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Vigiar e punir: o nascimento da prisão


Nessa obra, Foucault analisa os processos evolutivos das práticas punitivas, seus objetivos,
suas tecnologias e suas instituições. em seu livro, é possível observar a narrativa de uma
redistribuição da economia do castigo, das novas teorias que transformam o sistema penal e
das formas jurídicas decorrentes da verdade, trazendo sempre uma justificação moral e
política do direito de punir.
Em seu estudo, o autor explica as motivações e as técnicas por trás os procedimentos
punitivos desde o suplício no século XVI, até o surgimento das organizações prisionais como
instituições legítimas do sistema penal, a partir do século XVIII
Sua obra conta com quatro partes denominadas, respectivamente de Suplício, Punição,
Disciplina e Prisão. Já no início da obra, Foucault afirma que ao longo do tempo, as penas
sofrem uma mudança de objetivo.
Em um primeiro momento o autor descreve no capítulo suplício, a punição sendo feita em
cerimônias públicas e violentas, denominando-as como um espetáculo da decapitação. Nesse
sentido, o castigo acaba por se tornar um ato com finalidade corretiva, que garante que as leis
sejam cumpridas e promove a manutenção constante do poder sobre os corpos condenados.
Partindo desse viés vê se que o poder não é ligado ao autoritarismo e a vingança, mas a uma
microfísica onipresente que garante a centralização do poder de forma continua e
ininterrupta.
“A punição deixa o campo da percepção quase diária e
entra no da consciência abstrata. A certeza de ser
punido é que deve desviar o homem do crime e não mais
o abominável teatro” (FOUCAULT, 2014, p. 14).

Para confirmar o argumento, Foucault quartinho do suplício caracteriza o como um


procedimento físico político em que a partir de um ritual ostensivo de sofrimento e mutilação,
o corpo castigado torna-se uma ferramenta para a produção da verdade e confirmação do
poder soberano perante a todos os subalternos. Nesse sentido Foucault afirma que o culpado
seria “o arauto da própria pena” (FOUCAULT, 2014, P.47) e ponha explícito de forma rígida
aos olhos do povo a assimetria de poder entre os súditos e a irrefreável força da majestade
impetuosa.
No entanto, como ninguém consegue ficar muito tempo sendo torturando a partir do século
XVIII iniciou-se os protestos contra os suplícios, que contam com a participação de inúmeros
filósofos, juristas e legisladores que exigem um sistema mais eficaz de punição. A partir
desse momento é que o autor começa a construir a segunda parte de sua obra, em que surgem
cada vez mais teorias arquitetadas pelos reformadores sobre uma possível nova modalidade
institucional da prisão. Esses reformadores defendiam que deveria haver um processo
expositivo de exemplificação da pena, ou seja, acreditavam que ao colocar a população em
contato com as possíveis formas de castigo caso viessem a praticar algum delito deixaria mais
cautelosa e repreensiva ao pensar em descumprir a lei. Esse sistema descrito teria como
finalidade converter os criminosos em corpos submissos mecânicos e produtivos.

1 Ana B. Romanosque
Já na terceira parte do livro Foucault disserta sobre os esquemas disciplinares que se
espalharam, com o tempo, por toda a camada do corpo social. A partir desse ponto o autor
caracteriza essa sociedade como uma “sociedade disciplinar” (FOUCAULT, 2014, p. 202).
A disciplina revela-se como um método que possibilita o pleno controle e força a sujeição
dos indivíduos, para obter como resultado o que Foucault denomina de corpo dócil, ou seja,
faz com que os indivíduos sejam dóceis e úteis ao sistema capitalista. O sistema de controle
torna-se um eficiente meio de adestramento, uma vez que utiliza da vigilância constante,
trabalhos obrigatórios e sanções normalizadoras como forma de controle da população.
A mecânica das disciplinas começa a dominar quartéis, escolas, hospitais e nas prisões onde
acabam sem razão.
A partir desse pensamento, Michel Foucault indaga que:
“devemos nos admirar que a prisão se pareça com as
fábricas, com as escolas, com os quartéis, com os
hospitais, e todos se pareçam com as prisões?”
(FOUCAULT, 2014, p. 219).

E nesse sentido, o poder contido na sociedade disciplinar acaba se tornando microfísico e seu
funcionamento automático (FOUCAULT, 2014, p.203).
O fenômeno de panoptismo, Jeremy Bentham, se encaixa nesse contexto pois determina os
meios pelos quais se exerce uma nova forma de poder, mas eficaz, mas sutil, e ao mesmo
tempo mais austera. Os indivíduos passam a obter a sensação de que estão constantemente
sendo vigiados, mesmo que este não seja o caso.
Na última parte de sua obra, Foucault detém análise das prisões e dos motivos de sua
consolidação. Um fator essencial desse sucesso é o da não imposição legislativa das prisões
como forma padrão de punir, entretanto de seu crescimento orgânico em meio à sociedade da
disciplina.
Diante de tamanho aparato tecnológico e metodológico das disciplinas, as visões passam a
evoluir em um sistema carcerário detentor de grande autonomia e fonte do acabou sua
epistemológico própria, que faz do delinquente seu principal objeto.
Queria ser assim uma nova classe social anômala deficiente e que conduz a simples infração
ao delito, transforma um infrator em delinquente e torna-o uma engrenagem da indústria
carcerária.
“O delinquente se distingue do infrator pelo fato de não ser
tanto seu ato quanto sua vida o que mais o caracteriza (...) o
castigo legal se refere a um ato; a técnica punitiva a uma vida”
(FOUCAULT, 2014, p. 245).

Portanto, observa -se que a evolução das práticas punitivas são resultado da sobreposição de
uma longa série de processos sociais políticos históricos e econômicos.
A respeito do panorama moderno de punição é possível afirmar que se sustenta da mesma
forma em diversos alicerces variados em suas operações.
As prisões cumprem um papel social que vai além da punição ou da correção do infrator, mas
na tentativa de reintroduzir na sociedade. Os delinquentes por sua vez acabam se tornando
matéria-prima do sistema industrial carcerário, que acaba se tornando a condição do sine qua
non de uma ordem social, desigual e segmentada que mantém estável a dicotomia entre
normais e anormais, cidadão e delinquentes, classes e subclasse. A manutenção desse
dualismo que alimenta a sociedade atual é a essência da forma mais profunda de
manifestação de poder nas instituições sociais modernas.
Por fim Michel Foucault encerra o livro com a seguinte frase:
“interrompo aqui este livro que deve servir como pano
de fundo histórico para diversos estudos sobre o poder
de normalização e sobre a formação do saber na
sociedade moderna” (FOUCAULT, 2014, p. 302);

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