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A PORTADA DA CAPELA DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS DA PENITÊNCIA DE SÃO

JOÃO DEL REI – MINAS GERAIS

Indiamara Catarine Pech - História (FAFIUV)


Orientador: Ddo. Ilton César Martins

Resumo: Nosso objeto de estudo, a Portada da Capela de São Francisco de Assis da Penitência, em
São João Del Rei, é uma das mais importantes esculturas feita por Aleijadinho, e também uma das
principais obras mineira, pois nela podemos identificar muitos traços barrocos. A porta, ao longo da
história, sempre teve um significado importante, não só o de entrar e sair, ou de proteger ou dar
uma visão exterior, mas por simbolizar e representar poder, famílias, irmandades, nobreza,
fidalguia e levar em si o brasão, o merlão, o medalhão ou a pedras de armas. Esses elementos terão
mais importância no período barroco do que em todos os outros períodos da arquitetura, pois,
segundo Paiva (2004, p. 124) “põe em evidência conceitos fundamentais do Barroco: a teatralidade
e a valorização cenográfica dos espaços, o apelo aos sentidos e o dinamismo das formas”. Assim,
procuramos, também, apontar os elementos constituintes das portadas: estruturais, decorativos e
de identificação.

Palavras-chave: Portada. Barroco Mineiro. Estilo Aleijadinho.

INTRODUÇÃO

A perspectiva que se segue nessa pesquisa considera as relações existentes


entre o estilo Aleijadinho com a arte barroca mineira, através da obra projetada em
1774, a portada da capela de São Francisco de Assis da Penitência, em São João Del
Rei. A portada dessa capela é uma das mais importantes esculturas feita por
Aleijadinho, e também uma das principais obras, pois nela podemos identificar os
traços barrocos. Na fachada destacam-se as linhas curvas, os querubins, os florões,
os aspectos religiosos, o brasão e medalhões.
Escolhemos a porta como objeto de estudo, porque ao longo da história e do
tempo ela sempre teve um significado importante, não só o de entrar e sair, ou de

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proteger ou dar uma visão exterior, mas por simbolizar e representar poder,
famílias, irmandades, nobreza, fidalguia e levar em si o brasão, o merlão, o
medalhão ou a pedras de armas. Onde esses elementos, no período barroco, terão
mais importância do que em todos os outros períodos da arquitetura, pois “põe em
evidência conceitos fundamentais do Barroco: a teatralidade e a valorização
cenográfica dos espaços, o apelo aos sentidos e o dinamismo das formas” (PAIVA,
2004, p. 124). Assim, procuramos, também, apontar os elementos constituintes das
portadas: estruturais, decorativos e identificativos.
No caso da nossa portada, objeto de estudo, ela trás em si não só a arte
barroca mineira, mas um período de riqueza o qual os elementos decorativos
tinham por função simbólica o de sinalizar espaços, de valorizar os vãos de porta
que representam um único Deus, o de demonstrar poder, até porque a igreja foi
construída no período áureo da mineração, onde a cada ouro ou pedra preciosa
descoberta era levantada uma igreja em forma de agradecimento, apresentando
uma gramática arquitetônica e decorativa própria do período barroco. Também
nessa portada, vemos o estilo único de um dos artistas mais importantes de Minas,
que recebeu influências portuguesas, onde a tipologia arquitetônica mais
freqüente utilizada por Aleijadinho consiste num vão de porta encimada por
elementos decorativos e por uma cornija arquitravada ondulada.
Ao fazermos o estudo em torno da obra de Aleijadinho, estaremos
identificando as contribuições das suas obras para a história e cultura de Minas
Gerais, bem como ressaltando as principais diferenças e semelhanças com a arte
barroca, de forma que possam identificar como o Barroco se expressa na obra de
Aleijadinho.

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A PORTADA DA CAPELA DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS DA PENITÊNCIA DE SÃO
JOÃO DEL REI

1. AS PORTADAS DE IGREJAS BARROCAS

(...) a porta é um dos elementos essenciais do cerimonial e como a beleza


perecível da madeira esculpida ou a beleza mais permanente da pedra
talhada, do mármore colorido, acrescenta grandeza e nobreza ao gesto do
homem que caminha que transpõe o umbral de todo um mundo (BASTIDE,
2006, p. 130).

A Igreja da Contra-Reforma utilizou o barroco para mostrar sua


grandiosidade e poder dentro da sociedade. Sua arquitetura, monumental, sempre
era acompanhada de uma exuberante fachada com ornatos maravilhosamente
esculpidos, onde o dinamismo e a teatralidade predominam, com diferentes efeitos
visuais.
O Barroco surge no século XVII, na Europa, mais precisamente, na Itália.
Como é uma tendência artística, se desenvolveu primeiramente nas artes plásticas
e depois se manifestou na literatura, no teatro e na música. Tem como origem
principal a Reforma Protestante, na Europa. Essas Reformas Religiosas ocorreram
durante o século XVI, quando a Igreja Católica havia perdido seu espaço e poder,
pois a Reforma foi um efeito negativo para as pinturas e esculturas religiosas,
porque estas foram banidas, mas isto não impediu os católicos de continuarem
influenciando no cenário político, econômico e religioso na Europa, o que provocou
muitas alterações na cultura européia. Essa Reforma, segundo Graça Proença

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(2003), favoreceu o surgimento dos Estados nacionais e dos governos absolutos.
Com uma reação da Igreja Católica, surge o caráter da Contra Reforma, a partir do
Concílio de Trento (1515-1563), fazendo com que as ordens religiosas retomassem
suas forças, construindo grandes igrejas.
A partir de 1630, as igrejas ganham novo estilo arquitetônico, carregado de
características barroco, onde as fachadas, cúpulas, torres, retábulos, púlpitos e a
ornamentação interna das igrejas se libertam (BURY in OLIVEIRA, 2006). As
plantas começam a aparecer mais elípticas e ovuladas de dimensões menores.
Segundo Paiva (2004), cada portada constitui três elementos fundamentais:
o estrutural, o decorativo e o identificativo. O elemento estrutural faz parte
integrante da solidez construtiva da portada; o decorativo contribui para o
embelezamento do conjunto; já o elemento identificativo permite conhecer um
determinado estatuto social, porque veicula maneiras coletivas de pensar e de
sentir.

O barroco dos períodos de <<experimentação>> e de <<definição>> (c.


1650 a. c. de 1717), surge no Norte através de uma crescente decoração
das fachadas, utilizando-se essencialmente elementos retirados das
gravuras maneiristas do norte da Europa (...) nas cartelas, no
enquadramento das aberturas e dos nichos, aparece uma pujante
decoração de festões, ferragens e figuras helicóides que, pelas suas formas
túrgidas, vão dar às fachadas das igrejas e capelas a exuberância e fantasia
que lhes é negada pela arquitectura. Entramos, assim, num barroco cujo
interior sacro vai desenvolvendo um esquema decorativo (ALVES, 2005, p.
04).

É com Maderno e Borromini que aparecem o novo estilo arquitetônico nas


igrejas, principalmente nas portadas, nas quais as formas arredondadas

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substituíram as angulosas e as paredes parecem se curvar de dentro para fora e
vice-versa, numa sucessão côncava e convexa, dotando o conjunto de um forte
dinamismo.

Imagem 1: Fachada do Palácio de Marques De Dos Aguas, Valência.

Note que essa fachada, feita por Barromini, é repleta de volumes e


dinamismos, reproduzindo diferentes efeitos visuais, onde suas complicações
crescentes tornam-se exuberantes decorações, com uma pujança de estruturas
singelas e fortes. Seu elemento estrutural é contracurvado, com formas bastante
decorativas, aonde (a cima do vão da porta) se enquadra à pedra de arma, no caso
dessa a escultura da santa.

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Assim vemos que, a arquitetura e a escultura se desenvolveram como
elementos auxiliares, obtendo do efeito cenográfico total, com uma tendência
dramática e emocional do período.
A princípio, as igrejas possuíam uma única porta, pois significava uma única
verdade e um único Deus. Elas eram simples com poucas decorações, essas
pertenciam à primeira fase do Barroco, continuação do Renascimento. E é a partir
da sua segunda fase, o Alto Barroco, que as portadas vão ganhar mais
grandiosidade e detalhes nas decorações.

Imagem 2: Igreja e Mosteiro de Tibães, Braga.

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A fachada da igreja acima já demonstra a transição do renascimento para o
barroco (o que seria o barroco na sua primeira fase). Sua porta ainda é muito
simples, com pequenos detalhes, poucas curvas, sem florões e querubins.
Apresenta uma composição arquitetônica erudita, tendo o corpo central autônomo,
limitado por pilastras, aonde seu vão de porta é decorado em arcos de voltas
perfeitas, e seu ornato principal (ou a pedra de arma) é a cruz no alto.
Percebemos que a igreja e Mosteiro de Tibães, em Braga, possuem pilastras,
senda estas fundamentais, pois, segundo Paiva (2004, p. 86), reforça os cunhais,
dividem os muros em secções, criando efeitos decorativos, e frequentemente
ajudam a definir os vãos da porta, sendo nestes casos ressaltadas.

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Imagem 3: Mosteiro de Alcabaça, Portugal.

A portada acima, já no final do Alto Barroco e início do Barroco Tardio,


demonstra melhor a característica do Barroco em si. Toda sua decoração foi feita
por linhas curvas e arcos, seu corpo é ladeado com pilastras, criando uma
composição dinâmica, sua pedra de arma ou brasão aparece em lugar de destaque
entre as duas torres do mosteiro (a escultura da santa e a cruz no alto), não sendo
o único elemento dinâmico, pois todo o mosteiro é decorado com esculturas de

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santos em meio às pilastras. Decorada com muita delicadeza, o qual chama a
atenção de longe devido à riqueza de detalhes. Mais tarde, as colunas, do
renascimento, no barroco vão se enriquecer com enrolamentos de folhas e cachos
de uvas (ALVES, 2005).
Podemos afirmar que, as portas concentram mais elemento decorativo e
arquitetônico do que estrutural. Como diz Paiva (2004, p. 87)

(...) Mesmo nos casos mais simples, são estes que definem a portada e
valorizam o eixo de simetria da composição. Podem ser vãos de ombreiras
e lintel rectos, vãos de ombreiras e lintel rectos coroados por frontão
interrompido, vãos de ombreiras e lintel rectos com pilastras justaspostas
às ombreiras, vãos de ombreiras rectas e lintel curvo com ou sem frontão,
e ainda vãos em arco perfeito. O rusticado, o almafadado e as pilastras
ressaltadas são algumas das formas mais comuns de valorização dos vãos
de porta.

As portadas, assim como a arte e arquitetura, modificaram-se com o tempo,


de acordo com a época e a sociedade, onde, em maior parte, as portadas,
principalmente da fase do barroco, eram sinais de equilíbrio, de ordem e
dignidade, cumprindo uma função simbólica e de comunicação estabelecendo
“uma dinâmica entre a linguagem arquitectônica escolhida e aquilo que se
pretende dizer (PAIVA, 2004, p. 128). Assim sendo, as portadas do início do século
XVIII, maciças, altas e imponentes, tornam-se mais decorativas, recorrendo às
formas onduladas e sinuosas, porém o enquadramento das portadas seja igual o
que teria sido no passado. Essas portadas decorativas serão encontradas
principalmente na América Latina, onde o barroco é tardio e com influências
portuguesas, associado totalmente a religião cristã.

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Na América Latina, o barroco entrou no século XVII, trazido por artistas que
viajavam para a Europa, e permaneceu até o final do século XVIII. No Brasil, o
barroco inicia-se no século XVIII, e se manifesta principalmente nas arquiteturas e
nas esculturas, associado totalmente à religião, e nem poderia ser diferente, pois a
arte no Brasil cresceu sob a proteção da igreja (JORGE, 1966).
No Brasil duas linhas diferentes caracterizaram o barroco, nas regiões
enriquecidas pelo comércio e pela mineração, pois o Brasil, no século XVI, tornou-
se um empreendimento comercial importante para a Europa, pois produzia mais
riquezas que a Índia, atraindo também os exploradores fundando vilas, onde os
trabalhos eram feitos em relevos e com detalhes em ouro, e outra nas regiões onde
não existiam nem ouro nem açúcar, o qual os trabalhos eram mais simples e
modestas, feitas em talhas. Minas Gerais, Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro
foram privilegiados por serem centros econômicos do país, já São Paulo pertence à
segunda linha do barroco.

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Imagem 4: portada igreja São Francisco, Salvador.

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Imagem 5: Igreja São Francisco, Salvador.

A igreja de São Francisco, em Salvador, tem toda sua fachada em relevo, a


porta principal é toda decorada com santos, figuras, ramos, querubins, folhas,
florões, entre outros ornatos, mais a cima encontra-se a imagem do santo, o brasão
e a cruz, representando o poder da Ordem Terceira. Seu frontão é excepcional, está
muito evidente o conceito fundamental do barroco: a teatralidade, a valorização
cenográfica dos espaços e o dinamismo das formas.
Segundo Bastide (2006), as portas, aqui no Brasil, em especial no Nordeste,
tem um papel muito importante considerado uma manifestação de poder, tanto
para as ordens religiosas, como, também, para os senhores de engenho, pois
manifesta seu status social. O barroco brasileiro não será uma imitação, mas

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responde às mesmas funções que na Europa. Sendo o barroco o reino da
representação, “a porta sempre foi o lugar privilegiado da ornamentação, em razão
dos rituais de entrada e de saída, tanto na arquitetura religiosa como na
arquitetura civil (...). A porta da igreja barroca é ornamentada de modo a formar o
arco do triunfo do bispo que vem teatralmente abençoar a multidão” (BASTIDE,
2006, p. 134).
Assim como Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro, Minas Gerais também foi
um dos centros econômicos do Brasil. Propiciadas pela riqueza econômica e pelo
desenvolvimento continuo de novos núcleos urbanos gerados pela mineração,
Minas recebeu grande número de imigração de oficiais e mestre-de-obras
portugueses, atraídos pelas oportunidades de trabalho (OLIVEIRA in RESENDE;
VILLALTA, 2007, p. 365).
No período áureo da atividade mineratória (1730-1760) é que se teve uma
maior concentração de profissionais portugueses nas obras das igrejas mineiras.
Nas ultimas décadas dos setecentos os trabalhos são feitos por mãos de mulatos
treinados nas oficinas locais, que é o caso de Aleijadinho, treinado por seu pai
Manuel Francisco Lisboa, um arquiteto português, um dos primeiros a atuar nessa
área.
Antônio Francisco Lisboa é filho de Manuel Francisco Lisboa, arquiteto
português, e da escrava africana Izabel. Nasceu no dia 29 de agosto de 1730, na
antiga Vila Rica, hoje Ouro Preto, ex-capital de Minas Gerais, no bairro do Bom
Sucesso. Ficou conhecido como Aleijadinho devido à moléstia que sofreu. Segundo
Rodrigo Bretãs (in JORGE, 1966), os mestres de Aleijadinho foram Manuel
Francisco Lisboa, seu pai, e João Gomes Batista, abridor de cunhos da Casa de

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Fundição de Ouro de Vila Rica. Praticamente todos seus trabalhos eram de caráter
sagrado: florões, querubins sorridentes, anjos, escudos, festões, santos, cenas
bíblicas. Preferiu as linhas sinuosas distendendo em flexíveis volutas, a variedade,
misturando o profano ao sagrado, o ideal ao real, abusando em abundância de
decoração (JORGE, 1966).
A partir de 1777, sua doença começa a atacá-lo fortemente, a lepra nervosa,
uma doença que sofre muito preconceito, pois o portador dessa doença era
considerado impuro. Segundo Bretãs (in JORGE, 1966), Aleijadinho perdeu todos
os dedos dos pés e os dedos das mãos se atrofiaram, chegando a cair, restando-lhe
os polegares e indicadores, quase sem movimentos. Em 1810 já se encontra muito
doente, falecendo em novembro de 1814.
Os trabalhos realizados por Aleijadinho se destacam nas igrejas de Minas,
pois seus trabalhos são de desenhos mais livres, tanto interiormente como
exteriormente, elas se destacam com suas esculturas em pedra-sabão, todas
decoradas de folhas, florões e querubins, características típicas do estilo
Aleijadinho. Nas portadas nunca economizou, e de acordo com o pedido das
irmandades, ao esculpir o brasão sempre cuidava dos minuciosos detalhes para
que enriquecesse ainda mais o elemento decorativo e identificativo da igreja. As
obras de maior significado de Aleijadinho seriam as portadas para as Ordens
Terceiras do Carmo em Sabará, Ouro Preto e São João Del Rei e São Francisco de
Assis nas duas últimas cidades. Segundo Oliveira (in RESENDE; VILLALTA, 2007, p.
373), “o tema central de todas elas é a tarja com as armas da irmandade,
geralmente as chagas de Cristo ou os membros estigmatizados de Cristo e de São

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Francisco nas igrejas franciscanas, e o Monte Carmelo encimado por uma cruz e
três estrelas nas igrejas carmelitas”.

1.1 A PORTADA DA CAPELA DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS DA PENITÊNCIA DE


SÃO JOAO DEL REI – MINAS GERAIS

A cidade de São João Del Rei foi um dos grandes centros comercias para
Minas Gerais, devido a sua riqueza, pois a cidade era possuidora de grandes jazidas
de ouro de aluvião, a partir dessa descoberta, a cidade começou a crescer e
construções de novas capelas surgem. O município foi fundado no final do século
XVII, em 1713, por Tomé Portes Del Rei, e recebeu o nome de São João d’el-Rey, em
homenagem a Dom João V, rei de Portugal (DIAS; MANEIRA; MONTENEGRO;
HORTA; GONTIJO; MENDES e ANDRADE, 2007).
O ouro na cidade foi descoberto em 1709, gerando discórdia entre
portugueses e paulistas, tendo como conseqüência a Guerra dos Emboabas, onde
paulistas foram emboscados e chacinados por portugueses (OLIVEIRA: JANUÁRIO,
2007, p. 04).
A cidade é conhecida por suas festas religiosas, os toques dos sinos, pela
Semana Santa e pelas suas igrejas e capelas de estilo barroco mineiro, onde a
arquitetura reflete os diversos ciclos econômicos, o qual as opulências dos altares
dourados e a profusão de detalhes ornamentais se destacam. Várias são as igrejas
que se destacam em São João Del Rei: a igreja de Nossa Senhora do Carmo, Catedral
de Nossa Senhora do Pilar, a igreja de Nossa Senhora das Mercês, igreja São
Gonçalo, igreja do Rosário, mas a igreja principal e de maior destaque é a de São

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Francisco de Assis da Penitência, não só pelo seu adro e sua escadaria, mas pela
sua ornamentação e portada, que reflete todas as características do barroco
mineiro, devido a sua riqueza de detalhes, transmitindo a cultura e a fé da
população. Hoje a cidade é considerada a segunda cidade eleita como Capital
Brasileira da Cultura.
A igreja de São Francisco de Assis da Penitência, em São João Del Rei, foi
concluída em 1774, para a igreja franciscana, pertencente à irmandade de Ordem
Terceira, os quais excetuavam o voto de castidade e de clausura. Durante sua
construção, a igreja sofreu grandes alterações, sendo modificado o projeto de
Aleijadinho em 1785, na parte do frontispício e nas torres, por Francisco de Lima
Cerqueira. Assim sendo, só é de sua autoria a escultura em pedra-sabão da portada,
que contrasta com a parte mais grosseira do frontão.

Imagem 6: projeto original de Aleijadinho da igreja de São Francisco de Assis, São João Del Rei.

Note, na imagem 6, que, no projeto original desenhado por Aleijadinho, a


nave é alongada e sua torre não é coroada. Com a modificação o plano da nave será

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oval e toda a ênfase do desenho vai repousar no comprimento da nave (imagem 7).
A igreja trás consigo os principais fatores da originalidade das igrejas barrocas
mineiras: “movimentação poligonal e curvilínea, o tratamento ornamental da
fachada principal, dando ênfase no desenho dos frontões, das portadas e dos
coroamentos das torres”, possuindo influências italianas e portuguesas, fazendo
parte do barroco tardio (OLIVEIRA in RESENDE; VILLALTA, 2007, p. 369).

Imagem 7: Igreja São Francisco de Assis, São João Del Rei, MG.

Na igreja (imagem 7), as janelas enriquecem o efeito global, no alto da


igreja, a parte central é convexa, com paredes côncavas, o qual separa as torres.

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Note que em vez de pilastras são usadas as colunas, que se prolongam, elevando-
os, e seu frontispício é levemente sinuoso. A plasticidade dos ornatos em pedra-
sabão entra em contraste com o branco dos panos de muro, conferindo à portada
uma identidade própria, concentrando-se nela todo o esforço arquitetônico e
decorativo, com função simbólica de sinalizar espaço, o qual são sinais de
equilibro, ordem e dignidade. Sua pedra de arma é a cruz, na parte convexa da
igreja. O elemento identificativo é a escultura de São Francisco recebendo os
estigmas (imagem 28). A fachada principal possui uma bela escadaria que permite
o acesso à igreja, onde no período barroco é muito comum, pois é uma forma de
definir um equilíbrio entre a fachada nobre e a escadaria, passando
frequentemente por um jardim de recreio, ou por um pátio (PAIVA, 2004), no caso
da igreja de São Francisco de Assis, a escadaria dá acesso a um adro pavimentado.

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Imagem 8: escultura de São Francisco de Assis.

Mas o detalhe principal da igreja está na portada, a cima da porta se


encontra o medalhão da irmandade, onde Aleijadinho preferiu mudar o modelo de
medalhão (o qual seria a imagem de São Francisco de Assis), pondo o de Nossa
Senhora encimado pela coroa real (imagem 9), e nas cornijas das pilastras laterais
da porta, esculpiu dois anjos. O merlão, brasão e pedra de arma são elementos
fundamentais, pois estão vinculados à nobreza, ao poder, mas, segundo Paiva
(2004, p. 89), no elemento decorativo, “constatou-se igualmente o uso freqüente de
outros ornatos como: acrotérios, aleta, anjos, balaústres, bolas, conchas, jogaréus,
obeliscos, pináculos, pinhais, pirâmides, plintos, urnas, vasos de coroamentos e
volutas”. Esses elementos são encontrados sempre no coroamento da portada, o

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que enriquece os detalhes, tão usados no barroco mineiro e pelo artista
Aleijadinho.

Imagem 9: medalhão da igreja São Francisco de Assis.

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Podemos ver, na imagem 9 e 10, a coroa real com uma pequena cruz, abaixo
da coroa tem-se uma pomba que simboliza o divino Espírito Santo com seus raios
iluminando a Nossa Senhora Imaculada Conceição, formando o brasão, onde à sua
volta é toda decorada com florões e anjinhos aos seus pés. Na parte superior do
brasão da Virgem, encontra-se uma fita com a inscrição tota pulchra es Marie et
maculada originales no est in te (VEIGAS, 2010). Abaixo do brasão da Virgem,
encontram-se dois pequenos medalhões, sendo o da direita o escudo português, e o
da esquerda o emblema da Ordem Terceira de São Francisco de Assis. A cima dos
dois medalhões tem esculpido a coroa de Cristo, juntamente com dois anjinhos,
com um tarja inferior com as cinco chagas de Cristo, e nas laterais do mesmo, têm-
se duas asas de serafim emplumadas. Abaixo dos medalhões, as decorações são
feitas por ornatos barrocos, conchas, folhas, linhas curvas, florões e cachos de uvas.
Nas duas pilastras da porta tem-se a escultura de dois anjinhos (imagem 11),
dando a impressão de anjos guardiões.

imagem 10: detalhe da porta da igreja São Francisco de Assis.

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imagem 11: pilastras da portada da igreja São Francisco de Assis.

Segundo Costa (1980, p. 42):

A portada figurada nesse risco, apesar do seu inexcedível apuro, como


desenho e composição, parece ainda incompleta, pois ainda não havia
então ocorrido a Antônio Francisco a solução que afinal adotou na sua
volta a Ouro Preto, quatro meses depois, quando convenceu os irmãos da
necessidade de desfazer as ombreiras e a verga da porta e de afastar as
janelas do coro, já feitas, a fim de poder realizar o novo risco de portada
que trouxera. Que teria sucedido de tão decisivo em tão curto espaço de
tempo? Presume-se que de São João haja prosseguido viagem até o Rio, a
fim de conhecer a famosa portada de pedra de lioz trazida de Lisboa em
1761 e que, por seu porte e beleza, avultava na frontaria inacabada da
igreja carmelita carioca. Esse impacto sugeriu-lhe então sobrepor, naquele
seu risco, às armas da ordem franciscana, o medalhão de Nossa Senhora
encimado pela coroa real, completando a composição triangular com dois
anjos pousados sobre as cornijas das pilastras laterais. Este risco inicial
para São João Del Rey é, pois, uma realização a meio-caminho, o estágio
intermediário de uma obra ainda em processo de elaboração; o artista é,
por assim dizer, surpreendido em flagrante ao cometer o “delito”, da
criação, que resultou na obra prima realizada em Ouro Preto. E, assim, esta
capela franciscana adquiriu a sua feição definitiva, obra sem paralelo, onde
a energia, a força, a elegância e a finura se irmanam, conferindo à criação
arquitetônica palpitação de coisa viva.

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Mesmo sendo só a portada de sua autoria, Aleijadinho excede-a com
audácia, com decorativismo desenfreado. Percebemos, mais do que nunca, nesta
portada, as semelhanças do estilo Aleijadinho com o barroco mineiro, toda a
delicadeza dos detalhes e a exuberância na acumulação de ornatos. Mas
Aleijadinho vai além do barroco, ele usa assuntos bíblicos em desenhos livres,
formando um conjunto de fatores, tornando os elementos construtivos mais
dinâmicos, suas portadas conferem uma identidade própria, as cornijas são
onduladas, as colunas dividem as paredes marcando ritmos e as silharias
esculpidas e almofadadas enriquecem o conjunto.
A igreja São Francisco de Assis de São João Del Rei apresenta uma gramática
arquitetônica e decorativa própria do período barroco, onde a tipologia
arquitetônica utilizada por Aleijadinho consiste num vão de porta encimado por
elementos decorativos e por uma cornija arquitravada ondulada, típica do barroco.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Aleijadinho foi o principal escultor do estado de Minas Gerais, onde seus


monumentos, cheios de vida, embelezam algumas cidades como Ouro Preto,
Mariana, Tiradentes. Suas obras, carregadas de características da arte barroca,
efetuam e ganham mais fervor nas linhas curvas e nos florais de cada detalhe
esculpido, sendo propiciada e enriquecida pelo ouro mineiro da época.
Falar sobre o artista é estudar sobre a História da Arte do Brasil, pois além
de ser mulato, com herança escravista, é o responsável pelas principais igrejas
patrimoniais do país. Sem falar que suas obras estão relacionadas à economia

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mineira, porque viveu num período onde a igreja estava em alta. O que permitiu
que usufruísse do ouro em alguns altares das igrejas do estado.
Percebemos a predominância do barroco já na sua principal obra, a capela
de São Francisco de Assis, mais especificamente a portada, seja pelos florões,
volutas, querubins ou brasão. É indiscutível e impressionante. As portadas
esculpidas por Aleijadinho são essencialmente barrocas, não só na organização e
composição das peças, mas até na intenção criadora considerada em si mesma,
carregada de elementos decorativos.
Nessa pesquisa, podemos afirmar que a portada em si é de fundamental
importância para o monumento, pois ela carrega a cultura da sociedade e época,
demonstrando e impondo poder da igreja dentro da sociedade, identificando as
grandes irmandades que marcaram o estado de Minas Gerais no Brasil Colonial.
Tanto as portas como a arquitetura da igreja, se modificam juntamente com a
sociedade e com a economia da cidade, sendo as primeiras simples e pequenas,
com a descoberta do ouro e da pedra-sabão, ambas se modificam, demonstrando
grandiosidade e beleza.
Devemos lembrar que o Barroco só chegou até o Brasil porque sua riqueza
proporcionou seu desenvolvimento, tanto que suas igrejas são de grandiosa beleza.
O ouro fez com que chamassem a atenção de artistas de outros lugares,
proporcionando oportunidades de trabalhos. Não podemos esquecer também que
os grandes artistas de destaque nessa época são os mestiços que recebiam sua
liberdade ao nascer.
Aleijadinho, assim, com seu grande talento e estilo único, foi e é um dos
principais artistas barrocos do Brasil, mesmo sofrendo dificuldades com sua

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doença jamais deixou de criar exuberantes obras, entretanto não tem como falar
de sua arte sem associá-la à arte barroca.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BASTIDE, Roger. Variações sobre a Porta Barroca. En publicacion: Novos


Estudos no. 75. CEBRAP, Centro Brasileiro de Analise e Planejamento, Rio de
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http://www.cebrap.org.br/imagens/Arquivos/variacoes_sobre_a_porta.pdf acesso
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PROENÇA, Graça. História da Arte. São Paulo: editora Ática, 2003.
PAIVA, Maria Amélia da Silva. As Portadas na Arquitetura Civil do Conselho de
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RESENDE, Maria Efigênia Lage de; VILLALTA, Luiz Carlos. História de Minas
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Tempo, 2007.

2011
REFERÊNCIAS ELETRÔNICAS:
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Pilastras da portada da igreja São Francisco de Assis, disponível em:


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Acessado dia 12 de janeiro de 2011.

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