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MORTE E LUTO: DESAFIOS PARA

O PROFISSIONAL DE SAÚDE

Tânia Regina Corrêa de Souza


1
A PERDA DO OUTRO

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O PROCESSO DE LUTO
Luto: Conjunto de respostas a uma perda irrevogável. É uma experiência
pessoal e única.
. Reações do luto normal:
¾Dimensão emocional do luto: choque, sensação de perda, negação, tristeza,
apatia, angústia, agitação, raiva, ansiedade, medo, culpa, alívio, solidão.
¾Dimensão intelectual do luto: descrença, preocupação, baixa concentração,
desorganização, déficit de memória, confusão, desorientação.
¾Dimensão física do luto: aperto no peito, vazio no estômago, boca seca, nó na
garganta, falta de ar, distúrbios do sono, distúrbios alimentares.
¾Dimensão espiritual do luto: sonhos, perda da fé, raiva de Deus, dor
espiritual, questionamento de valores, traição de Deus.
¾Dimensão social do luto: perda da identidade, isolamento, falta de interação,
perda da habilidade para se relacionar socialmente.

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FASES DO PROCESSO DE ENLUTAMENTO

¾ Entorpecimento: dura até uma semana, mesclado por acessos de raiva e


tristeza.
¾ Anseio ou Protesto: emoções fortes e agitação física. O enlutado fica a
procura da pessoa perdida.
¾ Desespero: é a fase mais difícil, lenta e dolorosa provocando apatia,
depressão e desmotivação pela vida.
¾ Recuperação: Sentimentos positivos e adaptação às mudanças e
tornando possível o investimento afetivo em novas situações ou figuras
de apego.

Funções básicas: aceitar a realidade da perda, elaborar a dor da perda e


ajustar-se a um ambiente onde falta o objeto perdido.

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CLASSIFICAÇÃO DO LUTO COMPLICADO

¾ Luto crônico: prolongamento indefinido do luto.

¾ Luto inibido: ausência dos sintomas do luto normal.

¾ Luto adiado: sem reações imediatas à morte, apresentando mais tarde

sintomas de luto distorcido.

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FATORES DE RISCO INIBIDORES DO LUTO

¾No enlutado: idade, sexo, baixa auto-estima e perdas mal elaboradas.


¾Da relação com o morto: tipo de parentesco ou relação (ambivalência,
dependência ou segurança).
¾Causas e circunstâncias da perda: inesperada ou prematura (acidente,
suicídio ou assassinato),“luto antecipatório”.
¾Suportes sociais: ausência de família ou família não suportiva, falta de
perspectiva de vida.
¾Personalidade do enlutado: capacidade de responder a situações
estressantes.
¾Luto não reconhecido: ídolos, amantes e aborto.
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“A dor do luto é o preço que se paga pelo amor e pelo
compromisso” Parkes, 98

Formas de ajudar o enlutado e/ou família:


ajuda mútua
¾ aconselhamento
¾ grupo de apoio
¾ psicoterapia
Objetivo:
¾ reconstruir a identidade e a vida.
Princípios:
1. Deixar falar sobre a perda é o melhor remédio.
2. Confortar, e não tentar conformar.
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QUANDO O LUTO TERMINA?

Não é possível prever o tempo de duração do luto, nem sua


intensidade.

Dificilmente a elaboração ocorre num período menor que um ano.

Sinais de término do luto:


 lembrar e falar do falecido sem dor e sem tristeza.
 não ter manifestações psicológicas e físicas
 reorganização da vida
 adaptação a novos papéis

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A PERDA DE SI MESMO

O PACIENTE,
O LUTO E A
MORTE.

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Segundo Klubler-Ross (estudo com pacientes com câncer,
1998):

1o. Estágio - Negação e Isolamento


2o. Estágio - A Raiva
3o. Estágio - Barganha ESPERANÇA
4o. Estágio - Depressão
5o. Estágio - Aceitação

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Segundo Souza (estudo com pacientes com aids, 2008):
EVENTOS FASES PERDAS PRINCIPAIS SENTIMENTOS E SERVIÇO DE
ESTRESSANTES (PERDAS PRINCIPAIS) SECUNDARIAS EMOÇOES SAÚDE
1º Impacto do PERDA DA - choque - CTA
diagnostico IMORTALIDADE ------- - descrença - Atenção
- fantasias de morte Básica
- medo
- angústia
2ºComunicação da PERDA DA - afetivas - insegurança - SAE
soropositividade a IDENTIDADE - sexuais - baixa auto-estima
parceiros, amigos e - sociais - medo da discriminação
familiares. - profissionais - repressão da afetividade
- desgaste emocional causado
por incertezas

3º Diagnostico de PERDA DA SAUDE - acentuam-se as - risco iminente de adoecer - SAE


aids, inicio do perdas da fase - medo: - HD
tratamento, anterior *evidência pública do - ADT
infecções - auto-imagem diagnóstico - HC
oportunisticas. - auto-estima *efeitos colaterais dos ARV
* processo de adoecimento
4ºAgravamento do PERDA DA - acentuam-se as - desesperança - ADTP
quadro clinico, ESPERANÇA perdas da fase - dependência - HC
primeira internação anterior - renuncia
hospitalar. - independência - resignação
- autonomia - medo do sofrimento e da morte
- fantasias de fase final de vida
- angústia de separação
- necessidade de reavaliar a vida

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ASSISTÊNCIA NO LUTO

Relações do paciente:
com a equipe : vínculo + (acolhimento)
com a doença : vínculo - (dor total e insucesso no tratamento)
com a família : vínculo + (família deve ser suportiva)
¾ participação nas diferentes fases da doença
(diagnóstico/aguda/crônica/terminal/morte);
¾ auxiliar na elaboração do luto, novas formas de enfrentamento e
reorganização da vida;
¾ buscar sistemas de apoio formal e informal (rede de suporte social);
¾ ajudar o paciente e a família a expressarem seus desejos e sentimentos;
¾ ajudar o paciente a resolver pendências;

12 ¾ ajudar no processo de despedida.


Com relação a família:

¾ passa pelos mesmos estágios e perdas;


¾ necessita de um espaço para receber informações, tentar resolver
problemas, discutir seus medos, chorar , compartilhar sua angustia e dor;
¾ identificar formas de enfrentamento;
¾ ajudar a família a aceitar a realidade da perda e lidar com a separação e
o luto;
¾ ajudar no processo de despedida;
¾ garantir que a família fez tudo que estava ao seu alcance (diminuir
culpas);
¾ auxiliar na adaptação à vida sem a pessoa;
¾ reconstruir a identidade e a vida.

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A MORTE E OS
PROFISSIONAIS DE SAÚDE

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ADOECER E MORRER

Até o Século XIX: Idade Moderna:


¾ morte = fracasso (corpo, médico,
¾ morte anunciada e natural
sistema de saúde, sociedade e
¾ evento social
Deus)
¾ a morte era em casa, hospital tinha
o objetivo de curar ¾ a morte ocorre em hospital e
¾ preparação de rituais pelo próprio velórios
doente ¾ preparação é impessoal (legal) e
¾ não havia tecnologia pela família
¾ profissional de saúde: impotência ¾ tecnologia e recursos terapêuticos
e portador de más notícias ¾ o tempo de vida não é previsto
(esperança)
¾ necessidade de cuidar do
profissional de saúde
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Quem é o profissional de saúde?

Perez on Medicine
De onde provém o Sofrimento Psíquico no
trabalho com a saúde ?

Dor psíquica do Dificuldades técnicas, Dificuldades


contato com tempo quantitativo x pessoais e sociais
sofrimento do qualitativo, sobrecarga
outro, com a de tarefas, baixo DE SI MESMO
doença e a morte. salários.

DO OUTRO ORGANIZAÇÃO
DO TRABALHO ANGÚSTIA
17 STRESS
A DOR DO OUTRO

¾ perdas e lutos não constam dos objetivos da saúde, despreparo dos


profissionais;
¾ o impacto da doença +do doente + stress psicológico dos familiares;
¾ reexperimentação de medos infantis de separação e abandono;
¾ medo de sua própria mortalidade;
¾ lidar com a intimidade corporal e emocional;
¾ lidar com incertezas e limitações;
¾ perdas múltiplas e sucessivas levam a sobrecarga emocional;
¾ dor não é reconhecida.

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RESULTADOS DO STRESS:

¾ Alto nível de tensão;


¾ Baixa auto-estima;
¾ Angústia;
¾ Ansiedade;
¾ Faltas ou abandono de tarefas;
¾ Mudanças constantes de emprego;
¾ Problemas de saúde;
¾ Síndrome de Bournout (stress crônico).

“A dor é inevitável neste caso e não pode ser evitada...” (Parkes, 1972)

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DEFESAS:

¾ Objetivam facilitar a fuga de situações de ansiedade, dúvida, culpa,


incerteza.

¾ Facilitam a interação entre o TÉCNICO X PACIENTE no ambiente


hospitalar.

¾ Podem ser despertadas contra processos contratransferências.

¾ Podem dificultar a relação profissional paciente.

Fatores de risco: vínculo, tratamento prolongado, pacientes que cativam toda


equipe, pacientes de difícil manejo, pacientes com quem se identifica e
paciente que é colega.
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POSTURAS DOS PROFISSIONAIS
(estratégias de enfrentamento)

¾ Calosidade profissional - a prática traz indiferença total à dor do paciente,


de maneira a não ser tocado pelo sofrimento dele.
É a mais encontrada, fria e distante. Identidade profissional é preservada.
Não humanizada.
Foco: doença

¾ Distanciamento crítico - a dor do paciente é aprendida e compreendida na


totalidade de sua essência (modelo = relação psicoterapêutica).
É a mais adequada, postura de equilíbrio, permite ampla intervenção.
Foco: doente – escuta e compreensão dos sentimentos.

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¾Empatia genuína - envolvimento com o paciente sem estabelecer
qualquer tipo de barreira, o profissional não resguarda limites de sua
vida pessoal.

Vínculo transcende o relacionamento profissional e paciente. A dor


pode ser a mesma para os dois.
Ex: médico de família

¾Profissionalismo afetivo - trabalho sistematizado, sem que o


envolvimento profissional escape ao controle do profissional.
Respeito pelo doente e doença, mas com certo distanciamento.
Pode ser aprendida, é a que mais se aproxima das condições
tecnológicas das instituições nos dias de hoje.

Camon - 2002

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CLASSIFICAÇÃO DAS DEFESAS

¾ Fragmentação da relação técnico-paciente: divisão de tarefas para diminuir


tempo de contato com o paciente.
¾ Despersonalização e negação: não existem doentes, mas sim doenças.
Todos os pacientes são iguais.
¾ Distanciamento e negação: sentimentos e identificações são barradas,
evitadas.
¾ Eliminar decisões: rotinas, protocolos e padronizações de condutas.
¾ Redução do peso da responsabilidade: estrutura formal, hierarquização e
sistema de papéis.
PITTA - 2003

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MECANISMOS PARA ADAPTAÇÃO AO STRESS

¾ Construção de uma couraça impermeável às emoções e sentimentos;


¾ Isolamento social;
¾ Negação ou minimização dos problemas;
¾ Ironia e humor negro (jargões, rótulos Ex: SPP)
¾ Médico: cuida de si mesmo, da família e amigos.

Nogueira-Martins - 1991

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Como cuidar do profissional da saúde?

¾ Emoções devem ser identificadas, atendidas e cuidadas.


¾ Evitar negação ou repressão da emoção.
¾ Suporte :
* Espaço de reflexão e diálogo
* Vivências que possibilitem a expressão de sentimento - perda e
morte, relação da equipe, família, comunicação ......
¾ Supervisão sistemática
¾ Oferecer cursos e treinamentos que instrumentalizem os profissionais.
¾ Estimular atividades que diminuam o stress
( coral, massagem, comemorações, celebrações ...)

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“PODEMOS ATÉ NÃO LEMBRAR DE
QUEM PARTILHOU NOSSA ALEGRIA,
MAIS JAMAIS ESQUECEREMOS QUEM
CHOROU DIANTE DE NOSSA DOR...”

26 CAMON - 2002
BIBLIOGRAFIA:
• Bowlby, J. Formação e Rompimento dos laços afetivos. Martins Fontes, SP, 1979.
• Bromberg, M.H.P.F. A Psicoterapia em situações de Perdas e Lutos. Psy II, Campinas,
1998.
• Bromberg, M.H.P.F. Estudos Avançados sobre o Luto. Editora Livro Pleno, Campinas,
2002.
• Camon, V. A. A. Urgências Psicológicas no HOSPITAL. Pioneira, São Paulo, 2002.
• Kovács, M. J.Morte e Desenvolvimento Humano. Casa do Psicólogo, São Paulo, 1992.
• Kúbler-Ross, E. Sobre a Morte e o Morrer. Editora Martins Fontes, São Paulo, 1987.
• Parkes, C. M. Luto: Estudos sobre Perdas na Vida Adulta. Summus, São Paulo, 1998.
• Pitta, A. Hospital – dor e morte como ÓFÍCIO. Editora Hucitec, São Paulo, 1994.

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TANIA REGINA CORREA DE SOUZA

Coordenação Estadual DST/Aids


Rua Santa Cruz, 81
Tel: 5084.5235
São Paulo - S.P. - cep: 04121-000

Email: tania@crt.saude.sp.gov.br
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