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Fichamento de Museu Proust-Valéry, de Theodor Adorno

“Quem não possui uma coleção ─ e os grandes colecionadores particulares são cada vez
mais raros ─ só pode conhecer a pintura e a escultura em grande escala nos museus. E
quando o desconforto com eles fica muito grande e se tenta exibir os quadros em seu
ambiente original ou em ambientes reconstruídos [...], o mal-estar produzido é mais
constrangedor do que quando as obras se apresentam fora de qualquer contexto,
simplesmente amontoadas nas salas de exposição. O refinamento pode trazer mais
danos á arte do que a confusão.” (p.171)

“Com a crença em que o original pode ser reconstituído a partir do arbítrio, corremos o
risco de nos enredar em um romantismo sem saída; sem produzir benefícios, a
modernização do passado apenas o violenta.” (p.171)

“Valéry declara que não morre de amores pelos museus. Por mais que conservem coisas
admiráveis, diz ele, não guardam coisas deliciosas.” (p.172)

“Sob o impacto dos museus, Valéry atinge a compreensão histórico-filosófica da morte


da obra de arte. Segundo ele, é nos museus que condenamos e executamos a arte do
passado.” (p.174)

“Proust compara a estação ao museu. Ambos os lugares se subtraem á conexão


superficial e convencional dos objetos de ação [...]: ambos são portadores de um
simbolismo mortal [...]. Assim como ocorre com as reflexões de Valéry, as de Proust
também giram em torno da mortalidade dos artefatos. Aquilo que parece eterno, diz ele
em outro trecho, contém em si os motivos de sua destruição.” (p.175-176)

“Somente onde impera aquela rígida distância entre a obra de arte e o observador, a
distância que permite o gozo, é que pode surgir a questão de a obra estar viva ou morta.
Aquele que vive com a obra de arte como se estivesse em sua casa, em vez de visitá-la,
dificilmente terá este tipo de questionamento.” (p. 176)

“O que lhe importa [Valéry] é a obra de arte como objeto de uma contemplação que não
é perturbada por nada, mas que agarra o objeto durante tanto tempo e tão fixamente que
este [...], acaba morrendo. A obra pura é ameaçada pela coisificação e pela indiferença.
Com esta experiência, o museu a domina.” (p.177)
“Na capacidade das coisas de erodir, Proust descobre sua semelhança com o belo
natural. Ele considera a fisiognomia da decadência das coisas como fisiognomia da sua
segunda vida. […] A questão da qualidade estética é secundária para o estetismo
proustiano […].” (p.179)

“O aspecto caótico do museu que desagrada a Valéry por confundir a expressão das
obras, ganha em Proust uma expressão própria: a trágica. Para Proust, a morte das obras
no museu desperta-as novamente para a vida […].” (p. 179-180)

“A fetichização do objeto e a presunção do sujeito encontram reciprocamente o seu


corretivo. As posições acabam transitando uma para a outra.” (p.181)

“A luta contra os museus tem algo de quixotesco não apenas porque, nesta luta, o
protesto da barbárie não é ouvido, mas também porque carrega uma esperança
excessiva. [...] Aquelas penduradas em lugares antigos [...], são peças de museu sem
museu. Aquilo que devora a vida da obra de arte é ao mesmo tempo sua própria vida.”
(p.182)

“Os museus não podem ser fechados, e isto nem sequer seria desejável. Os gabinetes de
história natural do espírito, na verdade, transformaram as obras de arte na escrita
hieroglífica da história, acrescentando-lhe um novo conteúdo, enquanto o velho
encolhia. Contra isso, porém, não há como oferecer um conceito de arte pura tomado de
empréstimo ao passado e, ao mesmo tempo, expressão inadequada dele. [...] Ao mesmo
tempo, os museus demandam insistentemente o que toda obra de arte exige: algo
daquele que contempla [...]. A única relação com a arte que ainda seria própria dessa
realidade ameaçada pela catástrofe seria uma que levasse as obras de arte tão
drasticamente a sério como se tornou o rumo do próprio mundo.” (p.183)

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