisão de contratar pressupõe também um juízo sobre a
possibilidade legal ou até constitucional de contratação de um determinado serviço ou
prestação. Neste ponto, a entidade adjudicante pode ter o dever de ponderar se o objeto
do contrato que pretende celebrar é um objeto negociável.
Nessa ponderação, deve ter-se presente que as entidades adjudicantes não são
livres de dispor das suas competências (art.36ºCPA), pelo que os contratos que envolvam
a transferência de responsabilidades públicas ou a delegação de gestão de tarefas públicas
são possíveis apenas na medida em que uma lei autorize as entidades adjudicantes a
efetuar essa transferência ou delegação.
Além disso, cumpre notar que a lei pode estabelecer proibições e restrições à
competência para a decisão de contratar e estabelecer critérios de preferência pela
utilização de recursos próprios das entidades adjudicantes.
Ainda neste tema, mas num patamar já diferente, a decisão de contratar encerra
também uma decisão sobre uma certa forma ou modalidade de contratação: assim, por
exemplo, para responder à necessidade de construir uma ponte, pode optar-se por um

DANIEL LOURENÇO
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contrato de empreitada de obras públicas, por uma concessão de obras públicas ou,
eventualmente, por um modelo atípico; também aqui se pode colocar a opção entre
dividir em lotes; no caso dos contratos de compras públicas, o órgão adjudicante tem aqui
a incumbência fundamental de definir a correta estratégia de contratação. Estamos aqui
diante de uma outra dimensão da discricionariedade estratégica.
Neste capitulo de preparação da contratação pública, é essencial, para definir boas
estratégias de contratação, que as entidades adjudicante promovam e interiorizem uma
cultura de exigência e de aposta na negociação e na celebração de bons contratos e, para
esse efeito, invistam na formação na profissionalização do pessoal encarregado de
compras públicas.
⎯ Opção pela celebração de contratos mistos
A partir do disposto no artigo 32º, podemos identificar duas categorias de
contratos mistos:
a) Contratos que abranjam, em parte, prestações típicas de contratos
abrangidos pela Parte II do CCP e, noutra parte, prestações típicas de
contratos não abrangidos pela Parte II do CCP (art.32º/4);
b) Contratos que abranjam simultaneamente prestações típicas de mais do
que um tipo de contrato (art.32º/2) – trata-se agora de contratos que
abrangem prestações de diferentes tipos contratuais (v.g., aquisição de
bens móveis e de aquisição de serviços, como é o caso do contrato de
aquisição de computadores e de manutenção de uma rede de
informática; ou de aquisição de serviços e empreitada de obras
públicas);
Tendo sobretudo em vista a segunda categoria, o CCP estabelece restrições
importantes à possibilidade de celebração de contratos mistos: esta só é permitida se as
prestações a abranger pelo respetivo objeto forem técnica ou funcionalmente incindíveis
ou, não o sendo, se a sua superação causar graves inconvenientes para a entidade
adjudicante. Esta última parte da norma diminui bastante o alcance normativo da
restrição, mas o pendor restritivo da regra mantém-se.
O Professor PEDRO COSTA GONÇALVES, não encontra justificação para a
existência destes limites à celebração de contratos mistos. Contudo, eles existem e o

DANIEL LOURENÇO
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órgão adjudicante deve, naturalmente, tê-los presentes no momento da decisão de


contratar. Por força das restrições legais, o órgão adjudicante pode ter de optar por
adjudicar contratos distintos, o que exigirá várias decisões de contratar, em vez de
adjudicar um contrato único, de natureza mista.
⎯ Estudo prévio de avaliação custo/beneficio para certos contratos
No âmbito da preparação do procedimento e com o propósito de fundamentar a
decisão de contratar, a revisão de 2017 do CCP estabeleceu a exigência de um estudo
prévio que a entidade adjudicante tem de realizar quando o valor do contrato foi igual ou
superior a 5 000 000 EUR e não tenha por objeto a contratação de bens ou serviços de
uso corrente.
O estudo prévio consiste numa avaliação do custo/beneficio e deve conter,
nomeadamente e quando aplicável:
▪ A identificação do tipo de beneficiários do contrato a celebrar;
▪ A taxa prevista de utilização da infraestrutura, serviço ou bem;
▪ A análise da rentabilidade;
▪ Os custos de manutenção;
▪ A avaliação dos riscos potenciais e formas de mitigação dos mesmos;
▪ O impacto previsível para a melhoria da organização;
▪ O impacto previsível no desenvolvimento ou na reconversão do país ou da
região coberta pelo investimento.

Essa exigência do CCP está em linha com a que decorre do artigo 18º/3 da Lei de
Enquadramento Orçamental, onde se determina que a avalização da economia, da
eficiência e da eficácia de investimentos públicos que envolvam montantes totais
superiores a 5 000 000 EUR deve incluir, sempre que possível, a estimativa das suas
incidências orçamental e financeira liquidas, ano a ano, e em termos globais.
A não elaboração do estudo prévio constitui uma infração à lei, que determina a
invalidade da decisão de contratar. Nesse caso, quando se possa configurar como ato
administrativo, a decisão de contratar é anulável. Independentemente disto, a invalidade
da decisão de contratar transmite-se à decisão final do procedimento, isto é, à
adjudicação.

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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

⎯ Identificação de condicionantes jurídicas do procedimento ou do


contrato
O artigo 36º/5 indica que as peças do procedimento devem identificar todos os
pareceres prévios, licenciamentos e autorizações necessárias que possam condicionar o
procedimento e a execução do contrato. Uma leitura imediatista deste preceito parece
conduzir à conclusão de que a entidade adjudicante tem a obrigação de prepara
devidamente o lançamento do procedimento, sobretudo no caso de edificação de obras
públicas, munindo-se das autorizações, licenciamento e pareceres de entidades terceiras
que, nos termos da lei geral, são necessários para a normas execução do contrato. A
exigência de um lançamento seguro, do ponto de vista jurídico, do procedimento
pareceria ser um instrumento essencial para prevenir conflitos contratuais e, sobretudo,
para afastar o risco de suportar avultadas indemnizações ao contratante devidas a
paralisações na execução do contrato.
Todavia, se bem lermos, não é exatamente assim. Com efeito, em termos literais,
o que lá se diz é que as peças do procedimento devem identificar atos jurídicos que
possam condicionar o procedimento e a execução do contrato. É certo que uma
interpretação mais desprendida da letra da lei poderia conduzir a outro resultado, mas,
então, a questão que se tem de colocar é a de saber se a norma se pode interpretar com o
sentido de que as peças do procedimento devem contemplar ou devem integrar os atos
jurídicos que condicionam a execução do contrato. Pois bem, uma tal reconstrução do
teor do preceito afigura-se excessivas, pelo que se sugere que o mesmo seja lido com o
sentido estrito de identificar, ou seja, de assinalar ou indicar os licenciamentos,
autorizações e pareceres que condicionam a execução do contrato.
Seja como for, a independentemente da interpretação correta e adequada do nº5
do art.36, resulta dos princípios da boa administração e da prossecução do interesse
público, bem como da exigência elementar de racionalidade da ação administrativa que
as entidades adjudicantes não lancem procedimentos para a adjudicação de contratos cuja
execução dependa de licenciamentos, de autorizações ou de pareceres de terceiras
entidades sem que, previamente, tenham obtido estes licenciamentos, autorizações ou
pareceres ou sem, pelo menos, terem uma garantia de que os vão obter. Não obstante, a

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inexistência de atos jurídicos que condicionam a execução do contrato e, portanto, o


desenvolvimento legal da atividade contratada, não conduz à invalidade do contrato.

3.2. Competência para a decisão de contratar


Órgão competente para a decisão de contratar (órgão adjudicante) é o que foi
indicado na lei orgânica ou nos estatutos da entidade adjudicante (art.36º/2CCP). Se a lei
orgânica ou os estatutos da entidade adjudicante nada estabelecerem sobre este assunto e
para o caso de o contrato a celebrar envolver o pagamento de um preço, o CCP esclarece
então que a decisão de contratar cabe ao órgão competente para autorizar a despesa
gerada pelo contrato (art.36/1), que, como visto já, constitui uma norma facilitadora ou de
esclarecimento.
Nos termos do artigo 37º, quando o contrato a celebrar por uma das entidades
adjudicantes referidas nos artigos a), b) e d) do nº1 do artigo 2º configure, nos termos de
legislação própria, uma pareceria público-privada, a decisão de contratar compete,
conjuntamente, ao ministro ou ao membro do Governo Regional responsável pela área
das finanças e ao ministro ou ao membro do Governo Regional da tutela sectorial,
consoante o caso.
Recorde-se que, nos termos do nº3 do artigo 109º, a delegação da competência
para a decisão de contratar implica a delegação das demais competências do órgão
competente para a decisão de contratar atribuídas pelo CCP, exceto daquelas que o
delegante expressamente reservar para si.
Da competência para a decisão de contratar distingue-se a competência para
contratar, a qual se refere à competência formal para outorgar ou celebrar o contrato
(art.106º).
Poderá dar-se o caso de a decisão de contratar, da competência de um certo órgão
da entidade adjudicante, estar dependente da autorização prévia ou da aprovação
sucessiva de um outro órgão.

3.3. Natureza jurídica da decisão de contratar


A decisão de contratar, em si mesma, é um ato interno, sem projeção fora da
esfera da entidade adjudicante. Como alguma doutrina estrangeira explica, essa decisão

DANIEL LOURENÇO
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não corresponde, pelo menos até a um certo momento, a uma declaração de vontade, no
sentido em que não se dirige a nenhum sujeito estranho à entidade adjudicante. Pode, de
certo modo, considerar-se que, até ao momento da sua exteriorização, se trata de um ato
interno, de maturação da vontade, que esgota os seus efeitos no interior da entidade
adjudicante.
Todavia, converte-se num ato externo quando se revela para o exterior através do
anuncio ou do convite à apresentação de propostas. Estes atos, funcionalmente
autónomos não são, pois, atos de publicitação da decisão de contratar: neste contexto,
concebem-se melhor como elementos ou partes que, em conjunto com a decisão interna
de contratar, formam ou compõem a decisão de contratar enquanto ato administrativo
(ato composto).
Quando alcança o estatuto de ato administrativo, a decisão de contratar pode ser
judicialmente impugnada. Ilegalidades próprias da decisão de contratar poderão ser, por
exemplo, a falta de organização ou de cabimentação da despesa, a falta de estudo prévio
exigido no artigo 36/3, a falta de base legal, a infração de uma proibição legal de
contratar no caso especifico. Sendo um ato administrativo, a decisão de contratar tem que
ser fundamentada.

3.4. Decisão de contratar implícita na decisão de autorização de despesa


Nos termos do nº1 do artigo 36º, a decisão de contratar pode estar implícita na
decisão de autorização da despesa. Em rigor, o que a lei pretende dizer é que, nos casos
em que não exista como decisão documentada autonomamente, deve considerar-se que a
decisão de contratar se encontra implícita na decisão de autorização da despesa. O sentido
da lei, ao permitir ou, talvez melhor, ao prever que a decisão de contratar se considere
implícita na autorização de despesa não consiste em aliviar as exigências formuladas em
relação à decisão de contratar mas apenas em dispensar uma formalização autónoma
desta decisão.

3.5. Revogação da decisão de contratar


A revogação da decisão de contratar resulta, nos termos do artigo 80º/1, da
decisão de não adjudicação. Embora a letra da lei não se apresente inequívoca, parece que

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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

a revogação da decisão de contratar constitui, neste caso, um efeito automático da


designada decisão de não adjudicação, quer dizer, um efeito que se produz ainda que o
órgão adjudicante não o determine expressamente.
É este o sentido da letra da lei, ao especificar que a decisão de não adjudicação
determina a revogação da decisão de contratar. Conclui-se, pois, que a dita decisão de
não adjudicação implica a destruição de todo o procedimento de formação do contrato,
desde o seu inicio, isto é, desde a decisão de contratar. Por força da revogação automática
da decisão de contratar, o inicio de um novo procedimento após a decisão de não
adjudicação, mesmo se obrigatório –art.79º/3 – implica a decisão de uma noca decisão de
contratar.
Assim, o nº1 do artigo 80º não se refere propriamente ao poder de revogação da
decisão de contratar, mas sim à revogação desta decisão como consequência jurídica de
uma outra decisão.
A questão que cumpre então colocar consiste em saber se, e em que condições,
pode o órgão adjudicante proceder à revogação da decisão de contratar.
Nenhuma dúvida subsiste sore a possibilidade dessa revogação até ao momento
da publicação do anuncio do procedimento ou do convite à apresentação de propostas.
Até este momento, a revogação da decisão de contratar constitui um ato livre do órgão
adjudicante.
Após a publicação do anúncio ou o envio do convite à apresentação da proposta, o
tema da revogação da decisão de contratar tem de se analisar em termos específicos, que
não podem dispensar a consideração de que o órgão adjudicante tem, nos termos da lei,
um dever de adjudicação, consubstanciado no dever de dar sequência ao procedimento e
de o concluir com uma decisão de adjudicação. É isto mesmo o que se estabelece no
artigo 76º/1, onde se ressalva o disposto no nº1 do artigo 79º, sobre a decisão de não
adjudicação.
Neste contexto, articulando o que se estabelece nos artigos 76º/1 e 79º/1, parece-
nos que as circunstancias que legitima a revogação da decisão de contratar são decerto as
previstas nas alíneas c) e d) do nº1 do art.79º - por circunstâncias imprevistas, seja
necessário alterar aspetos fundamentais das peças do procedimento e circunstâncias

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

supervenientes relativas ao pressuposto da decisão de contratar, respetivamente, em


qualquer dos casos, se verifiquem antes do fim do prazo de apresentação das propostas.
Importa ainda procurar saber se, antes do fim do prazo de apresentação das
propostas, o órgão adjudicante tem o poder de revogar a decisão de contratar fora do
quadro de circunstâncias referidas nas alíneas c) e d) do nº1 do artigo 79º. Esta questão
convoca ponderações que deverão ser analisadas num contexto mais geral, quando se
abordar o tema da revogação do procedimento de adjudicação.
Apesar de a lei o não estabelecer de uma forma clara, a revogação da decisão de
contratar implica para a entidade adjudicante, em todos os casos, o dever de indemnizar
os concorrentes pelos encargos em que comprovadamente incorreram com a elaboração
das respetivas candidaturas ou propostas.

3.6. Anulação Administrativa da decisão de contratar


Distinta da figura da revogação, a anulação administrativa funda-se na invalidade
da decisão de contratar (art.165º/2CPA). O Professor PEDRO COSTA GONÇALVES
não vê nenhum obstáculo à mobilização, neste âmbito, das regras gerais sobre a
competência do órgão adjudicante para, por sua iniciativa, proceder à anulação de atos
próprios (art.168 CPA). Afigura-se, porém, que este poder de anulação só poderá ser
posto em marcha antes da celebração do contrato.
A não ser assim, conferir-se-ia à entidade adjudicante um poder de, por uma via
indireta, determinar unilateralmente a sorte de um contrato fundado em razões de
ilegalidade (poder de conformação da relação contratual de que, em geral, ela não
dispõe).
A anulação administrativa da decisão de contratar pressupõe, naturalmente, um
juízo de ilegalidade sobre esta decisão, v.g., adoção da conceção-construção contra o
disposto no artigo 43º/3.

3.7. Fixação do valor estimado do contrato


O contrato de procura publica é um objeto disputado quando tem um valor para o
adjudicatário, ou seja, quando está em condição de produzir ou gerar um beneficio
económico para quem venha a celebrá-lo. É assim que o conceito surge no artigo 17º/1: o

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

valor do contrato a celebrar é o valor máximo do beneficio económico que (…) pode ser
obtido pelo adjudicatário com a execução de todas as prestações que constituem o seu
objeto.
Não é, todavia, o valor do contrato nesse sentido que se tem em vista agora: do
que se trata, neste momento, é de projetar ou estimar o valor monetária do contrato, para,
desse modo, se definir o custo ou o encargo que o contrato a celebrar determina para a
entidade adjudicante.
O artigo 17º/7: a fixação do valor estimado do contrato deve ser fundamentada
com base em critérios objetivos, utilizando, com referência preferencial, os custos
médios unitários de prestações do mesmo tipo adjudicadas em anteriores procedimentos
promovidos pela entidade adjudicante. Nos nº 3, 4, 5 e 6 do artigo 17º, não há uma
referência expressa, mas, certamente, é o conceito de valor estimado do contrato que ali
se encontra pressuposto.
O valor estimado do contrato é, em regra, o valor monetário que a entidade
adjudicante estima ou projeta vir a pagar em contrapartida das prestações a efetuar pelo
adjudicatário.
É em função do valor estimado, calculado em certos termos e com base em certos
dados, que se determina:
⎯ Em muitos casos, o tipo de procedimento de adjudicação (art.18);
⎯ Se há lugar a envio, ou não, do anuncio para publicação no JOUE, pois os
limiares europeus, para aplicação das diretivas, reportam-se aos valores
estimados dos contratos (art.474º);
⎯ O objeto principal de um contrato misto (art.32º/2 e 3);
⎯ Qual o órgão competente para a decisão de autorização da despesa quando
esta se encontra limitada pelo valor do contrato a celebrar;
⎯ Se estão reunidas as condições jurídico-financeiras para poder vir a
assumir o compromisso financeiro inerente ao contrato.
Da inclusão do conceito de valor estimado do contrato no CCP emergiram
algumas novas dificuldades de articulação entre conceitos, nomeadamente do conceito de
preço base (art.47º).

DANIEL LOURENÇO
152
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Pois bem, apesar da diferente intencionalidade de cada um, existe uma


coincidência objetiva entre os dois conceitos, quer quanto aos respetivos componentes,
quer quanto aos critérios para a respetiva determinação.
No que se refere à intencionalidade dos conceitos, há diferenças importantes: o
conceito de preço base, que, em regra, tem de ser fixado e constar do caderno de
encargos, indica o montante máximo que a entidade adjudicante se dispõe a pagar pela
execução de todas as prestações que constituem o objeto do contrato (47º/1),
correspondendo, pois, a um parâmetro base do caderno de encargos, a que as propostas
estão vinculadas (art.42/3 e 4), sob pena de exclusão (art.70º/2/d)). O preço base, cumpre,
assim, a função de enunciar um limite máximo do custo a que a entidade adjudicante está
disposta a assumir e que nos termos da lei pode assumir. Neste sentido, pode dizer-se que
se trata de um limite de índole orçamental ou financeira estabelecido pela própria
entidade adjudicante.
Outra é a função do valor estimado. O sentido da estimativa de um valor do
contrato reside na exigência posta à entidade adjudicante de definir um elemento
essencial para poder tomar certas decisões: sobre a escolha do procedimento, sobre a
sujeição deste a publicidade internacional, sobre a competência para autorizar a despesa e
outras condições da legislação financeira.
Sem prejuízo das diferentes intencionalidades, há uma coincidência objetiva entre
os conceitos, pelo menos em dois aspetos fundamentais: nos critérios de determinação
dos respetivos montantes e nos componentes a considerar para o respetivo cálculo. Além
disso, e até por força destes elementos coincidentes, quando se trate de contratos que
envolvam um pagamento a cargo da entidade adjudicante e em que esta seja a
contrapartida única do adjudicatário, os montantes do preço base e do valor estimado
deverão coincidir.

3.7.1. Regras gerais sobre a fixação do valor estimado do contrato


⎯ Proibição de métodos abusivos de definição do valor estimado de
contratos (o fraccionamento ilícito do objeto do contrato)
A primeira regra pode considerar-se uma regra de ouro no âmbito da contratação
pública: método de cálculo do valor estimado de um contrato não pode ser escolhido com

DANIEL LOURENÇO
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o intuito ou com o resultado de desonerar a entidade adjudicante do cumprimento de


exigências legais.
Um processo de manipulação das regras consiste no fraccionamento artificial do
contrato. Ora, precisamente sobre o fraccionamento do objeto do contrato, o artigo 17º/8,
estipula o seguinte: o valor do contrato não pode ser fraccionado com o intuito de o
excluir do cumprimento de quaisquer exigências, designadamente, das constantes do
presente código.
Deve sublinhar-se, contudo, que a lei não veta o fraccionamento ou subdivisão de
contratos, nem, em si mesmo, este processo infringe qualquer principio ou regra jurídica;
aliás, ao contrário, o fraccionamento é até incentivado no contexto do favorecimento do
acesso ao procedimento dos operadores económicos mais pequenos.
O fraccionamento não é proibido, insiste-se. A lei limita-se a advertir as entidades
adjudicantes de que não podem realizar operações artificiais de fraccionamento,
determinadas pelo propósito de fuga ao cumprimento das exigências legais. Contudo,
apesar de não ser proibido, sempre que haja fraccionamento, a fim de evitar resultados
contrários à lei, vão aplicar-se regras de agregação dos valores de cada contrato isolado.
⎯ Componentes ou elementos a considerar para o cálculo do valor
estimado do contrato
O valor estimado do contrato abrange, em primeiro lugar, o montante total a
pagar, ou seja, o preço. Contudo, para efeito de determinar o valor estimado, o preço não
abrange apenas o valor das outras prestações, como, no caso das empreitadas das obras
públicas, o valor total dos bens móveis e serviços que são postos à disposição do
adjudicatário (Art.17/3) e, em geral, o valor de outras prestações da entidade adjudicante,
bem como o valor dos pagamentos de terceiros.
Além do preço, também devem ser contabilizados na estimativa do valor do
contrato os seguintes elementos:
⎯ Valor das prorrogações expressamente previstas nas peças do
procedimento: art.47/2; embora referindo-se a renovações, o preceito deve
ser interpretado no sentido de indicar as prorrogações previstas nas peças
do procedimento.

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⎯ Valor de outras modificações expressamente previstas nas peças do


procedimento, quando se trate de modificações baseadas em cláusulas,
claras, precisas e inequívocas (art.96º/1/j));
⎯ Valos dos prémios por cumprimento antecipado conta para o cálculo do
valor estimado do contrato e para a definição do preço base. Veja-se o
artigo 301/2 que estabelece que o valor dos prémios deve constar do
contrato.

⎯ Critérios de fixação do valor estimado (e do preço base) e


fundamentação
Nos termos do artigo 17º/7, a fixação do valor estimado do contrato deve ser
fundamentada com base em critérios objetivos, utilizando como referencia preferencial,
os custos médios unitários do mesmo tipo adjudicadas em anteriores procedimentos
promovidos pela entidade adjudicante. A letra desse preceito coincide largamente com a
do nº3 do artigo 47º, sobre a fixação do preço base: esta deve ser fundamentada com base
em critérios objetivos, tais como os preços actualizados do mercado obtidos através da
consulta preliminar prevista no artigo 35º-A ou os custos médios unitários, resultantes de
anteriores procedimentos, para prestações do mesmo tipo. Comparando as duas normas,
verifica-se que o artigo 47º/3, acrescenta como referência dos critérios objetivos os
preços atualizados do mercado obtidos através da consulta preliminar prevista no
art.35-A e que o art.17º/7, indica uma referencia preferencial.
Assim, para a fixação do valor estimado do contrato ou do preço base, a entidade
adjudicante terá de seguir critérios objetivos, e, neste âmbito, usar como referência
preferencial os custos médios unitários de prestações do mesmo tipo adjudicadas em
anteriores procedimentos promovidos pela entidade adjudicante.
Na hipótese de o uso dessa referência preferencial se revelar impossível ou
desadequado, poderão ser usados os preços atualizados do mercado obtidos através de
consulta preliminar ou outros elementos, por exemplo, resultantes de pesquisas informais
de preços.

DANIEL LOURENÇO
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3.7.2. Regras especais sobre a fixação do valor de certos contratos


O CCP estabelece algumas regras especiais para a fixação do valor estimado de
certos contratos.

3.7.2.1. Empreitada de Obras Públicas


Nos termos do nº3 do artigo 17º, no caso de contratos de empreitada de obras
públicas, o cálculo do valor do contrato inclui o custo da obra e o valor total dos bens
móveis e serviços que são postos à disposição do adjudicatário pela entidade adjudicante.
Na verdade, o conceito de custo da obra deveria ser evitado, porquanto o que aqui está
em causa não é o custo da obra, mas antes o preço que a entidade adjudicante tem de
pagar pela obra.

3.7.2.2. Acordos-quadro e sistemas de aquisição dinâmicos


Nos acordos-quadro e nos sistemas de aquisição dinâmicos, o valor a tomar em
consideração é o valor máximo de todos os contratos previstos ao seu abrigo durante a
vigência do acordo-quadro ou do sistema de aquisição dinâmico (art.17º/4CCP).

3.7.2.3. Parcerias para a inovação


No caso das parcerias para inovação, o valor a tomar em consideração é o valor
das atividades de investigação e desenvolvimento que tenham lugar em todas as etapas da
parceria prevista, bem como dos bens, dos serviços ou das obras a serem desenvolvidos e
adquiridos no final da parceira (art.17º/5 CCP).

3.7.2.4. Concessões de obras públicas e de serviços


O artigo 410-A dispõe sobre o valor do contrato de concessão. Compreende-se a
especificidade do processo de determinação do valor de contratos de concessão, pois,
como sabemos, nestes contratos, a entidade adjudicante pode não assumir qualquer custo,
encargo ou despesa. Não obstante, a fixação do valor do contrato continua a ser essencial.
Esse valor corresponde ao total do volume de negócios do concessionário gerado
ao longo da duração do contrato, sem IVA, conforme estipulado no contrato, em

DANIEL LOURENÇO
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contrapartida das obras e dos serviços que foram objeto da concessão, bem como dos
fornecimentos relacionados com tais obras e serviços (art.410-A/1).
Nos termos do nº2, o valor do contrato deve ter em conta, nomeadamente, o
seguinte:
⎯ O valor de qualquer tipo de opção e eventuais prorrogações da duração da
concessão;
⎯ As receitas provenientes do pagamento de taxas pelos utilizadores das
obras ou dos serviços distintas das cobradas em nome da entidade
adjudicante;
⎯ Os pagamentos ou qualquer vantagem financeira, independentemente da
forma, que a entidade adjudicante ou qualquer outra autoridade pública
proporcione ao concessionário, incluindo a compensação pelo
cumprimento de uma obrigação de serviço público e os subsídios ao
investimento público;
⎯ O valor das subvenções ou de quaisquer outras vantagens financeiras,
independentemente da forma, provenientes de terceiros pela execução da
concessão;
⎯ A receita da venda de ativos que façam parte do estabelecimento da
concessão;
⎯ O valor de todos os fornecimentos e serviços postos à disposição do
concessionário pelas entidades adjudicantes, desde que sejam necessários
à execução das obras ou à prestação dos serviços;
⎯ Os prémios ou pagamentos a candidatos ou proponentes.

3.7.3. Regras de agregação de valores


O fraccionamento do objeto do contrato não é proibido. Não obstante, com o
objetivo de prevenir situações de incumprimento da lei, nos casos de fraccionamento,
subdivisão ou desagregação do objeto de um contrato em vários contratos isolados, a lei
prevê a aplicação de determinadas regras de agregação, que, em geral, definem critérios
de cálculo do somatório dos valores dos contratos isolados.

DANIEL LOURENÇO
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Desta matéria ocupa-se o artigo 22º. O nº1 define a situação típica de


fraccionamento nos seguintes termos: situação de facto em que prestações do mesmo
tipo, suscetiveis de constituírem objeto de um único contrato, seja contratadas através de
mais do que um procedimento.
O conceito nuclear, que identifica a unidade do objeto de um determinado
contrato é, pois, o de prestações do mesmo tipo, suscetiveis de constituírem objeto de um
único contrato.
Por força do artigo 22º/1, se a entidade adjudicante tem a intenção de dividir ou
fraccionar o contrato de aquisição de uma obra, de um serviço ou de um bem, deverá
aplicar, em cada procedimento e, portanto, para cada contrato, as regras que seriam
aplicáveis em função:
⎯ Do valor acumulado do conjunto dos vários procedimentos, caso a
formação de todos os contratos a celebrar ocorra em simultâneo; ou
⎯ Do valor acumulado dos preços contratuais de todos os contratos já
celebrados somado o valor de todos os procedimentos ainda em curso,
quando a formação desses contratos ocorra ao longo do período de um
ano, desde que a entidade adjudicante, aquando do lançamento do
primeiro procedimento, devesse ter previsto a necessidade de lançamento
dos procedimentos subsequentes.
O artigo 22ºCCP concretiza um regime especial, de onde se retira que as
entidades adjudicantes ficam dispensadas do disposto no número anterior relativamente
a procedimentos de bens e serviços cujo valor seja inferior a 80 000 EUR, ou
empreitadas de obras públicas cujo valor seja inferior a 1 000 000 EUR, desde que o
valor do conjunto dos procedimentos não exceda 20% deste limite.

3.8. Decisão de autorização da despesa inerente ao contrato a celebrar


A decisão de contratar cabe ao órgão competente para autorizar a despesa inerente
ao contrato a celebrar (art.36º/1). Em regra, os contratos públicos criam obrigações de
pagamento para as entidades adjudicantes: celebrar o contrato corresponde, pois, a
realização de uma despesa.

DANIEL LOURENÇO
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Os contratos que envolvam obrigações de pagamento para as entidades


adjudicantes implicam a realização de despesa e, para muitas entidades adjudicantes, a
realização de despesa tem de ser autorizada segundo formas e procedimentos previstos na
lei.
A decisão de autorização da despesa é um ato expresso, que o órgão competente
tem, em regra, de praticar. Essa decisão pode conter, de forma implícita, a decisão de
contratar.
Para as entidades adjudicantes do setor das administrações e em relação a alguns
contrato, a decisão de autorização da despesa é antecedida, no plano contabilístico, pela
cabimentação da despesa, ou seja, o registo, em verba orçamental própria, de uma
determinada cotação, visando a realização da despesa. Por força da cabimentação, o
montante em causa fica cativado (congelado).
A indicação da competência para a autorização de despesas na administração do
Estado e nas autarquias locais continua a constar dos artigos 16º a 22º e 29º do Decreto-
Lei nº197/99 não ter sido excepcionado da revogação, deve entender-se que as normas
sobre a autorização de despesa se aplicam igualmente aos contratos de empreitada de
obras públicas.
Nos termos do citado diploma, em relação à Administração estadual, são
competentes para autorizar despesas até um valor determinado:
⎯ Os directores-gerais ou equiparados;
⎯ Os órgãos máximos dos organismos dotados de autonomia administrativa
e financeira, com ou sem personalidade jurídica;
⎯ Os ministros;
⎯ O primeiro-ministro; o Conselho de ministros é competente para a
autorização de despesa sem limite de valor.
No âmbito das autarquias locais, são competentes os presidentes de câmara e os
conselhos de administração dos serviços municipalizados, quanto a contratos até um
determinado valor; sem limite de valor, são competentes as câmaras municipais, as juntas
de freguesia, o conselho de administração das associações de autarquias locais e o órgão
executivo de entidades equiparadas a autarquias locais.

DANIEL LOURENÇO
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Nos procedimentos de adjudicação lançados por agrupamento de entidades


adjudicantes, o valor a considerar para efeitos de determinação do órgão competente de
cada entidade para autorizar a despesa corresponde ao valor da fração da despesa inerente
ao contrato a celebrar que cabe à entidade adjudicante: 47º/6.
Uma das condicionantes jurídico-financeiras da decisão de autorização da despesa
traduz-se na obrigatória observância das regras aplicáveis à assunção de compromissos e
aos pagamentos em atraso de entidades públicas, constantes da Lei nº8/2012.
As entidades abrangidas por regra não podem assumir compromissos (e,
logicamente em momento prévio, autorizar a despesa para a celebração de contratos) que
excedam os designados fundos disponíveis.
Embora não opere na fase do procedimento de adjudicação que estamos a
analisar, importa regista e chama a atenção para o disposto no art.7 DL nº127/2012, no
qual se estabelece, sob pena de nulidade a regra segundo a qual nenhum compromisso
pode ser assumido sem que tenham sido cumpridas as seguintes condições:
⎯ Verificada a conformidade legal e a regularidade financeira da despesa,
nos termos da lei;
⎯ Registado no sistema informático de apoio à execução orçamental;
⎯ Emitido um numero de compromisso válido e sequencial que é refletido na
ordem de compra, nota de encomenda ou documento equivalente.
Quando em causa esteja a assunção de compromissos plurianuais são, em regra,
exigidas decisões de autorização prévia: no caso do Estado, decisões dos membros do
Governo das finanças e da tutela (art.6/1/a) Lei 8/2012); nos casos dos municípios e
freguesias, a assunção de compromissos plurianuais depende de autorização prévia dos
respetivos órgãos deliberativos (assembleia municipal ou assembleia de freguesia).

4. ADJUDICAÇÃO POR LOTES


A adjudicação por lotes consiste num processo ou técnica de divisão do objeto
de um contrato (realização de uma obra, aquisição de um serviço ou aquisição de bens
móveis) a adjudicar no âmbito de um determinado procedimento, em vários lotes,
porções ou fracções, devidamente autonomizados, possibilitando a adjudicação a vários
concorrentes e a celebração de contratos independentes com cada um deles. Assim, o

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procedimento para a contratação de uma obra, de um serviço ou de um conjunto


homogéneo de produtos dará origem a várias adjudicações e a vários contratos. O
processo de adjudicação por lotes está regulado no art.46-A.
Embora a lei não o indique de forma explicita, pressuposto essencial da decisão
de adjudicação ou de não adjudicação por lotes é a presença de um contrato que
contemple prestações divisíveis ou cindíveis (contrato de objeto divisível). O contrato de
aquisição de duas máquinas de fotocópias é um contrato divisível; mas o contrato de
aquisição de uma máquina já não é divisível, pelo que, neste caso, a questão de
adjudicação por lotes não se coloca.
A divisão de uma aquisição em lotes pode efetuar-se segundo vários critérios:
geográfico, em função do parcelamento substancial do produto, da divisão operacional do
serviço, etc.
A divisão das compras em lotes, parcelas, porções, partes ou fracções é um
processo adequado para facilitar o acesso ao mercado da contratação pública dos
operadores económicos mais pequenos, que não dispõem de capacidade instalada para
apresentar propostas em conjunto, mas, porventura, já estarão em condições de o fazer
em relação às partes, parcelas ou porções em que a entidade adjudicante subdivide a sua
compra.

4.1. Escolha discricionária entre divisão ou fundamentação da não divisão


Prescreve o nº1 do artigo 46º/1 que as entidades adjudicantes podem prever, nas
peças do procedimento, a adjudicação por lotes.
Nos termos em que se encontra formulado, o preceito parece querer dizer que a
decisão de proceder à adjudicação por lotes se baseia numa liberdade da entidade
adjudicante; quer dizer, em regra, a entidade adjudicante pode optar pela adjudicação sem
fraccionamento em lotes. Essa é, de facto, a regra, mas a entidade adjudicante vê-se
onerada, em certos casos, com um dever especifico de divisão ou não divisão como
escolha discricionária.
Da regra da livre divisão em lites decorre a liberdade de determinar a dimensão e
o objeto dos lotes.

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4.2. Fundamentação da não divisão


Sem prejuízo da regra de liberdade de adjudicar ou de não adjudicar por lotes, do
disposto nos nº2 e 3 do artigo 46º-A resulta o seguinte: na formação de contratos públicos
de aquisição ou locação de bens, ou aquisição de serviços, de valor superior a 135 000
EUR e empreitadas de obras públicas de valor superior a 500 000 EUR por entidades
adjudicantes do art.2º que não atuem nos setores especiais, a decisão de não contratação
por lotes deve ser fundamentada. O CCP estabelece, assim, para os casos indicados, um
dever especifico de fundamentação da não adjudicação por lotes.
Ao exigir uma fundamentação da não adjudicação por lotes no contexto de uma
regra de liberdade de adjudicar por lotes ou não, a lei pretende impor ao órgão
adjudicante um dever de ponderar a operação da divisão e de, na sequencia, explicar por
que opta pela não divisão. Neste sentido, nos casos abrangidos, a liberdade que aqui
encontramos vê-se limitada e converte-se, numa discricionariedade de decisão.
Nos termos da lei, constituem fundamento de não adjudicação por lotes,
designadamente, as seguintes situações:
⎯ Serem as prestações a abranger pelo objeto do contrato técnica ou
funcionalmente incindíveis ou, noa o sendo, a sua separação causar graves
inconvenientes para a entidade adjudicante.
⎯ Revelar-se mais eficiente para a entidade adjudicante, por motivos de
urgência ou por imperativos técnicos ou funcionais, a gestão de um único
contrato. Esta hipótese refere-se a contratos que abrangem prestações que
podem ser cindidas ou separadas. Alem da urgência, que recomenda
procedimentos céleres e soluções contratuais simples e eficazes, também
os imperativos técnicos e funcionais podem fundamentar a não divisão em
lotes, quando a entidade adjudicante invoca que a gestão de um único
contrato se revela mais eficiente técnica e funcionalmente. Assim, pode
invocar, por exemplo, na execução de uma mesma obra, num perímetro
delimitado, o ter de se relacionar com vários empreiteiros, cada um
responsável por um parte da obra lhe causa transtornos e inconvenientes:
além dos custos de gestão de diversos contratos e da necessidade de
articulação sequencial entre os diversos intervenientes na execução do

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contrato, poderiam surgir aqui fenómenos de desresponsabilização e


casos complexos de apuramento de concurso de responsabilidades na
execução defeituosa de prestações contratuais.
Além dos que a lei sugere, outros fundamentos de não adjudicação por lotes
poderão ser invocados.
O artigo 46-A não esclarece onde e como deve ser apresentado o discurso da
fundamentação, pela entidade adjudicante, no caso de decidir não adjudicar por lotes. O
preceito em análise não fornece, de facto, qualquer indicação sobre o momento nem
sobre o local da fundamentação.
O Professor PEDRO COSTA GONÇALVES entende que a fundamentação
deverá seguramente constar do processo administrativo e ser junta à fundamentação da
decisão de contratar, proferida nos termos do disposto no artigo 36ºCCP. Uma vez que a
fundamentação pressupõe uma decisão de não adjudicação por lotes, esta deverá ter lugar
imediatamente na sequência da decisão de contratar.

4.3. Divisão
Na hipótese de a entidade adjudicante optar pela divisão e adjudicação por lotes, a
lei não define qualquer exigência especifica de fundamentação, nem tão-pouco impõe
qualquer discurso justificativo do concreto processo de divisão adotado pela entidade
adjudicante, por exemplo, quanto às dimensões de cada lote.
Assim, considerando apenas a letra da lei, nada parece obstar à divisão de uma
empreitada no valor de 600 000 EUR em dois lotes, um no valor de 550 000 EUR e um
outro no valor de 50 000 EUR. Não obstante o silencio da lei neste ponto, uma situação
com estes contornos pode ser vista como um expediente para fugir ao dever de
fundamentação. Assim, o facto de por de a lei não exigir esta fundamentação especifica, a
verdade é que a adjudicação por lotes pressupõe logicamente uma decisão nesse sentido,
sobretudo quanto ao processo de divisão adotado. Ora, a fundamentação desta decisão
poderá vir a ser solicitada à entidade adjudicante. Além disso, uma divisão arbitrária ou
inconsequente pode ser considerada ilegal, por violação de princípios como os referidos
no art.1-A/1.

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4.4. Limitação do número de lotes a adjudicar a cada concorrente


Vamos então supor que a entidade adjudicante efetua a divisão em lotes.
Nesse caso, a entidade adjudicante pode não definir qualquer regra particular
sobre se um dos concorrentes pode ser adjudicatário de todos os lotes (na hipótese de
apresentar a melhor proposta para cada um dos lotes a adjudicar. Não sendo definidas
regras, a adjudicação de todos os lotes a um concorrente é evidentemente possível. Dir-
se-á que esse é até o resultado melhor para a entidade adjudicante, que, assim, adjudica
cada lote à melhor proposta.
Mas a entidade adjudicante poderá pretender fomentar a concorrência ou outros
objetivos, como, por exemplo, garantir a integral e adequada execução das prestações
contratuais, e, para estes efeitos, considerar o cenário da limitação do numero de lotes
que podem ser adjudicados a cada concorrente. A esta eventual pretensão responde o nº4
do artigo 46º-A: a entidade adjudicante pode limitar o numero máximo de lotes que
podem ser adjudicados a cada concorrente, devendo indicar essas limitações no convite
ou no programa do procedimento.
O uso da faculdade de limitação do numero de lotes a adjudicar conhece uma
consequência imediata: nesse caso, a entidade adjudicante vai ter de definir previamente
critérios objetivos e não discriminatórios em que se baseie a escolha dos lotes a
adjudicar a cada concorrente nos casos em que a aplicação dos critérios de adjudicação
resulte na atribuição, ao mesmo concorrente, de um numero de lotes superior ao máximo
fixado (art.46-A/4). Os critérios de escolha de lotes deverão naturalmente, ser definidos e
conhecidos antes do momento de abertura das propostas apresentadas pelos concorrentes.
Imagine-se que um determinado concorrente apresenta a melhor proposta para os
5 ou para os 4 dos 5 lotes a adjudicar no procedimento, mas o programa estabelece que só
podem ser-lhe adjudicados 3 lotes. Neste caso, o programa do procedimento deve definir
os critérios em que se baseia a escolha dos 3 lotes a atribuir ao concorrente: poderá, por
exemplo, estabelecer-se que serão adjudicados ao concorrente ou os 3 lotes de menor
valor. Também poderá exigir-se ao concorrente, sempre que concorra a um numero maior
de lotes do que o numero dos que lhe podem ser adjudicados, que indique na sua proposta
a ordem das suas preferências em relação aos lotes a que concorre.

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4.5. Adjudicação combinada ou agregada


O nº5 do artigo 46º-A atribui à entidade adjudicante a possibilidade de rever e
alterar os termos da divisão em lotes que fez no programa de procedimento ou no convite,
desde que tal se encontre expressamente previsto nestas peças e sejam nelas estabelecidos
e indicados os critérios que fundamentam as várias hipóteses de combinação ou
agregação previstas. Assim, por exemplo, num procedimento com divisão em 5 lotes, a
entidade adjudicante pode concluir, em função das propostas apresentadas, que seria mais
vantajoso combinar numa adjudicação única os 5 lotes a um concorrente ou adjudicar em
conjunto 2 dos 5 lotes a um concorrente. Para que a agregação possa ocorrer, torna-se
necessário que a possibilidade tenha sido prevista e que, nesses casos, a entidade
adjudicante tenha estabelecido, respetivamente, a possibilidade de adjudicação conjunta
de todos os lotes ou os dois lotes que poderiam vir a ser combinados.
A adjudicação combinada ou agregada de lotes parece associar-se a casos em que
se estabelece no convite ou no programa do procedimento que os concorrentes que
apresentem uma proposta para cada um dos lotes a que concorrem podem apresentar uma
proposta distinta com base na agregação de lotes – teremos aqui um caso especial de
proposta variante. Em principio, a proposta agregadora deverá apresentar condições
mais vantajosas para a entidade adjudicante do que as propostas individualmente
consideradas.

4.6. Adjudicação dos lotes


Nos termos do artigo 73º/2, quando seja feita a adjudicação por lotes, pode existir
uma decisão de adjudicação para cada lote, podendo tais decisões ocorrer em momentos
distintos.
Em função do que se estabelece no nº5 do artigo 46-A, sobre a combinação de
vários ou até de todos os lotes e a respetiva adjudicação ao mesmo concorrente,
compreende-se que a adjudicação por lotes não se materialize, em todos os casos, numa
decisão de adjudicação por cada um dos lotes. Pode até dar-se o caso de, a final, a vir ser
proferida uma decisão de adjudicação única, a abranger todos os lotes.
Quando sejam proferidas várias decisões de adjudicação, a lei autoriza que as
mesmas sejam proferidas em momentos distintos. A descoincidência dos momentos das

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adjudicações dos lotes poderá resultar de vários fatores, ligados ao desenvolvimento da


tramitação específica do procedimento de adjudicação de cada lote. Neste ponto, a
indicação da lei sublinha a autonomia procedimental e processual da decisão em relação a
cada lote: assim, a impugnação judicial da decisão relativa a um lote não comporta
efeitos sobre as decisões relativas aos outros lotes.

5. DECISÃO DE ESCOLHA DO PROCEDIMENTO


5.1. Escolha do procedimento de adjudicação
Causará porventura alguma estranheza o facto de uma decisão que tem por objeto
a escolha do procedimento de adjudicação surgir dentro do procedimento de formação de
um contrato já em curso. Trata-se, contudo, de uma situação compreensível e lógica, se
recordarmos que o que está em causa é, em rigor, a opção do órgão adjudicante sobre a
tramitação especifica do subprocedimento de adjudicação, o qual se encontra integrado
ou enxertado no procedimento complexo e global de formação do contrato público.
A propósito da natureza da decisão de escolha do procedimento valem as
considerações tecidas sobre a natureza da descrição de contratar: trata-se de um ato
interno que se converte num ato externo (podendo ser impugnado) com o anuncio ou o
convite à apresentação de propostas) este ultimo, nos casos de ajuste direito e de consulta
prévia).
A decisão de escolha do procedimento não carece de formalização, não tendo de
constar de um documento específico e isolado. Essa decisão de escolha pode vir apenas a
materializar-se na elaboração do programa de procedimento pertinente.
A decisão de escolha do procedimento cabe ao órgão adjudicante e, como a
decisão de contratar, deve ser fundamentada. A fundamentação pode consistir numa
operação simples de mera justificação, mas também pode reclamar um discurso mais
substancial e detalhado, por exemplo quando se trate de fundamentar a escolha do
procedimento de negociação ou de diálogo concorrencial (Art.29º).

5.2. Tipos de procedimento


Através da decisão de escolha do procedimento, o órgão competente da entidade
adjudicante escolhe o procedimento (tramitação) para efetuar a adjudicação, ou seja, para

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seleccionar a proposta. Esta escolha deverá recair num dos tipos de procedimento de
adjudicação indicados no artigo 16º/1. Vejamos brevemente quais são estes
procedimentos:
⎯ Ajuste direto (art.112º-129ºCCP)
O ajuste direto é o procedimento em que a entidade adjudicante convida
diretamente uma entidade à sua escolha a apresentar a proposta. Com a revisão de 2017,
os elementos distintivos do ajuste direto são dois: em primeiro lugar, o que resulta de se
tratar de um procedimento baseado no convite (não no convite, como todos os outros com
a exceção da consulta prévia) e, um segundo lugar, o facto de o convite ser dirigido
apenas a uma entidade (nisto distinguido da consulta prévia).
⎯ Consulta prévia (112º-129ºCCP)
O artigo 112º/1 define consulta prévia como o procedimento em que a entidade
adjudicante convida diretamente pelo menos três entidades à sua escolha a apresentar a
proposta, podendo com elas negociar os aspetos de execução do contrato a celebrar.
como o ajuste direto, a consulta prévia baseia-se num convite; diferentemente o convite
tem de ser enviado a, pelo menos, três entidades.
⎯ Concurso Público (130º-161ºCCP)
Concurso público é o procedimento objeto de anuncio num jornal oficial no qual,
através da apresentação de uma proposta, pode participar qualquer entidade que preencha
os requisitos gerais de participação.
⎯ Concurso limitado por prévia qualificação (art.162º-192ºCCP)
Concurso limitado por prévia qualificação é o procedimento objeto de anuncio
num jornal oficial que se desenvolve em duas fases: numa primeira, de qualificação, pode
participar, através da apresentação de uma candidatura, qualquer entidade interessada em
demonstrar que preenche os requisitos mínimos de capacidade exigidos pela entidade
adjudicante; na segunda fase, de adjudicação, podem participar, através da apresentação
de uma proposta, as entidades qualificadas na primeira fase, que, para o efeito, são
convidadas pela entidade adjudicante.
⎯ Procedimento de negociação (193º-203ºCCP)
O procedimento de negociação segue o modelo do concurso limitado por prévia
qualificação, mas inclui ainda uma terceira fase, de negociação das propostas.

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⎯ Diálogo concorrencial (art.204º-218ºCCP)


O diálogo concorrencial, que começa por incluir uma fase de qualificação (como
o concurso limitado), distingue-se dos anteriores, por envolver a apresentação de
soluções e o diálogo com os candidatos qualificados e, depois, a apresentação de
propostas seguida de adjudicação.
⎯ Parceria para a inovação (art.218-Aº – 218-Dº CCP)
A pareceria para a inovação é um procedimento complexo, que integras as
seguintes fases, as quais podem ser adaptadas em função da complexidade e relevância
financeira da parceria a celebrar:
a) Fase da apresentação das candidaturas, podendo a respetiva selecção
incluir a qualificação dos candidatos quando se trate do
desenvolvimento de projetos dotados de especial complexidade;
b) Fase de apresentação de propostas de projetos de investigação e
celebração da parceria;
c) Fase de análise das propostas de projetos de investigação e celebração
da parceria.
Na sequencia de uma Diretiva imposta pelo Direito da União Europeia, o CCP
adota um principio de tipificação taxativa dos procedimentos de adjudicação: os
procedimentos que a entidade adjudicante pode escolher de uma lista fechada de tipos de
procedimentos.
Além disso, os tipos previstos de procedimentos são relativamente fechados,
estando limitada a margem de conformação do desenvolvimento da tramitação do
procedimento pelo órgão adjudicante. Este tem de seguir os trâmites previstos na lei, não
beneficiando, na verdade, de uma margem significativa para instituir novos momentos do
procedimento ou para alterar a ordenação do desenvolvimento que a lei prevê para cada
procedimento. Não quer isto, naturalmente, dizer que o órgão adjudicante não possa fazer
certas opções, v.g., adotar ou não uma fase de negociação na consulta prévia (art.118º)
ou no concurso público (art.149º); adotar um modelo simples ou um modelo complexo de
qualificação (art.179º e 181º). Sucede, porém, que se trata sempre de opções autorizadas
por lei. Está, pois, vedada ao órgão adjudicante a criação de espécies procedimentais
novas ou de regime mistos.

DANIEL LOURENÇO
168
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Os tipos de procedimentos sãos os que se indicaram acima e que correspondem


aos que se indicaram no art.16º/1. Deve, contudo, acrescentar-se que, em certos casos, os
tipos de procedimentos desdobram-se em subtipos: assim, por exemplo, os procedimentos
de concurso público e de concurso limitado por prévia qualificação subdividem-se entre
os que têm e os que não têm publicação de anuncio no JOUE; por outro lado, estes
mesmos procedimentos podem ter uma tramitação normal ou uma tramitação acelerada;
além disso, o concurso publico pode ser normal ou urgente.

5.3. Classificação dos procedimentos


Afigura-se possível efetuar a classificação dos procedimentos de adjudicação
segundo vários critérios. Vamos considerar os seguintes:

5.3.1. Critério de abertura à concorrência


De acordo com o critério de abertura do procedimento à concorrência, podem
distinguir-se entre os procedimentos abertos, que comportam a publicação de um anuncio
e são abertos à participação de todos os operadores económicos interessados que
cumpram os requisitos gerais e especiais de participação – concurso público, concurso
limitado por prévia qualificação, negociação, diálogo concorrência, parceria para a
inovação - e os procedimentos de acesso restrito, nos quais participam a penas as
entidades que recebem convite à apresentação de propostas: são os casos do ajuste direto
e da consulta prévia.

5.3.2. Critério da publicação de anúncio


Quase sobreposto ao critério anterior, podemos distinguir entre procedimentos
sem publicação de anuncio (ajuste direto e consulta prévia, cf., porém, o artigo 127º,
sobre publicação de contratos) e procedimentos com publicação de anúncio (todos os
outros).
Nos procedimentos com publicação de anúncio, a publicação tem de ter sempre
lugar no Diário da República:art.130º. Mas, além disso, em função do valor do contrato e
quando este atingir os montantes dos limiares europeus, pode ter de existir publicação no

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

JOUE: cfr. art.28º, 131º e 474º. A falta de publicação de anuncio no JOUE, quando
exigível, provoca ineficácia do contrato, nos termos do art.287/5/a).

5.3.3. Critério do faseamento do procedimento


Já se aludiu à distinção entre procedimentos unifásicos e os procedimentos
bifásicos, a respeito da bifurcação entre procedimentos que contemplam apenas uma fase
de proposta e a adjudicação e procedimentos que contemplam uma fase de candidatura e
qualificação + uma fase de proposta e adjudicação.
Pertencem ao primeiro grupo, dos procedimentos unifásicos, o ajuste direto e a
consulta prévia e o concurso público sem fase de negociação das propostas; pertence ao
segundo grupo, dos procedimentos bifásicos, o concurso limitado por prévia qualificação
(cfr. art.163º, sobre as fases deste procedimento).
Há ainda um outro tipo de procedimentos bifásicos: os que contemplam uma fase
de negociação de propostas (proposta inicial e negociação + proposta final e
adjudicação); eis o que sucede com os procedimentos de consulta prévia e de concurso
publico com fase de negociação de propostas (art.118º e 149º).
Temos, depois, uma outra hipótese: a dos procedimentos plurifásicos, que
conjugam uma fase de candidatura e qualificação, seguida de uma fase de proposta inicial
e negociação e de uma fase de proposta final e adjudicação: este é o caso dos
procedimentos de negociação (art.194º), bem como dos procedimentos de diálogo
concorrencial (art.205º) e de pareceria para a inovação (art.218º-A, nº1).
Ainda reportado ao critério do faseamento, apresentam-se muito relevantes os
tipos de procedimentos que, na transição entre as fases em que se desenvolvem, admitem
a redução do número de participantes: eis o que ocorre com os procedimentos com fase
prévia qualificação no caso de adoção do modelo complexo de qualificação (art.181º) e
com os procedimentos com fase de negociação restringida (art.149º/2).
Naqueles dois casos, só passam para uma fase sucessiva os concorrentes
seleccionados que tenham obtido em fases anteriores uma classificação que os posicione
em lugar de qualificação ou de seleção.
A passagem ou selecção para a fase seguinte não depende de requisitos
especificamente delineados para o efeito, mas apenas da maior capacidade demonstrada

DANIEL LOURENÇO
170
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

pelos requisitos de qualificação ou pela melhor classificação das propostas iniciais, no


cado de acesso à negociação para a melhoria de propostas. O programa do procedimento
apenas terá de definir o numero de participantes que passam para a shortlist (art.150/1/a),
164/1/m)).
Embora sem a estrutura faseada desses procedimentos, suscitam preocupações da
mesma natureza os acordos-quadro plurais, que envolvem um numero limitado de
propostas a adjudicar (art.253/4), bem a possibilidade de limitação do numero de lotes a
adjudicar, nos termos do artigo 46-A/4. Com efeito, em todos estes casos, impõe-se
especialmente a exigência de salvaguardar a genuína competição entre diferentes
concorrentes, recomendando-se a adoção de soluções especificas que dissuadam os
operadores económicos da tentação de se desdobrarem em entidades de fachada com o
fito de ocuparem os lugares disponíveis no procedimento.

5.3.4. Critério de uma tramitação urgente


A presença de um caso de urgência pode justificar a adoção de procedimentos
que, de outro modo, não seria possível: é o caso específico do ajuste direto adotado por
motivos de urgência imperiosa. Mas, independentemente disso, a urgência também pode
justificar a adoção de mecanismos de aceleração procedimental, como sucede nos casos
de redução dos prazos de apresentação de propostas no concurso publico, nos termos do
art.136º/3, e de redução dos prazos de apresentação de candidaturas (art.174º/2) e de
apresentação de propostas (art.191º/5º) no concurso limitado por prévia qualificação
(concurso limitado acelerado).
A urgência surge, em todos estes casos, como fundamento de adoção de medidas
ou de soluções procedimentais que não seriam possíveis num contexto de normalidade.
Isto explica a exigência de uma fundamentação específica que explique o
circunstancialismo de urgência. Daí que a lei aluda a situações de urgência devidamente
fundamentada (art.136º/3 e 174º/2 e 191º/5).
Justificado também pela presença de uma situação de urgência, não se deve
confundir com estes mecanismos de aceleração procedimental o concurso publico urgente
(art.155º e seguintes). Podendo ser adotado apenas em concurso nacionais, o concuros
publico urgente não envolve uma simples aceleração do procedimento (redução de

DANIEL LOURENÇO
171
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

prazos), antes implica uma alteração profunda na tramitação normal do procedimento de


concurso público: veja-se, a confirmá-lo, o artigo 156º/2. Além disso, permite a
estipulação de prazos curtíssimos para a apresentação de propostas (24h, no caso de
aquisição ou locação de bens móveis ou de aquisição de serviços, e de 72h, no caso de
empreitada de obras públicas).

5.3.5. Critério da Possibilidade de leilão eletrónico


Distinguem-se agora os procedimentos com possibilidade de leilão eletrónico:
concurso público e concurso limitado por prévia qualificação: art.140º-145º; 164º/1/p); o
leilão eletrónico está proibido no artigo 195º, para o procedimento de negociação, bem
como no artigo 204º/2, para o diálogo concorrencial; não está previsto, nem proibido, no
caso de ajuste direto.

5.4. Procedimentos e instrumentos procedimentais especiais


O Titulo IV do CCP consagra os denominados instrumentos procedimentais
especiais, os quais se distinguem dos procedimentos de adjudicação. Com efeito, não só
os referidos instrumentos não constam da lista ínsita no art.16ºCCP, como a tramitação
subjacente a cada um deles não tem em vista a prática de um ato de adjudicação e a
posterior celebração de um contrato.
Trata-se de instrumentos ou técnicas que constituem uma adaptação dos
procedimentos pré-contratuais gerais, em função dos concretos objetivos a alcançar, mas
que visam apenas permitir que as entidades adjudicantes identifiquem possibilidades de
contratação antes de decidirem (i) se pretendem contratar; (ii) o que pretendem contratar
e (iii) de que modo pretendem contratar.
Os instrumentos procedimentais especiais funcionam, assim, como um prius em
relação ao procedimento pré-contratual geral que, eventual e posteriormente, venha a ser
desencadeado pela entidade adjudicante.
O CCP enquadra no seu Título IV os seguintes instrumentos procedimentais
especiais:
⎯ Concurso de conceção e concurso de ideias;
⎯ Sistemas de aquisição dinâmicos;

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

⎯ Sistemas de qualificação;
⎯ Serviços sociais e outros serviços específicos.
Na opinião do Professor PEDRO COSTA GONÇALVES, atento o sentido
elementar do conceito de instrumentos procedimentais especiais, não parece que ao
mesmo se possam reconduzir os concursos de conceção de ideias, que, em rigor, são
verdadeiros procedimentos, não para adjudicação de contratos, mas para a seleção de
trabalhos de conceção ou de ideias. Por maioria de razão, a mesma conclusão de impõe
em relação aos procedimentos de adjudicação de contratos de serviços sociais e outros
serviços específicos regulados nos artigos 250º-A a 250º-D: trata-se, neste caso, de
procedimentos de adjudicação de contratos.
Nestes termos, o Professor PEDRO COSTA GONÇALVES entende que, apesar
da sistemática do CCP sugerir outra coisa, os instrumentos procedimentais especiais são
dois: os sistemas de aquisição dinâmicos e os sistemas de qualificação.

5.5. Regras de escolha do procedimento


Em geral, as entidades não dispõem de uma liberdade de confirmação do
procedimento de adjudicação: disponíveis são apenas os procedimentos que se encontram
previstos na lei.
Além disso, nem sempre as entidades adjudicantes podem escolher livremente os
procedimentos que a lei prevê. Há regras que as limitam neste domínio; há até
procedimentos na lei que só podem ser adotados em casos especiais.
Nos Capítulos II, III, IV da Parte II (art.17º-33º CCP), o CCP define as regras de
escolha do procedimento de adjudicação. Salvo no caso de existirem regras especiais, são
as regras do CCP que as entidades adjudicantes devem observar na escolha dos
procedimentos que vão utilizar na formação de contratos.
As regras de escolha do procedimento estabelecidas no CCP são determinadas em
rezão de quatro critérios ou fatores principais:
⎯ Valor (estimado) do contrato;
⎯ Critérios materiais;
⎯ Tipo de contrato;
⎯ Entidade adjudicante.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Alem disso, há ainda que atender às regras para a escolha do procedimento para a
formação de contratos mistos.

5.5.1. Escolha do procedimento em função do valor (estimado) do


contrato
Estabelece-se no artigo 18º que, sem prejuízo do disposto nos Capítulos III
(escolha do procedimento em função de critérios materiais) e IV (outras regras de escolha
do procedimento) do Título I da Parte II, a escolha dos procedimentos de ajuste direto, de
consulta prévia, de concurso público ou de concurso limitado por prévia qualificação
deve ser feita tendo por base o valor do contrato a celebrar, nos termos do disposto nos
art.19º a 22º.
Embora o preceito, como aliás a epigrafe do Capitulo II se refira a valor do
contrato, cremos que, na sequencia da revisão de 2017, se tornou claro que está ai em
causa o valor estimado do contrato.
O valor estimado do contrato é, em regra, valor monetário (valor indicado em
moeda – em euros) que a entidade adjudicante estima ou projeta vir a pagar em
contrapartida das prestações a efetuar pelo adjudicatário.
Pois bem, o valor que a entidade adjudicante estima ou projeta vir a ter de
suportar é um dos critérios que pode orientar a escolha do procedimento de adjudicação.

5.5.1.1. Ajuste direto


O ajuste direto pode ser escolhido em função do valor nos termos seguintes:
⎯ Contratos de empreitada de obras publica de valor inferior a 30 000 EUR:
art.19º/d);
⎯ Contratos de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de
serviços de valor inferior a 20 000 UER: art.20/1/d);
⎯ Quaisquer outros contratos de valor inferior a 50 000 EUR, com exceção
das concessões de obras públicas e de serviços públicos e dos contratos de
sociedade: art.21º/1/c) e 2;
⎯ Em alternativa com a consulta prévia, para a formação de contrato de
concessão de obras públicas e de serviços públicos de valor inferior a

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

75 000 EUR, desde que a duração do contrato seja inferior a um ano – art
31º/4;
⎯ Contratos sem valor, com exceção das concessões de obras públicas de
serviços públicos e de contratos de sociedade: art.21º/2.

5.5.1.2. Consulta prévia


O procedimento de consulta prévia pode ser escolhido em função do valor nos
termos seguintes:
⎯ Contrato de empreitada de obras públicas de valor inferior a 150 000
EUR: art.19/1/c);
⎯ Contratos de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de
serviços de valor inferior a 75 000 EUR: art.20/1/c);
⎯ Quaisquer outros contratos de valor inferior a 100 000 EUR, com exceção
das concessões de obras públicas e de serviços públicos e dos contratos de
sociedade: art.21/1/b);
⎯ Em alternativa com o ajuste direto, para a formação de contratos de
concessão de obras públicas e de serviços públicos de valor inferior a
75 000 EUR, desde que a duração do contrato seja inferior a um ano –
art.31/4;
⎯ Contratos sem valor, com exceção das concessões de obras públicas e de
serviços públicos e dos contratos de sociedade: art.21º/2.

5.5.1.3. Procedimentos de concurso (sem publicação no JOUE)


Os procedimentos de concurso publico e de concurso limitado por prévia
qualificação com publicação de anúncio no JOUE podem sempre ser utilizados, qualquer
que seja o valor do contrato.

5.5.1.4. Fundamentação da escolha do procedimento em função


do valor do contrato
A decisão de escolha do procedimento deve ser fundamentada. Nos casos de
escolha de procedimento em função do valor do contrato, parece suficiente a

DANIEL LOURENÇO
175
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

fundamentação por referência à norma legal que autoriza a escolha no caso concreto. A
suficiência de uma fundamentação nestes termos aplica-se em geral. Em especial, não nos
parece fazer sentido exigir-se à entidade adjudicante uma explicação para a não adoção
de um procedimento de consulta prévia no caso em que a lei autoriza a adotar o ajuste
direto em razão do valor do contrato. É certo que a adoção da consulta prévia em razão
do valor pode ter lugar sempre que se adota o ajuste direito em razão do valor. Alem
disso, o concurso publico pode ter lugar sempre que se adota a consulta prévia ou o ajuste
direto. Ora, não faria sentido exigir que, para cada contrato celebrado na sequencia de
ajuste direto ou de consulta prévia, a entidade adjudicante tivesse de explicar porque é
que não adotou o concurso público, que, em rigor, seria sempre possível. A indicação
legal de que um procedimento pode ser adotado em razão do valor corresponde a uma
permissão legislativa para a adoção desse procedimento, que não carece de outra
fundamentação.

5.6. Escolha do procedimento em função de critérios materiais


Para que a entidade adjudicante tome a decisão, neste âmbito, têm que estar
reunidos certos pressupostos ou condições materiais de que a lei faz depender a escolha
(art.23º a 30ºCCP).
A exigência de verificação de pressupostos materiais como condição da adoção de
um procedimento pode colocar-se em relação a qualquer tipo de procedimentos: ajuste
direto, consulta prévia, negociação, diálogo concorrencial, pareceria para a inovação, mas
também concursos (publico e limitado) com anúncio publicado apenas no Diário da
República.

5.6.1. Ajuste direto ou consulta prévia


Os artigos 24º a 27º definem os pressupostos materiais em que o procedimento de
ajuste direto pode ser adotado, seja qual for o valor do contrato a celebrar: esta é a regra;
contudo, como aliás se adverte na parte final do artigo 23º, a regra conhece exceções
expressamente previstas. E, na verdade, nos artigos 24º a 27º prevêem-se situações em
que a adoção do procedimento de ajuste direto depende, de forma conjugada e
cumulativa, da verificação de pressupostos materiais (critérios materiais) e, por outro

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

lado, do valor do contrato: eis o que ocorre, por exemplo, nos casos previstos nos artigos
25º/1/b); 26º/1/b); 27º/1/e) e 27º/3, em conjugação com o artigo 27º/1/b).
O artigo 24º indica pressupostos que permitem a adoção de ajuste direto para a
celebração de quaisquer contratos. Os artigos 25º a 27 indicam os pressupostos que
autorizam a adoção desse procedimento para a formação de contratos de empreitada de
obras públicas (art.25º), de locação ou aquisição de bens móveis (art.26º) e de aquisição
de serviços (art.27º).

5.6.1.1. Ajuste direto (ou consulta prévia) para a formação de


quaisquer contratos
Qualquer que seja o objeto do contrato a celebrar pode sempre adotar-se o ajuste
direto (ou consulta prévia, nos termos do art.27º-A) quando se verifiquem as
circunstancias seguintes:
⎯ Ausência de candidaturas ou propostas em procedimentos de concurso
(concursos desertos)
⎯ Exclusão de todas as propostas em anterior procedimento de concurso ou
diálogo concorrencial;
⎯ Motivos de urgência imperiosa;
⎯ Se trate de contratos para permitir a prestação de serviços de
telecomunicações;
⎯ As prestações do contrato só podem ser efetuadas por uma determinada
entidade.
Passaremos, então, à analise mais profunda e detalhada de cada uma destas
circunstâncias:
⎯ Procedimentos de concursos desertos
Nos termos da aliena a) do nº1 do artigo 24º, pode adotar-se o ajuste direto
quando em anterior concurso público ou concurso limitado por prévia qualificação,
nenhum candidato se haja apresentado ou nenhum concorrente haja apresentado
proposta, e desde que o caderno de encargos e, se for ocado, os requisitos mínimos de
capacidade técnica e financeira não sejam substancialmente alterados em relação aos
daquele concurso.

DANIEL LOURENÇO
177
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

O insucesso em prévio procedimento de seleção concorrencial é, pois,


fundamento do recurso a um procedimento de acesso restrito, em que a participação vai
depender de convite da entidade adjudicante.
Mas para que possa adotar, nesta situação, o procedimento de ajuste direto, a
entidade adjudicante não pode alterar substancialmente o caderno de encargos e, quando
for o caso, os requisitos mínimos de capacidade técnica e financeira estabelecidos no
primitivo procedimento. Como se diz nas diretivas, exige-se que as condições iniciais do
contrato não sejam substancialmente alteradas.
Surge aqui uma exigência de identidade substancial entre o objeto do
procedimento que ficou deserto, e que foi aberto à concorrência, e o objeto do
procedimento de acesso restrito que venha a ser lançado. Este procedimento, embora
constituindo, para todos os efeitos, um procedimento autónomo, está numa relação de
dependência em relação ao procedimento que o precede; em ambos os procedimentos,
deve estar presente a intenção de celebrar o mesmo contrato.
Numa formulação que poderia ser mais clara, no nº9 do artigo 24º considera-se
que o caderno de encargos e os requisitos de capacidade técnica e financeira são
substancialmente alterados quando as alterações sejam suscetiveis de impedir a
verificação das situações previstas nessas alienas, nomeadamente quando sejam
modificados os parâmetros base fixados no caderno de encargos. Assim, por exemplo,
uma alteração do preço base do procedimento inicial no procedimento de ajuste direto
posterior constituirá uma alteração substancial das condições do anterior procedimento e,
por essa razão, proibida pelo preceito em análise.
A aliena a) do artigo 24º consagra uma limitação temporal no recurso a um
procedimento de ajuste direto nestas situações, sob pena de caducidade da decisão de
escolha do referido procedimento (art.24º/8). Assim, o procedimento de ajuste direto (ou
de consulta prévia) apenas poderá ser adotado pela entidade adjudicante no prazo de seis
meses a contar do termo do prazo fixado para a apresentação de candidaturas ou
propostas do procedimento primitivo. Dentro deste prazo, deverá a entidade adjudicante
proferir a decisão de escolha do procedimento, bem como proceder ao envio dos
convites.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Por força do disposto nos nº 5 e 6 do artigo 24º, as entidades adjudicantes dos


setores especiais podem adotar o ajuste direto (consulta prévia) na formação de contratos
que digam direta e principalmente respeito a uma ou a várias das atividades dos setores
especiais, sempre que não tenham sido apresentadas propostas em anterior concurso
publico ou concurso limitado, ou procedimento de negociação.

⎯ Na sequência de procedimentos concorrenciais (concursos


e diálogo concorrencial) em que todas as propostas foram
excluídas
O artigo 24º/1/b) autoriza a adoção do ajuste direto (consulta prévia, nos termos
do art.27º-A) na formação de qualquer contrato quando em anterior concurso público,
concurso limitado por prévia qualificação ou diálogo concorrencial, todas as propostas
apresentadas tenham sido excluídas, desde que o caderno de encargos não seja
substancialmente alterado em relação ao daquele procedimento.
Estamos, de novo, perante um cenário de insucesso de um procedimento aberto de
seleção concorrencial. Em geral, a admissibilidade de recurso a um procedimento de
acesso restrito justifica-se, também agora, porque o procedimento anterior já assegurou,
de forma cabal e adequada, a publicidade e a concorrência. Aplicam-se, também neste
caso, as condições e limites que vimos na situação anterior: identidade substancial do
caderno de encargos (art.24º/9); limite temporal previsto nos nº7 e 8 do artigo 24º.
Ao contrário do que se pode deduzir da sua leitura isolada, o artigo 24º/1/b), não
define os termos finais da possibilidade de adoção do procedimento de ajuste direto que
nele se prevê. Na verdade, o facto de todas as propostas terem sido excluídas (e o caderno
de encargos não alterado) não autoriza, por si só, a adoção do ajuste direto. Embora não o
explicite e isso só se perceba em função do disposto noutras normas, o artigo 24º/1, alínea
b), estabelece uma norma incompleta: o aplicador só fica em condição de definir o
alcance de que nela se estatui após a consideração do disposto em outras normas.
Essas outras normas encontram-se nos nº2 e 3 do artigo 24º. Em função destas,
devemos distinguir dois regimes de adoção de procedimentos de acesso restrito (ajuste
direto ou consulta previa) no caso de verificar a hipótese prevista na aliena b) do nº1

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

(exclusão de todas as propostas): em função de o valor do contrato a adjudicar: se situar


abaixo ou ser igual ou superior aos limiares europeus.

i) Contratos de valor inferior aos limiares europeus


Neste caso (art.24º/2) pode adotar-se o ajuste direto, mas apenas quando todas as
propostas tenham sido excluídas com fundamento no nº2 do art.70º, ou seja, tenham sido
excluídas por razões materiais, isto é, por se ter considerado que se tratava de propostas
com irregularidades de fundo (na medida em que envolviam, no seu conteúdo, a violação
de limites ou regras substantivas constantes das peças do procedimento, sobretudo do
caderno de encargos). Utiliza-se o conceito de propostas irregulares ou com
irregularidades para indicar as propostas que desrespeitem exigências e limites impostos
por lei ou pelas peças do procedimento, seja o programa do procedimento ou o convite.
Este fundamento para a adoção de um procedimento de ajuste direto (consulta
prévia) sem a condição de limitar o convite a um universo de concorrentes definidos pelo
procedimento prévio, não se encontra previsto nas diretivas. Por isso mesmo, a adoção de
um procedimento de acesso restringido, nessas condições, apenas se revela viável quando
o valor do contrato a celebrar se situa abaixo dos limiares europeus. Por outro lado, uma
vez que o CCP apenas autoriza a adoção do procedimento de acesso restrito quando todas
as propostas tenham sido excluídas com fundamento no nº2 do artigo 70º, parece dever-se
concluir que a adoção do ajuste direto (ou consulta prévia) se encontra vedada noutros
cenários, por exemplo, em casos em que todas as propostas foram excluídas mas apenas
algumas delas com esse fundamento e as outras com outros fundamentos (irregularidades
formais), bem como os casos em que todas as propostas tenham sido excluídas por
irregularidades formais.
A justificação para a limitação do uso do procedimento de ajuste direto apenas
nessa situação parece próxima da que se encontra prevista na aliena a) do mesmo
art.24/1: a entidade adjudicante lançou um procedimento e anunciou-o ao mercado. Ao
contrário do que se passa na alínea a), neste caso, o procedimento não ficou deserto,
houve concorrentes e propostas, mas a verdade é que as propostas apresentadas foram
todas excluídas por irregularidades de fundo, quer dizer, por não respeitarem
especificações e as condições definidas pela entidade adjudicante. Mantendo a entidade

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

adjudicante o interesse na celebração do contrato nos termos que idealizou e para o qual
definiu essas especificações e condições a lei concede-lhe a oportunidade de identificar
operadores económicos que estejam dispostos a apresentar propostas que respondem a
esse seu interesse.
ii) Contratos de valor igual ou superior aos limiares
europeus
No mesmo quadro factual (exclusão de todas as propostas apresentadas em
anterior concurso ou diálogo concorrencial e não alteração substancial do caderno de
encargos), exige-se agora, no caso de contratos de valor igual ou superior aos limiares
europeus, em primeiro lugar, que o anuncio do procedimento anterior tenha sido
publicado no JOUE e, em segundo lugar, que sejam convidados a apresentar proposta
todos, e apenas, os concorrentes cujas propostas tenham sido excluídas com fundamento
no nº2 do artigo 70º.
Agora, o órgão adjudicante está dispensado de voltar ao mercado, com um
anuncio, para procurar celebrar o contrato que pretende, mas apenas pode pedir nova
proposta aos concorrentes que participaram num procedimento anterior. Trata-se, pois, de
um procedimento de consulta prévia em que as entidades a convidar se encontram
definidas.
Como se viu, a lei autoriza a adoção de um procedimento em que intervém um
núcleo definido de participantes, que, em termos teóricos, pode ser apenas um, dois ou
mais: em concreto, o número de participantes no procedimento é determinado pelo
numero de exclusões de propostas com fundamento no art.70º/2. Os concorrentes a
convidar têm de ter apresentado propostas em conformidade com as exigências formais e
procedimentais requeridas no procedimento concorrencial.
O CCP refere-se, neste caso, a um convite à apresentação de propostas; mas, em
rigor, trata-se de um convite à apresentação de propostas corrigidas. Todos os
concorrentes convidados apresentaram propostas e todas estas foram consideradas
irregulares e insanáveis, por desrespeitarem parâmetros vinculativos do caderno de
encargos ou exigências legais. Agora, se a entidade adjudicante se socorrer desta
faculdade, os concorrentes vão poder corrigir os defeitos substantivos de que padeciam as
propostas.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

A adoção do procedimento de consulta prévia neste caso, ao contrário do que


vimos suceder na hipótese do nº2 do artigo 24º, não depende de todas as propostas terem
sido excluídas por razoes materiais, nos termos do nº2 do artigo 70º. Pode ter havido
propostas excluídas por razoes formais (v.g., apresentação fora do prazo; falta de
documentos). Sucede, porém, que os concorrentes cujas propostas tenham sido excluídas
por fundamentos não previsto no nº2 do art.70º não podem ser convidados. Pelo
contrário, os que viram as suas propostas excluídas com fundamentos ali previstos têm o
direito a ser convidados, na hipótese de a entidade adjudicante usar da faculdade que lhe
concede o art.24º/1/b), em conjugação com o nº3.
Conforme se estabelece nos nº 5º e 6º do artigo 24º, as entidades adjudicantes dos
setores especiais podem adotar o ajuste direto (consulta prévia) na formação de contratos
que digam direta e principalmente respeito a uma ou a várias das atividades dos setores
especiais, desde que, em anterior concurso publico ou concurso limitado, ou
procedimento de negociação, as propostas tenham sido excluídas com fundamento
diferente dos previstos no nº2 do art.70º. Não se percebe o sentido desta solução, quer
dizer, não se entende a razão pela qual se pode utilizar um procedimento por convite
quando todas as propostas tenham sido excluídas por razoes formais.

⎯ Motivos de urgência imperiosa


O ajuste direto também pode ser adota na medida do estritamente necessário e por
motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis para a
entidade adjudicante, quando não possam ser cumpridos os prazos inerentes aos demais
procedimentos, e desde que as circunstâncias invocadas não sejam, em caso algum,
imputáveis à entidade adjudicante – art.24º/1/c).
Conforme decorre da norma, os pressupostos que deverão estar preenchidos para
que o recurso ao procedimento de ajuste direto seja legalmente admissível são os
seguintes:
a. Acontecimento imprevisível;
b. Não imputável à entidade adjudicante;
c. Que seja causa de uma situação de urgência imperiosa;
d. Impossível de cumprir prazos exigidos para outros procedimentos;

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e. E que por isso imponha a necessidade de realizar um ajuste direto,


qual deve conter-se nos limites do estritamente necessário.
Para que se possa adotar o procedimento com convite com este fundamento,
exige-se que todas as condições estejam reunidas: não estando preenchida uma delas, a
entidade adjudicante não pode adotar o procedimento com convite. Impende, assim, sobre
a entidade adjudicante a obrigação de demonstrar que o circunstancialismo do caso
concreto se subsume nos pressupostos legalmente previstos, o que passará pela
averiguação do sentido dos conceitos legais.
Para efeitos do preenchimento dos requisitos legalmente previstos para a
admissibilidade de recurso ao procedimento de ajuste direto, importará, em primeiro
lugar, que esteja presente um acontecimento imprevisível e inesperado. Assim se deve
qualificar um facto ou acontecimento que um decisor publico normal e razoável,
colocado na posição do real decisor, não podia ter previsto, nem tinha a obrigação de
prever.
Alem de imprevisível, o acontecimento não pode ter sido caudado nem pode ser
imputável à entidade adjudicante. Nesta medida, forçoso será, por exemplo, que o recurso
ao ajuste direto por parte da entidade adjudicante não resulte de falta de diligencia da sua
parte em, atempadamente, desencadear outro procedimento pré-contratual.
Em terceiro lugar, tem de existir um nexo de causalidade entre a ocorrência do
acontecimento e o motivo de urgência imperiosa: a queda de uma ponte exige uma
resposta urgente que permita o atravessamento do rio. Não basta, portanto, a ocorrência
de um acontecimento imprevisível; esse acontecimento deverá exigir uma reação urgente
da entidade adjudicante.
Em quarto lugar, exige-se a demonstração da impossibilidade de cumprir nos
prazos exigidos para outros procedimentos, considerando, para este efeito, os
mecanismos de aceleração procedimental e o concurso publico urgente. Neste sentido, o
ajuste direto deve ser necessário, ou exigível, pelo que, sem adotar a forma adequada e
em tempo útil à situação de emergência com que está confrontada.
Em relação a este requisito, deve ainda ter-se em consideração a relação entre o
ajuste direto e a consulta prévia. Com efeito, a preferência legal da consulta précia sobre
o ajuste direto (art.27º-A CCP) coloca, para este efeito, a consulta dos procedimentos

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abertos à concorrência e obriga, portanto, à demonstração pelo órgão adjudicante de que


os prazos mais longos deste procedimento não podem ser cumpridos por
incompatibilidades com a situação concreta de urgência.
Por fim, em quinto lugar, o procedimento só pode ser utilizado na medida do
estritamente necessário. Ou seja, o procedimento sem convite (ajuste direto ou consulta
prévia) será usado apenas para satisfazer necessidades imediatas, abrangendo apenas o
período que decorre até que possam ser encontradas soluções mais estáveis, no quadro da
contratação não urgente.
A verificação de uma situação de urgência imperiosa nos termos definidos na lei
tem, obviamente, de ser explicada na fundamentação da decisão de adotar o ajuste direto.
Mas, nos termos da lei, o órgão adjudicante não tem o dever estrito de explicar as razoes
da escolha dos operadores económicos a convidar. Desde que preencham os requisitos
positivos e negativos para participar em procedimentos de contratação pública, quaisquer
entidades podem ser convidadas. Poderá, contudo, suceder que a invocação da urgência
não se mostre na aparência conciliável com o convite dirigido a entidade que, em função
das condições do contexto, parecem não dispor de capacidade para responde com a
urgência devida. Neste caso, o órgão adjudicante deverá explicar as razoes que
determinam o convite a tais entidades.

⎯ Aquisições para a prestação de serviços de


telecomunicações
Um procedimento com convite pode ser adotado quando as prestações que
constituem o objeto do contrato a celebrar se destinem, a titulo principal, a permitir à
entidade adjudicante a prestação ao publico de um ou mais serviços de telecomunicações
(art.24/1/d).
Esta possibilidade de adoção de procedimento com convite corresponde a uma
das únicas situações em que a lei se mostra sensível ao facto de as entidades adjudicantes
exercerem atividades expostas à concorrência e, portanto, em competição com operadores
económicos. Com efeito, admite-se uma derrogação à regra geral de adoção de
procedimentos abertos, em atenção ao facto de estar em causa a formação de contratos

DANIEL LOURENÇO
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cujo objetivo principal é o de permitir à entidade adjudicante desenvolver uma atividade


exposta à concorrência.

⎯ Exclusividade do prestador ou do fornecedor


Conforme se estabelece no artigo 24º/1/e) CCP, o ajuste direto pode ser adotado
quando as prestações que constituem o objeto do contrato só possam ser confiadas a
determinada entidade por uma das seguintes razoes:
a. O objeto do procedimento seja a criação ou aquisição de uma obra
de arte ou de um espectáculo artístico;
b. Não exista concorrência por motivos técnicos;
c. Seja necessário proteger direitos exclusivos, incluindo direitos de
propriedade intelectual.
O fundamento material em análise dirige-se aos casos em que no mercado só
exista um operador técnica, artística ou juridicamente capaz de realizar as prestações do
contrato a celebrar.
A existência de apenas um operador apto a realizar a prestação contratual pode
surgir, em primeiro lugar, nos casos em que esteja em causa a criação ou aquisição de
uma obra de arte ou de um espectáculo artístico5.
Neste caso, o CCP dispensa o órgão adjudicante de demonstrar a existência de
alternativa ou substituto razoável, o que significa aceitar qualquer escolha, por exemplo,
quanto ao artista a convidar para um determinado espectáculo.
Em segundo lugar, admite-se que a inexistência de concorrência esteja associada a
motivos técnicos. Como esclarece o considerando 50 da Diretiva 2014/24/UE, motivos
deste tipo incluem, por exemplo, a impossibilidade técnica, na prática, de qualquer outro
operador económico atingir o desempenho exigido, ou a necessidade de utilizar
conhecimentos, instrumentos ou meios específicos que apenas um operador tem à
disposição; além disso, podem também resultar de requisitos específicos de

5
A jurisprudência do Tribunal de Contas, constantemente, tem excluído desta alínea
matéria relacionada com arquitectura.

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interoperabilidade que devam ser respeitados a fim de garantir o funcionamento das


obras, fornecimentos ou serviços que são objeto de concurso.
Na jurisprudência do Tribunal de Contas, tem sido afirmado que o ajuste direto
radicado em motivos técnicos (…) só é admissível quando, no mercado, e atenta a
complexidade e exigência dos serviços a prestar, exista uma única entidade disponível e
com aptidão técnica para assegurar a respetiva prestação.
Em terceiro lugar, a lei considera o cenário em que o facto de a prestação apenas
poder ser confiada a um único operador se deve à necessidade de proteger direitos
exclusivos, incluindo direitos de propriedade intelectual.
Relativamente às duas ultimas situações (motivos técnicos e necessidade de
proteger direitos exclusivos, incluindo direitos de propriedade industrial), o nº4 do
art.24ºCCP acrescenta que o ajuste direto só pode ser adotado quando não exista
alternativa ou substituto razoável e quando a inexistência de concorrência não resulte de
uma restrição desnecessária face aos aspetos do contrato a celebrar.
Este limite geral reflete-se no dever de fundamentação da escolha do
procedimento, que em relação à primeira exigência terá de esclarecer que as prestações
do contrato só podem ser efetuadas pela entidade convidada porque não existe alternativa
ou substituto razoável do produto ou do serviço que pretende adquirir: prova de
infungibilidade.
Mas, além disso (cumulativamente), a entidade adjudicante terá de demonstrar
que a definição das condições e especificações técnicas requeridas para o produto ou
serviço a contratar, embora envolva uma restrição à concorrência (uma vez que só a
entidade convidada estará em condição de fornecer o produto ou prestar o serviço com
as especificações requeridas), não comporta uma restrição desnecessária, porquanto só
um produto ou um serviço com essas especificações satisfaz cabalmente as necessidades
da entidade adjudicante.

5.6.1.2. Ajuste direto (ou consulta prévia) para a formação de


contratos de empreitada de obras públicas
Além dos casos previstos no art.24º, quando se trate de empreitada de obras
públicas, o ajuste direto ou a consulta prévia podem ainda ser utilizados, nos termos do

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art.25º e 27º-A, especificamente para contratos de empreitadas de obras públicas nos


seguintes casos:
⎯ Repetição de obras similares
Nos termos do art.25º/1/a), o ajuste direto pode ser utilizado quando se trate de
novas obras que consistam na repetição de obras similares objeto de contrato
anteriormente celebrado pela mesma entidade adjudicante, desde que, de forma
cumulativa:
a. O contrato seja celebrado com a entidade adjudicante com a qual foi
celebrado o contrato inicial;
b. Essas obras estejam em conformidade com um projeto de base comum;
c. Aquele contrato tenha sido celebrado há menos de três anos, na
sequência de concurso público, de concurso limitado por prévia
qualificação, de procedimento de negociação, de diálogo concorrencial
ou de parceria para a inovação;
d. O anuncio do procedimento tenha sido publicado no JOUE, no caso de o
somatório do valor estimado do contrato relativo ao ajuste direto e do
preço contratual relativo ao contrato inicial ser igual ou superior ao
limiar estabelecido na alínea a) do nº3 do artigo 474º;
e. A possibilidade de adoção do procedimento de ajuste direto tenha sido
indicada no anúncio ou no programa do procedimento.

⎯ Obras realizadas para fins de I&D


Conforme se estabelece no artigo 25º/1/b), o ajuste direto pode ser utilizado para a
adjudicação de contratos de empreitadas de obras públicas quando se trate de obras a
realizar para fins de investigação, de experimentação, de estudo ou desenvolvimento.
Porém, a utilização do ajuste direto está, neste caso, sujeita aos dois limites seguintes:
a. A realização das obras não se destinar a assegurar a obtenção do
lucro ou amortizar o custo das atividades de I&D;
b. O valor estimado do contrato terá de ser inferior limiar
estabelecido na alínea a) do nº3 do artigo 474º.

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⎯ Obras adjudicadas ao abrigo de acordos-quadro


O artigo 25º/1/c) autoriza a adoção do ajuste direto quando estejam em causa
contratos de empreitada de obras a adjudicar ao abrigo de um acordo-quadro celebrado
nos termos do disposto na aliena a) do nº1 do artigo 252º e do nº1 do artigo 258º. Quando
aos contratos de empreitada celebrados ao abrigo de acordos-quadro nos termos do
disposto do art.252/1/b), há lugar à adoção do procedimento de consulta prévia nos
termos do artigo 259º/1.

5.6.1.3. Ajuste direto (ou consulta prévia) para a formação de


contratos de aquisição de bens móveis
Alem dos casos em que pode ser utilizado nos termos do artigo 24º, quando se
trate de contratos de aquisição de bens móveis, o ajuste direto pode ainda ser utilizado,
nos termos do art.26º.
⎯ Aquisição de bens para substituir parcialmente ou ampliar
bens ou equipamentos de uso corrente
Nos termos do artigo 26º/1/a) pode adotar-se o ajuste direto quando se trate de
locação ou aquisição de bens destinados à substituição parcial ou ampliação de bens ou
equipamentos de especifico uso corrente da entidade adjudicante, desde que o contrato a
celebrar o seja com a entidade com a qual foi celebrado o contrato inicial de locação ou
de aquisição de bens e a mudança de fornecedor obrigasse a entidade adjudicante a
adquirir material de características técnicas diferentes, originando incompatibilidades ou
dificuldades técnicas de utilização e manutenção desproporcionadas.

⎯ Aquisição de bens a utilizar para fins de I&D


Em conformidade com o artigo 26º/1/b), pode adotar-se o ajusto direto quando se
trate de bens a utilizar para fins de investigação, de experimentação, de estudo ou de
desenvolvimento, desde que tais bens não sejam utilizados com finalidade comercial, ou
com vista a amortizar o custo dessa atividade, e o valor estimado do contrato seja inferior
aos limiares estabelecidos nas alíneas b) e c) do nº3 do artigo 474º.

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⎯ Aquisição de bens cotados em mercados de matérias-


primas
Nos termos do art.26º/1/c), o ajuste direto pode ser adotado quando se trate de
adquirir bens cotados e adquiridos num mercado de matérias-primas.

⎯ Aquisição de bens em condições especialmente vantajosas


Conforme se dispõe no artigo 26º/1/d), o ajuste direto pode ser adota quando se
trate de adquirir bens, em condições especialmente mais vantajosas do que as
normalmente existentes no mercado, as entidades cessem definitivamente a sua atividade
comercial, a curadores, liquidatários, administradores de insolvência ou ainda no âmbito
de acordo judicial ou procedimento da mesma natureza previsto na legislação aplicável.

⎯ Aquisição de bens ao abrigo de acordos-quadro


O ajuste direto pode ser adotado quando se trate de locar ou adquirir bens ao
abrigo de um acordo-quadro celebrado nos termos do disposto na alínea a) do nº1 do
artigo 252º e do nº1 do artigo 258º. Quanto aos contratos de locação ou aquisição de bens
celebrados ao abrigo de acordos-quadro nos termos do artigo 252º/1/b), há lugar a adoção
do procedimento de consulta prévia nos termos do artigo 259º/1.

⎯ Aquisição de águas ou de energia por entidades


adjudicantes que atuem nos setores da água ou da energia
Em conformidade com a alínea f) do nº1 do artigo 26º, pode adotar-se o ajuste
direto para a formação de contratos de aquisição de água ou energia, desde que a entidade
adjudicante exerça a atividade de colocação à disposição, de exploração ou de
alimentação de redes fixas de prestação de serviços ao público no domínio da produção,
do transporte ou da distribuição de, respetivamente, água potável ou eletricidade, gás ou
combustível para aquecimento.

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5.6.1.4. Ajuste direto (ou consulta prévia) para a formação de


contratos de aquisição de serviços
Além dos casos em que pode ser utilizado nos termos do art.24º, quando se trate
de contratos de aquisição de serviços, o ajuste direto pode ainda ser utilizado, nos termos
do art.27º nos casos que a seguir se indicam:

⎯ Aquisição de serviços similares a serviços contratados


previamente
Nos termos da alínea a) do nº1 do artigo 27º, o ajuste direto pode ser adotado para
a aquisição de novos serviços que consistam na repetição de serviços similares que
tenham sido objeto de contrato anteriormente celebrado pela mesma entidade adjudicante
com o mesmo adjudicatário, desde que, de forma cumulativa:
a. Esses serviços estejam em conformidade com um projeto base
comum;
b. Aquele contrato tenha sido celebrado, há menos de três anos, na
sequencia de concurso público, de concurso limitado por prévia
qualificação, de procedimento de negociação, de diálogo
concorrencial ou de parceria para a inovação;
c. O anuncio do procedimento tenha sido publicado no JOUE, no
caso de o somatório do valor estimado do contrato e do preço
contratual relativo ao contrato inicial ser igual ou superior ao valor
referido, consoante os casos, nas alíneas b) ou c) do nº3 do artigo
474º;
d. A possibilidade de adoção do ajuste direto tenha sido indicada no
anuncio ou no programa do concurso

⎯ Impossibilidade de definição de critérios de comparação


das propostas
A alínea b) do nº1 do artigo 27º autoriza a adoção do ajuste direto para a
contratação de serviços quando a natureza das respetivas prestações, nomeadamente as
inerentes a serviços de natureza intelectual, não permita a elaboração de especificações

DANIEL LOURENÇO
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contratuais suficientemente precisas para que sejam definidos os atributos qualitativos


das propostas necessários à fixação de um critério de adjudicação, nos termos do disposto
no artigo 74º, e desde que a definição quantitativa dos atributos das propostas, no âmbito
de outros tipos de procedimento, seja desadequada e essa fixação tendo em conta os
objetivos da aquisição pretendida.
Por força do nº4 do artigo 27º, o ajuste direto ao abrigo do disposto na alínea b)
do nº1 do mesmo preceito não pode ser adotado quando o serviço a adquirir consista na
elaboração de um plano, de um projeto ou de uma qualquer criação conceptual nos
domínios artístico, do ordenamento do território, do planeamento urbanístico, da
arquitectura, da engenharia ou do processamento de dados.

⎯ Aquisição de serviços relativos à aquisição de imóveis


Com fundamento na alínea c) do nº1 do art.27º, pode adotar-se o ajuste direto para
adjudicar serviços relativos à aquisição ou à locação, independentemente da respetiva
modalidade financeira, de quaisquer bens imóveis, ou a direitos sobre esses bens, salvo os
contratos de prestação de serviços financeiros celebrados simultaneamente, prévia ou
posteriormente ao contrato de aquisição ou de locação, seja qual for a sua forma.

⎯ Aquisição de serviços de arbitragem, conciliação ou


mediação
Na alínea d) do nº1 do art.27º permite-se a adoção do ajuste direto (art.27-A) para
a contratação do serviço de arbitragem, conciliação ou mediação.

⎯ Aquisição de serviços de I&D


Nos termos do art.27º/1/e), pode adotar-se o ajuste direto para a aquisição de
serviços de investigação e desenvolvimento não excluídos da aplicação da Parte II do
CCP pela alínea j) do nº4 do artigo 5º, desde que o valor estimado do contrato seja
inferior aos limiares estabelecidos nas alíneas b) e c) do nº3 do artigo 474º.

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⎯ Aquisição de serviços na sequência de concurso de


conceção
A alínea g) do nº1 do artigo 27º autoriza a adoção do ajuste direto para a
adjudicação de contrato que, na sequencia de um concurso de conceção, deva ser
celebrado com o concorrente seleccionado ou com um dos concorrentes seleccionados
nesse concurso, desde que tal intenção tenha sido manifestada nos respetivos termos de
referencia de acordo com as regras nele estabelecidas.

⎯ Serviços adquiridos ao abrigo de acordos-quadro


Nos termos da alínea h) do nº1 do art.27º, o ajuste direto pode ser adotado quando
se trate de adquirir serviços ao abrigo de um acordo-quadro, nos termos do disposto na
alínea a) do nº1 do art.252º e do art.258º/1. Quando aos contratos de aquisição de
serviços celebrados ao abrigo de acordos-quadro nos termos do disposto do artigo
252º/1/b), há lugar à adoção do procedimento de consulta prévia nos termos do art.259º/1.

⎯ Serviços adquiridos em condições especialmente


vantajosas
Em conformidade com a alínea h) do nº1 do artigo 27º, o ajuste direto pode ser
adotado para adquirir serviços, em condições especialmente mais vantajosas do que as
normalmente existentes no mercado, a entidade que cessem definitivamente a sua
atividade comercial, a curadores, liquidatários, administradores de insolvência ou ainda
no âmbito do acordo judicial ou procedimento da mesma natureza previsto na legislação
aplicável.

5.6.1.5. Regra de preferência da consulta prévia sobre o ajuste


direto
A decisão de escolha do procedimento tem de ser fundamentada sempre. Mas, em
especial por força do artigo 27-A, o órgão adjudicante deve explicar porque razão adota o
ajuste direto em vez de consulta prévia, a qual tem, em regra, preferência legal sobre
aquele. Assim, como parece resultar daquele preceito, a adoção do ajuste direto releva-se

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uma medida de exceção, não só em face dos procedimentos concorrenciais abertos, mas
também em face da consulta prévia.
A indicação do fundamento material da escolha do ajuste direto tem de constar do
modelo de ficha publicitada no portal dos contratos públicos, nos termos do art.127º/1.
O artigo 27-A estabelece o seguinte: nas situações previstas nos artigos 24º a 27 –
preceitos que autorizam expressamente a adoção do ajuste direto – deve adotar-se o
procedimento de consulta prévia sempre que o recurso a mais de uma entidade seja
possível e compatível com o fundamento invocado para a adoção deste procedimento.
Em termos práticos, o preceito vem, assim, implicar uma derrogação das várias
normas de permissão do recurso ao ajuste direto em função de critérios materiais.

5.6.2. Procedimentos de concurso (sem publicação no JOUE)


Nos termos do artigo 28º, pode adotar-se o concurso público ou limitado por
prévia qualificação, sem publicação do respetivo anuncio no JOUE, nos casos em que
pode ser adotado o ajuste direto em razão de critérios materiais (art.24 e 27), com
exceção daqueles em que só seja possível convidar uma entidade e do caso previsto na
alínea b) do nº1 do artigo anterior.
O sentido do art.28º reside em conceder às entidades adjudicantes a possibilidade
de adotarem procedimentos de concurso nacionais em situações em que também podem
adotar procedimentos de acesso restrito, com convite.
A faculdade de adoção de concursos nacionais, sem publicação no JOUE, nos
casos previstos nos artigos 24º a 27º, está, naturalmente, afastada quando só seja possível
convidar uma entidade, nos termos do artigo 24º/1, alínea e). em rigor, o que aí se
encontra afastado é, em si mesmo, o procedimento de concurso.

5.6.3. Procedimento de negociação e de diálogo concorrencial


Conforme se prescreve no artigo 29ºCCP, a entidade adjudicante pode adotar o
procedimento de negociação e de diálogo concorrencial quando:
⎯ As suas necessidades não possam ser satisfeitas sem a adaptação de
soluções facilmente disponíveis;
⎯ Os bens ou serviços incluírem a conceção de soluções inovadoras;

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⎯ Não for objetivamente possível adjudicar o contrato sem negociações


prévias devido a circunstâncias específicas relacionadas com a sua
natureza, complexidade, montagem jurídica e financeira ou devido aos
riscos a ela associados;
⎯ Não for objetivamente possível definir com precisão as especificações
técnicas por referência a uma norma, homologação técnica europeia,
especificações técnicas comuns ou referência técnica;

5.6.4. Parceria para a inovação


A entidade adjudicante pode adotar a parceria para a inovação quando pretenda a
realização de atividades de investigação e o desenvolvimento de bens, serviços ou obras
inovadoras, independentemente da sua natureza e das áreas de atividade, tendo em vista a
sua aquisição posterior, desde que estes correspondam aos níveis de desempenho e preços
máximos previamente acordados entre aquela e os participantes na parceria (art.30-A).

5.7. Escolha do procedimento em função do tipo do contrato


O artigo 31º estabelece um regime especial aplicável à escolha de procedimentos
para a formação de três tipos de contratos: concessões de obras públicas, concessões de
serviços públicos e contratos de sociedade.
Sem prejuízo da possibilidade de adoção de ajuste direto, nos termos artigo 24º,
ou da adoção da parceria para a inovação, nos termos do artigo 30º-A, para a formação
daqueles três contratos pode ser adotado, em alternativa, o concurso público, o concurso
limitado por prévia qualificação, o procedimento de negociação ou o diálogo
concorrencial.
A adoção de qualquer dos procedimentos indicados no nº1 do art.30º é obrigatória
mesmo que os contratos não impliquem o pagamento de um preço pela entidade
adjudicante ou ainda que sejam contratos sem valor.
Nos teros do nº3 do artigo 31º, quando razoes de interesse público relevante o
justifiquem, pode adotar-se o ajuste direto para a formação de contratos de sociedade –
trata-se do único caso em que a entidade adjudicante pode invocar um interesse público
relevante como fundamento material de adoção de um procedimento.

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5.8. Escolha do procedimento para a formação de contratos mistos


Para este efeito, interessam-nos os contratos que abranjam simultaneamente
prestações típicas de mais do que de um tipo de contrato (art.32/2CCP) – por exemplo,
aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços, como é o caso do contrato de
aquisição de computadores e de manutenção de uma rede informática; ou aquisição de
serviços e empreitada de obras públicas.
Ora, o CCP determina a aplicação, em matéria de escolha do procedimento de
adjudicação, do regime previsto para o tipo contratual que caracteriza o objeto principal
do mesmo; cfr.art.32º/2, que acrescenta que, na determinação do objeto principal, deve
atender-se a elementos tais como o valor estimado do contrato ou as suas prestações
essenciais.
Embora a lei não seja totalmente clara, em função do que dispõe o nº3 do artigo
32º, parece que o objeto principal do contrato se determina em termos diferentes
consoante seja possível ou não identificar separadamente as diferentes partes do contrato.
No caso de se revelar possível discernir as diferentes partes do contrato, o objeto
principal é determinado em função do tipo contratual a que se refere a parte do valor
estimado mais elevado. Se não for possível proceder à identificação das diferentes partes,
o critério de determinação do objeto principal passa pela identificação das prestações
essenciais.

5.9. Escolha do procedimento em função da entidade adjudicante


Quando esteja em causa a formação de contratos que digam direta e
principalmente respeito a uma ou a várias das atividades exercidas nos setores da água,
da energia, dos transportes e dos serviços postais pelas entidades adjudicantes referidas
no nº1 do artigo 7º, estas entidades podem adotar, em alternativa, o concurso público, o
concurso limitado por prévia qualificação, o procedimento de negociação, o diálogo
concorrencial, ou ainda, se cumpridos os pressupostos previstos no art.30º-A para a
inovação.
Submetem-se ao CCP os contratos celebrados pelas entidades adjudicantes do
artigo 7º/1, que não se reportem apenas a atividades desenvolvidas no âmbito dos setores
especiais, quando não seja possível determinar a que atividade tais contratos dizem

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principalmente respeito. Nestes casos, em que a lei presume, a predominância da


finalidade associada aos setores especiais, aplicar-se-á, naturalmente, também este regime
de escolha do procedimento (art.33/3).
Por outro lado, o regime especifico da contratação nos setores especiais estende-
se aos contratos celebrados pelos organismos de direito público que digam direta e
principalmente respeito a uma ou várias atividades nestes setores (art.12º). Por isso
mesmo, apesar de o nº1 do art.33º se referir apenas às entidades adjudicantes referidas no
nº1 do art.7º, deve entender-se, por força do disposto no artigo 12º, que o que nele se
dispõe também se aplica aos organismos de direito público. Contudo, quando os contratos
destas entidades não se relacionem apenas com atividades desenvolvidas nos setores
especiais, e não sendo possível identificar a que atividades tais contratos dizem
principalmente respeito, os organismos de direito público deixam de beneficiar do regime
de contratação nos setores especiais e, por conseguinte, também das regras de escolha do
procedimento previstas no nº1 do art.33º.

5.10. O caso especial dos procedimentos de concurso (público ou limitado


por prévia qualificação)
Em rega, a entidade adjudicante pode adotar sempre os procedimentos de
concurso. Esta é a regra, para contratos de empreitadas, de aquisição de serviços ou
bens móveis, bem como de contratos de concessão de obras públicas de qualquer valor,
desde que os concursos sejam publicados no JOUE (art.19º/a); 20º/1/a) e 131º/2). É
também regra para os contratos de empreitada de obras, de aquisição de serviços ou de
bens móveis de valores inferiores aos limiares europeus e para quaisquer contratos de
qualquer valor, sem publicação no JOUE, adjudicados, portanto, no âmbito de
concursos nacionais (art.19º/b), 20/1/b) e 21º/a)).
Por sua vez, o artigo 28º autoriza a adoção de procedimentos de concurso, com
publicidade apenas nacional, nos casos em que se pode adotar o ajuste direto em função
de critérios materiais. Este ultimo preceito só afasta a possibilidade de procedimentos de
concurso quando não seja possível convidar mais do que uma entidade, caso em que,
pela natureza das coisas, não pode haver lugar a concursos. Alem disso, e ainda nos
termos do artigo 28º, quando se trate de contratos de valor abaixo dos limites europeus,

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não pode haver concursos, se for impossível definir critérios de comparação entre
propostas, nos termos da alínea b) do nº1 do artigo 27º.
Por outro lado, os procedimentos de concurso público e de concurso limitado
por prévia qualificação são, em geral intercambiáveis. Todavia, não existe uma
incompleta indiferença normativa quanto à escolha de um e de outro: com efeito,
resulta, de algum modo, do artigo 165º que o concurso limitado não deve ser utilizado
quando a estipulação de requisitos mínimos não se revele adequada à natureza do
contrato. Neste contexto e dentro deste apertado condicionalismo, poderá aludir-se a um
princípio de preferência do concurso publico em relação ao concurso limitado por
prévia qualificação.
Note-se, por fim, que o poder genérico de adoção de procedimentos de concurso
não abrange o enxerto da fase das propostas no concurso público, nem a tramitação do
concurso público urgente: respetivamente, art.149º e seguintes e 155º e seguintes,
indicando os casos específicos em que essas tramitações são admissíveis.

5.11. Fundamentação da decisão de escolha do procedimento


A decisão de escolha do procedimento tem que ser fundamentada em todos os
casos. Todavia, a exigência assume maior importância nos casos de escolha do
procedimento em função de critérios materiais. E a importância da exigência é ainda
maior nos casos de adoção de procedimentos de processo restringido, por convite,
fundada em razões materiais, pois, neste caso, são precisamente as razões materiais que
justificam o afastamento de procedimentos abertos a quaisquer interessados. Neste
contexto, sempre que é chamado a pronunciar-se sobre a adoção de procedimentos sem
publicação de anúncio, o TJUE sublinha o caráter derrogatório das regras que autorizam
esses procedimentos, as quais, por isso mesmo, reclamam uma interpretação restritiva
neste sentido.
Torna-se, então, necessário, explicar que se verificam, no caso concreto, os
pressupostos que a lei define como condição de escolha do procedimento. Porém, neste
domínio, mais do que a fundamentação formal da decisão, essencial é que, na realidade,
se verifiquem tais pressupostos, de modo a que para tal for instada, a entidade
adjudicante possa alegar a verificação desses pressupostos. Em si mesmo, o dever de

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fundamentação formal tem, essencialmente, uma projeção interna, no sentido que deve
ficar a constar do processo, eventualmente para efeitos de ações de controlo e auditoria
que atinjam a entidade adjudicante.
A fundamentação da decisão de escolha do procedimento deve, em regra,
constar do processo administrativo de adjudicação. Todavia, em certos casos, a
fundamentação da escolha do procedimento tem de constar de peças do procedimento,
certamente com o propósito de impor a respetiva publicitação, de modo a que todos os
interessados fiquem a conhecer o fundamento legal da decisão de escolha do
procedimento. Assim é com a adoção de:
⎯ Procedimentos de ajuste direto e de consulta prévia: art.115º/1/c;
⎯ Procedimentos de concurso público e de concurso limitado por prévia
qualificação, quando a escolha de tais procedimentos seja feita ao abrigo
do artigo 28º: cfr. art.132º/1/d) e 164º/1/d). em rigor, e como já se
esclareceu, este dever de fundamentação apenas existe quando se trate de
concursos sem publicação do anuncio no JOUE e para a adjudicação de
contratos de valor superior a limiares europeus.

5.12. Violação das regras legais de escolha de procedimentos


A escolha dos procedimentos de adjudicação deve observar os critérios legais
acabados de analisar. Quando estes critérios não são seguidos, a decisão é ilegal e esta
ilegalidade comunica-se ao ato final do procedimento de adjudicação - a decisão de
adjudicação -, bem como, em certos termos, ao próprio contrato que venha a ser
celebrado (invalidade consequente).
De acordo com as regras gerais, o desrespeito da lei aplicável determina uma
situação de anulabilidade das decisões ilegais: art.163º/1 CPA.
Importa, contudo, ter em consideração o art.161º/2/l) CPA, que comina a sanção
da nulidade em relação aos atos praticados com preterição total do procedimento
legalmente exigido.
Contudo, resulta do exposto que não se pode dizer que decorra da lei, em geral,
uma exigência de adoção de procedimentos determinados em casos identificados. Neste
sentido, os procedimentos analisados não são legalmente exigidos. Com efeito, o que

DANIEL LOURENÇO
198
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

sucede é que a lei só permite a utilização de determinados procedimentos em casos


identificados: eis o que ocorre, tipicamente, com os procedimentos de ajuste direto, de
consulta prévia, de negociação ou de diálogo concorrencial. Mas o facto de a entidade
adjudicante adotar o procedimento de ajuste direto num caso não permitido não
significa que, por essa razão, esteja a ser totalmente preterido um ou o procedimento
legalmente exigido. Isto é assim porque, em condições normais, naquele mesmo caso,
poderia, por exemplo, ser escolhida a consulta prévia, o concurso público ou o concurso
limitado por prévia qualificação; e o leque de escolhas poderia até aumentar, por
exemplo, aos procedimentos de negociação e de diálogo concorrencial.
Nestes termos, importa saber se o referido preceito do CPA se aplica a um caso
em que o órgão adjudicante escolhe o procedimento de ajuste direto ou o procedimento
de negociação, na falta de pressupostos legais para essa escolha.
O Professor PEDRO COSTA GONÇALVES julga que a leitura correta do
problema recomenda uma distinção essencial entre os vários procedimentos, que
permita aplicar, no âmbito da contratação pública, o conceito de preterição total do
procedimento legalmente exigido.
Tendo presente o sentido fundamental da regulamentação legal dos
procedimentos de adjudicação de contratos públicos, uma indagação destinada a
identificar as categorias essenciais desses procedimentos conduz-nos a uma separação
estrutural entre dois tipos: os procedimentos com anúncio público e os procedimentos
com convite (ajuste direto e consulta prévia). Esta bifurcação assinala a diferença
essencial entre os procedimentos de adjudicação que a lei prevê: num caso, o
procedimento é aberto à participação de todos os interessados que cumpram os
requisitos, no outro caso, no procedimento, só podem entrar as entidades que forem
convidadas. Aqui reside, insiste-se, a diferença essencial entre duas famílias de
procedimentos de adjudicação: assim, se se adota um deles quando se deveria adotar o
outro, temos um caso de preterição total do procedimento legalmente exigido.
Como resulta do que vimos, a adoção ilegal de procedimentos com convite não
corresponde, em termos estritamente formais, à preterição de um procedimento
legalmente exigido. Mas, se tivermos em consideração que a regra geral do CCP impõe
a adoção de um procedimento com anuncio, e que, neste sentido, este representa um

DANIEL LOURENÇO
199
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

tipo de procedimento legalmente exigido em regra, é legitimo concluir então que,


sempre que, sem um fundamento legal, o órgão adjudicante adota um procedimento
com convite está a preterir um topo de procedimento legalmente exigido, que teria, em
qualquer caso, de ser um procedimento com anuncio, aberto a todos os interessados.
Assim, e em síntese, na interpretação do Professor PEDRO COSTA
GONÇALVES, haverá um caso de nulidade da decisão de escolha do procedimentos,
que se transmite à decisão final de adjudicação, por preterição total do procedimento
legalmente exigido, sempre que o órgão adjudicante adota um procedimento com
convite sem que haja fundamento legal material para o efeito, quer porque o valor do
contrato exige um procedimento com anuncio, quer porque não se verificam os
pressupostos de que a lei faz depender a adoção do procedimento com convite.
Para além dessa situação, reconduz à figura da preterição total de procedimento
legalmente exigidos os casos seguintes:
⎯ Aqueles em que o órgão adjudicante celebra um contrato sem seguir
qualquer regra estabelecida no CCP, v.g., porque supõe, erradamente,
que o contrato está excluído do âmbito de aplicação do CCP.
⎯ Aqueles em que o órgão adjudicante celebra um contrato sujeito à Parte
II do CCP no regime do ajuste direto simplificado fora das condições
estabelecidas no artigo 128º/1 (isto porque o ajuste direto simplificado
não alcança um grau de procedimentalidade mínimo, pelo que a sua
adoção fora dos casos previstos na lei corresponde, em todos os casos, à
preterição de um procedimento que a lei exige para a adjudicação de
contratos públicos).

6. DESENHO LEGAL DA TRAMITAÇÃO DOS PROCEDIMENTOS (ANÁLISE


GENÉRICA)
6.1. Ajuste Direto e Consulta Prévia
A consulta prévia é o procedimento em que a entidade adjudicante convida
diretamente pelo menos três entidades à sua escolha a apresentar proposta, podendo
com elas negociar os aspetos da execução do contrato a celebrar.

DANIEL LOURENÇO
200
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

O ajuste direto é o procedimento em que a entidade adjudicante convida diretamente


uma entidade à sua escolha a apresentar proposta.

⎯ FASES DO PROCEDIMENTO
1. Fase preparatória do procedimento
2. Abertura do procedimento na plataforma eletrónica
3. Colocar o procedimento no mercado – envio dos convites
4. Esclarecimentos
5. Erros e omissões
6. Apresentação e abertura de propostas
7. Disponibilização dos documentos das propostas (na hipótese de serem
apresentadas várias propostas)
8. Fase de negociação [opcional]
9. Análise das propostas e relatório preliminar
10. Audiência prévia
11. Relatório final
12. Adjudicação, apresentação dos documentos de habilitação e prestação de
caução
13. Outorga do contrato
14. Relatório de formação do contrato – eficácia do contrato (pagamentos)

1. FASE PREPARATÓRIA DO PROCEDIMENTO


2.
Acesso à plataforma eletrónica
Para terem acesso à plataforma os utilizadores necessitam de possuir um
certificado instalado no computador, o qual pode ser obtido no processo de inscrição
como fornecedor.

DANIEL LOURENÇO
201
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Assinatura digital qualificada


Todos os utilizadores da plataforma eletrónica de contratação têm de possuir um
certificado de assinatura eletrónica qualificada emitido pela Trusted List Nacional que
contempla todos os prestadores e respetivos Serviços de Confiança Qualificados.

Nestes termos, o certificado digital qualificado poderá ser:


⎯ Digitalsign;
⎯ Multicert;
⎯ Entidade de Certificação de Assinatura Digital Qualificada do Cartão de
Cidadão.
Nos casos em que o certificado de assinatura eletrónica qualificada não permita
relacionar diretamente o assinante com a sua função e poder de representação, deve a
entidade interessada submeter na plataforma um documento que comprove o poder de
representação e assinatura do assinante (artigo 27.º da Portaria nº 701-G/2008 de 29 de
julho).
Determinação do preço base, balizado pela análise dos preços de mercado dos
bens e serviços e, cabimentação da despesa do procedimento (artigo 47.º CCP e
Decreto-lei n.º 155/92, de 28 de julho)
Para determinar o preço base (ou seja, o preço máximo que a entidade
adjudicante se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações que constituem
objeto do contrato) deve-se multiplicar as quantidades estimadas para um ano pelos
preços estimados. Se existir a possibilidade de renovação do contrato, o preço base
deverá corresponder ao valor global dos anos de renovação.
Deverá ser escolhido qual o preço estimado através de consulta a fornecedores
do mercado. Após a determinação do preço base, deve-se registar o cabimento
orçamental na respetiva classificação económica de despesa do ano corrente.

Escolha das entidades convidadas (artigo 113.º do CCP)


A escolha das entidades convidadas a apresentar proposta cabe ao órgão
competente para a decisão de contratar. Não podem ser convidados as entidades nas
condições referidas no n.º 2 e 5 do artigo 113.º do CCP.

DANIEL LOURENÇO
202
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Preparação das peças do procedimento (convite e caderno de encargos – alínea


a) do n.º 1 do artigo 40.º do CCP)
As peças do procedimento são um conjunto heterogéneo de documentos escritos
e desenhados em que se fixam as formalidades, os requisitos e os parâmetros que a
entidade adjudicante quer ver adotados num dado procedimento de formação de um
contrato público e em que se estabelecem as bases gerais e especiais, técnicas, jurídicas
e económico-financeiras, do contrato a celebrar.

As entidades convidadas têm diferentes designações, consoante a etapa do ciclo


da contratação:
⎯ Entidade interessada: manifesta interesse no processo;
⎯ Candidato: pretende ser qualificado em qualquer processo ou em
concurso limitado por prévia qualificação;
⎯ Concorrente: participa em qualquer procedimento concorrencial;
⎯ Convidado: recebeu convite por parte do adjudicante.

Convite (artigo 114.º e 115.º do CCP)


Conteúdo do convite:
⎯ Identificar a entidade competente que autorizou a despesa e a respetiva data de
autorização (alínea b) do n.º 1 do artigo 115.º do CCP);
⎯ Identificar a entidade adjudicante e os seus contactos, designadamente a morada,
o endereço eletrónico e contacto telefónico (alínea a) do n.º 1 do artigo 115.º do
CCP);
⎯ Indicar o modo de apresentação das propostas (alínea f) do n.º 1 do artigo 115.º do
CCP);
⎯ Referir que a proposta deverá obrigatoriamente conter a declaração prevista na
alínea a) do n.º 1 do artigo 57.º CCP (Anexo I do mesmo código) e a indicação
do preço (artigo 60.º CCP);
⎯ Referir que os documentos que constituem a proposta têm de ser redigidos em
língua portuguesa (artigo 58.º CCP e alínea e) do n.º 1 do artigo 115.º do CCP);

DANIEL LOURENÇO
203
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

⎯ Indicar a data limite para apresentação das propostas na plataforma eletrónica


(artigo 63.º CCP e alínea f) do n.º 1 do artigo 115.º do CCP). Determina-se o
prazo para apresentação de proposta, sendo que o prazo mínimo recomendável é
de 5 (cinco) dias corridos e no caso de o procedimento possuir alguma
complexidade, nomeadamente haver necessidades de visitas a locais, o prazo
deverá ser mais longo.
⎯ Indicar o fundamento da escolha do ajuste direto, quando esta tenha sido tomada
em função de critérios materiais (alínea c) do n.º 1 do artigo 115.º e artigos 24.º,
26.º e 27.º, todos do CCP);
⎯ Indicar os documentos de habilitação que serão exigidos ao adjudicatário, o prazo
para apresentação pelo mesmo dos documentos de habilitação (até 5 dias úteis a
contar da notificação da adjudicação) e o prazo concedido para suprimir
irregularidades detetadas nos documentos apresentados (alínea j) do n.º 1 do
artigo 115.º do CCP). Na hipótese dos documentos de habilitação se encontrarem
disponíveis na internet, o adjudicatário pode indicar o endereço do sítio onde
podem ser consultados.
Devem ser redigidos em língua portuguesa ou, quando pela sua própria natureza
ou origem, estiverem redigidos em língua estrangeira, deve o adjudicatário fazê-
los acompanhar de tradução devidamente legalizada
⎯ O adjudicatário deve obrigatoriamente apresentar documento comprovativo de
que não se encontra na situação prevista nas alíneas b), d), e) e h) do n.º 1 do
artigo 55.º do CCP:
a) Declaração comprovativa da situação regularizada relativamente às
contribuições da Segurança Social (artigo 55.º alínea d);
b) Declaração comprovativa da situação regularizada relativamente aos
impostos devidos em Portugal, ou, se for o caso no Estado de que sejam
nacionais ou no qual se situe o seu estabelecimento principal (artigo 55.º
alínea e);
c) Registo criminal de todos os órgãos de gerência/administração/direção da
empresa adjudicatária e comprovar que não foram condenados por
sentença transitada em julgado por os crimes referidos nas subalíneas i),

DANIEL LOURENÇO
204
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

ii), iii), iv), v), vi) da alínea h) do artigo 55.º do CCP e alínea b) do n.º 1,
ou se, entretanto, tiver ocorrido sua reabilitação (artigo 55.º alínea h);
⎯ Indicar se é exigida ou não caução e caso seja exigida, qual o modo de prestação
da mesma (garantia bancária, seguro-caução ou outros previstos no CCP). A
caução apenas é exigida nos termos do n.º 2 do artigo 88.º do CCP, ou seja,
quando o valor contratual seja superior a 200.000,00€ (alínea i) do n. º1 do artigo
115.º do CCP);
Referir que a proposta deve ser apresentada através da plataforma eletrónica ou
através de meio de transmissão escrita e eletrónica de dados (Decreto-lei n.º 143-
A/2008, de 25 de julho e artigo 62.º n.º 1 CCP, e alínea g) do n. º1 do artigo 115.º
do CCP);
⎯ Indicar os documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos
aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos,
contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se
dispõe a contratar, referidos na alínea b) do n.º 1 do artigo 57.º;
⎯ Indicar os documentos que contenham os termos ou condições relativos a aspetos
da execução do contrato aos quais a entidade adjudicante pretende que o
concorrente se vincule, referidos na alínea c) do n.º 1 do artigo 57.º (alínea d) do
n.º 1 do artigo 115.º do CCP);
⎯ Indicar o critério de adjudicação (artigo 74.º CCP e alínea b) do n.º 2 do artigo
115.º do CCP). A adjudicação é feita de acordo com o critério da proposta
economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante, determinada por
uma das seguintes modalidades:
a. Melhor relação qualidade-preço, na qual o critério de adjudicação é
composto por um conjunto de fatores, e eventuais subfatores,
relacionados com diversos aspetos da execução do contrato a celebrar;
b. Avaliação do preço ou custo enquanto único aspeto da execução do
contrato a celebrar.
⎯ O critério da proposta economicamente mais vantajosa para a entidade
adjudicante na modalidade melhor relação qualidade–preço, deverão ser definidas

DANIEL LOURENÇO
205
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

as ponderações dos critérios e, caso existam, devem ser definidas as ponderações


dos subcritérios – artigos 75.º e 139.º do CCP).
⎯ Fixar os critérios de desempate.
⎯ Indicar se as propostas serão objeto de negociação, e em caso afirmativo, indicar
quais os aspetos da execução do contrato a celebrar que a entidade adjudicante
não está disposta a negociar e se a negociação decorrerá, parcial ou totalmente,
por via eletrónica e os respetivos termos (alínea a) do n.º 2 do artigo 115.º do
CCP).
⎯ Indicar qual o órgão que presta os esclarecimentos do convite e do caderno de
encargos.
⎯ Indicar o objeto do contrato: indicar os bens/serviços a adquirir e listar, caso se
aplique, os vários lotes.
⎯ Indicar o preço base (no caso de se incluírem vários lotes no mesmo
procedimento, o preço base é o somatório dos preços base de todos os lotes)
[artigos 22.º e 47.º do CCP].
⎯ Indicar a data limite e o modo como as entidades convidadas podem apresentar o
pedido de esclarecimentos (artigos 50.º e 64.º CCP).
⎯ Indicar o prazo de manutenção das propostas – 66 dias ou superior.
⎯ Referir que, na hipótese de existirem vários lotes no procedimento, a adjudicação
é efetuada por lote.
⎯ Indicar se o contrato será objeto de redução a escrito (artigos 94.º a 96.º CCP) –
não é exigível a redução do contrato a escrito:
a. Quando se trate de contrato de locação ou de aquisição de bens móveis
ou de aquisição de serviços cujo preço contratual não exceda
10.000,00€;
b. Quando se trate de locar ou de adquirir bens móveis ou de adquirir
serviços ao abrigo de um contrato público de aprovisionamento;
c. Quando se trate de locar ou de adquirir bens móveis ou de adquirir
serviços nos seguintes termos:
i. O fornecimento dos bens ou a prestação dos serviços deva
ocorrer integralmente no prazo máximo de 20 dias a contar da

DANIEL LOURENÇO
206
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

data em que o adjudicatário comprove a prestação da caução


ou, se esta não for exigida, da data da notificação da
adjudicação;
ii. A relação contratual se extinga com o fornecimento dos bens
ou com a prestação dos serviços, sem prejuízo da manutenção
de obrigações acessórias que tenham sido estabelecidas
inequivocamente em favor da entidade adjudicante, tais como
as de sigilo ou de garantia dos bens ou serviços adquiridos; e
iii. O contrato não esteja sujeito a fiscalização prévia do Tribunal
de Contas; ou
d. Quando se trate de contrato de empreitada de obras públicas de
complexidade técnica muito reduzida e cujo preço contratual não
exceda 15.000,00€.
⎯ A redução do contrato a escrito pode ser dispensada pelo órgão
competente para a decisão de contratar, mediante decisão fundamentada,
quando:
a) A segurança pública interna ou externa o justifique;
b) Seja adotado um concurso público urgente; ou
c) Por motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos
imprevisíveis pela entidade.

O convite é enviado em simultâneo sempre que for convidada mais do que uma
entidade (artigo 112.º do CCP).

Caderno de Encargos (artigo 42.º CCP)


O caderno de encargos é o documento que contém as cláusulas jurídicas e
técnicas que interessam à regulação do conteúdo do contrato a celebrar.
Conteúdo do caderno de encargos:
⎯ Cláusulas jurídicas:
a. Objeto do contrato
b. Necessidade de contrato escrito (se aplicável);

DANIEL LOURENÇO
207
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

c. Documentos que fazem parte integrante do contrato e sua prevalência


em caso de divergência (n.º 2 e 6 do artigo 96.º CCP);
d. Local da entrega do bem e/ou prestação de serviços; Prazo de
execução do contrato;
e. Renovação do contrato (se aplicável); Preço Base;
f. Atualização de preços (se aplicável); Condições de pagamento do
preço;
g. Condições de entrega do bem ou prestação do serviço por parte do
adjudicatário;
h. Sanções previstas para a inexecução do contrato por parte do
adjudicatário (n.º 2 e 3 de artigo 329.º CCP); Caução (se aplicável).

⎯ Cláusulas técnicas:
a) Características técnicas dos produtos / serviços a adquirir;
b) Nível e garantia de qualidade
c) Nível de desempenho funcional
d) Assistência técnica
e) Serviço pós-venda
f) Segurança Dimensões
g) Meios de acessibilidade de deficientes
h) Métodos e ensaios de produção
i) Requisitos ambientais
j) Entre outros

As especificações técnicas definem as características exigidas ao material,


produto ou fornecimento que permitem caraterizá-los de modo a que correspondam à
utilização a que a entidade adjudicante os destina.
Elaboração de documento do qual conste a autorização da despesa, autorização
de abertura do procedimento (decisão de contratar), escolha da modalidade
procedimental, aprovação das peças do procedimento e designação do júri.

DANIEL LOURENÇO
208
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

A decisão de contratar (ou deliberação de contratar, quando for adotada por


órgão colegial), sendo o ato inicial do procedimento, como ato jurídico, é o ato
unilateral pelo qual, constatada a necessidade ou conveniência de obter no mercado
certos bens ou serviços, e uma vez que não dispõe de meios humanos ou materiais para
realizar ela própria essas tarefas (ou não quer empenhá-los aí), o órgão com
competência para comprometer a entidade adjudicante decide abrir um procedimento
para determinar com quem e em que condições concretas será celebrado o
correspondente contrato.
A autorização da despesa do contrato é uma formalidade preambular dos
procedimentos de formação de contratos públicos. Por razões de organização e
contenção financeira pública, a lei condiciona a realização de despesas à autorização de
um órgão superior, a quem é pedido que ajuíze da necessidade de realizar uma despesa,
ou seja, que decida se os benefícios que daí advirão justificarão o dispêndio de um
determinado montante de dinheiros públicos.
O júri é o órgão com todos os poderes necessários para ser encarregado da
gestão e condução do procedimento. Não atua sob direção hierárquica do órgão
adjudicante. Inicia funções no dia seguinte ao do envio para publicitação do anúncio de
abertura do procedimento ou do convite para o ajuste direto e consulta prévia.
O documento deve conter os seguintes elementos:
a) Identificação das necessidades, bem como a justificação da aquisição
dos bens ou serviços;
b) Identificação dos bens que são objeto do presente procedimento e seu
fundamento legal;
c) Designação do júri para a condução do procedimento, sendo este
constituído por 5 elementos: o Presidente, 1.º e 2.º Vogais efetivos e
1.º e 2.º Vogais Suplentes (artigo 67.º CCP);
d) Delegação de competências no júri, com exceção da decisão de
adjudicação (artigo 69.º CCP);
e) Indicar o preço base (artigo 47.º CCP);

DANIEL LOURENÇO
209
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

f) Indicar que a despesa estimada (preço base) tem cabimento


orçamental na entidade adjudicante e a sua respetiva classificação
económica de despesa;
g) Referir qual é o órgão com competência para a decisão de contratar e
o fundamento legal;
h) Por fim, apresentar uma proposta ao órgão com competência para a
decisão de contratar.

3. ABERTURA DO PROCEDIMENTO NA PLATAFORMA


ELETRÓNICA
Passos a percorrer:
⎯ Criar Procedimento
⎯ Autorizar Procedimento
⎯ Constituição do júri
⎯ Inserir documentos
⎯ Assinatura de documentos
⎯ Selecionar as entidades a convidar

4. COLOCAR O PROCEDIMENTO NO MERCADO – ENVIO DOS


CONVITES
É a abertura do procedimento à concorrência, através do anúncio e do convite,
que marca externamente o início do procedimento. Dá-se conhecimento ao mercado e
aos potenciais interessados da abertura do procedimento.
O convite é formalizado através da plataforma eletrónica, acompanhado do
caderno de encargos, sendo o seu envio efetuado em simultâneo a todos os concorrentes
convidados (n.º 4 do artigo 115.º do CPC).
O dia da receção do convite não é considerado para efeitos de contagem dos
prazos (n.º 1 do artigo 470.º CCP).
O Júri inicia as suas funções no dia útil subsequente ao envio do convite (n.º 1
do artigo 68.º CCP).

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

5. ESCLARECIMENTOS (artigo 50.º e 116.º)


Durante o primeiro terço do prazo para a apresentação das propostas, as
entidades convidadas podem, na plataforma eletrónica, pedir ao júri esclarecimentos
sobre as peças do procedimento (artigo 50.º CCP).
Se as entidades convidadas solicitarem esclarecimentos, o júri tem de elaborar a
resposta ao pedido de esclarecimentos até ao termo do segundo terço do prazo para a
apresentação das propostas e disponibilizá-la na plataforma eletrónica a todas as
entidades convidadas, exceto quando o prazo fixado para a apresentação da proposta
seja inferior a nove dias corridos, hipótese em que os esclarecimentos podem ser
prestados até ao dia anterior ao termo daquele prazo (artigo 116.º do CCP).

6. ERROS E OMISSÕES (artigo 50.º)


As entidades convidadas devem, durante o primeiro terço do prazo para a
apresentação das propostas, apresentar uma lista identificativa de erros e omissões do
caderno de encargos, caso sejam detetados, designadamente, no que respeita aos dados
referidos nas alíneas do n.º 2 do artigo 50.º CCP.
Pode haver lugar à retificação de erros ou omissões pelo órgão competente para
a decisão de contratar até ao termo do segundo terço do prazo fixado para a
apresentação das propostas, exceto quando o prazo fixado para a apresentação da
proposta for inferior a 9 dias corridos, hipótese em que as retificações podem ser
efetuadas até ao dia anterior ao termo do prazo.
Esta retificação deve ser disponibilizada na plataforma eletrónica e anexada às
peças do procedimento, sendo notificadas todas as entidades convidadas daquela
disponibilização.
Nos casos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 64.º CCP há lugar à prorrogação do
prazo fixado para a apresentação das propostas.
Todas as deliberações tomadas pelo júri devem ser redigidas em ata.

7. APRESENTAÇÃO E ABERTURA DE PROPOSTAS (artigo 56.º)


Propostas são os processos documentais em que os interessados manifestam à
entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõem a fazê-lo,

DANIEL LOURENÇO
211
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

avançando as prestações que se propõem realizar para o efeito, as circunstâncias em que


o farão e aquilo que pretendem obter da entidade adjudicante em contrapartida.
A fase de apresentação das propostas é naturalmente a fase de eleição da
intervenção dos interessados no procedimento, em que se joga o seu destino, a admissão
da sua proposta e se vai ser considerada a mais vantajosa ou se a espera a exclusão e ser
preterida em favor de outra.
Trata-se da primeira fase da relação jurídica procedimental em que as suas
partes, os interessados, de um lado, e a entidade adjudicante e os seus órgãos, do outro,
entram em contato.
A proposta deve conter os seguintes documentos:
a) Declaração do anexo I ao presente Código, do qual faz parte integrante;
b) Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos
da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos,
contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o
concorrente se dispõe a contratar;
c) Documentos exigidos pelo programa do procedimento ou convite que
contenham os termos ou condições relativos a aspetos da execução do
contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos
quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule;
No caso de se tratar de procedimento de formação de contrato de empreitada ou
de concessão de obras públicas, a proposta deve ainda ser constituída por:
a. Uma lista dos preços unitários de todas as espécies de trabalho previstas
no projeto de execução;
b. Um plano de trabalhos, quando o caderno de encargos seja integrado por
um projeto de execução;
c. Um programa preliminar, nos casos previstos no n.º 3 do artigo 43.º,
competindo a elaboração do projeto de execução ao adjudicatário.

As entidades convidadas submetem as propostas na plataforma eletrónica de


contratação pública, preenchendo os requisitos estabelecidos nos artigos 26.º e 27.º da
Portaria n.º 701-G/2008, de 29 de julho.

DANIEL LOURENÇO
212
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

No dia e hora previamente definidos, o júri reúne-se e cada um dos seus


elementos efetivos deve aceder à plataforma eletrónica e ao procedimento em causa,
colocando a palavra-chave gerada pelo sistema.
O júri procede à abertura das propostas.
Na hipótese de ser apresentada apenas uma proposta segue-se o procedimento
referido no artigo 125.º do CCP.

8. DISPONIBILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS DAS PROPOSTAS (NA


HIPÓTESE DE SEREM APRESENTADAS VÁRIAS PROPOSTAS)
Após a abertura das propostas, o júri terá acesso a toda a informação apresentada
pelos concorrentes.
O júri procede à disponibilização de todos os documentos das propostas a todas
as entidades convidadas.

9. FASE DE NEGOCIAÇÃO [OPCIONAL] (artigos 118.º a 121.º)


Para ser possível proceder a negociações, é necessário que no convite se tenha
indicado se os atributos das propostas estão sujeitos a negociação e os termos da
negociação, e tenham sido apresentadas mais do que uma proposta.
A fase de negociação é conduzida pelo júri, ou pelos serviços da entidade
adjudicante, e deve incidir sobre os atributos da proposta.
Em momento prévio à notificação para a sessão de negociação, deve o júri
verificar se alguma(s) da(s) proposta(s) está em condições de ser excluída, nos termos
das alíneas a) a o) do n.º 2 e do n.º 3 do artigo 146.º do CCP, uma vez que os
concorrentes cujas propostas devam ser excluídas, não são convocados para a
negociação, aplicando-se-lhes, com as devidas adaptações, o disposto no artigo 123.º
relativo à audiência prévia (n.º 2 do artigo 118.º do CCP).
Procedimento de negociação:
⎯ Com a antecedência mínima de 3 dias, os concorrentes são notificados
pelo júri da data, hora e local da primeira sessão de negociação;
⎯ As restantes sessões de negociação, a existirem, serão agendadas de
acordo com a conveniência do júri e do respetivo procedimento;

DANIEL LOURENÇO
213
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

⎯ A negociação com os vários concorrentes pode decorrer conjunta ou


separadamente, de acordo com a indicação do júri, podendo este decidir
alterar o formato a qualquer momento;
⎯ Por cada sessão de negociação é lavrada ata, a qual é assinada pelo júri e
pelos representantes das entidades convidadas (caso algum dos presentes
na sessão de negociação se recusar a assinar, tal fato deve ser
mencionado);
⎯ As sessões de negociação devem assegurar a igualdade de circunstâncias
entre todos os concorrentes presentes;
⎯ As atas e outras informações/comunicações mantêm-se sigilosas durante
toda a negociação e até à audiência prévia;
⎯ Terminada a negociação, o júri notifica de imediato os concorrentes para
apresentarem as versões das propostas finais integrais no prazo por
aquele fixado para o efeito (devendo ter-se em conta que as propostas
não podem conter atributos diferentes dos contidos nas versões das
propostas iniciais);
⎯ Depois de apresentadas as versões finais integrais das propostas, não
podem as mesmas ser objeto de quaisquer alterações.

10. ANÁLISE DAS PROPOSTAS E RELATÓRIO PRELIMINAR (artigo


122.º)
As propostas são analisadas em todos os seus atributos representados pelos
fatores e subfatores que densificam o critério da adjudicação.
É nesta fase que o júri lê e averigua o que nas propostas se contém com relevo
para a sua admissão e ponderação, que afere da sua legalidade formal e material, e é
também aí que, por referência aos fatores de adjudicação, se avalia o seu mérito,
ordenando-as para efeitos da decisão final.

Esclarecimentos sobre as propostas


O júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos
sobre as propostas que considere necessários para efeitos de análise e de avaliação das

DANIEL LOURENÇO
214
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

mesmas. Os esclarecimentos fazem parte integrante das propostas e devem ser


disponibilizados na plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, devendo
todos os concorrentes ser imediatamente notificados desse fato.

Relatório preliminar
Após a análise das versões iniciais e finais (as versões finais só existem no caso
ter havido lugar à fase das negociações) das propostas e a aplicação do critério de
adjudicação, o júri elabora fundamentadamente um relatório preliminar, no qual deve
propor:
⎯ a ordenação das mesmas propostas (n.º 1 do artigo 122.º do CCP);
⎯ caso se verifique, fundamentadamente, a exclusão das propostas por
qualquer dos motivos constantes dos n.ºs 2 e 3 do artigo 146.º CCP, bem
como a exclusão das propostas finais (no caso de ter havido a fase de
negociações) que contenham atributos diferentes dos constantes das
versões iniciais no que respeita aos aspetos de execução do contrato a
celebrar que a entidade adjudicante tenha indicado não estar disposta a
negociar (n.º 2 do artigo 122.º do CCP).
Assim, do relatório preliminar constam as conclusões a que se chegou quanto ao
conteúdo e valia de cada uma delas, bem como o enunciado claro das razões concretas
porque avantajou umas e desfavoreceu outras em cada uns dos fatores elementares do
critério de adjudicação, ligando, logicamente, essa (des)vantagem à pontuação ou
classificação atribuída.
No mesmo relatório deve, ainda, constar a referência aos esclarecimentos
prestados pelos concorrentes nos termos do disposto no artigo 72.º do CCP (n.º 3 do
artigo 122.º do CCP).

11. AUDIÊNCIA PRÉVIA (artigo 123.º)


Elaborado o relatório preliminar:
O júri procede à audiência prévia nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 123.º
CCP, ou seja, o júri envia o relatório preliminar a todas as entidades convidadas,

DANIEL LOURENÇO
215
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

fixando-lhes um prazo não inferior a 5 (cinco) dias úteis (artigo 470.º do CCP), para se
pronunciarem, por escrito, ao abrigo do direito à audiência prévia.
Durante a fase de audiência prévia os concorrentes têm acesso:
⎯ às atas das sessões de negociação com os demais concorrentes;
⎯ às informações e comunicações escritas de qualquer natureza que estes
tenham prestado;
⎯ às versões integrais das propostas apresentadas (n.º 2 do artigo 123.º do
CPC).
Caso qualquer uma das entidades convidadas apresente pronúncia, o júri aprecia
a mesma.

12. RELATÓRIO FINAL (artigo 124.º)


Cumprida a fase da audiência prévia, o júri elabora um relatório final,
devidamente fundamentado, no qual pondera as observações dos concorrentes,
efetuadas ao abrigo do direito de audiência prévia (n.º 1 do artigo 124.º CCP) e através
do qual delibera:
⎯ Manter na íntegra o teor e as conclusões do relatório preliminar;
⎯ Modificar o teor e as conclusões do relatório preliminar, podendo ainda
propor a exclusão de propostas se verificar nesta fase a ocorrência de
qualquer motivo de exclusão previsto no n.º 2 do artigo 146.º do CCP.
Neste caso, bem como quando do relatório final resulte uma alteração da
ordenação das propostas constante do relatório preliminar, o júri procede a nova
audiência prévia, restrita aos concorrentes interessados (n.º 2 do artigo 124.º do CCP).
Após audiência prévia, o júri procede à elaboração de novo relatório final.
No relatório final deve o júri propor a adjudicação à entidade convidada
ordenada em primeiro lugar.

DANIEL LOURENÇO
216
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

13. ADJUDICAÇÃO, APRESENTAÇÃO DOS DOCUMENTOS DE


HABILITAÇÃO E PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO (artigos 73.º a 93.º e
125.º a 127.º)
O relatório final fundamentado e os demais documentos que compõem o
processo são enviados ao órgão competente para a decisão de contratar para que o
mesmo tome a decisão relativamente à adjudicação da(s) proposta(s) (n.º 3 do artigo
124.º). Deve averiguar a legalidade e mérito do que se propõe no relatório final em
matéria de admissão ou exclusão e de avaliação e ordenação das propostas. É, assim,
um ato administrativo em que profere uma decisão final do procedimento, adjudicando
o contrato ao titular da melhor proposta.
Quando tenha sido apresentada uma única proposta, compete aos serviços da
entidade adjudicante pedir esclarecimentos sobre a mesma e submeter o projeto da
decisão de adjudicação ao órgão competente para a decisão de contratar. Neste caso,
não há lugar às fases de negociação e de audiência prévia, nem à elaboração dos
relatórios preliminar e final, podendo, porém, o concorrente ser convidado a melhorar a
sua proposta.
A habilitação configura o ato de uma autoridade ou entidade competente, como
o órgão adjudicante, pelo qual se atesta ou confirma que o adjudicatário tem a
permissão legal para o exercício da atividade que é objeto do contrato e que não padece
de qualquer impedimento à contratação, de acordo com o artigo 55.º do CCP. Estamos,
assim, perante a faceta da aptidão profissional e da idoneidade ou honorabilidade do
concorrente.
A decisão de adjudicação deve ser notificada ao adjudicatário e restantes
concorrentes dentro do prazo da obrigação de manutenção das propostas, sendo essa
notificação acompanhada do relatório final de avaliação e ordenação das propostas e da
solicitação ao adjudicatário para:
⎯ Apresentar os documentos de habilitação no prazo fixado;
⎯ Prestar caução no prazo da lei;
⎯ Confirmar os compromissos de terceiros.
Após apresentação dos documentos de habilitação, de acordo com o solicitado
em convite e, no caso de haver mais de uma proposta, o órgão para a decisão de

DANIEL LOURENÇO
217
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

contratar notifica todos os concorrentes da apresentação dos documentos de habilitação


pelo adjudicatário, indicando o dia em que ocorreu essa apresentação.
Os documentos de habilitação apresentados pelo adjudicatário devem ser
disponibilizados para consulta de todos os concorrentes, em plataforma eletrónica
utilizada pela entidade adjudicante.
A adjudicação é um ato administrativo constitutivo do direito do adjudicatário à
celebração do contrato, mas a sua eficácia está dependente do preenchimento de várias
formalidades subsequentes. Assim, pressupõe o cumprimento pelo adjudicatário de um
certo número de requisitos, cuja falta ou irregularidade a lei faz corresponder a
caducidade da adjudicação, dando lugar a uma nova adjudicação a favor da proposta
ordenada em segundo lugar.
Causas da caducidade da adjudicação:
⎯ A falta de apresentação, por fato imputável ao adjudicatário, dos
documentos de habilitação nos prazos fixados no programa do
procedimento ou convite, ou pelo órgão adjudicante, para suprimento de
irregularidades neles detetadas (alínea a), n.º 1 do artigo 86.º e alíneas g)
do número 1 dos artigos 132.º e do 164.º);
⎯ A falta de apresentação de documentos comprovativos da titularidade das
habilitações exigidas, referidos no número 8 do artigo 81.º, no prazo
fixado para o feito na respetiva notificação ou no prazo fixado para o seu
suprimento (alínea b) do n.º 1 do artigo 86.º e no número 2 do artigo
86.º);
⎯ A apresentação por fato imputável ao adjudicatário, dos documentos de
habilitação não traduzidos ou, no caso do número 2 do artigo 82.º, que
não venham acompanhados de tradução devidamente legalizada (alínea
c) do número 1 do artigo 86.º);
⎯ A falsificação de documentos de habilitação ou a prestação culposa de
falsas declarações sobre os respetivos requisitos (artigo 87.º);
⎯ A falta da prestação de caução, por fato imputável ao adjudicatário, no
prazo e nos termos estabelecidos na lei (número 1 do artigo 91.º);

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⎯ A falta de confirmação, no prazo inicial ou prorrogado fixado para o


efeito, de compromissos assumidos por terceiros em relação a aspetos da
proposta do adjudicatário (artigo 93.º);
⎯ A falta de comparência do adjudicatário, por fato que lhe seja imputável,
no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato (alínea a) do
número 1 do artigo 105.º);
⎯ A falta de associação formal dos membros do agrupamento adjudicatário,
por fato que lhes seja imputável (alínea c) do número 1, artigo 105.º);
⎯ A extinção por qualquer razão da declaração bancária com base na qual
se considerou a candidatura do adjudicatário como financeiramente
capaz (número 1 do artigo 180.º).

A caducidade da adjudicação deve ser objeto de uma declaração expressa da


entidade adjudicante, devidamente fundamentada e precedida, nos casos do número 2
do artigo 86.º do CCP, de audiência prévia. Essa declaração tem como efeito a cessação
de todos os direitos e deveres que se houvessem constituído para a entidade adjudicante
e adjudicatário por força da adjudicação, designadamente do direito do adjudicatário à
celebração do contrato.
Há no CCP uma figura específica que constitui a entidade adjudicante no dever
de não proceder à adjudicação, proferindo uma decisão de não adjudicação. Existem
circunstâncias que obstam à atribuição do direito à celebração do contrato a qualquer
um dos concorrentes, decretando a extinção do procedimento. Referimo-nos a título
principal ao disposto no artigo 79.º do CCP:
⎯ Nenhum candidato se haja apresentado ou nenhum concorrente haja
apresentado proposta;
⎯ Todas as candidaturas ou todas as propostas tenham sido excluídas;
⎯ Por circunstâncias imprevistas, seja necessário alterar aspetos
fundamentais das peças do procedimento;
⎯ Circunstâncias supervenientes relativas aos pressupostos da decisão de
contratar o justifiquem;

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

⎯ Nos casos a que se refere o n.º 5 do artigo 47.º, a entidade adjudicante


considere, fundamentadamente, que todos os preços apresentados são
inaceitáveis;
⎯ No procedimento de diálogo concorrencial, nenhuma das soluções
apresentadas satisfaça as necessidades e as exigências da entidade
adjudicante;
⎯ No procedimento para a celebração de acordo–quadro com várias
entidades o número de candidaturas ou propostas apresentadas ou
admitidas seja inferior ao número mínimo previsto no programa de
concurso.
A decisão de não adjudicação determina a revogação da decisão de contratar e,
deve ser notificada a todos os concorrentes, bem como os respetivos fundamentos. A
revogação leva a que, para renovar o procedimento extinto ou reabrir um novo, seja
necessário proferir uma nova decisão.

Caução
O adjudicatário deve prestar a caução no prazo de 10 dias a contar da notificação
da decisão de adjudicação, consoante condições previstas no convite para esta matéria.
O valor de caução é, no máximo, de 5% do preço contratual. Quando o preço total da
proposta adjudicada seja considerado anormalmente baixo, o valor da caução prestar
pelo adjudicatário é de 10% do preço contratual.

13. OUTORGA DO CONTRATO


O contrato não é apenas um complexo de disposições relativas às prestações a
executar pelas partes, dele devendo constar igualmente várias menções relativas a outros
elementos essenciais seus, que não a disciplina da relação contratual.
Referimo-nos ao estipulado no artigo 96.º:
⎯ Identificação das partes e dos seus representantes no contrato;
⎯ Indicação da caução (modo e montante) prestada;
⎯ Indicação do ato de adjudicação e do ato de aprovação da minuta do
contrato;

DANIEL LOURENÇO
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⎯ Descrição do objeto do contrato;


⎯ Preço contratual ou o preço a receber pela entidade adjudicante ou, na
impossibilidade do seu cálculo, os elementos necessários à sua
determinação;
⎯ Prazo de execução das principais prestações objeto do contrato;
⎯ Ajustamentos aceites pelo adjudicatário;
⎯ Se for o caso, a classificação orçamental da dotação por onde será
satisfeita a despesa inerente ao contrato, a realizar no ano económico da
celebração do mesmo ou, no caso de tal despesa se realizar em mais de
um ano económico, a indicação da disposição legal habilitante ou do
plano plurianual legalmente aprovado de que o contrato em causa
constitui execução ou ainda do instrumento, legalmente previsto, que
autoriza aquela repartição de despesa;
⎯ Identificação do gestor do contrato em nome da entidade adjudicante;
⎯ Eventuais condições de modificação do contrato expressamente previstas
no caderno de encargos, incluindo cláusulas de revisão ou opção, claras,
precisas e inequívocas.
Fazem sempre parte integrante do contrato, independentemente da sua redução a
escrito:
a. Os suprimentos dos erros e das omissões do caderno de encargos
identificados pelos concorrentes, desde que esses erros e omissões
tenham sido expressamente aceites pelo órgão competente para a
decisão de contratar;
b. Os esclarecimentos e as retificações relativos ao caderno de encargos;
c. O caderno de encargos;
d. A proposta adjudicada;
e. Os esclarecimentos sobre a proposta adjudicada prestados pelo
adjudicatário.
Sendo exigida a redução a escrito do contrato, será através da elaboração de um
clausulado em suporte papel ou em suporte informático com a aposição de assinaturas
eletrónicas. A outorga deve ter lugar no prazo de trinta dias contados da data da

DANIEL LOURENÇO
221
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aceitação da minuta ou da decisão emitida sobre a reclamação (salvo no caso referido na


alínea c) do n.º 2 do artigo 104.º CCP), mas nunca antes de (n.º 1 do artigo 104.º do
CCP):
⎯ decorridos dez dias contados da notificação da decisão de adjudicação a
todos os concorrentes;
⎯ apresentados todos os documentos de habilitação exigidos;
⎯ comprovada a prestação de caução, quando este for devida;
⎯ confirmados os compromissos (se aplicável).
O órgão competente para a decisão de contratar comunica ao adjudicatário, com
uma antecedência mínima de cinco dias, a data, a hora e o local em que ocorrerá a
outorga do contrato (n.º 3 artigo 104.º CCP).
Caso o adjudicatário não comparência na data, hora e local fixados para a
outorga do contrato, por fato que lhe seja imputável, a adjudicação caduca (n.º 1 do
artigo 105.º CCP).
Não sendo exigida a redução a escrito do contrato, não se poderá dar início a
qualquer aspeto da execução do contrato antes de decorridos dez dias a contar da data
da notificação da decisão de adjudicação e, em qualquer caso, nunca antes da
apresentação de todos os documentos de habilitação exigidos, da comprovação da
prestação da caução, quando esta for devida, e da confirmação dos compromissos
referidos na alínea c) do n.º 2 do artigo 77.º do CCP.
A formação dos contratos públicos que não sejam reduzidos a escrito e que não
são, por isso, objeto de um documento autónomo onde fique lavrada a sua celebração e
conteúdo, são consubstanciadas pela fusão das peças do procedimento, da proposta do
adjudicatário e dos documentos complementares (esclarecimentos, retificações e
suprimentos), onde constam os direitos e obrigações recíprocos das partes, os quais
serão apropriados pela adjudicação, a qual incorpora o vínculo contratual. Corresponde
praticamente ao conteúdo dos contratos escritos.

DANIEL LOURENÇO
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14. RELATÓRIO DE FORMAÇÃO DO CONTRATO – EFICÁCIA DO


CONTRATO (PAGAMENTOS)
A celebração de quaisquer contratos deve ser publicitada pela entidade
adjudicante no portal da Internet dedicada aos contratos públicos, independentemente da
sua redução ou não a escrito.
A entidade adjudicante procede ao preenchimento do relatório de formação do
contrato, nos termos da alínea h) do artigo 3.º da Portaria n.º 701-E/2008, de 29 de
julho.
A ficha relativa ao contrato, prevista no n.º 1 do artigo 127.º do CCP, da qual
depende a eficácia do contrato, nomeadamente qualquer pagamento, é construída
automaticamente no Portal a partir dos dados incluídos no relatório de formação de
contrato acima referido (artigo 6.º da Portaria n.º 701-E/2008, de 29 de julho).
A entidade adjudicante acede ao Portal referido através www.base.gov.pt, cujo
login e password são atribuídas por inscrição na Imprensa Nacional Casa da Moeda.

6.2. Ajuste Direto Simplificado (artigo 128.º e 129.º CCP)


O ajuste direto simplificado é um procedimento para a aquisição de
bens/serviços cujo preço contratual não seja superior a 5.000,00€. O preço contratual no
ajuste direto simplificado não pode ser objeto de revisões (alínea b) do artigo 129.º
CCP).
A entidade adjudicante convida através de e-mail uma ou mais entidades para
apresentação de orçamento para os bens/serviços identificados.
Após a receção dos orçamentos, analisa os preços e as condições de
fornecimento e propõe a adjudicação da melhor proposta, sendo emitido o cabimento da
despesa no valor da adjudicação.
Os serviços administrativos elaboram uma informação de autorização de despesa
para o órgão com competência para a decisão de contratar.
O órgão com competência para a decisão de contratar autoriza a despesa, sendo
em seguida emitida e enviada ao fornecedor uma nota de encomenda com a notificação

DANIEL LOURENÇO
223
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

da adjudicação do bem ou serviço. A adjudicação é direta sobre a fatura ou documento


equivalente.
O prazo de vigência neste tipo de procedimento não pode ter duração superior a
1 (um) ano a contar da decisão de adjudicação, nem pode ser prorrogado (artigo 129.º
alínea a) CCP).

6.3. Concurso Público


Pode-se adotar o procedimento de concurso público sempre que a entidade
adjudicante assim o entender. No entanto, quando o valor do contrato a celebrar for
superior aos limiares europeus de contratação pública, conforme consta no quadro de
Escolha dos tipos de procedimento em função do valor, o anúncio deve ser
obrigatoriamente publicado no Diário da República e no Jornal Oficial da União
Europeia.
Concurso público em geral, com e sem publicidade internacional
1. Anúncio
2. Consulta e fornecimento das peças do concurso
3. Esclarecimentos
4. Apresentação de propostas
5. Avaliação das propostas
6. Leilão eletrónico
7. Preparação da adjudicação
8. Adjudicação, habilitação, caução, contrato e publicitação

1. ANÚNCIO (artigo 130.º e 131.º)


Os anúncios servem propósitos de publicitação e destinam-se a dar
conhecimento público da abertura de um determinado procedimento, divulgando alguns
dos mais importantes dos seus aspetos e do contrato a celebrar, convidando os
operadores económicos a aceder às peças que conformam o procedimento e o contrato
para poder manifestar a sua vontade de apresentar, ou não, uma candidatura ou
proposta.

DANIEL LOURENÇO
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Anúncio obrigatório para Concursos Públicos sem publicidade internacional


É publicitado no Diário da República através de anúncio conforme modelo
aprovado por portaria dos membros do Governo responsáveis pela edição do Diário da
República e pelas áreas das finanças e das obras públicas.
O anúncio referido no número anterior ou um resumo dos seus elementos mais
importantes pode ser posteriormente divulgado por qualquer outro meio considerado
conveniente, nomeadamente através da sua publicação em plataforma eletrónica
utilizada pela entidade adjudicante.

Anúncio obrigatório para Concursos Públicos com publicidade


internacional
⎯ Para Concursos Públicos com obrigatoriedade de publicitação
internacional, a entidade adjudicante deve publicitar o concurso público
no Jornal Oficial da União Europeia.
⎯ A publicação do anúncio no Jornal Oficial da União Europeia não
dispensa a publicitação do anúncio no Diário da República.

2. CONSULTA E FORNECIMENTO DAS PEÇAS DO CONCURSO


(artigo 132.º a 134.º)
As peças do procedimento são:
⎯ Programa do concurso que deve preencher os requisitos definidos no
artigo 132.º
⎯ Caderno de encargos que deve estar de acordo com os artigos 42.º a 46.º

Consulta das peças do procedimento:


O programa do concurso e o caderno de encargos devem estar disponíveis nos
serviços da entidade adjudicante para consulta dos interessados, desde o dia da
publicação do anúncio até ao termo do prazo fixado para a apresentação das propostas.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

As peças do concurso devem ser integralmente disponibilizadas, de forma direta,


no portal da internet dedicado aos contratos públicos ou em plataforma eletrónica
utilizada pela entidade adjudicante.
A disponibilização das peças do concurso pode depender do pagamento à
entidade adjudicante de um preço adequado.
A aquisição das peças do concurso não constitui, em caso algum, condição de
participação no mesmo.

O preço pago à entidade adjudicante pela disponibilização das peças do


concurso é devolvido aos concorrentes que o requeiram quando:
a) As respetivas propostas não sejam excluídas ou retiradas;
b) O órgão competente para a decisão de contratar decida não adjudicar;
c) O órgão competente para a decisão de contratar revogar esta decisão;
d) O concorrente fique objetivamente impedido de celebrar o contrato na
sequência da retificação ou da expressa aceitação de erros ou omissões
das peças do concurso.

3. ESCLARECIMENTOS (artigo 50.º)


Os esclarecimentos e as retificações às peças do procedimento devem:
a) Ser solicitados por escrito pelos interessados no primeiro terço do prazo
fixado para a apresentação de propostas;
b) Ser prestados e/ou retificados por escrito pela entidade para o efeito
indicado no programa do procedimento até ao termo do segundo terço do
prazo fixado para a apresentação de propostas;
c) Ser disponibilizados no portal da internet dedicado aos contratos públicos
ou em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante e juntos às
peças do procedimento que se encontrem patentes para consulta, devendo
todos os interessados que as tenham adquirido ser imediatamente
notificados desse fato.

DANIEL LOURENÇO
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4. APRESENTAÇÃO DE PROPOSTAS (artigos 135.º a 138.º)


Neste procedimento os operadores económicos começam desde logo por
apresentar propostas, o que significa que não existe uma fase de avaliação da
capacidade técnica e/ou financeira dos concorrentes, isto é, não existe nenhuma fase
prévia de qualificação dos concorrentes.
Regra geral, os documentos que constituem a proposta são obrigatoriamente
redigidos em língua portuguesa.
Os preços constantes da proposta são indicados em algarismos e não incluem o
IVA.
Os documentos que constituem a proposta devem ser apresentados em
plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, ou através de meio de
transmissão escrita e eletrónica de dados.
Só são admitidas propostas variantes nos casos em que o programa do
procedimento o permite. Caso o concorrente apresente uma proposta variante é obrigado
a apresentar a proposta base.
Prazo mínimo para a apresentação das propostas em concursos públicos sem
publicidade internacional:
⎯ Não pode ser fixado um prazo para a apresentação das propostas inferior
a seis dias a contar da publicação do anúncio;
⎯ No caso de se tratar de um procedimento de formação de um contrato de
empreitada de obras públicas, não pode ser fixado um prazo para
apresentação das propostas inferior a 14 dias a contar da publicação do
anúncio;
⎯ Em caso de manifesta simplicidade dos trabalhos necessários à
realização da obra, o prazo mínimo de 14 dias referido pode ser reduzido
até um prazo mínimo de seis dias.
Prazo mínimo para a apresentação das propostas em concursos públicos com
publicidade internacional:
(1) Não pode ser fixado um prazo para a apresentação das propostas inferior a 30 dias
a contar da data do envio desse anúncio ao Serviço das Publicações Oficiais da
União Europeia.

DANIEL LOURENÇO
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(2) Quando tenha sido publicado o anúncio de pré-informação ou o anúncio periódico


indicativo, e desde que o mesmo contemple as prestações objeto do contrato a
celebrar, o prazo mínimo é de 15 dias desde que:
a. O anúncio de pré -informação tenha sido enviado para publicação
com uma antecedência mínima de 35 dias e máxima de 12 meses
em relação à data do envio do anúncio; e
b. O anúncio de pré -informação tenha incluído todas as informações,
disponíveis à data da sua publicação, exigidas nos termos da parte
B do anexo V da Diretiva n.º 2014/24/UE, do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro.
(3) O prazo mínimo previsto no n.º 1 pode ser reduzido para 15 dias nos casos em que
uma situação de urgência devidamente fundamentada pela entidade adjudicante
inviabilize o cumprimento do prazo mínimo de 30 dias.

Até ao termo do prazo fixado para a apresentação das propostas, os interessados


que já as tenham apresentado podem retirá-las, bastando comunicarem tal fato à
entidade adjudicante, sem prejuízo do direito de apresentação de nova proposta dentro
daquele prazo.
O júri, no dia imediato ao termo do prazo fixado para a apresentação das
propostas, procede à publicitação da lista dos concorrentes na plataforma eletrónica
utilizada pela entidade adjudicante.
Mediante a atribuição de um login e de uma password aos concorrentes
incluídos na lista é facultada a consulta, diretamente na plataforma eletrónica referida,
de todas as propostas apresentadas.

5. AVALIAÇÃO DAS PROPOSTAS (artigo 139.º)


As propostas são analisadas em todos os seus atributos representados pelos
fatores e subfatores que densificam o critério de adjudicação.
O júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos
sobre as propostas que considere necessários para efeito de análise e de avaliação das
mesmas. Os esclarecimentos fazem parte integrante das propostas e devem ser

DANIEL LOURENÇO
228
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

disponibilizados em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, devendo


todos os concorrentes ser imediatamente notificados desse fato.
A pontuação global de cada proposta, expressa numericamente, corresponde ao
resultado da soma das pontuações parciais obtidas em cada fator ou subfator elementar,
multiplicadas pelos valores dos respetivos coeficientes de ponderação.
Para cada fator ou subfator elementar deve ser definida uma escala de pontuação
através de uma expressão matemática ou em função de um conjunto ordenado de
diferentes atributos suscetíveis de serem propostos para o aspeto da execução do
contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos respeitante a esse fator ou
subfator.
As pontuações parciais de cada proposta são atribuídas pelo júri através da
aplicação da expressão matemática referida ou, quando esta não existir, através de um
juízo de comparação do respetivo atributo com o conjunto ordenado referido no mesmo
número.

6. LEILÃO ELETRÓNICO (artigos 140.º a 145.º)


No caso de contratos de locação ou de aquisição de bens móveis ou de contratos
de aquisição de serviços, a entidade adjudicante pode recorrer a um leilão eletrónico que
consiste num processo interativo baseado num dispositivo eletrónico destinado a
permitir aos concorrentes melhorar progressivamente os atributos das respetivas
propostas, depois de avaliadas, obtendo -se a sua nova pontuação global através de um
tratamento automático.
Só podem ser objeto de um leilão eletrónico os atributos das propostas, desde
que:
⎯ O caderno de encargos fixe os parâmetros base dos respetivos aspetos da
execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência; e
⎯ Tais atributos sejam definidos apenas quantitativamente.

DANIEL LOURENÇO
229
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O programa do concurso deve indicar, para além dos elementos referidos no


artigo 132.º:
⎯ Os atributos das propostas objeto do leilão eletrónico;
⎯ As condições em que os concorrentes podem propor novos valores
relativos aos atributos das propostas objeto do leilão eletrónico,
nomeadamente as diferenças mínimas exigidas entre licitações;
⎯ Outras regras de funcionamento do leilão eletrónico;
⎯ As informações relativas ao dispositivo eletrónico a utilizar e às
modalidades e especificações técnicas de ligação dos concorrentes ao
mesmo.
Todos os concorrentes são simultaneamente convidados pela entidade
adjudicante, por via eletrónica, a participar no leilão eletrónico.
Não pode ser dado início ao leilão eletrónico antes de decorridos, pelo menos,
dois dias a contar da data do envio dos convites.
O dispositivo eletrónico utilizado deve permitir informar permanentemente
todos os concorrentes acerca da pontuação global e da ordenação de todas as propostas,
bem como dos novos valores relativos aos atributos das propostas objeto do leilão.
No decurso do leilão eletrónico, a entidade adjudicante não pode divulgar, direta
ou indiretamente, a identidade dos concorrentes que nele participam.
A entidade adjudicante pode encerrar o leilão eletrónico:
⎯ Na data e hora previamente fixadas no convite para participação no leilão
eletrónico; ou
⎯ Quando, decorrido o prazo máximo contado da receção da última
licitação, não receber novos valores correspondentes às diferenças
mínimas exigidas entre licitações.

7. PREPARAÇÃO DA ADJUDICAÇÃO (artigos 146.º a 148.º)


Após a análise das propostas, a utilização de um leilão eletrónico e a aplicação
do critério de adjudicação constante do programa do concurso, o júri elabora
fundamentadamente um relatório preliminar, no qual deve propor a ordenação das
mesmas.

DANIEL LOURENÇO
230
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Quando seja adotada uma fase de negociação aberta a todos os concorrentes


cujas propostas não sejam excluídas, o júri não deve aplicar o critério de adjudicação
nem propor a ordenação das propostas no relatório preliminar.
Elaborado o relatório preliminar, o júri procede à audiência prévia.
Cumprido o procedimento da audiência prévia, o júri elabora um relatório final
fundamentado, no qual pondera as observações dos concorrentes efetuadas ao abrigo do
direito de audiência prévia, mantendo ou modificando o teor e as conclusões do
relatório preliminar, podendo ainda propor a exclusão de qualquer proposta se verificar,
nesta fase, a ocorrência de qualquer dos motivos previstos no n.º 2 do artigo 146.º. O
relatório final, juntamente com os demais documentos que compõem o processo de
concurso, é enviado ao órgão competente para a decisão de contratar.
Cabe ao órgão competente para a decisão de contratar decidir sobre a aprovação
de todas as propostas contidas no relatório final, nomeadamente para efeitos de
adjudicação ou para efeitos de seleção das propostas ou dos concorrentes para a fase de
negociação quando seja adotada essa fase (a fase de negociação das propostas pode ser
adotada no caso de contratos de concessão de obras públicas ou de concessão de
serviços públicos).

8. ADJUDICAÇÃO, HABILITAÇÃO, CAUÇÃO CONTRATO E


PUBLICITAÇÃO (artigos 73.º a 79.º)
Cabe ao órgão competente para a decisão de contratar decidir sobre a aprovação
de todas as propostas contidas no relatório final, nomeadamente para efeitos de
adjudicação.
A decisão de adjudicação é notificada, em simultâneo, a todos os concorrentes.
Juntamente com a notificação da decisão de adjudicação, o órgão competente
para a decisão de contratar deve notificar o adjudicatário para:
a) Apresentar os documentos de habilitação;
b) Prestar caução, se esta for devida;
c) Confirmar no prazo para o efeito fixado, se for o caso, os compromissos
assumidos por terceiras entidades relativos a atributos ou a termos ou
condições da proposta adjudicada.

DANIEL LOURENÇO
231
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Quando o procedimento de formação do contrato tenha sido publicitado através


de anúncio publicado no Jornal Oficial da União Europeia, a entidade adjudicante deve
publicar no referido jornal, no prazo de 30 dias após a celebração de um contrato, um
anúncio conforme modelos constantes do anexo V da Diretiva n.º 2014/24/UE, ou do
anexo XII da Diretiva n.º 2014/25/UE, ambas do Parlamento Europeu e do Conselho, de
26 de fevereiro, consoante o caso.
Salvo o disposto no artigo 95.º, o contrato deve ser reduzido através da
elaboração de um clausulado em suporte papel ou em suporte informático com a
aposição de assinaturas eletrónicas.
O contrato é publicitado pela entidade adjudicante no portal da internet dedicada
aos contratos públicos.

6.4. Concurso Público Urgente (artigos 155.º a 161.º)


Destacam-se as seguintes especificidades:
⎯ O concurso público urgente é publicitado no Diário da República através de
anúncio próprio, do qual constam o programa do concurso e o caderno de
encargos (artigo 157.º do CCP)
⎯ O prazo mínimo para a apresentação das propostas é consideravelmente
reduzido, uma vez que é contabilizado em horas, designadamente:
a) O mínimo de 24h para a formação dos contratos de aquisição ou
locação de bens móveis ou aquisição de serviços, desde que o
prazo corra integralmente em dias úteis;
b) O mínimo de 72h para a formação dos contratos de empreitadas de
obras públicas, desde que o prazo corra integralmente em dias
úteis.
⎯ O prazo da obrigação de manutenção das propostas é de 10 dias, não
havendo lugar a qualquer prorrogação (artigo 159.º do CCP).
⎯ Pode-se adotar este tipo de procedimento em caso de urgência na
celebração de um contrato de locação ou aquisição de bens móveis, ou de
aquisição de serviços de uso corrente, ou de empreitada de obras públicas,

DANIEL LOURENÇO
232
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

desde que observado os requisitos previstos nas alíneas a) e b), do artigo


155.º:
a) O valor do contrato a celebrar seja inferior a:
i. 144.000,00€ para contratos de aquisição ou locação de bens
móveis ou aquisição de serviços quando a entidade
adjudicante for o Estado;
ii. 221.000,00€ para contratos de aquisição ou locação de bens
móveis ou aquisição de serviços quando a entidade
adjudicante for qualquer outra entidade adjudicante
diferente do Estado;
iii. 300.000,00€ para contratos de empreitadas de obras públicas.
b) A modalidade do critério de adjudicação da proposta
economicamente mais vantajosa, seja a avaliação do preço ou
custo, enquanto único aspeto da execução do
contrato a celebrar.
⎯ O adjudicatário deve apresentar os documentos de habilitação exigidos
no prazo de 2 dias a contar da data da notificação da adjudicação, sem
prejuízo do programa do procedimento poder fixar um prazo inferior
(artigo 161.º do CCP).

Ao concurso público urgente são aplicáveis as regras do concurso público


“normal”, com exceção das que dizem respeito a (artigo 156.º do CCP):
⎯ Esclarecimentos e retificação das peças do concurso (artigo 50.º do CCP)
⎯ Prorrogação do prazo fixado para apresentação das propostas (artigo 64.º
do CCP)
⎯ Júri do concurso (artigos 67.º a 69.º do CCP)
⎯ Esclarecimentos sobre as propostas (artigo 72.º do CCP)
⎯ Caução (artigos 88.º a 91.º do CCP)
⎯ Lista dos concorrentes e consulta das propostas apresentadas (artigo
138.º do CCP)

DANIEL LOURENÇO
233
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⎯ Relatório preliminar, audiência prévia e relatório final (artigos 146.º a


148.º do CCP)
⎯ Fase de negociação das propostas (artigos 149.º a 154.º do CCP)

6.5. Concurso Limitado Por Prévia Qualificação


Fases Principais
1. Anúncio
2. Consulta e fornecimento das peças do concurso
3. Esclarecimentos
4. Apresentação de candidaturas e qualificação dos candidatos
5. Apresentação, análise das propostas, adjudicação, habilitação, caução,
contrato e publicitação.

Este procedimento caracteriza-se por ser composto por duas


fases procedimentais:
⎯ Numa primeira fase, existe a apresentação das candidaturas e
qualificação dos candidatos;
⎯ Numa segunda fase, existe a apresentação e análise das propostas e
adjudicação.
O procedimento pode ser adotado sempre que a entidade adjudicante entenda
necessário avaliar a capacidade técnica e/ou financeira dos operadores económicos.

1. ANÚNCIO (artigo 162.º)


Trata-se de um procedimento concorrencial, dado a conhecer através de anúncio
publicado no Diário da República, e também no Jornal Oficial da União Europeia
quando o valor do contrato a celebrar for superior aos limiares Europeus (artigo 162.º e
seguintes do CCP). O mesmo é elaborado conforme modelo aprovado por portaria dos
membros do Governo responsáveis pela edição do Diário da República e pelas áreas das
finanças e das obras públicas.
O anúncio ou o resumo dos seus elementos mais importantes pode ser
posteriormente divulgado por qualquer outro meio considerado conveniente,

DANIEL LOURENÇO
234
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

nomeadamente através da sua publicação em plataforma eletrónica utilizada pela


entidade adjudicante.

2. CONSULTA E FORNECIMENTO DAS PEÇAS DO CONCURSO


(artigos 162.º a 165.º)
As peças do procedimento são:
⎯ Programa do concurso que deve preencher os requisitos definidos no
artigo 164.º;
⎯ Caderno de encargos que deve estar de acordo com os artigos 42.º a 46.º.
O programa do concurso pode indicar requisitos mínimos de capacidade
financeira que os candidatos devem preencher. Realça-se que, em regra os requisitos
mínimos de capacidade financeira não podem exceder o dobro do valor do contrato
(artigo 165.º, n.º 3). os requisitos mínimos de capacidade financeira devem, neste caso
reportar-se à aptidão estimada dos candidatos para mobilizar os meios financeiros
previsivelmente necessários para o integral cumprimento das obrigações resultantes do
contrato a celebrar. Quando, no caso de empreitadas ou de concessões de obras
públicas, os requisitos mínimos de capacidade técnica e de capacidade financeira
exigidos no programa do concurso se basearem em elementos de fato já tidos em
consideração para efeitos da concessão do alvará ou título de registo contendo as
habilitações adequadas e necessárias à execução da obra a realizar, tais requisitos devem
ser mais exigentes que os legalmente previstos para aquela concessão.
Os requisitos mínimos de capacidade técnica devem ser adequados à natureza
das prestações objeto do contrato a celebrar, descrevendo situações, qualidades,
características ou outros elementos.
Consulta das peças do procedimento:
O programa do concurso e o caderno de encargos devem estar disponíveis nos
serviços da entidade adjudicante, para consulta dos interessados, desde o dia da
publicação do anúncio até ao termo do prazo fixado para a apresentação de propostas.
Do mesmo modo, são colocadas no portal da internet dedicado aos contratos públicos
ou em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante. Nesta última situação,
o acesso depende do pagamento à entidade adjudicante de um preço adequado.

DANIEL LOURENÇO
235
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

3. ESCLARECIMENTOS (artigo 166.º)


Os esclarecimentos necessários à boa compreensão e interpretação das peças do
concurso podem ser solicitados e devem ser prestados nas fases:
⎯ Apresentação das candidaturas e qualificação dos candidatos;
⎯ Apresentação e análise das propostas e adjudicação.
Aplica-se o mesmo à retificação de erros ou omissões das peças de concurso.
Os esclarecimentos e as retificações devem ser disponibilizados no portal da
internet dedicado aos contratos públicos ou em plataforma eletrónica utilizada pela
entidade adjudicante, e juntos às peças do procedimento que se encontrem patentes para
consulta, devendo todos os interessados que as tenham adquirido ser imediatamente
notificados desse fato.
Os esclarecimentos e as retificações fazem parte integrante das peças do
procedimento a que dizem respeito e prevalecem sobre estas em caso de divergência.

4. APRESENTAÇÃO DE CANDIDATURAS E QUALIFICAÇÃO DOS


CANDIDATOS (artigos 167.º a 188.º)
Candidaturas são processos documentais e a pretensão e informação neles
incorporadas exigidos a quem esteja interessado em pré-qualificar-se para um
procedimento de contratação pública, demonstrando possuir capacidade (técnica e/ou
financeira) para aí apresentar uma proposta de contrato e honrar os compromissos nela
assumidos.
Quando o anúncio do concurso limitado por prévia qualificação não seja
publicado no Jornal Oficial da União Europeia, não pode ser fixado um prazo para a
apresentação das candidaturas inferior a seis dias a contar da data do envio.
Quando o anúncio do concurso limitado por prévia qualificação seja publicado
no Jornal Oficial da União Europeia, não pode ser fixado um prazo para a apresentação
das candidaturas inferior a 30 dias a contar da data do envio desse anúncio ao Serviço
das Publicações da União Europeia.
A candidatura é constituída pelos documentos destinados à qualificação dos
candidatos e pela declaração conforme o modelo constante no anexo V ao CCP, a qual é
substituída pelo Documento Europeu Único de Contratação Pública nos procedimentos

DANIEL LOURENÇO
236
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

com publicação de anúncio no Jornal Oficial da União Europeia. A declaração ou o


Documento Europeu Único de Contratação Pública referidos devem ser assinados pelo
candidato ou por representante que tenha poderes para o obrigar.
Quando, para efeitos do preenchimento dos requisitos mínimos de capacidade
técnica, o candidato recorra a terceiros, independentemente do vínculo que com eles
estabeleça, nomeadamente o de subcontratação, a respetiva candidatura é, ainda,
constituída por uma declaração através da qual estes se comprometam,
incondicionalmente, a realizar determinadas prestações objeto do contrato a celebrar.
Os documentos destinados à qualificação dos candidatos são obrigatoriamente
redigidos em língua portuguesa. Quando, pela sua própria natureza ou origem, os
documentos destinados à qualificação dos candidatos estiverem redigidos em língua
estrangeira, deve o interessado fazê-los acompanhar de tradução devidamente
legalizada.
Os documentos que constituem a candidatura devem ser apresentados
diretamente na plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, através de
meio de transmissão escrita e eletrónica de dados.
Quando algum documento destinado à qualificação se encontre disponível na
Internet, o candidato pode, em substituição da apresentação da sua reprodução, indicar à
entidade adjudicante o endereço do sítio onde aquele pode ser consultado, bem como a
informação necessária a essa consulta, desde que os referidos sítio e documento dele
constante estejam redigidos em língua portuguesa.
O júri, no dia imediato ao termo do prazo fixado para a apresentação das
candidaturas, procede à publicitação da lista dos candidatos na plataforma eletrónica
utilizada pela entidade adjudicante. Mediante a atribuição de um login e de uma
password, aos candidatos incluídos na lista é facultada a consulta, diretamente na
plataforma eletrónica referida no número anterior, de todas as candidaturas
apresentadas.
O júri do concurso analisa as candidaturas para efeitos da qualificação dos
respetivos candidatos. O preenchimento dos requisitos mínimos de capacidade técnica e
de capacidade financeira é comprovado pela avaliação dos elementos constantes dos
documentos destinados à qualificação dos candidatos.

DANIEL LOURENÇO
237
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

O júri do procedimento pode pedir aos candidatos quaisquer esclarecimentos


sobre os documentos, da sua autoria, destinados à qualificação que considere
necessários para efeitos da análise das candidaturas.
Após a análise das candidaturas e a aplicação às mesmas do critério de
qualificação, o júri elabora fundamentadamente um relatório preliminar, no qual deve
propor a qualificação dos candidatos.
O órgão competente para a decisão de contratar deve tomar a decisão de
qualificação e notificá-la aos candidatos, acompanhada do relatório final da fase de
qualificação, no prazo máximo de 44 dias após o termo do prazo fixado para a
apresentação das candidaturas, sem prejuízo da possibilidade de fixação de um prazo
superior no programa do concurso.
O órgão competente para a decisão de contratar notifica todos os candidatos da
decisão tomada, remetendo-lhes o relatório final da fase da qualificação, bem como um
convite à apresentação de propostas.
Os candidatos qualificados passam à fase seguinte em condições de igualdade.

5. APRESENTAÇÃO, ANÁLISE DAS PROPOSTAS, ADJUDICAÇÃO,


HABILITAÇÃO, CAUÇÃO, CONTRATO E PUBLICITAÇÃO. (artigos
189.º a 192.º)
Quando o anúncio do concurso limitado por prévia qualificação não seja
publicado no Jornal Oficial da União Europeia, não pode ser fixado um prazo para a
apresentação das propostas inferior a seis dias ou, no caso de se tratar de um
procedimento de formação de um contrato de empreitada de obras públicas, inferior a
14 dias, a contar da data do envio do convite. Em caso de manifesta simplicidade dos
trabalhos necessários à realização da obra, o prazo mínimo referido pode ser reduzido
até um prazo mínimo de seis dias.
Quando o anúncio do concurso limitado por prévia qualificação seja publicado
no Jornal Oficial da União Europeia, não pode ser fixado um prazo para a apresentação
das propostas inferior a 25 dias a contar da data do envio do convite, com as exceções
previstas no artigo 191.º.

DANIEL LOURENÇO
238
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

As normas do convite prevalecem sobre quaisquer indicações constantes dos


anúncios com elas desconformes, mas as normas contidas no programa do concurso
prevalecem sobre aquelas.
Os documentos que constituem a proposta são apresentados diretamente em
plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, ou através de meio de
transmissão escrita e eletrónica de dados.
Sem prejuízo da possibilidade de fixação de um prazo superior ao programa do
procedimento ou ao convite, os concorrentes são obrigados a manter as respetivas
propostas pelo prazo de 66 dias contados da data do termo do prazo fixado para
apresentação das propostas.
Por motivos de segredo comercial, industrial, militar ou outro, os interessados
podem requerer a classificação de documentos que constituem a proposta, para efeitos
da restrição ou da limitação do acesso aos mesmos na medida do estritamente
necessário.
As propostas são analisadas em todos os seus atributos representados pelos
fatores e subfatores que densificam o critério de adjudicação.
O júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos
sobre as propostas apresentadas que considere necessários para o efeito da análise e de
avaliação das mesmas. Estes esclarecimentos devem ser disponibilizados em plataforma
eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, devendo todos os concorrentes ser
imediatamente notificados desse fato.
A decisão de adjudicação é notificada, em simultâneo, a todos os concorrentes.
Juntamente com a notificação da decisão do relatório final de análise das
propostas, o órgão competente para a decisão de contratar deve notificar o adjudicatário
para:
⎯ Apresentar os documentos de habilitação;
⎯ Prestar caução, se esta for devida;
⎯ Confirmar no prazo para o efeito fixado, se for o caso, os
compromissos assumidos por terceiras entidades relativas a
atributos ou a termos ou condições da proposta adjudicada.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Quando o procedimento de formação do contrato tenha sido publicitado através


de anúncio publicado no Jornal Oficial da União Europeia, a entidade adjudicante deve
enviar ao Serviço das Publicações da União Europeia, no prazo de 30 dias após a
decisão de seleção, um anúncio conforme modelo constante do anexo III ao
Regulamento de Execução (UE) n.º 2015/1986, da Comissão, de 11 de novembro de
2015.
Salvo o disposto no artigo 95.º, o contrato deve ser reduzido a escrito através da
elaboração de um clausulado em suporte papel ou em suporte informático com a
aposição de assinaturas eletrónicas.
O contrato é publicitado pela entidade adjudicante no portal da internet dedicada
aos contratos públicos.

6.6. Procedimento De Negociação

Principais fases
1. Anúncio
2. Consulta e fornecimento das peças do concurso
3. Esclarecimentos
4. Apresentação de candidaturas e qualificação dos candidatos
5. Apresentação e análise das versões iniciais das propostas
6. Negociação das propostas
7. Análise das versões finais das propostas, adjudicação, habilitação,
caução, contrato e publicitação

O procedimento de negociação a semelhança do concurso limitado por prévia


qualificação, caracteriza-se pela existência de uma fase de qualificação, no entanto tem
a especificidade de os concorrentes (os quais foram previamente qualificados) podem
melhorar os atributos das suas propostas numa fase de negociação.
As entidades adjudicantes podem adotar o procedimento de negociação
verificados os requisitos previstos nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 29.º do CCP:

DANIEL LOURENÇO
240
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⎯ As suas necessidades não possam ser satisfeitas sem a adaptação de


soluções facilmente disponíveis;
⎯ Os bens ou serviços incluírem a conceção de soluções inovadoras;
⎯ Não for objetivamente possível adjudicar o contrato sem negociações
prévias devido a circunstâncias específicas relacionadas com a sua
natureza, complexidade, montagem jurídica e financeira ou devido aos
riscos a ela associados;
⎯ Não for objetivamente possível definir com precisão as especificações
técnicas.

1. ANÚNCIO (artigos 197.º e 198.º)

Anúncio obrigatório para procedimentos de negociação sem publicidade


internacional
Trata-se de um procedimento concorrencial, dado a conhecer através de anúncio
publicado no Diário da República, elaborado conforme modelo aprovado por portaria
dos membros do Governo responsáveis pela edição do Diário da República e pelas áreas
das finanças e das obras públicas.
O anúncio ou o resumo dos seus elementos mais importantes pode ser
posteriormente divulgado por qualquer outro meio considerado conveniente,
nomeadamente através da sua publicação em plataforma eletrónica utilizada pela
entidade adjudicante.
Anúncio obrigatório para procedimentos de negociação com publicidade
internacional Para procedimentos de negociação com obrigatoriedade de publicitação
internacional, a entidade adjudicante deve publicitar o procedimento no Jornal Oficial
da União Europeia.
A publicação do anúncio no Jornal Oficial da União Europeia não dispensa a
publicitação do anúncio no Diário da República.
Não pode ser fixado um prazo para a apresentação das candidaturas inferior a 30
dias a contar da data do envio do anúncio ao Serviço das Publicações da União
Europeia.

DANIEL LOURENÇO
241
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Quando tenha sido publicado o anúncio periódico indicativo com as indicações:


a) Das prestações objeto do contrato a celebrar;
b) O concurso limitado por prévia qualificação como o procedimento a
adotar para a formação do contrato a celebrar; e
c) Um prazo, que não pode ser superior a 11 meses a contar da data da
publicação do anúncio periódico indicativo, para os interessados
manifestarem à entidade adjudicante o seu interesse em participar no
concurso.
Não pode ser fixado um prazo para a apresentação das candidaturas inferior a 25
dias a contar da data do envio do convite para apresentação de candidaturas.
Os prazos mínimos para a apresentação das candidaturas previstos nos números
anteriores podem ser reduzido sem até sete dias quando os anúncios forem preparados e
enviados por meios eletrónicos conforme formato e modalidades de transmissão
indicados no portal da Internet http://simap.eu.int.

2. CONSULTA E FORNECIMENTO DAS PEÇAS DO CONCURSO


(artigos 193.º a 196.º)
As peças do procedimento são:
⎯ Programa do procedimento que deve preencher os requisitos
definidos nos artigos 150.º e 164.º;
⎯ O convite à apresentação das propostas;
⎯ Caderno de encargos que deve estar de acordo com os artigos 42.º a
46.º.
Para além dos elementos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 150.º e no n.º 1
do artigo 164.º, o programa do procedimento de negociação deve ainda indicar:
i. No caso de a qualificação assentar no sistema de seleção, o número
mínimo de candidatos a qualificar, que não pode ser inferior a três;
ii. Quais os aspetos da execução do contrato a celebrar que a entidade
adjudicante não está disposta a negociar;
iii. Se a negociação decorrerá, parcial ou totalmente, por via eletrónica e
os respetivos termos.

DANIEL LOURENÇO
242
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Consulta das peças do procedimento:


O programa do procedimento e o caderno de encargos devem estar disponíveis
nos serviços da entidade adjudicante, para consulta dos interessados, desde o dia da
publicação do anúncio até ao termo do prazo fixado para apresentação de propostas.
Do mesmo modo, são colocadas no portal da internet dedicado aos contratos
públicos ou em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante. Nesta última
situação, o acesso depende do pagamento à entidade adjudicante de um preço adequado.

3. ESCLARECIMENTOS (artigo 50.º)


Os esclarecimentos necessários à boa compreensão e interpretação das peças do
concurso podem ser solicitados e devem ser prestados nas fases:
o Apresentação das candidaturas e qualificação dos candidatos;
o Apresentação e análise das propostas e adjudicação;
Aplica-se o mesmo à retificação de erros ou omissões das peças de concurso.
Os esclarecimentos e as retificações devem ser disponibilizados no portal da
internet dedicado aos contratos públicos ou em plataforma eletrónica utilizada pela
entidade adjudicante e juntos às peças do procedimento que se encontrem patentes para
consulta, devendo todos os interessados que as tenham adquirido ser imediatamente
notificados desse fato.
Os esclarecimentos e as retificações fazem parte integrante das peças do
procedimento a que dizem respeito e prevalecem sobre estas em caso de divergência.

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DAS VERSÕES INICIAIS DAS


PROPOSTAS (artigos 199.º e 200.º)
O convite para a apresentação das propostas deve indicar:
⎯ A identificação do concurso;
⎯ A referência ao anúncio do procedimento;
⎯ Os documentos referidos na alínea c) do n.º 1 do artigo 57.º, se for o
caso;
⎯ Os documentos que constituem a proposta que podem ser redigidos em
língua estrangeira, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 58.º;

DANIEL LOURENÇO
243
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⎯ Se é admissível ou não a apresentação de propostas variantes, e o


número máximo de propostas variantes admitidas;
⎯ O prazo para a apresentação das propostas;
⎯ O prazo da obrigação de manutenção das propostas, quando superior a
66 dias;
⎯ O modo de prestação da caução, ou os termos em que não seja exigida
essa prestação;
⎯ O valor da caução, quando esta for exigida;
⎯ A indicação do prazo limite para identificação de erros e omissões e
para resposta quanto aos mesmos, se superior ao previsto no artigo 50.º;
⎯ O endereço do sítio da internet onde é disponibilizado o caderno de
encargos aos candidatos que ainda o não tenham adquirido;
⎯ Eventuais regras específicas sobre a fase de apresentação e análises das
versões iniciais das propostas.

Não pode ser fixado um prazo para a apresentação das candidaturas inferior a 30
dias a contar da data do envio do anúncio referido ao Serviço das Publicações da União
Europeia.
Quando tenha sido publicado o anúncio periódico indicativo com as indicações
referidas no n.º 3 do artigo 167.º, não pode ser fixado um prazo para a apresentação das
candidaturas inferior a 25 dias a contar da data do envio do convite previsto no n.º 5 do
mesmo artigo.
Os prazos mínimos para a apresentação das candidaturas previstos podem ser
reduzidos em até sete dias quando os anúncios forem preparados e enviados por meios
eletrónicos conforme formato e modalidades de transmissão indicados no portal da
Internet http://simap.eu.int. (informações sobre contratos públicos europeus).
As propostas são analisadas em todos os seus atributos representados pelos
fatores e subfatores que densificam o critério de adjudicação.

DANIEL LOURENÇO
244
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Esclarecimentos sobre as propostas


O júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos
sobre as propostas que considere necessários para efeito de análise e de avaliação das
mesmas. Os esclarecimentos fazem parte integrante das propostas e devem ser
disponibilizados em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, devendo
todos os concorrentes ser imediatamente notificados desse fato.
A pontuação global de cada proposta, expressa numericamente, corresponde ao
resultado da soma das pontuações parciais obtidas em cada fator ou subfator elementar,
multiplicadas pelos valores dos respetivos coeficientes de ponderação.
Após a análise das propostas, o júri elabora fundamentadamente um relatório
preliminar, no qual deve propor a ordenação das mesmas. Deste relatório deve ainda
constar a referência aos esclarecimentos prestados pelos concorrentes.
Elaborado o relatório preliminar, o júri procede à audiência prévia.
Após a audiência prévia, o júri elabora um relatório final fundamental, no qual
pondera as observações dos concorrentes, efetuadas ao abrigo do direito de audiência
prévia, mantendo ou modificando o teor as conclusões do relatório preliminar. Este
relatório final é enviado ao órgão competente para a decisão de contratar.

5. NEGOCIAÇÃO DAS PROPOSTAS (artigos 201.º e 202.º)


No caso de ter havido reclamação apresentada por interessado que não tenha
sido incluído na lista dos concorrentes, a negociação das propostas não pode iniciar-se:
⎯ Antes da notificação da decisão de indeferimento ou do decurso do
respetivo prazo; ou
⎯ No caso de a reclamação ser deferida, antes da apresentação da
proposta do reclamante, caso esta não se encontre.
As negociações devem incidir sobre os atributos das propostas.
Os concorrentes devem ter idênticas oportunidades de propor, de aceitar e de
contrapor modificações das respetivas propostas durante as sessões de negociação.
De cada sessão de negociações é lavrada ata, a qual deve ser assinada pelos
membros presentes do júri e pelos representantes presentes dos concorrentes.

DANIEL LOURENÇO
245
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

As atas e quaisquer outras informações ou comunicações prestadas pelos


concorrentes à entidade adjudicante devem manter-se sigilosas durante a fase de
negociação.
Quando o júri der por terminada a negociação notifica imediatamente os
concorrentes para, em prazo por ele para o efeito fixado, apresentarem as versões finais
integrais das propostas, as quais não podem conter atributos diferentes dos constantes
das respetivas versões iniciais no que respeita aos aspetos da execução do contrato a
celebrar que a entidade adjudicante tenha indicado não estar disposta a negociar.

6. ANÁLISE DAS VERSÕES FINAIS DAS PROPOSTAS,


ADJUDICAÇÃO, HABILITAÇÃO, CAUÇÃO, CONTRATO E
PUBLICITAÇÃO (Artigo 203.º)
Após a análise das versões finais das propostas e a aplicação do critério de
adjudicação, o júri elabora fundamentadamente um segundo relatório preliminar, no
qual deve propor a ordenação das mesmas, podendo ainda propor a exclusão de
qualquer proposta.
O júri deve também propor a exclusão das versões finais das propostas que
contenham atributos diferentes dos constantes das respetivas versões iniciais no que
respeita aos aspetos da execução do contrato a celebrar que a entidade adjudicante tenha
indicado não estar disposta a negociar.
Durante a fase de audiência prévia cada concorrente tem acesso às atas das
sessões de negociação com os demais concorrentes e às informações e comunicações
escritas de qualquer natureza que estes tenham prestado à entidade adjudicante, bem
como às versões finais integrais das propostas apresentadas.
Após a audiência prévia, o júri elabora um relatório final fundamentado, no qual
pondera as observações dos concorrentes efetuadas ao abrigo do direito de audiência
prévia, mantendo ou modificando o teor e as conclusões do relatório preliminar.
O relatório final, juntamente com os demais documentos que compõem o
processo de concurso, é enviado ao órgão competente para a decisão de contratar.

DANIEL LOURENÇO
246
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Cabe ao órgão competente para a decisão de contratar decidir sobre a aprovação


de todas as propostas contidas no relatório final, nomeadamente para efeitos de
adjudicação.
A decisão de adjudicação é notificada, em simultâneo, a todos os concorrentes.
Juntamente com a notificação da decisão de adjudicação, o órgão competente
para a decisão de contratar deve notificar o adjudicatário para:
a) Apresentar os documentos de habilitação;
b) Prestar caução, se esta for devida;
c) Confirmar no prazo para o efeito fixado, se for o caso, os compromissos
assumidos por terceiras entidades relativos a atributos ou a termos ou
condições da proposta adjudicada.
Salvo o disposto no artigo 95.º, o contrato deve ser reduzido através da
elaboração de um clausulado em suporte papel ou em suporte informático com a
aposição de assinaturas eletrónicas.
O contrato é publicitado pela entidade adjudicante no portal da internet dedicada
aos contratos públicos.

6.7. Procedimento Por Diálogo Concorrencial

Principais fases:
1. Anúncio
2. Consulta e fornecimento de peças do concurso
3. Apresentação das candidaturas e da qualificação dos candidatos
4. Apresentação das soluções e de diálogo com os candidatos
qualificados
5. Apresentação, análise das propostas e da adjudicação, habilitação,
caução, contrato e publicitação

O recurso ao diálogo concorrencial está posto para os casos em que a entidade


adjudicante desconhece a melhor maneira de satisfazer uma necessidade a seu cargo ou

DANIEL LOURENÇO
247
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

quais são as soluções disponíveis no mercado para o efeito e pretende conhecê-las e


adotar contratualmente a melhor.
À semelhança do concurso limitado por prévia qualificação, caracteriza-se pela
existência de uma fase de qualificação, no entanto tem a especificidade de, antes da fase
de apresentação das propostas, existir uma fase de apresentação de soluções e diálogo
com os candidatos qualificados. Neste procedimento o caderno de encargos só é
elaborado depois de terminada a fase de diálogo das soluções (artigo 207.º n.º 3).
Note-se que, ao contrário do procedimento de negociação não é admissível a
negociação das propostas dos concorrentes.
As entidades adjudicantes podem adotar o procedimento de diálogo
concorrencial verificados os requisitos previstos nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo
29.º do CCP:
⎯ As suas necessidades não possam ser satisfeitas sem a adaptação de
soluções facilmente disponíveis;
⎯ Os bens ou serviços incluírem a conceção de soluções inovadoras;
⎯ Não for objetivamente possível adjudicar o contrato sem negociações
prévias devido a circunstâncias específicas relacionadas com a sua
natureza, complexidade, montagem jurídica e financeira ou devido aos
riscos a ela associados;
⎯ Não for objetivamente possível definir com precisão as especificações
técnicas por referência a uma norma, homologação técnica europeia,
especificações técnicas comuns ou referência técnica.

1. ANÚNCIO (artigo n.º 208.º)


O procedimento do diálogo concorrencial é publicitado no Diário da República
através de anúncio conforme modelo aprovado por portaria dos membros do Governo
responsáveis pela edição do Diário da República e pelas áreas das finanças e das obras
públicas.
No caso de contratos de empreitada ou de concessão de obras públicas, de
contratos de locação ou de aquisição de bens móveis ou de contratos de aquisição de
serviços, deve ainda ser publicado anúncio do diálogo concorrencial no Jornal Oficial

DANIEL LOURENÇO
248
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

da União Europeia através de um anúncio contendo as menções previstas na parte C do


anexo V da Diretiva n.º 2014/24/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de
fevereiro ou, no caso de se tratar de um contrato de concessão de obras públicas através
de um anúncio do concurso público, contendo a informação constante do anexo V da
Diretiva n.º 2014/23/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro.

2. CONSULTA E FORNECIMENTO DE PEÇAS DO CONCURSO


(artigos 206.º e 207.º)

As peças do procedimento são:


⎯ Programa do procedimento do diálogo concorrencial que, além de
preencher os requisitos definidos no artigo 164.º o programa do
procedimento de diálogo concorrencial deve ainda indicar o montante
da eventual remuneração, ou o critério do respetivo cálculo, a atribuir
aos candidatos qualificados para participar no diálogo que
apresentem soluções que sejam admitidas;
⎯ Caderno de encargos que deve estar de acordo com os artigos 42.º a
46.º e que só é elaborado depois de concluída a fase de apresentação
das soluções e de diálogo;
⎯ Memória descritiva em que, o órgão competente para a decisão de
contratar identifica as necessidades e as exigências que pretende
satisfazer com o contrato a celebrar.

O programa do concurso, o caderno de encargos e a memória descritiva devem


estar disponíveis nos serviços da entidade adjudicante, para consulta dos interessados,
desde o dia da publicação do anúncio até ao termo do prazo fixado para a apresentação
de propostas.
As peças do concurso devem ser integralmente disponibilizadas de forma direta
no portal da internet dedicado aos contratos públicos ou em plataforma eletrónica
utilizada pela entidade adjudicante.

DANIEL LOURENÇO
249
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

3. APRESENTAÇÃO DAS CANDIDATURAS E DA QUALIFICAÇÃO


DOS CANDIDATOS (artigo 204.º)
A candidatura é constituída pelos documentos destinados à qualificação dos
candidatos e pela declaração conforme o modelo constante no anexo V ao CCP, a qual é
substituída pelo Documento Europeu Único de Contratação Pública nos procedimentos
com publicação de anúncio no Jornal Oficial da União Europeia. A declaração ou o
Documento Europeu Único de Contratação Pública referidos devem ser assinados pelo
candidato ou por representante que tenha poderes para o obrigar.
Quando, para efeitos do preenchimento dos requisitos mínimos de capacidade
técnica, o candidato recorra a terceiros, independentemente do vínculo que com eles
estabeleça, nomeadamente o de subcontratação, a respetiva candidatura é ainda
constituída por uma declaração através da qual estes se comprometam,
incondicionalmente, a realizar determinadas prestações objeto do contrato a celebrar.
Os documentos destinados à qualificação dos candidatos são obrigatoriamente
redigidos em língua portuguesa. Quando, pela sua própria natureza ou origem, os
documentos destinados à qualificação dos candidatos estiverem redigidos em língua
estrangeira, deve o interessado fazê-los acompanhar de tradução devidamente
legalizada.
Os documentos que constituem a candidatura devem ser apresentados
diretamente na plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, através de
meio de transmissão escrita e eletrónica de dados.
Quando algum documento destinado à qualificação se encontre disponível na
Internet, o candidato pode, em substituição da apresentação da sua reprodução, indicar à
entidade adjudicante o endereço do sítio onde aquele pode ser consultado, bem como a
informação necessária a essa consulta, desde que os referidos sítio e documento dele
constante estejam redigidos em língua portuguesa.
O júri, no dia imediato ao termo do prazo fixado para a apresentação das
candidaturas, procede à publicitação da lista dos candidatos na plataforma eletrónica
utilizada pela entidade adjudicante. Mediante a atribuição de um login e de uma
password, aos candidatos incluídos na lista é facultada a consulta, diretamente na

DANIEL LOURENÇO
250
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

plataforma eletrónica referida no número anterior, de todas as candidaturas


apresentadas.
O júri do concurso analisa as candidaturas para efeitos da qualificação dos
respetivos candidatos. O preenchimento dos requisitos mínimos de capacidade técnica e
de capacidade financeira é comprovado pela avaliação dos elementos constantes dos
documentos destinados à qualificação dos candidatos.
O júri do procedimento pode pedir aos candidatos quaisquer esclarecimentos
sobre os documentos, da sua autoria, destinados à qualificação que considere
necessários para efeitos da análise das candidaturas.
Após a análise das candidaturas e a aplicação às mesmas do critério de
qualificação, o júri elabora fundamentadamente um relatório preliminar, no qual deve
propor a qualificação dos candidatos.
O órgão competente para a decisão de contratar deve tomar a decisão de
qualificação e notificá-la aos candidatos, acompanhada do relatório final da fase de
qualificação, no prazo máximo de 44 dias após o termo do prazo fixado para a
apresentação das candidaturas, sem prejuízo da possibilidade de fixação de um prazo
superior no programa do concurso.

4. APRESENTAÇÃO DAS SOLUÇÕES E DE DIÁLOGO COM OS


CANDIDATOS QUALIFICADOS (artigos 209.º a 216.º)
Soluções são processos em que, tendo-se limitado a entidade adjudicante a
identificar as necessidades e exigências que pretende ver satisfeitas com o contrato a
celebrar, os concorrentes apresentam-lhe as respostas ou soluções que, em seu entender,
melhor servem essas pretensões, para depois elaborarem uma proposta de contrato com
a solução escolhida.
Com a notificação da decisão de qualificação, o órgão competente para a decisão
de contratar envia aos candidatos qualificados, em simultâneo, um convite à
apresentação de soluções suscetíveis de satisfazer as necessidades e as exigências
identificadas na memória descritiva.
O convite à apresentação das soluções deve indicar:
▪ A identificação do procedimento de diálogo concorrencial;

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

▪ A referência ao anúncio do procedimento de diálogo concorrencial;


▪ O prazo de apresentação das soluções elaboradas pelos candidatos
qualificados;
▪ Se é admissível a utilização de línguas estrangeiras na fase de diálogo
e, em caso afirmativo, quais as línguas.

Os documentos que constituem as propostas de solução são apresentadas


diretamente em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, através de
meio de transmissão escrita e eletrónica de dados. Quando, pela sua natureza, qualquer
documento dos que constituem a proposta não possa ser apresentado por via eletrónica,
deve ser encerrado e entregue em invólucro opaco e fechado.
Cada candidato só pode apresentar uma solução.
Os documentos que constituem as soluções são obrigatoriamente redigidos em
língua portuguesa, salvo o disposto em sentido inverso no convite efetuado.
Após a apresentação das soluções, o júri elabora um relatório preliminar onde
deve propor fundamentadamente a admissão e a exclusão das soluções apresentadas,
após o que procede à audiência prévia dos candidatos.
Cumprido o ato de audiência prévia, o júri elabora um relatório final
fundamentado, mantendo ou modificando o teor e as conclusões do relatório preliminar.
O órgão competente para a decisão de contratar notifica a decisão de admissão e
de exclusão das soluções, acompanhada do relatório final, em simultâneo, a todos os
candidatos qualificados.
O júri do procedimento estabelece com os candidatos qualificados cujas
soluções tenham sido admitidas um diálogo com vista a discutir todos os aspetos nelas
previstos ou omitidos relativos à execução do contrato a celebrar e que permitam a
elaboração do caderno de encargos.
O júri notifica os candidatos qualificados cujas soluções tenham sido admitidas,
com uma antecedência mínima de três dias, da data, da hora e do local da primeira
sessão de diálogo, agendando as restantes sessões nos termos que tiver por
convenientes.

DANIEL LOURENÇO
252
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Na fase de diálogo, o júri reúne sempre em separado com cada candidato


qualificado, devendo garantir a igualdade de tratamento de todos eles, designadamente
não facultando, de forma discriminatória, informações que possam dar vantagem a uns
relativamente a outros.
Os candidatos devem fazer-se representar nas sessões da fase do diálogo pelos
seus representantes legais ou pelos representantes comuns dos agrupamentos
candidatos, se existirem, podendo ser acompanhados por técnicos por eles indicados.
O diálogo com os candidatos prossegue até o júri:
(1) Identificar, se necessário por comparação, a solução suscetível de
satisfazer as necessidades e as exigências da entidade adjudicante;
(2) Declarar que nenhuma das soluções apresentadas e discutidas satisfaz as
necessidades e as exigências da entidade adjudicante.
Concluída a fase do diálogo, o júri elabora um relatório fundamentado, no qual
propõe, clara e distintamente, a solução suscetível de satisfazer as necessidades e as
exigências da entidade adjudicante ou, em alternativa, que nenhuma das soluções
apresentadas satisfaz aquelas necessidades e exigências. Cabe ao órgão competente para
a decisão de contratar decidir sobre a aprovação de todas as propostas contidas no
relatório.
O órgão competente para a decisão de contratar notifica todos os candidatos
qualificados cujas soluções tenham sido admitidas da decisão tomada, nomeadamente
para feitos de convite à apresentação de propostas, remetendo–lhes o relatório.

5. APRESENTAÇÃO, ANÁLISE DAS PROPOSTAS E DA


ADJUDICAÇÃO, HABILITAÇÃO, CAUÇÃO, CONTRATO E
PUBLICITAÇÃO (artigos 217.º e 218.º)
Caso tenha sido identificada uma solução suscetível de satisfazer as
necessidades e as exigências da entidade adjudicante, o órgão competente para a decisão
de contratar envia a todos os candidatos qualificados cujas soluções tenham sido
admitidas, simultaneamente com a notificação referida, um convite à apresentação de
propostas.

DANIEL LOURENÇO
253
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Para além dos elementos previstos nos n.ºs 2 a 4 do artigo 189.º, o convite à
apresentação das propostas deve:
⎯ indicar o modelo de avaliação das mesmas;
⎯ ser acompanhado do caderno de encargos ou da indicação do endereço
do sítio da Internet onde este é disponibilizado.
Não pode ser fixado um prazo para a apresentação das propostas inferior a 40
dias a contar da data do envio do convite.
As propostas são analisadas em todos os seus atributos representados pelos
fatores e subfatores que densificam o critério de adjudicação.
O júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos
sobre as propostas que considere necessários para efeito de análise e de avaliação das
mesmas. Os esclarecimentos fazem parte integrante das propostas e devem ser
disponibilizados em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, devendo
todos os concorrentes ser imediatamente notificados desse fato.
A decisão de adjudicação é notificada, em simultâneo, a todos os concorrentes.
Juntamente com a notificação da decisão de adjudicação, o órgão competente
para a decisão de contratar deve notificar o adjudicatário para:
▪ Apresentar os documentos de habilitação;
▪ Prestar caução, se esta for devida;
▪ Confirmar no prazo para o efeito fixado, se for o caso, os
compromissos assumidos por terceiras entidades relativos a atributos
ou a termos ou condições da proposta adjudicada.
Quando o procedimento de formação do contrato tenha sido publicitado através
de anúncio publicado no Jornal Oficial da União Europeia, a entidade adjudicante deve
publicar no referido jornal, no prazo de 30 dias após a celebração de um contrato, um
anúncio conforme modelos constantes do anexo V da Diretiva n.º 2014/24/UE, ou do
anexo XII da Diretiva n.º 2014/25/UE, ambas do Parlamento Europeu e do Conselho, de
26 de fevereiro, consoante o caso.
Salvo o disposto no artigo 95.º, o contrato deve ser reduzido através da
elaboração de um clausulado em suporte papel ou em suporte informático com a
aposição de assinaturas eletrónicas.

DANIEL LOURENÇO
254
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O contrato é publicitado pela entidade adjudicante no portal da internet dedicada


aos contratos públicos.

6.8. Parceria Para A Inovação

Fases principais:
1. Anúncio
2. Convite à apresentação de propostas de projetos de investigação e
desenvolvimento
3. Negociação das propostas de projetos de investigação e
desenvolvimento
4. Análise das propostas e celebração da parceria

O procedimento de parceria para a inovação destina-se à realização de atividades


de investigação e desenvolvimento de bens, serviços ou obras inovadoras, com vista à
posterior aquisição destes bens, serviços ou obras, desde que se cumpram os níveis de
desempenho de preços máximos previamente acordados.
O procedimento pode ser adotado quando a entidade adjudicante pretender
adquirir um bem, um serviço ou uma obra pública com determinadas características que
não encontra no mercado. O objetivo será o de encontrar parceiro(s) que desenvolva(m)
atividades de investigação e desenvolvimento para, eventualmente, se adquirir o
resultado dessas atividades.
A parceria para a inovação integra as seguintes fases, as quais podem ser
adaptadas em função da complexidade e relevância financeira da parceria a celebrar:
▪ Fase de apresentação das candidaturas, podendo a respetiva seleção incluir
a qualificação dos candidatos quando se trate do desenvolvimento de
projetos dotados de especial complexidade;
▪ Fase de apresentação de propostas de projetos de investigação e
desenvolvimento;
▪ Fase de análise das propostas de projetos de investigação e celebração da
parceria.

DANIEL LOURENÇO
255
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

A parceria para a inovação não pode ser utilizada com o intuito de restringir ou
falsear a concorrência.
À parceria para a inovação aplica -se supletivamente o regime previsto para o
procedimento de negociação.

1. ANÚNCIO (artigo 162.º)


Trata-se de um procedimento concorrencial, dado a conhecer através de anúncio
publicado no Diário da República, e também no Jornal Oficial da União Europeia
quando o valor do contrato a celebrar for superior aos limiares Europeus (artigo 162.º e
seguintes do CCP). O mesmo é elaborado conforme modelo aprovado por portaria dos
membros do Governo responsáveis pela edição do Diário da República e pelas áreas das
finanças e das obras públicas.
O anúncio ou o resumo dos seus elementos mais importantes pode ser
posteriormente divulgado por qualquer outro meio considerado conveniente,
nomeadamente através da sua publicação em plataforma eletrónica utilizada pela
entidade adjudicante.

2. CONVITE À APRESENTAÇÃO DE PROPOSTAS DE PROJETOS DE


INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
Nas peças do procedimento a entidade adjudicante deve:
(1) Identificar a necessidade de bens, serviços ou obras inovadores que não
possam ser obtidos mediante a aquisição de bens, serviços ou obras já
disponíveis no mercado, indicando ainda os requisitos mínimos que
concretizam a necessidade;
(2) Definir as disposições aplicáveis aos direitos de propriedade intelectual;
(3) Incluir os requisitos inerentes às capacidades que os concorrentes devem
possuir no domínio da investigação e desenvolvimento, bem como no
desenvolvimento e implementação de soluções inovadoras.

A entidade adjudicante deve enviar aos candidatos admitidos, em simultâneo,


um convite à apresentação de propostas de projetos de investigação e desenvolvimento

DANIEL LOURENÇO
256
PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

suscetíveis de satisfazer as necessidades e as exigências identificadas nas peças do


procedimento.
O convite à apresentação das propostas de projetos de investigação e
desenvolvimento deve indicar:
(1) A identificação do procedimento de parceria para a inovação;
(2) A referência ao anúncio do procedimento de parceria para a inovação;
(3) O prazo de apresentação das propostas de projetos de investigação e
desenvolvimento elaboradas pelos concorrentes qualificados.
Cada concorrente só pode apresentar uma proposta de projeto de investigação e
desenvolvimento.

3. NEGOCIAÇÃO DAS PROPOSTAS DE PROJETOS DE


INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

⎯ As entidades adjudicantes devem negociar com os concorrentes a


proposta inicialmente apresentada por cada um deles, bem como todas
as propostas posteriormente apresentadas, com exceção da proposta
final de cada um, sendo o critério de adjudicação o da proposta
economicamente mais vantajosa.
⎯ O critério de adjudicação é o da proposta economicamente mais
vantajosa na forma da melhor relação qualidade-preço, na qual o critério
de adjudicação é composto por um conjunto de fatores, e eventuais
subfatores, relacionados com diversos aspetos da execução do contrato a
celebrar
⎯ Os requisitos mínimos e o critério de adjudicação, incluindo os seus
fatores e subfatores, não podem ser objeto de negociação.

4. ANÁLISE DAS PROPOSTAS E CELEBRAÇÃO DA PARCERIA


Na fase de análise das propostas de projetos de investigação é elaborado o
relatório preliminar, fixado um prazo aos concorrentes, para que se pronunciem, por
escrito, ao abrigo do direito de audiência prévia, e redigido um relatório final

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

fundamentado, no qual o júri pondera as observações dos concorrentes efetuadas ao


abrigo do direito de audiência prévia, mantendo ou modificando o teor e as conclusões
do relatório preliminar.
A entidade adjudicante pode decidir estabelecer a parceria para a inovação com
um só concorrente ou com vários concorrentes, designados parceiros, competindo, neste
caso, a cada um deles realizar atividades de investigação e desenvolvimento distintas.
A parceria para a inovação deve ser estruturada em fases sucessivas de acordo
com a sequência de etapas do processo de investigação e desenvolvimento, que pode
incluir o fabrico do bem, a prestação do serviço ou a realização da obra.
A parceria para a inovação deve fixar as metas intermédias que devem ser
alcançadas pelos parceiros e prever o pagamento de remuneração em frações adequadas.
A entidade adjudicante é livre de, no final de cada fase, decidir pôr termo à
parceria ou, no caso de parceria com vários parceiros, reduzir o número de parceiros
pondo termos a contratos individuais, desde que tal possibilidade e respetivas condições
estejam previstas nas peças do procedimento.
A entidade adjudicante deve assegurar que a estrutura da parceria, em especial, a
duração e o valor das diferentes fases refletem o grau de inovação da solução proposta e
a sequência das atividades de investigação, desenvolvimento e inovação necessárias
para o desenvolvimento de uma solução inovadora que ainda não se encontre disponível
no mercado.
Para efeitos do disposto no número anterior, o valor estimado dos
fornecimentos, serviços ou obras não deve ser desproporcionado em relação ao
investimento exigido para o respetivo desenvolvimento.

6.9. Concurso De Conceção (artigos 219º-A a 219º-J)


O concurso de conceção é um instrumento procedimental especial que permite à
entidade adjudicante selecionar um ou mais trabalhos de conceção, ao nível de estudo
prévio ou similar, nomeadamente nos domínios artístico, do ordenamento do território,
do planeamento urbanístico, da arquitetura, da engenharia ou do processamento de
dados.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

O concurso de conceção reveste, em regra, a modalidade de concurso público,


podendo ser adotada, nos casos em que se exija a avaliação de capacidade técnica dos
candidatos, a modalidade de concurso limitado por prévia qualificação.
Ao concurso de conceção podemos incluir a possibilidade de criação de um
Concurso de Ideias, sendo que as suas disposições estão vertidas no art.º 219º-J.
Na sequência de um concurso de conceção, a entidade adjudicante pode,
posteriormente, e desde que tenha manifestado expressamente essa intenção, adquirir,
por ajuste direto ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 27.º do CCP, planos, projetos
ou quaisquer criações conceptuais que consistam na concretização ou no
desenvolvimento do trabalho, ou trabalhos, que tenham sido selecionados no âmbito do
concurso de conceção.

6.10. Concurso de Ideias (Artigo 219º-A A 219º-J)


O objetivo do Concurso de Ideias é de adquirir uma ou várias propostas de
ideias, remuneradas através da atribuição de um prémio apropriado. Para este tipo de
procedimento cumprem-se as disposições vertidas nos artigos de Concurso de
Conceção.

6.11. Sistema De Aquisição Dinâmico (artigos 237.º ao 241.º-D)


À semelhança da formação de Acordos Quadro, a entidade adjudicante pode,
através de um sistema de aquisição dinâmico celebrar contratos de locação ou de
aquisição de bens móveis ou de aquisição de serviços de uso corrente, bem como
contratos de empreitada de obras públicas de complexidade técnica reduzida, cujas
características e modos de execução genericamente disponíveis no mercado satisfaçam
as suas necessidades.
O sistema de aquisição dinâmico rege-se, com as necessárias adaptações, pelas
disposições que regulam o concurso limitado por prévia qualificação.
Pode ser instituído por centrais de compras para a celebração de contratos por
parte das entidades adjudicantes por ele abrangidas.

DANIEL LOURENÇO
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PROFESSORA MARIA JOÃO ESTORNINHO

Fases do sistema
O sistema de aquisição dinâmico compreende as seguintes fases:
a. Instituição do sistema, divulgado através da publicação de anúncio no
Diário da República e no Jornal Oficial da União Europeia, quando
obrigatório, nos termos das alíneas b) ou c) do n.º 3 do artigo 474.º;
b. Apresentação das candidaturas e qualificação dos candidatos, a qual se
prolonga durante o período de vigência do sistema de aquisição
dinâmico;
c. Apresentação e análise das propostas e adjudicação.

DANIEL LOURENÇO
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