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RESUMO RESUMEN
Este artigo tem por objetivo inserir a conquis- Este artículo tiene como objetivo insertar la
ta da Paraíba em um contexto histórico mais conquista de Paraíba en un contexto histórico
abrangente, conectado à consolidação da Mo- más amplio, vinculado a la consolidación de la
narquia Hispânica na América portuguesa. A Monarquía hispánica en la América portuguesa.
ocupação do território respondia a duas de- La ocupación del territorio respondió a dos
mandas principais: a necessidade de proteger demandas principales: la necesidad de proteger
a região contra os ataques dos franceses e, ao la región contra los ataques franceses y, al
mesmo tempo, ser um anteparo da última fron- mismo tiempo, ser un escudo de la última
teira em direção ao Peru. A ocupação daquele frontera hacia Perú. La ocupación de ese
território foi uma das iniciativas prioritárias da territorio fue una de las iniciativas prioritarias de
dinâmica dos Habsburgo para o Atlântico, pro- la dinámica de los Habsburgo para el Atlántico,
jeto que pode ser deduzido a partir da análise proyecto que se puede deducir del análisis de
da documentação oficial e também de fontes, la documentación oficial y también de fuentes,
referentes ao período filipino, que ainda não referentes al período filipino, que aún no habían
haviam sido exploradas. sido exploradas.
O ESTREITO E A NAVEGAÇÃO
a situação da Espanha nos Países Baixos, massacrada por forças sob o comando
com repercussão na Inglaterra, levaram o do Vice-Rei do México. Sobrevivendo a
governo inglês a se acautelar com relação esse episódio, Drake teria iniciado, em
às intenções de Filipe II e a ser furtiva- represália, nos anos que se seguiram,
mente receptivo a ações que acometes- sucessivos ataques e saques a portos e
sem pontos vulneráveis dos espanhóis, embarcações da Espanha na região do
tais como suas embarcações nos mares Caribe, culminando, em 1573, no istmo do
e as desprotegidas regiões costeiras de Panamá, com a apreensão de um grande
suas possessões (ZAMBRANO PEREZ, carregamento de prata, o que lhe permitiu
2007, p. 43). um confortável e temporário afastamento
Por essa época, um grupo de inves- da vida nos mares, até o tempo em que
tidores ingleses decidiu constituir uma lhe foi dado o comando da frota que teria
pequena frota de cinco navios que teria Alexandria como destino (ORTIGUEIRA
como destino declarado o Mediterrâneo AMOR et al, 2014). Os barcos liderados
Oriental, mais precisamente Alexandria. por Drake deixaram Plymouth, na Ingla-
Mas, esta não era a real rota a ser segui- terra, em dezembro de 1577. Quando es-
da na viagem. A preparação da expedi- tavam em mar largo, Drake comunicou
ção foi cercada de todo o sigilo possível, aos navegantes que, na realidade, o des-
no sentido de esconder o seu verdadeiro tino da viagem seria o sul da América. Ao
destino, tanto dos espanhóis como até chegar ao Cabo Verde, nas proximidades
mesmo de alguns influentes membros do da costa da África, de onde seria feita a
governo, em particular William Cecil, Lord travessia para o litoral brasileiro, Drake
Burghley, um dos principais conselheiros encontrou uma embarcação portuguesa,
da Rainha Isabel I, que se preocupava em cujo piloto tinha conhecimento e perícia
evitar transgressões que viessem provo- relacionados aos mares do sul, o que seria
car conflitos com a Espanha. Dentre os de grande valia na expedição (NUTTALL,
apoiadores do empreendimento encon- 1914, p. 296). A nau acabou sendo tomada
travam-se várias proeminentes figuras li- por Drake sendo também capturado o seu
gadas à Coroa britânica o que levou John piloto, o portuense Nuno da Silva, que foi
Horace Parry a afirmar que uma iniciativa incorporado à viagem, da qual deixou im-
de tal porte, com o tipo de investidores portante relato1.
que dela participavam, demandaria, pelo O único registro documental existente
menos, o velado assentimento de Isabel sobre o percurso planejado para a viagem
I, que, provavelmente, também teria feito de Drake é um manuscrito de 1577, par-
subliminar aplicação de capitais na inicia- cialmente danificado, em que se propõe
tiva (PARRY, 1984, p. 3). que a expedição faça uma prospecção
Para comandar a empresa, da qual era da costa meridional da América do Sul,
também um dos investidores, foi escolhi- alcance o Pacífico através do Estreito de
do o já na época afamado Capitão Francis Magalhães, navegue pela costa até 30º
Drake. Iniciado nas artes náuticas ainda de latitude sul (na altura de Coquimbo no
adolescente, Drake, aos 20 anos, era mes- Chile atual), explorando as possibilidades
tre de navio e encontrava-se, em 1568, no de comércio e povoamento, em seguida
porto mexicano de San Juan de Ulúa, em retornando pelo mesmo percurso. Essa
uma flotilha que desafiava a proibição es- rota marítima, no extremo sul do con-
panhola de comércio de estrangeiros com tinente americano, ligando os oceanos
suas colônias, e que foi impiedosamente Atlântico e Pacífico, havia sido explorada
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durante a Monarquia Hispânica
pela primeira vez, em 1520, pelo portu- estivesse, há vinte anos, no Peru. Com ca-
guês Fernão de Magalhães, navegando no pacidades multifacetadas, como militar,
sentido leste-oeste, no comando de uma cosmógrafo e geógrafo, Pedro Sarmiento
pequena frota espanhola (GRUZINSKI, era também cronista, tendo deixado várias
2015, p. 36). Desde então, a navegação relaciones, diversos memoriales, poesias
por essa passagem interoceânica havia e a famosa “Historia de los Incas”, escrita
sido intentada pouquíssimas vezes, antes em 1572 (MIGUEL BARROS, 2006, p. 26).
da expedição de Drake. As condições da A expedição de combate a Drake, com-
região austral, com mares bravios, fortes posta de duas embarcações, com 92 ma-
ventos, baixas temperaturas e a própria rujos e soldados, e plenamente aprovisio-
distância desaconselhavam a utilização nada de armas e munições, navegou para
dessa passagem, que tomou o nome do os mares do sul, à espera do retorno do
seu explorador primeiro, como rota das corsário inglês para o Estreito com o fruto
embarcações espanholas com destino às dos seus saques. Estando na costa norte
suas colônias nas costas do Pacífico, que do Pacífico, se apresentavam para Drake
continuaram a ser atendidas pelo Caribe e três alternativas de rotas. A primeira se-
istmo do Panamá. Drake fez a travessia do ria o retorno cumprindo o mesmo trajeto
Estreito em dezesseis dias, chegando ao anterior, com a perspectiva de encontrar
Pacífico com sua flotilha reduzida apenas os espanhóis para interceptá-lo. Outra
à embarcação que ele próprio capitanea- opção, encontrar o hipotético e lendário
va. As demais naus, por motivos vários, fo- Estreito de Anian, o que seria o caminho
ram abandonadas (PARRY, Idem, p. 4; 6). mais curto para se chegar à Inglaterra.
Ao percorrer as costas das possessões Francis Drake decidiu, então, cruzar o Pa-
espanholas, o corsário inglês encontrou-as cífico, alcançar as Molucas, e, utilizando o
totalmente desguarnecidas e iniciou uma caminho português para as Índias, contor-
série de saques e ataques aos portos do nar o Cabo da Boa Esperança retornando
Chile e Peru. Navegando para o norte, as- a Plymouth, três anos após a sua partida,
saltou o navio castelhano Nuestra Señora concluindo a segunda circum-navegação
de La Concepcion, que apesar de apelidado da Terra. O corsário saqueador das terras
Cacafuego estava praticamente desarma- e naus espanholas foi recebido na Ingla-
do, com valiosíssima carga, “twenty-six terra com honras de herói e condecorado
tons of silver, thirteen chests of rials of com o título de Sir pela Rainha (WALLIS,
plate, eighty pounds of gold, besides dia- 1984, p. 122).
monds and inferior gems”, talvez o maior Malograda teria sido a viagem de Pedro
saque realizado por corsários e piratas Sarmiento para o Estreito, se outras razões
naqueles tempos (JOHNSTONE, 1837, p. tão mais importantes que o combate a Drake
68-69). Diante dessa situação o Vice-Rei não a tivessem motivado. A Instruccion por
do Peru encetou providências para a per- ele recebida do Vice-Rei do Peru, dentre ou-
seguição a Drake, na presunção de que tras recomendações, as explicitava:
ele retornaria, navegando pela mesma rota
através do Estreito, no sentido oeste-leste. VI. Al tiempo que os halláredes
Para chefiar a expedição de perseguição en la altura de la Entrada del
Estrecho iréis con mucho
a Drake foi escolhido Pedro Sarmiento
mayor cuidado de ver todas las
de Gamboa. De origem familiar gallega, particularidades de Mar e Tierra
Sarmiento encontrava-se, desde 1555, na que halláredes atendiendo á las
América espanhola, sendo provável que comodidades de Poblaciones
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que por alli puede haber [...] y Coroa lusitana (KAMEN, 2003, p. 257).
procurad con vigilancia saber Àquela altura, Filipe II já sabedor, há cerca
todas las Bocas que tiene el dicho de um ano, das pilhagens de Drake, tinha
Estrecho á la entrada por esta Mar,
recebido parecer do Vice-Rei do Peru
y medirlas poniéndoles nombres
á quantas fueren, midiéndolas sugerindo que a melhor solução, a curto
así por lo ancho como por lo prazo, seria a construção de embarcações
fondo, y mirando en qual dellas para patrulhamento da entrada do Estrei-
hai mayores comodidades para to. Essa providência, após aprovação do
fortalecerlas2. Consejo de Indias, havia se iniciado, mas,
Sarmiento de Gamboa percorreu o Es- foi interrompida pela carência de fundos
treito de Magalhães, no sentido leste-oes- da Coroa (PHILLIPS, 2016, p. 8-9). Preocu-
te, em trinta e dois dias, elaborando um pações várias do Rei com acontecimentos
levantamento detalhado das condições e em que os espanhóis estavam envolvidos
características do local, em cumprimento diretamente vinham postergando a execu-
às Instruções que havia recebido. Ao se de- ção da emergente medida proposta.
parar com o Atlântico, Sarmiento navegou Pedro Sarmiento de Gamboa deslo-
rumo à Espanha para fazer a entrega do cou-se para Badajoz para apresentar ao
seu relatório ao Rei. Depois de três meses Rei o relato da sua viagem e expor as suas
em mar alto, chegou com sua embarcação considerações sobre a defesa do Estrei-
ao porto de Santiago no Cabo Verde. De to. Filipe II submeteu a proposta de Sar-
acordo com seu relato, “fueron barcos del miento de Gamboa ao Consejo de Indias,
Pueblo á saber qué Nao era, y la gente que e pediu a avaliação de conhecedores da
era, y de onde venía: e como se les dixo matéria. Apesar da contestação por parte
que éramos del Pirú, y veníamos de allá de alguns conselheiros reais, sob alega-
por el Estrecho de Magallánes, enmude- ção do elevado custo da empreitada em
cían no creyéndolo, y teniéndolo por im- relação à construção de embarcações, o
posible […]” (SARMIENTO DE GAMBOA, monarca decidiu aprovar o plano de Pedro
1768, p. 342). Durante a sua permanência Sarmiento. Como se veria posteriormente,
na Ilha de Santiago, onde aportavam naus as agressivas condições do local não per-
que singravam o Atlântico, Sarmiento pro- mitiam um aumento significativo da nave-
curou, já que os ventos o tinham levado gação marítima para o Pacífico através do
a navegar para longe da costa brasileira, Estreito de Magalhães. As informações,
obter notícias diversas sobre incursões de não muito corretas, sobre o lugar, trazidas
corsários e piratas e a presença de foras- por Sarmiento, provavelmente influen-
teiros nas terras americanas. ciaram na decisão real de construção
dos dois fortes no Estreito, que serviriam
A ARMADA DO ESTREITO como defesas que desestimulassem a re-
Quando Pedro Sarmiento de Gamboa petição, por outros corsários, da emprei-
chegou à Espanha, em agosto de 1580, tada de Drake, criando uma rota de na-
trazendo o relatório da sua investigação vegação para o Pacífico pela região, com
no Estreito de Magalhães para apresentar reflexos na segurança das possessões
a Filipe II, o Rei se encontrava, há meses, castelhanas do Chile e Peru.
na cidade espanhola de Badajoz, fron- Em fevereiro de 1581, foram iniciados
teiriça a Portugal, onde concentrara seu os preparativos para a realização da em-
exército de 47 mil homens para adentrar presa e constituída uma comissão para
o país vizinho, reclamando seu direito à tratar dos diversos aspectos do empre-
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endimento. O Duque de Alba, o Marquês boa que imaginava, por ter persuadido
de Santa Cruz, juntamente com outras Filipe II à adoção do seu plano de cons-
figuras notáveis do Reino, discutiam a trução de fortes e colonização do Estreito,
logística militar da expedição, o número deveria caber a ele o comando da empresa
e tipos de embarcações, o quantitativo (PHILLIPS, 2016, p. 10).
de soldados e marinheiros e a artilharia As relações de Flores de Valdés com Fi-
a ser usada nos fortes. Um grupo de en- lipe II eram antigas. Com idade próxima à
genheiros de origem italiana que então do Rei, o asturiano fez parte da esquadra
serviam à Monarquia Hispânica analisava que levou à Inglaterra o então Príncipe
os detalhes construtivos do projeto dos para o seu casamento com Maria Tudor
fortes. Nessas discussões, Sarmiento de (ALVAREZ DE LA RIVERA, 1924, p. 153).
Gamboa se fazia presente com os dados Esse conhecimento de muitos anos com
e informações que coletara sobre a região o soberano dava a Flores de Valdés uma
na sua viagem ao Estreito (ZULETA CAR- inusitada franqueza nos seus relatórios
RANDI, 2013, p. 159). ao Rei, decorrente da relação de certa
O porte da empresa requeria um co- confiança existente entre os dois. Filipe II
mandante qualificado, o que fez Filipe II resolveu, então, numa decisão conciliató-
colocar a empreitada sob as ordens do ria, designar Sarmiento de Gamboa como
Capitão-General Diego Flores de Valdés, governador das terras a serem ocupadas e
um dos mais destacados e experientes colonizadas no Estreito. O aparente assen-
navegadores da armada da Espanha, com timento de Sarmiento com a decisão do
mais de trinta anos a serviços da Coroa. Rei, na realidade latente e persistente irre-
Asturiano, de origem nobre, Valdés princi- signação, teria desdobramentos no desfe-
piara jovem no trato da vida do mar, em na- cho da expedição e na visão histórica que
vios da armada real que cruzavam o Canal se formou dos acontecimentos da jornada.
da Mancha com destino às províncias de Os preparativos para a expedição con-
Flandres. Depois de navegar durante anos, tinuaram por toda a primeira metade de
como capitão de naus, pelas Antilhas e 1581. Em maio, foi emitido documento
Tierra Firme, Valdés participara, como al- real com a Instrucción de Filipe II para Val-
mirante, da expedição, sob o comando de dés, em que são explicitados e detalhados
Pedro Menéndes de Avilés, com o objetivo os verdadeiros objetivos da armada:
de expulsar franceses que ocupavam a Fló-
rida. Por sua participação na Flórida, Filipe Habeis de advertir que por ahora
II concedeu a Valdés a mercê de caballero conviene que no se entienda que
esta Armada que se hace es para
da Ordem de Santiago, a mais importante
el Estrecho, así por lo que toca a
das ordens militares da Espanha, estabe- los enemigos, y poderlos mejor
lecida desde as lutas de reconquista do castigar estando descuidados,
território espanhol aos mulçumanos. Pro- como por que la gente vaya de
movido a General, Valdés comandou, pos- mejor gana; y así publicareis, que
teriormente, as frotas da Tierra Firme e, por es para la guarda de las Indias,
que esto mismo se dice acá, y va
duas vezes, a Armada de la Guardia, uma
referido en todos los despachos
esquadra de escolta aos comboios da Car- que hasta ahora se han hecho.3
rera de Indias. A escolha pelo Rei de Diego
Flores de Valdés como Capitão-General da Embora a construção dos fortes e a co-
esquadra que ia ao Estreito de Magalhães lonização das terras do Estreito constas-
desagradou a Pedro Sarmiento de Gam- sem das recomendações reais4, o caráter
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no norte da França, uma grande expedi- iniciasse a viagem o mais breve possível,
ção composta de 12 navios se organizava o Duque de Medina Sidonia, capitán ge-
com destino a terras brasileiras6. Conco- neral del mar de Andalucia, estabeleceu
mitantemente, outros relatos indicavam a data da partida da expedição para 25
rumores de movimentação de ingleses de setembro de 1581, saindo do porto de
com o intuito de repetir as investidas de Sanlúcar de Barrameda, base das opera-
Francis Drake. Essa situação levava à ções da expedição. Até então, o destino
premência na montagem da armada do da esquadra era desconhecido da maioria
Estreito, mas, dificuldades logísticas na dos que iam viajar. A data aprazada des-
preparação da frota ocasionavam a pos- considerou advertências feitas pelos pilo-
tergação da sua partida. Desde que Filipe tos sobre a impropriedade daquela esco-
II designou Diego Flores de Valdés como lha, em razão de que os dias seguintes ao
Capitão-General da chamada armada do equinócio seriam passíveis de incidência
Estreito, descontentamentos surgiram de fortes tempestades.
vindos daqueles que se julgaram descon- Com ventos calmos, cinco naus saíram
siderados pela escolha. A partir daí, foram ao mar no dia 25 de setembro, seis no dia
imputados, quase que exclusivamente, a seguinte, e, no dia 27, a galeaza capitana e
Valdés todos os percalços e transtornos as demais embarcações da esquadra dei-
por que passou o empreendimento. Pedro xaram o porto de Sanlúcar de Barrameda.
Sarmiento de Gamboa, considerando-se Após seis dias de navegação com brisas fa-
o motivador da existência da empreitada, voráveis, quando a esquadra se encontrava
desde os passos iniciais da preparação da nas proximidades de Cádiz, a cerca de 105
expedição, colocou-se em frontal antago- milhas de Sanlúcar, irrompeu fortíssima
nismo ao comando de Valdés, registrando tempestade com danosas consequências
sua insatisfação em cartas e em narrati- para a expedição. É Pedro de Rada, escri-
vas que escreveu sobre a jornada (FER- bano mayor da armada, quem descreve o
NANDEZ DURO, 1897). quadro daqueles dias tormentosos:
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narrativa de Herrera foi substituída pelas niu-se com a Câmara de Olinda, estando
diatribes contra Valdés dos apologistas de presentes também autoridades e pessoas
Sarmiento, dos quais o mais destacado foi gradas do lugar, expondo a importância da
o já mencionado Cesáreo Fernández Duro. expulsão dos franceses da Paraíba para a
Esse engrandecimento de Pedro Sarmien- tranquilidade e segurança da região, paci-
to nos eventos da armada do Estreito em ficando os “belicosos” Potiguara, e, para
detrimento de Diego Flores de Valdés foi que os portugueses assumissem o domí-
questionado por Antonio Rumeu de Ar- nio sobre o então chamado “puerto de san
mas para quem os historiadores têm sido domingos de la parayva”, conforme está
muito intransigentes em criticar a atua- assentado na coeva Relación de Andrés
ção de Valdés e generosos em ajuizar as Eguino16. Valdés pediu o envolvimento na
virtudes de Sarmiento de Gamboa “[...] empresa de todos os que habitavam aque-
con una interpretación maniqueista de la la terra. Os moradores concordaram em
historia, Flores es siempre el malo y Sar- constituir, às suas expensas, uma força,
miento un dechado de bondade y abnega- acrescida com indígenas aliados, que iria
ción.” (RUMEU DE ARMAS, 1985, p. 5-32). por terra à Paraíba, concomitantemente à
Poucas vozes discordantes, quase soli- armada. Filipe de Moura, lugar-tenente de
tárias, se apresentaram em contraposição Jorge de Albuquerque, terceiro donatário
ao que, até hoje, está sedimentado na his- da Capitania de Pernambuco, foi escolhido
toriografia luso-brasileira e espanhola, com como comandante das tropas terrestres17.
relação aos reais objetivos da expedição de A frota rumo ao Rio Paraíba foi, então,
Valdés. Pesquisas recentes realizadas nos formada: cinco naus espanholas, quatro
arquivos espanhóis demonstram que a in- embarcações remanescentes da armada
cursão à Paraíba da armada comandada do Estreito e uma das naus que vieram da
pelo Capitão-General Diego Flores de Val- Espanha com o General Diego de Alcega;
dés era prevista e pretérita à saída da frota duas portuguesas que foram incorpora-
do porto de Sanlúcar de Barrameda. O apa- das na Bahia, sob o comando de Diogo
recimento do códice do escribano mayor da Vaz da Veiga; duas que Valdés confiscara
armada do Estreito, a Relación de Pedro de em Pernambuco e uma caravela de Tomé
Rada, com a sua detalhada e fidedigna nar- da Rocha que era, no relato de Pedro de
rativa das ocorrências da expedição do Es- Rada, um nobre pernambucano18. Os
treito, vem se contrapor, de forma nítida e portugueses e indígenas aliados se con-
convincente, ao atual estágio historiográfi- centraram na Vila de Igarassu e, no dia
co que é aceito sobre os fatos motivadores 5 de abril, após as providências tomadas
da chamada “batalha da Paraíba”, o longo pelo ouvidor-geral Martim Leitão, que não
embate para expulsar os franceses da re- acompanhou a expedição, iniciaram o
gião (AUTOR, 2020). percurso para a Paraíba. A marcha seguiu
pelo caminho de Simão Rodrigues Cardo-
O CENÁRIO DA GUERRA
so, vereda desbravada, poucos anos an-
No dia 19 de março de 1584, após de- tes, por Rodrigues Cardoso quando então
zenove dias de navegação desde a partida capitão e ouvidor de Pernambuco tentara,
da Bahia, a frota chegava a Pernambuco. sem êxito, em consórcio com Frutuoso
Na cidade de Olinda as naus ficaram an- Barbosa, a conquista da Paraíba (SALVA-
coradas longe da costa, o que não permitia DOR, 1982, p. 222).
a aproximação de naus maiores que 200 Providências foram tomadas para a
toneladas. Após desembarcar, Valdés reu- partida da frota. Na galeaza capitana San
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neral Valdés que, segundo a Relación de ban de las Alas, e, no voto e solemnidad,
Pedro de Rada, na presença de todos, do dia 29 de abril, quando da transmissão
pegou uma pá e começou o trabalho22. do forte em construção ao capitão Fran-
Como as naus maiores estavam afasta- cisco de Castrejón28. A fortificação na
das do porto e submetidas a mar revolto, Paraíba foi, na época, uma das mais im-
com a quebra de cabos e âncoras, situa- portantes da costa brasileira, com capaci-
ção que não poderia perdurar, decidiu o dade para “perto de 170 homens, e alguns
General Valdés providenciar as medidas de cavalo” na estimativa da crônica jesuí-
a serem tomadas para o seu retorno para tica (SUMÁRIO, 2006, p. 40).
a Espanha. Como Capitão-General da ar- Diego Flores de Valdés, segundo o
mada Valdés tinha autoridade, concedida relato de Rada, após entregar certifica-
pelo Rei para deliberar, tanto no mar como dos aos homens de Pernambuco pelos
na terra. O poder de um Capitão-General serviços que estavam prestando, deixou,
de uma frota espanhola chegava mesmo no último dia do mês de abril, a Paraíba
a superar o de um Vice-Rei, se ambos es- retornando para a nau capitana, navegan-
tivessem num mesmo lugar ao mesmo do para a Espanha na terça-feira, dia pri-
tempo (PHILLIPS, 2016, p. 19). E assim, o meiro de maio de 1584, o que seria para
General Valdés designou o Capitão Fran- Rada, incorretamente, o dia da celebração
cisco de Castrejón como alcaide do forte dos santos São Filipe e Santiago, que so-
que estava sendo construído23. mente se daria dois dias depois. Como,
No dia 29 de abril, foi transmitido ao ao que conseguimos averiguar, a data
Capitão Francisco de Castrejón o forte comemorativa dos dois apóstolos nunca
ainda em construção, tendo sido feita a mudou, também não foram muito atentos
cerimônia de costume com o voto y so- os religiosos que escreveram sobre o fato,
lemnidad do alcaide da fortaleza. O termo o jesuíta redator do Sumário das Armadas
de voto y solemnidad de Castrejón, docu- e frei Vicente do Salvador, quando indica-
mento inédito, faz parte dos manuscritos ram São Filipe e São Tiago como os san-
de Pedro de Rada24. Na guarnição do for- tos do primeiro de maio, e daí vinculando
te, sob o comando de Castrejón, ficaram a partida de Valdés naquele dia ao nome
110 soldados armados com mosquetes e da forte em construção, versão que san-
arcabuzes, e foram deixadas provisões e cionada por Varnhagen persiste, até hoje,
munições para sete meses de duração. em quase toda a historiografia do período.
O navio tomado aos franceses foi deixa- O objetivo deste artigo foi compreen-
do para, após o seu desmanche, ter sua der a política colonial espanhola para a
madeira utilizada nas obras do forte. Tam- região do Atlântico sul, demonstrando de
bém, três lanchas abandonadas pelos forma investigativa o percurso que conduz
franceses foram deixadas para utilização à compreensão da inserção da região da
por Castrejón25. No início da construção Paraíba no horizonte da Monarquia His-
da fortaleza decidiu-se chamá-la de San pânica. Os debates, na esfera da adminis-
Phelipe y Sanctiago, conforme se lê no re- tração régia, sobre fortificações na região
latório de Pedro de Rada26. Esse nome do demonstram uma clara preocupação com
forte já aparece em documentos oficiais a defesa da área, em uma época atormen-
anteriores à data da volta de Valdés para tada pela ameaça constante de invasões
a Espanha, tais como em uma Reláción de “estrangeiras”. A compreensão do pro-
bastimentos27 entregues, em 28 de abril, a cesso de conquista da região da Paraíba
Castrejón pelo provedor da armada Este- é importante para entender a sistemática
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Editora da Universidade de São Paulo, 1981.
NOTAS
1
Archivo General de Indias (AGI), Patronato, 266, R. 17.
2
AGI, Patronato 33, N. 2, R. 6, f. 3. “Instrucción dada por el virrey don Francisco de Toledo, al
capitán Pedro Sarmiento de Gamboa, sobre ir con una expedición al Estrecho de Magallanes.
Lima, 9 de octubre de 1579”.
3
AGI, Patronato 33, N. 3, R. 5. “Instrucción que Felipe II dio al general Diego Flores de Valdés,
sobre lo que debía hacer en la jornada que con su armada iba a emprender para el Estrecho
de Magallanes. Tomar, 1 de mayo de 1581”.
4
AGI. Real Cédula. Indiferente, 582, L. 1, f. 29v-31v.
5
AGI, Patronato 33, N. 3, R. 5, f. 3. “Instrucción que Felipe II dio al general Diego Flores de
Valdés, sobre lo que debía hacer en la jornada que con su armada iba a emprender para el
Estrecho de Magallanes. Tomar, 1 de mayo de 1581”.
6
Archivo General de Simancas (AGS), Secretaría de Estado, K1559, Doc 6.
7
O manuscrito de Pedro de Rada, escribano mayor da expedição, permaneceu em arqui-
vos privados por mais de 400 anos. A Relação inclui, além do relatório detalhado de toda
a empresa, cópias de vários documentos oficiais referentes aos sucessos da expedição,
em especial aqueles acontecidos na costa do Brasil. Huntington Library (HL). Relación de
Pedro de Rada. MS HM 59416, f. 3.
8
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 7v.
9
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 11r.
10
Biblioteca da Ajuda (BA), 49 - X - 1, f. 343-344.
11
AGS, Guerra Antigua, Legajo 109, Doc. 451.
12
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 33r.
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 75r. Requerimiento que el general Diego Florez hizo a
13
14
HL. Relación de Pedro de Rada, 75v.
15
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 39r.
16
AGI, Patronato, 33, N3, R. 41.
27
Sylvia Brandão Ramalho de Brito
17
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 41r.
18
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 42r.
19
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 42r-42v.
20
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 43r.
21
AGI, Patronato, 33, N. 3, R. 41.
22
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 46r.
23
AGS. Guerra Antiga, Legajo 165, Doc. 244.
24
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 79r-79v.
25
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 46v.
26
HL. Relación de Pedro de Rada, f. 46r.
27
AGI, Patronato, 33, N. 3, R. 47.
28
HL. Relación de Pedro de Rada. Voto e solemnidad que o capitão Francisco Castrejon fez
como alcaide do forte chamado San Phelipe y Sanctiago, que era construído na Paraíba.
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