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MATAN TORÁ 257

MATAN TORÁ (A ENTREGA DA TORÁ)

“Ame ao próximo como a ti mesmo” (Levítico 19:18)


Rabi Akiva diz, “Este é um grande princípio na Torá” (Bereshit Raba, Cap. 24)
Esta afirmação dos nossos sábios exige explicação. A palavra princípio (heb. Klal)
indica uma soma de detalhes que, quando colocados juntos, formam o princípio
acima. Assim, quando o Rabi Akiva diz sobre a Mitzvá, “ame ao próximo como a ti
mesmo”, que este é um grande princípio na Torá, nós devemos entender que o resto
das 612 Mitzvot (preceitos) na Torá, com todas suas interpretações, não são nem mais
e nem menos que a soma dos detalhes inseridos e contidos nesta única Mitzvá
(singular para Mitzvot), “ame ao próximo como a ti mesmo”.
Isto é muito intrigante, pois você pode dizer isto em relação às Mitzvot entre
o homem e seu próximo, mas como é possível que esta única Mizvá contenha todas
as Mitzvot entre homem e Deus, que são a essência e a vasta maioria da Torá?
2) E se ainda pudermos nos esforçar para encontrar um modo de reconciliar
estas palavras, chega-nos um segundo dito, ainda mais evidente, sobre um convertido
que se apresentou a Hilel (Shabat 31a) e lhe disse: “Ensina-me toda a Torá enquanto
eu fico num pé só”. E ele respondeu: “Não faça aos outros o que você não gostaria
que eles fizessem a você” (a tradução de “ame ao próximo como a ti mesmo”), e todo
o resto é comentário; vá e estude.
Esta é uma indicação clara que nenhuma das outras 612 Mitzvot da Torá é
mais importante do que a Mitzvá, “ame ao teu próximo como a ti mesmo”, já que
todo seu propósito é nos permitir observar a Mizvá de amar nosso amigo
corretamente. Hilel diz especificamente que “...todo o resto é comentário; vá e
estude”. Isto significa que todo o resto da Torá é um comentário desta única Mitzvá,
e é impossível cumprir a Mitzvá de amar ao seu amigo perfeitamente sem isto.

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3) Mas antes de nos aprofundarmos no cerne da questão, devemos olhas para


a estrutura desta Mitzvá “ame ao próximo como a ti mesmo” porque as palavras
“como a ti mesmo” implicam que você precisa amar seu amigo no mesmo grau que
você ama a você mesmo, e nada menos que isso. Em outras palavras, que eu devo
estar sempre pronto para satisfazer as necessidades de cada um dos indivíduos da
nação Israelita, não menos do eu estou sempre pronto para satisfazer minhas
próprias necessidades.
Isto é completamente impossível, pois não existem muitas pessoas cujo
trabalho diário seja suficiente para satisfazer suas próprias necessidades, então como
eles podem esperar satisfazer as necessidades de uma nação inteira? Nós não
podemos pensar que a Torá estava exagerando, pois a Torá nos diz: “...não adicione
e nem subtraia ...,” (Deuteronômio 13:1) indicando que estas palavras das leis e regras
da Torá são precisas e exatas.
4) E se isso ainda não for o suficiente para você, eu adicionarei que a simples
explicação dessa Mitzvá de “amar o próximo” é ainda mais rigorosa, pois nós
precisamos colocar as necessidades do nosso próximo à frente das nossas próprias.
Isto é o que Tosafot escreveu em nome do Talmud de Jerusalém (Kidushin pg. 20a)
quanto ao verso “que ele esteja bem contigo” (Deuteronômio 15:16), que se refere
ao servo Hebreu. E estas são suas palavras: “Se uma pessoa tem apenas um travesseiro,
e dormir nele e não der ao seu servo, ele não está cumprindo: ‘que ele esteja bem
contigo’, porque dorme no travesseiro e o servo dorme no chão. E se ele não dormir
nele e também não der ao seu servo, este é um atributo Sodomita. Nós vemos que o
mestre é obrigado a dar o travesseiro ao seu servo e então dormir no chão”, fim de
suas palavras – leia-as cuidadosamente.
Da explicação acima nós podemos aprender e expandir no preceito de amar
ao próximo porque aqui também o livro diz que a pessoa deve satisfazer as
necessidades de seu amigo assim como satisfaz as suas próprias como no exemplo
“que ele esteja bem contigo”, relativo ao servo Hebreu. A Halachá declara que se
uma pessoa tem apenas uma cadeira enquanto que seu próximo não tem nenhuma
cadeira, e ele não a der para ele, ele viola o preceito de “ame ao próximo como a ti
mesmo”, porque ele não está satisfazendo as necessidades do amigo como satisfaz as
suas próprias.
E se ele não se sentar na cadeira e nem a der ao seu amigo, isto é considerado
um atributo tão mal quanto o dos Sodomitas, e ele é obrigado a dar a cadeira ao seu
amigo para que ele sente nela enquanto ele senta no chão ou fique em pé. É claro
que este princípio se aplica a todas as necessidades e carências de seus próximos.
Agora considere, esta Mitzvá é de alguma forma praticável?
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5) Primeiro nós precisamos entender por que a Torá foi dada


especificamente à nação Israelita e não igualmente à todas as pessoas no mundo.
Isto é devido ao nacionalismo, Deus proíba? É claro que só um louco poderia pensar
assim. E a verdade é que os sábios já lidaram com esta questão e isto é o que eles
dizem (Avodá Zará, pg. 2b): “Deus ofereceu a Torá para todas as nações e línguas, e
elas não a aceitaram”.
Mas como nós vamos entender isto? Pois se é assim, por que nós somos
chamados de “o povo escolhido de Deus”, conforme é dito “... o Senhor vosso Deus
vos escolheste” (Deuteronômio 7:6) se nenhuma outra nação queria a Torá? E além
disso, estas coisas são contraditórias em sua essência, pois é possível que o Criador
chegou a estas nações (espiritualmente) selvagens daquele tempo com a Torá em
Sua mão e negociou com elas? Nem os seus profetas. Tal coisa nunca foi ouvida
antes e é inconcebível e inaceitável.
6) No entanto, quando nós entendermos bem o suficiente a essência da Torá
e das Mitzvot que nos foram dadas, assim como o que é esperado de sua realização
no nível que os sábios nos instruíram, que é o propósito da grande Criação que
contemplamos, então nós compreenderemos tudo. Pois é evidente que não se realiza
uma ação sem um propósito, e não existem exceções a esta regra exceto no caso dos
tolos ou crianças. Portanto, nós não podemos ter qualquer dúvida sobre o Criador,
cuja exaltação está além do nosso entendimento, dizendo que Ele realizaria qualquer
ação, grande ou pequena, sem um propósito.
E nossos sábios nos ensinaram que o mundo foi criado apenas para o
propósito de observar a Torá e as Mitzvot, ou seja, assim como nossos antigos sábios
de abençoada memória explicaram, que desde o momento da Criação, a
intenção do Criador era revelar a Criação de Sua Divindade. E o conhecimento
de Sua Divindade é transmitido aos criados através da recompensa agradável
que Ele provê que cresce até que atinja o grau desejado.
Ao receber esta beneficência os inferiores são elevados através do
verdadeiro reconhecimento disto, que é se tornar a carruagem da Sua Santidade
e aderir a Ele até que eles atinjam sua perfeição derradeira: “Nenhum olho viu
um Deus além de Ti” (Berachot 34b). Já que esta perfeição é tão grande e
esplêndida, mesmo a Torá e os Profetas foram cuidadosos para não mencionar
mesmo uma palavra disto. Como os sábios aludiram: “Todos os profetas
profetizaram apenas sobre os dias do Messias, mas sobre o Mundo Vindouro:
‘Nenhum olho viu um Deus além de Ti’”. Isto é conhecido para aqueles que
encontram o conhecimento, e este não é o lugar para expandir nisto.
Essa perfeição é expressa nas palavras da Torá, da Profecia, e nas palavras dos
sábios por uma simples palavra, Dvekút (adesão). Esta palavra é tão comumente
usada pelas pessoas que ela está próxima de perder seu significado. Mas se você
pensar sobre esta palavra por um momento, você ficará espantado com sua
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incrível elevação, pois se você imaginar o conceito de Divindade em comparação


com a elevação do Criador, você será capaz de estimar a magnitude da
capacidade da Dvekút de um com o outro, e então você entenderá porque nós
consideramos este conceito como o propósito de toda esta grande Criação.
Do que nós dissemos, ao aplicar as Mitzvot da Torá, é concluído que todo o
propósito da Criação é que todas as criações inferiores evoluam e elevem ainda mais
alto, até que sejam recompensadas com Dvekút com seu Criador.
7) No entanto, aqui os Sábios do Zohar pararam e perguntam: “Por que nós
já não fomos criados desde o início nessa elevada dimensão de Dvekút com o Criador?
Qual foi o Seu propósito em nos sobrecarregar com esta luta e esforço da Criação, e
da Torá e suas Mitzvot? E eles responderam: “Aquele que come aquilo que não é seu,
tem medo de olhar em sua face” (Talmud de Jerusalém, Orla, Cap. 1). Isto significa que
aquele que come e desfruta do trabalho do seu amigo tem medo de olhar em sua
face, porque ao fazê-lo torna-se cada vez mais humilhado até que perca toda a
dignidade (lit. forma) humana. E já que não podem haver atalhos no que deriva de
Sua perfeição, o Criados nos deu espaço no qual possamos ganhar por nós mesmos
a desejada elevação através das nossas ações de aplicar a Torá e suas Mitzvot.
E estes conceitos são extremamente profundos e eu já os expliquei no meu
livro Panim Me’irot uMasbirot para a Árvore da Vida, Ramo Um, e no livro, O Estudo
das Dez Sefirot, Reflexão Interna, Parte Um. Aqui eu vou explicar brevemente para
torná-las compreensíveis para todos.
8) Isto pode ser comparado na forma de uma analogia com um homem rico
que chamou um homem no mercado e o alimentou, deu-lhe o de beber, e deu-lhe
prata e ouro e todas as coisas desejáveis, dia após dia. E cada dia ele dava mais do
que no último, e assim por diante até que finalmente o homem rico o perguntou:
“Diga-me, todos os teus desejos foram satisfeitos?” E ele respondeu, “Todos os meus
desejos ainda não foram satisfeitos, pois quão maravilhoso e quão agradável seria se
eu tivesse toda essa riqueza e luxúria vindo para mim através das minhas próprias
ações, como vieram a ti, ao invés de estar recebendo através de tua caridade”. E o
homem rico respondeu, “Neste caso, nunca nasceu uma pessoa que poderia
satisfazer os seus desejos”.
E é natural que mesmo se, por um lado, prove grande prazer que aumenta
conforme os presentes aumentam, e por outro lado é difícil para ele sofrer o
constrangimento de receber estes benefícios que o homem rico aumenta vez após
vez, porque é uma Lei da Natureza que um recipiente sempre sentirá algum tipo de
vergonha e impaciência quando receber um presente gratuito daquele que dá por
caridade e piedade.
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E disto derivamos uma segunda lei, que não há ninguém no mundo que
possa completamente satisfazer os desejos do seu próximo, porque no fim, não pode
dar ao outro o senso e o sentimento de autorrealização que é necessário para atingir
a perfeição desejada.
E vemos que isto é verdade apenas para os criados, e não é aplicável à exaltada
perfeição do Criador. Este é o motivo pelo qual Ele planejou as coisas para que
possamos lutar e trabalhar através da Torá e das Mitzvot para atingir nossa própria
exaltação, assim que todo o prazer e bondade que vem para nós por Ele, isto é, no
conceito da Dvekút com Ele, é ganhado por nós através de nossas ações, e então
sentimos a verdadeira possessão sem a qual não há senso de realização, como
explicamos.
9) No entanto, é apropriado para nós examinar o significado e a origem desta
lei natural: qual é a fonte e por que sentimos vergonha e impaciência quando
recebemos caridade de alguém? Isto é o que aprendemos da lei conhecida pelos
estudiosos da natureza: que a natureza de cada ramo é próxima e igual àquela da sua
raiz, e todas as coisas em relação à raiz também se aplicam ao ramo, e o ramo as ama,
deseja e deriva sua utilidade delas. E o oposto, há aquelas coisas que não se aplicam
à raiz que o ramo também se afasta e não pode tolerar e é também danificado por
elas. E esta lei se aplica a toda raiz e ramo sem exceção.
Isto nos dá uma abertura para entender a origem de todos os prazeres e
tormentos do nosso mundo. Já que o Criador é a raiz de todas as criações que Ele
criou, portanto todas as coisas que estão incluídas nEle e atraídas por Ele
diretamente, são prazerosas a nós, já que nossa natureza é próxima a nossa exaltada
raiz. Por outro lado, todas as coisas que não se aplicam a Ele e não são atraídas por
nós diretamente, mas através da natureza da própria criação, vai contra nossa
natureza e são difíceis para nós tolerarmos. Isto quer dizer, nós amamos o descanso
e odiamos o movimento, tanto que não fazemos nenhum movimento a menos que
seja para atingir o descanso. Isto é porque nossa raiz não é uma de movimento, mas
sim de descanso e movimento não se aplica a Ele. Portanto vai contra a nossa
natureza e não gostamos disto.
Da mesma forma amamos a sabedoria, a bravura, a riqueza etc., porque todas
estas são incluídas nEle que é nossa raiz. Este é o porquê odiamos seus opostos, como
ignorância, fraqueza e pobreza, porque elas não podem ser encontradas na nossa
raiz, nos fazendo rejeitar, não gostar e odiá-las. Elas também nos fazem sofrer
intoleravelmente.
10) Este é o motivo para nossos sentimentos defeituosos de vergonha e
impaciência quando recebemos caridade dos outros. O Criador não tem aspecto de
receber benefício dos outros em sua natureza. Pois de quem Ele receberia? E já que
este conceito não se aplica à nossa raiz, que é o Criador, nós não gostamos disto,
como explicamos. Por outro lado, sentimos prazer, doçura e conforto quando nós
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compartilhamos com os outros, já que isto se aplica à nossa raiz que compartilha
com todos.
11) Agora nossos olhos foram abertos para examinarmos o propósito da
Criação, que é “Aderir-se a Ele”, com sua verdadeira natureza. Todo este conceito
de elevação e Dvekút que é assegurado a nós através de nossa aplicação na Torá e suas
Mitzvot não é mais e nem menos que o processo dos ramos tornando-se em afinidade
com sua exaltada raiz, pelo qual tudo o que é agradável, eufórico e agradável vem
naturalmente, como explicamos acima. Este prazer é nada mais que obtenção de
uma Similaridade de Forma com seu Fazedor, assim quando nos transformamos
para nos tornarmos iguais em cada detalhe com nossa raiz, sentimos o deleite.
Além disso, tudo que acontece conosco que não é encontrado em nossa raiz
torna-se intolerável, repulsivo e doloroso, como este conceito deixou claro. Assim é
natural que todas as nossas esperanças dependam de quão bem sucedidos estamos
em atingir Similaridade de Forma com nossa raiz.
12) Este é o porquê nossos sábios perguntaram: “Por que Deus se importa se
nós abatemos do pescoço ou de trás do pescoço? Afinal, as Mitzvot foram dadas
apenas para purificar a humanidade”. (Bereshit Raba 44) E o significado deste
processo de purificação é a purificação do corpo sombrio, que é o propósito de
observar a Torá e Mitzvot.
“Um asno selvagem se tornará homem” (Jó 11:12), porque quando nasce
está no nível máximo de imundície e inferioridade, isto é, há muito amor egoísta
inerente nele, pelo qual todas as suas ações são centradas em si mesmo sem nenhum
traço de pensamento de compartilhar com os outros.
Assim está na maior distância possível da sua Raiz. Está diametralmente
oposto, porque a Raiz apenas compartilha com os outros sem um pensamento de
receber, Deus proíba. O recém-nascido está em um estado total de receber para si
mesmo sem um único pensamento de compartilhar com os outros, e portanto é
considerado estando no ponto mais baixo da inferioridade e imundície no nosso
mundo humano.
E quanto mais cresce, mais recebe medidas parciais de “compartilhar com os
outros” de seu ambiente, que é dependente do desenvolvimento de valores do seu
ambiente. Ele é então ensinado a cumprir a Torá e Mitzvot para seu próprio benefício
– para uma recompensa neste mundo e no Mundo Vindouro. Isto é considerado Lo
Lishmá (não em Nome Dela), já que é impossível fazer uma criança se acostumar em
alguma outra forma.
E conforme cresce, lhe é mostrado como aplicar-se em Torá e Mitzvot Lishmá
(em Nome Dela), ou seja, que os faz apenas para dar prazer ao seu Criador.
Conforme o RAMBAM (Maimônides) disse, “Mulheres e crianças não devem ser
ensinadas a aplicarem-se em Torá e Mitzvot Lishmá, pois elas não são capazes de
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carregar a carga do conceito. Apenas quando se maturam e adquirem sabedoria e


entendimento isto deve ser ensinado a elas”. (Hilchot Teshuva, Leis do Arrependimento,
Capítulo 10) E como os sábios disseram, “Ao aplicar A Torá Lo Lishmá, chega-se
eventualmente a Lishmá” (Pesachim página 50b), ou seja, estudando a Torá e
aplicando os preceitos na sua vida com a única intenção de dar prazer para seu
Criador, e não para seu amor egoísta.
O Criador conhece os poderes inerentes que existem na Torá e Mitzvot
Lishmá quando aplicados na vida, como os sábios nos dizem: “O Criador disse, ‘Eu
criei a má inclinação e criei a Torá como remédio.’” (Kidushin 30b) Assim vemos que
a pessoa continua a desenvolver e mover-se através dos níveis de elevação até que
perca todas as centelhas de amor egoísta, e todas as Mitzvot em seu corpo são elevados
e todos os movimentos que faz é apenas para beneficiar os outros. Então até mesmo
as necessidades básicas que precisa receber são canalizadas para compartilhar com os
outros. É por isto que nossos sábios disseram, “As Mitzvot foram dadas apenas para
purificar as criaturas do nosso mundo”. (Midrash Raba, capítulo 44).
13) De fato, vemos que existem dois tipos de princípios da Torá: 1) Mitzvot
entre o homem e o Criador; e 2) Mitzvot entre o homem e seu próximo. Ambos tem
o mesmo propósito, que é trazer a criatura a seu propósito derradeiro de Dvekút com
o Criador, como explicamos.
Além disso, mesmo a aplicação prática destes dois é a mesma, já que quando
uma pessoa realiza um ato Lishmá, sem mistura de amor egoísta, isto é, sem derivar
algum benefício pessoal, então sentirá nenhuma diferença independente se está
agido por amor ao seu próximo ou seu amor pelo Criador.
É uma Lei da Natureza que tudo percebido pelas criaturas como sendo
externo a si mesmo parecerá vazio e como se não fosse parte deste reino, assim toda
ação de amor aos outros que uma pessoa faz é motivado pelo sentimento da Luz
Retornante a si ou tendo esperança de obter uma recompensa que é benéfica apenas
para si mesmo. Portanto estas ações não podem ser verdadeiramente chamadas
“amar outras pessoas” pois elas são definidas por suas consequências. Isto pode ser
comparado à um salário que só é pago após a conclusão.
E em todo caso uma ação realizada por um salário não pode ser considerada
amar os outros, sem um aspecto de centelhas da Luz Retornante para si e alguma
esperança de recompensa que advirá, é completamente impossível de acordo com a
Lei da Natureza. E em relação a tais coisas o Tikúney Zohar, Tikun 30:10 fala às nações
do mundo dizendo: “Todo ato de bondade feito é feito por benefício próprio”.
Ou seja, que todo ato de bondade que fazem para seus próximos ou em servir
aos seus deuses não é por amor aos outros, mas por amor egoísta, e isto é porque
seria contra a natureza humana, como explicamos.
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Portanto, apenas aqueles que guardam a Torá e Mitzvot são capazes disto. Ao
se acostumarem a guardar a Torá e as Mitzvot para trazer contentamento ao seu
Fazedor, gradualmente separam a si mesmos do seio da natureza humana e adquirem
uma segunda natureza, que é o acima mencionado amor aos outros.
Este é o porquê os sábios do Zohar excluíram as nações do mundo
completamente da característica de amar os outros e disseram que todo ato de
bondade que fazem é apenas para seus próprios benefícios, já que não tem nada que
ver com a aplicação da Torá e Mitzvot Lishmá. O propósito de todas as adorações de
seus deuses é pelo bem de recompensa e redenção neste mundo e no próximo, e
assim vemos que sua adoração aos deuses é procedente do amor egoísta. Em todo
caso, eles nunca tomarão uma ação de valor que será fora do âmbito do seu próprio
corpo; que levantem a si mesmos e sequer um fio de cabelo acima do chão da
natureza humana.
14) Assim vemos com nossos próprio olhos que não há diferença entre estes
dois tipos de preceitos da Torá, em termos de aplicarem-se à Torá e Mitzvot Lishmá,
mesmo em termos da aplicação prática da Torá. É uma necessidade que, antes que
seja recompensado, todas as ações em relação aos outros, seja em relação ao Criador
ou em relação a outras pessoas, parecem ser vazias e imperceptíveis. No entanto,
através de grande esforço pode elevar-se gradualmente e atingir uma segunda
natureza, como mencionado acima, e então imediatamente atinge a meta final, que
é a Dvekút com o Criador, como explicamos.
Já que isto é assim, a lógica dita que a parte da Torá em relação ao homem e
seu próximo é mais capaz de trazer o homem à sua meta desejada. E já que o
cumprimento das Mitzvot entre o homem e o Criador é predeterminada e específica,
e não há feedback nisto, e acostuma-se a eles facilmente, qualquer coisa que é feita
por hábito não é mais capaz de trazer algum benefício, como bem conhecido. Isto
não é verdade nas Mitzvot em relação ao homem e seu próximo, que não são
predeterminados ou específicos. Eles são muito exigentes que se transforme, e,
portanto, sua capacidade é mais assegurada e é mais fácil e mais próximo de atingir
a meta através deles.
15) Agora podemos entender claramente as palavras de Hilel HaNasi para o
convertido, onde ele declara que a essência da Torá é “Ame ao próximo como a ti
mesmo e as outras seiscentas e doze Mitzvot são um comentário e preparação para
este”, (veja acima no Item 2). Mesmo as Mitzvot em relação ao homem e o Criador
são incluídas nesta Mitzvá, já que é a meta derradeira de toda a Torá e Mitzvot, como
os sábios disseram: “A Torá e Mitzvot foram dadas apenas para purificar os Israelitas”,
(veja acima no Item 12), que significa a purificação do corpo ao ponto onde adquire
uma segunda natureza que é definida como amar os outros, isto é, a única Mitzvá de
“Ame ao próximo como a ti mesmo”, que é a meta derradeira da Torá, depois da
qual brevemente atinge a Dvekút com o Criador.
MATAN TORÁ 265

Não há necessidade de perguntar por que isto não é definido pelas palavras:
“Ame o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a alma e com todo o
teu poder” (Deuteronômio 6:5), pois de acordo com o motivo explicado acima, não há
diferença entre o amor do Criador e o amor aos outros.
Isto é porque aquele que ainda está sujeito à natureza humana, já que tudo
externo a si mesmo não é real e não existe. E já que este converso perguntou o Hilel
HaNasi para explicar a essência do que a Torá requere em uma forma que sua meta
seria fácil para atingir e próximo de encontrá-la, dizendo, “Me ensine toda a Torá
enquanto pulo de um pé só”, o Hilel definiu isto como o amor aos outros, já que
esta meta é a mais próxima e rápida a ser revelada (veja acima no Item 14), pois é
seguro e pode ser cumprida sem erro e é acompanhada com um mecanismo de
feedback firme.
16) Nisto encontramos uma abertura para entender como a Torá demanda
algo de nós que não possamos cumprir, (veja acima nas Seções 3 e 4 especificamente
o conteúdo da Mitzvá “Ame ao próximo como a ti mesmo”). Leia isto atentamente
e entenda!
Este é o motivo pelo qual a Torá não foi dada para nossos santos patriarcas
Abraão, Isaac e Jacó, mas foi adiada até o Êxodo do Egito; apenas quando eles se
tornaram uma nação completa de seiscentos mil homens acima da idade de vinte
anos. Todo membro da nação foi perguntado se concordava com este trabalho
elevado. E apenas quando cada uma das pessoas na nação concordou com todo seu
coração e alma e disse “Faremos e ouviremos” (Êxodo 24:7), apenas então foi possível
cumprir o princípio de toda a Torá, que é deixar o reino da impossibilidade e entrar
no reino da possibilidade.
Pois então é absolutamente certo, se seiscentos mil homens tirarem sua
atenção de suas próprias necessidades e concordar em adiá-las por outra atividade e
devotarem-se na certificação que nenhum de seus amigos próximos careçam de algo,
e fizeram assim com incrível amor, com todos seus corações e com todas suas almas
e completamente cumprissem a Mitzvá “Ame ao próximo como a ti mesmo”, então
não há dúvida que nenhum homem da nação precisaria se preocupar com seu
próprio sustento
Através disto, cada pessoa tornou-se absolutamente livre da preocupação de
seu próprio sustento e podia facilmente guardar a Mitzvá “Ame ao próximo como a
ti mesmo” de acordo com todas as condições explicadas nas Seções 3 e 4. Pois como
alguém poderia se preocupar com seu próprio sustento quando seiscentos mil
amigos amados e leais estavam constantemente se certificando que todas as suas
necessidades fossem satisfeitas?
266 CABALÁ PARA O ESTUDANTE

Assim, depois que todos os membros da nação concordaram com isto, a Torá
foi imediatamente entregue a eles, já que eram então capazes de cumpri-la. Antes de
eles atingirem o tamanho de uma nação completa, falando do tempo dos patriarcas,
quando eram poucos, não eram verdadeiramente capazes de cumprir a Torá
propriamente, já que um pequeno número de pessoas não pode mesmo começar a
se envolver nas Mitzvot em relação ao homem e seu próximo à extensão de “Ame ao
teu próximo como a ti mesmo” como explicado nas Seções 3 e 4, é por isto que a
Torá não foi entregue a eles.
17) Assim podemos entender um dos ditos mais assombrosos dos sábios:
“Todos os Israelitas são responsáveis uns pelos outros” (Midrash Raba, Shir HaShirim
7:14) que parece totalmente injustificável. É possível se outra pessoa pecar, ou
transgredir e se irritar com seu Criador, e eu nem mesmo a conheça nem tenha nada
a ver com ela, que o Criador me fizesse pagar por sua transgressão? Há uma passagem
na Torá que diz: “Pais não serão mortos pelos pecados de seus filhos. Cada pessoa
deve ser mota por seu próprio pecado”, (Deuteronômio 24:16), assim como pode ser
dito que eu sou responsável pelos pecados de um completo estranho, de quem você
não conhece nem ele, nem seu paradeiro?
E como se isto não fosse suficiente, no Tratado Kiddushin, pg. 40b, é dito,
“Rabi Elazar filho do Rabi Shimon disse, ‘Já que o mundo é julgado pela maioria, e
o indivíduo é julgado pela maioria, aquele que cumpre uma Mitzvá faz com que ele
mesmo e o mundo todo aponte a escala do mérito; e ai daquele que comete uma
transgressão, pois ele faz com que ele mesmo e o mundo todo aponte para a escala
do demérito, como está escrito: ‘Um pecador causa a perda de muitos bens’”.
Dizendo isto, Rabi Elazar filho do Rabi Shimon nos faz responsáveis pelo
mundo todo, pois em sua opinião todas as pessoas no mundo são responsáveis umas
pelas outras. Cada pessoa provoca ou o mérito ou o demérito para o mundo todo
através de suas ações. E este é um grande enigma.
No entanto, de acordo com o que explicamos acima, suas palavras são
precisas e simples, já que claramente provamos que todas as 613 Mitzvot na Torá
revolvem ao redor desta única Mitzvá “Ame ao próximo como a ti mesmo”, e não
pode ser cumprida a menos que toda a nação, cujos todos membros, estejam prontos
para fazer isto.

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