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HUCITEC'
As exposições universais da indústria realizadas du papel de arautcjs da mfrdernicLide não só poix|ue di\'ul-
rante a segunda metade do século passado em Lon garam o aparato lecnolcfgico c|ue veio a modelar o coti
dres, Paris, Viena, Filadélfia e Chicago contaram quase diano das cidades de todo o mundo — desde as grandes
todas com a representação do Brasil. Propondo-se a máquinas industriais até as inovações uti l itárias como o
reunir e celebrar os melhores resultados da criativida telefone ou a bicicleta —,mas também porc|ue demarca
de e do labor humanos, dos vários países do mundo, ram o início da formação da sociedade de massas, urba
tiveram propósitos comerciais mas, como bem mostra nizada, deslumbrada pelas imagens, mobi l izadas por
este livro, suas funções ideológicas sobrepujaram seu apelos emocionais.
papel econômico.
Todavia, se no caso europeu esses eventos já indicavam
Elas constituíram, de fato, a exaltação da produção percalços históricos enfrentados pela organização da so
mecanizada capitalista, num espetáculo ostentatório ciedade de classes, no caso brasileiro o sentido moderntj
e lúdico capaz de atrair público de todas as classes e trazido pelas exposições foi, ao contrário, o de propiciar
de atuar sobre o inconsciente coletivo. Nelas os in essa organização. As feiras preparatórias da represen
ventos mecânicos e o objeto industrial foram sacra tação nacional no exterior vieram alertar alguns dentre
mentados como mitos, símbolos que se tornaram da nossa incipiente burguesia de meados do século XIX para
capacidade de domínio sobre a natureza, apanágio a urgência de se superar a já inviável herança escravista
da burguesia controladora da produção. colonial, se se pretendia atingir, posto que em benefício
agrário, os patamares tecnológicos trazidos pela indús
No processo ofuscou-se o desempenho essencial do tria.
trabalhador mas, mesmo que os sindicatos hajam de
nunciado seu caráter alienante, a festa em que se tor Para tanto faltava organizar a própria classe burguesa e o
naram as exposições despertou no imaginário popular mercado de mão-de-obra livre, o que até o final do sécu
confiança num progresso contínuo liderado pela bur lo foi conseguido com sucesso, passando-se, inclusive, a
guesia, preenchedora, assim, das aspirações de abun promover a industrialização. De todo modo, na Améri
dância e bem-estar para todos. Assumia-se, ao mesmo ca, o país não só moderno mas desencadeador de ondas
tempo, a crença na superioridade do lúcido e eficien modernizantes, passando a competir com a Europa, fo
te homem europeu frente às nações inseridas em seus ram os Estados Unidos, onde as feiras mundiais acaba
impérios. ram se alojando no final do período estudado pelo livro.
Para o filósofo Walter Benjamin, um dos primeiros a No Brasil, o caráter incompleto da constituição da cida
analisá-las, as exposições mundiais se definiram como dania e, portanto, da própria nação, ressentido vivamen
lugares de peregrinação para o culto da mercadoria. te até nossos dias, transformou nossa modernização num
Poder-se-ia acrescentar, tal qual os shopping centers arremedo dos modismos de momento, inserindo-nos na
do presente ou, enquanto cenários para vivência de globalização hodierna como frágeis nativos ante um im
fantasias coletivas, tal qual os parques temáticos hoje perialismo atualizado.
tão atuais.
direção de
Maria Irene Szmrecsányi
Milton Santos
direção de
Maria Irene Szmrecsányi
ESTUDOS URBANOS
títulos publicados
EXPOSIÇÕES UNIVERSAIS
espetáculos da modernidade
do século XIX
Estudos Urbanos
Série Arte e Vida Urbana
'EDITORA HUCITEC
São Paulo, 1997
© Direitos autorais, 7 997,
de Sandra jatahy Pesavento.
Direitos de publicação
reservados pela Editora Hucitec
Ltda., Rua Gil Eanes, 713 —
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Editoração eletrônica
Ouripedes Callene
Projeto Gráfico
GMR AA Lúcio Gomes Machado
Eduardo J. Rodrigues
Capa
Neusa Scaléa
Revisão de texto
Eloísa Aragão
Ante-Sala do Tema 12 SUMARIO
A Aventura da Modernidade:
O Espetáculo da Fin-De-Siècle:
Sumário
À memória de meu pai, Cássia Jatahy.
A Jacques Leenhardt, em Paris; /\GRADECIMENTOS
a Artur Moiella, em Washington;
a Mirian Levin, em Cleveland;
a Almir P. Freitas Filho, no Rio de Janeiro;
a Antônio Cury, em São Paulo;
pela ajuda no momento exato.
Agradecimentos 11
ANTE-SALA DO TEMA
Por ocasião da exposição universal de Paris de 1889, o Cuide Bleu du Figaro
et du Petit Journal, publicado para orientar os visitantes do evento, dava aos
leitores a "sua explicação" referente àquela grande mostra internacional:
"Com que espírito é preciso visitar a Exposição? Épreciso vê-la com o mes
mo espírito que presidiu a sua organização: é preciso vê-la para se instruir
e para se divertir. Ela é para todo mundo, para todas as idades, para os
sábios, assim como para os menos instruídos, uma incomparável 'lição de
coisas'. O industrial aíencontra os modelos dos quais ele saberá aproveitar.
O simples passante aí toma uma idéia geral e suficiente das maravilhas,
sempre em progresso, da indústria moderna. Um pode aíencontrar o cami
nho da fortuna, pelo estudo dos processos aperfeiçoados de fabricação;
outro aí encontra, com os objetos usuais colocados sob seus olhos, a satis
fação econômica do seu gosto".^
"As exposições universais, que foram tão criticadas, têm pelo menos a vanta
gem incontestável de permitir aos diferentes Estados que aítomam parte esta
belecer uma espécie de balanço oficial para a maior parte dos ramos de sua
produção. Quão rico ou quão pobre que se seja, é sempre útil conhecer
exatamente o ponto de prosperidade ou de decadência em que se acha. Para
isso, é suficiente aos indivíduos colocar em linha de conta o seu ativo e o seu
passivo. Não se passa assim da mesma forma quando se trata dos povos. A
fim de apreciar com alguma seu estado econômico, é preciso dizer que eles
o comparem a aquele de seus vizinhos, porque, na luta internacional do
comércio e da indústria, tudo não é senão negócio de relações".^
Ante-sala do tema 13
A Europa do século XIX, sem dúvida, que assistia à consolidação do sistema
de fábrica, ao triunfo da ordem burguesa, ao advento das máquinas e das
novas invenções, a Europa que via as transformações urbanas redesenharem
sua paisagem e que via os avanços da ciência desvendar os mistérios da
natureza.
Para cumprir esta meta de apanhar o "trem da história", nada mais indicado
do que participar daqueles verdadeiros espetáculos da modernidade que eram
as exposições universais.
Dos Estados Unidos vinha o exemplo bem-sucedido de que era possível reali
zar a aventura da modernidade, do desenvolvimento industrial, da sociedade
burguesa e do governo democrático em terras americanas.
Caberia ainda lembrar que tanto a França como os Estados Unidos se apresen
tam como a alternativa ao predomínio do imperialismo britânico no mundo,
além de realizarem, historicamente, um processo de desenvolvimento indus
trial distinto do ocorrido na Inglaterra.
Que outra expressão não teriam as novas máquinas surgidas pela aplicação da
ciência à tecnologia, os rápidos e modernos meios de comunicação baseados
na ferrovia e na navegação a vapor ou os assombrosos inventos do engenho
humano,como o telefone, o telégrafo, o cinematógrafo, a fotografia? Merca
dorias destinadas a encantar a humanidade, símbolos do progresso técnico
dos "novos tempos", não eram simples produtos postos à venda, mas corpori-
ficavam idéias que buscavam impor-se com a força de certezas: o sistema
capitalista trouxera o progresso à humanidade, a máquina era voltada para a
satisfação das necessidades humanas,a ordem burguesa instaurava a socieda
de do bem-estar, o futuro era previsível, o trabalho disciplinado tinha possibi
lidades redentoras, a propriedade não era apenas desejável e justa, como era
uma meta a ser alcançada por todos, etc., etc. Neste contexto, a máquina
apareceu como o símbolo das inovações, rupturas, utopias e contradições dos •' Marx, Kari. O fetichismo da mercadoria:
"novostempos", responsável pormudanpsmateriais,sociaisementais.Apa- sêT^rèdo.
recendo como que dotada de vida própria, a máquina apresenta exigências e c/t. Livro 1, v. i, p. 8i.
Os SEGREDOS DA FÁBRICA: FETICHISMO E,ALIENAÇÃO 21
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22 Os SEGREDOS DA FÁBRICA: FETICHISMO E ALIENAÇÃO
desafios, pelos quais se dissimula a essência da dominação burguesa, da acu
mulação e do controle político.
Dessa forma, qual esfinge da tragédia que se apresenta aos Édipos contempo
râneos, a máquina se propõe como um enigma: decifra-me ou te devoro. De
cifrá-la significa, antes de mais nada, produzir um saber técnico adequado,
capaz de conhecer seus segredos, pô-la em funcionamento e usá-la segundo
fins desejados. Mas o sistema de fábrica, ao introduzir a máquina no processo
de trabalho, hierarquiza saberes e funções: desqualifica a virtualidade técnica
artesanal, isola o trabalhador do produto final e justapõe ao processo o técni
co qualificado, capaz da "leitura" da máquina. Numa outra dimensão, a má
quina "devora" o trabalhador, subjugando-o ao processo e rebaixando o valor
de sua força-trabalho. Em suma,como ponta de lança do sistema de fábrica, a
máquina mediatiza a assimetria social e impõe a disciplina do trabalho por
meio dos agentes do capital.
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"/...7 ser moderno é viver uma vida de paradoxo e contradição [...] é fazer
parte de um universo no qual, como disse Marx,'tudo que é sólido desman
cha no ar'"?
Trata-se, sem dúvida, de uma outra leitura de Marx, mas que, a rigor, não se
opõe ao Marx que disseca e desvela os mecanismos da dominação burguesa e
do sistema de fábrica. Crítica e repúdio, mas também admiração, magia e
fascínio pelo vigor de um sistema em construção.
Postura similar poderia ser encontrada em Baudelaire, que oscila entre a cele
bração da burguesia como classe e a denúncia do caráter arrasador do proces
so técnico trazido pela modernidade.
"Uns sábios, outros proprietários; — um dia radioso virá em que os sábios Ubidem, p. 35.
serão proprietários,e os proprietários sábios. Então vosso poderio será com
pleto, e ninguém protestará contra ele. Esperando esta harmonia suprema, ^ Ibidem, p. 116.
Ora o poema das Flores do Mal aparece como o porta-voz da burguesia, como
no já citado caso do Salão de 1846, ora se volta contra ela. Tome-se o caso da
figura do dandy, que ocupa um lugar central na sua obra. Ao inverso da bur
guesia, este não tem uma função claramente assinalada. O dandy é um dile
tante, um vagabundo, um boêmio, que não procura atingir outro fim senão o
de celebrar por tudo e sempre a glorificação das aparências, da beleza e das
sensações.^ Note-se a dialética que preside a personagem: é antieconômico e,
como tal, antiburguês; não faz nada, tal como o antigo aristocrata, mas ao
mesmo tempo é a imagem de um homem revoltado por excelência. Tal como
o artista, é produto de sua época, mas contra ela se volta, na busca de um
ideal estético livre da mercantilização da vida.
Por outro lado, esta mesma ordem burguesa, que fora capaz de desencadear
um surto de desenvolvimento tecnológico que dotara o mundo de novos in
ventos, é encarada pelo escritor como catastrófica e destruidora da verdadeira
arte e do belo. Para Baudelaire, o progresso, sendo o domínio progressivo da
matéria pelo homem,era, ao mesmo tempo, uma invenção da filosofia do seu
tempo:
"[...] o progresso indefinido não será sua mais engenhosa e sua mais cruel
tortura; se, procedendo por uma opiniâtica negação de si mesmo, ele não
será um modo de suicídio incessantemente renovado e se, fechado no cír
culo de fogo da lógica divina, ela não se assemelharia ao escorpião que se
volta contra si mesmo com a sua terrível cauda, este eterno 'desideratum'
que faz seu eterno desespero"
Refere Tuffelli:
Talvez por ser espectador e ator da "vida moderna" que ele buscou captar,
"Tuffelli, Nicole. L'art au XIXe siècle; Baudelaire enfatiza nesta afirmação a modernidade como o transitório, na
1848-1905. Paris, Bordas, 1988, p. 6. qual se evocam os componentes mais característicos do seu tempo: a moda, a
novidade, o progresso. Há,contudo, uma outra leitura do mesmo Baudelaire,
Baudelaire, op. c/f., p. 695. na qual ele focaliza a modernidade como um todo, sendo o eterno e o transi-
30 A AVENTURA DA MODERNIDADE! OS CONTRADITÓRIOS CAMINHOS DO PROGRESSO
tório seus dois componentes. Nesta outra definição, Baudelaire estaria resga
tando a historicidade do conceito, que supõe a faculdade de passar de uma
época a outra e de ser reconhecido como tal. Assim, a modernidade não seria
só o novo, a curta temporalidade de uma época naquilo que ela tivesse de
mais passageiro, como a moda. Dessa maneira, Baudelaire apontaria para a
modernidade como o "sentido da vida presente", que se renova e se historici-
za em cada contexto,em cada sujeito, em cada objeto. Mais ainda, dilataria a
modernidade para além da sua época, como aquilo que toca mais ao sujeito
no seu tempo.
Com a modernidade.
Mantendo ele próprio uma atitude ambivalente para com a sociedade burgue
sa, Benjamin, ao se debruçar sobre Baudelaire, resgata neste autor uma postu
ra similar:
Berman, op. c/f., p. 142. Indo mais além na análise da ambivalência de Baudelaire, Benjamin aponta
para o tema da multidão, caro aos escritores do século XIX. Para Engels e para
Kothe, Fiávio. introdução, /n: Kothe, Fiá
Poe, a massa tem algo de ameaçador, mas em Baudelaire exerce uma sensa
vio, org. e trad. Walter Benjamin, Socio
logia. São Paulo, Ática, 1985, p. 8. ção ora de repúdio, ora de atração. Ele é, ao mesmo tempo, cúmplice deste
indivíduo sem rosto e sem nome e dele também busca diferenciar-se, recusan
Benjamin, Walter. A Paris do Segundo do a massificação.^' .
Império em Baudelaire. In: Kothe, op. c/f.,
p. 117. Foi interrogando-se sobre os conceitos baudelairianos que Benjamin articulou
e amadureceu os seus, indo mais longe no seu processo de reflexão sobre a
Benjamin, Walter. Sobre alguns temas em realidade.
Baudelaire. In: A modernidade e os mo
dernos. Trad. Heindrun Krieger Mendes
Silva, Aríete de Brito e Tânia Jatobá. Rio Na Paris do Segundo Império, época de Baudelaire, Benjamin procurou des
de janeiro. Tempo Brasileiro, 1975. vendar o processo mediante o qual se construiu o mundo material e o "espíri-
32 A AVENTURA DA MODERNIDADE: OS CONTRADITÓRIOS CAMINHOS DO PROGRESSO
to" do século XIX. O crescimento da indústria, pela própria dinâmica da sua
acumulação, obriga-se a aperfeiçoar constantemente os métodos produtivos,
criando novas tecnologias e pondo à disposição dos consumidores nova gama
de mercadorias. A concorrência capitalista que se instala é, ela própria, um
poderoso estímulo na superação do novo pelo mais novo ainda,da técnica em
uso por aquela que se intenta produzir. Benjamin, todavia, não só fica na
constatação do progresso naquilo que ele aparenta ser ou na forma tal como
se mostra — melhor qualidade, maior quantidade, maior rapidez —,mas vai
ao âmago daquilo que ele oculta. Não se trata apenas de colocar ao consumo
das populações que se aglomeram nas cidades grande variedade de mercado
rias, mas do processo mediante o qual palavras, pessoas e processos se tornam
eles próprios mercadorias. O sentido é,aqui, mais uma vez aquele empregado
por Marx, fetichista e alienador, pelo qual as coisas passam a exprimir algo
que não é explícito, ou se travestem de umá aparência que encobre uma es
sência. Daí, o recurso de Benjamin ao processo de pensar a realidade por
meio de alegorias, imagens condicionadas pelo fetiche da mercadoria.
Segundo Rouanet:
Se o progresso foi uma utopia que embalou os sonhos do século XIX,os novos
inventos, fruto da aplicação da ciência à tecnologia, adquiriram aos olhos da
multidão o síafusde fantasmagorias,surgidas no mundo moderno para encan
tar a humanidade.
"De um lado, é certo que Benjamin sublima na fantasmagoria sua função Konder, Leandro. Walter Benjamin; o
marxismo da melancolia. Rio de Janeiro,
de transfiguração e de engodo. Mas,de outro lado, ele lhes encontra igual Campus, 1988, p. 80.
mente e ao mesmo tempo aspectos positivos: elas são também imagens —
sonhos da coletividade, elas encerram as demandas utópicas daquelas que ^ Janz, Rolf Peter. Expérience mysthique
as desenvolvem" ' et expérience historique au XIXe siècle. In:
Tiedmann, op. c/f., p. 458.
A AVENTURA DA MODERNIDADE: OS CONTRADITÓRIOS CAMINHOS CXD PROGRESSO 35
De certa forma,cada época produz os seus sonhos, mas é na sociedade domi
nada pelas relações capitalistas — e, portanto, pela mercantilização da vida
— que a dimensão onírica assumiria um papel preponderante. A história seria,
sem dúvida alguma, realizada pelos homens, mas sem plano ou consciência,
como se fosse num sonho, em virtude da fetichização.
Por outro lado, com o mito da eterna repetição, Benjamin retoma Baudelaire
por meio da dialética do novo e do eternamente igual. É ainda Rouanet que,
com propriedade, explica esta ambigüidade:
É claro que essa aguda percepção de conseguir ver o sempre-igual como ilu
sório e resgatar o novo dos escombros do tempo passado não é tarefa para o
comum dos mortais...
Uma coisa, contudo,é resgatar o senso crítico presente nas mentes iluminadas
dos pensadores que, de uma forma dialética, perceberam as transformações
materiais e as socialidades do seu tempo e cujo pensamento chegou até nós.
Outra é perceber que, de forma acrítica e não consciente, aquele turbilhão de
mudanças influiu nos atores sociais anônimos do processo sob a forma de
senso comum, de representações mentais e de um imaginário social.
Dessa forma, a modernidade do século XIX, tal como eclodiu como percep
ção aguda por intermédio de seus pensadores mais representativos, ocorreu
também como vivência socializada pelo homem comum, que foi portador
também destas ambigüidades, perplexidades e percepção de mudança.
Benjamin tinha em mente tanto a débãcledo Segundo Império quanto a Comu "Rouanet, op. cit, p. 66.
na de Paris, com o que desfaz a aparente estabilidade da sociedade burguesa
(ou, como aludira Marx, tudo o que é sólido pode desmanchar-se no ar...). "Benjamin, Walter. Paris, capitale du XIX
siècle. Le livre des passages. Paris, Cerf,
1989, p. 47.
Nesta medida, Philippe Ivernel distingue dois fios na narrativa de Benjamin
nas "Passages": a Paris da burguesia, da moda, da fantasmagoria, das forças "Ivernel, Philippe. Paris, capitale du Front
míticas da mercadoria, e a Paris das revoltas e das revoluções, "que põe à populaire ou Ia vie posthume du XIXe
história na hora da política tanto quanto a política na hora da história"}^ siècle. In: Tiedmann, op. cit., p. 252.
A AVENTURA DA MODERNIDADE: OS CONTRADITÓRIOS CAMINHOS DO PROGRESSO 39
Este elemento de tensão, presente nas polarizações da riqueza e da pobreza e
que já consta da obra de Baudelaire, é o elemento que precisa ser revelado e
ser trazido à tona pelo historiador que à semelhança do trapeiro, vai recolhen
do fragmentos e cacos do passado. Para Benjamin, não há mais diferença
entre este "despertar" produzido pelo historiador e a ação política.
Assim, a base teórica desta análise é a que vai de Marx a Benjamin, ou, em
outras palavras, a que trabalha com a fetichização do mundo e a transfigura
ção alegórica da realidade.
3
Fenômenos típicos do século XIX, as exposições universais são, como refere
Bensaude-Vincent,' produtos de um mundo industrial já adulto e que se apoia
va sobre o tripé do carvão,do vapor e das estradas de ferro. Nesse sentido, não
há como negar sua dimensão propriamente econômica, de feira de mercado
rias, mostruário de novos produtos, meca de lucrativos negócios. Foram seus
agentes a burguesia — industrial, comercial e financeira — secundada pelo
Estado. As exposições visavam ampliar as vendas pelos renovados contatos
entre produtores e consumidores, que estimulariam os negócios e a produção
pelo salutar conhecimento dos novos produtos e processos. Além disso, am-
pliar-se-ia o consumo, graças a um eficaz esquema publicitário.^
^ Bensaude-Vmcent, Bernadette. Florilège
A dimensão de universalidade seria dada pela abrangência dos itens expostos, des societés industrieiles. In: Le livre das
englobando tudo o que concerne à atividade humana,e também pela interna expositions universeííes, 1851-1859. Pa
cionalização do evento, dada a participação ativa das nações estrangeiras ris, Ed. des Arts Décoratifs/Herscher, 1983,
além da que promovia e sediava a exposição.^ p. 277.
Logo, a exposição
Pode-se dizer, em certa medida, que o homem do século XIX viveu sob a
crença do progresso ilimitado, elemento central de uma visão do mundo na
qual o futuro se antecipa como uma conquista assegurada. O progresso mate
rial e o resultado dos avanços da ciência humana haviam,de alguma maneira,
feito com que
"A idéia do progresso é, pois, uma teoria que contém uma síntese do passa
do e uma previsão do futuro. Baseia-se numa interpretação da história que
considera o homem caminhando lentamente. [...]em uma direção definida
e desejável e se infere que este progresso continuará indefinidamente".^^
Refere Bensaude-Vincent que esta proposta é nítida e clara nas primeiras dis
posições universais, as quais são predominantemente industriais:
Feira de mercadorias, a exposição enfeitiça com a sua mística do progresso e "Kothe, Fiávio. A alegoria. São Paulo,
a sua função didático-pedagógica, recolhendo seriedade na tradição saint- Ática, 1986, p. 87.
Exposições universais: paicos de exibição do mundo burguês 49
simoniana e comtista. Sua função é, contudo, ainda mais ampla,enveredando
pelo caminho do lúdico.
" Debray, Régis. Entre Diderot et Dis- Lugar artificialmente criado, evento efêmero, as exposições têm de festa este
neyland. Le Monde. Paris, 6 juil. 1990, p. caráter de curta duração e brilho. Grandes construções foram feitas para não
38. durar e mesmo a Torre EiffeI, símbolo da exposição de 1889, não tinha,em seu
início, a pretensão de perenidade. Como festa, a exposição celebra com faus
"Ibidem.
to e encantamento a sociedade industrial e a glória da ciência. Buscando na
própria ciência aplicada à técnica e nos avanços da indústria os recursos para
Rancière, Jacques et Vaudray, Patrice.
En allant 'l'expo: i'ouvrier, sa femme et Ia
os seus engenhos de diversão, a festa complementa a fábrica, assim como o
machine. In: Les revoltes logiques. Paris, ensino é suplantado pelo lazer.
n." 1, 1975.
Robichon, François. L'attraction, pare- Não dizia Benjamin que as exposições, ao transfigurarem o valor de troca das
gon des expositions universalles. In: Le li mercadorias, inauguravam uma fantasmagoria na qual o homem penetrava
vre des expositions..., op. cit., p. 315. para se distrair?®" E os homens não se abandonavam às manipulações desta
indústria prazerosa da diversão, alienados de si próprios e com relação aos
2® Paris des illusions. Mairie de Paris. Bi-
outros?
bliothèque Historique de Ia Ville de Paris.
1984-1985.
É ainda Martayan quem se pergunta se a festa e a diversão não serviriam para
2^ Martayan, Eisa. L'ephemère dans Ia vil o mesmo objetivo dos defensores da missão educativa das exposições:"redu
le. Paris et les expositions universeiles. In: zir num momento as distâncias sociais e assentar um imaginário coletivo em
Les expositions universelles à Paris. La torno de uma certa idéia de grandeza nacional?'^^
Revue d'Économie Sociale. Paris, avr.
1990, p. 44.
Oportunidade do lucro, glória da indústria, festa do trabalho, lição de coisas,
Benjamin, op. cit, p. 39.
parque de diversões... As exposições foram também monumentos à nacionali
dade.
Martayan, op. cit., p. 46.
Como lembra Pascal Ory,®® apesar do manifesto caráter de universalidade das
32
Cf. Ory, op. cit. exposições,transparecem nelas o nacionalismo dos movimentos imperialistas
52 Exposições universais: palcos de exibição do mundo burguês
em choque. A escolha das datas não se dá por acaso e tem um significado
profundo para as nações que sediaram o evento: em 1876, a exposição da
Filadélfia, nos Estados Unidos,é dada por ocasião do centenário da Indepen
dência, assim como a de 1889,em Paris, comemora os cem anos da Revolu
ção Francesa,ou a de 1878 pretende reafirmar o reerguimento francês após os
anos terríveis do início desta década, marcados pela derrota diante da Alema
nha e a eclosão da Comuna.
Por outro lado, a modernidade que se impõe precisa de símbolos,e eles estão
presentes nas novas e arrojadas formas arquitetônicas que acompanharam es
tes eventos. Londres, em 1851, inovou com o seu Crystal Palace, que com
uma moderna construção de ferro e vidro demonstrou ao mundo do que era
Oliveira, Lúcia Lippi. Modernidade e
possível a feliz combinação da ciência, da técnica e da indústria; em 1878, questão nacional. In: Lua Nova, n.° 20,
Paris apresentou aos contemporâneos o símbolo da solidariedade entre os maio 1990, p. 49.
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Esta, também, parece ter sido a preocupação de Benjamin, na sua obra incon
clusa das Passagens. PIum, op. cit, p. 29.
De um lado, o arguto pensador da modernidade resgatava os meandros da "Rébérioux, Madeleine. Les ouvriers et
sedução social e, de outro, a dimensão da resistência dos subalternos à magia ies expositíons universeilles de Paris au
burguesa das exposições, com a consciência pronta para o despertar da cole XIXe siècle. In: Le livre des expositíons...,
op. cit
tividade.
* Rébérioux, Madeleine. Les expositions
universelles. Vbir Paris ou mourir. In: Les
expositions universelles..., op. cit., p. 7.
Aqui, como na Europa, havia também, por parte dos segmentos mais esclare
cidos, a percepção de que o mundo atravessava um profundo processo de
mudanças. Afinal, por intermédio do comércio internacional, impulso vital de
sua economia, o Brasil tomava conhecimento dos novos produtos lançados
pelas fábricas européias e dos novos inventos. A máquina a vapor e as vias
férreas haviam-se tornado conhecidas também na América. As idéias do libe
ralismo econômico e político também haviam penetrado no país, "metaboli-
zadas" pelos interesses dos grupos dominantes locais que haviam "selecionado"
do ideário liberal aqueles princípios que melhor se adequassem a seus interes
ses escravistas, agroexportadores e latifundiários.
60 Acertar o passo com a história: o dilema da modernidade brasileiro no século XIX
Acompanhando as transformações materiais e os hábitos burgueses, um
conjunto de "idéias novas" passou a difundir-se: Darwin, Comte, Spencer,
Buckle vinham demonstrar, com suas teorias, que a renovação das ciências
da natureza podia ser transportada para o campo das ciências humanas.
Neste contexto, generalizou-se a opinião de que "o intelectual não podia
permanecersilepcioso, assim como tinha o direito de ser progressista e avan
çado".^
Esta mescla de posturas seria também apontada por Machado de Assis, no seu
ensaio de 1879,"A Nova Geração", no qual o autor alude à falta de unidade
que dificultava uma melhor caracterização. Mas ainda é Machado de Assis
'Romero, Silvio. História da literatura bra quem surpreende as coordenadas gerais da nova tendência: por um lado, um
sileira. Rio de Janeiro, INL/MEC, 1980, v. sentimento diverso da geração romântica, "oriunda do fastio deixado pelo
5, p. 1659.
abuso do subjetivismo" e, por outro lado, a inegável atração pelo
" Machado de assis. A nova geração. In:
Obra completa. Rio de Janeiro, Nova Agui- "[...] desenvolvimento das ciências modernas, que despovoaram o céu dos
lar, 1994, v. 3, p. 810. rapazes, que lhe deram diferente noção das coisas, e um sentimento de que
de nenhuma maneira podia ser o da geração que os precedeu".^
'Ibidem, p. 182.
Talvez um dos representantes mais significativos dessa mentalidade esclareci Machado de Assis, op. cit, p. 181.
da e fascinada pela técnica seja André Rebouças. Mulato, engenheiro, defen
sor intransigente da monarquia e do Partido Liberal, professor da Escola "Ibidem, p. 242-3.
Acertar o passo com a história: o dilema da modernidade brasileirÒ no século XIX 63
Politécnica, Rebouças viajaria por duas vezes ao exterior, visitando muitas
fábricas, oficinas, docas, ferrovias, pontes e outras obras públicas. Minucioso
nas descrições que deixou destas suas viagens,'^ expressa todo o interesse que
lhe despertavam os novos processos e mesmo o entusiasmo diante dos gran
des empreendimentos europeus.
Ibidem, p. 249.
Se Rebouças representa uma vertente da mentalidade esclarecida do país,
que, atraída pelas máquinas, buscava introduzir novos processos no Brasil,
"Ibidem, p. 251. Joaquim Nabuco é exemplo de uma outra dimensão da modernidade brasilei
ra do Segundo Império.
"Ibidem, p. 246.
"Sou antes um espectador do meu século do que do meu país;a peça é para
mim a civilização, e se está representando em todos os teatros da humani
dade, ligados hoje pelo telégrafo. Uma afeição maior, um interesse mais
próximo, uma ligação mais íntima faz com que a cena, quando se passa no
Brasil, tenha para mim importância especial, mas isto não se confunde com
a pura emoção intelectual; é um prazer ou uma dor, por assim dizer, do
méstica, que interessa o coração, mas não é um grande espetáculo, que
prende e domina a inteligência".^^
Por outro lado, Ortiz aponta que toda identidade se refere a algo que lhe é
exterior, apresentando-se como uma diferença em relação "ao outro". Há,
contudo, uma dimensão interna, que corresponde ao domínio do conjunto de
traços e elementos que dão o critério de auto-identificação e solidariedade
simbólica entre os indivíduos.^''
Não se tratava apenas de construir uma imagem do Brasil como nação que,
nos trópicos, se tornou independente do Reino d além mar, perpetuando a
forma monárquica de governo e conservando a mesma dinastia reinante. Mais
do que isso, tratava-se de um projeto de construção nacional que se dava no
quadro de um processo de modernidade.^'
Se a nação é uma comunidade política imaginária, qual era o Brasil sonhado
no século XIX? Em outras palavras, o que seria uma naçao moderna? "Ortiz, Renato. Cultura brasileira e iden
tidade nacional. São Paulo, Brasiliense,
O dilema inicial constituía-se com base na própria diversidade e extensão dq 1985, p. 8.
território: como construir um corpo político coeso diante de ta diversificação
geográfica, social, climática etc.? Como evitar a desagregação latino-america "Ibidem, p. 7.
na da América Hispânica?
"Cf. Oliveira, Lúcia Lippi de. Moderni
dade e questão nacional. Lua Nova, n.°
Um artificio político foi dado pela imposição da forma monárquica centraliza 20, maio 1990, p. 48.
da, herdada do império português e já "aculturada" na terra, tendo em vista a
67
Acertar o passo com a história: o dilema da modernidade brasileiro no século XIX
transmigração da Corte para o Brasil, interessa, contudo, resgatar as dimen
sões ideológicas do processo, em que a configuração do nacional se impõe
como uma idéia agregadora.
Portanto, o Brasil — grande, variado, dispare — era, contudo, uno como indi
vidualidade, como "alma", como socialidades estereotipadas, que levavam a
identificar conceitos ideais como "caráter do povo brasileiro".
Refere Coutinho sobre o enfrentamento fatal das duas correntes que se consti
tuíram na década de 1870:
"De um lado, os que insistiam nas raízes européias, procurando fazer delas a
essência de nossa civilização e reforçando os laços de nossa dependência
cultural à Europa. A essa corrente se deve a maioria de nossa obra historio-
gráfica, escrita em função do interesse ou da perspectiva lusitana ou da clas
se branca,dominante, herdeira lídima e continuadora da semente ocidental.
"De outro lado, a corrente dos nativistas, nacionalistas, brasilistas, que,sem
voltar as costas à Europa, de onde nos veio a herança cristã greco-roma-
no-ocidental —> procuram encarar o Brasil como algo novo, resultante da
fusão de elementos distintos, mas que não é mais rienhum desses elemen
tos isolados e sim um outro complexo racional, cultural, social, lingüístico,
literário e histórico".^^
Ortiz, Renato. O Guarani: um mito de
fundação da brasilidade. Ciência e Cultu
Representativa desse confronto é a polêmica entre Alencar e Nabuco,ocorri ra, n.° 40, 1988.
da no ano de 1875 e que implicou o enfrentamento de uma tendência cosmo-
politista com uma visão nacionalista. "Coutinho, Afrânio. Introdução. In: Cou
tinho, Afrânio (org.). A polêmica Alencar
Forçoso é reconhecer que a modernidade se colocaria do lado dos universa- e Nabuco. Rio de Janeiro, Tempo Brasilei
ro, 1978, p. 7-8.
listas, que encaravam a redenção do país pela europeização. Seus arautos
69
Acertar o passo com a história: o dilema da modernidade brasileiro no século XIX
apontavam que de lá vinham os ventos do progresso, da moda,da ciência, da
razão e da técnica. Por que opor-se a essa verdade insofismável? O Brasil
moderno só podia almejar este status se alcançasse o trem da história, parti
cipando dessa marcha civilizatória da humanidade. Apoiada no poder das
idéias, da ciência e da educação, a elite brasileira buscava superar o atraso
cultural, colocar o país no nível do século e fazê-lo acelerar sua marcha evo
lutiva.^"
Neste ponto, cabe referir que, para o Brasil do século XIX, participar das expo
sições universais e organizar exposições nacionais era antes instrumento para
o convencimento das próprias elites do que para a cooptação dos trabalhado
res.
Por outro lado, num país em que se tratava de estabelecer a indústria, os cami
nhos do progresso técnico passavam, necessariamente, pela modernização
agrária.
Assim, o endosso das propostas modernizadoras era levado a efeito por uma
parcela da classe dominante nacional interessada na renovação dos meios de
produção e na difusão de novos processos para romper a situação de atraso e
rotina em que se via mergulhada a agricultura brasileira."
Quando o Hyde Park foi definido como o lugar para a exposição, a população
^ The lllustrated Exhibition: a tribute to the londrina reagiu ante a possibilidade de abater algumas frondosas árvores que
world's industry jubile, comprising sket- ali existiam, o que obrigou Paxton a construir seu palácio com uma óave ca
ches, by pen and penei! of the principal paz de abrigar as árvores no seu interior.
objects in the Creat Exhibition of the In
dustry of ai! Nations. 1851. London, John
Cassei) Ed., 1851.
A rapidez da construção e a natureza dos materiais empregados causava de
imediato uma sensação de insegurança logo desfeita pelo maravilhamento
" Cf. Beriyn, Peter & Fowler, Charles. The que se seguia à entrada do recinto.
Crystal Palace: its architectural history and
constructive marwels. London, James Gil- O aspecto da obra figurava-se mágico para todos os que a viam: o suporte de
bert Paternoster, 1851.
ferro, o vidro translúcido deixando passar a luz, as árvores no interior mistu-
The Building Erected in Hyde Parak for the
Creat Exhibition of the Works of Industry rando-se a máquinas e produtos de todo o mundo."* No centro da construção
of AH Nations. 1851. London, john Wea- erguia-se uma fonte de cristal, produzida por uma fabricante de Birmingham.
le. 1852. No dizer dos que aí estiveram presentes, o espetáculo suscitava aos contem
The Art Journal lllustrated. Catalogue of porâneos a imagem dos contos de fada, de princesas adormecidas em caixões
AH Nations. 1851. London, George VIrtue, de cristal e outras fantasias desse porte...^
1851.
lí
11
LAMl, Eugène. Inauguração do Crystal
Paiace (aquarela). Exposição de Londres,
1851.
Fonte: Le Livre des Expositions
Universelles, 1851-1989. Paris.
Éditions des Arts Décoratifs, 1983, p. 18.
"Serai-ce donc un coup de magique science?
De Crystal transparent un arceau sans parei!
Ou gazon verdoyant comme un jet d'eau s'élance
A Ia rencontre du solei!"
o Crystal Paiace, com a sua fonte, era, contudo, o cenário ou a moldura que
permitia apreciar inventos, processos, máquinas, produtos.
^V .c.;
."v
íhV; ^
I ..
Duas delas eram oficiais, enviadas pela Assembléia Nacional e pela munici
palidade e compostas por trabalhadores cujos nomes haviam sido propostos
pelos empresários. A terceira fora custeada pela imprensa, embora no relató
rio dessas delegações não se tenha encontrado nenhum sinal de tentativas Dickinson's Comprehensive Pictures of
para estabelecer uma ligação permanente com a delegação inglesa, e sim de the Great Exhibition of 1851. London,
que França e Inglaterra deviam manter relações pacíficas, não é possível Dickinson Brothers, Her Magesty's Publ.,
1854.
esquecer que, justamente a partir desse encontro, a identidade trabalhadora
iria ampliar suas fronteiras, forjando a base para um comportamento classista.
Drury, An na Harriet. The First ofMay, a
new vision of a celebrated modem baila
São dessa época as críticas de KarI Marx sobre o espetáculo do exibicionismo da. London, William Pickeringe, 1851.
burguês que se realizava em Londres:
Tamir, M. Les expositions internationa-
"A prosperidade da indústria será ainda incrementada pela [...] grande ex-' les à travers les âges. Paris, Gallerie Jean-
ne Boucher, s.d. (Thèsse pour le doctorat
posição industrial de 1851. Já em 1849, quando todo o continente ainda
d'Université presentée à Ia Faculté das
sonhava com revoluções, foi a exposição convocada pela burguesia com o Lattras da 1'Univarsité da Paris), p. 37.
mais admirávelsangue frio. Ela convoca todos os seus vassalos, da França à
China, para um grande exame, no qual eles devem demonstrar de que Banjamin, Paris, capitala..., op. c/L, p.
maneira utilizaram o seu tempo. [...] esse grande congresso mundial de 201.
"A França é muito aristocrática na sua indústria: ela só sabe fazer boas
coisas e só faz coisas para os ricos;sua indústria toca a arte e seus operários
são artistas. [...] A aristocrática Inglaterra faz o contrário. Prepara produtos
para o consumo popular. Ela trabalha para as classes baixas, ela as vpste, as
alimenta, as mobilia aos mais baixos preços. [...] Ela nos bate neste terreno
e nós batemos no nosso. Mas os Estados Unidos estão começando a apare
cer no terreno inglês, aperfeiçoando suas máquinas".
A obra escultórica de Elias Robert era completada com uma terceira figura que
representava a França coroando a Arte e a Indústria, sentadas a seus pés. 2® Revista de Arquitetura e dos Trabalhos
Públicos. 1855, tomo 8, p. 123. Apud: Le
Ciência e progresso, fé no futuro e um otimismo nas potencialidades da razão Livre des expositions, op. cit. Exposição
e do trabalho humano pareciam incitar os visitantes e a se engajarem nesta de 1855, p. 28.
torrente que conduzia a um novo tempo.
Allwood, John. The Great Exhititions.
Londres, Studio Vista, s. d., p. 34.
Rica em significados, a mensagem alegórica da estatuária presente no pórtico
monumental se encaixava na Paris da metade do século XIX vivida por Baude- Llllustration Française.Paris, 19 de maio
laire e tão bem evocada por Walter Benjamin. de 1855, p. 315.
A modernidade aí chegara para se instalar naquela que buscava firmar sua Andraud, M. Exposition universelle de
posição como capital do século. 1855. Paris, Guiliaumin et Cie. Librairies,
1855, p. 15.
As caracterizações usadas por Benjamin" para trabalhar a modernidade são
Benjamin, Walter. Paris, capital do sé
extremamente apropriadas. As galerias ou passagens de Paris, por exemplo, culo XIX. In: Benjamin, Walter. Sociolo
não teriam sido possíveis sem certo desenvolvimento industrial e conheci gia. São Paulo, Âtica, 1985.
mentos técnicos que permitissem a utilização do ferro e do vidro nas constru . A Paris do II Império em Bau-
ções, dando ao mesmo tempo a impressão de luz e de intimidade, onde se delaire. In: Sociologia, op. cit.
Do Crystal Palace a Paris: a mística do progresso, o culto à máquina e a sedução do novo 85''
trazia a rua para dentro e o que se produzia dentro (as mercadorias) era trazi
do para fora (expor para a venda). Da mesma forma, o desenvolvimento do
grande comércio era também precondição para as passagens, numa Paris que
se tornava o centro da moda e da novidade, a cidade que fervilhava com os
mais variados tipos: banqueiros, industriais, ricos comerciantes, funcionários
públicos, militares, cocottes, artistas, operários, parvenus, flãneurs.
Ou seja, a correção das distorções sociais se daria pelo lado moral, reintegran
do a sociedade capitalista no seu originário caminho de concretizar o bem-
estar e a felicidade. Nesse sentido é que viria ganhar força a figura do "bom
patrão", como se verá mais adiante.
"[...] ciência que apenas se conhece, mas que excita a imaginação. Ela
permite a comunicação de um lado a outro do universo;ela dá uma luz que
parece uma emanação do sol; ela produziu no tratamento físico de corpos
simples, efeitos que viriam deslocar todos os conhecimentos teóricos sobre
"Andraud, op. cit, p. 109-200. a matéria"."^
Cf. Le Livre des Expositions, op. cit, p A exposição universal também apresentava algumas novidades, nem tão pro
29. digiosas assim, mas pioneiras para a época, como a "borboleta" da entrada
para o controle de visitantes"*® ou as poltronas rolantes para a locomoção inter
Ulllustration Française. Paris, 22 set. na de senhoras e idosos."'
1855, p. 198.
Diante de tal complexidade de mostras, a classificação propriamente indus
Ulllustsration Française. Paris, 17 nov trial era mais complexa do que a utilizada por ocasião do evento de Londres:
1855, p. 335.
os produtos eram classificados segundo força-motriz, matéria-prima e profis
OiY' Pascal. Les expositions universel-
sões,'" o que contudo deixa pensar que um mesmo item poderia ter mais de
les de Paris. Paris, Ramsay, 1982, p. 18. uma entrada...
Grandy, Marie Noèíle Pradel. Comment Mesmo assim, a exposição esforçava-se por apresentar seus produtos cuida
fait-on une exposistion universelle? In: Le dosamente classificados, de maneira metódica e científica, tal qual um museu
livre des expositsions, op. cit, p. 277. ou uma enciclopédia.
'Tamir, op. cit, p. 57. Nesse sentido, a exposição de 1855 apresentava-se como o próprio espetácu-
90 Do Crystal Palace a Paris: a mística do progresso, o culto à máquina e a sedução do novo
Do Crystai. Palace a Paris; a mística do progresso, o culto A máquina e a sedução ob novo 91-
Io da modernidade, sob o influxo do progresso, da máquina e da novidade,
explicitamente bela e racional, porém ao mesmo tempo mistificadora da rea
lidade em curso.
Isay, op. c/f., p. 16. Esse tipo de proposta encontraria abrigo na opinião contemporânea, como
registra o Annuaire des Deux Mondes:
"Bouin, Phillippe & Chanut, Christian-
Phillippe. Histoire française des foires et
des expositions universelles. Paris, Ed. du "Assim, em plena guerra, a exposição universal, emblema da paz e das
Nesle, 1856, p. 57e 71. alianças internacionais, convocava em Paris os produtos industriais e artís
ticos do mundo inteiro. Era uma espécie de protesto contra a guerra, o
"Ory, op. cit, p. 18. protesto do trabalho e do talento, da inteligência contra a força bruta. Era
92 Do Crystal Palace a Paris: a mística do progresso, o culto à máquina e a sedução do novo
INDVb'
A exposição de 1851 postulava, pois,a harmonia social numa Paris que sofria as
cirurgias urbanas de Haussmann, expulsando os pobres do centro da cidade.
Reproduzindo esse tipo de filosofia, L'lllustration Française louvava a medida q Andraud, op. c/f.
do governo de tentar facilitar a visita à exposição de operários de todos çs
cantos do país: se ory, op. dt., p. 18.
Do Crystal Palace a Paris: a mística do progresso, o culto à mâquiina e a sedução do novo 95
"Não serão só os operários e contramestres franceses que virão a Paris,
serão também todos os outros governos que vão imitar esta medida. A In
glaterra decidiu dar prêmios em dinheiro aos melhores alunos das Escolas
de Artes e Ofícios para que venham a Paris, assim como estabeleceu subs
crições públicas para que os delegados operários dos grandes centros ma-
nufatureiros possam vira Paris".
O Brasil tinha direito de aspirar à entrada neste concerto das nações que era
impulsionado pelo avanço técnico, pela ciência e pela razão.
Essas concepções, que aparecem nos relatórios dos membros das diferentes
comissões da exposição de 1861, realizada no Rio de Janeiro, expressam a
magnitude do passo dado pelos dirigentes da nação brasileira.
Essa forma de agir e pensar sobre a realidade brasileira tem condições de ser
apreciada na evocação feita das palavras do Visconde de Mauá sobre a livre
iniciativa e que foram endossadas pelo júri especial de premiação da indústria
fabril e manual quando da exposição nacional de 1861:
"[...] Na última exposição de Londres apareceram carnes enviadas pelas „ Asssembléia Provincial do Rio
Repúblicas do Prata que obtiveram geral aplauso. E nós pretendemos,con- Grande do sul. 1862.Sessão de 2 de outu-
corrência com o nosso charque magro?"^^ bro de 1862.
Do Brasil para o mundo: o^universo está em Londres 109^ - -
Todavia, não seria por esses tímidos ensaios que o Rio Grande do Sul ou mes
mo o Rio de Janeiro, com alguma indústria já estabelecida, iriam sensibilizar
os espectadores londrinos da segunda exposição universal inglesa.
O Brasil seria lembrado pela sua vasta e exótica coleção de amostras de ma
deira^'ou pelos seus "surpreendentes" insetos, convertidos em flores artificiais
nas quais as pétalas eram as asas e os órgãos...^®
Se a exposição objetivava demonstrar os avanços da indústria britânica no
decorrer dos dezenove anos desde a primeira exposição mundial, o efeito
obtido foi realmente marcar o contraste entre o avanço técnico científico das
nações ditas avançadas com o exotismo e a barbárie do mundo não-europeu.
Verdadeiro curso de "geografia pitoresca",^' o fascínio pelos povos distantes
era satisfeito com a observação das porcelanas da China'^ ou os interessantes
objetos com a aplicação em laca vindos do Japão.
Mais uma vez, a exposição caracterizou-se pela apresentação de novos pro
cessos de fabricação e de novos produtos, perseguindo o objetivo de produ
zir melhor com menos custo. Por ocasião do evento, deu-se a conhecer o
"Tamir, M. Les expositions international- processo Bessemer para a fabricação do aço, possibilitando-se a fabricação
les à travers les ages. Paris, Gallerie Jean- de máquinas e aparelhos dessa nova matéria.^'' Igualmente a exposição apre
ne Boucher, s. d.(Thèse pour le doctorat sentou novas matérias-primas, tais como a borracha e a juta, ao mesmo
d'Unlversité presentée à Ia Faculté des
Lettres de l'Universlté de Paris), p. 65.
tempo que marcavam presença o telégrafo e os cabos submarinos, cujas
experiência^ de ligação do Velho com o Novo Continente haviam iniciado
Revue des Deux Mondes. Paris, 1 jul. em 1857.
1862, p. 70.
O sentido prático dos inventos e objetos expostos era uma outra característica
Ibidem, p. 64. enfatizada. Demonstrava-se, para os visitantes encantados,como as máquinas
podiam colocar-se a serviço do lar burguês. Tapetes de linóleo, silenciosos e
"Benjamin,Walter. Paris,capitale du XIXe atraentes, papéis de parede decorados,com a respectiva máquina para impri
siècle. Le livre des passages. Paris, Cerf,
1989, p. 205.
mi-los, os muitos usos do papel maché, corantes e anilinas que davam novos
tons aos objetos e tecidos eram todos um universo de possibilidades que se
"Le Livre des Expositions Universelles. abria para o consumo burguês...
//
1851-1989. Paris, Ed. des Arts Décoratifs/
Herscher, 1983, p. 42. Todavia, este "bazar platônico" deixava ver, mas não tocar; as coisas ali esta
vam para serem vistas e não compradas, tal como um museu ou uma grande
"PIum, Werner. Expoxições mundiais no enciclopédia que mostrava ao público os recentes inventos produzidos pelo
século XIX: espetáculos da transformação engenho humano.
sociocultural. Bonn, Friedrich Ebert Stif-
tung, 1979, p. 117.
110 Do Brasil para o mundo: o universo está em Londres
Ao lado do exotismo dos países distantes, eram "os produtos do amanhã, os
gérmens novos e fecundos", o que mais chamava a atenção do povo.^^
Uma invocação religiosa presidira a construção do edifício, que tinha no arco Revue des Deux Mondes. Paris, 15 set.
que suportava a abóbada de vidro a seguinte inscrição: 1862, p. 385.
"Oh!Deus! Todas as riquezas e todos os homens vêm de Ti; Tu reinas sobre Ibidem, 1.° jul. 1862, p. 88.
tudo, na Tua mão estão o poder e a força e na Tua Mão também reside o
poder de fazer o homem grande" Demy, Adolphe. Essai historíque sur les
expositions universelles de Paris. Paris,
Alphonse Picard et Fils, 1907, p. 100.
Deus era, pois, invocado para depor em favor do capital, abençoar o progres
so, colaborando na missão do convencimento burguês... > Revue des Deux Mondes. Paris, 1.° jul.
1862, p. 62.
fWpW-
r. iv
%iv d; •
Em sua volta, vão aproveitar a proteção imperial levada a efeito por Napoleão
III, desejoso de conquistar o voto dos proletários: reclamarão o direito de
coalizão — entenda-se greve — e o de associação que já gozavam as Trade
Unions britânicas.''®
Rébérioux, Madeleine. Les ouvriers et Ou seja, Cheválier, apresentava uma versão moralizadora capital que se apro
les expositions universelles de Paris au XIX ximava da visão de harmonia social de Comte. Para esse pensador, era da
siècle. In: Le livre des passages, op. cit, p.
186.
"ordem natural" das coisas a existência de ricos e pobres, mas competia aos
pobres não desejar mais do que tinham e aos ricos não esbanjar e ostentar
Revue des deux Mondes. Paris, 1 nov. desnecessariamente. A harmonia social poderia ser obtida pela dedicação dos
1862, p. 14e19. fortes pelos fracos e pela veneração dos fracos pelos fortes. Logo, as correções
114 Do Brasil para o mundo: o universo está em Londres
da miséria ou da ganância se dariam por uma via moral. Em suma, saint-
simonismo e comtismo reconheciam o problema social e se empenhavam em
atendê-lo, evitando que as tensões se agudizassem e o conflito se estabeleces
se. É também no desdobramento de tais concepções que, à exposição londri
na de 1862, projetou-se a exposição de Paris de 1867.
Visto de hoje, o acontecimento pode muito bem ser admirado como uma es
pécie de símbolo da modernidade, naquilo que esse fenômeno, como expe
riência histórica, apresenta de mais característico: o sentido do exibicionismo
burguês, levado às suas últimas conseqüências; a exteriorização da exempla- ^ Tamir, M. Les expositions internationales
ridade do capitalismo e da genialidade de seus protagonistas; as técnicas feti- à travers les âges. Paris, gallerie Jeanne
chistas de persuasão empreendidas pela burguesia para manter a tutela sobre Bucher,s. d.(Thèse pour le doctorat d'Uni-
as classes subalternas. Todavia, como processo dialético, a exposição revelou versité presentée à La Faculté des Lettres
todas as antinomias do momento histórico no qual se realizava. d'Université de Paris), p. 67.
Uma coisa, portanto, é visualizá-la como festa galante, na qual uma Paris
renovada e atraente pós-reformas de Haussmann se oferecia aos estrangeiros
com coqueteria. Como resistir à iluminação feérica, às festas deslumbrantes,
ao desfile das personalidades, à exibição da moda, aos cafés? Tudo isso, indi
retamente, era o "clima" de uma saison parisienne, sob a qual se realizava o
evento e que não é possível deixar de considerar como tendo contribuído
poderosamente para o sucesso da exposição. Paris era o centro da cultura, da
moda, da arte, da maneira elegante e moderna de viver. Por sua exposição
internacional mostrava ao mundo o progresso de sua economia, sociedade e
costumes.
O problema social era nuclear na exposição. Pode-se mesmo dizer que -foi " Le Correspondam Paris, 25 jul. 1867,
p. 608 e 616.
nesse ponto que ela se distinguiu mais das que a precederam. Sob uma ordem
aparente, subterraneamente pululavam as contradições e outro não foi o mo ibidem, p. 617.
tivo que levou o empresariado e o Estado a enfatizar na exposição as realiza
ções sociais do capitalismo. > " Llllustration Française. Paris, 30 mar.
1867.
Não é, pois, por acaso que o Segundo Império passou a desenvolver um tipo
de política orientado pelo social desde o início da década de 1860,conceden
do aos trabalhadores a possibilidade de participar dos eventos internacionais,
como foi o caso da delegação operária francesa enviada à exposição de 1862,
em Londres, ou a concessão do direito de reunir-se em assembléia sem recor
rer ao poder público em 1868, ou ainda a concessão do direito de greve em
1864. Ou seja, as medidas do governo, embora se revistam de uma aparência
de paternalismo estatal, que "desde cima" concede aos operários regalias, são
na realidade uma resposta, preventiva e às vezes até cautelatória, às preten
sões manifestadas pelo movimento operário. Entende-se, nesse caso, que os
instrumentos legais não são apenas meros recursos de dominação, mas um
campo de luta e negociação, que evidenciam ser o processo histórico uma
permanente articulação entre mecanismos de dominação, subordinação e re
sistência.''*
Refere Rébérioüx:
Existe um dualismo nas concepções de Le Play que oscila entre a ordem moral
e a técnica, entendendo que um dos maiores problemas da sociedade de seu
tempo era a falta de paralelismo entre a evolução de ambas. Se o progresso
técnico se apóia na mudança e projeta o futuro, a moral se volta para a passa
do, para as tradições cristãs, e toda mudança é, nesse caso, um desvio. Nesse
contexto, Le Play sugere a moralização do progresso técnico, o que reconsti
tuiria a solidariedade perdida entre o capital e trabalho. Nesse sentido, era
preciso evitar a luta de classes e a luta dos povos,sendo a paz social o objetivo
máximo.'^
Por outro lado, a exposição de 1867 contava com um grupo especial — o 10.°
— que continha todos os móveis, vestimentas e alimentos, úteis e a bom pre
ço, suscetíveis de melhorar a situação física e moral das populações. A inicia
tiva era completada com um restaurante popular, no Campo de Marte, que
fornecia refeições a preços módicos.
Le Play, F., op. c/t., p. 47. Além disso, a exposição parisiense, sempre com o seu intuito de sedução so-
•« Revue des Deux Mondes. Paris, 1 abr. cial, não se limitava a projetar O futuro e garantir o presente: resgatava tam-
1867, p. 738. bém o passado, por intermédio do Museu de História do Trabalho. Verdadeira
122 De Paris a Viena: a sedução européia
exposição retrospectiva, relatava a evolução das formas de trabalho social
desde a indústria doméstica ao sistema fabril.
Mesmo diante das greves e das disputas salariais, que se revelavam o cerne
do conflito entre o capital e o trabalho, a educação era considerada o elemen
to moralizador, capaz de apaziguar divergências.^' Afinal, se a riqueza era
produzida pela união do capital com o trabalho, era na sua divisão que o
conflito aparecia: se o salário se elevava, diminuía o lucro e vice-versa... Reto
ma-se aqui a percepção de que a solução era coibir, moralmente, a ambos,
perante a necessidade de manter a paz social. Nesse ponto, Le Play lembra as
propostas comtianas para a solução dos problemas sociais: a moral e a educa
ção.
Mais uma vez os periódicos captam o espírito da época por íiieio da sátira.
Ora são os desenhos de Daumier, ironizando a capacidade do homem do
povo de apreciar a arte de outros povos,^'ora são os instrutores primários que,
compelidos a vir a Paris, desvirtuavam o sentido pedagógico da visita em vir
tude dos atrativos mundanos da cidade-luz...^^
Surpreendente construção da engenharia, a exposição apresentava um diora- Llllustration Française. Paris, 12 out.
ma sobre o Canal de Suez próximo a ser aberto, maravilhando os visitantes. 1867, p. 237.
&
Mas os efeitos da eletricidade não se restringiam aos domínios da vida prática, Bouin & Chanut, op. c/t., p. 84.
invadindo os campos de lazer e dilatando a jornada das diversões até altas
horas da noite: "Carte,"Patrice A. Expositions et moder-
nité: electricité et communication dans les
expositions parisiennes de 1867 et 1900
"[...] Enquanto isso, o parque, ficando aberto até às 11 horas, retinha ainda Romantisme, Paris, 65:35 e 38, 3 - sem
um certo número de visitantes que desejavam aíjantar e gozar de algumas 1989.
distrações que ele oferecia na 'soirée'. Caindo a noite, o pórtico do(palácio
se iluminava de um cinturão de fogos,aos quais os restantes acrescentavam "Le Play, F. Commission Impériale. Ra-
o brilho de suas luzes. O grande farol do lago cintilava sobre Paris. O jar pportsur l'Exposition Universelle de 1867
dim chinês e, durante algum tempo, os concertos dados nos salões do cír a Paris. Paris, Imprimérie Imperiale, 1869.
p.164. Apud: Le Livre des Expositions
culo internacional atraíam ou retinham algumas pessoas".^^ Universelles. 1951-1889. Paris, Éd. des
Arts Décoratifs/Herscher, 1983.
Esse aspecto lúdico era, contudo, condenado pelos mais moralistas como o
grande vício da exposição:
Entretanto, apesar de tais protestos, as exposições se voltariam cada vez mais ^ Alwood, John. The Creat Exhibitions.
Londres, Studio Vista, s. d., p. 34.
para esses aspectos de verdadeiras cidades, com uma total infra-estrutura de
serviços e de opções de lazer à disposição do público. Llllustration Française. Paris, 24 abr.
1867, p. 264.
Mas a magia e o encantamento não eram completos. Os relatórios dos operá
rios franceses sobre a exposição de 1867 podem ser tomados como um mo Le Correspondam Paris, 25 jul. 1867,
mento em que os trabalhadores se percebem como produto de sua despossessão. p. 621.
Que espetáculo oferecia o Brasil neste seu segundo evento nacional, prepara
tório para a exposição parisiense de 1867?
Sem dúvida alguma, o país ainda iria comparecer com a sua tradicional fisio
nomia herdada do passado colonial: produtos de gêneros alimentícios e maté
rias-primas para o mercado internacional. Nesse sentido, predominavam nas
províncias do norte do país os produtos da sua "indústria extrativa", ao passo
que nas províncias sulinas os produtos da "indústria agrícola". Mais uma vez a
aplicação da palavra indústria era indiscriminada, referindo não só produtos
manufaturados como gêneros agrários in natura. Em suma, o uso do termo
indústria era praticamente sinônimo de atividade econômica.
A indústria açucareira, por outro lado, rendia pouco lucro aos lavradores, pois
era pouco difundido o uso de máquinas e aparelhos demandados pelo cultivo
para que este pudesse apresentar maiores vantagens. Era lembrado o exemplo
de outros países, nos quais o recurso à tecnologia permitia menor despesa
com salários."*^
Era lembrado que o algodão que saía do Brasil como matéria-prima era manu
faturado no exterior para a produção de finos tecidos. Não seria, pois, conve
niente que ele fosse aqui menos beneficiado ou que o governo preferisse os
tecidos das fábricas nacionais para o abastecimento do Exército ou da Ma
rinha."^
Para análise da formação do mercado "[...] atestam que já temos hábeis construtores e que elas se podem bem
de trabalho livre no Rio Grande do Sul e a preparar no país, sendo certo que os estabelecimentos desta ordem forne
relativa escassez de mão-de-obra apresen cem ocupação a um grande número de operários e inegavelmente concor
tada, consultar: Pesavento, Sandra Jatahy. rem para a educação de muitos filhos de classes menos abastadas da
A emergência dos subalternos; trabalho
livre e ordem burguesa. Porto Alegre, Ed.
sociedade, aos quais oferece um meio de vida lucrativo".
da UFRGS, 1989.
Ligada àquela questão da industrialização se achava este que era, na verdade,
Rego, op. cit., p. 49. o principal problema das elites brasileiras no decorrer da segunda metade do
134 De Paris a Viena; a sedução européia
século XiX: a formação do mercado de trabalho livre, eixo central do processo
de internalização capitalista que atravessava o país.
Essa não era, contudo, a opinião francesa: ao comentar o espaço ocupado Villeneuve, Júlio Constância de. Relató
rio sobre a Exposição Universal de 1867.
pelo Brasil, pelo Chile e pela Argentina, Le Correspondant ironizava dizendo Paris, Tip. Júlio Claye, 1868, tomo I, p.
que cabiam no côncavo da mão..." XXIII-LIX.
As medalhas de ouro obtidas foram dadas por causa do café e das madeiras, e Le Correspondant. Paris, 25 jul. 1867,
o algodão obtivera uma láurea coletiva, o "prêmio grande do algodão". Se tais p. 613.
Lamentava-se não terem sido premiadas as carnes do Rio Grande, uma vez
que o extrato de carne fabricado no Prata pelo sistema Liebig recebera refe
rências elogiosas e ganhara medalha de ouro.^^ A criação de uma nova ordem
de prêmios — a que recompensava as ações para promover o bem-estar social
ou a harmonia das relações entre o capital e o trabalho — acabou benefician
do o Brasil. Como o programa de prêmios não abrangesse só a indústria fabril,
o representante do júri especial reclamou para o Brasil a outorga de uma das
premiações para as colônias agrícolas brasileiras, como as de Blumenau e São
Leopoldo. Argumentava-se que nesses estabelecimentos os operários eram ao
mesmo tempo patrões e empregados, trabalhando em terras que se tornavam
suas. Após intensas negociações, a colônia de Blumenau foi recompensada.
Na verdade tratava-se de algo relativamente distante da proposta original fran
cesa, inspirada no patronato e nas práticas assistenciais de dominação do ca
pital sobre os trabalho, mas a repercussão foi boa para o Brasil. Mais próximas
das propostas francesas estariam os tímidos empreendimentos do nascente
empresariado brasileiro de investir em educação, lazer, habitação e serviços
médicos para os seus operários. Num país que transitava da força-trabalho
escrava para a força-trabalho livre, tais medidas visaram reter nos estabeleci
mentos uma mão-de-obra relativamente escassa e que precisava ser "domes-
ticada".
Uexposition universelle de 1867 illus- Se, do ponto de vista da elite ilustrada nacional, ansiava-se pelo cosmopolitis-
trée. Paris, Adminstration, 1867, p. 278-9. mo no país, para o capital internacional essa participação no intercâmbio mun-
140 De Paris a Viena; a sedução européia
dial de produtos consagrava a jovem nação brasileira na sua antiga posição de
região agrícola tropical.
Cada país arranjara sua quota de objetos a serem expostos à sua maneira, o
69
Demy, op. cit., p. 192. que deu ao conjunto um aspecto de miscelânea, tornando difícil a compara
ção entre as mercadorias de um mesmo tipo.
Le Moniteur lllustrée de rExposition,
Viena, 15 abr. 1873, p. 2.
Comparecendo à inauguração da exposição, Rebouças classificou o evento
71
Le Livre des Expositions, op. cit., p. 56. como uma festa monótona e triste, à qual faltara o caráter civilizador, perma
necendo apenas a aparência de um bazar imenso que abrigava todos os povos
Fournel, Victor. Voyage hors de ma do mundo. Ressalvando a personalidade moralista de Rebouças, avesso às
chambre. Paris, Charpentier, 1878. festas mundanas, parece que as opiniões dos contemporâneos convergiam
para um mesmo ponto de crítica: um conjunto variado de produtos e exposito
Rebouças, André. Diário e notas auto res, cosmopolita sem dúvida, mas dificultando a apreciação do conjunto e do
biográficas. Rio de Janeiro, José Olympio, detalhe. Como diria Freud, também espectador do evento: "trata-se de um
1938, p. 240.
espetáculo destinado às pessoas de espírito, às beias-artes e aos irrefietidos"
Apud: Babin, Pierre. Sigmund Freud, un
tragique à l'àge de Ia science. Paris, Galli- A galeria das máquinas, por sua vez, apresentou o que havia de mais moder
mard, 1990, p. 23. no. A Inglaterra e os Estados Unidos — estes experimentando um surto econô-
142 De Paris a Viena: a sedução européia
mico pós-guerra civil — ressaltavam-se com suas grandes máquinas agrícolas.
A França, que havia perdido para a Alemanha importantes regiões industriais
após a guerra de 1870, consolava-se em ver os seus produtos de luxo admira
dos por todos, assim como suas obras de arte.
TTj
"Nós diremos dos Estados Unidos o que dissemos da Rússia: eles estão
longe de ocupar na exposição um espaço em relação com a extensão de
seu território, entretanto os objetos que eles enviaram eram interessantes e
caracterizam bem este povo saído de um imenso cadinho onde se fundiram
os elementos europeus e que tomaram por divisa 'go ahead't [...] Desde o
início se viu que o objetivo principal do americano é substituir o braço que
lhe falta pela ajuda da máquina. As coisas mais simples e triviais se fazem à
mecânica".^
A exposição foi inaugurada em maio de 1876, revestindo-se de toda pompa Memorial of the International Exhibition.
e solenidade. Ao som da música de Wagner, que compôs um hino especial Hartford, Published by L. Stebbins, 1877.
mente para a ocasião, o evento foi aberto com a presença do Presidente ^ 1876. A Centennial Exhibition. Washing
Grant e do imperador do Brasil, D. Pedro II, que, juntos, puseram em fun ton D.C. The National Museum of History
cionamento a gigantesca máquina Corliss, produzida em Rhode IslancL Ocu and Techonology, Smithsonian Institution.
pando o centro da Machinery Hall,com um motor de 1.500 HP, mas podendo Roberto Post Editor, 1876, p. 19 e 10.
Deve ser ressaltado que, no caso da sátira, faz-se a leitura não-oficial das
motivações do evento ressaltando o cotidiano do certame e os interesses par
ticulares de cada um que nada tem a ver com a visão propriamente política de
realização da Centennial. O que flui da leitura das piadas contemporâneas é o
aspecto lúdico e bizarro da exposição, além do aspecto de ela não ser só
mostruário de objetos, mas vitrina de pessoas,em que os indivíduos assumem
a conotação de mercadorias. Retoma-se, aqui, a mercantilização da vida e a
aparência dos fenômenos que escondem a essência dos processos vividos, já
anteriormente aludida.
"Harper's Bazar. New York, 15 jul. 1876.
Para a tropical monarquia dos Bragança, a exposição foi muito mais além da Harper's Bazar. New York,24 jun. 1976.
expectativa dos povos europeus. Enfim, a modernidade atravessava o oceano Os business men iam porque o país espe
e comprovava-se ser possível a aventura do progresso em terras americanas. rava que os seus homens mais proeminen
Os Estados Unidos, que também haviam sido colônias d'além-mar, eram o tes comparecessem; as moças casadoiras
para ver se encontravam um charmoso
exemplo vivo de que era possível acompanhar o trem da história. estrangeiro; os rapazes em busca de uma
herdeira; as elegantes para serem admira
A opinião entusiasmada da elite brasileira transparece nos relatórios da parti das; o batedor de carteiras à cata de "opor
cipação brasileira na Centennial ou da exposição nacional de 1875, prepara tunidades financeiras"; o homem casado
tória da internacional de 1876. obrigado pela mulher; o pai de família ar
rastado pelas crianças; o gordo em busca
de bons restaurantes.
O Brasil não deveria temer expor-se à crítica internacional, seguindo o exem
plo dos Estados Unidos,que ousara disputar com a Europa.'^ Se, por um lado, "Exposição nacional de 1875. Notas e
a exposição lavrava um tento nos rumos do progresso industrial, por outro, era observações de Rosendo Moniz Barreto.
mais um degrau na escala da ciência, causando um "efeito mágico sobre o Rio de Janeiro, Tip. Nacional, 1876, p. 5.
espírito ávido de saber". A América dava ao mundo o melhor exemplo de
amor ao trabalho,espírito de associação,emprego útil do tempo e alto espírito Ibidem, p. 21.
de iniciativa." O Brasil só tinha a lucrar participando de um evento de tal
"Exposição Centenária da Filadélfia, Es
natureza. Sólidos interesses uniam os dois países, tendo em vista a comercia
tados Unidos, em 1876. Relatório da Co
lização do café, e a exposição era uma ótima oportunidade para tornar-se missão Brasileira, apresentado por J. M.
mais bem conhecido do conjunto da população americana, que j|i consumia Silva Coutinho. Rio de janeiro, Tip. Na
cerca de metade da produção brasileira. cional, 1879, p. 3-5.
"[...] não há em nossa terra indiferentismo em relação à indústria, à agricul "Catálogo da Exposição da Província de
tura, e ao progresso das artes. Compreende-se que uma exposição demons São Pedro do Rio Grande do Sul em 187S.
S.n.t.
tra o labor, a constância, o engenho, a perfeição e o desenvolvimento do
trabalho d'um povo; reproduz como que estereotipada a riqueza pública e
" Catálogo da Exposição Nacional em
a particular e só isso deveria ser um incentivo para o interesse que, pela 187S. Rio de Janeiro, Tip. Carioca, 1875.
nossa exposição provincial, tem tomado a população da capital. Consig
nando este fato em nossas colunas, não fazemos mais do que prestar home A Reforma. Porto Alegre, 27 maio 1875.
nagem ao espírito do povo, por mostrar-se tãojustamente interessacjo pelos
cometimentos que podem dar em resultado a prosperidade da pátria". "Ibidem, 30 maio 1875.
Para a edificação de seu pavilhão, mais uma vez o Brasil optara por um estilo
mourisco,sem muito a ver com as tradições arquitetônicas lusas, mas de gran
de efeito pelas cores variadas e brilhantes e pela ornamentação exótica, que
incluía flores artificiais, penas de pássaros, borboletas e insetos, ou mesmo
amostras de algodão que se dispunham a recobrir as paredes.^'
Mas realmente a grande figura do evento foi dada pela simpatia pessoal, a
simplicidade de maneiras, a educação e profunda curiosidade intelectual por
toda a exposição demonstrada pelo imperador D. Pedro II. Fontes americanas
e francesas não cessaram de elogiá-lo, ressaltando a distinção do casal impe
rial, a sua cultura contrastando com a sua simplicidade das maneiras e o mi
nucioso interesse com que examinou os objetos expostos.
"Não nos iludamos, o que mereceu aplausos na exposição foi quase tudo A legenda, apresentada na edição do
obra da natureza; o trabalho do homem entrou aí com pequena parcela, Harper's Bazar de maio de 1876, p. 352,
era a seguinte: "Do give the good man a
mas felizmente, tanto quanto bastou para demonstrar que não somos indig chance! D. Pedro and the 'Bray-siUy-uns'
nos das riquezas que possuímos. O melhor exemplo que podemos imitar of the United States". A blague do vocá
para alcançar a prosperidade temo-lo nesse mesmo país que tambérn nos bulo "brasileiro" é feita com as palavras
acolheu e julgou-nos, nesse povo despido de preconceitos, ativo, simples. inglesas bray (zurrar) e silly (estúpidos)...
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'Dom táDkb and th* í'Bray-sillvtUíís" cr tMb UMÍfso StatiÍí
O relatório enfatizava que não era possível continuar a nação iludida com as
suas potencialidades naturais. A solução, que indicava o caminho do país
desejado, era do trabalho e da máquina.^^
Como refere Isay, com Edison se impunha novo ideal de civilização, e fun-
diam-se três mitos: o mito americano, o mito da democracia, o mito da ciên-
cia.^^ A França, contudo, voltava a tirar partido do brilho americano, e a
exposição da imensa cabeça da estátua da liberdade, de Bartholdi, visitada
por dentro pelo público interessado, vinha lembrar que a independência ame
ricana fora obtida com o derramamento do sangue das duas nações e que
parte do sucesso dos Estados Unidos era advinda da influência francesa.
O sucesso da exposição era inegável triunfo político para a República. À dife Cerbelaud, Ceorges & Dumond, Ceor-
rença das exposições anteriores, o governo é que enfrentou-sozinho todos os ges. La génie civil et les travaux publics à
1'exposition universelle de 1878. Paris, J.
custos e riscos do evento. O uso político da exposição universal não passaria,
Defey e Cie. Imprimeurs Éditeurs, 1879,
contudo, despercebido, e periódicos da época denunciavam esse fato.^® p. IV.
Se é possível delinear os princípios orientadores da expoyção, eles foram a Le Correspondant. Paris, 10 out. 1878,
ciência e a educação. O avanço científico aplicado à tecnologia brindara o p. 139.
isiíyw
A. . ♦ *. -ík.'. ,-ft ■•
Dessa forma, a exposição francesa de 1878 teve a seu favor a Rua das Nações,
miscelânea de povos e estilos arquitetônicos que exibiam raças, costumes e
vestimentas exóticos ante os visitantes curiosos. Naturalmente o Oriente e a
África eram objeto da maior curiosidade para os olhos ocidentais dos euro
peus brancos.
Por outro lado, grande atração foi o balão cativo apresentado no evento, que
permitia aos visitantes elevarem-se aos céus de Paris e de lá, maravilhados,
descortinarem um panorama dantes nunca visto. Como dizia um periódico da
época, descrevendo a sensação:
A modernidade, pois, tinha caminhos que nem sempre passavam pela indus
trialização local. É certo que as maiores críticas partiram do comércio impor
tador alemão e que os industriais dessa etnia não deixaram de comparecer ao
evento. Contudo, parece claro também que o intuito do Partido Liberal basea
va-se mais no objetivo de oferecer aos consumidores locais produtos baratos e
aos produtos estrangeiros oportunidades de colocação no sul. Não é de estra
nhar, pois,que,quando surgiu no sul o Partido Republicano,com uma propos
ta que contemplava mais explicitamente a indústria e o comércio locais,
estendesse o seu raio de ação, com sucesso, para a emergente burguesia ur
bana.
"[...] nascida nas oficinas da indústria nacional, foi levada a efeito pelos
mesmos ativos industriais, classe digna do mais solícito apoio de todos os
brasileiros, porquanto às belas frases ela antepõe as boas obras. Esta expo
sição não foi concebida nas altas regiões do poder, nem à sua educação
presidiram os princípios da ciência ou os atletas da palavra;gerada no pró
prio seio da indústria nacional, os seus passos tiveram por principal guia e
melhor arrimo os homens do trabalho"."^
Dito dessa forma, parece haver uma inspiração de conteúdo liberal na propos
ta: a livre concorrência dando oportunidade ao justo preço e à satisfação de
consumidores e produtores. Não estava ausente, contudo, das preocupações
dos industriais a injusta e difamatória campanha movida contra eles, de que a
indústria era causa da elevação do custo de vida, ou o preconceito contra os
produtos nacionais, caros e malacabados, diante dos estrangeiros superiores.
Afirmavam os industriais que o setor manufatureiro do país ainda precisaria
percorrer um longo caminho até equiparar-se com os do exterior e que, para
isso, competia ampará-lo com tarifas aduaneiras protecionistas. O caso dos
Estados Unidos era lembrado como exemplo bem-sucedido desta prática.
Kl
Na passagem j j' j j
da década j-r
de 70 para a seguinte, diferentes I
visões se articula- Catálogo da exposição
promovida e levadada aindústria na-
efeito pela
vam,tecendo e retecendo interesses, mas confluindo na identificação de que Associação industrial em 1881 com os
se viviam novos tempos e que a modernidade era um sonho que podia ser auxílios do Governo imperial. Rio de ja-
realizado em terras americanas. ^'P- Nacional, 1882, p. v.
"[...]é ela que fez das exposições um dos lugares privilegiados da moderni
dade, a terra regularmente fecundada onde o fetichismo da inovação in
dustrial anda de par com a convicção herdada de Augusto Comte de que a
história tinha um sentido e que a humanidade, em rota para a idade positi
vista, tinha entrado na 'transição crítica"'^
Todavia, o progresso, esta idéia-mestra do século XIX, não é apenas utopia, ^ Rébérioux, Madeleine. Au toumante des
desejo coletivo e difuso de um mundo melhor. Ele é também a outra faceta expôs. 1889. In: Le Mouvement Social.
Paris, out.-dez. 1989, p. 6.
que comporta o imaginário e que se dá o nome de ideologia. Nestardimensão,
o progresso é veiculado pelo discurso, carregado de intenções e significados e 2 .Approches de 1'histoire des ex-
seus arautos são comprometidos com a ordem estabelecida. positions universeiles à Paris du Second
Empire à 1900. In: Bulietin du Centre
Mas, então, poder-se-ia perguntar, o progresso funciona como Jano de duas d'Histoire Économique et Sociale de Lyon.
caras, no imaginário do século XIX? Se a realidade não é "isto" ou "aquilo". 1976, p. 1.
Como se dizia então,o mundo se renovava a cada dez anos e o progresso com
"botas de sete léguas"...
A data de sua realização não fora obra do acaso. Tanto ela correspondia mais
ou menos a um intervalo regular entre as exposições francesas universais até
então realizadas — 1855 — 1867 — 1878 — quanto coincidia com o Cente
'Revue de l'Exposition Universelle de nário da Revolução Francesa. O motivo era justificável e facilmente ganharia
1889. Paris, Librairie des Imprimeries Ré- adeptos para a causa. Por outro lado, a intencionalidade política do evento
unles, tome 1", n." 2, p. 4. era também manifesta: associava-se às realizações da Revolução com a exce
lência da forma republicana de governo. Ainda segundo Pascal Ory, a partir
" Ory, Pascal. L'expo universelle. Bruxel- de tal coincidência, as forças do calendário e do poder conjugavam-se para
les, Complexe, 1989, p. 10. colocar em ação todos os recursos a seu dispor.'
' . Le centenaire de Ia Revolution
Française. In: Nora, Pierre, dir. Le lieux de
Tratava-se, pois, de "tirar proveito" do "clima" favorável ao evento e dar-lhe
mémoire. La Republique, v. 1. Paris, Galli- um sentido mais amplo, indo da dimensão nacional à universal. Ou seja, a
mard, 1984, p. 523. Revolução Francesa, que tantas benesses trouxera à civilização, não era ape-
174 Paris é uma festa: o "charme" da Cidade-Luz
nas uma manifestação do gênio francês, mas também um acontecimento uni
versal. O conjunto das modificações trazidas pela Revolução de 1789 era,
assim, um patrimônio da humanidade: os direitos do homem,o liberalismo, a
abolição das corporações e a liberdade do trabalho, o avanço da ciência e da
técnica etc. etc.
"[...] ela conserva as qualidades essenciais de sua raça, ela continua sendo ® UÉcho de Paris. Paris, 8 maio 1889.
o que foram seus ancestrais: honestos e trabalhadores. Ela tem por paixão o
trabalho e a ela consagrara todo o seu gênio, inteligência, ciência, seu hu ® La Gaulois. Paris, 6 maio 1889.
mor alegre e franco, seus imensos recursos, enfim, o que há de melhor no
pafs".'^ Isay, Raymond. Panorama des exposi-
tions universeiles. Paris, Gailimard, 1937,
p. 181.
O Presidente Carnot, que por sinal sofrerá um atentado na inauguração da
exposição — nódoa que não conseguiu empanar o brilho do evento... —,não "Ory, L'expo universeiles, p. 65.
deixou por menos a exaltação do espírito nacional e da república, associan-
do-os com a democracia. A Revolução Francesa inaugurara uma nova et^a que Le Temps. Paris, 6 maio 1889.
É claro que todas as exposições pretendiam ser um sucesso, que tal sucesso
seria medido pela afluência do público e que este se mobilizava por causa das
atrações. Como refere Robichon:
"A história das exposições universais é também a história dos seus parques
de atrações que reuniram em cada época os prazeres mais variados com
um gosto marcado pelas superproduções. O imaginário que elas colocam
em cena responde a outra significação da palavra utopia, aquela de um
lugar onde a tecnologia do fantástico está a serviço do prazer. Este gozo
transborda o programa da exposição. O seu sentido contamina a razão".
Como não acreditar nas forças do progresso, se ele fora capaz de criar tão
atrativas formas de diversão? Como não se sentir seduzido pela viagem no
espaço e no tempo, proporcionadas pela visão exótica dos diferentes povos e
costumes, ou pelo panorama retrospectivo da vida humana através dos sécu
los? ComoTião se render à fada eletricidade, que tornava clara a noite de Paris
e prolongava a festa até horas tardias? Que dizer então da fonte luminosa em
frente à torre, atraindo todos com o seu espectro de cores? Se se formavam
Robichon, François. L'attraction, parer- filas para ver e experimentar o telefone e o fonógrafo, não menos sucesso
gon des expositions universelles. In: Le li experimentavam os novos meios de locomoção internos: opousse-pousse tonki-
vre des expositions universelles. 1851-
1989. Paris, Ed. des Arts Décoratifs, 1983, nois, empurrado por orientais, os burros da Rua do Cairo, ou mesmo as pontes
p. 315. rolantes que, no interior da enorme Galeria das Máquinas, permitiam aos visi-
178 Paris é uma festa: o "charme" da Cidade-Luz
tantes ter, do alto, uma visão do impressionante conjunto de engenhos em
movimento...
Para as crianças, nada mais encantador do que o "País das Fadas", onde os
contos de Perrault e das mil e uma noites fascinavam o seu pequeno público.
"A torre se define por um duplo simbolismo, por uma significação conside
rável. Ela simboliza um dos fenômenos mais interessantes na exposição: a
transformação dos meios arquitetônicos, a substituição do ferro pela pedra,
o esforço deste metal para encontrar a sua forma de beleza. [...] Ela simbo
liza também uma outra característica dominante da exposição, ela busca
tudo o que possa facilitar as comunicações, acelerar as trocas e promover a
fusão das raças. [...] Cada grama de aço com que ela é feita já foi paga pela
alegria, pela elevação do espírito de cada homem que nela subiu. [...] A
Torre não é muda, ela fala: 'Eu represento a força universal disciplinada
pelo cálculo. O pensamento humano corre ao longo dos meus membros
[...] eu sou a ciência [...] eu faço o homem livre [...] eu não tenho necessi-
dadp do vosso Deus, inventado para explicar uma criação da qual eu co
nheço as leis".^^
Vogüé apresenta com a Torre uma imagem alegórica do seu tempo: a força do
ferro, impelida pela razão, possibilitada pela ciência, rompia o fim do século
para assegurar a consolidação da sociedade burguesa, industrial, democráti
ca. É verdadeiramente uma ode à modernidade e uma reafirmação otimista
das virtudes do progresso. O homem, ser racional, senhor da técnica, possui
dor do conhecimento científico, domara as leis do universo. Prometeu rompe
ra os grilhões, subjugara as forças da natureza. Essa potencialidade se traduzia
em libertação. Com tais poderes, quem poderia deter a marcha do progresso?
Como não acreditar que o futuro pudesse preservar e mesmo ampliar a socie
dade do bem-estar?
"Sobre EiffeI, consultar: Sobre a figura dos engenheiros e seu enorme prestígio no momento da exposi
Lemoine, Bertrand. Custave EiffeI. Paris, ção universal de 1889, diria um periódico da época:
F. Hazan, 1986.
Marrey, Bernard. Custave EiffeI; une en-
treprise examplaire. Paris, Institute, 1989. "Eles são os heróis do momento, os triunfadores do século. EiffeI, Edison,
EiffeI, Custave. La Tour EiffeI en 1889. Pa Alphand, Bouvard, Contamin e também Balthard. [...] Estes homens perso
ris, Masson et Cie. Éditeurs, 1902. nificam a civilização, os últimos anos do século XIX. Cada época teve os
seus mestres, os seus gênios. O século XIX, tendo perdido os seus generais,
"Ao que consta, a idéia de uma torre seus artistas, seus poetas, parecia acabar na decrepitude, mais eis que surge
metálica de 300m, inspirada nos pilares
das pontes metálicas, havia sido dos en
toda uma grande geração de engenheiros. A sua vinda era fatal, lógica e,
genheiros Koechiin e Nouguier, posterior por assim dizer, forçada. O'século do vapor, da eletricidade, teria necessa
mente secundadas pelo arquiteto Sauves- riamente de criar homens capazes de tirar proveito destas maravilhosas
te, que o apresentaram a EiffeI, em cuja benfeitorias [...]. É a consagração da fórmula de Darwin:o meio modifica a
empresa trabalhava. Inicialmente não de
monstrando interesse, EiffeI apresentou
espécie e a função criada o órgão".
depois o projeto como seu no concurso
organizado para construção de um monu Homem-símbolo de sua época, EiffeI foi o protótipo da audácia da engenharia
mento para a exposição de 1889. Como da fin de siècle. Expert na construção em ferro, trazia em seu curricuium di
diria Lemoine, na sua obra La tourdeMon- versas realizações que lhe haviam rendido notoriedade.'^ Prestigiado pelo re
sieur EiffeI (op. cit., p. 29), "Seu 'savoir-
gime,a proposta de EiffeP" foi a vencedora no concurso realizado pelo governo
faire' lhe permitiria materializar este am
bicioso projeto, seu gênio não está em ter francês com o objetivo de erguer um monumento para a exposição do cente
inventado a Torre, é a de haver realizado nário.
e de lhe haver dado seu nome".
A resposta de EiffeI foi mais além do que a defesa da beleza da torre ou de que
os princípios da estética não eram estranhos aos homens das ciências exatas.
Remontando ao renomado Vogüé, de indiscutível cultura, EiffeI contra-argu-
mentou que já era tempo de a França deixar de ser pensada apenas como o
país do divertimento, do prazer, dos cafés-concerto e do vaudeville, para ser
também a terra dos engenheiros e dos construtores que edificavam os monu
mentos da indústria moderna..
"Picard, Alfred. Exposition universel Inter- A particif^ação do Brasil, todavia, percorreu um caminho especial.
natlonal. Paris, 1889. Rapports du júri In-
ternational. Paris, Imprimérie National, Relatórios oficiais franceses^^ e brasileiros^® enfatizavam que o compareci-
1891.
mento do país na exposição parisiense de 1889 foi encorajado,desde o início,
"Sant'Atina Nery, F. J. Le Brésil en 1889. pelo imperador D. Pedro II, por políticos brasileiros e pela opinião pública.
Paris, Librairie Charles Delagrave, 1889.
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Entendia-se que o Brasil não poderia deixar de tomar parte neste "inventário
comparativo do globo" e demonstrar o seu adiantamento. Desde a primeira
vez em que o Brasil se apresentava no exterior, era possível dizer que o país
dilatara em muito o seu parque fabril e aperfeiçoara seus processos, podendo
ser assimilado à civilização ocidental... O velho sonho retornava e, com ele, Le Moniteur de l'Exposition. Paris, 25
mar. 1888.
os brasileiros retomavam as suas origens ultramarinas, sentindo-se participan
tes da espiral de progresso civilizatório da Europa Ocidental. O Auxiliador da Indústria Nacional. Rio
de Janeiro,Tip. Universal de Laemmert and
A utopia ia mais além nessa volta ao passado, resgatando tradições ê traços Co., 1889, V. LXII.
Sim,como não lembrar Pombal, que com o seu espírito iluminista realizava a
exposição de manufaturas nacionais em Oeiras, em 1755? A exposição de
Paris de 1798 nada mais fizera do que recordar o ato de Pombal,e a Inglater
ra, por seu lado, convertera estes ensaios num evento de caráter mais abran
gente, tal como o fora a exposição de 1851...
Da mesma forma em que se forjava um mito das origens industriais que fazia
o Brasil partilhar do processo de desenvolvimento científico e industrial euro
peu, procurava-se resgatar a contribuição dos imigrantes — estrangeiros, do
Velho Mundo — como o elemento que daria continuidade a este processo de
integração. Na visão empresarial, a imigração era associada muito mais ao
desenvolvimento da indústria do que a sua utilização como mão-de-obra nas
lavouras do café paulista.
Nesta saga industrial que construía a sua história, não faltaria uma galeria de
heróis, que davam nome às diferentes salas e partes da exposição. Compare
ciam Pombal, é claro, e o Visconde de Mauá, Irineu Evangelista de Sousa.
Esse tipo de visão ufanista era também capaz de entusiasmar uma classe ope
rária nascente, que via no fortalecimento da indústria a afirmação da sua pró
pria identidade e valor. Dessa forma,jornais operários trazem relatos de apoio
à participação brasileira no evento, no qual se esperava demonstrar a evolu-
190 Paris é uma festa; o "charme" da Odade-Luz
ção sofrida pela indústria nacional ao longo do tempo.'*'' A exposição não é,
pois, entendida como um espetáculo burguês de mascaramento das reais con
dições de trabalho, mas sim como uma afirmação da importância da indústria
e, por extensão, do próprio valor do contingente operário.
"O Brasil veio a Paris [...] para fazer constatar à Velha Europa que ele não é
indigno, por seus progressos realizados, de entrar mais largamente ainda
no conceito econômico dos grandes Estados [...] para nutrir mais solida-
mente os laços que o ligam à Europa [...]. Diziam que não éramos civiliza
dos. Não se conhecia do Brasilsenão o 'brasileiro de opereta', a febre amarela
e as cobras cascavéis!'
Por outro lado, o exemplo bem-sucedido dos Estados Unidos não era esqueci
do, e convinha fazer certas inter-relações:
"[...] Por sermos americanos do sul, nós não somos menos americanos, o
que quer dizer, práticos. [...] O gigante da América se desperta".'*^
"Países sem pressupostos e sem tradição, eles deram carta branca a seus
mandatários, que desta aproveitaram livremente. A maior independência
de estilo reina em todas estas construções que se acavalam nosjardins com
uma desordem cheia de graça e um delicioso capricho. Não são senão
cúpulas multicoloridas, telhados e torreões elevados que emergem do gra
mado numa decoração de fantasia. O ferro aí domina com suas cores ale
gres, o azul, o verde, o amarelo, o vermelho se aíse casam com o ouro em
combinações mais ousadas!'.
Com a presença do Presidente Carnot,o pavilhão brasileiro foi inaugurado em "Ibidem, tome 2, p. 215.
Entre o desideratum de ser e parecer moderno e o estereótipo da monarquia ^ Exposition Universeile de Paris. 1889.
tropical latino-americana, qual imagem teria prevalecido para a opinião fran Empire du Brésil. Catalogue Officiel, op.
cesa? cit, p. 116-7.
Ibidem, p. 160.
Generalizadas eram as apreciações entusiasmadas que reproduziam aquele
estereótipo. Admirava-se o "esplendor da vegetação tropical",®' com suas "ár ^0 Le Brésil en 1889, op. cit, p. 653-73.
vores prodigiosas", "concertos de pássaros", orquídeas, bananeiras, palmei
ras, a enorme vitória-régia, as pedras preciosas... Enfim, era um país que Cuide Bleu du Figaro et du Petit Journal.
"despertava delícias" ao lembrá-lo, com as suas "florestas com tigre, crocodi Paris. Exposition de 1889, p. 170.
los, macacos"...®^
"Revue de PExposition Universelle de
1889, tome 2, p. 347.
"[...] cidade curiosa, mas não é uma bela cidade. Poucos monumentos re-
marcáveis, ruas estreitas, mal pavimentadas, onde os carros saltam a cada
volta da roda e sacodem os infelizes viajantes. Em compensação, muitos
cantos pitorescos, divertidos. [...] Aqui entre nós, nada mais feio do que o
palácio imperial todo amarelo. Tratos? Bicoques? Igrejas?'Edifícios do
maior mau gosto, perturbadas por decorações à espanhola, carregadas e
sobrecarregadas de dourados. Na cidade,se encontram pouco mais do que
se desejaria de índios com roupas ignóbeis. [...] Toda a população do Rio
de janeiro parece, além disso, eternamente sem ter o que fazer. Se trabalha
[...]simplesmente para se ter o direito de se divertir. Eh!Por que se dar mais
trabalho? A terra é tão fecunda, dizem os voluptuosos: ela bem pode ali
mentar seus habitantes"
Era, pois, para o Estados Unidos, e não para a Bolívia ou o Paraguai, que
se dirigiam as palavras entusiasmadas de Varigny, na Revue des Deux Mon
des:
"Tudo aífala de uma raça Jovem, ativa, vigorosa, de um solo fértil, propício
ao europeu, de uma cultura inteligente e diante desta acumulação de maté
rias-primas^ diante dos produtos desta indústria à qual nossas conquistas
cientificar,'espalharam dispendiosas influências [...] se pergunta até onde
poderão ir os povos que iniciam assim".
"Ory, op. c/f., p. 84-5.
A Europa se via projetada no sucesso norte-americano, como co-participante
™Vangny,c. de. L'Amérique a 1'exposition pátria-mãe de uma nova e vigorosa nação,
universelle. In: Revue des Deux Mondes.
Paris, 19 out. 1889, p. 837.
Em pleno inverno, às vésperas do Natal, nova greve eclodiu entre os 140 tra
balhadores dos canteiros superiores da torre, que reivindicavam um aumento
de meio franco por hora de trabalho real, conseqüência da menor duração do
dia no inverno e também pelo perigo maior resultante da altura do edifício.®^
Sabe-se,contudo,que dessa vez EiffeI foi inflexível e não aderiu aos operários,
ameaçando despedir os que não voltassem ao trabalho.
° Ibidem, p. 53. A poucos anos do final da Guerra de Secessão, o problema racial que atingia
206 O ESPETÁCULO DA F(N DE SIÈCLE: DE ChICAGO A PaRIS, CHECANDO A PoRTO AlECRE
OS negros afluía com força,e o estereótipo se consolidava: inteligência reduzi
da,folgazão, incapaz de dominar a língua. Estava distante, portanto, do bran
co, anglo-saxão e protestante, protótipo de uma raça vitoriosa em que o gênio
inventivo e prático eram mais marcas registradas.
Uma das maiores atenções da exposição foi, contudo, o conjunto arquitetôni As charges do Worí&s Fair Puck(Chica
co global. O impacto foi realmente grande: uma seqüência de enormes edifí go, n.° 18, 4 set. 1893) mostrava o verda
cios brancos, num estilo semelhante ao clássico greco-romano,erguiam-se ao deiro atropelo de senhores respeitáveis, de
redor e ao longo de canais. O conjunto era entremeado de fontes luminosas, fraque e cartola, para assistir as noites ára
bes e os mistérios da vida no harém exibi
estátuas e colunas sobremontadas por águias imperiais.
dos na exposição....
The white city, the dream city, the magic c/ty foram algumas das designações Allwoods, John. The Great Exhibitions.
empregadas na época para o impressionante conjunto." London, Studio Vista, s. d., p. 92.
Edificado justamente para causar impacto, levava a pensar se o visitante se Como se pode ver nas publicações da
encontrava diante de uma nova Jerusalém, da Veneza dos doges ou da velha época:
Roma Imperial. Quem sabe ainda se a Grécia de Péricles havia sido transpor The Magic City. St. Louis, Historical Pu-
blishing Co., 1894.
tada para o Novo Mundo, por um passe de mágica? The Dream City. St. Louis, ND.Thompson
Publishing CO., 1893.
Na sugestão do Presidente Cleveland, parecia um mundo encantado criado
pela lâmpada de Aladim." Após encerrada a exposição, ela deixaria como Burg, David F. Chicago's White City of
herança um certo estilo para a construção de prédios públicos nos Estados 1893. The University Press of Kentucky,
Unidos, the White Citystyle.^^ s.d.
Official Cuide to the World's Columbian O interior do prédio, enfeitado com palmeiras, trazia uma profusão de pintu
Exposition. Columbian Cuide Co., 1893, ras históricas e paisagens brasileiras.^® Para o gosto norte-americano, as obras
p. 131.
de Pedro Américo e outros eram elogiáveis, embora para o padrão europeu a
TheMagic City. St. Louis, Historical Pu-
arte americana em geral fosse considerada naíf.
blishing Co., 1894.
A exibição do café sob o patrocínio dos comerciantes do produto, ocupava o
A History ofthe World's Columbian Ex hall central do edifício e nele não faltava a tradicional seção de oferecimento
position Held in Chicago in 1893, v. II, p. da bebida aos visitantes.
411.
Illustrated Cuide and Descriptive Cata
logue of the Exhibit of the Bureau of the
A mostra brasileira se fez presente em praticamente todas as seções. Natural
American Republics. Chicago, W. B. mente, o maior destaque cabia ao próprio café. O setor coureiro inovara com
Conkey Co., 1893. um grande globo terrestre feito de pedaços de peles de vários tipos, assim
como a seção de recursos minerais organizou sua mostra armada em pirâmi
Catalogue of th Brazilian Section at the de.®" Na opinião americana, o Brasil havia feito bela figura também no domí
World's Columbian Exposition. Chicago, nio da indústria têxtil, das máquinas e implementos agrícolas, artigos de couro,
1893. E. J. Campell, 1893.
Offícial Cuide to the World% op. c/f.
farmacêuticos e outros. Na distribuição final de medalhas, no cômputo geral
Photographic History of the World's Fair abarcando todas as categorias, o Brasil não ficara tão mal colocado: o país
and Sketch of the City of Chicago. Balti- obtivera 4^1 medalhas, contra 2.518 da Alemanha, 53 (!) da França, 838 da
more, R. H. Woodward and Co., 1893. Grã-Bretaíiha, 574 da Itália, 1.099 do México e 9.846 dos Estados Unidos.®'
The Book ofthe Fair, op. c/f., v. I.
A classificação norte-americana não era despropositada. Afinal, todo país que
Final Report of Executive Committee of
sediava uma exposição arrebanhava a maior parte dos prêmios. O Brasil, no
Awards'World's Columbian Commission.
Washington DC, Joh F. Scheiny Printer, caso, se apresentava próximo da Itália e na frente da França!
1895.
^ .'; '
juntamente com São Paulo e Rio de Janeiro, o Rio Grande do Sul se apresenta
va como um dos maiores centros onde se propiciava um surto industrial.
Opiniões lisonjeiras sobre o Brasil dadas pelos Estados Unidos nesse momento
não desvirtuam o sentido básico da exposição columbiana. Na escala evolu
tiva das raças e culturas, os latino-americanos não se encontravam bem si
tuados, mas o interesse econômico pelo maior país da América do Sul e a
possibilidade de ganhar espaços com o governo recém-instalado levavam a
uma opinião simpática. Mesmo porque o Brasil não era concorrente, e sim
mercado ou área de investimento.
"[...] os fabricantes desta massa fazem grandes fortunas e companhias por Gran Finale of the Stupendous Specta-
ações se instalaram para fabricação deste produto, desconhecido na Euro cular Success. Charge do: Worí&s Fair
pa, felizmente. Nada é mais enervante do que termos em casa ou ao lado, Puck, n.° 25, 30 out. 1893.
no trem, no bonde,indivíduos rudes,silenciosos, mascandosem parar,per
suadidos de que este exercício mecânico é excelente para o estômago e Revue des Deux Mondes. Paris, 1.° jun.
facilita a digestão". 1894, p. 579-611.
Seus organizadores pretendiam que ela fosse a síntese do século XIX, realizas
se um balanço das realizações e conquistas, determinasse a filosofia do sécu
lo. Ora, a filosofia ou a idéia-mestra continuava a ser a do progresso, que
subsistia ainda, embora o conteúdo pedagógico-científico tivesse sido sobre
pujado pelo sentido de show e de apelo à diversão. Neste fim de século, a
idéia de progresso se apresentava balizada pela fé no amanhã, que via no
Économiste Française. Paris, 7 dez. encerrar de um século de descobertas, invenções e avanços econômicos uma
1895, p. 29. conquista assegurada do futuro:
Calonne, Alphonse de. Revue des Deux "Esta fé, apanágio exclusivo de alguns nobres espíritos do último século,se
Mondes. Paris, 15 jan. 1895.
espalha hoje mais e mais: ela é a realização dos tempos modernos, culto
Lockroy Edouard. L'exposition de 1900.
fecundo onde as exposições universais tomam lugar como majestosas e
UÉcIair, 18 jun. 1895. In: Le Livre des Ex- úteis solenidades, como as manifestações necessárias da existência de uma
positions Universeiles, op. c/f., p. 107. nação laboriosa arrimada de uma irresistível necessidade de expansão. [...]
218 O ESPETÁCULO DA FIN DE SIÈCLE: DE ChICACO A PaRIS, CHEGANDO A PORTO AlEGRE
o ESPETÁCULO DA FIN DE SIÈCLE: DE ChICAGO A PaRIS, CHEGANDO A PORTO ALEGRE 219
Este sera o fim de um século de prodigioso desenvolvimento científico e
economico, este será também a soleira de uma era onde os sábios e os
filósofos profetizam a grandeza e do qual as realidades ultrapassarão sem
' dúvida os sonhos de nossa imaginação"
A fé no futuro expressa bem a forma pela qual a idéia-mestra do progresso se
apresentava no futuro como utopia—desejo generalizado de um mundo melhor
e rnais feliz — e como ideologia, ou forma intencional de socializar valores e
idéias desejáveis à ordem burguesa.
Paralelamente a tais princípios orientadores mais amplos,o nacionalismo fran
cês se via revigorado: mais uma vez Paris, a cidade-luz, se abria ao estrangei
ro para demonstrar a sua cultura e civilização, num momento marcante na
evolução da humanidade. Opiniões mais cívicas chegavam a lembrar que,
para os visitantes a exposição era mesmo um pretexto; na realidade. Paris era
o fim verdadeiro que mobilizava as multidões vindas do estrangeiro ou da
província."^
Defesa da exposição de 1900 feita pelo
Ministro do Comércio e Indústria Jules Mobilizada para superar o evento de Chicago,''^ a França preparou uma va-
Roche. Apud: Picard, Alfred. Exposition riadíssima gama de atrações.
universelle internationale de 1900 a Pa
ris; rapport général administratif et tech-
nique. Paris, Imprimerie National, 1902. Embora muitas opiniões convergissem para a idéia de que a exposição de
Tome 1", p. 8-9. 1900 não acrescentara quase nada às novidades exibidas em 1889, não há
como negar que certas inovações foram apresentadas e/ou popularizadas no
« Intervenção do Deputado Bouge, ses evento do fim do século.
são de 16 de março de 1896. Journal Offi-
ciel, 17 mar. 1896. Apud: Le Livre des
Expositons Universelles, op. cit. A bicicleta. Ia petite reine, encontrava a sua consagração e o automóvel triun
fava como a grande aplicaçãõ"dos motores de combustão interna. Ambos eram
"A opinião norte-americana que se gene vedetes da exposição, aos quais se acrescentava outra novidade: o cinemató-
ralizou é justamente esta: a França quise grafo.
ra imitar e(ou)superar Chicago. Consultar,
a propósito:
Insley, Edward. Paris in 1990 and the Ex
Apresentada pela primeira vez em 1895 pelos irmãos Lumière, de Lião, no
position. Harper's Monthly Magazine, v. subsolo do,^rand Café, situado na região dos grandes boulevards de Paris, a
Cl. sp. 1900, n. DCIV, p. 485-97. invenção hávia produzido espanto e reflexão. Os jornais não cansavam de
Handy, Moses P. The Paris exposition of exprimir opiniões sobre esse novo aparelho, que captava não apenas o movi
1900. Munsey's Magazine, 20(1):90-9, mento, mas a própria vida:
Oct. 1898.
Douglas, James. The Paris Exposition. VIII.
In: General 'The Nation 71", 1035: 168- "A beleza da invenção reside na novidade e engenhosidade do aparelho.
9, 30 Aug. 1900. Quando estes aparelhos forem liberados ao público, quando todos pude-
220 O ESPETÁCULO DA RN D£ SltCLC: DE ChICACO A PaRIS, CHECANDO A PORTO AlEGRE
P;
ti» EXPOSITIOr
190
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rem fotografar os seus que lhe são caros, não mais na sua forma imóvel,
mas em seu movimento, na sua ação, nos seus gestos familiares, com a
palavra na ponta dos lábios, a morte deixará de ser absoluta"
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o espetáculo da FtN DE SltCi.E: DE ChICACO A PaRIS, CHECANDO A PORTO AlECRE 223
Os novos "prédios da exposição", que deveriam abrigar as diferentes seções
da feira, apresentavam,contudo, uma diferença marcante com relação a 1889:
o ferro cedia lugar ao estuque, ao gesso e ao cimento armado, e os engenhei
ros aos arquitetos.^"
"Russel, Charles E. Munsey Magazine,24 Mas o Brasil deixou de comparecer a esse espetáculo de fin de siècle. Sinais
nov. 1900, p. 164-84. das primeiras superproduções do café, que levariam a uma reviravolta da po
lítica com relação ao produto e a um recuo da linha financeira adotada desde
"Schopier. Amusements of the Paris Ex- o Encilhamento? Sintoma do saneamento financeiro?
position. The Century Magazine. 60 (4-5),
Aug.-Sept. 1900.
O certo é que o Brasil não se fez representar entre os expositores do evento, o
Mattox, Capitain, A. H. Sights of the Pa
que, contudo, não deixou de fazer com que, no país, tivesse lugar uma expo
ris Fair. Munsey'sMagazine, n." 22, p. 784- sição fin de siècle.
91.
Razões de natureza ideológica não lhe faltavam para justificar esse espetáculo
de modernidade no sul do país. Apoiado numa matriz de orientação política e
administrativa de origem positivista, o governo estadual rio-grandense tinha
bem presentes as noções do progresso como uma meta e da manutenção da
ordem como o pressuposto da evolução desejada. Os jovens e radicais repu
blicanos que haviam assumido o poder com o novo regime caracterizavam-se
pela sua feroz militância partidária. Defensores da república, essa forma de
governo era para eles, tal como para muitos outros republicanos do centro sul
do país, um regime moderno, civilizado e capaz de responder às exigências
de uma ordem econômico-social em transformação num momento de transi
ção para a economia capitalista.
O progresso não era apenas desejável, mas era um dos elementos constituti
vos da realidade. Era a força evolutiva que conduzia a humanidade por está
gios sucessivos de aperfeiçoamento tecnológico e moral.
Ante o que chamava "uma crise geral" que atravessava o país, com o café
enfrentando a superprodução e a nação com um todo suportando os efeitos da
política de saneamento financeiro, com a conseqüente deflação e desempre
go, o Rio Grande do Sul postulava para si uma posição diferenciada inaugu
rando com brilho a sua exposição do fim do século.
Por que ser tributário do estrangeiro, como o café?®® A vinculação que o Rio
Grande,"celeiro do país", pretendia estabelecer com o contexto internacional
não era outra senão a dependência de mercados e capitais, mas o oferecimen
to de oportunidades a investidores e a imigrantes. No Rio Grande,o processo
imigratório fora diferente e não convertera os colonos em assalariados da la
voura: no sul do país, eles eram proprietários.®'
"Os habitantes do Brasil são racialmente diferentes, conforme as latitudes A Federação. Porto Alegre,8 mar. 1900.
em que vivem e a mistura da raça de que são os produtos. As condições
sociológicas e climatéricas são tais que as raças saxônica, teutônica e célti- Ibidem, 19 fev. 1901.
ca não podem prosperar no norte do Brasil; é muito diferente, porém, nos
estados do sul do Brasil. Aí há vigor e energia. Nos estados do nofte, espe- Ibidem, 2 fev. 1901.
Mantendo estreitos laços com os líderes políticos do estado, não foi sem sen
tido a presença do corpo consular dos Estados Unidos na inauguração festiva
da exposição em fevereiro de 1901. Localizada nos prédios da Escola de En
genharia e da Escola Benjamim Constant, destinados à preparação da elite
técnica e da mão-de-obra qualificada para a indústria, a exposição estadual
foi aberta ao som da marcha da exposição,em estilo wagneriano e da autoria
do maestro Araújo Viana.
"É realmente animador o exemplo que vem dar o Rio Grande enfrentando
corajosamente a tremenda crise que assoberba o nosso vasto país, promo
vendo em quadra de tamanha calamidade a significativa festa que tanto
honra os seus promotores e imediatos executores! Quando os demais esta
dos da União, desalentados e convulsionados pelas paixões políticas, apre
sentam o mais triste quadro de decadência e alguns, dizemos, mesmo de
A Federação. Porto Alegre, 24 maio dissolução moral,é um conforto para a alma nacional o exemplo dignifica-
1900.
dor que, aos olhos da nação, apresenta o extremo sul, promovendo e exe
cutando bizarramente uma exposição que nos coloca em grau de
Ibidem, 30 maio 1990.
relatividade, a par dos mais cultos países do mundo"."
O Independente. Porto Alegre, 3 mar.
1901. Na verdade, não se tratava de uma exposição nacional ou universal. O evento
228 O ESPETÁCULO DA FIN DE SIÈCLE: DE ChICAGO A PaRIS, CHEGANDO A PORTO AlEGRE
mesmo se colocava à revelia de uma crise nacional, ressaltando o avanço do
Rio Grande em relação às demais unidades da federação. O Rio Grande,sem
modéstia, pretendia condensar a civilização de uma época na sua exposição
da fin de siècle."
Desse modo, o Rio Grande apresentava também o seu "Pavilhão das Máqui
nas" e procurava exibir o cuidado que o governo de orientação positivista
nutria pela questão tecnológica e pelo ensino profissional, alicerces do pro
gresso, bem como o espírito empreendedor do seu empresariado.
PROVO GRÁFICA
TEL.; (011)418-0522
ERRATA DA AUTORA
45, 14 "Como missão manifesta, elas objetivam "Como missão manifesta, elas objetivam
informatizar, explicar, inventariar e" informar, explicar, inventariar e"
52, Ia 3 "A exposição está para a feira internacional "A exposição está para a feira internacional
aquilo que o museu está para a galeria assim como o museu está para a galeria
marchande para o objeto de arte. comercializadora do objeto de arte.
Ela o põe em glória, não em venda. [...] Ela o põe em glória, não em venda. [...]
Ela se coloca para oferecer à produção Ela se dispõe a oferecer à produção técnica
técnica seu cerimonial e" seu cerimonial e"
74, 6 e 7 "transparência do uso do vidro. Com 564 "transparência do uso do vidro. Com 564 metros
metros de altura por 124 metros de largura" de comprimento por 124 metros de largura"
127, 11 "e dos Estados Unidos, substituírem por "e dos Estados Unidos, substituírem por
tudo as escadas tão penosas de montar" tudo as escadas tão penosas de subir"
212, 1 "figura da mulher. O Palácio das Mulheres, "figura da mulher. O Palácio das Mulheres,
com seus painéis pictóricos à mulher" corn seus painéis pictóricos dedicados à mulher"
SANDRA JATAHY PESAVENTO é professora titular de História do Brasil no
Departamento de História, Curso de Pós-Graduação em História e do Curso
de Pós-Graduação em Urbanismo e Planejamento Urbano da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul. Doutora em História pela Universidade de São
Paulo, com dois pós-doutorados na École des Hautes Études en Sciences So-
ciales de Paris, realizou estágios no Smithsonian Institute, em Paris VII e em
Cleveland, Ohio, além de ter ministrado cursos em Leiden (Holanda), Poitiers
(França)e várias palestras na França, Holanda, Bélgica e Alemanha. É pesqui
sadora I.A. do CNPq,onde vem desenvolvendo projetos em História Social e
Cultural Urbana. Autora de ensaios e de artigos, e de mais de vinte livros entre
os quais:
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ISBN 85-271-0402-4
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9 788527"104029' I ■, I
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