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Tradução feita por Iara I. Ribeiro Vilhena para estudo dos alunos da disciplina
Da imagem: estudos das noções de lonjura e distância em Maurice Blanchot e
Georges Didi-Huberman, ministrada pela profa Dra Daisy Leite Turrer – 2011.
NANCY, Jean-Luc. Le jardinier. In: _____. Noli me tangere: Essai sur la levée
du corps. Paris: Bayard Editions, 2003. p. 47-53
O JARDINEIRO
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Eu negligencio aqui, para ficar o mais próximo do texto que identifica bem Jesus, a hipótese
mais arriscada que eu sugeri mais acima: que se trata unicamente do jardineiro. Seja o que for,
é remarcável que os pintores tenham tão freqüentemente mantido a aparência do jardineiro, ao
menos por uma pá, que às vezes mal discernimos à primeira vista. Eu voltarei aqui.
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Os discípulos de Emmaüs, Lc 24,16.
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Há nesse ponto questões de interpretação delicadas, já que, segundo as versões (grega ou
siríaca), Maria Madalena se vira uma só vez ou duas vezes).
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Madalena não estaria nem na fé diante do vazio, nem na adesão trazida pela
constatação. Ela acredita porque ela ouve. Ela escuta o que só se dirige a ela.
Ela ouve esta voz que desmente a aparência do jardineiro, embora não tenha
sido dito que essa aparência tenha mudado. Ela responde somente à voz
daquele que mantém a mesma aparência.
Os pintores compreenderam a questão do “jardineiro” representando
Jesus, freqüentemente, com os atributos deste ofício: uma pá ou uma enxada,
um chapéu de palha. Quando seu rosto está na sombra, como em Dürer, a
intenção pode ser a de indicar a dificuldade de discernir seus traços. No
entanto, a pá ou o chapéu só pertencem ao pensamento da mulher que
acredita que é o jardineiro. Estes atributos estão na imagem da representação
da crença, ou da ilusão. Quanto à fé, ela diz respeito ao que nenhuma crença
pode fornecer nem decepcionar.
Os atributos do jardineiro raramente estão ausentes nas representações
da cena. É o caso de Giotto, Duccio ou Schongauer, por exemplo, em que
Jesus aparece exclusivamente como Cristo, Messias e Salvador. A
justaposição das obras que representam um Cristo portador dos emblemas da
realeza messiânica, e daquelas (mais numerosas) que colocam um jardineiro,4
tem uma força esclarecedora. De certa maneira, é o mesmo Cristo. De outra
maneira, o Messias enquanto ressuscitado (...) não é ninguém mais do que o
primeiro jardineiro vindo. Não há nada a mudar em seu aspecto, não há,
portanto, nada a mudar no olhar de Maria Madalena, e esta visão não é um
engano. Sim, como no desenho de Dürer, a pá que escava a terra é contígua
ao sol nascendo. Sim, Maria vê o jardineiro, o homem comum que sucede a
outro homem comum e morto cujo túmulo escancarado expõe a ausência
insondável.
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Dificilmente podemos afirmar que a representação do jardineiro se acentuará a medida que se
distancia de Giotto, pois a encontraremos também nas iluminuras ou nas gravuras anteriores.
Mas nem por isso se nega que esta representação comporte também um aspecto pitoresco e
anedótico que seduz sobretudo os pintores mais desligados da religião. Era preciso também
considerar todas as misturas que são praticadas: meio-jardineiro, meio-Messias, meio-vestido
(que deve ser o jardineiro), meio-nu (que deve ser o corpo saído de sua mortalha), e as
combinações cujos dados tornam-se recursos para o desenho e para a cor. Ficamos
fascinados por esta circunstância que faz com que um problema teológico – como se deve
representar esse corpo glorioso? – forneça e combine tantos pretextos para elaborações
iconográficas.
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Ela não pensa “se ele diz meu nome, é que... etc.”, não mais que Abraão especule “Se Deus
é Deus, ele salvará meu filho”; ela e ele partem de lá, vão para lá, como se diz...(cf. a esse
respeito a diferença das interpretações de Abraão entre Paulo e Tiago: em Paulo a fé de
Abraão assemelha-se a uma estimativa que permite “crer” que Deus será benevolente, em
Tiago a fé está inteira no ato de partir sobre a ordem de Deus, não em uma operação reflexiva).
(Eu explicito esta análise em “Le judéo-chrétien”, Atos do Colóquio “Judéités, questions à
Derrida” que aconteceu em 2000 no Centro Comunitário Israelita de Paris, publicado em 2003
por Galilée.)