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Informativo 1018-STF
Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE
DIREITO CONSTITUCIONAL
AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA
▪ É inconstitucional dispositivo da CE que confere autonomia financeira e orçamentária para a Universidade
Estadual, assim como a criação de Procuradoria Jurídica própria e a escolha do reitor sem participação do chefe
do Poder Executivo.

DIREITO ADMINISTRATIVO
ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA
▪ É dispensável a autorização legislativa para a alienação de controle acionário de empresas subsidiárias.

SERVIDOR PÚBLICO (REMUNERAÇÃO)


▪ É inconstitucional norma que preveja que o teto remuneratório se aplica para todas as empresas públicas e
sociedades de economia mista, ou seja, mesmo aquelas que não recebam recursos da Administração Pública.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL


EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA
▪ A chamada execução invertida é constitucional.

DIREITO TRIBUTÁRIO
DIREITO FINANCEIRO
▪ É inconstitucional o bloqueio ou sequestro de verba pública, por decisões judiciais, de empresa estatal prestadora
de serviço público em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário.

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DIREITO CONSTITUCIONAL

AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA
É inconstitucional dispositivo da CE que confere autonomia financeira e orçamentária para a
Universidade Estadual, assim como a criação de Procuradoria Jurídica própria e a escolha do
reitor sem participação do chefe do Poder Executivo

Importante!!!
É inconstitucional emenda à Constituição Estadual que confere autonomia financeira e
orçamentária próprias de órgãos de Poder à universidade estadual.
É constitucional o repasse de recursos orçamentários para universidade estadual na forma de
duodécimos.
Não pode o Estado-membro, por meio de sua Constituição ou legislação, instituir procuradoria
jurídica própria para universidade estadual.
É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que preveja que a Universidade
Estadual escolherá seu reitor sem qualquer participação do Chefe do Poder Executivo no
processo.
Também é inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que preveja iniciativa
privativa da Universidade Estadual para propor projeto de lei que disponha sobre sua
estrutura e funcionamento administrativo, bem como sobre suas atividades pedagógicas.
STF. Plenário. ADI 5946/RR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

O caso concreto foi o seguinte:


A Assembleia Legislativa de Roraima aprovou e promulgou uma emenda (EC estadual 59/2018) à
Constituição do Estado de Roraima tratando dos seguintes temas:
• conferiu autonomia financeira e orçamentária à Universidade Estadual de Roraima;
• criou a Procuradoria Jurídica da Universidade; e
• alterou normas relativas à escolha do cargo de Reitor da Universidade.

A então Governadora propôs uma ADI contra a referida emenda, arguindo, em síntese,
inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa e inconstitucionalidade material por quebra do
princípio da simetria.
Antes do término de seu mandato, a então Governadora encaminhou nova proposta de emenda
constitucional à Assembleia Estadual com conteúdo idêntico ao da emenda impugnada, suprindo o vício
de iniciativa. A proposição foi aprovada (EC 61/2018).
O novo Governador do Estado, em aditamento à inicial, solicitou a continuidade da ação direta de
inconstitucionalidade em relação à EC 61/18, de idêntico conteúdo à citada EC 59/2018.
A Universidade Estadual de Roraima, que defendia a constitucionalidade do ato, sustentou a
impossibilidade de aditamento da inicial e pediu a extinção da ação por perda de objeto.

O que acontece se o ato normativo impugnado por meio de ADI é alterado antes do julgamento da
ação?
O autor da ADI deverá aditar a petição inicial demonstrando que a nova redação do dispositivo impugnado
apresenta o mesmo vício de inconstitucionalidade que existia na redação original. Em outras palavras, ele
informa ao STF que houve a alteração legislativa, mas que, apesar disso, a nova redação continua
contrariando a Constituição Federal.

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E se o autor da ADI não fizer isso?


Neste caso, o STF não irá conhecer da ADI, julgando prejudicado o pedido em razão da perda
superveniente do objeto (perda superveniente do interesse de agir), nos termos do art. 485, VI, do CPC:
Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:
(...)
VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual;

Nesse sentido:
A revogação, ou substancial alteração, do complexo normativo impõe ao autor o ônus de apresentar
eventual pedido de aditamento, caso considere subsistir a inconstitucionalidade na norma que promoveu
a alteração ou revogação.
Se o autor não fizer isso, o STF não irá conhecer da ADI, julgando prejudicado o pedido em razão da perda
superveniente do objeto.
STF. Plenário. ADI 1931/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 7/2/2018 (Info 890).

A revogação, ou substancial alteração, do complexo normativo impõe ao autor o ônus de apresentar


eventual pedido de aditamento, caso considere subsistir a inconstitucionalidade na norma que promoveu
a alteração ou revogação.
STF. Plenário. ADI 2595 AgR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/12/2017.

O que acontece caso o ato normativo que estava sendo impugnado na ADI seja revogado antes do
julgamento da ação?
Regra: haverá perda superveniente do objeto e a ADI não deverá ser conhecida (STF ADI 1203).
Exceção 1: não haverá perda do objeto e a ADI deverá ser conhecida e julgada caso fique demonstrado
que houve "fraude processual", ou seja, que a norma foi revogada de forma proposital a fim de evitar que
o STF a declarasse inconstitucional e anulasse os efeitos por ela produzidos (STF ADI 3306).
Exceção 2: não haverá perda do objeto se ficar demonstrado que o conteúdo do ato impugnado foi
repetido, em sua essência, em outro diploma normativo. Neste caso, como não houve desatualização
significativa no conteúdo do instituto, não há obstáculo para o conhecimento da ação (STF ADI 2418/DF,
Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 4/5/2016. Info 824).
Exceção 3: caso o STF tenha julgado o mérito da ação sem ter sido comunicado previamente que houve a
revogação da norma atacada. Nesta hipótese, não será possível reconhecer, após o julgamento, a
prejudicialidade da ADI já apreciada (STF. Plenário. ADI 951 ED/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em
27/10/2016. Info 845).

No caso concreto, o STF acolheu o aditamento da inicial?


SIM. A Corte decidiu pela continuidade do processo de controle abstrato. Isso porque, apesar da
revogação do diploma legislativo impugnado, as regras nele constantes persistem no ordenamento
jurídico em diferente sede normativa.

Quanto ao mérito, o que o STF decidiu? Essa emenda é constitucional?


Em parte, sim.
O Plenário, por maioria, declarou:
• a inconstitucionalidade do caput e dos §§ 1º, 3º, 4º e 5º do art. 154 da Constituição do Estado de
Roraima, na redação dada pela EC 61/2018; e
• declarou a constitucionalidade do § 2º do art. 154 da Constituição do Estado de Roraima, na redação
dada pela EC 61/2018.

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Confira o teor dos dispositivos da Constituição do Estado de Roraima:


Art. 154. (...)
§ 1º Anualmente a Universidade Estadual de Roraima elaborará sua proposta orçamentária,
dentro dos limites da Lei de Diretrizes Orçamentárias, e encaminhará ao Poder Executivo para
inserção no Orçamento Geral do Estado.
§ 2º Os recursos correspondentes às dotações orçamentárias, compreendidos os créditos
suplementares e especiais destinados à Universidade Estadual de Roraima, ser-lhes-ão entregues
até o dia 20 de cada mês, em duodécimos.
§ 3º A cada quatro anos a comunidade acadêmica da Universidade Estadual de Roraima elegerá,
por voto direto, o Reitor e o Vice-Reitor, nos termos do seu Estatuto e Regimento Geral.
§ 4º Para a defesa de seus interesses, a Universidade Estadual de Roraima goza de Procuradoria
Jurídica própria, que a representa em juízo ou fora dele, nos termos da Lei.
§ 5º É de iniciativa da Universidade Estadual de Roraima lei que disponha sobre sua estrutura e
funcionamento administrativo, bem como sobre suas atividades pedagógicas.

Vejamos com calma cada um dos pontos decididos.

É inconstitucional a previsão de autonomia financeira e orçamentária conferida à Universidade Estadual


A CF/88 assegurou autonomia às Universidades, dividindo-a em três campos de incidência: i) didático-
científica; ii) administrativa; e iii) de gestão financeira e patrimonial. Confira:
Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão
financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão.

Vejamos o que significa cada uma delas:

Autonomia didático-científica
É a essência da Universidade, que representa um espaço livre para pensar, discutir e rediscutir ideias e
ideais, bem como para produzir conhecimento, fazer ciência e, assim, impulsionar a justiça social e o
desenvolvimento nacional.
A autonomia didático-científica acarreta um duplo dever do Estado. De um lado, significa que o Poder
Público não pode violar sua autonomia. De outro, representa o dever do Estado de garantir ações positivas
que possibilitem recursos suficientes para a efetivação de suas garantias.

Autonomia administrativa
Como consequência e condição da autonomia didático-científica, as Universidades gozam de autonomia
administrativa, isto é, a garantia de que as providências administrativas necessárias à concreção da
liberdade acadêmica possam ser adotadas sem a interferência indevida do Estado.
Apesar disso, vale ressaltar que as Universidades públicas se submetem às regras presentes na
Constituição e nas leis. Além disso, estão sujeitas ao controle dos órgãos de fiscalização, de modo que não
estão livres dos limites constitucionais e legais impostos à Administração Pública.

Autonomia de gestão financeira e patrimonial


As universidades podem gerir os recursos postos à sua disposição, executar e reestruturar orçamentos,
constituir patrimônio e dele livremente dispor. Embora trate-se de uma gestão vinculada às finalidades
que orientam a existência da própria instituição, no caso das universidades públicas, essa autonomia
permite certa discricionariedade quanto aos meios de execução do seu orçamento.
Com isso, a vinculação ao orçamento do Estado seria decorrência lógica da delegação para que, em nome

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do Estado, a universidade cumpra seus deveres constitucionais de promover a educação, o


desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica.
Conclui que a autonomia didático-científica só se perfectibiliza com as garantias da autonomia
administrativa e da autonomia de gestão financeira e patrimonial que, por sua vez, só serão de fato
observadas se presentes recursos financeiros mínimos para assegurar seu funcionamento.

Autonomia financeira e orçamentária não foi conferida às Universidades pela CF/88


A emenda discutida ampliou a previsão do art. 207 da CF/88 e conferiu às universidades “autonomia
financeira e orçamentária”. Para o STF, tal ampliação é inconstitucional.
A autonomia financeira e orçamentária não foi assegurada pela CF/88 às Universidades, tendo sido
conferida apenas aos entes federados, aos poderes instituídos, ao Ministério Público e à Defensoria
Pública.
Como vimos, o art. 207 mencionou apenas “autonomia de gestão financeira e patrimonial”, que consiste
em liberdade para administrar os recursos e patrimônio que recebe, ou seja, a partir do momento em que
“o dinheiro entra na sua conta”.
A autonomia financeira e orçamentária é mais ampla, portanto, permitindo aos poderes elaborar sua
própria proposta orçamentária, dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, a qual
será consolidada pelo Poder Executivo e encaminhada para votação pelo Poder Legislativo.
O Poder Constituinte decorrente (Assembleia Legislativa editando emendas à CE) não pode dar tratamento
próprio de poder instituído às Universidades estaduais ou municipais, sob pena de afronta ao princípio da
separação dos poderes.
As Universidades, embora autônomas, submetem-se à estrutura do Poder Executivo, que as criou. O poder
de elaborar a proposta orçamentária, dentro dos limites legais e respeitadas as estruturas administrativas
próprias, é conferido pela Constituição ao Chefe do Poder Executivo.
Da mesma forma, o poder constituinte dos Estados e Distrito Federal não pode, sob pena de violação ao
princípio da separação dos poderes – norma de observância obrigatória pelo poder constituinte derivado e
decorrente –, prever tal autonomia a órgãos ou entidades vinculadas ao poder executivo estadual, sob
pena de usurpar competência própria de um poder, competência essa que não pode ser objeto de
renúncia pelo atual ocupante da cadeira de chefia do poder executivo.
Nesse ponto, o STF entendeu que a emenda constitucional impugnada incorreu em inconstitucionalidade
material por violação ao previsto no art. 2º da Constituição Federal, uma vez que subtrai poderes do Chefe
do Poder Executivo e amplia a autonomia universitária (art. 207 da CF/88), de modo a conferir à
Universidade estadual – fundação pública – as autonomias reservadas aos Poderes Executivo, Legislativo,
Judiciário, ao Ministério Público e à Defensoria Pública.
Resumindo este primeiro ponto:
É inconstitucional emenda à Constituição Estadual que confere autonomia financeira e orçamentária
próprias de órgãos de Poder à universidade estadual.
STF. Plenário. ADI 5946/RR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

É constitucional a previsão de repasse de duodécimos à Universidade Estadual


A previsão de repasse dos recursos na forma de duodécimos, embora não prevista pela CF/88 para as
universidades, está dentro da margem de discricionariedade do Chefe do Poder Executivo na construção
da engenharia institucional mais adequada às necessidades e opções do Estado ou Município.
Obs: dizer que a Universidade receberá seus recursos em forma de duodécimo significa que se dividirá o
orçamento anual em 12 parcelas e, cada mês, ela terá direito a uma dessas parcelas. Duodécimo = uma
das doze partes iguais em que se dividiu um todo.
A definição do montante de recursos a ser destinado às Universidades estatais é competência do Poder
Executivo, e não pode ser abolida pelos Entes Federados com base em sua autonomia.
Apesar disso, a escolha da forma como esse repasse dos recursos é feita admite diferentes modelos,

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podendo os Entes federados, respeitada a competência privativa do Chefe do Poder Executivo, escolher
modelo diferente do previsto para a União, como uma forma de aprimoramento da gestão Universitária.
O art. 207 da CF/88 não determina que as Universidades recebam seu orçamento na forma de
duodécimos. Mas, ao se fazer uma interpretação sistemática da Constituição, não se encontra uma
vedação para que as Universidades recebam os repasses orçamentários na forma de duodécimos.
Assim, desde que respeitada a competência do Chefe do Poder Executivo para propor o modelo de
repasse de recursos, o repasse orçamentário por duodécimos encontra-se dentro da margem de
discricionariedade conferida aos Estados e Municípios para desenhar o arranjo institucional que melhor se
adeque às necessidades de suas Universidades.
Resumindo este segundo ponto:
É constitucional o repasse de recursos orçamentários para universidade estadual na forma de
duodécimos.
STF. Plenário. ADI 5946/RR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

É inconstitucional a criação de Procuradoria Jurídica própria para Universidade estadual


O art. 132 da CF/88 estabelece um modelo de advocacia pública fundado no princípio da unicidade de
representação judicial e de consultoria jurídica dos Estados e do Distrito Federal, exceção feita apenas às
Procuradorias autárquicas e fundacionais que já existiam quando do advento da Constituição.
Segundo o princípio da unicidade da representação judicial dos Estados e do Distrito Federal, os
Procuradores dos Estados e do Distrito Federal serão os únicos responsáveis pela representação judicial e
pela consultoria jurídica das respectivas unidades federadas.
Em outras palavras, só um órgão pode desempenhar as funções de representação judicial e de consultoria
jurídica nos Estados e DF e este órgão é a Procuradoria-Geral do Estado (ou PGDF).
Este “princípio” está previsto no art. 132 da CF/88:
Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o
ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos
Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria
jurídica das respectivas unidades federadas.

Desse modo, não pode o Estado-membro, por meio de sua Constituição ou legislação, instituir
procuradorias jurídicas próprias para a administração indireta.
As Universidades Estaduais possuem natureza jurídica de autarquia ou de fundação, integrando, portanto,
a Administração Pública indireta. Logo, a representação judicial e a consultoria jurídica das universidades
estaduais deve ser feita pela PGE.
Atenção. É possível que a lei determine que o cargo de Procurador-Geral da Universidade seja um cargo
em comissão, de livre nomeação e exoneração, podendo ser nomeado um jurista que não integre os
quadros da Procuradoria do Estado. É o entendimento do STF sobre o tema:
É constitucional lei estadual que preveja o cargo em comissão de Procurador-Geral da universidade
estadual. Esta previsão está de acordo com o princípio da autonomia universitária (art. 207 da CF/88).
STF. Plenário ADI 5262 MC/RR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 27 e 28/3/2019 (Info 935)

O que não pode é a criação de uma Procuradoria jurídica incumbida da representação judicial e da
consultoria jurídica da Universidade estadual.
Resumindo este terceiro ponto:
Não pode o Estado-membro, por meio de sua Constituição ou legislação, instituir procuradoria jurídica
própria para universidade estadual.
STF. Plenário. ADI 5946/RR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

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A escolha direta do Reitor e a iniciativa legislativa reservada


Nesse ponto, o Ministro entendeu que as alterações promovidas pela EC 61/2020, que possibilitaram à
Universidade estadual escolher seu próprio reitor, retirando qualquer participação do Chefe do Poder
Executivo no processo, bem como reservaram à Universidade iniciativa privativa para enviar projeto de lei,
incorrem em vício de inconstitucionalidade material por violação ao art. 2º da CF/88.
É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que preveja que a Universidade Estadual
escolherá seu reitor sem qualquer participação do Chefe do Poder Executivo no processo.
Também é inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que preveja iniciativa privativa da
Universidade Estadual para propor projeto de lei que disponha sobre sua estrutura e funcionamento
administrativo, bem como sobre suas atividades pedagógicas.
STF. Plenário. ADI 5946/RR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

DIREITO ADMINISTRATIVO

ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA
É dispensável a autorização legislativa para a alienação
de controle acionário de empresas subsidiárias

É desnecessária a autorização legislativa expressa para a criação de subsidiárias quando


houver autorização legislativa da criação de empresa pública ou sociedade de economia mista
e nesta constar permissão genérica da possibilidade de criação de subsidiárias. Assim, não se
exige lei específica para autorizar a criação de subsidiária.
Com base no paralelismo das formas, como não é exigida lei específica para criar a subsidiária,
também não é necessária lei específica para alienar o seu controle acionário.
Em palavras mais simples: como não se exige lei específica para criar, também não se exige lei
específica para “vender”.
STF. Plenário. ADPF 794/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

Para entendermos esse julgado, é necessário previamente relembrarmos o que decidiu o STF na ADI 5624.

ENTENDENDO A DECISÃO DO STF NA ADI 5624


Lei nº 13.303/2016
Sobre o que trata a Lei?
A Lei nº 13.303/2016 é o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas
subsidiárias. Ela se aplica a toda e qualquer EMPRESA PÚBLICA e SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
A Lei nº 13.303/2016 aplica-se a empresas públicas e sociedades de economia mista que:
• explorem atividade econômica; ou
• se dediquem à prestação de serviços públicos

Obs: também se submete ao regime desta Lei a sociedade, inclusive a de propósito específico, que seja
controlada por empresa pública ou sociedade de economia mista (art. 1º, § 6º).

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Empresa pública
Empresa pública é...
- a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado,
- com criação autorizada por lei e
- com patrimônio próprio,
- cujo capital social é integralmente detido pela União, pelos Estados, pelo DF ou pelos Municípios.

Observação importante:
É permitido que uma empresa pública seja formada por mais de um ente (ex: União e Estado-membro) ou
entidade (ex: Estado-membro e empresa pública federal). Veja o que diz a Lei:
Art. 3º (...)
Parágrafo único. Desde que a maioria do capital votante permaneça em propriedade da União, do
Estado, do Distrito Federal ou do Município, será admitida, no capital da empresa pública, a
participação de outras pessoas jurídicas de direito público interno, bem como de entidades da
administração indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Sociedade de economia mista


Sociedade de economia mista é...
- a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado,
- com criação autorizada por lei,
- sob a forma de sociedade anônima,
- cujas ações com direito a voto pertençam em sua maioria à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos
Municípios ou a entidade da administração indireta.

Criação das empresas estatais


Para que uma empresa estatal seja instituída, é necessária a edição de uma lei específica autorizando essa
criação, sendo essa lei de iniciativa do chefe do Poder Executivo, conforme prevê o art. 37, XIX c/c art. 61,
§ 1º, II, “b” e “e”, da CF/88:
Art. 37 (...)
XIX – somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa
pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste
último caso, definir as áreas de sua atuação;

Art. 61 (...)
§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:
(...)
II - disponham sobre:
(...)
b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e
pessoal da administração dos Territórios;
(...)
e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no
art. 84, VI;

Extinção das empresas estatais


Como a criação das empresas estatais necessita de uma lei prévia autorizando, prevalece o entendimento
de que, em razão do paralelismo (simetria) das formas, a extinção das empresas estatais também deve ser
precedida de autorização legislativa.

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Criação de uma subsidiária


Subsidiária é uma empresa controlada pela empresa pública ou pela sociedade de economia mista e que é
criada para atuar em ramos específicos. Ex: a Petrobras é uma sociedade de economia mista que possui
mais de 30 subsidiárias, dentre eles a Transpetro e a BR Distribuidora.
Para a criação de uma subsidiária, a CF/88 também exige a edição de lei autorizativa:
Art. 37 (...)
XX - depende de autorização legislativa, em cada caso, a criação de subsidiárias das entidades
mencionadas no inciso anterior, assim como a participação de qualquer delas em empresa privada;

No entanto, a doutrina e o STF, interpretando esse dispositivo, afirmam que a criação das subsidiárias não
precisa de autorização legislativa específica. Basta uma autorização genérica, que pode estar na lei que
autorizou a criação da empresa estatal matriz. Ex: uma lei específica autorizou a instituição da sociedade
de economia mista “XXX”. No corpo desta lei há uma previsão afirmando que essa sociedade de economia
mista “XXX” poderá instituir empresas subsidiárias ou controladas. Essa autorização “genérica” já é
suficiente e, assim, a sociedade “XXX” poderá criar quantas subsidiárias ou controladas quiser.
Foi como decidiu o STF:
(...) 2. É dispensável a autorização legislativa para a criação de empresas subsidiárias, desde que haja
previsão para esse fim na própria lei que instituiu a empresa de economia mista matriz, tendo em vista que a
lei criadora é a própria medida autorizadora. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.
STF. Plenário. ADI 1649, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgado em 24/03/2004.

Lei nº 13.303/2016
A Lei nº 13.303/2016 criou:
• novas hipóteses de licitação dispensável, previstas no art. 29; e
• novas situações em que a licitação é inexigível, elencadas no art. 30.

Vale ressaltar que essas hipóteses somente se aplicam para as empresas públicas, sociedades de economia
mista e suas subsidiárias, nos termos do art. 1º da Lei nº 13.303/2016.
Assim, uma autarquia, por exemplo, não poderá se valer dos arts. 29 e 30 da Lei nº 13.303/2016.

Regime especial de licitação


Importante salientar que a própria Constituição Federal previu que as empresas públicas e sociedades de
economia mista deveriam ter um regime especial de licitação, menos burocrática e que pudesse atender
às suas peculiaridades:
Art. 173. (...)
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e
de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens
ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
(...)
III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da
administração pública;

Venda de empresa estatal (inciso XVIII do art. 29)


O inciso XVIII do art. 29 da Lei nº 13.303/2016 trouxe a seguinte hipótese de licitação dispensável:
Art. 29. É dispensável a realização de licitação por empresas públicas e sociedades de economia
mista:

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(...)
XVIII - na compra e venda de ações, de títulos de crédito e de dívida e de bens que produzam ou
comercializem.

Decreto nº 9.188/2017 (regime especial de desinvestimento das sociedades de economia mista)


Em 2017, o Presidente da República, com base na dispensa de licitação prevista neste art. 29, XVIII, da Lei
nº 13.303/2016, editou o Decreto nº 9.188/2017 instituindo o regime especial de desinvestimento de
ativos das sociedades de economia mista. Este regime teve como objetivo alienar ativos pertencentes às
sociedades de economia mista federal.
O que seriam esses ativos que o Governo pretendia alienar (vender) sem fazer licitação?
• unidades operacionais pertencentes às sociedades de economia mista (ou suas subsidiárias);
• estabelecimentos pertencentes às sociedades de economia mista (ou suas subsidiárias);
• direitos e participações da sociedade de economia mista em outras sociedades.

Considera-se alienação qualquer forma de transferência total ou parcial de ativos para terceiros.

ADIs
Foram propostas algumas ADIs contra esse art. 29, XVIII, da Lei nº 13.303/2016 e o Plenário do STF julgou
a medida cautelar.
O STF concedeu parcialmente a medida cautelar para conferir ao art. 29, XVIII, da Lei nº 13.303/2016,
interpretação conforme à Constituição Federal, assentando as seguintes conclusões sobre esse dispositivo:
1) a alienação do controle acionário de empresas públicas e sociedades de economia mista exige
autorização legislativa e licitação;
2) a exigência de autorização legislativa, todavia, não se aplica à alienação do controle de suas subsidiárias
e controladas. Nesse caso, a operação pode ser realizada sem a necessidade de licitação, desde que siga
procedimentos que observem os princípios da administração pública inscritos no art. 37 da CF/88,
respeitada, sempre, a exigência de necessária competitividade.
STF. Plenário. ADI 5624 MC-Ref/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 5 e 6/6/2019 (Info 943).

Alienação de participação societária é privatização


Para o Min. Ricardo Lewandowski, a alienação de participação societária, inclusive de controle acionário, é
uma forma clássica de privatização. Isso porque se o Poder Público perde o controle acionário da entidade,
ou seja, se o controle acionário da sociedade de economia mista passa para a iniciativa privada, essa
entidade deixa de ser uma sociedade de economia mista. Na sociedade de economia mista, as ações com
direito a voto devem pertencer, em sua maioria, ao Poder Público. É como explicou o ex-Min. Sepúlveda
Pertence no julgamento da ADI 234/RJ:
“Alienar controle de sociedade de economia mista - se, como entendo eu, esse controle é
essencial ao próprio conceito constitucional de sociedade de economia mista -, é uma forma de
extingui-la enquanto sociedade de economia mista. Enquanto sociedade anônima, pode ela
sobreviver sob controle privado, mas já não será mais sociedade de economia mista que, repita-se,
segundo a Constituição constitui instrumento da política econômica do Estado, e pressupõe por
isso, controle estatal permanente.”

Assim, como a perda do controle acionário é equiparado à extinção da sociedade de economia mista, essa
operação precisa de autorização legislativa.
O STF possui, portanto, julgados afirmando ser imprescindível a autorização legislativa para que ocorra a
transferência do poder de controle de sociedades de economia mista. Nesse sentido:

Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 10


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(...) 3. “No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 234/RJ, ao apreciar dispositivos da


Constituição do Rio de Janeiro que vedavam a alienação de ações de sociedades de economia mista
estaduais, o Supremo Tribunal Federal conferiu interpretação conforme à Constituição da República, no
sentido de serem admitidas essas alienações, condicionando-as à autorização legislativa, por lei em
sentido formal, tão-somente quando importarem em perda do controle acionário por parte do Estado.
Naquela assentada, se decidiu também que o Chefe do Poder Executivo estadual não poderia ser privado
da competência para dispor sobre a organização e o funcionamento da administração estadual.” (ADI
1348/RJ, DJe 7/3/2008).
4. A autorização legislativa exigida “há de fazer-se por lei formal, mas só será necessária, quando se cuide
de alienar o controle acionário da sociedade de economia mista" e demais estatais. (ADI 234 QO/RJ, DJe
de 9/5/1997). (...)
STF. Plenário. ADI 1703, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 08/11/2017.

Acompanhe, mais uma vez, o raciocínio:


• o art. 37, XIX, da CF/88, afirma que somente por lei específica poderá ser autorizada a instituição de
empresa pública ou de sociedade de economia mista;
• a alienação do controle acionário de empresas públicas ou de sociedades de economia mista é
equiparada à extinção da empresa pública ou da sociedade de economia mista;
• por força do paralelismo das formas, somente por lei poderá ser autorizada a extinção de empresa
pública ou de sociedade de economia mista;
• logo, somente por lei poderá ser autorizada a alienação do controle acionário de empresa pública ou de
sociedade de economia mista.

O Estado não pode abrir mão da exploração de determinada atividade econômica, expressamente
autorizada por lei, sem a necessária participação do Parlamento, porque a decisão não compete apenas ao
chefe do Poder Executivo.

Modo de interpretar o art. 29, XVIII


Embora a redação do art. 29, XVIII, da Lei nº 13.303/2016 não trate expressamente sobre a necessidade ou
não de autorização legislativa, o STF entendeu que esta lacuna poderia gerar interpretações equivocadas,
expectativas ilegítimas e, consequentemente, insegurança jurídica.
Logo, é indispensável conferir interpretação conforme ao dispositivo para deixar claro que a venda de
ações das empresas públicas ou de sociedades de economia mista exige prévia autorização legislativa,
sempre que isso importar em perda do controle acionário (alienação do controle acionário).
Importante esclarecer que é plenamente possível a venda de parte das ações na Bolsa de Valores.
Contudo, a alienação do controle acionário precisa de lei autorizativa e de processo licitatório.

Entendi o motivo de se exigir autorização legislativa. Mas, e por que é necessária a licitação para a
alienação do controle acionário? Por que não se aplica a dispensa do art. 29, VIII, da Lei nº 13.303/2016?
O art. 4º, I e § 3º, da Lei nº 9.491/97, ainda vigente, exige, nos procedimentos de desestatizações, que a
alienação de participação societária, inclusive de controle acionário, seja feito por meio de licitação.
Essa disposição da Lei nº 9.491/97 é mais consentânea com a vontade do legislador constituinte.
“Nesse sentido, permitir a venda direta de ações, em montante suficiente a perder o controle societário
de empresa estatal, de maneira a impossibilitar a concorrência pública, poderia atentar contra o texto
constitucional, o qual consigna que as alienações serão realizadas ‘mediante processo de licitação pública
que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes’ (art. 37, XXI).” (Min. Ricardo Lewandowski).
Cumpre ressaltar, mais uma vez, que a licitação é dispensada quando a alienação das ações não importar a
perda de seu controle acionário.

Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 11


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Decreto nº 9.188/2017 criou procedimento de licitação não previsto na lei


Ainda para o Min. Lewandowski, o Decreto nº 9.188/2017, alegadamente fundado na Lei nº 13.303/2016,
dela desbordou ao criar procedimento de licitação não previsto na legislação, derrogando, ou
pretendendo derrogar implicitamente, a Lei nº 9.491/97.

E as subsidiárias e controladas?
Quanto às subsidiárias e controladas, o STF não fez as mesmas exigências.
O STF decidiu que não se exige autorização legislativa para a alienação do controle das subsidiárias e das
controladas pertencentes às empresas públicas ou sociedades de economia mista.
Além disso, a alienação do controle das subsidiárias e das controladas não precisa de prévia licitação,
sendo indispensável, no entanto, que essa alienação cumpra procedimentos que observem os princípios
da administração pública inscritos no art. 37 da CF/88, respeitada, sempre, a exigência de necessária
competitividade.

Por que existe esse tratamento diferenciado para a alienação do controle societário das subsidiárias e
controladas?
Porque, conforme já foi explicado mais acima, é desnecessária a autorização legislativa expressa para a
criação de subsidiárias quando houver autorização legislativa da criação de empresa pública ou sociedade de
economia mista e nesta constar permissão genérica da possibilidade de criação de subsidiárias (ADI 1649).
Assim, não se exige lei específica para autorizar a criação de subsidiária e, pelo princípio do paralelismo
das formas, também não se exige lei específica para a sua alienação.

ALIENAÇÃO DO CONTROLE ACIONÁRIO DA CEB-DISTRIBUIÇÃO (EMPRESA SUBSIDIÁRIA)


A situação concreta foi a seguinte:
A Companhia Energética de Brasília (CEB) é uma sociedade de economia mista, sendo que 80,2% de seu
controle acionário pertence ao Governo do Distrito Federal.
A CEB possui algumas subsidiárias. Uma delas era a CEB-Distribuição (empresa controlada integral).
Ocorre que a CEB queria fazer caixa e, para tanto, decidiu alienar o controle acionário da CEB-Distribuição.
Foi, então, publicado o Edital de Leilão nº 01/2020 destinado a alienar 100% do controle acionário da CEB-
Distribuição.
O Partido Comunista do Brasil (PC do B) ajuizou ADPF contra esse edital alegando, basicamente, que a
privatização não foi precedida de autorização legislativa, por meio de lei específica aprovada pela Câmara
Legislativa Distrital, o que teria violado o princípio da separação de poderes, a reserva do Poder
Legislativo, a repartição constitucional de competência e os princípios constitucionais relativos à gestão
das empresas públicas do Distrito Federal.
Além disso, o partido argumentou que a questão não se amolda ao que foi decidido na ADI 5624.

Cabe ADPF neste caso?


SIM.
Cabe ADPF contra Edital de Leilão sob o argumento de que ele teria violado o princípio da separação de
poderes, a reserva do Poder Legislativo e a repartição constitucional de competências.
STF. Plenário. ADPF 794/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

A arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) é uma ação prevista no art. 102, § 1º, da
CF/88. Confira:
CF/Art. 102 (...)
§ 1º A arguição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será
apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei.

Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 12


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Foi editada a Lei nº 9.882/99 para regulamentar a ADPF.


Trata-se de um instrumento de controle concentrado de constitucionalidade.
As hipóteses de cabimento da ADPF estão previstas no art. 1º da Lei nº 9.882/99:
Art. 1º A arguição prevista no § 1º do art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o
Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental,
resultante de ato do Poder Público.
Parágrafo único. Caberá também arguição de descumprimento de preceito fundamental:
I - quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo
federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição;

O Edital de Leilão pode ser enquadrado como ato do Poder Público.

A tese sustentada na ADPF foi acolhida pelo STF?


NÃO. O STF julgou improcedente o pedido formulado.
No julgamento da ADI 5624 MC-Ref/DF prevaleceu o entendimento de que a lei que autoriza a criação da
empresa estatal matriz é suficiente para viabilizar a criação de empresas controladas e subsidiárias, não
havendo que se falar em necessidade de autorização legal específica para essa finalidade.
Em outras palavras, a criação das subsidiárias não precisa de autorização legislativa específica. Basta uma
autorização genérica, que pode estar na lei que autorizou a criação da empresa estatal matriz. Ex: uma lei
específica autorizou a instituição da sociedade de economia mista “XXX”. No corpo desta lei há uma
previsão afirmando que essa sociedade de economia mista “XXX” poderá instituir empresas subsidiárias ou
controladas. Essa autorização “genérica” já é suficiente e, assim, a sociedade “XXX” poderá criar quantas
subsidiárias ou controladas quiser.
Assim, se é compatível com a CF/88 a possibilidade de criação de subsidiárias quando houver previsão na
lei que cria a respectiva empresa estatal, por paralelismo, não há como se proibir, por suposta falta de
autorização legislativa, a alienação de ações da empresa subsidiária, ainda que tal medida envolva a perda
do controle acionário do Estado.

Tentando ser mais claro:


• É desnecessária a autorização legislativa expressa para a criação de subsidiárias quando houver
autorização legislativa da criação de empresa pública ou sociedade de economia mista e nesta constar
permissão genérica da possibilidade de criação de subsidiárias. Assim, não se exige lei específica para
autorizar a criação de subsidiária.
• Com base no paralelismo das formas, como não é exigida lei específica para criar a subsidiária, também
não é necessária lei específica para alienar o seu controle acionário.
• Não se exige lei específica para criar. Logo, não se exige lei específica para “vender”.

É dispensável a autorização legislativa para a alienação de controle acionário de empresas subsidiárias.


STF. Plenário. ADPF 794/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13


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SERVIDOR PÚBLICO (REMUNERAÇÃO)


É inconstitucional norma que preveja que o teto remuneratório se aplica para todas as empresas
públicas e sociedades de economia mista, ou seja, mesmo aquelas que não recebam recursos da
Administração Pública

O teto constitucional remuneratório não incide sobre os salários pagos por empresas públicas
e sociedades de economia mista, e suas subsidiárias, que não recebam recursos da Fazenda
Pública.
Veja o que diz o § 9º do art. 37 da CF/88: “O disposto no inciso XI aplica-se às empresas
públicas e às sociedades de economia mista, e suas subsidiárias, que receberem recursos da
União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios para pagamento de despesas de
pessoal ou de custeio em geral.”
STF. Plenário. ADI 6584/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

A situação concreta foi a seguinte:


A Câmara Legislativa do Distrito Federal aprovou uma emenda à Lei Orgânica do DF afirmando que o teto
remuneratório se aplica para os empregados de todas as empresas públicas e sociedades de economia
mista. Confira o § 5º inserido no art. 19 da Lei Orgânica do DF:
Art. 19 (...)
X - para fins do disposto no art. 37, XI, da Constituição da República Federativa do Brasil, fica
estabelecido que a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos
públicos, dos membros de qualquer dos Poderes e dos demais agentes políticos do Distrito
Federal, bem como os proventos de aposentadorias e pensões, não poderão exceder o subsídio
mensal, em espécie, dos Desembargadores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios,
na forma da lei, não se aplicando o disposto neste inciso aos subsídios dos Deputados Distritais;
(...)
§ 5º Aplica-se o disposto no inciso X a todas as empresas públicas e às sociedades de economia
mista distritais, e suas subsidiárias. (parágrafo inserido pela emenda nº 99/2017)

O Governador do Distrito Federal ajuizou ADI contra essa emenda alegando que, segundo a CF/88, o teto
remuneratório não se aplica para empresas públicas e sociedades de economia mista que não recebam
financiamento público para pagamento de despesas com pessoal ou custeio em geral. Logo, ao ampliar a
incidência do teto para todas as empresas estatais, a emenda teria violado a Constituição Federal.

Esse argumento foi acolhido pelo STF?


SIM.
O teto constitucional remuneratório não incide sobre os salários pagos por empresas públicas e
sociedades de economia mista, e suas subsidiárias, que não recebam recursos da Fazenda Pública.
STF. Plenário. ADI 6584/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

Teto remuneratório
A CF/88 prevê, em seu art. 37, XI, o chamado “teto remuneratório”, ou seja, o valor máximo que os
agentes públicos podem receber no país. O objetivo do constituinte foi o de evitar que alguns agentes
públicos recebessem os chamados “supersalários”, que são incompatíveis com o serviço público.
Além de um teto geral (nacional), o dispositivo constitucional prevê limites específicos para o âmbito dos
Estados e Municípios (chamados de subtetos).
O teto geral do serviço público no Brasil é o subsídio dos Ministros do STF que, atualmente, está em R$
39.293,32 (bruto), conforme prevê a Lei nº 13.752/2018.
Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 14
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A quem se aplica o teto?


Aplica-se aos agentes públicos, independentemente do tipo de vínculo: estatutário, celetista, temporário,
comissionado, político.

O teto se aplica à Administração direta e indireta?


• Agentes públicos da administração direta: SEMPRE
• Agentes públicos das autarquias e fundações: SEMPRE
• Empregados públicos das empresas públicas e sociedades de economia mista: o teto somente se aplica
se a empresa pública ou a sociedade de economia mista receber recursos da União, dos Estados, do DF
ou dos Municípios para pagamento de despesas de pessoal ou de custeio em geral. É o que prevê o
art. 37, § 9º, da CF/88:
Art. 37 (...)
§ 9º O disposto no inciso XI aplica-se às empresas públicas e às sociedades de economia mista, e
suas subsidiárias, que receberem recursos da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos
Municípios para pagamento de despesas de pessoal ou de custeio em geral.

Desse modo, consoante o disposto no § 9º do art. 37 da Constituição Federal, a regra do teto


remuneratório aplica-se às empresas estatais que recebam recursos da Fazenda Pública para pagamento
de despesas de pessoal e de custeio em geral.
Logo, as empresas públicas e sociedades de economia mista que não receberem recursos da Fazenda
Pública para despesas de pessoal e para custeio em geral não estão submetidas ao teto.
Essa exceção existe porque as empresas públicas e sociedades de economia mista que não recebem
recursos da Administração Pública são aquelas que disputam o mercado, desenvolvendo atividades
econômicas. Assim, é necessário que os salários pagos sejam compatíveis com a remuneração praticada
no mercado, o que leva muitas vezes a remunerações mais altas que o teto. Exemplo em nível federal:
Petrobrás.

Interpretação conforme
Com base nesse entendimento, o Plenário do STF, por maioria, julgou procedente o pedido formulado em
ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Emenda à Lei Orgânica do Distrito Federal (LODF)
99/2017 e dar interpretação conforme à Constituição ao art. 19, X, da LODF, de modo que a expressão
“empregos públicos” se limite às entidades que recebam recursos do Distrito Federal para pagamento de
despesas de pessoal ou de custeio em geral.

Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 15


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DIREITO PROCESSUAL CIVIL


EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA
A chamada execução invertida é constitucional

Importante!!!
Não ofende a ordem constitucional determinação judicial de que a União proceda aos cálculos
e apresente os documentos relativos à execução nos processos em tramitação nos juizados
especiais cíveis federais, ressalvada a possibilidade de o exequente postular a nomeação de
perito.
STF. Plenário. ADPF 219/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 20/5/2021 (Info 1018).

Execução invertida
O CPC prevê que a execução contra a fazenda pública deverá ser deflagrada por iniciativa do credor
(exequente), que apresentará os cálculos do valor que entende devido. Nesse sentido, confira o que diz o
art. 534 do CPC:
Art. 534. No cumprimento de sentença que impuser à Fazenda Pública o dever de pagar quantia
certa, o exequente apresentará demonstrativo discriminado e atualizado do crédito contendo:
I - o nome completo e o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro
Nacional da Pessoa Jurídica do exequente;
II - o índice de correção monetária adotado;
III - os juros aplicados e as respectivas taxas;
IV - o termo inicial e o termo final dos juros e da correção monetária utilizados;
V - a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso;
VI - a especificação dos eventuais descontos obrigatórios realizados.

Ocorre que se percebeu que, na maioria das vezes, o credor é pessoa que dispõe de poucos recursos e que
não tem quem possa fazer esses cálculos. Essa realidade se mostra ainda mais evidente no caso dos
Juizados Especiais Federais. Pensando nisso, alguns juízes dos Juizados Especiais idealizaram uma
adaptação do procedimento, que ficou conhecida como “execução invertida”.
A execução invertida, em palavras simples, consiste no seguinte: havendo uma decisão transitada em
julgado condenando a Fazenda Pública ao pagamento de uma quantia considerada como de “pequeno
valor”, o juiz do Juizado Especial Federal intima o Poder Público (devedor) para que este elabore a planilha
de cálculos com o valor que é devido e apresente isso nos autos para análise do credor. Caso este
concorde, haverá o pagamento voluntário da obrigação e a execução se encerra rapidamente.
O ônus de preparar esses cálculos e pedir a execução seria do particular (credor). No entanto, com essa
sistemática, há uma inversão desse ônus, de forma que a própria Fazenda Pública, mesmo sendo a
devedora, é quem apresenta os cálculos da quantia devida. Vale ressaltar que esses cálculos, obviamente,
deverão ser realizados segundo os parâmetros que foram fixados pelo juízo na sentença/acórdão (título
executivo judicial).
A execução invertida é amplamente admitida nos Juizados Especiais Federais. Nesse sentido:
Enunciado nº 129 do FONAJEF: Nos Juizados Especiais Federais, é possível que o juiz determine que o
executado apresente os cálculos de liquidação.

ADPF
A União ajuizou uma ADPF para questionar decisões dos Juizados Especiais Federais do Rio de Janeiro que
impuseram a ela o dever da execução invertida, isto é, o dever de apurar ou indicar, nos processos em que
figure como ré ou executada, o valor devido à parte autora.
Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 16
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A União argumentou que a chamada execução invertida seria inconstitucional.

O STF acolheu o argumento da União? É inconstitucional a exigência feita pelo juízo no sentido de que a
Fazenda Pública apresente os documentos e faça os cálculos do quanto terá que pagar?
NÃO.
Não ofende a ordem constitucional determinação judicial de que a União proceda aos cálculos e
apresente os documentos relativos à execução nos processos em tramitação nos juizados especiais
cíveis federais, ressalvada a possibilidade de o exequente postular a nomeação de perito.
STF. Plenário. ADPF 219/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 20/5/2021 (Info 1018).

O STF considerou legítima a determinação de que, em decisões judiciais proferidas pelos Juizados Especiais
Federais, a União efetue os cálculos para a execução das verbas devidas nas ações em que for condenada.
Entre os princípios que regem o microssistema processual dos juizados especiais federais — versados na
Lei nº 9.099/95 e na Lei nº 10.259/2001 — estão os da simplicidade, da economia processual e da
celeridade. A legislação potencializa o acesso à Justiça.
Em regra, é do credor a iniciativa nas execuções civis, cabendo-lhe instruir a execução com os cálculos da
obrigação materializada no título. Apesar disso, não há vedação legal a que se exija a colaboração do
executado, principalmente quando se trata de ente da Administração Pública federal.
No âmbito dos juizados especiais federais, tudo indica ser possível a inversão da ordem. A relação
estabelecida entre o particular que procura o juizado e a União é, evidentemente, assimétrica. Logo,
impõe-se potencializar os poderes conferidos pelo CPC ao magistrado para restabelecer a efetiva
igualdade entre as partes.
A leitura atual do papel exercido pela Administração Pública dá primazia ao interesse público primário. A
própria legislação dos juizados pressupõe que a Administração agirá no intuito de buscar a efetividade dos
direitos dos administrados.
Exigir que exista sempre a intervenção de perito designado pelo juízo revela incompatibilidade com os
princípios da economia processual, da celeridade e da efetividade do processo.
A nomeação de perito representa custo ao Erário com os honorários correspondentes.
Além disso, os cálculos efetuados deverão ser posteriormente revistos pela própria Administração
fazendária a fim de verificar o acerto do valor apurado.
De igual modo, se o exequente apresentar valor excessivo, caberá à Fazenda declarar de imediato o valor
que entenda correto.
Logo, como a Fazenda Pública terá que sempre analisar o valor, melhor que já faça isso de início,
facilitando todo o processo.
Acrescente-se, ainda, que, em última análise, o dever de colaboração imputável ao Estado decorre dos
princípios da legalidade, da moralidade, da eficiência, e do subprincípio da economicidade.
Obs: vale ressaltar que, apesar de a tese fixada pelo STF falar apenas em União, é possível que seu
raciocínio seja também aplicado para as entidades federais, como o INSS, e para os outros entes
federativos, como Estados, DF e Municípios.

O credor será obrigado a aceitar a execução invertida?


NÃO. O credor pode fazer absoluta questão de que os cálculos sejam realizados por terceiro imparcial
(perito do juízo). Em tais hipóteses, ele deverá formular requerimento expresso, incumbindo ao Estado
viabilizar a atuação do perito.

Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 17


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DIREITO TRIBUTÁRIO

DIREITO FINANCEIRO
É inconstitucional o bloqueio ou sequestro de verba pública, por decisões judiciais, de empresa
estatal prestadora de serviço público em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário

Os recursos públicos vinculados ao orçamento de estatais prestadoras de serviço público


essencial, em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário, não podem ser
bloqueados ou sequestrados por decisão judicial para pagamento de suas dívidas, em virtude
do disposto no art. 100 da CF/1988, e dos princípios da legalidade orçamentária (art. 167, VI,
da CF), da separação dos poderes (arts. 2°, 60, § 4°, III, da CF) e da eficiência da administração
pública (art. 37, caput, da CF).
STF. Plenário. ADPF 616/BA, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte:


A Justiça do Trabalho proferiu diversas decisões judiciais determinando o bloqueio, arresto, penhora e
sequestro de valores integrantes do orçamento da Empresa Baiana de Águas e Saneamento - EMBASA, para
pagamento de indenizações trabalhistas, sem observância do regime de precatórios (art. 100 da CF/88).
Vale ressaltar que a EMBASA é uma sociedade de economia mista responsável pela execução da política
de abastecimento de água e de esgotamento sanitário no Estado da Bahia. Seu capital social é composto
por 99,69% de ações pertencentes ao referido Estado.
O Governador ajuizou ADPF contra esse conjunto de decisões judiciais alegando que houve violação a
diversos preceitos fundamentais, em especial àqueles referentes ao sistema orçamentário.
Defendeu a plena aplicabilidade do sistema constitucional de precatórios à estatal e requereu a extensão
das prerrogativas inerentes à atuação da Fazenda Pública em juízo à prestadora de serviço público.

Primeira pergunta: cabe ADPF neste caso?


SIM.

Mas essas decisões não poderiam ser impugnadas individualmente? Ex: não seria possível que o Estado
interpusesse recursos contra essas decisões da Justiça do Trabalho?
SIM. Essas decisões podem ser impugnadas individualmente.

O fato de as decisões poderem ser impugnadas individualmente prejudica o cabimento da ADPF? Um


dos requisitos da ADPF é a subsidiariedade...
De fato, um dos requisitos da ADPF é a subsidiariedade.
A subsidiariedade da ADPF está prevista expressamente no art. 4º, § 1º, da nº 9.882/99: “a arguição não
será admitida quando houver qualquer outro meio de sanar a lesividade”.
Assim, só cabe ADPF se não houver outro meio eficaz de sanar a lesão.
Vale ressaltar, no entanto, que o fato de existirem ações, incidentes processuais ou recursos que poderiam
ser manejados nas instâncias ordinária ou extraordinária não exclui, por si só, a admissibilidade de ADPF.
Isso porque o requisito de subsidiariedade deve ser compreendido pela inexistência de meio processual
apto a sanar a controvérsia de forma geral e imediata.
Não havia outro meio eficaz para se declarar, de forma ampla, geral e imediata, a inconstitucionalidade
desse conjunto de decisões.
Desse modo:
A ADPF pode ser ajuizada para impugnar um conjunto de decisões judiciais tidas como violadoras de
preceitos constitucionais fundamentais.
STF. Plenário. ADPF 588/PB, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 26/4/2021 (Info 1014).

Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 18


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Superada a questão do cabimento, vamos ao mérito. Essa constrição das verbas públicas foi uma
medida acertada? As decisões da Justiça do Trabalho foram mantidas?
NÃO.
É inconstitucional o bloqueio ou sequestro de verba pública, por decisões judiciais, de empresa estatal
prestadora de serviço público em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário.
STF. Plenário. ADPF 616/BA, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

A EMBASA é uma empresa estatal que desempenha serviço público essencial de saneamento básico (art.
23, IX, CF/88), compreendendo a captação, tratamento e distribuição de água, bem como a coleta,
transporte, tratamento e destinação adequada de esgoto, em regime não concorrencial e sem intuito
lucrativo primário.
Desse modo, o bloqueio e a penhora dos recursos da EMBASA violam:
• o sistema constitucional de precatórios;
• o princípio da legalidade orçamentária;
• o princípio da separação dos Poderes; e
• o princípio da eficiência administrativa.

Precatório
A jurisprudência do STF afirma que o regime constitucional dos precatórios deve ser aplicado também
para as empresas estatais que prestam serviço público em regime não concorrencial e sem intuito
lucrativo primário.
Logo, as decisões judiciais que determinam o bloqueio e o sequestro de verbas dessas empresas são
inconstitucionais por violarem o regime de precatórios (art. 100 da CF/88).

Princípio da legalidade orçamentária


A Constituição veda a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma programação
para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa:
Art. 167. São vedados:
VI - a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de
programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa;

São balizas constitucionais para alocação e utilização de recursos públicos.


Justamente por isso, quando a Justiça do Trabalho determina o uso de verbas alocadas para a execução de
determinada finalidade (habitação popular) em finalidades diversas (pagamento de dívidas trabalhistas),
isso viola normas constitucionais relacionadas com a legalidade orçamentária (art. 167, VI).

Princípio da separação dos Poderes


Ademais, o princípio da legalidade orçamentária está estritamente vinculado ao princípio da separação
dos Poderes (arts. 2º e 60, § 4º, III, da CF/88).
A exigência de lei para a modificação da destinação orçamentária de recursos públicos tem por finalidade
resguardar o planejamento chancelado pelos Poderes Executivo e Legislativo no momento de aprovação
da lei orçamentária anual. É nessa ocasião que se definem as prioridades de atuação da Administração,
isto é, que se apontam as políticas e os serviços públicos que deverão ser implementados ou aprimorados
no exercício financeiro respectivo.
A ordem constitucional rechaça a interferência do Judiciário na organização orçamentária dos projetos da
Administração Pública, salvo, excepcionalmente, como fiscalizador.

Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 19


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Princípio da eficiência administrativa


Entende-se, por fim, que, no caso, os atos jurisdicionais impugnados, ao bloquearem verbas orçamentárias
para o pagamento de indenizações trabalhistas, atuaram como obstáculos ao exercício eficiente da gestão
pública, subvertendo o planejamento e a ordem de prioridades na execução de projetos sociais do Poder
Executivo local, o que caracteriza desrespeito ao princípio da eficiência da Administração Pública (art. 37,
caput, da CF/88).

Em suma:
Os recursos públicos vinculados ao orçamento de estatais prestadoras de serviço público essencial, em
regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário, não podem ser bloqueados ou sequestrados
por decisão judicial para pagamento de suas dívidas, em virtude do disposto no art. 100 da CF/1988, e
dos princípios da legalidade orçamentária (art. 167, VI, da CF), da separação dos poderes (arts. 2°, 60, §
4°, III, da CF) e da eficiência da administração pública (art. 37, caput, da CF).
STF. Plenário. ADPF 616/BA, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente arguição de
descumprimento de preceito fundamental. Vencido o ministro Marco Aurélio.

Tudo o que o autor pediu na ADPF foi concedido?


NÃO. O Governador havia também pedido a extensão das prerrogativas processuais da Fazenda Pública à
EMBASA. Neste ponto, o pedido não foi nem sequer conhecido.
O STF decidiu que a ADPF não deveria ser conhecida quanto ao pedido de extensão, à EMBASA, das
demais prerrogativas processuais da Fazenda Pública, tais como o prazo em dobro para recorrer, a isenção
de custas processuais e a dispensa de depósito recursal, por dois motivos:
a) não há, na inicial, um fundamento sequer para esse pedido;
b) as prerrogativas processuais da Fazenda Pública têm sede infraconstitucional e, portanto, inexiste
parâmetro normativo para o controle concentrado de constitucionalidade. Em outras palavras, não cabe
ADPF para veicular tal pedido.

Informativo 1018-STF (28/05/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 20


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comentado

EXERCÍCIOS

Julgue os itens a seguir:


1) É constitucional emenda à constituição estadual que confere autonomia financeira e orçamentária
próprias de órgãos de Poder à universidade estadual. ( )
2) É inconstitucional o repasse de recursos orçamentários para universidade estadual na forma de
duodécimos. ( )
3) Não pode o estado-membro, por meio de sua Constituição ou legislação, instituir procuradoria jurídica
própria para universidade estadual. ( )
4) É constitucional dispositivo da Constituição Estadual que preveja que a Universidade Estadual escolherá
seu reitor sem qualquer participação do chefe do poder executivo no processo. ( )
5) É constitucional dispositivo da Constituição Estadual que preveja iniciativa privativa da Universidade
Estadual para propor projeto lei que disponha sobre sua estrutura e funcionamento administrativo,
bem como sobre suas atividades pedagógicas. ( )
6) É dispensável a autorização legislativa para a alienação de controle acionário de empresas subsidiárias. ( )
7) O teto constitucional remuneratório não incide sobre os salários pagos por empresas públicas e
sociedades de economia mista, e suas subsidiárias, que não recebam recursos da Fazenda Pública. ( )
8) Ofende a ordem constitucional determinação judicial de que a União proceda aos cálculos e apresente
os documentos relativos à execução nos processos em tramitação nos juizados especiais cíveis federais,
ressalvada a possibilidade de o exequente postular a nomeação de perito. ( )
Gabarito
1. E 2. E 3. C 4. E 5. E 6. C 7. C 8. E

OUTRAS INFORMAÇÕES
3 INOVAÇÕES NORMATIVAS STF

RESOLUÇÃO STF 733 de 20.5.2021 - Torna público o Quadro de cargos efetivos dos servidores do Supremo Tribunal
Federal.
RESOLUÇÃO STF 734 de 24.5.2021 - Altera a Resolução 638/2019.

Supremo Tribunal Federal - STF


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O Informativo original do STF é uma publicação elaborada Secretaria de Altos Estudos, Pesquisas e Gestão
da Informação da Corte na qual são divulgados resumos das teses e conclusões dos principais julgamentos
realizados pelo STF.
O Informativo comentado do Dizer o Direito tem por objetivo apenas explicar e sistematizar esses julgados.
Vale ressaltar que os argumentos expostos foram construídos nos votos e debates decorrentes dos
julgados. Portanto, a autoria das teses e das razões de convencimento são dos Ministros do STJ e do STF,
bem como de sua competente equipe de assessores.
INFORMATIVO STF. Brasília: Supremo Tribunal Federal, Secretaria de Altos Estudos, Pesquisas e Gestão da
Informação. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/textos/verTexto.asp? servico=informativoSTF.

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