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Adrián Gorelik
Via a interpretação de dois acontecimentos na cidade de Buenos Aires, discute a cate-
goria espaço público, apontando o papel do Estado e seus níveis de comprometimento
com a comunidade, em que ora prevalece sua ausência diante de prerrogativas essen-
ciais como a segurança, ora sua presença de caráter democrático na construção de um
“estado de bem-estar”. Esses exemplos ilustram as condições que essa categoria pode
inserir nos fenômenos culturais urbanos e na criação de identidades coletivas, presen-
tes na dialética do espaço público com a memória, a ação política, as estratégias mer-
cantis, a idealização do convívio entre os indivíduos e a cidade.
Espaço público; cultura e sociedade; políticas urbanas.
Para os urbanistas, o tardio redesco- sar que o apelo ao espaço público é decisi-
brimento das virtudes da cidade clássi- vo na mudança de representações da cida-
ca no momento de sua imposibilidade de, entre os anos 90 e hoje, quando a ima-
definitiva pode ter sido o ponto de não- gem da “cidade dos negócios” e os
retorno, o momento de sua descone- esplendorosos megaempreendimentos já
xão fatal, o motivo de desqualificação. não gozam de boa reputação. Assim como
Hoje, eles são especialistas em dores nos anos 90 Buenos Aires encontrou seu
fantasmagóricas: doutores que discutem “postal” em Puerto Madero, hoje, se tivés-
as complicações médicas de uma ex- semos que eleger um postal que encarnasse
tremidade amputada. os imaginários em voga, deveríamos esco-
Rem Koolhaas2 lher alguma imagem de Palermo Viejo, re-
presentado como o bairro tradicional recu-
I - Nos anos 80 do século 20, depois de perado para a intensidade dos usos contem-
muito tempo de ausência nos vocabulários porâneos, porém sem perder seu encanto
cultural, sociológico, político ou urbano, o bucólico, como distrito de festa e design, cujo
espaço público converteu-se em categoria extraordinário sucesso imobiliário e comer-
oniexplicativa e, sobretudo, operativa, e as- cial parece reconciliar a cidade – frente ao
sim continua até hoje. É notório, por exem- megaempreendimento de enclave típico dos
plo, que na Buenos Aires que atravessou a anos 90 – com o espaço público do bairro
crise em 2001 e 2002, e hoje parece assistir de classe média que aquelas políticas leva-
a um novo boom urbano, a categoria espa- ram ao perigo da extinção.
ço público continua funcionando como nos
anos 80 e 90, tanto para interpretar os fe- O sucesso dessa categoria nota-se no fato
nômenos da cultura urbana, do circuito tu- de, desde os anos 80 até hoje, ela continuar
Fotos de Tomas de
Isaías Garde
rístico-tanguero3 até as Gallere nights, como a ser a preferida não apenas no universo
Fonte: 5.1 Megapixeles Factor para fundamentar as ações do governo so- cultural e acadêmico, mas também junto aos
Serpiente fotos, http://
factorfotos.blogspot.com,
bre a cidade, como se vê nas mais recentes governos municipais e, o que é mais signifi-
Buenos Aires, Argentina transformações centrais. Poder-se-ia até pen- cativo, entre os grupos empresariais para
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liares e reabrir o trânsito, a rua continua recer o tradicional uso popular da costa, ilus-
ocupada pelo santuário informal, que fun- trando o velho ideal do século 19 que con-
ciona não apenas como lugar de peregri- siderava o parque o espaço público
nação e memória, mas como evidência do democratizador por excelência, a “nova ca-
lugar que ocupam os afetados diretos tedral” da cidade moderna, em que a comu-
diante da ausência do Estado, como nidade se encontra e se reconhece, em que
materialização política desse vazio de repre- os indivíduos, iguais pelo efeito do sol e da
sentação, a cicatriz urbana da crise. natureza cultivada, convertem-se no público
crítico da modernidade. Não é secundário
A segunda cena é a o Parque Micaela no projeto a participação de um dos princi-
Bastidas, em Puerto Madero, um espaço re- pais criadores de toda a operação Puerto
cente na zona mais nova da cidade. Esse Madero, o qual, contra toda evidência, sem-
parque foi assinalado como verdadeiro acer- pre apoiou o caráter popular e progressista
to no desenho de parques e, muito mais do do empreendimento: talvez se deva enten-
que isso, como reapropriação pública da der esse parque como uma espécie de
zona modelo da cidade dos anos 90. Frente revanche do “planejamento estratégico” com
à cristalização do Puerto como enclave ex- relação às vozes agoureiras.7
clusivo de negócios e turismo de alto pa-
drão, o bairro mais moderno e caro de Os exemplos são um pouco infelizes. Pode-
Buenos Aires, o parque aparece como equi- ria escolher outras oposições, como a que
pamento sofisticado, mas voltado para favo- se produziria entre uma interrupção de ruas
por uma das tantas assembléias vicinais de
2002 – quando funcionaram como a
encarnação da nova política, e se organizou
todo um turismo político para relevar, in situ,
o último grito da temporada de rebelião con-
tra o “Império”– e o acordo da tradicional
Avenida Corrientes, cujas calçadas foram
ampliadas como parte de uma série de in-
tervenções recentes na área central, de acor-
do com um discurso oficial que apela, como
dissemos, para o enaltecimento do espaço
público. E também casos de qualquer outra
cidade, latino-americana ou não, como a Ci-
dade do México, mostrando uma rua do
centro histórico recém-“recuperada”, com
seus pavimentos reluzentes e suas fachadas
elegantes, e o quarteirão seguinte ainda
ocupado pelo tumulto da venda ambulante
(um bom teste para os imaginários urbanos
do México: diante dessas duas imagens, es-
colha qual sugere melhor a idéia de espaço
público). Minha intenção aqui, entretanto,
não é voltar a determinar uma tradicional e
maniqueísta oposição entre “a cidade das
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festações políticas, mas também quando a ção burguesa e, sobretudo, no qual se reali-
arte moderna busca sua ligação com a “vida”, za a conversão de toda a vida urbana em
ocupando a rua, estamos na presença de um circulação, mostrando não a dialética implí-
espaço público em ebulição, que não se pro- cita entre o mercado e o espaço público,
põe articular o social, mas pôr em evidência mas o caráter exclusivo e irredutivelmente
as múltiplas fraturas entre a sociedade, o mercantil da metrópole moderna.
espaço e o tempo.
Não quis alimentar uma imagem simplifica-
A segunda acepção do espaço público, por dora das relações entre teorias do espaço
sua vez, nos obriga a alguns matizes e a dife- público (em termos sociológicos, históricos
renciações internas. A definição do espaço e políticos) e modelos urbanos de referên-
público burguês clássico sem dúvida remete cia: precisamente, como “categoria-ponte”,
a Habermas. É muito freqüente, entretanto, o espaço público não tem resolvido – não o
que ela seja tomada de modo frouxo para poderia ter – seu nó teórico fundamental, a
analisar a cidade do século 19 e até do 20, e relação que estabelece, implicitamente, en-
é ali que aparece o problema adicional ao tre forma urbana e política. Não acredito,
conflito de interpretações, a violação da teo- porém, distorcer muito essas teorias quan-
ria habermasiana. Já que Habermas teorizou do noto que certas imagens e modelos ur-
o momento de emergência dos espaços de banos operam nelas e a partir delas, produ-
publicidade da burguesia no século 18, e para zindo conseqüências nas diferentes concep-
ele sua potencialidade política já entra em ções do social e do político que se podem
decadência desde o século 19, com a pro- fazer notar nas práticas espaciais e nas políti-
gressiva identificação das esferas política e cas urbanas contemporâneas.
social a partir do crescimento do que logo
será chamado de Estado assistencial – o du- A esquematização das cidades e dos espa-
plo processo de socialização do Estado e a ços dessas três posições, além do mais, re-
estatalização do social, que produz, para essa presenta graficamente o caráter conflitivo das
conceitualizações mais habituais entre os
acepção, a extinção dessa brecha de auto-
especialistas urbanos que, quando se refe-
nomia da sociedade frente ao Estado que
rem ao espaço público, operam a partir de
precisa do espaço público para sua existên-
suas próprias tradições, incorporando des-
cia; brecha que já não se recuperará mais na percebidamente novos esquemas oscilantes
cidade da indústria, das massas e do consumo. entre uma visão comunitária, como aquela
Assim, já temos, na verdade, três posições clássica de Lewis Mumford, que buscava re-
cuperar um espaço “orgânico” inspirado na
com seus respectivos modelos urbanos: a
praça medieval – uma idéia de espaço públi-
primeira (arendtiana) cujo modelo urba-
co que o espaço público moderno destruiu,
no de espaço público é a ágora da pólis
e que remete a uma sociedade fechada, em
clássica; na segunda (a de Habermas) es- que domina a ação coletiva contra qualquer
tão os espaços do salão aristocrático ou o idéia de indivíduo e de racionalidade projetual
café ilustrado do século 18 (espaços em que –, e uma visão societal, como a que produz
nasce a crítica burguesa); e na terceira posi- o pós-modernismo em sua recuperação da
ção (a extensão indevida da hipótese cidade do século 19.11
habermasiana), o modelo urbano é o
boulevard do século 19, o espaço público Essas duas visões instaladas no imaginário
no qual a noção ilustrada de representação arquitetônico e urbano se dissimulam de
parece transformar-se em auto-representa- maneira complexa nas noções teóricas e têm
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E em textos menos conhecidos, mas não não supõe negar as transformações das quais
menos significativos, nos quais todos esses busca dar conta o autor do artigo; o proble-
temas da moda se transformam em vulgata, ma é saber se incorporá-las à força ao mo-
a confusão e a mescla chegam a níveis de delo teórico-político-urbano do espaço pú-
absoluta improdutividade. Tomo um deles, blico ajuda a entendê-las. E, para coroar esse
muito recente, produzido no contexto aca- mal-entendido, o autor passa, quase sem
dêmico das universidades norte-americanas solução de continuidade, a denunciar a trans-
e utilizado como introdução para um livro formação dos espaços públicos em “não-lu-
oficial sobre as propostas para o espaço gares”, usando outra categoria de muito êxi-
público do governo da cidade de Buenos to, que rapidamente passou do jargão aca-
Aires, porque demonstra, ao mesmo tem- dêmico para o da imprensa, desconhecen-
po, o modo banal em que veio funcionando do o fato de que a noção de “lugar” utilizada
a categoria de espaço público como ponte por Marc Augé é antropológica, enqüanto a
possível entre a reflexão crítica e as políticas de espaço público é política.17 Ou seja, ambas
públicas. Já no começo, na mesma frase ini- as categorias servem para pensar questões
cial em que respalda sua noção de espaço completamente diferentes nas relações ci-
público na teoria de Habermas (transmitida dade/sociedade. Forçadas a estar lado a lado,
com “piscadas de olhos” entre especialistas), caberia a princípio considerar que a própria
o autor sustenta que a mais drástica das trans- emergência do espaço público moderno (ao
formações urbanas atuais é “a modificação menos na definição habermasiana, a qual,
substancial do espaço social devida à apro- como vimos, o autor alude) supôs o cance-
priação do espaço público por mãos priva- lamento histórico da idéia de lugar, já que o
das”,16 o que respalda a contundência crítica espaço público necessita para seu desenvol-
de seu título: “El asalto al espacio público”. vimento da existência de uma sociedade de
Habermas, entretanto, não afirma que só indivíduos sem vínculos, rompidos com a rela-
existe espaço público quando pertencente ção identitária entre o lugar e a comunidade.
à sociedade civil, ou seja, a mãos privadas,
para defendê-las, justamente, do assalto do III - De todo modo, não é propósito deste
Estado? Assinalar essa contradição teórica trabalho “elucidar” a partir da teoria a con-
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fusão reinante em nossas noções sobrepos- publicava-se Vida e muerte de las grandes
tas de espaço público, mas apenas tentar ciudades, de Jane Jacobs,19 livro que encarnou
entender como funcionaram as diversas re- a proposta de recuperação da vida buliçosa
presentações de espaço público, como ope- da rua de bairro frente a negação da urba-
ram na cidade que se transforma diante nos- nística modernista; e se recordamos que o
sos olhos. O particular da conjectura dos arco condutor da obra de Kevin Lench20 à
anos 80, em que a categoria surge e se afir- de Aldo Rossi – ou seja, da morfologia e da
ma, é que nela pareceu coincidir uma idéia semiologia urbanas para a arquitetura da ci-
de cidade, arquitetura, política, sociedade e dade – descreveu-se completamente entre
cultura urbana que surgia dessa articulação. finais dos anos 50 e a primeira metade dos
Cada uma dessas perspectivas iluminava a 60, podemos advertir que a crise do mo-
noção de espaço público e por ela se deixa- dernismo que se fez evidente em meio à
va iluminar, dando-lhe matizes diferenciais bem-sucedida modernização do pós-guer-
porém complementares, no típico movimen- ra, já havia produzido uma série de refle-
to centrífugo que se produz no momento xões que eclodiriam à margem do debate
de elevação de uma categoria, quando tudo dos especialistas, 20 anos depois.
parece provar sua capacidade teórica e instru-
mental. Esse foi o romance do espaço público. Explica-se, assim, a coexistência nos anos 80,
como agentes ativos na exaltação da cultura
A conjuntura foi apelativamente internacio- urbana, dos debates diferentes do espaço
nal (ao menos no Ocidente), embora, como público e do modernismo/pós-modernismo:
sempre sucede, em cada lugar se modula- fontes diversas, problemáticas diferentes,
ram diversas problemáticas e diversas inter- articuladas em uma série de tropos tanto de
pretações do espaço público. Poder-se-ia debilidade quanto de hospitalidade teórica:
dizer que foi o resultado de crise tripla: do como o êxito, por exemplo, da figura do
socialismo, do Estado assistencial e (comple- flâneur. E, por último, cabe não esquecer a
tamente contingente em relação às anterio- peculiar torsão instrumental realizada em
res) das ditaduras sul-americanas, que con- ambos os debates, já que as fontes neles
fluíram na disposição comum de discutir as privilegiadas esquivam-se de favorecer o
tendências totalitárias do Estado, colocando dominante enfoque entusiasta. Como já
em primeiro plano a “sociedade civil”. De mencionado, tanto Arendt quanto Habermas
modo que a categoria espaço público, re- são taxativos a respeito da irreversível “de-
cordada apenas pela tradição liberal anglo- cadência” do espaço público, por usar a fi-
saxônica e trabalhada por figuras como gura de outro autor do período, Richard
Arendt ou Habermas entre os anos 50 e 60, Senté,21 que tampouco é otimista – no que
a partir de preocupações filosóficas típicas pesa a seus reiterados, e sempre agudos, in-
desse período como a “multidão solitária” – tentos de pensamento operativo para o res-
para recordar a célebre fórmula de David gate de formas de espaço público na cidade
Riesman18 –, converteu-se na chave para contemporânea.22 E até Marshall Berman,
recente reconsideração da esquerda do pro-
por otimista que seja, encontra no século
blema democrático, fazendo empenho em seu
19 uma armadilha dialética de fatores de
chamado à reativação política da cidadania.
altíssima produtividade que o século 20 se
Na verdade, no debate urbano e teria esmerado em arruinar. Então, para to-
arquitetônico produziu-se defasagem tem- dos esses autores de referência nos anos 80,
poral similar: se pensamos que em 1961 o espaço público funciona, mais do que um
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modelo aplicável, como ferramenta de críti- – espaço público – sociedade civil – merca-
ca do presente à luz de momentos fatalmen- do: foi uma avaliação do liberalismo que in-
te perdidos – uma espécie de figura “utópi- seriu a reflexão sobre o autoritarismo na
ca”, como em um dos possíveis sentidos com Argentina no curso de um vasto movimen-
que Baczko23 interpretou o livro de Moro. to político-intelectual mundial que buscava
encarregar-se da crise do socialismo. Natu-
Analogamente, também a celebração da ci- ralmente, todo esse processo de descobri-
dade produzida pelo debate modernismo/ mento do espaço público não pode despren-
pós-modernismo encontrou apoio em po- der-se da experiência de ocupação do es-
sições como as de Georg Simmel ou Walter paço público urbano no final da ditadura e
Benjamin, desentendendo-se do humor trá- começo da democracia, em combinação –
gico no qual interpretaram a metrópole mais arendtiana do que habermasiana – de
como chave da modernidade capitalista (uma artes (teatro na rua, recitais massivos, arte
idéia de modernidade na qual se deve ler, urbana) e política (os protestos dos organis-
como assinalou Jedlovske,24 a consciência mos de direitos humanos, de modo muito
pessoal desses autores sobre a crise da cul- especial), em que a celebração urbana de-
tura ocidental). mocrática parecia contestar, nos aconteci-
mentos, a obsessão da ditadura pela limpe-
IV - No caso de Buenos Aires, as primeiras
za e a ordem na cidade.
reflexões sobre o espaço público se realiza-
ram no final da ditadura, no correr dos anos Esse caminho de valorização do espaço pú-
80. As interpretações de Habermas susten- blico, como categoria política e como pro-
taram assim uma visão das relações entre tagonista da transição democrática, teve,
Estado e autoritarismo, produzindo uma porém, como correlato a recuperação de
nova imaginação histórica de forte impacto um espaço urbano como protagonista: o
nos modos de pensar a cidade. Houve bairro popular. Essa foi nossa particular mo-
redescobrimento quase tocquevilliano do dulação do romance do espaço público que
associacionismo bairrista dos anos 20 e 30 se entoava em todas as partes. A modula-
(quando floresceram em Buenos Aires as so- ção foi muito idiossincrática de Buenos Aires
ciedades de fomento, as bibliotecas popula- – nessa cidade, o bairro popular também o
res e toda uma cultura popular bairrista, for- é. Porém convém recordar, simplesmente
mando as bases para a extensão da peculiar para notar como esses temas vão tomando
classe média portenha), identificando nessas corpo em diferentes locais de forma
instituições “ninhos da democracia”: espaços deslocada – ou seja, determinando proble-
públicos de resistência e transmissão de uma mas aparentemente similares, embora a par-
“democracia à espreita” em tempos de auto- tir de situações completamente diferentes –,
ritarismo.25 A reflexão sobre o autoritarismo que, ao mesmo tempo, o bairro assumia-se
produzia reivindicação otimista dos proces- como protagonista decisivo no processo de
so próprios da sociedade frente ao Estado e renovação de Berlim Ocidental, emblema de
revalorização – completamente recente na um novo “urbanismo do pequeno” na déca-
cultura progressista argentina – da classe
da de 1980. E que, em meados dessa déca-
média como sociedade civil por excelência.
da, o efeito do terremoto no México tam-
A aceitação política do horizonte da demo- bém se traduziu em uma nova onda de rei-
cracia liberal implicava, como conseqüência vindicação da participação popular nos bair-
lógica, a adoção da corrente teórica estado ros, que apareceram como espaço liberado
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pelo tradicional bairro de San Telmo (extre- De toda forma, a noção de gentrificação não
mamente protegido por restrições legais). E parece de fácil aplicação nesse caso, uma vez
em Palermo se encontraram com o plus da que, apesar do explosivo sucesso comercial
idéia de “bairro”, como meio ambiente ur- associado ao design e à cultura juvenil, não é
bano ideal que sintonizava com aquele fácil reconhecer uma mudança no conteúdo
redescobrimento das leituras históricas e po- social do bairro. Em todo caso, se algo pare-
líticas da cidade e da cidadania. De modo cido com a gentrificação ali ocorreu, foi nos
que um novo tipo de programa arquitetônico anos 80, quando começaram a chegar os
(a restauração historicista da moradia indivi- primeiros arquitetos para comprar casas e
dual frente à paixão modernizadora pela mo- restaurá-las; mas, tampouco chegaram a pro-
radia coletiva das décadas anteriores), co- duzir grandes alterações no meio social. Na
meçava a se articular com um tipo de ope- verdade, é difícil encontrar ainda hoje pro-
ração urbana (o “urbanismo do pequeno”, cessos de gentrificação estritos em Buenos
frente às fáusticas operações da planificação Aires: não existiu nos casos de transforma-
tradicional) e com o tipo de relação cidade/ ção radical, como Puerto Madero, porque à
sociedade civil que propiciava a categoria “es- diferença do ocorrido no Porto de Londres,
paço público”, fechando o círculo. Palermo não havia aqui população para desalojar – e
foi vanguarda nessa idéia de espaço público essa ausência de conflito potencial foi um
bairrista e também seu exemplo mais bem dos principais acertos da escolha de Puerto
sucedido, a ponto de, incluído na atual frivo- como foco de transformação “estratégica”
lidade generalizada do “boom de Buenos da cidade; experimentou-se e fracassou no
Aires”, preservar-se em algumas respostas Abasto; e agora se está experimentando em
originais e eficazes à miséria urbana, como alguns pontos seletos de Barracas com a aju-
as que vem realizando desde 2001 a Socie- da das exposições de desenho da Casa
dade de Fomento de Palermo Viejo com a FOA.26 O modo da transformação urbana e
cooperativa de catadores de papel El Ceibo, social em Buenos Aires continua, no entan-
cujo plano piloto de reciclagem foi tomado to, presidida em grande medida pelo
pelo governo da cidade como modelo para paradigma da renovação, mais do que da
um recente plano de coleta de resíduos. revalorização patrimonial. A grande mudan-
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ça atual, quanto a essa modalidade principal, das nas transformações de Berlim e Barce-
é que, se a cidade sempre acompanhou com lona (modelos emblemáticos da concepção
transformações gerais a estendida mobilida- societal-pós-modernista que mencionáva-
de da sociedade, hoje essas transforma- mos); especialmente Barcelona, já que, com
ções assumem a forma da incorporação os responsáveis por sua gestão, se iniciou na
interiorizada no que os fragmentos sobrevi- democracia forte relação de intercâmbio
ventes daquela mobilidade se autocontêm técnico e ideológico. Na verdade, desde
e buscam recortar sua diferença. então, se produz ao longo da década de 1990
um verdadeiro modelo “de exportação”, de
É certo que o fenômeno de Palermo Viejo forte impacto em toda a América Latina:
também poderia ser pensado como a esco- assim funciona o “planejamento estratégico”.
lha consciente de um setor da classe média Trata-se de modelo urbano que propõe as-
que nestes últimos anos opta por formas de sumir os limites da gestão pública e aceitar a
desfrute da cidade frente às opções mais dimensão mercantil do território metropoli-
generalizadas nos anos 90 de condo- tano, incorporando francamente os capitais
mínios fechados, do consumo protegido do privados à reforma urbana, concebida de
shopping, com suas promessas de seguran- modo fragmentário, como peças urbano-
ça e isolamento, e assim está funcionando arquitetônicas que enfatizam a capacidade
nas representações atuais de Buenos Aires. da forma arquitetônica tanto no plano das
Mais além dessa valoração, entretanto, necessidades identitárias da cidadania como
Palermo Viejo está demostrando duas coi- no valor de commodities dos edifícios e lo-
sas. A primeira se percebe ao percorrer so- cais urbanos. Tudo isso temperado por um
zinho o bairro, entrando e saindo de um novo rol da arquitetura “de marca” como
boliche com design, uma livraria ou um res- dinamizadora das mudanças urbanas, cujo
taurante fashion dos que se amontoam qua- exemplo paradigmático nos anos 90 foi o
dra a quadra: não pode haver espaço públi- Museo Guggenheim de Bilbao. (Decerto, há
co em um setor urbano produzido como que estudar as relações existentes entre essa
cena de Townscape, de Gordon Cullen, tão recuperação de uma urbanística do século
bonita quanto artificial. A segunda tem a ver 19 e a reaparição de uma figura típica da
com comprovação mais geral sobre o funcio- modernização urbana de finais do século 19
namento desse bairro em meio a uma me- e começo do 20: o especialista internacio-
trópole fraturada: o que se percebe é o fra- nal, contratado pelos governos municipais
casso do discurso típico dos anos 80 sobre latino-americanos para desenvolver seus pla-
a reativação do espaço público mediante nos urbanos com as idéias que se demostra-
planejamento da “cidade por partes”, que foi ram bem-sucedidas em sua cidade de origen.)
a modulação urbanística daquele otimismo
social e político sobre o espaço público e Não me deterei aqui na descrição do pro-
seu lugar de encarnação, o bairro popular. cesso que se desenvolveu nos anos 90 e que
muitas vezes se identifica com a simplificadora
Como se sabe, a idéia da “cidade por par- noção de globalização – creio que se deve-
tes” rejeita o dominio da planificação, quan- ria pensar que as dinâmicas econômicas e
titativa e metodológica, para recuperar a territoriais que haviam acelerado os proces-
pequena escala de intervenção qualitativa e sos de fragmentação social e espacial em
revalorizar a trama urbana tradicional. Eram Buenos Aires se comprendem melhor à luz
idéias que propunham recuperar as qualida- de lógicas locais. Simplesmente, convém re-
des clássicas da cidade do século 19, inspira- cordar que, no processo de abertura eco-
200
nômica e desmantelamento do Estado, os brepor à exausta estrutura urbana de Buenos
fragmentos urbano-arquitetônicos que se Aires um sistema completamente novo, de
pensavam como dinamizadores da cultura incorporações e vias expressas, que aceita-
urbana e da dinâmica social, motores do es- va como irremediáveis as diferenças urba-
paço público e originários de um modelo nas e sociais decorrentes da decadência do
flexível de cidade, mais vinculados com as modelo tradicional – e, portanto, as
demandas e iniciativas da sociedade civil do potencializava. Essa vontade desacelerou-se
que com a vontade fáustica do Estado, com a crise, mas a atual decolagem imobiliá-
demostraram não funcionar de acordo com ria – um dos setores mais dinâmicos da eco-
seus modelos originários, mas como incor- nomia do boom – concentrando-se nova-
porações recortadas contra um fundo de mente no tipo de empreendimentos de in-
decadência, espelhos dos processos de con- corporação característico daqueles anos:
centração que resultavam completamente bairros privados, torres-country e até os
funcionais como recurso para a entrada no megaempreendimentos que haviam perma-
mercado daqueles setores da cidade e do necido em suspenso (como Retiro ou as
território que supunham vantagens diferen- ampliações de Puerto Madero), mostrando
ciais para o desenvolvimento de grandes que a crise atuou como cristalização das fra-
negócios privados. Ou seja, a ideologia da turas sociais e urbanas sobre as quais pros-
“cidade por partes” mostrou-se funcional perou aquele modelo de cidade, sem ne-
para o resultado da “cidade arquipélago”, e nhuma medida pública à altura do desafio
os discursos do planejamento estratégico tentando reorientar essa dinâmica.
foram as justificativas progressistas para um
neoliberalismo selvagem. VI - É evidente, então, que desde os anos 80
até hoje, coisas completamente diferentes
Se pensamos na situação atual de Buenos foram mencionadas por meio da categoria
Aires vamos ver que, apesar da mudança de espaço público; que falava em espaço públi-
discursos em seguida da crise do paradigma co quem desejava devolver à sociedade es-
neoliberal, os processos da cidade haviam feras de atividade que estiveram durante
retomado caminho igual, diante da ausência décadas dirigidas pelo Estado – e assim se
de um projeto político-urbano alternativo: a justificou, nos anos 90, todo o processo de
política urbana neoliberal dos anos 90 já não privatização dos serviços públicos – e tam-
é contínua explicitamente, mas tem sido bém quem buscava preservar os espaços
substituída por um modelo diverso de cida- comuns dirigidos pelo Estado de sua con-
de. A lucidez do neoliberalismo em diagnos- versão em negócio privado. Continua ten-
ticar a crise da cidade expansiva e em pro- do sentido, então, chamar de “espaço públi-
por um modelo de substituição (o da “cida- co” qualquer uma dessas opções, lutando
de dos negócios”) não foi contrastada com pela definição “legítima”?
diagnóstico igualmente lúcido, mas ideologi-
camente diferente, sobre a cidade que aque- O pensamento urbano mais avançado faz
las políticas deixaram. Assim, sob as auto- tempo começou a questionar a própria no-
representações mitologizantes do boom pós- ção de cidade que aludia à categoria de es-
crise de Buenos Aires (soma de turismo e paço público. Como assinalou Corboz ao
clímax cultural e imobiliário), já é claro que a cunhar a noção de “hipercidade”, as partes
melhoria econômica reativou a lógica da ci- “tradicionais” da cidade, aquelas que normal-
dade dos 90, que havia sido atenuada pela mente continuamos associando à idéia de
crise.27 A vontade típica dos anos 90 foi so- cidade, ocupam na própria Europa, onde essa
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ram articuladamente, não foi para favorecer a cidade funcionar como mercado haverá
o espaço público. Como escreveu Otília espaço público. E assim se chegou, na déca-
Arantes, uma das primeiras e mais agudas da de 1990, a sustentar com o discurso do
críticas do planejamento estratégico, a frag- espaço público um tipo de cidade que tem
mentação urbana recente, contou com o muito pouco a ver com os valores que, em-
auxílio de um “harmoniosa dupla estratégi- bora de sua maneira utópica, a categoria es-
ca”, os urbanistas – em geral, de procedên- paço público busca sustentar.
cia progressista – e os empresários que en-
contraram nas cidades um novo campo de Como se vê, usos diversos para uma cate-
acumulação: os primeiros se dedicaram, apa- goria que só muito superficialmente permi-
rentemente por modismo, a projetar “em te as articulações de “categoria-ponte”. Se
termos gerenciais provocativamente explí- podemos falar em “espaço público” para
citos”; os últimos não fazem mais do que referir tanto a rua interditada em memória
celebrar os valores culturais da cidade, da tragédia de Cromañón como o parque
“enaltecendo o ‘pulsar de cada rua, praça ou Micaela Bastidas em Puerto Madero, talvez
fragmento urbano’”, pelo que terminam se deva pensar que, mais do que continuar a
todos falando “o mesmo jargão de au- insistir em espaço público, apelando para sua
tenticidade urbana que se poderia denomi- capacidade de composição de esferas dife-
nar culturalismo de mercado”.34 rentes, hoje convenha voltar a decompor
as partes individuais que entram em jogo,
Finalmente, se poderia dizer que as políticas para ver se podemos compreender o que
urbanas utilizaram a categoria espaço públi- se passou enquanto falávamos sobre o
co em duplo sentido: por uma parte, em espaço público, com a cidade, por uma
sentido muito tradicional e operativo, como parte, e a política, a sociedade e o Estado,
o espaço aberto da cidade (as ruas e as pra- pelas outras.
ças), sem mais conteúdo teórico do que o
suposto de que é no espaço aberto que a Adrián Gorelik é arquiteto e doutor em história, profes-
sor titular na Universidad Nacional de Quilmes, coorde-
sociedade se reúne e reconhece; por outra nador do Programa de Historia de las ideas, los
parte, agregando automaticamente nesse intelectuales y la cultura da Faculdade de Filosofia e Le-
espaço aberto todas as qualidades sociais e tras da Universidade de Buenos Aires. Divide com Jorge
políticas que as teorias do espaço público F. Liernur a autoria de La sombra de la vanguardia.
Hannes Meyer en México, 1938-1947, Buenos Aires:
colocam em circulação. Nesse sentido, por Proyecto Editorial, 1993; é autor de La grilla y el parque.
obra e graça do “romance do espaço públi- Espacio público y cultura urbana en Buenos Aires, 1887-
co”, desenhar uma pracinha já não era dese- 1936, Buenos Aires: Editorial de la Universidad Nacio-
nal de Quilmes, 1998; e Das vanguardas à Brasília. Cul-
nhar uma pracinha, mas estar construin-
tura urbana e arquitetura na America Latina, Belo Hori-
do os pilares da sociabilidade democráti- zonte: Editora UFMG, 2003.
ca. Assim se justificaram como progressistas
idéias urbanísticas que simplemente retoma-
Tradução: Rodrigo Krul
ram com bastante pobreza de meios os mo-
delos urbanos do século 19, retomando tam- Revisão técnica: Xênia Roque
bém o princípio do funcionamento de mer- Notas
cado da cidade, como se a constatação teó-
rica de que para existir espaço público tem 1 Este trabalho foi desenvolvido para o Laboratorio de cul-
tura urbana: Los conflictos culturales en el futuro de las
que haver mercado, garantisse a ciudades, organizado pelo Grupo de Estudios de Cultu-
constatação prática inversa, de que onde ra Urbana, Universidad Autónoma Metropolitana, Mé-
204
18 Riesman, David, com Nathan Glazer e Reuel Dennee 30 Analisei essa pasagem em Gorelik, Adrián. Políticas de la
[Nova York, 1950]. La muchedumbre solitaria. Buenos representación urbana: el momento situacionista. Punto
Aires: Paidós, 1964: 298. de Vista n. 86, Buenos Aires, dezembro de 2006: 23-30.
19 Jacobs, Jane [Nova York, 1961]. Vida e muerte de las 31 Refiro-me à célebre discussão de Feuerbach com Hegel
grandes ciudades. Madri: Península, 1967: 468. sobre religião, desenvolvida em La esencia del cristia-
nismo, de 1841, que Marx retoma e reformula em Ma-
20 Lench, Kevin [Cambridge, 1960]. La imagem da ciudad.
nuscritos económicos y filosóficos, de 1844. Tem-se
Buenos Aires: Edições Infinito, 1974: 228.
análise muito boa dos diversos usos da noção de alie-
21 Sennet, Richard [Nova York, 1977]. El declive del hombre nação nesses textos em Giddens, Anthony. Capitalism
público. Barcelona: Península, 1978: 433. and Modern Social Theory. Cambridge: Cambridge
22 Ver, por exemplo, Sennet, Richard. The Comscience of University Press, 1971: 382.
the Eye. The Design and Social Life of Cities. Nova York: 32 Beck, Ulrich e Willms, J. Conversations with Ulrich Beck.
Alfred Knopf, 1990: 270. Cambridge: Polite, 2004: 232.
23 Baczko, Bronislaw [Paris, 1984]. Los imaginários sociales. 33 Harvey, David. El arte de la renta: la globalización e la
Memórias e esperanzas colectivas. Buenos Aires: Nueva mercantilización de la cultura. In Harvey, David e Smith,
Visión, 1988: 270. Neil. Capital financiero, propiedad inmobiliaria y cultura.
24 Jedlowski, Paolo. Introduzione. In Georg Simmel. La Barcelona: Museu d’Art Comtemporani de Barcelona/
metropoli e la vita dello spirito. Roma: Armando Universitat Autónoma de Barcelona, 2005: 29-57.
Editore, 1995: 7-32. 34 Arantes, Otilia. Uma estratégia fatal. A cultura nas novas
25 Os termos aspeados foram utilizados em trabalho pio- gestões urbanas. In Arantes, Vainer e Maricato. A cidade
neiro do grupo de historiadores do Pehesa, em especial do pensamento único. Desmanchando consensos.
Leandro Gutiérrez, Luis Alberto Romero, Hilda Sabato Petrópolis: Editora Vozes, 2000: 67.
e Juan Carlos Korol (Ver Pehesa. ¿Dónde anida la de-
mocracia?, Punto de Vista n.15, Buenos Aires, agosto de
1982: 6-10). Leandro Gutiérrez y Luis Alberto Romero
continuaram com os estudos das sociedades vicinais e o
espaço público de bairro em uma série de trabalhos
posteriormente reunida em Gutiérrez, Leandro e
Romero, Luis Alberto. Sectores populares. Cultura e
política. Buenos Aires en la entreguerra. Buenos Aires:
Sudamericana, 1995: 212.
26 Com o propósito de angariar fundos para a Fundação
Oftalmológica Argentina Jorge Malbran – FOA, a Casa
FOA surgiu em 1985, contribuindo para a recuperação
de monumentos históricos de Buenos Aires, como Casa
de la Moneda (1995), Hotel de Inmigrantes (2000),
Monasterio de Santa Catalina (2001), Casa del Patio de
la Reconquista (2003), e a conservação de imóveis de-
clarados Áreas de Proteção Histórica pela Comissão
Nacional de Museus, Monumentos e Lugares Históri-
cos: Hotel Avenida de Mayo (1991), Puerto Madero
Dock 5 (1993), Palacio Alcorta (1994), Tattersal de
Palermo (1998), Apostadero Naval (2000), Terrazas de
Buenos Aires (2002), Tribuna II Palermo (2004), Palacio
Lezama, ex-fábrica de Biscoitos Canale (2006). In:
www.casafoa.com. Acesso em 28 jul. 2008. (N.T.)
27 Gorelik, Adrián. Modelo para armar. Buenos Aires, de la
crisis al boom. Punto de Vista n. 84 Buenos Aires, abril
de 2006: 33-39.
28 Corboz, André. L’ipercittà [1994]. In Ordine Sparso. Saggi
sull’arte, il metodo, la città e il territorio. Milão: Franco
Angeli, 1998: 234-238.
29 Koolhaas, op. cit.: 963.