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A expedição de Pedro Álvares Cabral

A expansão portuguesa por outros continentes teve início em 1415 com a tomada da cidade de Ceuta, no norte da África.
Em 1488, o navegador Bartolomeu Dias ultrapassou o Cabo da Boa Esperança, ao sul da atual Cidade do Cabo, no sul
da África. Dez anos depois, em 1498, Vasco da Gama chegava finalmente a Calicute, na Índia. A expedição de Vasco
da Gama retornou a Portugal com os navios carregados de produtos orientais.
Diante do sucesso do empreendimento, a Coroa portuguesa organizou outra expedição rumo ao Oriente. O comando
coube ao navegador Pedro Álvares Cabral, à frente de treze navios. O caminho seguido por ele deveria ser o mesmo que
levou Vasco da Gama às Índias, contornando a costa africana. Entretanto, Cabral se afastou da rota e velejou em direção
ao sudoeste. Em 22 de abril de 1500, ele e seus homens avistaram terra e aportaram no litoral sul do atual estado da
Bahia, como você viu na abertura do capítulo.
O desvio da frota foi grande: do litoral africano até a América do Sul, os navegadores percorreram mais de 3 mil
quilômetros por mar aberto. Para alguns historiadores, isso indica que a Coroa portuguesa pretendia estabelecer seu
domínio sobre terras situadas a leste da Linha de Tordesilhas, como lhe garantia o tratado firmado com a Espanha em
1494. Durante os dez dias que passaram nas terras que os povos Tupi chamavam de Pindorama, os portugueses fizeram
contatos amistosos com mais de quatrocentos nativos, segundo o relato de Pero Vaz de Caminha em sua carta ao rei de
Portugal.
Os primeiros contatos
Os portugueses não encontraram de imediato os tão cobiçados metais preciosos. Por essa razão, nas terras americanas,
a Coroa limitou-se inicialmente a enviar expedições com o fim de estudar a costa do território. Nos primeiros anos, as
relações entre portugueses e indígenas foram marcadas por um estranhamento mútuo.
Os europeus não compreendiam o modo de vida, a organização social dos povos indígenas e a ausência de propriedade
privada da terra, e ficavam chocados com a antropofagia. Por sua vez, os indígenas estranhavam a aparência dos
portugueses, de pele clara, com barbas longas e muitas roupas. Apesar do espanto e da incompreensão mútua, os
primeiros contatos entre as duas culturas foram pacíficos. A fim de obter mão de obra para seus empreendimentos na
América, porém, os portugueses escravizaram um considerável número de nativos, e isso gerou violentos conflitos, nos
quais morreram milhares de indígenas.
Outro fator que contribuiu para a morte de muitos nativos foi a disseminação de doenças trazidas pelos europeus, como
a varíola, a gripe, o sarampo, a tuberculose e a lepra. Os indígenas não apresentavam imunidade contra essas doenças,
e o contato com elas teve um efeito devastador nas populações nativas.
Sociedades indígenas e a ação colonizadora
Quando os portugueses chegaram às terras que viriam a ser o Brasil, no final do século XV, viviam no território em
torno de 1 milhão de indivíduos, distribuídos em mais de mil povos indígenas, que falavam cerca de 1.300 línguas.
As sociedades indígenas não se organizavam em torno de um Estado. Os diversos grupos dividiam-se em aldeias de
instalação temporária. Em cada uma delas, havia um pajé (responsável pelos rituais religiosos) e um cacique como líder.
No entanto, essa liderança não era absoluta.
Caso os membros da aldeia discordassem de uma decisão do cacique, poderiam ignorá-la.
Para os portugueses, essa falta de hierarquia social, assim como a inexistência de cidades ou de comércio, bem como
algumas práticas culturais (como a antropofagia e a poligamia), demonstravam atraso. Esses motivos estavam entre os
que levaram os colonizadores a acreditar que deveriam “civilizar” os nativos. Para tal, fundaram missões jesuíticas,
destinadas a convertê-los ao cristianismo e acostumá-los ao modo de vida europeu.
Desse modo, os portugueses, embora tenham utilizado os conhecimentos indígenas para sobreviver em suas possessões
– como técnicas de caça e coleta e de percepção da aproximação de animais perigosos –, reproduziram na colônia o
modelo administrativo europeu. Além disso, aproveitaram-se das rivalidades entre os vários povos indígenas,
estabelecendo alianças para enfrentar os que eram considerados inimigos. Aliaram-se, por exemplo, aos Tupiniquim
para combater o grupo dos chamados Botocudos, que apresentavam maior resistência à colonização portuguesa – e por
isso foram exterminados ou expulsos das regiões em que viviam.
A extração do pau-brasil
Embora o interesse pelas terras americanas não fosse de início muito grande, a Coroa portuguesa decidiu enviar algumas
expedições para reconhecer o território. Os exploradores perceberam que uma árvore nativa, abundante no território,
poderia ser explorada comercialmente: o pau-brasil.
O pau-brasil é uma árvore originária da Mata Atlântica, alta e coberta de espinhos. Os europeus extraíam de seu tronco
pigmentos vermelhos, muito valorizados na Europa, que eram utilizados para tingir tecidos. Na Ásia, eles já tinham
encontrado uma espécie muito semelhante, utilizada para fabricar corantes e objetos de uso cotidiano, como móveis e
utensílios domésticos.
Além disso, a extração do pau-brasil não exigia a fixação dos portugueses no território. Por isso, em vez de povoados,
eles fundaram feitorias, entrepostos comerciais fortificados, ao longo da costa, que serviam para estocar a madeira,
abastecer os navios e proteger os exploradores de ataques de indígenas e incursões estrangeiras.
A prática do escambo
A exploração do pau-brasil foi a principal atividade econômica dos portugueses nos primeiros anos após a chegada à
América. Os indígenas trabalhavam na extração e no transporte da madeira,
em troca, recebiam roupas, facas, ferramentas e outros objetos trazidos pelos portugueses. Essa prática comercial é
conhecida como escambo. Sabendo do valor comercial do pau-brasil, a Coroa decretou o monopólio real sobre o
produto. Isso significava que, para explorar a madeira, era necessária a autorização do rei de Portugal. Fernão de
Noronha, um dos principais comerciantes portugueses daquela época, foi o primeiro a conseguir a autorização real para
comerciar o produto, em 1503. Ele se comprometeu a enviar ao Brasil seis navios por ano para explorar a costa e a
construir feitorias para proteger o litoral contra possíveis invasões.
O início da colonização
Ingleses, holandeses e franceses não reconheciam a divisão estabelecida pelo Tratado de Tordesilhas e não aceitavam o
monopólio português no comércio do pau-brasil. Por isso, as invasões de exploradores europeus na costa brasileira eram
constantes e ameaçavam o domínio de Portugal sobre as terras americanas. Outros problemas afetavam igualmente as
atividades comerciais de Portugal. Mercadores turcos, holandeses e da Península Itálica disputavam o controle do
comércio de especiarias do Oriente. Os muçulmanos retomaram o norte da África e tornaram-se importantes
concorrentes dos comerciantes portugueses lá estabelecidos. Para assegurar ao menos o controle das terras americanas,
a Coroa portuguesa decidiu colonizar efetivamente o Brasil.
A expedição de Martim Afonso de Sousa
Decidido a colonizar o território, em dezembro de 1530 o rei de Portugal, D. João III, enviou ao Brasil uma expedição
comandada pelo militar português Martim Afonso de Sousa. Com ele vieram cerca de quinhentos homens para expulsar
os franceses do litoral, fundar núcleos de povoamento e avançar na exploração do território da colônia.
Os primeiros núcleos de povoamento fundados no Brasil foram São Vicente, no litoral, e Santo André da Borda do
Campo, no Planalto de Piratininga, ambos no território correspondente ao do atual estado de São Paulo. Em São Vicente,
os portugueses testaram com sucesso a cultura da cana-de-açúcar. Martim Afonso de Sousa, entusiasmado com a
descoberta de prata na América espanhola, também enviou alguns homens para o interior da colônia com o objetivo de
encontrar
metais preciosos.
As capitanias hereditárias
A partir de 1534, o rei D. João III implantou na colônia o sistema de capitanias hereditárias. A colônia foi dividida
em quinze faixas de terra, que iam do litoral até a linha imaginária do Tratado de Tordesilhas.
As capitanias foram entregues a particulares, chamados capitães-donatários. Eles eram a principal autoridade na sua
capitania e tinham o compromisso de torná-la produtiva. Por não serem os proprietários das terras que recebiam, só
tinham o direito de explorá-las.
Caso um donatário morresse, a capitania era transferida a seu filho mais velho. Para isso, era estabelecido um
compromisso por meio da Carta de Doação. Os direitos e deveres dos donatários foram instituídos pelo Foral. De
acordo com esse documento real, os capitães-donatários podiam ficar com uma parte dos tributos arrecadados, fundar
vilas, alistar colonos para fins militares e conceder sesmarias (grandes extensões de terra doadas àqueles que tinham
condições de torná-las produtivas).
O governo-geral
Apenas as capitanias de São Vicente e Pernambuco progrediram. As demais falharam em razão da falta de recursos e
da dificuldade de comunicação com a Coroa portuguesa, além dos conflitos com os indígenas. Diante desse quadro, em
1548 a metrópole decidiu centralizar a administração da colônia. Para isso, criou o governo-geral. Tomé de Sousa foi
o primeiro governador-geral do Brasil. Ele chegou à Bahia em 1549, acompanhado de um grupo de funcionários reais,
trabalhadores, degredados e jesuítas liderados pelo padre Manuel da Nóbrega. Na capitania, Tomé de Sousa fundou a
cidade de Salvador, que se tornou a primeira capital da colônia.
O governador-geral devia promover a exploração econômica da colônia, proteger o território e incentivar a
evangelização dos indígenas. Três outros administradores auxiliavam o governador-geral: o ouvidor-mor, que cuidava
da justiça, o provedor-mor, que cobrava os tributos e zelava
pelo Tesouro Real, e o capitão-mor, responsável pela defesa da colônia.
As câmaras municipais
Câmaras municipais são órgãos do Poder Legislativo que existem desde o período colonial. Elas foram criadas para
administrar as vilas e as cidades da colônia portuguesa na América. Somente os chamados “homens bons”, ou seja,
homens brancos e proprietários de terras, podiam participar das eleições para ocupar os cargos em uma câmara. Os
proprietários de terras eram os homens mais importantes da política local e dominavam as ações na colônia. Indígenas,
negros e mestiços, pessoas que exerciam trabalhos manuais e mulheres eram excluídos da política.
As câmaras municipais legislavam sobre a administração e a vida nas cidades, como a limpeza urbana, o fornecimento
de alimentos, a segurança contra os ataques de inimigos e a construção de
obras públicas. Elas também fiscalizavam a cobrança dos impostos devidos à Coroa e podiam criar outras taxas e
arrecadações. Isso demonstra que tinham certo grau de autonomia.
Com o tempo, a metrópole portuguesa criou mecanismos, como a nomeação de juízes de fora, para diminuir o poder
local das câmaras municipais. O juiz de fora era um magistrado, nomeado pelo rei de Portugal, que tinha a tarefa de
presidir os trabalhos das câmaras. Assim, estabelecia-se um vínculo direto entre o governo local e a Coroa portuguesa.
Confederação dos Tamoios
Como você viu no capítulo anterior, a França, atrasada na expansão marítima, tentou colonizar territórios na América
do Norte, na América Central e na América do Sul, sobretudo nas possessões portuguesas. Em meados do século XVI,
os franceses invadiram a região do atual Rio de Janeiro, onde fundaram a França Antártica. Nesse contexto, em 1555,
iniciou-se a Guerra dos Tamoios, ocorrida na área compreendida entre Cabo Frio e São Vicente. Os portugueses,
preocupados em recuperar o território, aliaram-se aos povos Tupiniquim e aos Temiminó. Já os franceses se uniram aos
Tamoios (grupo constituído por indígenas Tupinambá e aliados), formando assim a chamada Confederação dos
Tamoios, para defender a colônia francesa recém-criada.
O governador-geral organizou expedições para combater os invasores. Em 1565, os portugueses tomaram a Guanabara
e fundaram a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. No entanto, os conflitos estenderam-se até 1567, quando
ocorreu a vitória lusitana definitiva.
A Guerra dos Tamoios foi mais um episódio em que os portugueses utilizaram a rivalidade entre os povos indígenas em
benefício da colonização. Naquele contexto, a tradição indígena dos Tupiniquim de capturar os adversários para realizar
seus rituais antropofágicos foi frustrada em favor da imposição lusitana de escravizá-los. Ao mesmo tempo, os jesuítas
buscavam converter os indígenas ao cristianismo e convencê-los a abandonar a antropofagia. Apesar de a maioria dos
grupos nativos preferir manter suas tradições, naquele momento teve início o longo processo de aculturação dos povos
indígenas do Brasil.
Mulheres portuguesas na colônia
Até por volta dos anos 1980, as mulheres quase não eram mencionadas nos livros de história do Brasil, particularmente
do período colonial. Recentemente, porém, os historiadores e, sobretudo, as historiadoras passaram a chamar a atenção
para a ativa participação feminina no processo de construção da sociedade brasileira.
No início do período colonial, o número de mulheres que chegou à América portuguesa era muito menor que o de
homens. A maioria dos primeiros colonos havia deixado para trás suas famílias, esposas e filhos, na expectativa de
enriquecer e um dia retornar a Portugal. Essa situação favoreceu as relações, muitas vezes reduzidas à violência sexual,
entre colonos e mulheres nativas ou africanas.
As primeiras portuguesas chegaram ao Brasil em 1551: eram três irmãs órfãs, que deviam se casar com colonos. Até o
final do século XVI, outras mulheres foram chegando aos poucos, sempre em número muito inferior ao dos homens. As
mulheres brancas, segundo a cultura europeia da época, deviam ocupar-se da educação das crianças e dos cuidados com
a casa e a família. Várias mulheres, contudo, ousaram contrariar essa tradição e exercer atividades que eram atribuídas
aos homens.
Na década de 1580, por exemplo, Inês de Souza, mulher do governador do Rio de Janeiro, Salvador Correia de Sá,
comandou a defesa da cidade contra uma tentativa de invasão de corsários franceses. Outro caso conhecido foi o de
Brites de Albuquerque, capitã-donatária de Pernambuco. Esposa de Duarte Coelho Pereira, primeiro capitão-donatário
da capitania de Pernambuco, dona Brites chegou ao Brasil em 1535 com o marido e o irmão, Jerônimo de Albuquerque,
e nunca mais voltou a Portugal. Com a morte do marido e na ausência do filho mais velho, em 1554 foi nomeada capitã
interina de Pernambuco, cargo que exerceu até 1561.
Durante seu governo, Brites de Albuquerque pacificou as relações entre os colonos e os indígenas, contribuiu para o
desenvolvimento da economia açucareira e promoveu a urbanização de Olinda, sede da capitania.

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