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Língua e cultura latinas

Unidade II
5. O latim vulgar: definição

O principal objeto de estudo da linguística histórica é o fato de que as línguas se alteram


com o passar do tempo. Dessa forma, as línguas humanas não constituem realidades estáticas,
porque mudam continuamente. Os falantes, de modo geral, não têm consciência de que a língua
está sofrendo mudanças. Como elas são lentas, é difícil perceber isso na vida cotidiana. Nessa
perspectiva, vamos, a seguir, verificar as mudanças ocorridas no latim clássico em relação ao latim
vulgar.

Mas o que era exatamente o latim vulgar? Segundo Ilari (2001), a palavra vulgar admite interpretações
distintas:

1. Pode‑se tomá‑la com o sentido pejorativo de reles, baixo, associado à vulgaridade;

2. É possível associá‑la com vulgarismo, nome que ainda hoje os puristas da língua dão às
formas e expressões que julgam condenáveis por suas conotações populares, provincianas ou
arcaizantes.

Ainda de acordo com Ilari (2001), realmente o latim foi uma língua popular. Já na segunda acepção,
ela não chega propriamente a representar uma língua, pois uma língua é muito mais que um catálogo
de “erros” que ameaça a pureza da língua literária.

O autor ainda ressalta que as relações entre o latim clássico e o vulgar apresentaram equívocos
devido à crença de que corresponderam respectivamente ao latim escrito e falado. Essa crença se revela
falsa quando se lembra de que o latim literário foi uma língua falada e teve um suporte direto na
expressão coloquial da aristocracia romana.

Lembrete

A grande diferença entre as duas variedades do latim não é cronológica (o latim vulgar não
sucede ao latim clássico), nem ligada à escrita, mas é social.

As duas variedades refletem duas classes sociais que conviveram em Roma: de um lado, uma
sociedade conservadora e aristocrática, constituída pela classe dos patrícios; de outro, a plebe, uma
classe aberta a todas as influências e a elementos estrangeiros.

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5.1 Características do latim vulgar

Veja algumas peculiaridades do latim vulgar de acordo com Ilari (2001):

• em relação ao vocabulário:

— preferência dada às palavras compostas, principalmente expressões perifrásicas: Exemplos: hac


hora (nunc), Vernum tempus (ver);

— emprego frequente de termos representativos de ideias, que eram expressas diferentemente do


latim literário. Exemplos: caballus (equus), Bellus (pulcher).

• em relação à fonética:

— redução dos ditongos e hiatos a simples vogais. Exemplos: arum (aurum), Preda (praeda);

— obscurecimento dos sons finais: Exemplos. dece (decem), Ama (amat);

— tendência a evitar as palavras proparoxítonas. Exemplos: masclus (masculus), Virdis (viridis);

— perda da aspiração representada no latim clássico pelo h. Exemplos: abere (habere), Omo
(homo);

— confusão entre i e e, sobretudo em hiato. Exemplos: nubis (nubes), aria (area);

— confusão entre b e v. Exemplos: serbus (servus), Albeus (alveus);

— pelo acréscimo de um i nos grupos iniciais sl, sp, sc. Exemplos: islare (slare), Ispiritus (spiritu),
Iscribere (scribere).

• em relação à morfologia:

— redução das cinco declinações do latim clássico a três, proveniente da confusão da quinta com
a primeira e da quarta com a segunda. Exemplos: dia, ae (dies, ei), fructus, i (fructus, us);

— redução dos casos, tendo‑se conformado, em todas as declinações, o vocativo com o nominativo;
o genitivo, dativo e ablativo, já desnecessários pelo emprego mais frequente das preposições,
com o acusativo: Exemplos. cum filios (cum filiis), ex litteras (ex litteris);

— tendência para tornar masculinos os nomes neutros no singular. Exemplos: templus (templum),
Vinus (vinum);

— substituição das formas sintéticas do comparativo e superlativo pelas analíticas. Exemplos:


plus certus (certior), Multum Justus (justissimus);
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— uso do demonstrativo ille, illa, e do numeral unus, uma, como artigos. Exemplos: ille homo,
Unum templum;

— substituição pelo futuro imperfeito do indicativo por uma perífrase em que entrava o infinitivo
de um verbo e o indicativo de habere, que deu origem ao futuro do pretérito em língua
portuguesa. Exemplos: amare habeo (amabo), Debere habeo (debebo);

— emprego de perífrases, formadas pelo verbo sum e particípio passado de outro verbo, em lugar
das formas passivas sintéticas: Exemplos: amatus sum (amor), Auditus sum (audior).

• em relação à sintaxe:

— preferência pelas construções analíticas. Exemplo: credo quod terra est rotunda (credo terram
esse rotundam);

— emprego mais frequente de preposições em vez dos casos. Exemplo: liber de Petro (Petri líber).

Observação

Algumas dessas particularidades mencionadas existiam também no


latim clássico, porém se acentuaram mais no vulgar.

Saiba mais

No livro “A Língua de Eulália: novela sociolínguística”, o professor


Marcos Bagno apresenta e analisa muitos aspectos da língua portuguesa
atual, considerados como “erros” pela gramática normativa, mas que ele
relaciona com processos das transformações do latim vulgar, apoiando‑se,
para tanto, na linguística histórica.

BAGNO, M. A língua de Eulália: novela sociolingüística. São Paulo:


Contexto, 2001.

5.2 Fontes de informação sobre o latim vulgar

E como tomamos conhecimento da estrutura e do vocabulário do latim vulgar? As poucas fontes de


informação são as seguintes:

• alguns trabalhos de gramáticos latinos, que corrigiam várias formas “errôneas”, comuns na época,
em relação ao latim clássico;

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O Appendix Probi é um documento importante da língua vulgar. No entanto, ele só interessa à


fonética e à morfologia, e nada à sintaxe do latim. Provavelmente foi escrito em Roma no século III. Não
é uma gramática, mas uma relação de palavras com a possível correção ao lado.

Veja abaixo alguns exemplos retirados do Appendix Probi:

Porphireticum marmor non purpureticum marmor.


Tolonium non toloneum.
Speculum non speculum.
Masculus non masclus.
Vetulus non veclus.
Vitulus non viclus.
Vernaculus non vernaculus.
Articulus non articles.
Baculus non vactus.
Angulus non anglus.
Iugulus non iuglus.
Calcostegis non calcosteis.
Septizonium non septizodium.
Vacua non vaqua.
Vacui non vaqui.
Cultellum non cuntellum.
Columna non colomna.
Pectin non pectinis.
Formica non furmica.
Avus non aus.
Miles non milex.
Sobrius non suber.
Figulus non figel.
Lanius non laneo.
Barbarous non barbar.
Acre non acrum.
Bravium non brabium.

• obras de comediógrafos, quando apresentam em cena pessoas do povo, falando;

• inscrições legadas por artistas plebeus.

As inscrições são muito importantes para o conhecimento do latim vulgar. Sem elas, seria
impossível conhecer, em seus vários aspectos, a língua falada pelo povo do Império Romano. É por
meio delas que sabemos as diferenças regionais do latim, como consequência de sua adoção por
povos tão diversos.

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É importante salientar que nem todas as inscrições devem ser consideradas para o conhecimento do latim
vulgar. As oficiais, por exemplo, não são relevantes para o conhecimento dessa modalidade da língua tampouco
aquelas que as pessoas cultas mandaram gravar, porque, nesses casos, apresentam a linguagem culta, “correta”.

Entretanto, há outras (a imensa maioria), nas quais estão claramente marcados os traços do latim vulgar.

De grande interesse a essa finalidade, são as inscrições contidas nas tabuinhas execratórias (defixionum
tabellae). Assim se chamam algumas pequenas tábuas de chumbo, bronze, estanho, mármore ou terracota,
em que estão inscritas certas fórmulas mágicas de encantamento ou de maldição, que, segundo era crença
entre o povo, deviam produzir os efeitos desejados contra as pessoas a quem eram endereçadas.

As inscrições a seguir foram coligidas no Corpus Inscriptionum Latinorum, 16 volumes, Berlim,


1863‑1943. Veja alguns exemplos:

Te rogo que infernales partes tenes, commendo tibi Iulia Faustilla, Marii filia, ut eam celerius
abducas et ibi in numerum tu abias. (apud Manuel C. Diaz e Diaz, Antol. Del Lat. Vulg., p.43.)

Tradução:

A ti, que dominas as regiões infernais, peço e encomendo Júlia Faustila, filha de Mário,
para que a leves mais rapidamente e a conserves aí no número (dos mortos).

Dii iferi vobis comedo si quicua


sactitates hbetes AC tadro [...] Ticene
Carisi quodquid acat quod icidat
omnia in adversa. Dii iferi vobis
Comedo illius membra, colore
Ficura, caput, capilla, umbra, cerebru,
Frute, supercilia, os nasu,
Metu, bucas, labras, verbu [...]
[...] iocur, úmeros, cor, fulmones,
Itestina, vetre, bracia, dicitos,
Manus, ublicu, visica, femena,
Cenua, crura, talos, planta,
Ticidos,
Dii iferi si ilud libens ob aniversariu
Facere dicbus par
Entibus ilius
Peculiu tabesca

Tradução:

Deuses do outro mundo, conto com vocês, se algo de


sagrado tendes [...] Ticene
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de Carísio, o que quer que faça que, para ele, dê


tudo errado. Deuses do outro mundo, a vocês
entrego as partes do corpo dele, a cor do rosto,
a cara, a cabeça, os cabelos, a sombra, o cérebro,
a testa, as sobrancelhas, a boca, o nariz,
o queixo, as bochechas, os lábios, a fala, [...]
[?] o fígado, os ombros, o coração, os pulmões,
Os intestinos, o ventre, os braços, os dedos,
As mãos, o umbigo, a bexiga, as coxas,
os joelhos, as pernas, os calcanhares, a planta dos pés
(os dedos?)
Deuses do outro mundo, se tudo isso eu vir [...]

Exemplos de inscrições tumulares:

Hoc tetolo fecet Muntana conius sua Mauricio, qui visit com elo annus dodece ET
portavit annos quarranta. Trasit die VIII KL Iunias. (Tradução: Zélia de Almeida Cardoso).

“Este epitáfio fez para Maurício a sua esposa Montana, que viveu em sua companhia doze
anos, e tinha ele quarenta. Morreu no dia oitavo antes das calendas de junho (25 de maio).”

Anastacia et Laurentia, puellas Dei, quas nos precesserunt in sonum pacis. (Tradução:
Zélia de Almeida Cardoso).

“Anastácia e Lourença, filhas de Deus, que nos precederam no sono da paz.”

Entre as inscrições, estão os graffiti de Pompeia. Como se sabe, a cidade foi soterrada no ano 79 d.C. por cinzas
expelidas pelo Vesúvio, que a cobriram sem, porém, destruí‑la. Assim, Pompeia conservou‑se intacta até hoje.

Figura 5 – Vesúvio, vulcão em Pompeia

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Gaius Plinius Caecilius Secundus (61 ou 62 d.C. – 113 d.C.) é famoso principalmente por suas cartas.
Talvez a mais notável delas seja a carta VI, 16, dirigida a Tácito, seu amigo e outro importante nome
da literatura latina, na qual descreve a morte de seu tio Plínio, o Antigo. Vejamos alguns trechos dessa
carta.

Petis ut tibi avunculi mei exitum scribam, quo verius tradere posteris possis. Gratias ago;
nam video morti eius si celebretur a te immortalem gloriam esse propositam. [...]

[...] Nonum Kal. Septembres hora fere septima mater mea indicat ei apparere nubem
inusitata et magnitudine et specie.

Usus ille sole, mox frigida, gustaverat iacens studebatque; poscit soleas, ascendit locum
ex quo maxime miraculum illud conspici poterat. Nubes – incertum procul intuentibus
ex quo monte; Vesuvium fuisse postea cognitum est – oriebatur, cuius similitudinem et
formam non alia magis arbor quam pinus expresserit. Nam longissimo velut trunco elata
in altum quibusdam ramis diffundebatur, credo quia recenti spiritu evecta, dein senescente
eo destituta aut etiam pondere suo victa in latitudinem vanescebat, candida interdum,
interdum sordida et maculosa prout terram cineremve sustulerat.[.

[...] Iubet liburnicam aptari; mihi si venire una vellem facit copiam; respondi studere me
malle, et forte ipse quod scriberem dederat. [...]

[...] Egrediebatur domo; accipit codicillos Rectinae Tasci imminenti periculo exterritae – nam
villa eius subiacebat, nec ulla nisi navibus fuga ‑: ut se tanto discrimini eriperet orabat. [...]

Figura 6 – Corpo petrificado em Pompeia

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Tradução:

Tu pedes que eu escreva para ti sobre a morte de meu tio, para que possas transmitir
para a posteridade justamente. Agradeço, pois vejo que uma glória imortal será atribuída à
morte dele, se for celebrada por ti. [...]

[...] No nono dia antes das Calendas de Setembro, por volta da hora sétima, minha mãe
anuncia a ele que surge uma nuvem estranha pela magnitude e pela forma.

Ele havia tomado um banho de sol, logo depois um banho frio, estava deitado após ter
se alimentado e estudava; pediu as sandálias, subiu em um lugar do qual pôde enxergar
ao máximo aquele fenômeno extraordinário. Uma nuvem surgia (era incerto para os que
observavam de longe de qual monte – se soube depois que era do Vesúvio), cuja semelhança
e forma pareciam alguma árvore não maior que um pinheiro. Pois, elevada ao alto como
um tronco longuíssimo, espalhava certos ramos, acredito porque era levada por um vento
recente, depois era abandonada quando perdia a força ou mesmo vencida por seu peso,
dissipava‑se pela lateral, ora branca, ora suja e manchada, conforme carregava terra ou cinza.

[...] Ele ordena que o barco seja preparado, dá permissão para que eu fosse junto se
desejasse; respondi que preferia estudar e por acaso ele mesmo havia dado algo para que
escrevesse. [...]

[...] Saía de casa quando recebeu uma carta de Rectina, esposa de Tasco, atemorizada
pelo perigo iminente – pois sua casa ficava aos pés do Vesúvio e não havia outra fuga a não
ser por barco – na qual pedia que lhe tirasse de tamanho risco. [...]” (Tradução de Beatris
Gratti)

Entre outros dados de importantíssimo valor documental sobre a vida antiga, foram preservados
os graffiti das paredes de Pompeia. Essas inscrições são muito numerosas e diversificadas porque os
habitantes dessa cidade tinham o hábito de rabiscar paredes com carvão, escrevendo e desenhando.

Figura 7 – Graffiti em casa de Pompeia

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Compare os graffiti de Pompeia com os grafitti atuais na Grande São Paulo:

Figura 8 – Grafite em Ribeirão Pires

Veja na inscrição a seguir (localizada também em Pompeia), uma crítica irônica ao próprio hábito de
rabiscar paredes, que utiliza, diferentemente de outras inscrições, linguagem literária:

Admiror, paries, te non cecidisse ruinis


Qui tot scriptorum taedia sustineas.

Tradução:

“Admira‑me, parede, que não tenhas desabado,


Tu que aguentas o fastio de tantos escritores.”

A obra Satiricon foi escrita por um dos grandes escritores: Petronius (cerca de 65 d.C.). Ela está
incompleta, porém há episódios de uma divertida história vivida por três jovens – Encólpio, Ascilto e
Gitão – e um velho poeta, Eumolpo, que peregrinam por cidadezinhas da região do sul da Itália. Eles
envolvem‑se em várias peripécias de cunho erótico e um dia participam de uma ceia oferecida pelo
novo‑rico Trimalquião. A descrição da ceia é muito longa e ocupa várias e várias páginas, sendo uma
sátira aos costumes da época. Um dos recursos que Petrônio utiliza para caracterizar a personagem do
novo‑rico é o seu modo de falar, utilizando‑se de formas vulgares cultas demais, com o propósito de
escapar a uma possível crítica de vulgaridade.

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Saiba mais

Procure assistir à obra cinematográfica baseada nos episódios narrados


por Petronius:

SATYRICON. Direção: Federico Fellini. França/Itália, 129 minutos, 1969.

Por semelhantes documentos e pelos muitos subsídios que nos fornecem as línguas românicas,
podemos concluir que eram bem profundas as diferenças entre o sermo vulgaris e o sermo urbanus.
Importante para o estudo do latim vulgar são as obras dos escritores da decadência romana,
principalmente daqueles que escreviam com simplicidade, sem a preocupação da gramática e do estilo,
como, por exemplo, os autores cristãos.

6 A literatura latina

Agora, passaremos ao estudo de grandes escritores da literatura latina, que muito infuenciaram a
literatura ocidental. Vamos iniciar com o gênero comédia.

6.1 As origens da comédia

Os antigos romanos realizavam procissões religiosas nas quais se dançava e se cantava e, em ocasiões
especiais, havia cantos dramatizados de caráter licencioso e grosseiro, chamados fesceninos.

Segundo Cardoso (2003), dançarinos etruscos estiveram em Roma em 394 a.C. para realizarem uma
cerimônia de invocação de proteção dos deuses em razão de uma epidemia que assolava a cidade. Os
dançarinos fizeram uma sessão de danças gestuais, acompanhadas de música de flauta. Depois dessas
performances, os romanos começaram a imitá‑los, misturando cantos e brincadeiras satíricas e danças
gestuais. Nascia então a satura, possivelmente a primeira manifestação do teatro romano propriamente
dito.

Lívio Andronico, Névio e Ênio se inspiraram na comédia nova, modalidade teatral que se desenvolveu
na Grécia no século IV a.C. Essa comédia trata de fatos engraçados do dia a dia, ocorridos entre pessoas
das várias classes sociais. Baseando‑se nos textos escritos pelos autores que se dedicaram à comédia
nova, os comediógrafos romanos praticavam a contaminatio (contaminação), fundindo numa única
peça duas ou mais obras gregas.

Os romanos gostavam da comédia para entreter o público e muitas delas eram realizadas no Coliseu
ou em outras arenas destinadas às lutas entre gladiadores. Elas geralmente eram apresentadas antes das
batalhas. Dessa época, datam as comédias de Plauto e de Terêncio.

As comédias romanas apresentam personagens tipos, semelhantes àqueles das comédias gregas e
possuem também estrutura similar a elas.
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Plauto (Titus Maccius Plautus – 250? – 184? a.C.)

Plauto desempenhou várias funções nas artes cênicas. Conta‑se que ele era um escravo de guerra
que aprendeu a profissão de carpinteiro. Inclusive, em suas peças, mostra‑se a situação dos escravos em
Roma. Atribuiu‑se a ele a autoria de mais de cem comédias. Vinte e uma resistiram até a época atual,
conservando‑se quase na íntegra: Anfitrião, Os burros, A marmita, Báquides, Os prisioneiros, Cásina,
O cofre, O gorgulho, Epídico, Os menecmos, O mercador, O soldado fanfarrão, O fantasma, O persa,
Psêudolo, A corda, O trinumo, Truculento, A valise e O cartaginês.

As personagens de Plauto têm nomes gregos, vivem em cidades gregas, mas agem como os romanos.
Elas se referem aos costumes dos romanos como familiares enquanto que os hábitos da Grécia são
considerados estrangeiros. Devido a esse ponto de vista do autor, as comédias de Plauto têm mais valor
social e histórico do que as de Terêncio, ao descrever a vida romana. Em O cartaginês, por exemplo (escrita
na época da segunda guerra de Roma contra Cartago), há uma detalhada descrição dos cartagineses,
inimigos dos romanos.

Em Anfitrião, Plauto trata da lenda mitológica sobre o nascimento de Hércules, construindo uma
trama em que Júpiter, apaixonado por Alcmena, esposa de Anfitrião, adquire as feições do marido ausente
e seduz a bela mulher. Isso causa uma série de confusões apresentadas com humor. Misturam‑se cenas
cômicas e sérias, caracterizando‑lhe como tragicomédia além de ainda haver muitos trechos cantados.
Obtendo grande popularidade, essa peça de Plauto serviu de modelo para Camões (Auto dos Enfatriões)
e Molière (O Anfitrião).

Os Menecmos é uma comédia em que também se explora a confusão provocada pela semelhança
entre pessoas. Um jovem de Siracusa, Menecmo, chega a Epidano após ter percorrido toda a Grécia à
procura de um irmão gêmeo desaparecido na infância. Ao desembarcar na cidade onde vivia o irmão,
começa a ser confundido com ele pelas pessoas que moram no local. Há uma série de engraçadas
confusões que levam, finalmente, ao conhecimento da verdade. Shakespeare se baseou nessa peça para
escrever A comédia dos erros.

A marmita (Aulularia) é a história de um velho avarento, Euclião, que encontra na lareira de sua
casa uma marmita cheia de moedas de ouro ali escondida anos atrás por seu avô. Euclião esconde o
que achou, mas ela acaba sendo descoberta por um escravo de Licônes, que seduzira, alguns meses
antes, a filha do avarento. Ao saber que seu próprio tio pedira a moça em casamento, Licônes resolve
reparar seu erro, desposando‑a. O escravo devolve a marmita a Euclião e ele a oferece aos jovens
namorados.

Segundo Cardoso (2003), como comédia de intriga, a peça apresenta duas ações: uma voltada para
as peripécias e confusões de Euclião, surgidas depois de ele haver encontrado a marmita cheia de ouro
e a outra ação é centrada na história de amor de sua filha, grávida de Licônes, e que será pedida em
casamento por Megadoro, sem que este e seu futuro sogro saibam da gravidez da moça.

Os dois enredos são independentes um do outro, mas se encontram entrelaçados, já que seus
principais incidentes (o roubo da marmita e a confissão de Licônes), vão se combinar, no fim da
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história, para solucionar o problema de Euclião, de sua filha e do rapaz que, com a ajuda da mãe,
levará o tio a desistir do casamento. Nesse momento, já ciente do drama dos dois jovens e da
desistência de Megadoro, Euclião concede a filha em casamento a Licones e dá ao casal a marmita
recuperada.

Esse final feliz, mostrando que o protagonista tem desprendimento aos bens materiais, não consta
da Aulularia original. É de autoria de Codro Urceo, um latinista do século XV, que refez o último ato, com
base nos argumentos, no prólogo e no IV fragmento da peça, que chegou até nós incompleta, contendo
apenas fragmentos de sete versos.

Lembrete

Como você já deve ter percebido, o enredo das peças de Plauto é


engraçado, cheio de surpresas e reviravoltas. A gestualidade é muito
explorada, em cenas de correria e pancadaria. O caráter caricatural e
exagerado das personagens também contribui para o riso.

A linguagem de Plauto também é um recurso cômico. Os nomes das personagens são muitas vezes
estranhos e engraçados. Ele cria aliterações e repetições cheias de comicidade e trocadilhos, muitas
vezes reponsáveis por inúmeras confusões. Todos esses recursos contribuíram para a popularidade desse
autor que, mesmo seguindo o modelo das peças gregas, apresenta elementos muito originais em suas
peças.

Cardoso (2001) afirma que os cenários e os temas são gregos, mas há um “processo de
romanização” em suas peças, pois deuses romanos são evocados, coexistindo com divindades
gregas. Além disso, algumas personagens têm os nítidos traços de personalidade que caracterizaram
o povo romano.

Observação

A criação de Plauto permanece na história da literatura e do teatro


na cultura ocidental. Esse autor foi muito apreciado por Shakespeare,
Molière e muitos escritores que fizeram imitações e adaptações de suas
comédias.

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Saiba mais

A marmita inspirou a peça de Molière chamada O Avarento, além de


influenciar O santo e a porca de Ariano Suassuna.

Ariano Suassuna nasceu na Paraíba em 1927, formou‑se em Direito


e foi professor na Universidade Federal de Pernambuco. Paralelamente,
dedicou‑se ao teatro popular do Nordeste. Suas peças mais famosas são O
auto da compadecida e O santo e a porca, esta última encomendada pela
atriz Cacilda Becker.

Procure pesquisar e também fazer uma leitura das peças de Suassuna


para que se conheça mais desse grande autor brasileiro.

SUASSUNA, A. O auto da compadecida. Rio de Janeiro: Agir, 2005.

___. O santo e a porca. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002.

Terêncio (185 – 159 a.C.)

Terêncio era um estrangeiro de origem africana. Suas comédias são mais sutis que as de Plauto,
mostrando que foram escritas para um público refinado e culto.

O tom romano que impregna as comédias de Plauto desaparece em Terêncio, cujas peças são muito
helenizadas. Os próprios títulos das comédias são em grego como Adelphone (Os irmãos) e Hecyra (A
sogra). As intrigas das peças de Terêncio não variam muito. O autor prefere histórias de jovens de boa
família que se apaixonam por belas escravas contra a vontade dos parentes.

O enredo de suas peças, entretanto, é apenas um ponto de partida para vários tipos de reflexões que
propoprcionam ao texto um tom moralizante. Por exemplo, na peça Os dois irmãos, são apresentados
dois velhos irmãos, e um deles entrega ao outro um de seus filhos para que seja criado. Porém, eles
encaram a educação de forma diferente. O pai do joven vive no campo e dá aos filhos uma educação
severa e rígida; o outro, solteiro, vive na cidade e educa o sobrinho com extrema liberalidade. Após
muitas peripécias, tudo termina bem, após os fatos se esclarecerem com a ajuda do tio.

6.2 Historiografia

Catão

Catão foi um historiador, orador e erudito. Embora seus textos não possam ser considerados
totalmente literários, sua linguagem é quase sempre da poética latina, com ritmo melódico, vocabulário
selecionado, figuras e elementos ornamentais.
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Autor de numerosas obras de erudição, escreveu Sobre a agronomia (De agri cultura) e preocupou‑se
com o tema da evasão do camponês, que procurava a cidade, despovoando a região rural. Catão via no
cultivo da terra uma forma de ampliar a riqueza da pátria.

Na primeira parte do livro, refere‑se à exploração do solo, aos deveres do proprietário de terras, ao
cultivo da vinha e da oliveira e aos instrumentos agrícolas. Na segunda parte, apresenta as precauções
que devem ser tomadas contra as inundações e das propriedades medicinais de algumas plantas,
fornecendo receitas práticas, inclusive fórmulas mágicas e encantamentos. Possui um estilo conciso,
com frases curtas e incisivas.

6.3 Poesia filosófica

Lucrécio (Titus Lucretius Carus – 99 – 55 a.C.)

Lucrécio foi um poeta e filósofo latino que viveu no século I a.C e pouco se sabe da sua vida. É
provável que tenha nascido em Roma, onde foi educado. A única obra que compôs foi o poema Sobre a
Natureza (De rerum natura), publicada após sua morte por suicídio em 55 a.C.

O autor procurou reproduzir em versos toda a doutrina de Epicuro, filósofo grego que vivera em
Atenas entre os séculos IV e III a.C. Epicuro quis demonstrar que a felicidade do homem consiste no
prazer, ou seja, na ausência de dor para o corpo e de perturbações para a alma. Só se chega, entretanto,
a essa paz interior, quando o espírito se liberta de seus medos maiores: dos deuses e da morte.

Segundo Cardoso (2003), para libertar o homem desses medos, Epicuro mostrou que os deuses
existem, mas não interferem na natureza e, portanto, na vida do homem e que a morte é um fenômeno
natural, sendo a vida após a morte ilusória, já que o espírito é material e mortal.

Epicuro baseia‑se nas teorias físicas de Demócrito, fundamentadas no atomismo. Essa doutrina
defende a ideia de que nada se destrói: tudo se reintegra no universo, que é constituído de partículas
mínimas e indivisíveis (os átomos), agrupando‑se em combinações e formando os seres animados e
inanimados.

Composto por seis cânticos, esse poema começa evocando Vênus, princípio de toda a vida; em
seguida, expõe as leis de Demócrito e de Epicuro a respeito do universo e termina mostrando as etapas
que o homem e a civilização devem percorrer antes de alcançarem a sabedoria.

Veja a seguir um trecho desse poema:

Mimosa Vênus, mãe da eneide. Roma,


Prazer dos homens e numes! Tu alentas
Os astros, que dos céus no âmbito giram,
As férteis terras, o naval oceano.
Por ti, todo animal recebe a vida!
Logo ao nascer, na luz do sol atenta...
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Lembrete

Utilizando recursos poéticos, Lucrécio descreve fenômenos da natureza,


explicando‑os por meio de causas naturais, pois, segundo ele, a filosofia
precisa libertar os homens das superstições e do medo dos deuses.

Muitos estudiosos concordam em considerar a obra de Lucrécio como o maior poema filosófico de
todos os tempos.

Observação

Em sua obra, Lucrécio apresenta a teoria de que a luz visível seria


composta de pequenas partículas. Muito consistente, é uma espécie de
visão antiga da atual teoria dos fótons.

Lucrécio também sustenta a ideia da existência de seres vivos que,


apesar de invisíveis, teriam a capacidade de causar doenças. Essa ideia
representa a base da microbiologia.

6.4 A retórica

Dedicando‑se muito cedo à oratória política e jurídica, os romanos, práticos por natureza, não se
descuidaram da formação dos oradores, procurando fornecer‑lhes elementos que os capacitassem para
o desempenho de suas atividades. Para isso, foram criadas escolas de retórica, cujas características se
diferenciavam de uma para outra, conforme a época e a moda do momento.

Já Aristóteles, na Grécia, havia mostrado a ligação da retórica com a persuasão, desvinculando‑a


da noção de verdade. Assim, é no mundo da opinião que são tecidas as relações sociais, políticas e
econômicas.

Como consequência do trabalho realizado nessas escolas, começaram a surgir, desde o início
do século I a.C., os primeiros tratados de retórica – obras que estabeleceram os princípios do “falar
bem”.

Marco Antônio (143 – 87 a.C.), político, orador e um dos mestres de Cícero, foi provavelmente um
dos primeiros tratadistas, escrevendo Sobre a razão de falar (De ratione dicendi), texto em que procurou
demonstrar como deveria ser formado o orador eficaz.

73
Unidade II

Figura 9 – Escola de Atenas. À porta, Aristóteles e Platão. Afresco de Rafael

Cícero (106–43 a.C.)

Cícero tornou‑se famoso como advogado em Roma. Seus ideais políticos o fizeram um enérgico
defensor do regime republicano e da constituição.

Em 63 a.C., Cícero elegeu‑se cônsul, representando o partido aristocrático. Venceu seus adversários,
Crasso e César, que eram apoiados por Catilina. Por ter sido derrotado nas eleições seguintes, Catilina
preparou uma conspiração e seus planos incluíam o assassinato de Cícero e o incêndio de Roma. No
meio do caos, ele pretendia tomar o poder, mas a conspiração foi descoberta. Sendo apoiado pelo
Senado, que lhe deu poderes especiais, Cícero desmascarou Catilina, com um discurso que ficou célebre.
Mais tarde, com provas escritas, Cícero fez com que os partidários de Catilina fossem aprisionados e
depois executados em Roma. Os que escaparam – uns 3000 – foram liquidados na Etrúria, inclusive o
próprio Catilina.

Para Cícero, o discurso não devia apenas dizer alguma coisa: devia ensinar e comover o auditório,
além de agradar a ele.

Sobre o orador (De oratore) é composto em forma de diálogo, como se fosse uma conversa entre
Antônio e Crasso, dois antigos mestres de Cícero. O primeiro considera a cultura geral como o principal
requisito: o orador deve ser dono de grande saber; já o segundo, julga que a prática de eloquência é mais
importante. Também argumentam sobre as qualidades exigidas por quem vai dedicar‑se à arte oratória,
além de fazer reflexões sobre a estrutura do discurso.

Leia a seguir a tradução de um trecho dessa obra:

[...]II. Visto que, efetivamente, a eloquência consta de palavras e de ideias, deve‑se lograr

74
Língua e cultura latinas

que, falando pura e corretamente, isto é, latinamente, sigamos de perto a elegância dos
termos, ademais tanto os próprios como os translatos; nos próprios, que escolhamos os
mais distintos; nos translatos, que deles usemos seguindo rigorosamente a similitude. 5. E
existem precisamente tantos gêneros de ideias quantos eu disse existir de méritos; assim,
as ideias do instruir são agudas, as do deleitar são, por assim dizer, argutas, as de comover
são graves. Das palavras existe uma estrutura que produz dois efeitos, o ritmo e a leveza; as
ideias, por sua vez, têm sua composição, a ordem apropriada ao que deve ser demonstrado.
Mas disso tudo a memória é, por assim dizer, o fundamento, como o dos edifícios; a ação, a
luz. 6. Será, pois, perfeito orador aquele no qual isso tudo for sumo; medíocre aquele no qual
for médio; o pior aquele no qual for mínimo. E todos serão chamados oradores, como são
chamados pintores mesmo os maus, e não em gêneros, mas em capacidades, diferirão entre
si. Assim, não é orador quem senão queira semelhante a Demóstenes. Porém Menandro não
se quis semelhante a Homero; ora, o gênero era outro. Isso não existe entre os oradores, ou,
se é que alguém, buscando a gravidade, fuja à sutileza, outro, pelo contrário, se queira mais
agudo que ornado, mesmo estando em gênero tolerável certamente não está no melhor, se
em verdade o que possui todos os méritos é o melhor. (Tradução Clóvis Luiz Alonso Júnior)

As Filípicas são discursos em que Cícero ataca violentamente a vida particular e pública de Marco
Antonio, o triúnviro. Escritos sob a forma de panfletos e divulgados em toda a Itália, esses discursos
(que não chegaram a ser proferidos em sua totalidade), marcaram o fim da carreira oratória e política
de Cícero, sendo os responsáveis por sua condenação e morte.

Quintiliano (30 d.C. – 95 d.C.)

Quintiliano foi advogado e proprietário de uma famosa escola de retórica, fundada por volta do ano
70 de nossa era.

Escreveu um grande tratado em doze livros, A Instituição Oratória (Institutio Oratória). Embora
extensa, a obra de Quintiliano tem um objetivo único: apresentar o necessário para a formação do
orador. Segundo seu ponto de vista, o orador deve ser “o homem de bem, capaz de discursar”. A partir
de tal ideia, desenvolve‑se toda a teoria de Quintiliano.

No livro I, trata do futuro orador, falando sobre a alfabetização. Para Quintiliano, esta se inicia com
o conhecimento das letras e o material didático deve ser adequado aos interesses da criança. As frases
apresentadas para leitura devem sempre transmitir algum ensinamento. Os versos devem ser ensinados
desde cedo e a leitura deve ser ministrada como se fosse um jogo.

Além disso, o autor trata também da natureza da retórica e a formação geral do orador. Nas entrelinhas,
depreendem‑se muitos aspectos da visão de Quintiliano sobre o estado, as sociedades humanas e os
deuses. Ele defende a necessidade, para o orador, de um conhecimento mais enciclopédico possível,
que extrapole o simples conhecimento da gramática. Esta, juntamente com a retórica, a dialética, a
aritmética, a música, a geometria e a astronomia constituíam as chamadas artes liberales que formariam,
posteriormente, o trivium e o quadrivium medievais.

75
Unidade II

Apresenta‑se, a seguir, um trecho da obra de Quintiliano, em que ele cita Empédocles (médico e
filósofo do século V a.C), Varrão (o grande erudito da época de César, autor de muitos estudos sobre o
latim, que em grande parte estão perdidos) e Lucrécio (autor do poema filosófico De rerum natura).

Nec poetas legisse satis est: excudiendum omne scriptorum genus, non propter historias
modo, sed uerba, quae frequenter ius ab auctoribus sumunt. Tum neque citra musicen
grammatice potest essere perfecto, cum ei de metris rhythmisque dicendum sit, Nec, si
rationem siderum ignoret, poetas intellegat, qui, ut alia mittam, totiensortu occasuque
signorum in declarndis temporibus utuntur, Nec ignara philosophiae, cum proppter plurimos
in omnibus gere carminibus locos ex intima naturalium quaestionum subtilitate repetitos,
Tum UEL propter Empedoclea in graecis, Varronem ac Lucretium in Ltinis, qui praecepta
sapientiae uersibus tradiderunt. (Instituição Oratória – Livro Primeiro).

“Mas não basta ler os poetas: todo tipo de escritores deve ser estudado, não apenas
pelo conteúdo de suas obras como pelas suas palavras, que amiúde recebem o aval dos
que a empregam. Além disso, a gramática não se pode considerar perfeita, prescindindo da
música, pois o gramático deve tratar de metros e ritmos, e, se ignorar a astronomia, não
compreenderá os poetas, os quais – deixando de lado outras coisas – servem‑se tantas vezes
do nascimento e do ocaso dos astros para veicular a ideia de tempo. Não pode a gramática,
igualmente, ignorar a filosofia, tendo em vista que numerosas passagens de muitos poemas
se baseiam na mais profunda sutileza da filosofia natural. De mais, entre os gregos temos,
por exemplo, Empédocles, e entre os latinos Varrão e Lucrécio, que transmitiram princípios
filosóficos em versos. (Tradução Marcos Aurélio Pereira).”

Saiba mais

Nessa obra, Quintiliano enfatiza a relação entre várias disciplinas. Essa


é uma ideia muito presente na pedagogia atual. Pesquise as relações entre
interdisciplinaridade e os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) no site
do MEC: <http://www.mec.gov.br>.

6.5 A poesia lírica e a poesia épica

Catulo (84 – 52 a.C.)

Catulo nasceu em Verona em uma família respeitável e rica. No entanto, a vida desregrada e cheia de
prazeres fez com que ele perdesse a fortuna e morresse jovem, antes dos trinta anos. Educado em Roma,
iniciou sua carreira literária escrevendo poemas e panfletos políticos, sátiras a personagens da época,
inclusive Júlio César e Pompeu, além de recriações mitológicas e temas eróticos.

Seus textos mais considerados foram os que tratam de experiências pessoais como a morte do irmão e vinte
e cinco poemas dirigidos a uma mulher, em que retrata excepcionais declamações de ternura e sentimento.
76
Língua e cultura latinas

Sua poesia influenciou os elegíacos latinos Tíbulo, Propércio e Ovídio, dos quais pode ser considerado
precursor, e foi admirado por poetas do nível de Virgílio e Horácio.

A obra de Catulo (87-84 – 54‑52 a.C.) consiste numa coletânea de 116 poemas (Carmina) que se
organizam em três grupos distintos. O primeiro compreende os sessenta primeiros poemas e em muitos
deles, Catulo se dirige a uma musa inspiradora, à qual dá o nome de Lésbia.

Vivamos, minha Lésbia, e amemos


E atribuamos o valor de um níquel
Às murmurações dos velhos mais severos.
Os sóis podem morrer e retornar
Mas, quanto a nós, quando a breve luz se vai,
Só nos resta dormir uma noite sem fim.
Dá‑me mil beijos, e depois mais cem,
Depois mais outros mil, depois mais cem,
Depois mais mil ainda e ainda cem.
(Catulo. 5, 1‑9)

Em outros poemas, existe amargura, desencanto e tristeza:

Pobre Catulo, deixa de ser louco


E considera perdido o que vês que se perdeu,
Brilharam‑te outrora belos dias de sol
Quando corrias para onde te levava uma garota
Mais amada por ti do que nenhuma o será.
Muitas brincadeiras realizavam‑se então.
Aquilo que desejavas, a garota também queria,
Brilharam–te, realmente, belos dias de sol.
Agora ela não quer mais, deixa, também de querer.
Não persigas quem te foge, não viva como infeliz.
(Catulo. 8, 1‑10)

O segundo grupo de poemas (61–68) compõe‑se de oito peças relativamente longas. Todos esses
textos são construídos de acordo com uma linguagem ornamentada, abundância de figuras e requinte
na composição de imagens.

O pequeno trecho a seguir mostra de forma evidente a excessiva preocupação com os aspectos
formais, o que caracteriza os poemas desse grupo.

Assim como o Zéfiro, quando a Aurora desponta


No limiar do Sol errante, encrespa o plácido mar
Com seu sopro matinal e incita as ondas dóceis,
E elas se alongam, a princípio lentamente,
Impelidas pelo ar manso, e o marulho ressoa
77
Unidade II

Com o agitar‑se das águas, mas depois, quando o vento aumenta,


Inflam‑se mais e mais e, debatendo‑se,
Refulgem ao longe com brilhante luz purpúrea,
Assim os hóspedes, deixando o palácio real,
Partiram para seus lares, cada um por seu caminho.
(Catulo. 64, 269‑278)

O terceiro grupo apresenta apenas epigramas e dísticos elegíacos. Alguns são dirigidos a amigos e
pessoas da sociedade romana da época.

Segundo Cardoso (2003), Catulo foi um dos maiores líricos romanos. Soube combinar brincadeira
e seriedade, ironia e sentimentalismo, o estilo elegante, caracterizado pela riqueza vocabular e pela
abundância de figuras e a linguagem popular, repleta de modismos, de diminutivos, de expressões do
dia a dia extraídas das formas coloquiais.

Virgílio (70 – 19 a.C.)

A família de Virgílio, muito modesta, era de agricultores. O poeta viveu em contato com a natureza,
por isso valorizava os elementos campestres. Aos doze anos foi para Cremona estudar, depois para Milão
e então para Roma, fracassando nos estudos oratórios.

Augusto o incumbiu de escrever uma grandiosa epopeia para exaltar os feitos romanos e o trabalho
durou dez anos – de 29 a 19 a.C. A Eneida se compõe de doze cantos ou livros, num total de 9.826 versos.
Para tanto, Virgílio baseou‑se nas epopeias gregas.

Leia a seguir os cantos resumidos:

Canto I – Atingidos por violenta tempestade provocada por Juno (a deusa inimiga de Troia), os
navios de Eneias são arremessados às praias do norte da África. Dido, a rainha de Cartago, acolhe os
náufragos e se apaixona por Eneias, que vaga por muito tempo em busca da pátria prometida.

Canto II – Eneias relata a Dido a história da guerra de Troia, a introdução do cavalo de madeira na
cidade, a saída dos soldados escondidos na calada da noite, a batalha noturna, o incêndio, o ataque ao
palácio do rei e a vitória dos gregos.

Canto III – Eneias relata à rainha as peripécias que marcaram a viagem dos troianos e a morte de
Anquises, seu velho pai.

Canto IV – Extremamente apaixonada por Eneias, Dido entrega‑se a ele durante uma tempestade.
Júpiter o censura por ter abandonado sua missão e Dido, desesperada, suicida‑se.

Canto V – Chegando de novo a Sicília, Eneias faz uma homenagem ao primeiro aniversário da morte
de Anquises.

78
Língua e cultura latinas

Canto VI – Eneias, por meio de uma sacerdotisa, fica sabendo de alguns acontecimentos futuros e
obtém uma permissão para se encontrar com seu pai no reino dos mortos.

Canto VII – Eneias chega à região do Tibre e o rei latino lhe oferece a mão de sua filha, Lavínia, mas
esta fora prometida a Turno, que se enfurece ao saber dos fatos.

Canto VIII – Eneias procura fazer aliança com o rei Evandro enquanto Vênus oferece armas para o
troiano.

Canto IX – O acampamento de Eneias é atacado e a guerra prossegue.

Canto X – Júpiter procura conciliar Juno e Vênus, a fim de que a guerra chegue ao fim. Há perdas
importantes de ambos os lados, mas a violência continua. Faz‑se uma trégua para que se enterrem os
mortos; pensa‑se em uma proposta de paz, mas os inimigos se defrontam.

Canto XII – Turno intenciona enfrentar Eneias num duelo. Firmam‑se as condições, mas o tratado
é violado. Trava‑se um combate. O chefe troiano vence o inimigo e o sacrifica. Superando todos os
obstáculos, Eneias assegura a fundação de Roma.

Veja, a seguir, alguns versos dessa obra:

Arma virumque cano, Troiae qui primus ab oris


Italiam, fato profugus, Laviniaque venit
litora, multum ille et terris iactatus et alto
vi superum saevae memorem Iunonis ob iram;
multa quoque et bello passus, dum conderet urbem,
inferretque deos Latio, genus unde Latinum,
Albanique patres, atque altae moenia Romae.

“Eu canto as armas e o barão primeiro,


Que, prófugo de Tróia por destino,
à Itália e de Lavínio às praias veio.
Muito por mar e terra contrastado
Foi do poder dos numes, pelas iras
esquecidas jamais da seva Juno:
Muito sofreu na guerra, antes qu’em Lácio
Cidade erguesse e introduzisse os deuses:
D’onde a gente Latina origem teve,
D’Alba os padres, e os muros d’alta Roma.”
(Tradução: José Barreto Feio)

Muitas vezes, a Eneida foi considerada como uma espécie de “cópia” das epopeias gregas. Porém,
Virgílio faz inovações. Por exemplo, segundo Cardoso (2003), os deuses de Virgílio são diferentes dos
de Homero, pois são mais “humanos” e se submetem ao Destino e às leis que comandam o Universo.
79
Unidade II

As personagens humanas são construídas com mais complexidade e revelam, às vezes, características
tipicamente romanas. Eneias, no início da epopeia, apenas obedece a ordens, sem praticamente agir.
Após a visita a seu pai, no reino dos mortos, as atitudes de Eneias mudam, tornando‑o um herói.

Observação

Virgílio procura valorizar as virtudes cultuadas pelos romanos dos velhos


tempos, sobretudo a piedade – pietas –, ou seja, a consciente submissão aos
deuses, a resignação com a própria condição e o profundo senso de dever.

Virgílio estava descontente com a Eneida e ordenou em testamento que os manuscritos fossem
destruídos, mas Augusto se opôs a isso. A obra foi elogiada por Ovídio e Quintiliano e ficou com tão
grande fama que até nos banquetes se costumava ler trechos dela para distração dos convidados,
passando a ser o texto preferencial nas escolas romanas para aulas de gramática, retórica, filologia
e poética. Santo Agostinho estimava muito a Eneida, que continuou a ser um texto muito presente
durante a Idade Média nas aulas dos mosteiros.

Observação

Todas as grandes epopeias do ocidente europeu foram criadas com base


na Eneida. Por exemplo, A Comédia de Dante Alighieri e Os Lusíadas de
Camões são os épicos modernos que, mais de perto, se deixaram influenciar
pela Eneida.

Na Comédia de Dante, todas as tensões morais, políticas, filosóficas e literárias confluem.


Apresentam‑se visões, gênero literário da tradição medieval ou profecias de eventos faustosos e
calamidades como a descida de Eneias ao Ade, no sexto livro da Eneida. Na obra de Dante, a síntese do
humano, tanto em relação à sabedoria antiga quanto à cristã, resume toda cultura ocidental.

Em sua estrutura, A Comédia é um poema de três cantos dedicados a uma viagem, na visão de
Dante, ao Além: Inferno, Purgatório e Paraíso. Essa viagem apresenta um paradoxo. Para entender isso,
é necessário conhecer a cosmologia aristotélica – ptolomaica de Dante, um sistema físico‑astronômico
baseado na teologia e na ética. Segundo essa concepção, a Terra é uma esfera imóvel no centro do
universo, circundada pelas superfícies esféricas do céu, cada uma delas com seu próprio movimento. No
Empíreo encontra‑se a sede de Deus. O Inferno se encontra no hemisfério boreal como um anfiteatro na
forma de um cone cujo vértice coincide com o centro da terra. Do lado oposto, se eleva a montanha do
Purgatório. O cume do monte é o Paraíso terrestre.

Não se conhece, ao certo, a data da composição da obra. Sabe‑se apenas que os contemporâneos já
conheciam o Inferno em 1316 e o Purgatório em 1320. Depois disso foi escrito o Paraíso.

80
Língua e cultura latinas

No livro Inferno, Dante, com 35 anos, inicia a viagem entre a noite de quinta‑feira santa e o domingo
depois da Páscoa. É o poeta Virgílio que lhe indica o caminho da salvação: ele próprio guiará Dante
pelo Inferno e pelo Purgatório, enquanto Beatrice o guiará pelos céus do Paraíso, até a visão de Deus. A
viagem terá a proteção da Virgem Maria e de Santa Luzia.

Inicia‑se o caminho para o Inferno, dividido em nove círculos de diâmetros cada vez mais estreitos
à medida que se desce até a ponta, onde fica Lúcifer. A cada círculo, Dante fala com os condenados ao
fogo eterno. Após passar pelo Purgatório, o poeta Dante começa a subir aos céus e encontra Beatrice,
que o leva ao encontro de Deus.

Lembrete

A Comédia é uma viagem em direção a Deus. O poeta Virgílio, nessa


obra, representa um ideal de perfeição e encarnação da justiça, como um
guia para a perfeição.

Também Os Lusíadas apresenta características da Eneida. Compare o início desse poema com o início
do épico de Camões:

Primeiros versos da Eneida:

Arma virunque cano, Troiae qui primus ab oris


Italiam, fato profugus, Laviniaque venit
litora, multum ille et terris iactatus et alto;
vi superam saevae memorem iunones ob irem;

Tradução:

“As armas dos varões eu canto, que das costas de Troia


Para a Itália vieram, pelo fado exilados, a Lavínia
Alto agitados pela ira de Juno;”

Primeiros versos de Os Lusíadas:

As armas e os Barões assinalados


Que da Ocidental praia Lusitana
Por mares nunca dantes navegados
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;

81
Unidade II

Saiba mais

Procure ler as obras Os Lusíadas de Camões e A Comédia de Dante


Alighieri na íntegra.

CAMÕES, L. Os Lusíadas. São Paulo: Abril Cultural, 1982.

ALIGHIERI, D. A divina comédia. Trad. Cristiano Martins. Belo Horizonte:


Itatiaia, 1976.

Virgílio escreveu outra obra, as Geórgicas, um poema didático que se divide em quatro livros, cada
um deles com aproximadamente quinhentos versos.

No Livro I, o poeta expõe os tipos de solo que é preciso conhecer antes de iniciar o cultivo, a
necessidade que a terra tem de descansar entre uma semeadura e outra e a importância de alternarem‑se
as culturas. Em seguida, refere‑se às más consequências das queimadas e apresenta as dificuldades dos
agricultores. Para o poeta, Júpiter foi o responsável pela dureza dos trabalhos agrícolas, não permitindo
que, durante o seu reinado, os homens se tornassem preguiçosos.

No Livro II, se inicia uma invocação a Baco, deus do vinho. O poeta trata do cultivo das videiras, das
oliveiras, de árvores frutíferas em geral e das plantas silvestres que produzem essências.

Já no III Livro trata do gado em geral e das doenças a que estão sujeitos esses animais, enquanto o
Livro IV trata da apicultura.

No gênero poesia lírica, Virgílio compõs, entre 41 e 37 a.C., dez poemas pastoris que se agrupam em
uma coletânea sob o título de Bucólicas (assim se designavam os poemas que versavam sobre assuntos
relacionados ao pastoreio).

Virgílio, embora com alguma influência de Homero, poeta grego, se inspira principalmente em
Teócrito, poeta que viveu em Alexandria e criou, em seus poemas, personagens‑pastores. Virgílio
baseou‑se nesses poemas, porém recriando os temas e transformando o cenário, retratando as regiões
que conhecia e dando mais delicadeza à personalidade de seus pastores.

Horácio (65 – 8 a.C.)

Contemporâneo de Virgílio, Horácio era considerado um inimigo na época, contra Otávio e, por isso,
foi espoliado dos poucos bens que possuía. Só após ter sido apresentado por Virgílio a Mecenas, protetor
das artes, e de ter recebido uma propriedade rural, começou a publicar suas obras.

Dentre os textos compostos por Horácio, destacam‑se as Sátiras e Odes. O poeta prefere,
em algumas circunstâncias, censurar, por meio da sátira, não uma pessoa específica, mas algum
82
Língua e cultura latinas

defeito, em sua generalidade. Não apresenta um tom agressivo, atenuando assim o próprio ridículo
das coisas.

Diversos são os assuntos tratados por Horácio nas Sátiras. No Livro I, composto de dez poemas,
o poeta aborda temas morais como insatisfação com a própria condição, perigo de cair num erro
quando se evita outro e falsidade de julgamentos. No Livro II, composto de oito sátiras, Horácio focaliza
problemas de ordem moral: a sobriedade, a loucura humana e a liberdade. A importância exagerada
dada aos prazeres da mesa são ridicularizados em dois poemas.

As Odes são variadas quanto à métrica, extensão, assunto e até mesmo quanto ao estilo e aos temas:
a juventude, o amor, os prazeres do vinho e a alegria da vida. Elas dirigem‑se aos deuses, relembram
lendas mitológicas e exaltam o civismo e o espírito patriótico, alternando poemas longos com outros
mais curtos. Horácio dedica essa obra a Mecenas, que patrocinava vários artistas na época. Nessas odes,
encontram‑se algumas das principais ideias de Horácio, retomadas mais tarde, em outros momentos da
literatura universal.

Carpe diem

Em muitos poemas de Horácio há o desejo de aproveitar o momento presente, a sede de viver. O


poeta aconselha que as pessoas não se preocupem com realizações heroicas, já que, segundo o autor,
não se sabe o que os deuses reservam. Então, o melhor é não sonhar com o futuro, admitir que a vida é
breve e colher os frutos de hoje. Assim, deve‑se aproveitar a vida ao máximo, livre de preocupações. A
expressão carpe diem (“colher o dia“) aparece no poema 11 das Odes do poeta Horácio.

A própria natureza confirma a transitoriedade das coisas:


A beleza não está sempre presente nas flores da primavera
e a lua vermelha não brilha sempre com a mesma aparência.
(Horácio. Odes. II, 9‑10)

É preciso, portanto, não desperdiçar as ocasiões e gozar de tudo que o momento presente possa
oferecer:

Mostras que tem gosto, filtra teu vinho [...]


Enquanto falamos, o tempo hostil terá passado.
(Horácio. Odes. I, 11, 5-7)

Além desses temas, encontramos o elogio da moderação e da simplicidade (aurea mediocritas), o


desprezo pelas riquezas e pelo luxo:

Odeio os aparatos orientais, meu jovem,


E as coroas trançadas com cordões de tília
(Horácio. Odes. I, 38, 1‑2)

83
Unidade II

Observação

A expressão aurea mediocritas (mediocridade dourada) dá a ideia de


que só é feliz quem se contenta com pouco ou com aquilo que tem, sem
aspirar a mais. Portanto, é um conselho à moderação e às coisas simples
da vida.

Ou então:

Nem ouro nem marfim


Fazem brilhar os painéis de minha casa
(Horácio. Odes. II, 18, 1‑2)

Veja mais alguns versos de Horácio a seguir:

Tu ne quaesieris (scire nefas) quem mihi, quem tibi


finem di dederint, Leuconoe, nec Babylonios
temptaris numeros. ut melius quidquid erit pati!
seu pluris hiemes seu tribuit Iuppiter ultimam
quae nunc oppositis debilitat pumicibus mare
Tyrrhenum, sapias, vina liques et spatio brevi
spem longam reseces. dum loquimur, fugerit invida
aetas: carpe diem, quam minimum credula postero.

Tu não trates (que é mau) saber, ó Leucônoe,


que fim darão a mim, a ti os deuses;
nem inquiras as cifras babilônias.
Por que melhor (qual for) sofrê‑lo apures.
Ou já te outorgue Jove invernos largos,
ou seja o derradeiro o que espedaça
agora o mar Tirreno nos fronteiros
carcomidos penhascos. Vinhos coa:
encurta em tracto breve ampla ‘sperança.
Foge, enquanto falamos, a invejosa
idade. O dia de hoje colhe, e a mínima
no dia de amanhã confiança escores. (Tradução Filinto Elísio)

84
Língua e cultura latinas

Saiba mais

O tema carpe diem também está presente na obra árcade brasileira


“Marília de Dirceu” de Thomas Antonio Gonzaga.

Se você pesquisar, irá se admirar com o emprego dessa expressão em


vários campos da vida social na atualidade. No filme Sociedade dos poetas
mortos, esse tema aparece:

SOCIEDADE dos poetas mortos. Direção Peter Weir. EUA, 129 minutos, 1989.

Ovídio (43 a.C. – 17 d.C)

Ovídio nasceu em uma família rica. Seus pais o enviaram a Roma para aprender as técnicas retóricas,
que serviam para que o aluno falasse de forma eloquente e de improviso sobre qualquer assunto. Os
estudos de filosofia em Atenas lhe proporcionaram uma ampla visão de mundo. Frequentava o palácio
do Imperador Augusto. Ovídio participou das modificações decisivas nessa época e acompanhou os
passos que levaram à pax romana. Presenciou a implantação das políticas e viveu intensamente as
consequências de uma nova estrutura social. Pouco a pouco, o poeta impôs‑se ao círculo culto e
elegante que o recebera com simpatia.

Ovídio começou a publicar suas obras por volta de 20 a.C. No entanto, as censuras e comentários sobre
suas criações, consideradas licenciosas, acabaram levando o imperador a decidir pelo seu banimento
para a costa do Mar Negro, de onde não voltou mais. Isso ocorreu principalmente por causa do seu livro
Ars amatoria (que constitui‑se como um conjunto de três volumes nos quais o poeta apresenta “dicas
de sedução”, publicados no final do século I a.C.), o que lhe causou um profundo desgosto até o final
de sua vida.

Inicialmente, a obra deveria constar somente de dois livros; no decorrer de sua criação, Ovídio resolve
juntar um terceiro, exclusivamente para mulheres.

No primeiro livro, o autor mostra quais as principais ocasiões em que os homens podem aproximar‑se
da mulher amada – em passeios, nos edifícios públicos, no fórum, no teatro, no circo, em comemorações
de triunfos, em banquetes –, dando conselhos de como agir para agradar a essa mulher; o segundo livro
refere‑se aos meios utilizados para seduzir a mulher amada: amabilidades, presentes, devotamento,
manifestações de ciúme; o terceiro livro apresenta as artimanhas da mulher para tornar‑se amada:
penteados, roupas etc. A figura feminina nessa obra não é a de um ser passivo. Pelo contrário, ela deve
desfrutar de todos os prazeres assim como o homem o faz.

O estilo de Ovídio nessa obra é um pouco rebuscado, devido aos recursos retóricos que ele utiliza. O
livro é constituído por estrofes com dois versos.

85
Unidade II

Em Metamorfoses (15 livros), o poeta apresenta as origens do mundo até a época de Augusto. Isso
é feito por meio de um universo de transformações e a partir da cosmogonia, construída no mito da
criação. Assim, Ovídio conta histórias de transfigurações, de “metamorfoses” de deuses e de homens,
em fontes, árvores, rios, pedras e animais. Essas mudanças vão sucedendo‑se continuamente, sem
comentários moralistas ou reflexões teóricas sobre o sentido delas, misturando ficção e realidade.

Em Metamorfoses há uma construção intertextual, uma rede de correspondências com obras


anteriores a Ovídio. O autor retoma tanto aspectos narrativos quanto estilísticos de fontes gregas, mas
mantém um estilo próprio e original.

Veja também a forma original pela qual Ovídio expressa suas ideias, justificando o fato de não
escrever textos no gênero tragédia:

A primeira recusa da tragédia

Uma floresta ergue‑se antiga há muitos anos não cortada


É de crer que um deus habita esse lugar
Há no meio uma fonte sagrada e uma caverna de que pendem pedras,
e de todo lado pássaros pendem com doçura.
Aqui, enquanto eu vagava, oculto pelas sombras do bosque,
(pois buscava um gênero que a Musa inspirasse),
Eis que chega a Elegia, com cabelos cheirosos e trançados
E, creio, tinha um pé mais longo que o outro.
A bela forma era decente; a vestimenta, muitíssimo tênue; o rosto, de amante:
E o defeito nos pés era causa do decoro.
Eis que vem também a Tragédia, violenta, com grandes passos
(os cabelos na fronte turva, o manto escorrido pelo chão;
a mão esquerda movia largamente o cetro real,
o coturno lídio atava‑se ao alto da perna).
e foi a primeira a dizer‑me: “haverá fim para o teu amar;
ó poeta, que demoras em teu assunto?
De teus galanteios contam os banquetes vinosos
contam as encruzilhadas repartidas em muitas estradas.
Amiúde alguém com o dedo aponta o poeta que passa,
e diz: “esse, esse aí é aquele a quem Amor feroz queima”.
Já és, e não sabes, anedota em toda a cidade,
Uma vez que, largado o pudor, conta os teus feitos.
Era tempo de seres movido, impelido pelo tirso mais grave;
Basta de inércia! Dá início a um gênero mais alto.
Com aquela matéria estás oprimindo teu engenho: canta as gestas dos varões
Dirás: “Aquele é o território da minha inclinação”.
Tua musa já brincou de fazer versos que as tenras meninas soem cantar
e tua primeira juventude transcorreu entre ritmos que lhe convinham.
Agora, por meio de ti, eu, a Tragédia Romana, hei de possuir renome!
86
Língua e cultura latinas

Teu entusiasmo cumprirá minhas leis”.


Falou e, apoiada nos coturnos pintados, meneou
Três, quatro vezes a cabeça densa pela cabeleira.
A outra, se estou lembrado, sorriu com seus olhinhos oblíquos
(engano‑me ou será que na mão direita havia um ramo de mirto?)
Disse ela: “Por que, impetuosa Tragédia, com graves palavras
me oprimes? Ou será que não podes deixar de ser grave?
Porém tu te dignaste a mover‑te em versos desiguais:
Lutaste contra mim usando meus versos.
Não vou comparar teus cantos sublimes aos meus
Teu palácio faz desaparecer minha humilde casa.
Sou ligeira e comigo é ligeiro Cupido, meu cuidado;
Não sou mais forte do que minha matéria,
E, no entanto, mereci ter mais poder do que tupor suportar
muitas coisas que teu cenho não admitiria,
Sem mim que seja rústica a mãe do lascivo Amor;
nasci para ser alcoviteira e companheira daquela deusa.
A porta que não poderia abrir com teu duro coturno
é franqueada às minhas blandícias.
Por meu intermédio Corina, enganando o guardião, aprendeu
A corromper a fidelidade da porta trancada,
a deslizar do leito oculta pela túnica aberta,
e a mover, pela noite, os pés sem rumor.
Quantas vezes, gravada, estive apenas em duras portas
sem temer ser lida pelo povo que passava!
Mais: até que o cruel guardião partisse, lembro‑me
de ter estado oculta, como carta, no seio da ama.
E quando me envias como presente de aniversário e
ela me rasga e, bárbara, mergulha‑me na água que está ao lado?!
Eu fui a primeira a mover os germes fecundos de teu talento.
Se ela já te procura, isto é dádiva minha”.
Terminara. Comecei: “peço a cada um de vós
que as palavras de quem teme cheguem a ouvidos disponíveis.
Tu me ornas com teu cetro e teu grande coturno:
Tocada já por ti minha boca, a voz agora é grandiosa,
tu dás ao meu amor um nome sempre vivo.
Vem, pois, e aos longos acrescenta versos breves!
Ao vate, Tragédia, concede um pouco de tempo.
Tu és trabalho eterno: o que a Elegia pede é breve”.
Comovida, permitiu. Que, ternos, meus Amores se apressem,
enquanto é lícito, que lá detrás um gênero mais elevado já me alcança. (Tradução João
Ângelo Oliva Neto – Primeira Recusa da Tragédia – Ovídio, Amores. III 1, 1‑70).

87
Unidade II

6.6 A obra filosófica de Sêneca e a tragédia latina

Sêneca (Lucius Annaeus Seneca) – (4 a.C. – 65 d.C.)

A obra literária e filosófica de Sêneca inspirou o desenvolvimento da tragédia na Europa. O autor


nasceu em Córdoba, na Espanha, em uma família ilustre.

Quando Nero foi nomeado imperador, Sêneca converteu‑se em seu principal conselheiro e tentou
orientá‑lo para que se fizesse uma política justa e humanitária. Durante algum tempo, exerceu influência
benéfica sobre o jovem, mas aos poucos foi forçado a concordar com algumas atitudes do imperador.
Mais tarde, acusado de participar de uma conjuração, Sêneca recebeu de Nero a ordem de suicidar‑se,
o que executou em Roma, com serenidade, conforme seus ideais filosóficos.

Juntamente com Marco Aurélio e Cícero, Sêneca é considerado um dos mais importantes
representantes da intelectualidade romana e apesar de ter sido contemporâneo de Cristo, não fez relatos
significativos de fenômenos milagrosos. Entretanto, constata‑se que os cristãos assimilaram aspectos
filosóficos estoicos, utilizando inclusive as mesmas metáforas estoicas na bíblia.

Na cultura em que Sêneca estava inserido, a filosofia era considerada não apenas um sistema de
ideias, mas, sobretudo, uma prática para a vida. Aderir a uma determinada escola filosófica implicava em
apoiar não apenas uma ideia, mas um determinado modo de ser. O objetivo disso era uma arte de viver
que se concebia para o alcance de uma vida feliz, adequada a realizar as necessidades do homem. Para
Sêneca, essa filosofia era o estoicismo.

O estoicismo é uma escola filosófica do século IV a.C. Essa doutrina afirma que todo o universo é
governado por um logos e a alma está identificada com este princípio divino, como parte do todo ao
qual pertence. Este logos (razão universal) domina todas as coisas: tudo surge a partir dele e de acordo
com ele.

Observação

O estoicismo propõe que se viva de acordo com a lei racional da natureza


e aconselha a indiferença (apathea) em relação a tudo que é externo ao ser,
ou seja, o ser humano não se deve deixar escravizar pelas paixões e pelas
coisas externas.

Sêneca considerava o estoicismo a maior virtude para não ter a alma perturbada e procurava aplicar
sua filosofia à prática. Assim, apesar de rico, vivia modestamente: bebia apenas água, comia pouco e
dormia sobre um colchão duro. Sêneca não via nenhuma contradição entre a sua filosofia estoica e o
fato de ser rico. Dizia que o sábio não estava obrigado à pobreza, desde que o seu dinheiro tivesse sido
ganho de forma honesta, mas que, no entanto, deveria ser capaz de abdicar dele.

88
Língua e cultura latinas

A ação virtuosa, para o estoicismo, não é simplesmente aquela que é guiada pela razão, mas sim a que
é guiada por um juízo reto. As paixões humanas (como vontade, cobiça, receio) devem ser ultrapassadas.
Os bens podem ser adquiridos, porém não se pode estabelecer uma dependência deles.

Mais do que se libertar das paixões, para um estoico, ser livre é não ser arrastado pelo destino,
é deixar‑se conduzir por ele. Por isso, não se trata de simples submissão, mas de uma “sujeição
com consentimento”, ainda que isso seja contraditório. Apenas o homem livre das paixões é capaz
disso. Segundo essa filosofia, o destino encontra‑se predestinado. O homem pode apenas aceitá‑lo
ou rejeitá‑lo. Se o aceitar de livre vontade, goza de liberdade. A morte é algo natural e o suicídio não
é excluído.

A tragédia latina originou‑se da grega, reproduzindo um modelo que se constituía no produto final
de uma longa evolução. No século V, a tragédia grega atingiu o seu ápice com os textos de Ésquilo,
Sófocles e Eurípedes.

Em Roma, em 240 a.C., Lívio Andronico traduziu a Odisseia e divulgou em Roma os princípios que
norteavam o teatro grego, além de traduzir ou adaptar comédias e tragédias. Suas tragédias apresentam
certa falta de teatralidade, pois o autor escreveu possivelmente para que elas fossem lidas em sessões
públicas, para uma elite familiarizada com velhos mitos e habituada com textos em que os aspectos
retóricos eram valorizados acima de tudo.

De acordo com Cardoso (2003), as peças de Sêneca foram influenciadas pelas gregas, mas revelando
muitos traços de originalidade. Enquanto as peças gregas eram mais movimentadas, as latinas eram
mais estáticas.

Sêneca compôs nove tragédias inspiradas em modelos gregos, sobretudo nas peças de Eurípedes.
Dentre elas, destacam‑se Édipo, baseada em Édipo‑Rei de Sófocles e bastante próxima a ela. A peça
relata a desgraça que acomete o rei de Tebas quando ele toma conhecimento dos crimes hediondos
que cometera sem intenção. Fedra trata da rainha de Creta, violentamente apaixonada pelo enteado,
causando‑lhe a perdição e a morte e Medeia relata a vingança da princesa feiticeira que, desprezada
pelo amante, dele se vinga assassinando os filhos. Medeia se sente traída por Jasão, após tê‑lo
ajudado. Ele vai se casar com a filha do rei de Coríntios, Creonte. Este conhece bem os poderes de
Medeia, que é uma feiticeira, e teme por sua filha. Medeia envia à princesa, como presente, um véu
e uma diadema envenenados, que matam a princesa que os vestiu e também o rei, seu pai, ao tentar
salvá‑la. Jasão corre até sua casa, pois teme por seus filhos mas chega tarde demais, pois eles foram
mortos pela própria mãe. Medeia, nesse momento, já está fugindo pelo ar, guiada por um carro com
serpentes aladas.

Leia um trecho de Medeia, de Eurípedes:

Amigas, decidida está a minha ação: matar os filhos o mais depressa que puder e evadir‑me
dessa terra, não vá acontecer que, ficando eu ociosa, abandone as crianças, para serem mortas
por mão mais hostil. É absoluta a necessidade de as matar, e, já que é forçoso, matá‑las‑emos
nós, nós que as geramos. Mas vamos, arma‑te, coração. Por que hesitamos e não executamos
89
Unidade II

os males terríveis, mas necessários? Anda, ó minha desventurada mão, empunha a espada,
empunha‑a, move‑te para a meta dolorosa da vida, não te deixe dominar pela covardia, nem
pela lembrança dos teus filhos, de como eles te são caros, de como os geraste. Mas por este
breve dia, ao menos, olvida, que depois os chorarás. Porque, mesmo matando‑os, eles te são
sempre caros e eu – que desgraçada mulher que eu sou! (Medeia – Eurípedes)

Compare agora o que foi lido com a Medeia de Sêneca. Observe, nesse excerto, que Medeia revela
também a luta que se trava em seu íntimo e a firme resolução ali gerada:

Minha mente se tumultua com a ideia de desgraças selvagens, desconhecidas, capazes


de fazer tremer o céu e a terra. [...] Arma‑te com teu ódio e prepara‑te para a destruição
com todo o teu furor. [...] Arranca de ti essa indecisão covarde. A pátria que te deste com um
crime, com um crime deverá ser deixada. (Medeia – Sêneca)

Existe também uma peça atual, Gota d’água, em que Chico Buarque e Paulo Pontes fizeram uma
transposição da tragédia grega Medeia, de Eurípedes, para o contexto carioca: um conjunto residencial
proletário do Rio de Janeiro da década de 70.

Joana, a Medeia brasileira, é abandonada pelo amante Jasão, muito mais novo do que ela. Jasão,
autor do samba Gota d’água, de grande sucesso, vai casar‑se a filha de Creonte, proprietário do conjunto
residencial e explorador do povo oprimido da Vila do Meio‑Dia. Além de perder seu amante, Joana,
oprimida pela engrenagem social, será expulsa por Creonte, com as duas crianças. Após falhar o plano
de vingança, de envenenar a noiva no dia do casamento, ela acaba envenenando os dois filhos e depois
a si própria. Observa‑se que Jasão não só trai Joana, mas também trai o povo, pois ele passa para o lado
do patrão. Veja como isso fica evidente na fala de Joana:

Só que essa ansiedade que você diz


não é coisa minha, não, é do infeliz
do teu povo, ele sim, que vive aos trancos,
pendurado na quina dos barrancos.
Seu povo é que é urgente, força cega,
coração aos pulos, ele carrega
um vulcão amarrado pelo umbigo
Ele não tem tempo nem amigo,
nem futuro, que uma simples piada
pode dar em risada ou punhalada
Como a mesma garrafa de cachaça
acaba em carnaval ou desgraça
É seu povo que vive de repente
porque não sabe o que vem pela frente
Então ele costura a fantasia
e sai, fazendo fé na loteria,
se apinhando e se esgoelando no estádio,
bebendo no gargalo, pondo no rádio
90
Língua e cultura latinas

sua própria tragédia, a todo volume,


morrendo por amor e por ciúme,
matando por um maço de cigarro
e se atirando debaixo do carro.
Se você não aguenta essa barra,
Tem mais é que se mandar, se agarra
na barra do manto do poderoso
Creonte e fica lá em pleno gozo
de sossego, dinheiro e posição
com aquela mulherzinha. Mas, Jasão,
já lhe digo o que vai acontecer:
tem uma coisa que você vai perder,
e a ligação que você tem com sua
gente, o cheiro dela, o cheiro da rua,
você pode dar banquetes, Jasão,
mas samba é que você não faz mais não. [...]

7 Línguas Românicas

Línguas românicas são aquelas que conservam vestígios evidentes de sua origem latina no
vocabulário, na morfologia e na sintaxe.

As línguas neolatinas não derivaram diretamente do latim, pois entre aquelas e estas, houve vários
romances que eram modificações regionais do latim, dos quais saíram então as línguas românicas. Não
se pode precisar a época exata da formação dos romances nem o desaparecimento do latim vulgar.
Segundo Grandgent, o período estende‑se do ano 200 a.C. até cerca do ano 600 da Era Cristã.

O território atual em que se falam estes idiomas oriundos do latim não coincide com os limites do
Império Romano antes da invasão dos bárbaros. Há lugares em que o latim conseguiu impor‑se, mas
depois teve de ceder às investidas de outros idiomas.

Há dez línguas românicas: português, espanhol, catalão, francês, provençal, italiano, reto‑romano,
dalmático, romeno e sardo. Essas línguas estão assim distribuídas:

• o português: falado em Portugal, no Brasil, na Ilha da Madeira, no arquipélago dos Açores, nas
antigas colônias portuguesas da África, da Ásia e da Oceania;

• o espanhol: falado na Espanha e suas colônias, em quase toda a América do Sul (à exceção
do Brasil e das Guianas), na América Central, no México, em algumas ilhas do arquipélago das
Antilhas e nas Filipinas;

• o catalão: falado na Catalunha, nos vales de Andorra, no departamento francês dos Pirineus
orientais, na zona oriental de Aragão, na maior parte de Valência, nas Ilhas Baleares e na cidade
de Alguer, situada na costa noroeste de Sardenha;
91
Unidade II

• o francês: falado em quase toda a França (exceto no sul) e na Bretanha, em suas colônias da Ásia,
da África, da América e da Oceania, na Bélgica e Congo Belga, na Suíça, em Mônaco, no Canadá,
na Luisiânia e no Haiti;

• o provençal: falado no sul da França (Provença);

• o italiano: falado na Itália e nas ilhas adjacentes (Córsega, Sicília), nas antigas colônias italianas
da Ásia e da África e em S. Marinho;

• o reto‑romano, rético ou ladino: falado no Tirol, no Friul e no Cantão dos Grisões (Suíça);

• o dalmático: outrora falado na Dalmácia;

• o romeno ou valáquio: falado na România e em parte da Macedônia. É a mais oriental das línguas
neolatinas. Os romanos não apenas dominaram mas também colonizaram esta distante província
que o imperador Trajano conquistou no ano de 107 d.C. e chamou de Dácia. Essa língua conserva
muitas características do latim mas também possui influências de diversas outras línguas como a
húngara, turca e grega e as línguas eslavas búlgaro e russo.

• o sardo: falado na Sardenha, muito próximo do antigo latim.

A língua portuguesa, uma das línguas românicas, proveio da Lusitânia, região situada ao ocidente
da Península Ibérica. Pode‑se afirmar que o português é o próprio latim modificado. Parece que povos
procedentes de outras zonas europeias se sobrepuseram às populações nativas.

No século V a.C. houve a penetração dos celtas, que vinham do sul da Alemanha e já haviam se
apoderado do território da Gália. Fixaram‑se principalmente na Galícia e nas regiões altas do centro
de Portugal. A convivência entre celtas e iberos teve como consequência uma fusão, que resultou nos
celtiberos.

Os romanos penetraram na Península no século III a.C. e a anexaram como província em 197 a.C. Na
época do governo de Augusto, houve a assimilação da cultura latina por parte dos habitantes da região.

A assimilação começou nas cidades e nos centros mais povoados, passando depois às aldeias e
finalmente aos campos. Os peninsuladores começaram a ver nos conquistadores um povo mais forte
e civilizado e, depois de uma resistência que foi vencida pelos soldados romanos, adotaram a língua
dos vencedores. Porém, houve um povo da Península Ibérica que não aceitou o latim como língua e
continuou a falar o próprio idioma: o basco.

De acordo com Coutinho (1976), vários fatores concorreram para a romanização das populações que
viviam na península:

• o recrutamento militar dos jovens provincianos que, depois de prestado o serviço do exército,
voltavam aos seus familiares falando o chamado “latim vulgar”;
92
Língua e cultura latinas

• o eficaz sistema rodoviário romano, que permitia fácil intercâmbio com a metrópole;

• o direito à cidadania concedido às cidades da Península pelos imperadores romanos;

• a tentativa de fazer desaparecerem as diferenças sociais, com os padres pregando num latim
muito acessível, já na época do cristianismo.

O latim que se espalhou pelo território ibérico foi o do povo inculto, o sermo vulgaris. A outra
modalidade, o sermo urbanus, utilizada por Cícero, Virgílio, Horácio e Ovídio, foi conhecida nas escolas.

No século V, os bárbaros invadiram a Península, principalmente os vândalos, os suevos e os visigodos.


Os suevos se estabeleceram na Galícia e na Lusitânia. Esses eram povos rudes e guerreiros e, embora
vencedores, assimilaram a civilização romana e, com ela, o próprio latim, já sensivelmente alterado.

No século VIII, houve a invasão dos árabes na Península. Eles valorizavam as artes e as letras e a
ciência estava muito difundida entre eles, além da medicina, filosofia, matemática e história.

Muitos hispano‑godos, interessados na civilização árabe, incorporaram seus costumes e às vezes até
sua língua e ficaram conhecidos como “moçárabes”. Na maioria da Península, adotou‑se o árabe como
língua oficial, mas o povo continuou a falar o romance, ou seja, o latim vulgar modificado.

O cristianismo começou a ser pregado em outras línguas. Primeiro em grego, com São Paulo, mas
cedo chegou a Roma e logo sua propagação começou a ser feita também em latim.

A cultura árabe era totalmente diferente da cultura da região; a religião foi certamente um fator decisivo
e fundamental de distanciação entre os árabes e a população românica, que era era cristã, enquanto
aqueles eram muçulmanos. Esses fatores levaram os dois povos a viverem, geralmente, segregados.

Empréstimos linguísticos

A expressão empréstimo linguístico significa a transmissão de formas linguísticas entre línguas de


contato. Os empréstimos podem ter várias causas, desde a transmissão de uma cultura para a outra de
técnicas e de objetos antes desconhecidos até moda.

As palavras de origem hebraica também estão presentes na língua portuguesa, embora os hebreus
não tenham dominado a Península Ibérica. Em geral são nomes relacionados à religião e vieram do latim
pelas sagradas escrituras. Exemplos: aleluia, amém, Cabala, Páscoa, rabino, sábado.

As palavras de procedência grega, introduzidas pelos colonos durante a dominação deste povo na
Península Ibérica ou se perderam totalmente ou foram incorporadas ao latim. De origem mais antiga
podem ser citadas: bolsa, corda, espada, governar, golfo.

Com o cristianimo, muitos foram os vocábulos gregos que penetraram no latim e se expandiram
devido à Igreja. Exemplos: anjo, apóstolo, Bíblia, crisma, epifania.
93
Unidade II

Alguns vocábulos de origem grega nos foram transmitidos pelos árabes, mas antes sofreram
modificações na pronúncia como acelga, alambique, alcaparra.

Assim, os árabes transmitiram para a Europa algumas de suas colaborações para o domínio da ciência
e do comércio. Esses empréstimos geralmente são reconhecíveis pela sílaba inicial al–, correspondente
ao antigo árabe: álcool, alferes, alcorão, álgebra, alfândega, almoxarifado.

Pode‑se perceber, portanto, que a influência da língua árabe sobre o latim na Península Ibérica não
foi tão grande como era de se esperar devido à longa dominação árabe nesse local.

As palavras de origem árabe mais frequentes em nossa língua designam plantas, frutas, flores e
substâncias aromáticas: algodão, alecrim, alfafa, alface, alfazema, açafrão, alcachofra.

Outras designam instrumentos musicais, utensílios e armas: alaúde, gaita, adarga, alicate, algema.

Pesos e medidas: arroba, alqueire.

Ofícios, cargos e empregos: alfaiate, alferes, almoxarife, califa.

Alimentos e bebidas: álcool, almôndega.

Da dominação germânica, há mais ou menos duzentas palavras que ficaram incorporadas à língua
portuguesa. Muitas palavras de origem germânica entraram no latim e referem‑se, quase todas, às artes
militares, usos e costumes, objetos e utensílios do povo germânico. Exemplos: acha, arauto, agasalho,
arreio, albergue, anca, aspa, barão, banco, banho, brasa, dardo, escuma, espeto, elmo, estribo, espora,
feudo, grupo, guerra, marco, sopa, roupa.

A influência germânica ainda se manifesta em alguns adjetivos e verbos: branco, fresco, liso, morno,
rico, agasalhar, adular, brandir, estampar, guardar, roubar.

A tendência normal dos empréstimos é serem absorvidos de maneira completa na própria


língua depois de uma fase mais ou menos longa em que sua origem estrangeira é sensível para
os falantes.

Observação

Na história das línguas românicas, a circulação de empréstimos sempre


foi intensa. Eles originavam‑se não só de variedades linguísticas faladas
no próprio território romano mas também do latim literário, cultivado em
ambientes ligados à Igreja e à escola. Assim, o latim literário exerceu uma
influência importante desde o período românico.

94
Língua e cultura latinas

Durante o longo tempo que se seguiu às invasões bárbaras, até o século XI, quando os
povos europeus adquiriram certa estabilidade e começaram a deixar testemunhos escritos, a
Igreja foi a única instituição sólida cujas fronteiras se estendiam a todo o mundo conhecido.
Ela utilizava o latim como instrumento de sua atividade, como meio de comunicação para
pregar a povos que não conheciam essa língua. Nos mosteiros, copiavam‑se e compilavam‑se
manuscritos em latim. Os bispos e os monges viajavam de país a país sem a necessidade de
intérpretes.

Houve um movimento renovador que procurava minimizar as influências do latim vulgar, sendo o
latim dos autores clássicos reintroduzido como modelo. Os grandes intelectuais da Idade Média utilizaram
por séculos o latim, inclusive em obras escritas. Deste modo, a língua se aprimorou, tornando‑se mais
abstrata, com mais nuances para exprimir o rigor lógico e se enriqueceu no vocabulário, em razão de
inúmeras traduções de palavras gregas e árabes.

Nesse contexto, a Escolástica pretendia racionalizar a fé por meio da filosofia grega. Foi nas
universidades medievais e em latim que se formaram os primeiros legistas, que foram muito importantes.
Os médicos, pelos quais a medicina árabe veio a ser introduzida na Europa ocidental, estudaram em
latim.

Nessa época, houve muitos incentivos para o cultivo dessa língua e para um retorno aos modelos
clássicos, que culminaram no Humanismo, um movimento que, partindo da Itália, se estendeu por todo
o Ocidente. Um dos principais criadores desse movimento foi Petrarca, considerado, junto com Dante,
um dos fundadores da língua moderna e da literatura italianas.

No século XII, a sociedade medieval atingiu seu auge. Esse foi o século das Cruzadas, das grandes
catedrais e da fundação das primeiras universidades que rapidamente se estenderam por toda a Europa:
Paris, Oxford, Cambridge, Bolonha, Montpellier, Colônia, Upsala e Salamanca. As universidades da Idade
Média conheciam o latim apenas como língua didática e por esse motivo havia uma unidade – tanto de
língua como de pensamento – em todo o Ocidente.

Mesmo com o Renascimento, o latim continuou a ser a língua da ciência. Todos os precursores da
ciência moderna escreviam em latim: Copérnico, Kepler e Newton. Descartes escreveu as Meditações
metafísicas em latim e Spinoza, toda sua obra. Assim, todos os trabalhos importantes da filosofia e da
ciência, entre 800 e 1700, no Ocidente, foram escritos em latim.

É claro que, pouco a pouco, o latim foi dando lugar às línguas vulgares, mas, ainda no século
XVIII e começo do século XIX, as teses eram redigidas em latim na maior parte das universidades
europeias.

Na segunda metade do século XIX, iniciou‑se o ensino secundário na maioria dos países
da Europa. Considerou‑se importante o estudo do latim e do grego, mas apenas como uma
introdução à cultura humanista e não para que os alunos chegassem a utilizá‑los como meio de
comunicação.

95
Unidade II

A Igreja continuou utilizando o latim na liturgia e na formação de eclesiásticos, mas, no século XX,
isso começou a diminuir. O Concílio do Vaticano II decidiu substituir o latim pelas línguas vulgares na
liturgia.

Em razão do uso sistemático do latim como veículo do saber e da cultura, o vocabulário é derivado
dessa língua e também do grego. Trata‑se de um léxico homogêneo não só entre as línguas românicas
mas também em todas as línguas da Europa.

Embora o latim fosse a língua comum e praticamente exclusiva na maior parte das terras do Império
Romano, é preciso estabelecer uma distinção entre o latim culto, o latim da oratória e da prosa literária
ou administrativa e ainda o latim da vida cotidiana (basicamente oral).

As diferenças regionais que aparecem são consequência da comunicação entre os habitantes


de um mesmo local e, por isso, produziram evoluções independentes. Essas evoluções são bastante
influenciadas pelas pressões exercidas pela língua falada anteriormente. Por exemplo, quando os
iberos do litoral mediterrâneo começaram a utilizar o latim, conservaram seus hábitos fonéticos
e suas preferências sintáticas, ao mesmo tempo que foram introduzindo no latim palavras de sua
antiga língua.

À medida em que o Império Romano foi se debilitando, a unidade foi‑se quebrando e as estruturas
comuns desaparecendo, tendo o processo de diferenciação se acentuado, até aparecerem as diferentes
línguas românicas, num processo gradual e contínuo.

Lembrete

Toda evolução linguística inclui tendências desagregadoras, mas,


ao mesmo tempo, põe em jogo pressões unificadoras que mantêm a
comunidade da língua entre os habitantes.

7.1 O método histórico‑comparativo no estudo das línguas

O aluno pode estar se perguntando: como foi observado que as línguas românicas vieram do latim?
Isso foi possível a partir do método histórico‑comparativo, que possui objetivos de reconstituição. Assim,
a semelhança constatada entre expressões pertencentes a diferentes línguas românicas prova que elas
se originaram de uma mesma palavra latina e que a forma que essas palavras assumiram nas línguas
românicas é indício da forma que deve ter tido a expressão original.

Para ilustrar o funcionamento do método‑histórico comparativo, verifique as palavras do quadro a


seguir. Ele apresenta cinco colunas: a primeira é formada por palavras do latim clássico e as outras contêm
palavras portuguesas, espanholas, francesas e italianas. O quadro permite dois tipos de comparação:
entre formas românicas e entre estas e o latim clássico.

96
Língua e cultura latinas

Latim Português Espanhol Francês Italiano


(1) novu novo nuevo neuf nuovo
movet move mueve meut muove
mordit morde muerde mord morde
porta porta puerta porte porta
populu povo pueblo peuple popolo
(2) flore- flor flor fleur fiore
hora hora hora heure hora
solu só (ant. soo) solo seul solo
famosu famoso famoso fameux famoso
co(ho)rte corte corte cour corte
prorsa prosa prosa prose prosa
(3) gula gola gola gueule gola
juvene jovem joven jeune giovane
ulmu olmo olmo orme olmo
unda onda onda onde onda
bucca boca boca bouche bocca
furnu forno horno four forno
musca mosca mosca mouche mosca
(4) luna lua luna lune luna
virtute virtude virtud vertu virtù
mutare mudar mudar muer mutare

Tabela 171

Como é possível observar, o quadro anterior é uma pequena amostra das comparações possíveis em
relação às vogais.

Veja as conclusões da análise:

Bloco 1: onde o latim apresentava um “o” aberto e acentuado, o espanhol traz, sempre, o ditongo
“eu”; o francês “eu” e o italiano, o ditongo “uo” desde que na palavra latina a mesma sílaba fosse aberta,
isto é, sem consoante depois da vogal; o português apresenta o “o”.

Bloco 2: onde o latim trazia um “o” fechado, as línguas românicas do quadro apresentam um “o”,
exceto o francês.

Bloco 3: valem as mesmas observações feitas para o bloco 2. Isso leva à conclusão de que na origem
das línguas românicas está uma variedade do latim, com um quadro vocálico no qual o “o” longo e o “u”
breve do latim clássico se confundiam numa única vogal.

Bloco 4: onde aparecia o “u” longo latino, todas as línguas do quadro apresentam “ u”.

1
(ILARI, 2001, p. 23)
97
Unidade II

À medida que se vão somando observações desse tipo, forma‑se uma variante do latim que se pode
estudar em confronto com o latim clássico, mas que não se confunde com ele. É a essa variante que
se chamou de “latim vulgar”. Como observa‑se na tabela abaixo, o quadro anterior pode ser reduzido a
três blocos, mostrando que as semelhanças das línguas românicas com o latim vulgar são mais diretas.

Latim vulgar Português Espanhol Francês Italiano

o aberto síl. aberta o ue eu uo


síl. fechada o ue o o

o fechado síl. aberta o o eu o


síl. fechada o o o, ou o
u u u u u

Tabela 182

7.2 A formação da língua inglesa

Qual foi a evolução da língua inglesa?

Antes da chegada dos anglos e dos saxões, a ilha hoje chamada de “Grã‑Bretanha” foi habitada
durante mais de um milênio por tribos celtas.

Os povos mediterrâneos, principalmente os fenícios, tinham relações comerciais com os habitantes da ilha.
No ano de 55 a.C., com a intenção de assegurar a total conquista da Gália, Júlio César atravessou o Canal da
Mancha e, em uma segunda expedição de conquista, chegou até o Tâmisa, impondo ali a soberania romana.

A partir de 43 a.C., a Britannia tornou‑se, com este nome, província romana. Entretanto, quando seu
domínio terminou, os romanos deixaram poucos traços na língua da população local – de modo bem
diverso do que ocorreu na Gália. Assim, as tribos germânicas que chegaram à Bretanha encontraram
uma população de língua celta.

Uma das razões da riqueza do vocabulário inglês consiste no fato da língua possuir, para designar
muitas coisas, uma palavra de origem germânica e outra de origem românica.

Durante o Renascimento, houve o interesse pelas línguas antigas, o latim e o grego. Isso provocou uma
adoção de novas palavras, diretamente do grego, do grego por meio do latim ou do latim diretamente.

A partir do século XVI, as palavras latinas usadas no inglês são inúmeras e muitas foram adotadas
sem qualquer modificação: error, horror, genius, census, referendum, veto. Foram adotados também
sufixos românicos, em especial ‑able, ‑ment e ‑ation.

O inglês arcaico conservava declinações. Era a língua que falavam os anglos e os saxões que se
instalaram nas ilhas britânicas no século V, ocupando o lugar dos celtas.

2
(ILARI, 2001, p. 24)
98
Língua e cultura latinas

7.3 A formação da língua portuguesa

A partir do século XVIII, durante a dominação muçulmana, os cristãos costumavam organizar


cruzadas, com o fim de libertarem o território ibérico. Por conta delas é que se estabeleceram os reinos
de Leão, Castela e Aragão, com terras antes pertencentes aos árabes.

Entre os fidalgos que ajudaram a combater os árabes estava D. Henrique, Conde de Borgonha. Pelos
serviços prestados, D. Afonso VI, Rei de Leão e Castela, lhe deu em casamento sua filha D. Tereja e
também o Condado Portucalense. Esta é a origem de Portugal. A nacionalidade portuguesa, porém, só
começa com D. Afonso Henriques, que foi proclamado rei de Portugal em 1143.

É importante ressaltar que o falar dessa região sempre se distinguiu dos falares de outros territórios
por ela ter sido ocupada pelos celtas e suevos e haver constituído um feudo, que mais tarde se tornou
independente.

Do romance aí falado veio a formar‑se, ao norte, o dialeto galaico‑português. Mais tarde, esse
dialeto estendeu‑se progressivamente pela parte sul, absorvendo o romance que ali existia. Com a
independência de Portugal, houve uma diferenciação entre o português e o galego.

Mais tarde, com os descobrimentos marítimos, iniciou‑se a fase de expansão da língua portuguesa,
que então espalha‑se pelo Atlântico, atinge as costas da Ásia e da África e chega à América do Sul.
Nesses locais, a língua portuguesa apresenta muitas diferenciações e em alguns deles, apareceram os
chamados “crioulos”.

Lembrete

Chama‑se “dialeto crioulo” o falar resultante do emprego de uma língua


de civilização pelos nativos de uma região, que a utilizam principalmente
nas relações comerciais. O dialeto crioulo caracteriza‑se pela extrema
simplificação das formas gramaticais.

Para que se tenha uma ideia melhor das transformações de uma língua no decorrer do tempo,
Faraco (1998) contrasta um texto escrito no século XIII ou XIV com uma versão contemporânea dele:

Lenda do Rei Lear

Este rrey Leyr nom ouue filho, mas ouue três filhas muy fermosas e amaua‑as muito. E
huum dia ouue sãs rrazõoes com ellas e disse‑lhes que lhe dissessem verdade, qual d’ellas o
amauua mais. Disse a mayor que nom auia cousa no mundo que tanto amasse como elle;
e disse a outra que o amaua tanto como ssy mesma; e disse a terceira, que era a meor, que
o amaua tanto como deue d’amar filha a padre. E elle quis‑lhe mall porém, e por esto nom
lhe quis dar parte do rreyno. E casou a filha mayor com o duque de Cornoalha, e casou a

99
Unidade II

outra com rrey de Scocia, e nom curou da meor. Mas ela por as vemtuira casou‑se melhor
que nenhua das outras, Ca se pagou d’ella El‑rey de França, e filhou‑a por molher. E depois
seu padre d’ella em as velhice filharom‑lhe seus gemrros a terra, e foy mallandamte, e ouue
a tornar aa merçee d’ell‑rrey de França e de as filha, a meor, a que nom quis dar parte do
rreyno. E elles reçeberom‑no muy bem e derom‑lhe todas as cousas que lhe forom mester,
e homrrarom‑no mentre foy uiuo; e morreo em seu poder.

Lenda do Rei Lear

Este rei Lear não teve filhos, mas teve três filhas muito formosas e amava‑as muito. E um
dia teve com elas uma discussão e disse‑lhes que lhe falassem a verdade, qual delas o amava
mais. Disse a maior que não havia coisa no mundo que amasse tanto como a ele; e disse a outra
que o amava tanto como a si mesma; e disse a terceira, que era a menor, que o amava tanto
como deve uma filha amar um pai. E ele lhe quis mal por isso, e por isso não lhe quis dar parte
no reino. E casou a filha maior com o duque da Cornualha, e casou a outra com o rei da Escócia,
e não cuidou da menor. Mas ela por sua sorte casou melhor que as outras, porque se agradou
dela o rei da França, e tomou‑a por mulher. E depois, a seu pai em sua velhice, tiraram‑lhe os
genros a terra, e ficou infeliz, e teve de recorrer à mercê do rei da França e de sua filha, a menor,
a quem não quis dar parte do reino. E eles o receberam muito bem e deram‑lhe todas as coisas
que lhe foram necessárias, e o honraram enquanto foi vivo; e morreu na casa deles.

Desconsiderando as diferenças gráficas, pode‑se notar no texto antigo a ocorrência de palavras que
não usamos mais (Ca, esto, mentre); que usamos hoje mas não com o significado com que aparecem
no texto (porém, curou, filhas, poder); ou ainda que usamos com outra forma (fermosa, padre, sa). Além
disso, pode‑se observar que o artigo definido era menos frequente do que é hoje.

Assim, por meio de um pequeno texto, é possível perceber que o português, embora mantenha
muitas das suas características, passou, no século XIII ou XIV, por várias mudanças lexicais e estilísticas,
além de alterações sintáticas, sonoras e semânticas.

Para finalizar essas reflexões, compare o soneto de Olavo Bilac “Língua Portuguesa” e um trecho da letra da
canção “Língua” de Caetano Veloso. Os dois fazem referência às origens da língua portuguesa “flor do Lácio”.

Língua Portuguesa

Última flor do Lácio, inculta e bela,


És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...

Amo‑te assim, desconhecida e obscura.


Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!
100
Língua e cultura latinas

Amo o teu viço agreste e o teu aroma


De virgens selvas e de oceano largo!
Amo‑te, ó rude e doloroso idioma,

em que da voz materna ouvi: “meu filho!”,


E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

Língua

Gosto de sentir a minha língua roçar a língua de


Luís de Camões
Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar a criar confusões de prosódias
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões
Gosto do Pessoa na pessoa
Da Rosa no Rosa
E sei que a poesia está para a prosa
Assim como o amor está para a amizade
E quem há de negar que esta lhe é superior?
E deixe os Portugais morrerem à míngua
“Minha pátria é minha língua”
Fala Mangueira! Fala!

Flor do Lácio Sambódromo Lusamérica latim em



O que quer
O que pode esta língua? [...]

8. Presença da cultura romana

8.1 Outros aspectos do legado cultural romano

8.1.1 Máximas romanas

Havia, na sociedade romana, muitas máximas, ou seja, frases que tinham a intenção de passar
ensinamentos. Algumas eram de autoria incerta, mas de outras, conhecia‑se o autor. Um deles, Publílio
Siro (46 a.C.), contemporâneo de César e Augusto, nasceu escravo na Síria e após ir para Roma, foi
libertado em razão de seus dotes intelectuais. Tornou‑se poeta e suas sentenças morais, principalmente,
deram‑lhe a estima do povo. Às suas sentenças, entretanto, foram incorporadas máximas de outros
autores. Veja algumas que são repetidas até hoje:
101
Unidade II

Sobre a fama

Bona fama in tenebris splendorem habet.


A boa fama tem brilho nas trevas.

Honesta fama est alterum patrimonium.


A fama honesta é patrimônio.

Vita et fama hominis ambulant passu pari.


A vida e a fama dos homens andam em igual passo.

Famam curant multi, pauci conscientiam.


Muitos se preocupam com a própria fama, poucos se preocupam com a própria consciência.

Sobre a justiça

Neminem nec accusaveris nec laudaveris cito.


Não acusarás nem louvarás ninguém apressadamente.

Lex videt iratum, iratus legem non videt.


A lei vê o irado, o irado não vê a lei.

Sobre a amizade

Amicum perdere est damnorum maximum.


Perder um amigo é o maior de todos os prejuízos.

Amicum laedere ne ioco quidem licet.


Não se pode ofender a um amigo nem por brincadeira.

Honesta fama est alterum patrimonium.


Uma reputação honrada é um segundo patrimônio

8.1.2 A cidadania e o Direito Romano

O cidadão romano deveria apresentar as seguintes qualidades: coragem, gosto pela glória, respeito
aos deuses, lealdade e fidelidade. Essas virtudes deviam caracterizar toda pessoa que estivesse a serviço
da comunidade e do engrandecimento da pátria. O bem do povo deveria ser o interesse supremo de
toda a nação.

A vida do cidadão romano era regulada por duas instituições: a lei pública e a lei privada. Essa
preocupação com a lei levou os romanos a desenvolverem bastante o seu Direito. O Direito Público (jus
publicum) era composto pelo Direito Civil (jus civile), originário dos costumes e da lei, e pelo Direito
Estrangeiro (jus gentium), originário das conquistas romanas.
102
Língua e cultura latinas

Ainda durante a República, os magistrados encaminhavam leis às Assembleias que, se as aprovassem,


incorporá‑las‑iam ao Direito Público. Ao lado das leis codificadas, existiam as leis não escritas (leis dos
costumes) e a aplicação do Direito pertencia exclusivamente ao clero.

No período do Império, quando apareceram as primeiras escolas de Direito, iniciou‑se a sistematização


do Direito Romano. Nessa época, os melhores juristas passaram a compilar em textos escritos as respostas
das primeiras representações feitas pelos melhores juízes às consultas que lhes tinham sido feitas,
anexando‑as aos códigos de Direito. O Direito Romano foi adotado pelos povos europeus, conservando
sua importância até os dias atuais.

8.1.3 A arte romana e a arquitetura

A arte grega e a das antigas civilizações itálicas foram as duas fontes principais da arte romana.
A primeira chegou à Itália principalmente pela Sicília e por intermédio dos etruscos, que realizaram
as primeiras representações de deuses e santuários inspiradas em modelos gregos. Também com
esse povo, os romanos aprenderam a forma orientalizante de representação da natureza, mas
dando a essa representação uma interpretação própria. Da segunda, os romanos assimilaram
principalmente a simetria, (harmonia que resulta de certas combinações regulares e da observação
de certas proporções).

A grande manifestação artística dos romanos foi a arquitetura. Enquanto para os gregos a obra
essencial era o templo, para os romanos, as construções mais importantes eram as que satisfaziam
necessidades práticas. Assim, as obras que mereceram destaque especial foram os reservatórios de água,
aquedutos, fachadas e pórticos.

A fusão de tipos diferentes de volumes dentro do mesmo edifício deu origem a um sistema
arquitetônico cujo exemplo mais característico eram as termas imperiais (banhos públicos construídos
pelos imperadores), com arcos, cúpulas e semicúpulas. Os edifícios destinados a mercados e tribunais
serviram de modelo para a construção das igrejas cristãs, às quais foi acrescentada a cúpula central,
segundo o estilo do Panteon.

Os romanos empregaram novos materiais de construção, como o cimento e os tijolos, e novas


técnicas como o arco e a abóbada (construção feita em arco com pedras talhadas que cobre certo
espaço e cujos elementos se equilibram). A seguir, outras áreas de desenvolvimento:

• estradas: os romanos criaram, entre suas cidades, uma rede de caminhos que permitia a
mobilidade das tropas e facilitava o comércio. Em geral, essas estradas eram retas, subiam as
colinas, atravessavam as depressões e eram pavimentadas;

103
Unidade II

Figura 10 – Rua de Pompeia

Figura 11 – Rua de Pompeia

• pontes: os romanos da República tinham construído pontes de madeira, mas, durante o Império,
edificaram pontes de pedras e aquedutos. Roma era alimentada por dezenove deles e distribuía
água a 1352 fontes públicas. Alguns desses aquedutos eram muito compridos, como o de Cartago,
que ultrapassava sessenta quilômetros;

• termas: no século II a.C., os romanos já tinham assimilado do Oriente a prática dos banhos. Roma
terá mil termas em IV d.C. Os imperadores construíram imensas delas como as de Caracala. Essas
termas eram locais de cultura física e intelectual e de reunião. Compunham‑se de auditórios,
estádios e bibliotecas. O edifício dos banhos comportava vestiários, salas frias, quentes e estufas.
Essas peças eram revestidas de mármore e frisos de mosaicos e estátuas enfeitavam os jardins;
104
Língua e cultura latinas

Figura 12 – Banho romano – Termas de Caracala

As cidades das províncias construíam termas menos importantes, mas que seguiam os mesmos
modelos. As residências particulares possuíam banhos próprios. A água das cozinhas e das latrinas era
evacuada em esgotos.

• arcos de triunfo: eram muitas vezes simbólicos. O triunfo era um evento importante. Tanto em
Roma como na Etrúria, o rei era recebido como um deus à porta da cidade. Essa cerimônia sagrada
era chamada de adventus Augusti e a porta triunfal era chamada arcus divorum. Já outros arcos
foram construídos para recordar a fundação de uma cidade ou a inauguração de uma ponte;

Figura 13 – Arco de Tito

105
Unidade II

• teatro: os romanos apreciavam os espetáculos e sua forma de teatro era, em geral, a do teatro
grego, mas com a plateia não mais num círculo traçado em torno de um altar, mas sim num
simples meio‑círculo. O palco era escondido no início do espetáculo por uma cortina que podia
ser aberta para os lados ou abaixada em frente ao palco;

Figura 14 – Teatro em Pompeia

• anfiteatros: o maior desses monumentos é o Coliseu. Todo o império romano construía anfiteatros,
como por exemplo, na região da Gália, onde situava‑se Nîmes. Nessas construções, ocorriam as
lutas de gladiadores, que os romanos receberam dos etruscos. A arena do Coliseu, com o tempo, foi
transformada. Havia um soalho com alçapões que permitiam a introdução de cenários e a saída de feras.
As jaulas eram erguidas por elevadores ou então os animais eram empurrados por corredores estreitos
que conduziam a planos inclinados. A arena era cercada por alta rede metálica. As arquibancadas eram
divididas em várias categorias: o podium, por exemplo, era reservado aos senadores e às vestais. Havia
duas frisas: uma destinada ao imperador e a outra aos cônsules e pretores;

Figura 15 – Interior do Coliseu, em Roma

106
Língua e cultura latinas

• circo: local onde se realizavam as corridas de carros. O mais antigo era o Grande Circo. Os circos
simbolizavam a órbita do sol e ao redor deles, projetavam‑se as arquibancadas para os espectadores.

8.1.4 As fábulas romanas

Fedro nasceu na Trácia, foi levado a Roma como escravo, pertenceu ao imperador Augusto e por ele
libertado. Escreveu 123 fábulas que se agrupam em cinco livros. Essas fábulas foram bastante difundidas
e imitadas por escritores de várias épocas e nacionalidades.

A palavra fábula, que significa fala, conversa, narração é uma alegoria, em prosa ou em verso, que
apresenta uma lição moral. Um dos seus traços característicos é o antropomorfismo, tendência que leva
o espírito humano a atribuir a outros seres e objetos maneiras de sentir, pensar e agir peculiares aos
homens.

Observação

Ao entrar em contato com a palavra fábula, o aluno provavelmente se


lembra de La Fontaine, que também recriou fábulas da Antiguidade.

Inspirando‑se em fábulas gregas atribuídas a Esopo, Fedro as modificou e compôs também alguns
poemas originais, mas se distanciou do autor grego, pois escrevia em versos enquanto as fábulas atribuídas
a Esopo são em prosa. Além disso, Fedro fez alusões a fatos e pessoas de sua época, por isso foi exilado no
governo de Tibério, quando o principal auxiliar do imperador foi retratado em alguns poemas.

Note que a fábula a seguir é uma crítica a Sejano, auxiliar do Imperador Tibério. O historiador Tácito
relata muitos exemplos que demonstram como Tibério e Sejano abusavam da Lei de Lesa Majestade
para castigar aqueles que os contrariavam. Essa lei, a princípio, punia os acusados com o exílio. Os
acusadores inventavam os mais absurdos motivos para condenar os inocentes. Foi o que aconteceu com
Fedro, sendo exilado por ordem de Sejano. Seu livro foi retirado de circulação, não podendo ser lido
publicamente.

O lobo e o cordeiro

Lupus et agnus
compulsi siti
uenerant
ad eundem riuum;
lupus stabat superior
agnusque
longe inferior.
Tunc latro
incitatus fauce improba

107
Unidade II

intulit causam iurgii.


“Cur” inquit
“fecisti turbulentam
Aquam
Mihi bibenti?
Laniger timens
contra:
“Qui possum
quaeso,
facere quod quereris,
lupe?”
Liquor decurrit
a te
ad meos haustus.
Ille repulsus
uiribus ueritatis
ait:
“Ante hos sex menses
Male dixisti mihi”.
Agnus repondit:
“Equidem
Non eram natus”.
“Tuus pater
hercle”
inquit ille
“male dixit mihi”.
Atque ita
lacerat
correptum
nece iniusta.

Haec fabula scripta est


propter illos homines
qui opprimunt innocents
causis fictis.

Tradução:

Um lobo e um cordeiro
compelidos pela sede
tinham vindo
a um mesmo ribeiro;
o lobo estava mais alto (mais acima)
e o cordeiro
108
Língua e cultura latinas

muito mais baixo (muito mais abaixo)


Então o salteador (o lobo)
incitado pela goela voraz
trouxe um motivo de briga.
“Por que”, diz ele,
“fizeste turva
a água
a mim que estou bebendo?”
O lanígero temendo
Em resposta diz:
“Como posso,
diz,
fazer isso de que te queixas,
ó lobo?”
O líquido corre
de ti
para os meus goles.
Aquele (o lobo) rebatido
pela força da verdade
diz:
“Há seis meses
Disseste mal de mim”.
O cordeiro respondeu:
[Eu] na verdade
Nessa época não era nascido”.
“Teu pai,
por Hércules”,
diz aquele (o lobo)
disse mal de mim”.
E assim
dilacera
a vítima
com morte injusta.

Esta fábula foi escrita


por causa daqueles homens
que oprimem os inocentes
por motivos fingidos.

Agora, a versão de Monteiro Lobato:

O lobo e o cordeiro

Estava o cordeiro a beber num córrego, quando apareceu um lobo esfaimado, de horrendo aspecto.

109
Unidade II

–Que desaforo é esse de turvar a água que venho beber? – disse o monstro arreganhando
os dentes. Espere, que vou castigar tamanha má‑criação!

O cordeirinho, trêmulo de medo, respondeu com inocência:

–Como posso turvar a água que o senhor vai beber se ela corre do senhor para mim?

Era verdade aquilo e o lobo atrapalhou‑se com a resposta. Mas não deu o rabo a torcer.

–Além disso – inventou ele – sei que você andou falando mal de mim o ano passado.

–Como poderia falar mal do senhor o ano passado, se nasci este ano?

Novamente confundido pela voz da inocência, o lobo insistiu:

–Se não foi você, foi seu irmão mais velho, o que dá no mesmo.

–Como poderia ser o meu irmão mais velho, se sou filho único?

O lobo, furioso, vendo que com razões claras não vencia o pobrezinho, veio com uma
razão de lobo faminto:

–Pois se não foi seu irmão, foi seu pai e seu avô!

E – nhoque! – sangrou‑o no pescoço.

Contra a força não há argumentos.

Estamos diante da fábula mais famosa de todas – declarou Dona Benta. Revela a essência
do mundo. O forte tem sempre razão. Contra a força não há argumentos.

–Mas há a esperteza! Berrou Emília. Eu não sou forte, mas ninguém me vence. Por
quê? Por que aplico a esperteza. Se eu fosse esse cordeirinho, em vez de estar bobamente
a discutir com o lobo, dizia: “Senhor Lobo, é verdade sim, que sujei a água deste riozinho,
mas foi para envenenar três perus recheados que estão bebendo ali embaixo.” E o lobo, já
com água na boca: “Onde?” E eu, piscando o olho: “Lá atrás daquela moita!” E o lobo ia ver
e eu sumia...

–Acredito, murmurou Dona Benta. E depois fazia de conta que estava com uma
espingarda e, pum! Na orelha dele, não é? Pois fique sabendo que estragaria a mais bela
e profunda das fábulas. La Fontaine a escreveu de modo incomparável. Quem quiser ver
o que é obra‑prima, leia e analise a sua fábula do Lobo e o Cordeiro (LOBATO, 1994, pp.
42‑43).

110
Língua e cultura latinas

8.2 Repercussões da cultura romana

A expansão do Império Romano constituiu‑se como uma grande influência na cultura romana. As
casas perderam a simplicidade tradicional e aumentaram de tamanho a fim de receber convidados. A
alimentação frugal recebeu requintes orientais. Os romanos passaram a comer à moda grega, com lutas
e espetáculos musicais para entretenimento. Também o vestiário mudou, tornando‑se variado e com
muita ornamentação. O uso de enfeites e cosméticos difundiu‑se tanto entre mulheres quanto homens.

A influência desse novo tipo de vida na moral foi enorme. Os laços familiares se afrouxaram, os
divórcios se multiplicaram, ao mesmo tempo em que as famílias ricas evitavam o aumento do número
de filhos, para não dividirem a fortuna, evitando a perda de prestígio.

Da religião grega, a influência se manifestou na introdução dos mistérios. As bacanais, em homenagem


a Baco, passaram a ser toleradas, dando origem a orgias clandestinas de criminosos. Os deuses orientais
começaram a entrar no culto romano, tomando o lugar dos deuses tradicionais. Os escravos vindos do
Oriente trouxeram consigo suas crenças e práticas religiosas. Devido a todos esses fatores, os cultos
tradicionais passaram para segundo plano, chegando a ser ridicularizados.

Também no setor das artes se fez sentir a influência grega. O estilo coríntio começou a ser empregado
nas construções romanas. Sob a influência grega, foram edificadas termas, teatros e anfiteatros, onde
aconteciam jogos e espetáculos públicos.

A formação intelectual dos romanos se aperfeiçoou, surgindo círculos culturais de acentuada


influência grega uma vez que escravos trazidos a Roma eram elevados à condição de mestres (pedagogos)
dos jovens das famílias romanas.

8.3 O legado cultural romano

Os romanos assimilaram muitos elementos da cultura grega e oriental e transmitiram esses


conhecimentos aos povos que se estabeleceram no Império Romano, os bárbaros germânicos. Estes, por
sua vez, se encarregaram de passá‑los ao mundo moderno e contemporâneo. Não é possível esquecer o
papel desempenhado por Roma na construção da sociedade europeia.

A influência direta da língua latina foi evidente. Com exceção feita às Ilhas Britânicas, em todas
as terras do Ocidente onde os romanos se estabeleceram, se falam hoje línguas românicas. Na parte
oriental do Império, a influência do latim foi menor.

O papel do latim na história linguística da Europa não se limitou a ser apenas o da origem das línguas
românicas. Adaptado pela Igreja como língua própria, o latim continuou a ser importante, apesar das
invasões bárbaras que desfizeram a estrutura política em que se apoiava.

A contribuição dos romanos não foi igual em todos os setores. Por um lado, no campo da ciência, no
estudo da natureza e na matemática, praticamente não acrescentaram nada, não existindo uma invenção
significativa que possa ser atribuída aos romanos. Por outro lado, deixaram notáveis ensinamentos
111
Unidade II

no campo militar, na administração pública, na arquitetura e, principalmente, no campo da ciência


jurídica (Direito) e na prática política. O direito romano é a base da ciência do Direito de todos os povos
contemporâneos. Sua experiência na arte de governar, na economia, na literatura e nas artes serviu de
modelo para todos os povos da Europa ocidental.

O sistema de administração municipal romana, as termas, o teatro, os aquedutos, a organização da


Igreja Católica e o ideal de liberdade dos homens que viveram na República foram outras contribuições
importantes da civilização romana à sociedade contemporânea.

Resumo

O latim vulgar apresentava características bem diferentes daquelas do


latim clássico e dava preferência às expressões perifrásicas. Também foram
reduzidos os ditongos e hiatos a simples vogais. Houve o obscurecimento
dos sons finais e as palavras proparoxítonas eram evitadas.

Os casos reduziram‑se, tendo‑se conformado, em todas as declinações,


o vocativo com o nominativo; o genitivo, dativo e ablativo, já desnecessários
pelo emprego mais frequente das preposições, com o acusativo.

As inscrições de cunho popular são muito valiosas para o conhecimento


do latim vulgar. Caso não existissem, seria impossível conhecer a língua
falada pelo povo do Império Romano em seus vários aspectos.

A literatura romana teve grande importância, influenciando a literatura


ocidental. No gênero comédia, destaca‑se Plauto. Suas personagens são
construídas de forma exagerada, para produzirem efeitos cômicos.Também
os nomes delas são, muitas vezes, estranhos e engraçados. Criam‑se
combinações fônicas inusitadas, reponsáveis por inúmeras confusões.
O tom romano de que se impregna as comédias de Plauto desaparece
nas comédias de Terêncio, pois suas peças são muito influenciadas pelas
comédias gregas.

Outro importante autor latino é Lucrécio, que procurou reproduzir toda


a doutrina de Epicuro, filósofo grego que vivera em Atenas entre os séculos
IV e III a.C.

Para Cícero, representante da retórica grega, o discurso não devia


apenas dizer alguma coisa: devia ensinar, agradar e comover. Sobre o
orador (De Oratore) é composto em forma de diálogo como se fosse uma
conversa que teria sido travada em 91 a.C. Assim como Cícero, Quintilhano
tratou da retórica. Escreveu um grande tratado em doze livros, A instituição

112
Língua e cultura latinas

oratória (Institutio oratoria) que, embora extensa, tem um objetivo único:


apresentar o necessário para a formação do orador.

Augusto incumbiu o poeta Virgílio de escrever uma grandiosa epopeia


para exaltar os feitos romanos. O trabalho durou dez anos – de 29 a 19 a.C,
e resultou em uma grande obra, a Eneida, baseada nas epopeias gregas.

Horácio desenvolve temas diversos, alternando poemas longos com


outros mais curtos. O poeta apresenta um posicionamento diante da
vida de forma a aproveitá‑la ao máximo, livre de preocupações sobre
o futuro. A expressão carpe diem aparece no poema 11 das Odes de
Horácio.

Ovídio começou a publicar suas obras por volta de 20 a.C. No final do


século I a.C. escreve a Arte de amar, que trata‑se de um conjunto de três
livros nos quais o poeta constrói uma verdadeira teoria da sedução.

A filosofia de Sêneca afirmava que, mais do que estar liberto das


paixões, ser livre, é deixar‑se conduzir pelo destino, por uma “sujeição
com consentimento”. Suas tragédias apresentam um pouco de falta de
teatralidade, pois o autor as escreveu possivelmente para serem lidas em
sessões públicas, para uma elite habituada com textos em que os aspectos
retóricos eram muito valorizados. Embora baseadas nas tragédias gregas,
há traços originais nas tragédias de Sêneca.

Línguas românicas

As línguas neolatinas não vieram diretamente do latim, mas de vários


romances, que eram as modificações regionais do latim. Não se conhece a
época exata da formação dos romances nem o desaparecimento do latim
vulgar.

A história do Império Romano deveria ser de amplo conhecimento


de todos os habitantes do Ocidente, porque este lado do mundo recebeu
e conserva uma herança notavelmente romana, ainda que tenha sido
enriquecida, no decorrer do tempo, por outros povos e culturas.

Costuma‑se designar como Império Romano o vasto território que se


agregava em torno do governo de Roma.

O primeiro período (753 – 509 a.C.) constitui a fase nascente de Roma.


Sua aliança mais importante foi com os etruscos, que, na época, possuíam
avançada civilização.

113
Unidade II

O segundo período (509 – 27 a.C.) corresponde à época da República e


constitui a principal etapa da expansão territorial romana.

O terceiro período (27 a.C. – 476 d.C.) engloba o apogeu do Império


Romano e sua decadência. As conquistas romanas desse período ampliaram
todas as fronteiras.

Os romanos, embora não impusessem sua língua e seus costumes,


criavam redes de infraestrutura antes inexistentes nas áreas conquistadas,
favorecendo o comércio com a metrópole enquanto o latim se tornava
língua do mercado, abrindo portas para que postos fossem atingidos na
sociedade romanizada.

Os povos bárbaros que pressionavam as fronteiras do Império Romano


começaram a rompê‑las a partir do século III d.C. Embora os povos invasores
se cristianizassem e adotassem a língua latina como sistema linguístico de
comunicação na Itália, introduziam sua própria cultura, usos e costumes.

No século VIII, houve a invasão dos árabes na Península. A cultura árabe


era totalmente diferente da cultura da região. Lá, predominava a cristã,
enquanto aqueles que invadiam eram muçulmanos. Esses fatores levaram
os dois povos a viverem, em geral, separados. Na língua portuguesa há
inúmeros empréstimos linguísticos provenientes das línguas germânicas,
do árabe, do grego e do hebraico.

A partir de 43 a.C., a Britannia tornou‑se, com este nome, província


romana. Entretanto, quando seu domínio terminou, os romanos deixaram
poucos traços na língua da população local. Assim, as tribos germânicas
que chegaram lá encontraram uma população de língua celta. Uma das
razões da extrema riqueza do léxico inglês consiste no fato de ele possuir,
para designar muitas coisas, uma denominação de origem germânica e
outra de origem românica.

Mesmo com o Renascimento, o latim permaneceu sendo a língua


da ciência. A Igreja continuou a utilizá‑lo na liturgia e na formação de
eclesiásticos, mas, no século XX, seu uso passou a diminuir e decidiu‑se pela
substituição do latim pelas línguas vulgares na liturgia.

A sistematização do Direito Romano começou na época do Império,


quando apareceram as primeiras escolas de Direito. O Direito Romano foi
adotado pelos povos europeus, conservando sua importância até hoje.

A grande manifestação artística dos romanos foi a arquitetura. Para eles,


as obras mais importantes eram as que satisfaziam necessidades práticas.
114
Língua e cultura latinas

Os romanos assimilaram muitos elementos da cultura grega e oriental


e transmitiram esses conhecimentos aos povos que se estabeleceram
no Império Romano, os bárbaros germânicos. Estes, por sua vez, se
encarregaram de transferi‑los ao mundo moderno e contemporâneo.

Exercícios

Questão 1. Considere o poema a seguir:

Língua portuguesa (Olavo Bilac)

Última flor do Lácio, inculta e bela,


És, a um tempo, esplendor e sepultura;
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo‑te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo‑te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: “Meu filho!”,
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!3

Analise as afirmações que seguem:

I. Ao se referir à língua como “a última flor do Lácio”, o poeta, metaforicamente, lembra a origem do
português.

II. Os adjetivos “inculta e bela” mostram a percepção do poeta sobre a língua, originada do latim
vulgar, e ao mesmo tempo bonita.

III. Ao se referir à sepultura, o poeta tem como intenção mostrar que a morte do Império Romano
decretou a morte da língua culta e esplendorosa, pois toda a cultura posterior tem pouco valor.

Está correto o que é dado:

(A) Somente na afirmativa I.

3
Disponível em: <http://poesiasselecionadas.spaceblog.com.br/167881/ULTIMA‑FLOR‑DO‑LACIO‑Olavo‑Bilac/>.
Acesso em: 20 nov. 2011.
115
Unidade II

(B) Somente na afirmativa II.

(C) Somente na afirmativa III.

(D) Somente nas afirmativas I e II.

(E) Somente nas afirmativas I e III.

Resposta correta: alternativa D

Análise das afirmativas:

I – Afirmativa correta.

Justificativa: o português foi a última língua neolatina com origem no latim vulgar, falado pelos
soldados da região italiana do Lácio.

II – Afirmativa correta.

Justificativa: o poeta valoriza a beleza da língua portuguesa, mesmo ela tendo sua origem no latim
vulgar.

III – Afirmativa incorreta.

Justificativa: o poeta não considera sem valor a cultura originada a partir do fim do Império Romano.

Questão 2. Leia o trecho a seguir, do professor Marcos Bagno:

“Em contraposição à noção de “erro” e à “tradição da queixa” derivada dela, a ciência linguística
oferece os conceitos de variação e mudança. Enquanto a gramática tradicional tenta definir a “língua”
como uma entidade abstrata e homogênea, a linguística concebe a língua como uma realidade
intrinsecamente heterogênea, variável, mutante, em estreito vínculo com a realidade social e com os
usos que dela fazem os seus falantes. Uma sociedade extremamente dinâmica e multifacetada só pode
apresentar uma língua igualmente dinâmica e multifacetada.

Ao contrário da gramática tradicional, que afirma que existe apenas uma forma certa de dizer as coisas,
a linguística demonstra que todas as formas de expressão verbal têm organização gramatical, seguem
regras e têm uma lógica linguística perfeitamente demonstrável. Ou seja: nada na língua é por acaso.

Por exemplo: para os falantes urbanos escolarizados, pronúncias como broco, ingrês, chicrete, pranta
etc. são feias, erradas e toscas. Essa avaliação se prende essencialmente ao fato dessas pronúncias
caracterizarem falantes socialmente desprestigiados (analfabetos, pobres, moradores da zona rural etc.).
No entanto, a transformação do L em R nos encontros consonantais ocorreu amplamente na história da
língua portuguesa. Muitas palavras que hoje têm um R apresentavam um L na origem:
116
Língua e cultura latinas

Latim Português
blandu‑ brando
clavu‑ cravo
duplu‑ dobro
flaccu‑ fraco
fluxu‑ frouxo
obligare obrigar
placere‑ prazer
plicare pregar
plumbu‑ prumo

Tabela 19

Assim, o suposto “erro” é na verdade perfeitamente explicável: trata‑se do prosseguimento


de uma tendência muito antiga no português (e em outras línguas) que os falantes rurais ou não
escolarizados levam adiante. Esse fenômeno tem até um nome técnico na linguística histórica:
rotacismo.

Esse é só um mínimo exemplo de que tudo o que é chamado de “erro” tem uma explicação
científica, tem uma razão de ser, que pode ser de ordem fonética, semântica, sintática, pragmática,
discursiva, cognitiva etc. Falar em “erro” na língua, dentro do ambiente pedagógico, é negar o
valor das teorias científicas e da busca de explicações racionais para os fenômenos que nos
cercam.

O exemplo apresentado acima (mudança de L para R em encontros consonantais) não deve levar
ninguém a supor que esses fenômenos variáveis e mutantes só ocorrem na língua dos falantes
rurais, sem escolarização e pobres. Eles também ocorrem na língua dos falantes “cultos”, urbanos e
letrados, muito embora esses mesmos falantes acreditem ser os legítimos representantes da língua
“certa”.4

Considere as afirmações que seguem:

I. A troca do “L” pelo “R” acontece de forma intencional, pois as pessoas conhecem a origem latina
das palavras.

II. Segundo o autor, o fenômeno do rotacismo é um erro, que ocorre também nas palavras citadas
como exemplos.

III. De acordo com o autor, muitas pessoas que se julgam representantes da fala culta não têm
consciência de que utilizam palavras que sofreram variações semelhantes às que aparecem na linguagem
popular.

4
Disponível em <http://marcosbagno.com.br/site/?page_id=12>. Acesso em 12 nov. 2011. (Adaptado).
117
Unidade II

Está correto o que apresenta:

(A) Somente na afirmativa I.

(B) Somente na afirmativa II.

(C) Somente na afirmativa III.

(D) Somente nas afirmativas I e II.

(E) Somente na afirmativa II e III.

Resolução desta questão na Plataforma.

118
Língua e cultura latinas

Figuras e ilustrações

Todas as figuras que constam neste livro‑texto (exceto a Figura 4, referenciada a seguir) fazem parte
dos arquivos das professoras conteudistas.

Figura 4 – Disponível em: <http://incautosdoontem.opsblog.org/page/27/>. Acesso em: 20 nov. 2011.

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Informações:
www.sepi.unip.br ou 0800 010 9000

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