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O Mestre Ignorante
O Mestre Ignorante
la,-ãn
Educação: Experiência e Sentido
Jacques Ranciêre
O mestre ignorante
Cincoliçõessobrea íman(caçãoitlteleduat
Tradução
1..ílian do Valle
oa .];.xa
A' --'nya-/
2' reimpressão
autêntica
:Le Maíüe lgnorant" de Jacques Ranciêre
APRESENTAÇÃODA COLEÇAO
Word copyright © Librairie Arthême Fayard, 1987
192p.(Educação: Experiência e Sentido, l) ser o que somos, pma ser ouça coisa pma além do que vimos sendo.
71 ,4 zazà doJÜ#.zü
Cérebros e folhas, 72 -- Um animal atento, 77 Uma
vontade servida por uma inteligência, 83 -- O pí:incípio
da veracidade, 86 -- A razão e a língua, 90 -- Eu também
sou pintor, 97 -- A lição dos poetas, 100 -- A comunidade
desiguais,104.
\Q9 -Á sociedade
do deq)feno PREFÁCIO À EDIÇÃO BRASILEIRA
As leis da gravidade , ll 1-- A paixão da desigualdade,
1 15 -- A loucwa retórica, 119 0s infel-iores superiores,
123 0 rei 61ósofo e o povo soberano, 127 -- Como des- Qual o sentido de propor ao leitor brasileirodeste
razoar razoavelmente, 130 -- A palavra no Avendno, 137. início de terceiro milênio a história de Joseph Jacotot --
seja,em aparência, a história de um extravagante pedago
h.4X O emancipados e st4asimitações go francês dos inícios do século XIX? Mas haveria, já,
qualquer sentido em propâ-la, quinze anos mais cedo,
O métodoemancipados
e o métodosocial,142--
aos cidadãos da Fiança -- apesar de tudo, supostamente
Emancipação dos homens e instrução do povo, 147 -- Os
apaixonada por tudo quanto é antiguidade nacional?
homens do progresso, 151 -- De carneiros e homens, 157
-- O círculo dos progressistas, 162 -- Sobre a cabeça do A história da pedagogiadecerto conhece suas ex-
üavagâncias.E, estas,por tanto quanto sedevem à própria
povo, 169 -- O triunfo do Velho, 175 -- A sociedade peda-
gogizada, 180 -- Os contos da panecástica,185 -- O tú- esü.anhezada relação pedagógica, foram freqüentemente
mulo da emancipação, 190.
mais insüutivas do que as proposições mais racionais.No
entanto,no caso de Joseph Jacotot, o que estáem jogo é
bem mais do que apenas um artigo, enfie tantos, no gran-
de museu de cul-iosidadespedagógicas.Pois trata-se, aqui,
de uma voz solitária que, em um momento vital da consti-
tuição dos ideais, das práticas e das instituições que ainda
governam nosso presente, ergueu-se como uma dissonân-
cia inaudita -- como uma dessasdissonâncias a pmtir das
quais não se pode mais consta-uirqualquer hmmonia da
instituição pedagógica e que, portanto, é preciso esquecer,
para poder cont:muar a ediâcar escolas,programas e peda-
gogias, mas, também, como uma dessas dissonâncias que,
em certos momentos, talvez sejapreciso escuta- ainda, pa-a
que o ato de ensina jamais perca htekamente a consciên-
cia dos paradoxosque Ihe fornecem sentido.
Revolucionário na França de 1789, exilado nos Paí-
ses Baixos quando da restauração da monarquia, Joseph
Jacotot foi levado a tomar a palavra no excitomomento
em que se instala toda uma lógica de pensamentoque
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COLEÇÃO "EOUCAÇÃO: EXPERIÊNCIA
E SENTIDO
poderia ser assim resumida: acabar a revolução, no duplo paciâlcamente na ordem das sociedades fundadas sobre
sentido da palavra: por um termo em suasdesordens, re- as luzes da ciência e do bom governo.
alizando a necessáriatransformação das instituições e Fazendo passar os conhecimentos que possui para o
mentalidades de que foi a encarnação antecipada e fan- cérebro daqueles que os ignoram, segundo uma sábiapro-
tasmática; passar da fase das febres iguahtátias e das de- gressão adaptada ao nível das inteligências limitadas, o
sordens revolucionárias à constituição de uma nova or- mestre era, ao mesmo tempo, um paradigma âlosófico e
dem de sociedades e governos que conciliasse o progresso, o agenteprático da entradado povo na sociedadee na
sem o qual as sociedadesperdem o elã, e a ordem, sem a ordem governamental modernas. Esse paradigma pode
qual elas seprecipitam de crise em crise. Quem pretende servir para pedagogosmais ou menos rígidos, ou para
conciliar ordem e progresso encontí-anaturalmente seu liberais. Mas estas diferenças não desmerecem em nada a
modelo em uma instituição que simboliza sua união: a lógica do conjunto do modelo, que atl-ibui ao ensino a
instituição pedagógica,lugar -- material e simbólico -- onde tarefa de reduzir tanto quanto possível a desigualdade
o exercício da autoridade e a submissão dos sujeitos não social, reduzindo a distância entre os ignorantes e o sa-
têm ouço objetivo além da progressão destes sujeitos, ber. Foi sobre esta questão, exatamente, que Jacotot fez
até o limite de suascapacidades;o conhecimento dasma escuta, para seu tempo e para o nosso, sua nota absolu-
ténias do programa para a maior-ia, a capacidade de se tamente dissonante.
tornar messe, por su2 vez, para os melhores. Ele preveniu: a distância que a Escola e a sociedade
Nesta perspectiva, o que deveria, portmto, arrematar pedagogizada pretendem reduzir é aquela de que vivem e
a era das revoluções era a sociedade da ordem progressiva: que não cessamde reproduzir. Quem estabelecea igual-
a ordem idêntica à autoridade dos que sabem sobre os que dade como aóyb#z,aa ser atingido, a parti- da situação de
ignoram, ordem votada a reduzir za zog#a Za.poxx/»/a dis- desigualdade, de fato a posterga até o infinito. A igualda-
tância enfie os pl:imeiros e os segundos. Na França dos de jamais vem após, como resultado a ser atingido. Ela
anos 1830, isto é, no país que havia feito a experiência mais deve sempre ser colocada antes.A própria desigualdade
radical da Revolução e que, assim, se acreditava chamada social já a supõe: aquele que obedece a uma ordem deve,
por excelência a completa- esta revolução, por meio da ins- pJ-imeiramente, compreender a ordem dada e, em segui-
tituição de uma ordem moderna razoável,a insüução tor- da, compreender que deve obedecê-la. Deve, portanto,
nava-seuma palavrade ordem cento-al:governo da socie ser já igual a seu messe, para submeter-se a ele. Não há
dade pelos cidadãos instruídos e formação das elites, mas ignorante que não saibauma infinidade de coisas,e é so-
também desenvolvimento de formas de instrução desti- bre este saber, sobre esta capacidade em ato que todo
nadas a fornecer aos homens do povo conhecimentos ensino deve se fundar. Instruir pode, portanto, signi6lcar
necessáriose suficientes para que pudessem, a seu rit- duas coisas absolutamente opostas: consumar uma in-
mo, superar a distância que os impedia de se integrarem capacidadepelo próprio ato que pretende reduzi-la ou,
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A lógica da Escola republicana de promoção da igualda- tem seusselvagensa civilizar e seusalunos em diâculdade
de pela dista-ibuiçãodo universal do saber faz-se sempre, a recuperar. Nestas condições, a instl-ução escola é cada
ela própJ-ia, prisioneira do paradigma pedagógico que re- vez mais encarregada da tarefa fantasmática de superar a
constitui indeânidamente a desigualdade que pretende su distância entre a igualdade de condições proclamada e a
primar A pedagogia tradicional da Uansmissão neutra do desigualdade existente, cada vez mais instada a reduzir as
saber, tanto quanto as pedagogias modernistas do saber desigualdades tidas como residuais. Mas a tuefa última
adaptado ao estado da sociedade mantêm-se de um mes- dessesobre-investimento pedagógico é, Êmalmente,legi-
mo lado, em relaçãoà alternativacolocadapor Jacotot. timar avisão oligárquico de uma sociedade-escolaem que
Todas as duas tomam a igualdade como objetivo, isto é, o governo não é mais do que a autoridade dos melhores
elas tomam a desigualdadecomo ponto de partida. da turma. A estes ''melhores da turma" que nos gover-
As duas estão, sobretudo, presas no círculo da socie- nam é oferecida então, mais uma vez, a antiga alternativa:
dade pedagogizada. Elas atJ.ibuem à Escola o poder fan- uns lhes pedem que se adaptem, aüavés de uma boa pe-
tasmático de realizar a igualdade social ou, ao menos, de dagogia comunicativa, às inteligências modestas e aos pro-
reduzir a "ffatura social" . Mas este fantasma repousa, ele blemas cotidianos dos menos dotados que somos; ou-
próprio, sobre uma visão da sociedadeem que a desi tros lhes requerem, ao contrário, administra, a partir da
gualdade é assimilada à situação das crianças com petar- distância indispensável a qualquer boa progressão da clas-
do. As sociedadesdo tempo de Jacotot confessavama se,os interesses da comunidade.
desigualdade e a divisão de classes. A insüução era, para Era bem isto que Jacotot tinha em mente: a maneja
elas,um meio de instituir algumas mediações entre o alto pela qual a Escola e a sociedade inânitamente se simboli-
e o baixo: um meio de conceder aospobres a possibilida- zam uma à outra, reproduzindo assim indeânidamente o
de de melhorar individualmente suâcondição e de dar a pressuposto desigualitário, em suaprópria delegação. Não
todos o sentimento de pertencer, cadaam emle# úegnr,a que ele estivesseanimado pela perspectiva de uma revo
uma mesma comunidade. Nossas sociedades estão muito [ução socia]. Sua lição pessimista era, ao contrário, que o
longe desta franqueza. Elas se representam como socie axioma igualitário não tem efeitos sobre a ordem social.
dades homogêneas,em que o l-itmo vivo e comum da Mesmo que, em última instância, a igualdade ftJndassea
multiplicação das mercador.ias e das trocas anulou as ve- desigualdade, ela não podia se atuajizar senão individual-
lhas divisões de classese fez com que todos participas- mente, na emancipação intelectual que deveria devolver a
sem das mesmas fruições e liberdades. Não mais proletá- cadaum a igualdade que a ordem social Ihe havia recusa-
rios, apenasrecém-chegadosque ainda não entraram no do, e Ihe recusaria sempre, por sua própria natureza. Mas
ritmo da modernidade, ou atrasados que, ao conüário, essepessimismo também tinha seu mérito: ele marcavaa
não souberam se adaptar às acelerações desse ritmo. A nat:urezaparadoxal da igualdade, ao mesmo tempo pl-in
sociedade se representa, assim, como uma vasta escola que cípio último de toda ordem sociale governamental,e
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E, entre aqueles que se dispuseram a delas beneficiar-se, saído tão bem dessa diHcil situação quanto o fariam
um bom número ignorava o â-ancês. Joseph Jacotot, por muitos francesesl Não seria, pois, preciso mais do que
suavez, ignorava totalmente o holandês. Não existia, por- querer, para poder? Todos os homens seriam, pois, vir-
tanto, língua na qual pudesseinstrui-los naquilo que Ihe tualmente capazesde compreender o que outros haviam
solicitavam. Apesar disso, ele quis responder às suas ex- feito e compreendido?":
pectativas. Para tanto, era preciso estabelecer, entre eles, Tal foi a revolução que essa experiência do acaso
o laço mínimo de uma raçacomum. Ora, publicara-seem provocou em seu espírito. Até ali, ele havia acreditado no
Bruxelas, naquela época, uma edição bilíngue do Te/l11wa- que acreditam todos os professores conscienciosos: que
au:estava encontrada a coisa comum e, dessa forma. Te- a grande tarefa do mestl-e é transmitir seus conhecimen-
lêmaco ente-ouna vida de Joseph Jacotot. Por meio de tos aos alunos, para eleva-los gradativamente à sua pró-
um intérprete, ele indicou a obra aos estudantes e lhes pria ciência. Como eles, sabia que não se untava de entu-
solicitou que aprendessem,amparados pela uadução, o pir os alunos de conhecimentos, fazendo-osrepetir como
texto francês. Quando eles haviam atingido a metade do papagaios,mas,também, que é preciso evitar essescami-
livro primeiro, mandou dizer-lhes que repetissem sem nhos do acaso,onde se perdem os espíritos ainda incapa-
parar o que haviam aprendido e, quanto ao resto, que se zes de distinguir o essencial do acessório; e o pl-incípio da
contentassem em lê-lo para poder narra-lo. Era uma so- conseqüência. Em suma, o ato essencial do mestre era
lução de improviso, mastambém, em pequena escala,uma a;.pecar,destacaros elementos simples dos conhecimen-
experiência 6Hosó6lca, no gosto daquelas tão apreciadas tos e harmonizar sua simplicidade de princípio com a
no SéculodasLuzes.EJosephjacotot,em 1818,perma- simplicidade de fato, que caracteriza os espíritos Jovens e
necia um homem do século passado. ignorantes. Ensinar era, em um mesmo movimento, trans-
No entanto, a experiência superou suas expectati- mitir conhecimentos e formar os espíritos, levando-os,
vas. Ele solicitara aos estudantes assim preparados que segundo uma progressão ordenada, do simples ao com-
escrevessemem francês o que pensavam de tudo quanto plexo. Assim progredia o aluno, na apropriação racional
haviam lido. "Ele estava esperando por terdveis barba- do sabere na formaçãodo julgamentoe do gosto,até
rismos ou, mesmo, por uma impotência absoluta. Como. onde suadestinação social o requeria, preparando-se para
de fato, poderiam todos essesjovens, pl-ivados de expli- dar à sua educação uso compatível com essa desdnação:
cações,compreender e resolver dificu]dades de uma ]ín. ensinar,advogar ou governar para as elites; conceber,
gua nova para eles?De toda forma, era preciso verificar desenharou fabricar instrumentos e máquinaspara as
até onde esse novo caminho, aberto por acaso, os havia novas vanguardas que se buscavam, agora, arrancar da
conduzido e quais os resultados desse empirismo deses-
perado. Mas, qual não foi suasurpresaquando descobriu Fénixe Vector Ratier, "Enseignement universel. Emancipation intellectueHe
que seus alunos, abandonados a si mesmos, se haviam }ezr a depbilosaplliepatzécasügHe,'1838,
p.'155.
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COLEÇÃO "EDUCAÇÃO: EXPERIÊNCIA E SENTIDO' Uma aventura intelectua
elite do povo; fazer, na carteira das ciências, novas desco- compreendeu. E, para que compreenda, é preciso que
bertas para os espíritos dotados desse gênio particular. alguém Ihe tenha dado uma explicação,que a palawa do
Sem dúvida, o procedimento desseshomens de ciência mestre tenha rompido o mutismo da m.z/é/ü ensinada.
divergia sensivelmente da ordem razoada dos pedagogos. Essa lógica não deixa, entretanto, de comporta certa
Mas não se extraíadaí qualquer argumento contra essa obscuJ.idade.Eis, por exemplo, um Hvro entre as mãos do
ordem. Ao contrário, é preciso haver adquil-ido,inicial- aJuDo.Esse limo é composto de um conjunto de raciocínios
mente, uma formação sólida e metódica, para dar vazão destinados a fazer o aluno compreender uma matéria. Mas,
às singularidades do gênio. Poí/ óoc e P.p/ipz?fóor. eisque, agor% o mestre toma a pa]awa pa-a exp]icm o livro.
Assim raciodnam todos os professoresconsciencio- Ele fm um conjunto de raciocínios pma explicar o conjunto
sos.Assim havia radocinado e agidoJosephjacotot, em t:tinta de raciocíniosem que o limo seconstitui. Mas, por que teria
anos de oãcio. Porém, eis que um grão de a.eia vinha, eor- o livro necessidade de tal assistência?Ao invés de pagar um
tuitamente, seintroduzir na engrenagem. Ele não havia dado explicador, o pai de fàn)ília não podem-ia,
simplesmente,dar
a seus "alunos" nenhuma explicação sobre os pt:imeiros ele- o livro a seu alho, não poderia este compreender, diretz-
mente, os raciocínios do livro? E, caso não o âzesse, por
mentos da língua.Ele não hes havia explicado a ortograâa e
as conjugações. Sozinhos, eles haviam buscado as palavras que, então, compreenderia melhor os raciocínios que he
üancesas correspondentes àquelas que conheciam, e as ra- explicmão aquilo que não compreendeu?Teriam essesúlti-
mos uma natweza diferente? E não sel.ia necessário, nesse
zões de suasdesinências.Sozinhos eles haviam aprendido a
combina-las, pma emer, por sua vez, bases 6.ancesas: â.ases caso, explica, ainda, a forma de compreendê-los?
cuja ortografia e gramática tornavam-se cada vez mais exp- A lógica da explicação comporta, assim,o princípio
us, à medida em que avmçavam na ]eitwa do livro; mas, de uma regressãoao inânito: a reduplicação das razões
sobretudo, bases de escritores, e não de iniciantes. Sel:iam, não tem jamais razão de se deter. O que detém a regressão
pois, supérfluas asexplicações do messe? Ou, se não o eram, e concede ao sistema seu fundamento é, simplesmente, que
para que e pma quem teriam, então, utilidade? o explicador é o único juiz do ponto em que a explicação
está,elaprópria, explicada. Ele é o único Juiz dessaques-
tão, em si mesma vertiginosa: teria o aluno compreendido
A ordem e41icadora
os raciocülios que Ihe ensinam a compreender os raciocí-
nios? É aí que o mestre supera o pai de família: como po-
Uma súbita iluminação tornou, assim, brutalmente deria esseúltimo assegura-se de que seu filho compreen-
nítida, no espíàto de Joseph Jacotot, essa cega evidência deu os raciocínios do livro? O que efta ao pai de família, o
de todo o sistema de ensino: a necessidadede explica- que sempre fdtmá ao üio que forma com a criança e o
ções. No entanto, o que haveria de mais seguro do que limo, é essa mte singulm do explicador: a mte da züü óúz.
essa evidência? Ninguém nunca sabe, de fato, o que O segredo do mestre é saber reconhecer a distância enfie a
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Uma aventura intelectual
matéria ensinadae o sujeito ainstruir, a distância, também, dita. Tudo se passa, agora, como se ela não mais pudesse
ergue@re#úf e ru/2@x?e#den
O explicador é aqueleque im- aprendercom o recurso da inteligênciaque Ihe serviu
põe e abole a distância, que a desdobra e que a reabsorve até aqui, como se a relação autónoma entre a aprendiza-
no seio de suapalavra. gem e a veri6lcação Ihe fosse, a partir daí, estrangeira.
Esse l/nüf pdvilegtado da palavra não suprime a re Entre uma e outra, uma opacidade, agora, se estabele-
gressão ao inânito, senão para instituir uma hierarquia pa- ceu. Trata-se de du/2@ree#der--
e essa simples palavra reco-
radoxal.Na ordem do explicador,com efeito, é preciso bre tudo com um véu: razl@ree#de/"
é o que a criança não
uma explicação oral pa-a explica a explicação escrita.Isso pode fazer sem as explicaçõesfornecidas,em certa or-
supõe que os raciocínios são mais clm-os impl-imem-se dem progressiva, por um mestre. Mais tarde, por tantos
melhor no espú:itodo aluno -- quedo veiculadospela pa- mestres quanto forem as matérias a compreender. A isso
lavra do mestre, que sedissipa no instante, do que no limo, se soma a esa-anhocircunstância, de que as explicações,
onde estão inscritas para sempre em caracteresindeléveis. depois que se iniciou a era do progresso, não cessamde
Como entender esseprivilégio paradoxal da palavra sobre se aperfeiçoar para melhor exphcm, melhor fazer com-
a escrita, do ouvido sobre a vista? Que relação exist:iria, preender, melhor ensinar a aprender, sem que jamais se
pois, enfie o poder da palavra e o do mestre? possa vel-i6lcar um aperfeiçoamento correspondente na
Mas, a esse pm-adoxo logo segue-se ouço: as .pa&zem dita compreensão. Antes pelo contrário, começa a erguer-
que a cl-lança aprende melhor, aquelas em cujo sentido ela se um triste rumor, que não mais deixará de se ampliâlcm,
penetra mais facilmente, de que se apropria melhor pai-a seu de um contínuo declínio na eâcáciado sistemaexplicati-
próprio uso, são as que aprende sem messe explicador, en- vo, a carecer, evidentemente, de novo aperfeiçoamento
tes de qualquer mestre explicador. No rendimento desigual para tornar as explicações mais fáceis de serem compre-
das diversas aprendizagensintelectuais, o que todos os a- endidas por aqueles que não as compreendem. ..
lhos dos homens aprendem melhor é o que nenhum mesa.e A revelação que acometeuJosephjacotot se relacio-
lhes pode explica- -- a língua materna. Fala-se a eles,e f:ila-se
na ao seguinte: é preciso inverter a lógica do sistemaex-
em torno deles.Eles escutame retêm, imitam e repetem, plicador. A explicação não é necessáriapara socorrer uma
erram e se corllgem, acertam por acaso e recomeçam por
incapacidade de compreender. E, ao conüáíio, essa üaa-
método, e, em idade muito tem-a para que os explicadores .paízaad?,a âlcção esuuturante da concepção explicadora
possam realizar sua instrução, são capazes,quase todos
de mundo. É o explicador que tem necessidadedo inca-
qualquer que seja seu sexo,condição social e cor de pele -- de
paz, e não o contrário, é ele que constitui o incapazcomo
compreender e de fã]ar a língua de seus pais.
tal. Explicar alguma coisa a alguém é, antes de mais nada,
E, então, essa criança que aprendeu a fdm por sua demonstra-lhe que não pode compreendê-la por si só.
própria inteligência e por intermédio de mestres que não Antes de sero ato do pedagogo,a explicaçãoé o mito
Ihe explicam a língua, começa suainstrução, propriamente da pedagogia, a parábola de um mundo dividido em
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Uma aventu ra intelectua
espíritos sábios e espíritos ignorantes, espíritos maduros exatamente por ser culto, esclarecido e de boa-fé que ele
e Imaturos, capazes e incapazes, inteligentes e bobos. O é mais eficaz. Mais ele é culto, mais se mostra evidente a
procedimento próprio do explicador consiste nessedu- ele a distância que vai de seu saber à ignorância dos igno-
plo gesto inaugural: por um lado, ele decreta o começo rantes. Mais ele é esclarecido,e Ihe parece óbvia a dife-
absoluto -- somente agora tem início o ato de aprender; rença que há entre tatear às escurase buscar com méto
por outro lado, ele cobre todas as coisas a serem aprendi- do, mais ele se aplicará em substituir pelo espírito a letra,
das desse véu de ignorância que ele próprio se encarrega pe[a c]arezadas explicações a autoridade do livro. Antes
de retirar. Até ele, o pequeno homem tateou às cegas, de qualquer coisa, dir-se-á, é preciso que o aluno com-
num esforço de adivi1lhação.Agora, ele vai aprender. Ele preenda e, para isso, que a ele se forneçam explicações
escutava palavras e as repetia. Trata-se, agora, de ler, e ele cada vez melhores. Tal é a preocupação do pedagogo es-
nao escutará as palavras, se não escuta as sílabas, e as síla- clarecido: a criança está compreendendo? Ela não com-
bas, se não escuta as letras que ninguém poderia fazê-lo preende? Encontrmei manei-as novas de explicar-lhe, mais
escuta, nem o livro, nem seuspais -- somente a palavra rigorosas em seu princípio, mais atrativas em sua forma;
do mestí-e.O mito pedagógico, dizíamos, divide o mun- e veriâcarei que ele compreendeu.
do em dois. Mas, deve-se dizer, mais precisamente, que Nobre preocupação.Infelizmente, é essapequena
ele divide a inteligência em duas. Há, segundo ele, uma palavra,exatamente essapalavra de ordem dos esclareci-
inteligência inferior e uma inteligência superior. A pri- dos -- ra @fee#def--a causadora de todo o mal. E ela que
men.aregístra as percepções ao acaso,retém, interpreta e interrompe o movimento da razão,destrói sua confiança
repete empiricamente, no estreito círculo dos hábitos e em si, expulsa-ade suavia própria, ao quebrar em dois o
das necessidades. É a inteligência da criancinha e do ho- mundo da inteligência, ao instaurar a ruptura ergueo ani-
mem do povo. A segundaconhece as coisaspor suasra- mal que tateia e o pequeno cavalheiro instruído, entre o
zões, procede por método, do simples ao complexo, da senso-comum e a ciência. A partir do momento em que
parte ao todo. E ela que permite ao mestre t:ransmitir seus
se pronuncia essapalavra de ordem da dualidade,todo
conhecimentos, adaptando-os às capacidadesintelectu- aperfeiçoamento na maneira de JaRlefroi @xee#2ef-- essa
ais do aluno, e vetiâcar se o aluno entendeu o que acabou grande preocupação dos metodistas e dos progressistas
de aprender. Tã é o pl-incípio da explicação. Tal será. a -- se torna um progresso no embrutecimento. A criança
partir daí, para Jacotot, o princípio do emÓm/?ólme#áo.
que balbucia sob a ameaça das pancadas obedece à íéru-
Entendâmo-lo bem -- e, para isso, afastemos as ima- la, eis tudo: ela aplicará sua inteligência em outra coisa.
gens feitas. O embrutecedor não é o velho mestre obtuso Aquele, contudo, que foi e>@acado investirá suainteligên-
que entope a cabeçade seusalunos de conhecimentos cia em um trabalho do luto: compreender sigmâca, para
in(tgestos, nem o ser maléfico que pratica a dupla verdade, ele, compreender que nada compreenderá, a menos que
para assegurar seu poder e a ordem social. Ao contrário, é Ihe expliquem. Não é mais à Hrula que ele se submete,
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Uma aventara intelectual
mas à hierarquia do mundo das inteligências. Quanto ao guia-los e balizam astuciosamente todo um percurso com
resto, ele permanece tão tranquilo quanto o ouço: se a obstáculos que precisam superar sozinhos. Ele os havia
soluçãodo problemaé muito difícil de buscam.,
ele teráa
deixado sós com o texto de Fénelon, uma uadução nem
inteligência de arregalar.os olhos. O mestre é vigilante e mesmo interlinear, como era uso nas escolas e a vonta-
paciente. Ele notmá quando a criança já não estiver en-
de de aprender o francês. Ele somente lhes havia dado a
tendendo, e a recolocará no bom caminho, por meio de
ordem de auavessar uma floresta cuja saída ignorava. A
uma re-explicação.Assim, a criança adquire uma nova
necessidade o havia consta-cingidoa deixar inteiramente
inteligência -- a das explicações do messe. Mais tende. ela
de fora sua inteligência, essainteligência mediadora do
poderá, por sua vez, converter-se em um explicador. Ela
mestre que une a inteligência impressa nas palavras escri-
possui os meios. Ela, no entanto, os aperfeiçoará: ela será
um homem do progresso. tas àquela do aprendiz. E, ao mesmo tempo, ele havia
suprimido essadistância imaginária, que é o princípio do
embrutecimento pedagógico. Tudo se deu, a rigor, enfie
O acaso e a vontade
a inteligência de Fénelon, que havia gwe/zdo fazer um cer-
to uso da língua francesa, a do tradutor, que havia g#e7zao
E assim que corre o mundo dos explicadores ópp&an- fornecer o equivalente em holandês, e a inteligência dos
daí.E como correria, também, pai-a o professorJacotot, aprendizes,que gwe/ümaprender a língua francesa.E fi-
se o acasonão o houvessecolocado em presençade um cou evidente que nenhuma outra inteligência era neces-
$nZo-- e Joseph Jacotot pensava que todo raciocínio deve sária. Sem perceber, ele os havia feito descobrir o que ele
partir dos fatos e ceder diante deles. Porém, não conclu- próprio com eles descobria: todas as frases e, por conse-
amos, com isso, que se tratava de um materialista. Ao guinte, todas as inteligências que as produzem são de
contrãno: como Descartes,que provava o movimento ao mesma natureza. Compreender não é mais do que uadu-
anda, mas também como seu contemporâneo, o muito zir, isto é, fornecer o equivalentede um texto, mas não
realista e religioso Maine de Biran, ele tinha os #a/o.rdo suarazão. Nada há atrás da página escrita, nenhum ft)n
espeto que age e que toma consciência de sua atividade do duplo que necessite do üabalho de uma inteligência
como mais seguros do que qualquer ruácamaterial. E era aa#u,a do explicador; nenhuma língua do mest:re,nenhu-
bem disso que se tratava: olazo exaque alguns estudantes ma língua da língua cujas palavras e frases tenham o po-
íe e#lz#axnma falar e a escrever em francês, sem o socorro der de dizer a razão das palavras e frasesde um texto. E
de suas explicações. E]e nada lhes havia transmitido de
disso os estudantesflamengos haviam fornecido a pro
sua ciência, nada explicado quanto aos radicais e as fle- va: para falar do Teüparo,eles não tinham à suadisposi-
xões da língua francesa. Ele nem mesmo havia procedi- ção senão as palavras do Tezlg».zru.Bastam, portanto, as
do à maneira dessespedagogosreformadores que, como frases de Fénelon para compreender as frases de Fénelon
o preceptor do Em/Zza,perdem seusalunos, para melhor e para dizer o que delas se compreendeu. Aprender e
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COLEÇÃO "EOUCAÇÃO: EXPERIÊNCIA E SENTIDO' Uma aventura intelectua
compreender são duas maneiras de expl:emir o mesmo um pequeno animal que, se chocando com as coisas,ex-
ato de tradução. Nada há aquém dos textos, a não ser a plora um mundo que ainda não é capaz de ver, mas que
vontade de se expressar,isto é, de traduza.. Seeles haviam essascoisas,precisamente, Ihe ensinmão a discernir. Mas o
compreendido a língua ao aprender Fénelon, não era âlhote de homem é, antes de qualquer outra coisa, um ser
simplesmente pela ginástica que compara uma página à de palavra. A criança que repete as palawas aprendidas e o
esquerdacom uma página à düeita. Não é a aptidão de estudanteflamengo "perdido" em seu Zeé$maíu não se guiam
mudar de coluna que conta, mas a capacidadede dizer o pelo acaso.Todo o seu esforço,toda a sua exploraçãoé
que sepensa nas palavras de outrem. Se eleshaviam apren- tencionada pe[o seguinte: uma palavra humana lhes foi di-
dido isso com Fénelon, é porque o ato de Fénelon escri- rigida, a qual querem reconhecer e à qual querem respon-
tor era, ele próprio, um ato de #2zZ#Zon
para traduzir uma der -- não na qualidade de alunos, ou de sábios, mas na
lição de politica em um relato legendário, Fénelon havia condição de homens; como se responde a alguém que vos
transposto, em francês do seuséculo, o grego de Home- fala, e não a quem vos examina: sob o signo da igualdade.
ro, o latim de Vlrgaio e a língua,culta ou primitiva, de O fato estava lá: eles haviam aprendido sozinhos e
cem outros textos,do conto infantil à história erudita. semmestre explicador. Ora, o que se dá uma vez é sem-
Ele havia aplicado a essa dupla tradução a mesma inteli-
pre possível. De resto, essa descoberta devem-ia
ser res-
gência que eles empregavam, por sua vez, para relatar com ponsável por uma reviravolta nos princípios do .p/dêxxor
bases de seu livro o que pensavamdesselivro.
Jacotot. Mas o homemJacotot estavamais prepmado para
Mas a inteligência que os âzera aprender o &ancêsem reconhecera variedade daquilo que se pode esperarde
Ze#m.zõoera a mesma que os havia feito aprender a língua um homem. Seu pai havia sido açougueiro, antes de cui-
materna: observando e retendo, repetindo e vedâcando. dar das contas de seu avâ, o carpinteiro que havia envia-
associando o que buscavam aprender àquilo que Já conhe- do seuneto ao colégio. Ele próprio era professor de retó-
ciam, fazendo e refletindo sobre o que haviam falto. Eles rica, quando escutou ecoar o apelo às armas, em 1792. O
haviam procedido como não se deve proceder, como fa- voto de seuscompanheiroso havia feito capitãode arti-
zem as crianças, por a(&lehó«iã. E a questão, assim, se im- lharia e ele se distinguira como um notável artilheiro. Em
punha: não seria necessário inverter a ordem admitida dos 1793, na Seção das Pólvoras, esse latinista haja se torna-
valores intelectuais? Não seda essemétodo maldito, da adi- do insuutor de química para a formação aceleradados
vinhação, o verdadeiro movimento da inteligência huma- operários que seriam enviados para aplacarem todos os
na que toma posse de seu.P/l»/ü poder? E sua proscdção cantos do território as descobertas de Fourcroy. Na casa
nao mmcatia, na verdade, a vontade de dividir em dois o dessemesmo Fourcroy ele havia conhecido Vauquelin,
mundo da inteligência? Os me/ozãlrzmopõem o método alho de camponêsque se dera uma formação em quími-
mau, do acaso,ao caminho da razão.Mas eles se dão. ca às escondidas de seu pat:rão.Na Escola Politécnica, ele
antecipadamente, aquilo que querem provar. Eles supõem tinha visto chegar jovens que comissõesimprovisadas
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haviam selecionado,com base no duplo critério de vivaci- advinha uma conseqüência capital, não mais para os alu
dade de espilito e de patriotismo. E ele os havia visto tor- nos, mas para o Mesa-e.Eles haviam aprendido sem mes-
narem-se muito bons matemáticos, menos pela matemáti- tre explicador, mas não sem mest:re.Antes, não sabiam e,
ca que Monge ou Lagrange lhes explicava, do que por aquela agora, sim. l-ogo, Jacotot havia lhes ensinadoalgo. No
que praticavam diante deles. Ele próprio havia, apa-ente- entanto, ele nada lhes havia comunicado de sua ciência.
mente, aproveitado suas funções administrativas para Não era, portanto, a ciência do Mest:reque os alunos
construa uma competência de matemático que, mais tar- aprendiam. Ele havia sido mestre por força da ordem que
de, exercem-ia
na Universidade de Dijon. Assim como havia mergulhara os alunos no círculo de onde eles podiam sú-
acrescentado o hebraico às línguas antigas que ensinava e sozinhos, quando reú-ava sua inteligência para deixar as
composto um -E#iazoxaZ'r?ag?zzmáÉba
óeónnzh.Ele pensava deles entregues àquela do livro. Assim se haviam disso-
-- só Deus sabe a razão -- que essalíngua tinha futuro. En- ciado as duas funções que a prática do mestre explicador
fim, ele havia construído para si, a conUagosto, mas com vai relegar,a do sábio e a do mestre. Assim se haviam
o menor rigor, uma competência de representante do povo. igualmente separado, liberados uma da outra, as duas fa-
Em suma, ele sabia que a vontade dos indivíduos e o peri- culdades que estão em Jogo no ato de aprender: a inteli
go da Pária poderiamfazernascercapacidades
inéditas gência e a vontade. Entre o mestre e o aluno se estabele
em cucunstàncias em que a uqência obrigava a queimar as cera uma relação de vontade a vontade: relação de
etapas da progressão explicativa. Ele pensava que este es- dominação do mestre, que tivera por conseqüênciauma
tado de exceção,comandado pelas necessidadesda Nação, relação inteiramente livre da inteligência do aluno com
em nada diferia, em seuprincípio, da ugência quc rege a aquelado livro -- inteligênciado livro queera,também,a
exploração do mundo pela criança, ou dessaoutra exigên- coisacomum, o laço intelectual igualitário entre o mestre
cia que rege a via singular dos sábios e dos inventores. Por
e o aluno. Esse dispositivo permitia desta-inchar as cite
meio da experiência da criança, do sábio e do revolucioná-
gorjas misturadas do ato pedagógico e defiíú- exatamen-
rio, o método do águiapraticado coH sucessopelos está te o embrutecimento explicador. Há embrutecimento
dantes flamengos revelava seu segundo segredo. Esse mé
quando uma inteligência é subordinada a ouü-ainteligên-
todo da @w.züade
era, antes de mais nada, um método da
cia. O homem -- e a criança, em particular pode ter
z,a#zade.
Podia-se aprender sozinho, e sem messe explica-
necessidadede um mestre, quando sua vontade não é su-
dor, quando se queria, pela tensão de seu próprio desejo
ficientemente forte para coloca-la e mantê-la em seuca-
ou pelas contingências da situação.
minho. Mas a sujeição é puramente de vontade a vontade.
E[a se torna embrutecedora quando liga uma inteligência a
1) messe emanc$ador
uma outra inteligência. No ato de ensinar e de aprender,há
Essascontingências haviam tomado, na circunstân- duasvontades e duas inteligências. Chama-se-á embrute-
cimento à sua coincidência. Na situação experimental
cia, a forma de recomendaçãofeita por Jacotot. Disso
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Mas, à época, ele se ocupava precisamente de expel=imen- por sua vez, não se acredita capaz de aprender por si
ta- a distância entre o título e o ato. Ao invés, pois, de fazer mesmo -- menos, ainda, de inst:ruir um outro ignorante.
em francêsum curso de direito, ele ensinou os estudantes Os excluídos do mundo da inteligência subscrevem, eles
a pleitear em holandês. Eles o âzeram muito bem, mas ele próprios, o veredicto de sua exclusão.Em suma,o círcu
continuava a ignorar o holandês. lo da emancipação deve ser ramefado.
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Este é, no entanto, o salto mais diãcil. Quando ne- desses monitores sobre toda a população a ser instruída.
cessário,todos praticam essemétodo, mas ninguém está A perspectiva agradavaaos amigos do progresso: é assim
pronto a reconhecê-lo,ninguém quer enfrentar a revolu- que a ciência se difunde, dos píncmos até as mais modestas
ção intelectual que ele implica. O círculo social, a ordem inteligências.A felicidade e aliberdade a acompanham.
das coisas, proíbe que ele sela reconhecido pelo que é: o Essa espécie de progresso, para Jacotot, cheirava a
verdadeirométodo pelo qual cadaum aprendee pelo qual rédeas.Um carrossel aperfeiçoado, dizia ele. Ele sonhava
cadaum descobre a medida de suacapacidade.É preciso com outra coisa, a título de ensino mútuo: que cadaigno-
ousar reconhecê-lo e prossegue a veriâcação aóerZade rante pudesse se fazer, para outl-o ignorante, um mest:re
seu poder. Sem o que, o método da impotência, o HgZ%o.
que revelaria a ele seu poder intelectual. Mais exatamen-
durará tanto quanto a ordem das coisas.
te, seu problema não era a insüução do povo: / í/ irem-íe
Quem gostaria de começa? Havia, à época, muitos os recrutas que se enganam sob sua bandeira, os subalter-
tipos de homens de boa vontade que se preocupavam nos que devem poder compreender as ordens, o povo
com a Instrução do povo: homens da ordem quem.iam le- que se quer governar à maneja progressiva, isto é, sem
var o povo a secolocar acimade seusapetitesbrutais; dü-eito divino e somente segundo a hierarquia das ó;@.za-
homens de revolução queriam conduzi-lo à consciência dadei.O problema era a em.zxr@ap2a:que todo homem
de seus direitos; homens de progresso desejavam, pela do povo pudesse conceber sua dignidade de homem,
instrução, atenua- o abismo entre as classes;homens de medir a dimensão de suacapacidadeintelectual e decidir
indústria sonhavam, por seu intermédio, conceder às quanto a seu uso. Os amigos da instrução asseguravam
melhores inteligências populares os meios de uma pro- que era essaa condição de uma verdadeira liberdade. Em
moção social. Todas estas boas intenções encontravam seguida,reconheciam dever ao povo essainstrução, e es-
um obstáculo:os homensdo povo têm pouco tempo e, tavam prontos a briga ente-esi para âxar aquela que Ihe
menos ainda, dinheiro para investi nessa aquisição. As- deveria ser concedida. Jacotot não via que liberdade po-
sim, procurava-seum meio económico de difiindir o mini. dia resultar,para o povo, dos deveresde seusinstrutores.
mo de insüução julgada necessáriae suâciente pma, con- Ele pressentia, ao contrário, que estava em jogo uma nova
forme o caso, realizar o aplimoramento das populações forma de embrutecimento. Quem ensina sem emanci-
laboriosas. Entre os progressistas e os industriais, um mé- par, embrutece. E quem emancipa não tem que se preo-
todo desâ.utava,então, de grande reputação: o Ensino cupar com aquilo que o emancipado deve aprender. Ele
Ele permitia reunir em um vastolocal um grande aprenderá o que quiser, nada, talvez. Ele saberáque pode
número de alunos, divididos em destacamentos,ditigi- aprender.pongwe a mesma inteligência está em ação em
pelos mais avançadosentre eles,que eram promo- todas as produções humanas, que um homem sempre
vidos à ftlnção de monitores.Desse modo, o manda- pode compreender a palavra de um ouço homem. O im-
mento e a lição do mestre irradiavam-se por intermédio pressor de Jacotot tinha um filho que era débil mental.
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CAPÍTULO SEGUNDO
Todos se preocupavam por não poder fazer nada a res-
peito. Jacotot Ihe ensinou o hebraico, e a criança tor-
nou-se um excelente litógrafo. A língua, é evidente, ja-
mais Ihe serviu para nada -- a não ser para saber o que as
inteligências mais bem dotadas e mais instruídas ainda
-Wotaxap:tt, e não se tratada do hebraico.
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