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Primeiro esta lenda: "Era uma vez uma praga que atingiu os mongóis.
Os saudáveis fugiram, deixando os doentes e dizendo: 'Que o Destino
decida se eles vivem ou morrem'. Entre os doentes havia um jovem chamado
Tarvaa. O seu espírito deixou o corpo e chegou ao lugar dos mortos. O
governante daquele lugar disse a Tarvaa: 'Por que deixaste o teu corpo
enquanto ainda estava vivo?'. 'Eu não esperei que tu me chamasses',
respondeu Tarvaa, 'simplesmente vim'. Comovido com a presteza com que o
jovem obedeceu, o Khan do Inferno disse: 'A tua hora ainda não chegou.
Deves retornar. Mas podes levar daqui o que quiseres'. Tarvaa olhou em
volta e viu todas as alegrias e todos os talentos terrenos: riqueza, felicidade,
riso, sorte, música, dança. 'Dá-me a arte de contar histórias', disse ele, pois
sabia que as histórias podem congregar as outras alegrias. E assim retornou
ao seu corpo e constatou que os corvos já lhe haviam arrancado os olhos.
Como não podia desobedecer ao Khan do Inferno, reentrou no próprio corpo
e viveu cego, porém conhecendo todos os contos. Passou o resto da vida
viajando pela Mongólia, contando contos e lendas e trazendo às pessoas
alegria e saber".
Antes de virar marca de chocolate, Lady Godiva era uma lenda que
ilustra uma das variantes do tema que estamos tratando. Aí ressurgem as
questões do ver e do não- ver, porém envoltas com o problema da
transgressão e da punição. Diz a lenda que entre os anos 968-1057, na
Inglaterra, na região de Coventry, havia um rei, Leofric III, que cobrava
pesados impostos de seu povo. Sua mulher, Lady Godiva, implorava ao
marido que fosse mais humano com seus súditos. Ele não cedia. E um dia,
como ela tornasse a insistir, ele fez uma contraproposta, evidentemente, para
humilhá-la e mostrar uma vez mais seu poder sobre o povo. Que ela
desfilasse nua sobre um cavalo pela cidade e ele aboliria os impostos
excessivos.
Pois a Lady aceitou o desafio. O marido, aparentemente liberal, era, no
entanto, ciumento, e botou uma condição: ninguém poderia vê-la desfilar
nua, todas as portas e janelas deveriam estar trancadas. Pode-se imaginar
como essa nudez se tornava logo mais erotizada não só pela presença
desse cavalo em pêlo onde ela ia peladíssima, "vestida" apenas de sua
longa cabeleira, mas a interdição tornava a cena ainda mais erótica. E no dia
ansiado, lá estava Lady Godiva sobre o cavalo ondeando suas formas,
oferecendo sua nudez real e imaginária, posto que ninguém deveria ou
poderia vê-la. Mas como em toda lenda, há um transgressor; e um certo
Peeping Tom resolveu fazer um buraco na janela de sua casa para ver a
nudez real passar. Dizem que é daí que veio a expressão "peeping tom" em
inglês, significando o voyeurista, o que sente prazer sexual em ver as
intimidades alheias.
O fato é que o cidadão curioso foi punido com a cegueira. Ele viu o que
não deveria ver. Nem sempre a autoridade permite que se veja o que ela não
quer que seja visto. Se alguém insiste em ver o interditado deve ser cegado,
para que a autoridade e o sistema permaneçam. É interessante, no entanto,
observar duas coisas. Primeiro que, apesar deste incidente, o rei aboliu os
impostos. E, em segundo lugar, um detalhe que não pode passar em branco
na seqüência de histórias que estamos analisando: o voyeurista, aquele que
quis ver a nudez da Lady Godiva era um alfaiate. Não deve ter sido por
acaso que a lenda se constituiu deste modo incluindo aí um alfaiate, da
mesma maneira que não é à toa que naquela lenda de Andersen que citei
noutra crônica os dois tecelões( variantes do alfaiate) tecem a roupa
inexistente para o rei.
Ao contrário da lenda de Andersen e de seus tecelões charlatães, aqui o
alfaiate, que sabia cobrir o corpo alheio com as roupas mais apropriadas, é
aquele que ousa ver a anti-roupa, ou melhor, a roupa original, a Lady vestida
pelo esplendor de sua nudez. Portanto, aquele que por profissão cobre a
nudez do corpo é o mais curioso para ver a Lady Godiva nua, desvestida.
Essa lenda tem sua parte de verdade, pois esses personagens são
reais, há a sepultura da Lady na Trinity Church, e desde 1678 realiza-se um
desfile lembrando o episódio. Uma lenda sobrevive na medida em que
expressa conteúdos do imaginário coletivo.
Como não lembrar uma vez mais a lenda do rei nu? Na narrativa de
Andersen é um menino, alguém também de fora, que aponta a nudez dos
fatos e no conto de Poe o narrador diz "que muitos meninos de escola
conseguem raciocinar melhor" que o policial. O olhar excessivo, o hiperolhar
da corte (e de certos críticos e analistas) vê "demais". Já diziam os chineses:
"o homem inteligente é o que descobre o óbvio". Ou, Guimarães Rosa:
"sujeito muito lógico, o senhor sabe: cega qualquer coisa". E ilustrando essa
dificuldade que temos de não ver o óbvio, Dupin dá um exemplo: aquele jogo
em que uma pessoa escolhe uma palavra num mapa e o adversário tem que
dizer qual é ela. A tendência é o desafiado ir procurando a menor palavra e
que está mais escondida, quando às vezes a palavra escrita em letras
imensas e espaçadas, por ser visível, é ignorada.
A metáfora da visão é muito explorada no conto. Primeiro Dupin,
contrariando a lógica meridiana da polícia, diz que é melhor examinar certas
coisas "no escuro". É como se estivesse zerando nosso olhar, reinventando o
primeiro olhar, desviciando a maneira de ver. E a seguir, quando vai ao
gabinete do ministro que surrupiou a carta, chega aí com estranhos "óculos
verdes", queixando-se de problemas de visão. É um álibi às avessas. É
como se se disfarçasse de cego para ver melhor. Assim se a incapacidade
do chefe de polícia de achar a carta confirma que o pior cego é aquele que
não quer ver, o investigador Dupin mostra que o melhor "cego" é aquele que
sabe ver. Por isto, no "escuro", com seus "óculos verdes" percebe que a
carta tão procurada, na verdade, está à vista, num porta-papéis barato
pendurado por uma fita azul e ensebada dentro de um envelope amassado e
sujo. O esperto larápio da carta sabia que iriam procurá-la em lugares
secretos, por isto a colocou num lugar à vista. Ao percebê-la, Dupin,
espertamente, troca a carta por outra, usando da mesma tática do ministro
quando trocou a carta verdadeira na mesa real também por outra.
Nessa história, verdadeiro "jogo de cartas", Dupin afirma que o policial
conduziu a investigação erradamente porque não acreditou na inteligência e
astúcia do ministro, pois achava que o ministro era "tolo porque adquiriu a
fama de poeta". E na alma do policial "todos os idiotas são poetas". Neste
ponto, Poe, que era poeta e construía seus textos matematicamente, faz
algumas considerações sobre "poetas" e "matemáticos", revelando uma das
chaves do mistério. Expõe a tese de que o raciocínio matemático em si não
leva ao conhecimento se não estiver associado a algo mais, como a poesia.
E porque aquele que era investigado era ao mesmo tempo "matemático e
poeta", Dupin não poderia usar de um raciocínio lógico trivial, mas teria que
desenvolver diversas astúcias, sendo também "poeta e matemático".
Lista Cegos
10/01/2005
Crônica sobre o professor Edison Ribeiro Lemos
Um dia sentam-se perto de você no terraço e dizem uma frase com tal
maneira que você sente que não pode mais trocar as fraldas daquela
criatura.
Onde é que andou crescendo aquela danadinha que você não percebeu?
Ali estão muitos pais ao volante, esperando que eles saiam esfuziantes e
cabelos longos, soltos.
Esses são os filhos que conseguimos gerar e amar, apesar dos golpes dos
ventos, das colheitas, das notícias, e da ditadura das horas.
Deveríamos ter ido mais à cama deles ao anoitecer para ouvirmos sua alma
respirando conversas e confidências entre os lençóis da infância, e os
adolescentes cobertores daquele quarto cheio de adesivos, posters, agendas
coloridas e discos ensurdecedores. Não os levamos suficientemente ao
Playcenter, ao shopping, não lhes demos suficientes hambúrgueses e
refrigerantes, não lhes compramos todos os sorvetes e roupas que
gostaríamos de ter comprado.
Os pais ficaram exilados dos filhos. Tinham a solidão que sempre desejaram,
mas, de repente, morriam de saudades daquelas "pestes". Chega o
momento em que só nos resta ficar de longe torcendo e rezando muito para
que eles acertem nas escolhas em busca da felicidade.
A Mulher Madura
A adolescente, com o brilho de seus cabelos, com essa irradiação que vem
dos dentes e dos olhos, nos extasia. Mas a mulher madura tem um som de
adágio em suas formas. E até no gozo ela soa com a profundidade de um
violoncelo e a sutileza de um oboé sobre a campina do leito.
Sei que falo de uma certa mulher madura localizada numa classe social, e os
mais politizados têm que ter condescendência e me entender. A maturidade
também vem à mulher pobre, mas vem com tal violência que o verde se
perverte e sobre os casebres e corpos tudo se reveste de uma marrom
tristeza.
Na verdade, talvez a mulher madura não se saiba assim inteira ante seu olho
interior. Talvez a sua aura se inscreva melhor no olho exterior, que a
maturidade é também algo que o outro nos confere, complementarmente.
Maturidade é essa coisa dupla: um jogo de espelhos revelador.
O texto acima foi extraído do livro "A Mulher Madura", Editora Rocco - Rio de
Janeiro, 1986, pág. 09.
Ler o Mundo
FANTASIA ERÓTICA
O casal resolveu passar uma noite no motel. Ou melhor: Foi resolvido que o
casal deveria passar a noite lá. Resolvido não por eles, mas pelos filhos que
queriam dar uma festa na casa dos pais, mas sem a presença dos coroas. E
o afastamento de pai e mãe era pedido por duas razões que pareciam
pertinentes: primeiro que a festa era de jovens e o som seria da pesada;
segundo porque se armava um agito que iria ate as 8h.
Ora, não há mulher casada que resista a esse convite feito pelo marido.
Algumas não resistem nem ao convite feito por quem não é seu marido.
Durante o namoro os casais freqüentam motéis. Depois do casamento isto
praticamente acaba e toda mulher ouve com certa inveja quando uma amiga
lhe diz que o marido a levou a um motel. É um trunfo. É como se dissesse:
"Está vendo, não preciso de amante".
O fato é que o casal, tanto por amor aos filhos quanto movido por fantasias
arcaicas, topou a idéia. Os filhos sentiram orgulho daquilo. Até revelam aos
amigos o próximo paradeiro dos pais, como a dizer: "Eles são velhos, mas
ainda batem uma bola legal!".
Era espetacular. Tão espetacular que a mãe não resistiu e telefonou para os
filhos descrevendo o paraíso. A festa parou para ouvir a narrativa. E a mãe
falava como se fosse Sherazade no apogeu das "Mil e uma noites". A suíte
era ampla e tinha uma iluminação especial para cada recanto. Luzes saiam
debaixo da cama, luzes piscavam numa pista de dança. Espelhos para todo
lado, música de todo tipo e televisão com inúmeros canais estrangeiros.
Junto a um jardim iluminado, um chafariz jorrava água e emoção. Havia a
deliciosa banheira para hidromassagem. Cama giratória, saunas a vapor e
seca. Piscina de água corrente e um teto que se movia abrindo-se para uma
lua cheia. Isto, além das louças inglesas, do cardápio e da champagne que
rolava.
- Quando eu virar coroa, ainda vou ter uma noite como essa.
Uma guerra pós-moderna
Bush, como lhes disse, é pós-moderno sem o saber. Não sei que curso ele fez lá no
Texas. (Dizem que antes da Casa Branca ele nunca tinha ido à Europa). Por que ele
seria pós-moderno? Porque um dos traços da malfadada pós-modernidade é o
pastiche. Em arte se diz: fulano fez um pastiche de sicrano. Quer dizer: copiou,
aproveitou o que já existia, escondeu sob a máscara do outro a sua precária
criatividade. Pois Bush filho é primeiramente o pastiche do Bush pai. O pastiche é a
impotência travestida de potência. A vontade de ser aquilo que não se é. O pastiche é
o oposto da paródia, esta sim, uma revivificação da linguagem. Enfim, a arte das
últimas décadas, confessadamente, vive recorrendo ao pastiche como outros recorrem
ao viagra.
Por essas e por outras é que deveriam dar mais cursos de História, de antropologia e
de arte contemporânea nos quartéis americanos. Uma das tolices do século XX foi,
através de silogismos fascinantes, anunciar a morte da História, a morte da arte, a
morte do homem. Pois a História está renascendo, a arte está renascendo, o homem
está renascendo no cemitério de mortes anunciadas do finado século. Essa guerra,
pelo avesso, pode ser a contestação e o princípio do fim da globalização e da cultura
pós-moderna que se comprazem no pastiche, na repetição inócua, na valorização da
quantidade sobre a qualidade, no culto à imagem e ao simulacro em detrimento do
real. Essa pós-modernidade que descontextualiza as pessoas e desterritorializa as
culturas.
30.6.99
Semana passada, no vôo 442, entre Rio e São Paulo, no horário de 9h34m, um
senhor dirigia-se ao assento para ele reservado no interior da chamada aeronave, mas
encontrou-o ocupado por uma americana. Nas condições normais de temperatura e
pressão da sociedade brasileira, aquele cidadão brasileiro teria dialogado com a turista ou
chamado a comissária de bordo para ser juíza do impasse.
Dizem os que assistiram à cena que a acuada americana não tinha cara de ser do
FMI, mas mesmo assim escafedeu-se logo, e pode-se imaginar o que estará contando às
suas vizinhas no Arkansas sobre a fúria ideológica e econômica dos aborígines brasileiros.
O fato é que o indignado e ousado cidadão foi bem-sucedido. Mais bem-sucedido que os
economistas do Governo diante do Stanley Fischer ou que os governadores que estão
reclamando que o FMI está metendo a mão no orçamento deles.
Mas o que me assusta é um detalhe. E assim como Guimarães Rosa dizia que Deus
está nos detalhes, estou para dizer que certos detalhes às vezes podem ser demoníacos.
Refiro-me a um fato que passou despercebido ao sofrido ouvido da nação. Ou seja, o
presidente outro dia começou uma frase com a palavra ‘‘repilo’’. Ele queria rechaçar
alguma coisa que andavam dizendo. Então, disse uma frase que começava com esse
verbo, algo tipo ‘‘repilo as insinuações’’...
É muito grave um presidente dizer ‘‘repilo’’. E lhes digo porquê. Não é que lhe seja
vedado repelir quem quer que seja. Não. Mas os dois presidentes que me lembro usaram
esse verbo foram Collor e Jânio Quadros. E vocês viram que fim levaram. Isto me faz
pensar que quando um presidente diz ‘‘repilo’’ é porque quem está sendo repelido é ele.
Além do mais, esse verbo que parece inofensivo quando a gente, no infinitivo, diz
‘‘repelir’’, fica esquisitíssimo na primeira pessoa do presente do indicativo, ou melhor, fica
indicativo de que o presente está esquisitíssimo na boca da primeira pessoa do país - o
presidente. Parece mesmo coisa de Jânio, tipo ‘‘fi-lo porque qui-lo’’.
A charge era assim: cena de uma partida de futebol, ou melhor, de uma pelada entre
garotos. De um lado, um garoto com a cara de Fernando Henrique. (Aliás, um amigo dizia
que ‘‘Fernando Henrique’’ soa como nome de filho único, mimado, com a mãe dizendo
‘‘Leva a suéter, Fernando Henrique, senão você pega um resfriado’’).
Mas voltando à fantasiosa charge do Chico Caruso, lá estava num canto, aliás, fora
da linha do campo, o Fernando Henrique abraçado com a bola e dizendo: ‘‘A bola é minha,
se eu não puder jogar do jeito que eu quero e fazer gols do meu jeito, ninguém joga’’.
Outro dia, a Miriam Leitão publicou aqui um artigo perturbador. Citou uma porção de
frases do presidente, do seu ministro da Fazenda, dos principais jornais e revistas do país
sobre a crise, a inflação, o câmbio, etc. Só que as frases que a gente pensava fossem de
Fernando Henrique, de Malan e outros, eram de Collor, Marcílio e, pasmem! do próprio
Armínio Fraga, quando ocupou, naquele tempo, uma direção do Banco Central. O artigo é
terrível, porque demonstra que o drama é o mesmo, só mudaram os personagens.
Por essas e por outras é que temos que olhar com desconfiança essa frase que
muita gente anda repetindo, que ‘‘o Brasil é maior que a crise’’, de que a ‘‘crise é
temporária e o Brasil, permanente’’. Tais frases são exercício de auto-indulgência. São
frases-bóias, são salva-vidas, que a gente lança para não submergir de vez na amargura.
O certo, porém, é constatar o contrário: nesses 500 anos a crise é a norma e alguma
estabilidade, uma exceção. No Brasil, a oração bíblica tem que ser corrigida pois em vez
de ‘‘pão nosso de cada dia’’, cada vez tem mais ‘‘a crise nossa de cada dia’’.
Assaltos insólitos
Assaltos não tem graça nenhuma, mas alguns, contados depois, até que são
engraçados. É igual certos incidentes de viagem, que quando acontecem deixam a gente
aborrecidíssimo, mas depois, narrados aos amigos num jantar, passam a ter um sabor de
anedota.
1. Uma vez me contaram de um cidadão que foi assaltado em sua casa. Até aí, nada
demais. Tem gente que é assaltada na rua, no ônibus, no escritório, até dentro de igrejas
e hospitais, mas muitos o são na própria casa. O que não diminui o desconforto da
situação.
Pois lá estava o dito-cujo em sua casa, mas vestido em roupa de trabalho, pois
resolvera dar uma pintura na garagem e na cozinha. As crianças haviam saído com a
mulher para fazer compras e o marido se entregava a essa terapêutica atividade, quando,
da garagem, vê adentrar pelo jardim dois indivíduos suspeitos.
Mal teve tempo de tomar uma atitude e já ouvia:
- É um assalto, fica quieto senão leva chumbo.
Ele já se preparava para toda a sorte das tragédias quando um dos ladrões
pergunta:
- Cadê o patrão?
Num rasgo de criatividade respondeu:
- Saiu, foi com a família ao mercado, mas já volta.
- Então vamos lá dentro, mostre tudo.
Fingindo-se então, de empregado de si mesmo, e ao mesmo tempo para livrar sua
cara, começou a dizer:
- Se quiserem levar, podem levar tudo, estou me lixando, não gosto desse patrão.
Paga mal, é um pão-duro. Por que não levam aquele rádio ali? Olha se eu fosse vocês
levava aquele som também. Na cozinha tem uma batedeira ótima da patroa. Não querem
uns discos? Dinheiro não tem, pois ouvi dizerem que botam tudo no banco, mas ali dentro
do armário tem uma porção de caixas de bombons, que o patrão é tarado por bombom.
Os ladrões recolheram tudo o que o falso empregado indicou e saíram apressados.
Daí a pouco chegavam a mulher e os filhos.
Sentado na sala, o marido ria, ria, tanto nervoso quanto aliviado do próprio assalto
que ajudara a fazer contra si mesmo.
2.10.91
7.7.99