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06/12/2020 A lucrativa exploração do pau-brasil na América portuguesa

A lucrativa exploração do pau-


brasil na América portuguesa
11 de abril de 2017

O pau-brasil, caesalpinia brasiliensis ou echinata, segundo a taxionomia botânica atual, ou simplesmente ibirapitanga,
em tupi, teve importância extraordinária na história do Brasil. Seu comércio foi a principal atividade econômica dos
portugueses na América até cerca de 1530, mas sua exploração continuou ativa durante todo o período colonial,
gurando com destaque nas exportações brasileiras ainda na segunda metade do século XIX.

O pau-brasil antes do Brasil


Desde a Idade Média, o pau-brasil era conhecido na Europa, sob outra variedade originária da Sumatra, no Oriente, em
malaio, de sapang (do sânscrito patanga ou “vermelho”). Era usado  para tingir sedas e linhos usados pelos nobres do
Oriente. Como tintura sua cor variava do marrom ao castanho-claro e, conforme a diluição e as misturas, podia resultar
em tons de rosa, castanho e púrpura.

Na Europa, os maiores consumidores do pau-de-tinta eram a França, onde era chamada de brezil, e a Itália que a
denominava bracire ou brazili. Com o nome de brasil, a árvore já era conhecida em Portugal e Espanha por volta de
1220.

Tintureiros tingindo tecidos com pigmento extraído do pau-brasil. Iluminura


francesa, séc. XVI

Cristóvão Colombo foi o primeiro a ver árvores de pau-brasil crescendo em meio às orestas do Caribe, e registrou sua
existência na carta que enviou aos Reis Católicos, em 1495. Em sua terceira viagem à América, em 1498, Colombo
recolheu 20 quintais (pouco mais de uma tonelada) da madeira nas matas do golfo de Pária, na Venezuela, e os levou

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para Sevilha.

Em janeiro de 1500, o espanhol Vicente Pinzón carregou seus navios com 350 quintais (ou 21 toneladas) de pau-brasil,
recolhidos nas praias do nordeste do Brasil, ou talvez na região de Pária, levando-os à Espanha.

A exploração do pau-brasil nas terras portuguesas


O pau-brasil crescia em meio à Mata Atlântica, entre o Rio Grande do Norte e o Rio de Janeiro, concentrando-se nas
costas que hoje correspondem ao Rio de Janeiro, sul da Bahia e Pernambuco.

A própria expedição de Cabral parece ter embarcado alguma quantidade de toras de pau-brasil e quase todas as
expedições de reconhecimento ou guarda-costas enviaram toneladas de pau-brasil para Portugal que seguiam daí para
Amsterdam, onde o pó da madeira raspada era transformado em corante.

Em 1501, a exploração de pau-brasil foi arrendada ao mercador Fernando de Noronha ou Loronha que, em 1504, foi
agraciado com a donataria no arquipélago que traz hoje o seu nome. O contrato de arrendamento foi renovado até
1511, depois transferido a Jorge Lopes Bixorda. De 1513 em diante, permitiu-se a livre exploração mediante o
pagamento do quinto (20%) ao rei.

A exploração do pau-brasil foi feita num ritmo tão feroz que só no primeiro século de exploração, cerca de 2 milhões de
árvores foram derrubadas – uma espantosa média de 20 mil por ano ou quase 50 por dia. Cada navio podia levar cerca
de 5 mil toras por viagem. Não é de se estranhar, portanto, que já em 1558, as melhores árvores só pudessem ser
encontradas a mais de 20 km da costa.

Feitorias, “brasileiros” e regimentos


O negócio do pau-brasil estimulou a fundação de feitorias em toda a costa brasílica. As feitorias eram simples galpões
de madeira, cercado por uma paliçada de toras pontiagudas, tendo por mobília apenas arcas e caixotes e onde, ao
longo do ano, cavam apenas três ou quatro homens. Eles eram chamados de “brasileiros”. O nome dado a esses
tra cantes ou coletores de pau-brasil acabaria se estendendo a todos os nascidos no futuro país.

Em 1519, havia três feitorias no Brasil: em Cabo Frio, Rio de Janeiro e Pernambuco. Provavelmente havia uma quarta, na
baía de Todos os Santos. A exploração do pau-brasil e a disciplina dos “brasileiros” eram reguladas por normas rígidas
estabelecidas pela Coroa lusitana. O primeiro desses regulamentos parece datar de 1511. Trata-se do famoso Livro da
viagem e regimento da nau Bretoa, descoberto por Adolfo Varnhagen na Torre do Tombo, em Lisboa, em 1844.

A Bretoa pertencia a um consórcio de mercadores formado por Fernando de Noronha, pelo banqueiro orentino
Bartolomeu Marchioni, Benedeto Moreli e Francisco Martins. A tripulação do navio era constituída por 36 homens. De
acordo com o regimento real, a missão da Bretoa era “obter a maior carga de pau-brasil de boa qualidade, com a menor
despesa possível”.

A nau partiu de Lisboa em fevereiro de 1511 e aportou em abril na baia de Todos os Santos onde permaneceu por 27
dias. Depois rumou para Cabo Frio onde se erguia a mais antiga feitoria do Brasil, fundada por Américo Vespúcio sete
anos antes. Em agosto, a Bretoa zarpou do Brasil levando 5.008 toras de pau-brasil pesando cerca de 100 toneladas,
além de mais de 60 animais entre eles 15 papagaios, 12 felinos e 6 macacos.

O regimento da nau Bretoa incluía uma vasta lista de proibições impostas aos marujos como a proibição de ultrapassar
os limites da feitoria, de adentrar a terra rme, de falar ou negociar com os índios, de pernoitar fora da nau, de praguejar
etc. As normas rígidas e as punições severas aos infratores não conseguiram evitar o roubo de machados e
machadinhas por tripulantes que foram usados para trocar por aves, penas e macacos com os índios.

Piratas e corsários franceses


Piratas e corsários agiam da mesma maneira: abordavam e pilhavam navios, praticavam violências contra tripulações,
atacavam áreas costeiras saqueando e fazendo vítimas. Diferenciavam-se, porém, quanto à sua organização e mando.
A pirataria era uma iniciativa autônoma, impulsionada por interesses materiais, sem qualquer consideração ética ou
religiosa. O corsário, por sua vez, atuava dentro de uma certa “legalidade” munido de uma “carta de corso” concedida
por reis e príncipes autorizando o ataque a áreas inimigas.
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As descobertas marítimas impulsionaram a pirataria do Mediterrâneo para o Atlântico. As costas do Brasil estavam
muito mais próximas dos portos europeus do que a Índia ou Sumatra. Os franceses foram os primeiros a investirem
conta o litoral do Brasil.

O painel “L’Isle du Brésil”, entalhado em madeira de pau-brasil, no século XVI, mostra índios brasileiros derrubando as árvores e levando as
toras nos ombros. O painel decorava a parede de uma estalagem em Rouen, na Normandia, França. Tem 2 m de comprimento, 50 cm de
largura e 6 cm de espessura. Museu Marítimo de Rouen, França.

Em junho de 1503, Paulmier de Gonneville armou um navio de 120 toneladas, o L’Espoir, para saquear especiarias no
mercado indiano. Impossibilitado de manter o rumo, arribou às costas do Brasil. Foi a primeira visita francesa ao Brasil,
seguida de muitas outras.

O L’Espoir aportou no litoral norte de Santa Catarina onde permaneceu seis meses ancorado. Foi, contudo, na baía de
Todos os Santos que ele abasteceu o navio com uma preciosa carga de pau-brasil. Ao retornar à Europa, o navio foi
atacado primeiro por um pirata inglês e depois por um pirata bretão. Em maio de 1505, os poucos sobreviventes do
L’Espoir chegaram a pé em Hon eur sem navio e sem carga.

Embora a viagem de Paulmier de Gonneville tenha sido um fracasso comercial, ela alertou de nitivamente os franceses
para a existência do Brasil. O rei francês Francisco I, contestando o Tratado de Tordesilhas que dividia a mundo entre
Portugal e a Espanha, autorizou corsários a atacarem as terras lusas no Oriente e na América.

Em maio de 1527, corsários franceses chegaram a Pernambuco dispostos a carregar os navios com pau-brasil. Foram
interceptados pela expedição guarda-costa de Cristóvão Jacques. O combate que se travou foi violento com dezenas
de mortos e tamanha a crueldade com os prisioneiros que o rei de português destituiu Cristóvão Jacques e exigiu seu
regresso imediato.

Outro painel da série “L’Isle du Brésil”. Originalmente, ele decorava uma estalagem em Rouen. Madeira de pau-brasil entalhada, século XVI.
Museu Marítimo de Rouen, França.

Mas os ataques de piratas e corsários continuaram. Em setembro de 1531, os portugueses capturaram próximo ao
estreito de Gibraltar, no Mediterrâneo, a nau La Pelèrine que retornava do Brasil com o porão cheio de pau-brasil: 15 mil
toras (300 toneladas), 3 mil peles de onça, 600 papagaios, 1,8 toneladas de algodão, além de óleos medicinais, pimenta,
semente de algodão.

Esta disputa luso-francesa teve desdobramentos nas relações entre europeus e indígenas, forjando-se e desfazendo-se
alianças que os nativos souberam conduzir com habilidade, ao passo que os europeus em con ito se esforçaram para
deles se aproximar.

A mão de obra indígena


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O papel dos índios foi fundamental no processo de exploração do pau-brasil, pois eram eles que derrubavam as árvores,
cortavam as toras e as transportavam para os navios. Era trabalho árduo considerando-se o tamanho das árvores, a
espessura dos troncos e seu peso. Os troncos, duríssimos, variando de 20 a 30 metros de altura, depois de cortados,
eram transformados em toras de cerca de 1,5 metros que podiam pesar até 30 quilos cada uma. Jean de Léry
descreveu o trabalho estafante dos índios nas lides do pau-brasil que carregavam nos ombros nus por duas a três
léguas (de 13 a 20 quilômetros).

Índios cortam as toras de pau-brasil. Detalhe do mapa “Terra Brasilis”, Atlas Miller,
1519, Biblioteca Nacional da França.

Em troca desse serviço, os nativos recebiam facas, espelhos, miçangas, tesouras, agulhas, foices e, decerto, machados
de ferro para cortarem os troncos. A difusão do uso desses machados em substituição aos de pedra aumentou
imensamente a produtividade do trabalho, reduzindo em mais de dez vezes o tempo para derrubada dos troncos. Daí
entender que no século XVI mais de 2 milhões de árvores tenham sido derrubadas e reduzidas a toras.

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Os índios, por sua vez, souberam aproveitar a tecnologia dos instrumentos europeus para benefício próprio, incluindo
machados e facas de metal nas suas guerras e nas atividades de subsistência.

Infográ co
O infográ co abaixo traz mais informações sobre a exploração do pau-brasil até a atualidade. Para imprimi-lo em
tamanho A-4, clique aqui.

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Transcrição do infográ co

Histórico
1500: Pedro Álvares Cabral chega ao Brasil e envia embarcação para Portugal com a carta de Pero Vaz de Caminha e
amostras de produtos da terra, como o pau-brasil.

1501: A Coroa portuguesa impõe o monopólio sobre o pau-brasil e arrenda o direito de extração a particulares.
Fernando de Noronha foi o primeiro arrendatário. Em 1504, ele se torna capitão-donatário da ilha que hoje leva seu
nome (primeira capitania do Brasil).

1511: A Nau Bretoa leva da Bahia para Portugal os primeiros 36 índios escravizados, animais (papagaios, araras,
macacos, felinos etc.) e 300 troncos de pau-brasil. Calcula-se que, nos primeiros anos, os portugueses coletaram cerca
de 1200 toneladas/ano de pau-brasil.

1516: Expedição de Cristóvão Jacques, a primeira guarda-costeira, persegue tra cantes de pau-brasil, principalmente
franceses. Em 1526, aprisiona na Bahia 300 franceses que são executados.

1530: Tra cantes franceses destroem feitoria de Pernambuco e extraem pau-brasil na costa usando mão de obra
indígena.

1531: Expedição de Martim Afonso de Souza marca o início da colonização por meio da exploração agrícola da terra. A
atividade extrativista de pau-brasil continua monopólio real. A madeira representa, então, 30% dos produtos brasileiros
exportados para Portugal.

1578: O corsário inglês Francis Drake extrai pau-brasil no Maranhão. Calcula-se que os tra cantes franceses, ingleses e
espanhóis tenham provocado a extração de 12 mil toneladas de pau-brasil por ano.

1605 – 1607: Ao iniciar o século XVII, cerca de 2 milhões de árvores de pau-brasil já tinham sido derrubadas, afetando 6
mil km2 da Mata Atlântica. A Coroa cria a função de guarda orestal para controlar o desmatamento; a penalidade para
a extração ilegal era pena de morte.

1824 – 1829: A Constituição imperial preserva o monopólio do pau-brasil. A vigilância das reservas orestais é
responsabilidade do conselho fazendário do Rio de Janeiro. Em 1826, passou para os juízes de paz, autoridades eleitas
e subservientes aos proprietários locais.

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1859: Abolido o monopólio real do pau-brasil. Poucos anos antes, a exportação da madeira corante havia se reduzido
muito com a invenção de corantes de alcatrão mineral.

1875: Entra no mercado a anilina, corante sintético para tecidos que substitui o pau-brasil como matéria prima para a
indústria têxtil. O pau-brasil passa a ser usado na fabricação de violino, arcos de violino e violoncelos.

1924: O poeta Oswald de Andrade usa o nome pau-brasil para chamar seu Manifesto da Poesia que lançou as bases da
poesia modernista de caráter primitivista, sem arcaísmos e erudição, e de valorização da cultura brasileira.

1978: A Lei 6.607, de 7 de dezembro de 1978, declara o Pau-Brasil Caesalpinia echinata a árvore nacional do Brasil.

1998 – 2000: A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) mapeia, no sul da Bahia, as últimas 277
árvores de pau-brasil nascidas naturalmente em solo brasileiro. Executa-se um projeto para o repovoamento  de áreas
da Mata Atlântida.

Curiosidades
Os europeus conheciam o pau-brasil desde o século XI. Havia uma espécie de árvore semelhante em Sumatra, no
Sudeste Asiático. De seu tronco extraía-se um corante para tecidos.
Antes da chegada dos europeus, o pau-brasil crescia em abundância em meio à Mata Atlântica brasileira, que se
estendia na faixa litorânea, de norte a sul do Brasil.
A árvore do pau-brasil alcança entre 10 e 15 metros de altura e possui tronco reto, com casca cor cinza-escuro. As
ores possuem quatro pétalas amarelas e uma menor vermelha, muito aromáticas.
O pau-brasil era encontrado também nas orestas da Venezuela e do Caribe.

Fonte
VAINFAS, Ronaldo (direção). Dicionário do Brasil Colonial (1500-1808). Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
DEAN, Warre. A ferro e fogo. A história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo: Companhia das
Letras, 1986
HOLANDA, Sérgio B. de & PANTALEÃO, Olga. “Franceses, holandeses e ingleses no Brasil quinhentista”. In: HGCB.
São Paulo: Difel, v. 1.
MAESTRI, Mário. “No tempo do pau-brasil”. D.O. Leitura. São Paulo, 9 (105): 2-3, 1991.

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