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Actualidade do Tema
A actualidade de um tema está diretamente relacionada com o lugar que a coletividade lhe
reserva nas suas relações sociais. O direito do Consumidor nasce, desenvolve-se e justifica-se na
sociedade de consumo. Regula a produção e a comercialização de produtos e serviços pelo
prisma do consumo. E este — como nota Jean Baudrillard — tem um lugar certo: “é a vida
quotidiana”(l).
Ora, nada pode ser mais actual do que algo que se propõe a proteger a “vida quotidiana” dos
indivíduos.
O Direito do Consumidor é, pois, a disciplina jurídica da “vida quotidiana” do habitante da
sociedade de consumo. Seu surgimento, com alterações profundas no Direito tradicional,
decorre directamente da revolução industrial (com produção, comercialização, consumo, crédito
e comunicação em massa), já que esta mudou, por inteiro, o dia-a-dia dos homens — agora
chamados consumidores. A afirmação da actualidade do Direito do Consumidor não implica
dizer que antes de sua formulação não existissem consumidores ou que estavam eles
absolutamente desamparados.
Consumidores sempre existiram. Apenas o Direito — ou melhor, o legislador — não tinha uma
percepção clara de sua moldura, como sujeito diferenciado de categorias tradicionais (como o
comprador e o locatário, por exemplo). Mas mesmo sem lhe dar certidão de baptismo, o
ordenamento jurídico clássico possuía certos mecanismos de tutela do consumidor. Já é lugar
comum afirmar-se que tais instrumentos se mostraram inadequados para tal fim.
A adaptação de soluções do “liberalismo clássico”, produzidas em uma realidade econômica
inteiramente diversa da actual, deixou de levar em conta que “fenómenos de massa” não
comportam remédios individualistas, alicerçados em ideias sem qualquer conexão com a
sociedade de consumo. Princípios como os da liberdade contratual, da liberdade de comércio, da
não intervenção do Estado no gerenciamento do mercado, da responsabilidade do fornecedor
apenas por culpa, assim como as normas rígidas de legitimidade ad cau- sam e de prova, foram
formulados para regular relações sociais de feições diversas da relação de consumo. Aplicados
na sociedade de consumo, criam apenas mitos de direitos(2).
Mas por que esse despertar legislativo? Primeiro porque o surgimento da sociedade de consumo
propiciou o aparecimento de relações jurídicas antes desconhecidas. Ou, se se preferir, permitiu
o aparecimento de “formas de manifestação” singulares para as relações jurídicas clássicas
(compra e venda, locação, mútuo). Em segundo lugar, a mesma sociedade de consumo, pela
massificação de suas relações e pelo fortalecimento da empresa, criou uma situação de
“vulnerabilidade” para o consumidor.
Não se pense, contudo, que a mera vulnerabilidade do consumidor conseguiria, de per se,
sensibilizar o legislador ou o aplicador. A “universabilidade” desta vulnerabilidade é que
explica a intervenção legislativa. Quanto maior for o número dos vulneráveis, maior será a
sensibilidade estatal. É que em uma sociedade democrática, compreensivelmente, a equação
numérica tem enorme peso. Esta é a razão para que o Direito, muitas vezes, fique ao lado da
maioria mesmo que com a minoria esteja o poder e a riqueza (3). Daí que o Direito do
Consumidor não se justifica apenas como produto da sensibilidade do legislador para com a
vulnerabilidade do consumidor. Igualmente relevante no seu desenvolvimento é o facto de que
os consumidores são imensamente maioritários no mercado.
Óbices à Autonomia
Diversas são as dificuldades que se antepõem a um esforço autonomista para o Direito do
Consumidor. Cinco seriam as principais: a novidade do tema, o estado assistemático das normas
de consumo, a multidisciplinaridade, a supraindividualidade do interesse do consumidor, o
tratamento já dispensado por outros ramos do Direito a certas matérias reivindicadas pelo
Direito do Consumidor, a mutabilidade mercadológica e, finalmente, a ausência de tribunais
especializados em conflitos de consumo.
A Novidade do Tema
A primeira dificuldade, sem dúvida alguma, é a novidade do tema, qualidade esta que decorre
principalmente do facto de que só há pouco tempo o Direito descobriu que, ao lado do
comprador, do locatário, do segurado, do passageiro e da vítima tradicionais, existe um outro
sujeito que, por muito tempo, parasitou na órbita destes conceitos: o consumidor. Novidade,
ademais, é a concepção que põe, no centro da disciplina, o consumidor, enquanto que, no
modelo tradicional, o comerciante concentrava as atenções dos juristas. Finalmente, original é o
carácter colectivo que se empresta ao Direito do Consumidor. Não se trata apenas de proteger o
consumidor isoladamente considerado, mas, principalmente, de tutelá-lo perante fenômenos
colectivos que, por isso mesmo, exigem soluções coletivas.
Fala-se em Direito do Consumidor como uma disciplina jurídica absolutamente pioneira. Tal é
verdade em parte. É certo que só em 1972, pela primeira vez, usou-se na França a expressão
Direito do Consumidor, em um colóquio realizado em Aix-en-Provence (22). Entretanto,
conforme já notamos acima, se entendermos o mercado como sendo objecto de regulamentação
legal permanente, seja através de normas de pesos e medidas, seja mediante as proibições contra
fraude ou mesmo o estabelecimento de princípios gerais de comportamento negocial, como o da
boa-fé, haveremos de chegar à conclusão de que o Direito — sem grande sucesso e ausente
qualquer sistematização — sempre protegeu o consumidor(23).
Mas a novidade do tema, por si só, não impede a autonomia do Direito do Consumidor.
Nenhuma disciplina jurídica nasce “pronta”. Todas são fruto de lenta evolução. E, em algum
momento de seu desenvolvimento, também foram novidade.
A Desordem Sistemática
Também não se pode negar a existência de verdadeira desordem sistemática na tutela do
consumidor. Tal se explica pelo facto do Direito do Consumidor ainda estar em processo de
consolidação. Mas nesse amontoado de normas de origens diversas, de jurisprudência
contraditória e de doutrina ainda insegura e em rápida evolução, bem se pode enxergar os
fundamentos da nova disciplina, com um regime próprio e informado pela “necessidade de
promover os interesses dos consumidores face ao poder de seus parceiros econômicos,
produtores, distribuidores e prestadores de serviços”(24).
Nos países que já possuem um arcabouço de normas de consumo, codificado e sistematizado,
como o Brasil, é mais fácil defender-se a autonomia do Direito do Consumidor. Mas a
codificação, já dissemos, não é requisito intransponível para a autonomia da disciplina. Mesmo
sem uma estrutura assentada em um Código, mas baseada em leis esparsas, é certo afirmar que
quanto mais amplo e articulado for o sistema legal especial colocado à disposição do
consumidor, mais visível será o novo Direito, v.g., nos Estados Unidos, Canadá, Austrália, nos
países escandinavos e no seio da Comunidade Econômica Europeia.
Mas se a dispersão de assentos normativos não inviabiliza a autonomia, não há como negar-se
que passa — para o intérprete e para a própria sociedade — um certo ar de desorganização, o
que, de certa maneira, dificulta o trabalho do jurista na identificação dos traços particulares da
disciplina. Logo, fartura de legislação especial não é sinônimo de maturidade do Direito do
Consumidor. É por isso que, na Europa, ressalta-se sempre a carência de uniformidade nas
normas de consumo, o que vem a caracterizar o Direito do Consumidor muito mais como um
fundo que se pode pôr em ordem(25).
O caos relativo que reina, assim, no campo do Direito do Consumidor, não é óbice nem à sua
autonomia nem a sua codificação. O ”panorama caótico de expansão dinâmica dum campo
especial do Direito, ao invés de constituir um obstáculo intransponível ao trabalho paciente e
disciplinado do codificador, antes deve estimula-lo no esforço benéfico de coordenação. Na
realidade, direito calmo, imutável e estagnado — é já direito morto”(26).
Princípio da Vulnerabilidade
Vulnerável, segundo o dicionário Aurélio “é tudo àquilo que pode ser vulnerado. É àquele que
se encontra do lado fraco de um assunto ou de uma questão” (FERREIRA A. B., 2009, p. 2078).
A vulnerabilidade do consumidor fundamenta todo o sistema de consumo (BRAGA NETTO,
2008, p. 43). Tal premissa escuda-se na verificação de que o consumidor, na maior parte das
vezes, é o polo mais fraco da relação, ou seja, aquele que merece uma melhor atenção no
momento da apreciação de uma demanda que tenha como base uma relação de consumo.
Assim, a LDC parte do pressuposto de que o consumidor é um sujeito vulnerável ao adquirir
produtos e serviços ou simplesmente se expor a práticas do mercado. A vulnerabilidade é o
ponto fundamental da LDC e, na prática, traduz-se na insuficiência, na fragilidade de o
consumidor se manter imune a práticas lesivas sem a intervenção auxiliadora de órgãos ou
instrumentos para sua proteção. Por se tratar de conceito tão relevante, a vulnerabilidade
permeia, directa ou indirectamente, todos os aspectos da proteção do consumidor.
Em rápido apanhado histórico, é preciso saber que o modo de produção da economia mundial
tem se modificado profundamente, especialmente pelos avanços tecnológicos da humanidade.
No século XVIII, vários países da Europa atravessaram a chamada Revolução Industrial
(processo histórico marcado pela invenção da máquina a vapor, a partir do qual se deixou de
produzir bens de consumo manualmente – o que era feito em pequena escala e de modo
rudimentar – para fabricá-los a partir de máquinas, aumentando consideravelmente a oferta
destes bens no mercado).
Antes, as relações entre comerciantes e seus compradores eram pessoais e estes últimos
detinham maior poder de decisão quanto à escolha, forma de pagamento, técnica adoptada para
a feitura do bem, correcta identificação do comerciante e seu domicílio, factores que lhes
permitiam exercer não apenas uma negociação segura, mas também confiável. Com a produção
em larga escala (também conhecida como Fordismo – em alusão ao industrial norte-americano
Henry Ford, criador da linha de produção), principalmente após a Segunda Guerra Mundial, o
comércio se despersonalizou. A vontade do consumidor nem sempre tem sido considerada,
como ocorre nos contratos de adesão.
Observa-se, ademais, em algumas áreas, a imposição de condições mais vantajosas para o
fornecedor, tais como: o controle das informações transmitidas aos consumidores, a eliminação
dos atendimentos pessoais, o aumento das vendas a distância (vendas em domicílio,
inicialmente, depois por telefone e, hoje, pela internet), o incremento das vendas a partir de
técnicas publicitárias (de marketing), formas de pagamento e demais regras impostas para o
alcance de seus produtos ou serviços. Os consumidores, a partir de então, experimentam
situações cada vez mais desfavoráveis demonstrando extrema fragilidade ao se relacionar no
mercado1.
O modo encontrado pelos fornecedores para se sobreporem na relação com tantos e indefinidos
consumidores foi se apoiar em formulários nos quais se inserem as imposições contratuais,
cumprindo ao consumidor, em regra, tão somente aceitá-los na sua integralidade ou rejeitá-los.
Este é um factor, dentre outros, que contribuiu para que as relações de consumo sejam
massificadas, isto é, concluindo as contratações em bloco sem atenção para a necessidade ou
vontade individual de cada consumidor. O instrumento por excelência das relações de consumo
em massa são os chamados contratos de adesão. O que se pode daí extrair é que o consumidor
deixou de ter livre-escolha, o alcance de sua vontade real sobre o que adquire, para
simplesmente submeter-se às condições gerais do mercado. Com efeito, uma vez caracterizada a
vulnerabilidade (esta marca de diferença) do consumidor, o Estado viu-se obrigado a intervir no
mercado a partir da Lei para garantir aos consumidores o restabelecimento de igualdade e
respeito à sua existência digna.
Processo histórico parecido aconteceu com as Leis Trabalhistas. Mas, de antemão, é importante
realçar que a LDC não é uma lei que protege o consumidor a todo e qualquer custo. Não é
sempre verdadeiro o ditado de que o consumidor tem sempre razão. A LDC veio para
restabelecer uma situação de equilíbrio entre consumidor e fornecedor. É exactamente o que
estabelece a meta de harmonização das relações de consumo. Logo, o consumidor deve pagar
um preço justo e agir de boa-fé.
Nesse contexto, observa-se que a LDC é um microssistema jurídico que determina a prevalência
do Princípio da boa-fé e transparência nas relações de consumo, com o intuito de garantir a
harmonização dos interesses das partes, restabelecendo uma situação de igualdade onde há uma
desigualdade de facto. Tais princípios determinam que o consumidor e o fornecedor contratem
com lealdade e segurança recíprocas. Assim o Princípio da proteção da confiança do
consumidor, tem como um dos seus aspectos “a proteção da confiança na prestação contratual,
que dará origem às normas que procuram garantir ao consumidor a adequação do produto ou
serviço adquirido, assim como evitar riscos e prejuízos oriundos destes produtos e serviços¹²”. A
transparência, confiança, harmonia nas relações de consumo, reconhecimento da
vulnerabilidade do consumidor, bem como a harmonização de interesses, sempre com base na
boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores, são princípios que devem
sempre estar presentes nas relações de consumo.
Assim, nota-se que entre os objectivos da Política Nacional das Relações de Consumo estão o
respeito à dignidade, o atendimento à saúde e segurança dos consumidores, a proteção dos
interesses econômicos e a transparência e harmonia nas relações de consumo, por intermédio do
1
Atenção! A palavra mercado tem vários sentidos. Pode designar um espaço físico onde comerciantes se reúnem para oferecer
bens de consumo (ex.: Mercado Municipal de uma cidade); pode indicar um ramo específico de certa actividade empresarial (ex.:
o mercado de automóveis importados cresceu muito depois que o dólar baixou); ou, em seu significado amplo, mercado de
consumo é todo o conjunto de actividades econômicas (de toda natureza e forma, inclusive por meios eletrônicos, fora e dentro
dos estabelecimentos comerciais, bancárias, securitárias, financeiras e creditórias) envolvendo o fornecimento de produtos e
serviços.
reconhecimento do Princípio da vulnerabilidade. Para Valério Dal Pai Moraes, vulnerabilidade,
sob o enfoque jurídico, é, então, o princípio pelo qual o sistema jurídico positivado reconhece a
qualidade ou condição daquele(s) sujeito(s) mais fraco(s) na relação de consumo, tendo em vista
a possibilidade de que venha(m) a ser ofendido(s) ou ferido(s), na sua incolumidade física ou
psíquica, bem como no âmbito econômico, por parte do(s) sujeito(s) mais potente(s) da mesma
relação¹³.
A vulnerabilidade possui quatro nuances que devem ser estudadas: técnica, fática, jurídica e
informacional, senão vejamos.
Vulnerabilidade técnica é aquela em que falta ao consumidor o conhecimento científico ou se
faz ausente a melhor expertise, no que tange ao mau funcionamento do bem de consumo.
Isto quer dizer que, sendo o fornecedor o expert da relação, conhecedor, por exemplo, da
matéria-prima utilizada na confecção do bem de consumo, como no caso do tecido de um terno,
da placa mãe que integra um computador ou até mesmo do tipo de agrotóxico utilizado na
produção de hortifrutigranjeiros, restou para o consumidor o qualificativo da vulnerabilidade
nas questões de ordem técnica (BOLZAN, 2013, p. 199).
É o fornecedor quem detém o controle e conhecimento sobre o meio de produção dos bens
(MELO, 2010, p. 55), acrescentando Miragem (2008, p. 63):
O que determina a vulnerabilidade, nesse caso, é a falta de conhecimentos específicos do
consumidor e, por outro lado, a presunção ou exigência destes conhecimentos pelo fornecedor.
É o exemplo da relação existente entre o médico e o seu paciente, na qual o primeiro detém
informações científicas e clinicas que não estão ao alcance do consumidor leigo no assunto. Da
mesma forma, a relação de consumo envolvendo qualquer produto industrializado. Cogite-se de
uma dona de casa que adquira um computador. Não se pode exigir que possua conhecimentos
especializados sobre informática. Ora, as técnicas de fabricação e as características do produto
presumem- se ser do conhecimento do fornecedor.
Na vulnerabilidade fática ou socioeconômica, o ponto de concentração é o fornecedor, que, por
sua posição de supremacia e poderio econômico, impõe sua superioridade a todos que com ele
contratam (MARQUES, 2016, p. 333).
Nesta hipótese de vulnerabilidade, a fragilidade reside na falta do mesmo porte econômico do
fornecedor. Imagine-se o exemplo de uma pessoa física, consumidora de pequeno porte, que
resolve se aventurar em contratar com uma gigantesca rede de supermercados ou com uma
empresa multinacional (MIRAGEM, 2008, p. 63). Sua fragilidade é flagrante.
Esta vulnerabilidade pode guardar relação com a dinâmica da relação de consumo, como na
hipótese de uma campanha de marketing que venha a se aproveitar da credulidade do
consumidor. Quem um dia, não foi convidado por um grande amigo para participar de um
negócio que lhe deixaria, de uma hora para outra, RICO?
Empresas de marketing multinível (“boca a boca”) reservam salões de grandes hotéis, arenas
esportivas, dentre outras localidades que passem uma sensação de prosperidade, riqueza e
felicidade, para receber consumidores que são trazidos, normalmente, por amigos, para, após
horas de imersão, serem submetidos a uma tentadora proposta de negócios.
São situações em que se identifica a fragilidade de uma das partes, como na hipótese de um
consumidor crédulo ou mais humilde, que se deixa levar pela conversa enganosa de um
vendedor que afirma ser o melhor presente o produto mais caro da loja. Perceba, que nesta
hipótese o preposto não necessariamente trouxe questões de ordem técnica afetas ao produto ou
jurídicas relacionadas ao contrato, mas denota-se uma situação de fragilidade (BOLZAN, 2013,
p. 200).
Finalmente, ainda é possível existir uma debilidade agravada, como na hipótese do consumidor
criança ou idoso, ambos detentores de atonias específicas, como capacidade reduzida de
discernimento e falta de percepção (MIRAGEM, 2008, p. 64), onde simplesmente inexista uma
paridade mínima desencadeada no nascimento da relação jurídica.
Vulnerabilidade jurídica ou científica é a falta de conhecimentos jurídicos específicos, como na
hipótese recorrente de seguros de telefones celulares em que a oferta assegura a cobertura para
roubo e furto, mas no momento do sinistro evidencia-se cláusula contratual que só garante o
ressarcimento para furto qualificado.
O consumidor é considerado vulnerável juridicamente quando lhe falta conhecimento sobre a
matéria jurídica ou a respeito de outros ramos científicos, como da publicidade ou do marketing.
Durante alguns anos essa vulnerabilidade classificava-se somente como jurídica, como que
somente esta ciência se apresentasse como capaz para desvelar questões que envolviam o
mercado de consumo. Esse pensamento sempre tomou por base a fraqueza do consumidor na
apreciação das cláusulas dos contratos, sobretudo os de adesão, cuja confecção é monopolizada
pelo fornecedor. A impossibilidade de discutir os termos contratuais maximiza a
vulnerabilidade jurídica do consumidor, no entanto, é patente sua fragilidade em outros ramos
científicos (BOLZAN, 2013, p. 199).
Vulnerabilidade informacional é aquela que resulta de um déficit produzido pela ausência das
informações inerentes ao bem de consumo adquirido ou, ainda, pela deficiência interpretativa de
instrumentos contratuais que, por muitas vezes, são redigidos propositalmente para produzir
esse estado de desigualdade.
Esta vulnerabilidade guarda relação com a importância das informações relativas aos bens de
consumo e sua influência no poder de decisão do consumidor no momento de suas escolhas. Ela
é relevante em um mundo contemporâneo, em que o consumidor é persuadido em sua liberdade
de opinião pelas técnicas agressivas inerentes à oferta, por ser o fornecedor o grande detentor e
manipulador da informação. Por este motivo, trata-se de relação díspar e merecedora da
proteção do mais frágil, sob o prisma da informação (BOLZAN, 2013, p. 201).
2
Artigo 78.º (Direitos do consumidor)
1. O consumidor tem direito à qualidade dos bens e serviços, à informação e esclarecimento, à garantia dos seus produtos e à
protecção na relação de consumo.
2. O consumidor tem direito a ser protegido no fabrico e fornecimento de bens e serviços nocivos à saúde e à vida, devendo ser
ressarcido pelos danos que lhe sejam causados.
3. A publicidade de bens e serviços de consumo é disciplinada por lei, sendo proibidas todas as formas de publicidade oculta,
indirecta ou enganosa.
4. A lei protege o consumidor e garante a defesa dos seus interesses.
directamente a todas as entidades públicas e privadas, não se está a referir a todos os preceitos
constitucionais constantes da Constituição, mas apenas aos preceitos respeitantes aos Direitos,
Liberdades e Garantias4. Isto significa que, para se pensar na aplicação da força jurídica
derivada do art. 28.º, n.º 1 da CRA, ao art.º 78.º, relativo aos direitos dos consumidores, deverá
enquadrar-se no Capítulo II «Direitos, Liberdades e Garantias Fundamentais» do citado
diploma5.
Para se ultrapassar esta dificuldade, a única maneira é apoiar-se na própria Constituição que, no
seu art. 27.º6, estende o âmbito de aplicação do regime dos Direitos, Liberdades e Garantias a
todos os direitos fundamentais de natureza análoga. Estabelece o preceito mencionado que «o
regime jurídico dos direitos, liberdades e garantias, enunciados neste capítulo [II], é aplicável
aos direitos, liberdades e garantias e aos direitos fundamentais de natureza análoga,
estabelecidos na Constituição, consagrados por lei ou por convenção internacional»7.
A doutrina8 não é unânime quanto à aplicação directa ou imediata do art. 78.º da CRA (60.º da
CRP) às relações de consumo. Todavia, há autores que entendem que os direitos do consumidor
são considerados análogos aos direitos, liberdades e garantias porque «por um lado, a
participação do Estado na sua realização prescinde das ditas prestações sociais (direitos que
precisam da intervenção estatal para a sua concretização, como é o caso do direito ao trabalho,
ao ensino, etc.) típicas e, por outro, porque têm o seu conteúdo definido independentemente de
uma norma infra constitucional»9. Ou seja, não são todos os direitos dos consumidores
considerados análogos aos direitos, liberdades e garantias, e, por isso, merecedores de aplicação
directa e imediata desta norma, nas relações privadas de consumo. É o caso do direito à
protecção dos interesses económicos e do direito das associações a terem apoio e a serem
ouvidas pelo Estado, uma vez que, por assumirem natureza social, a sua materialização carece
da intervenção do Estado.
Sendo o direito à qualidade dos bens e serviços, o direito à protecção da saúde e à segurança
física, o direito à informação e á reparação dos danos, considerados análogos aos direitos,
liberdades e garantias fundamentais, pode haver aplicação directa10 daquela norma
constitucional, com base na ideia de que as normas fundamentais são aplicáveis de forma
obrigatória e directamente no comércio jurídico entre entidades privadas, individuais ou
colectivas, sem necessidade de mediação pelo poder legislativo ou de utilização de cláusulas
abertas do direito privado11.
Parece-nos que, por força do art. 27.º da CRA, o art.78.º do mesmo diploma se aplica
directamente12 às relações de consumo, podendo o consumidor invocar este preceito
directamente contra o Estado (Administração Pública) e as entidades privadas (art. 78.º), sempre
que os seus direitos sejam violados13, por serem considerados análogos aos direitos, liberdades
e garantias fundamentais. No entanto, não há ainda em Angola um relato de um caso concreto
em que se tivesse aplicado directamente o art. 78.º da CRA.
Ministério Público
Caracterizando-se tradicionalmente o MP pela riqueza e diversidade das funções que lhe são
acometidas, verifica-se que o art. 186.º da CRA determina que «ao MP compete representar o
Estado, defender a legalidade democrática e os interesses que a lei determinar, promover o
processo penal e exercer a acção penal, nos termos da lei, nomeadamente […], al. d) defender
os interesses colectivos e difusos». O MP é uma instituição essencial à função judiciária do
Estado, é composto por magistrados destacados junto de cada tribunal e investidos do poder de
exercer o controlo genérico da legalidade, do poder de exercer a acção penal, do de representar
o Estado e ainda com outras funções atribuídas por lei, em conformidade com os arts. 189.º da
Constituição e 2.º, da Lei n.º 5/90, de 7 de Abril193.
A LDC e a LCGC contém normas que legitimam a actuação do MP na área dos direitos do
consumidor.
O MP, sempre que estejam em causa interesses individuais, homogéneos, colectivos ou difusos,
de harmonia com o parágrafo 2.º do art. 27.º e art. 28.º alínea c), ambos da LDC, tem
legitimidade activa para intentar as acções previstas na referida lei.
Nestes termos, a LDC atribui-lhe expressamente uma competência genérica para «a defesa dos
consumidores194, no âmbito da presente lei e no quadro das respectivas competências,
intervindo em acções administrativas e cíveis tendentes à tutela dos interesses individuais
homogéneos, bem como de interesses colectivos ou difusos»195.
Porém, a violação dos direitos do consumidor ocorre no âmbito dos contratos de adesão,
nomeadamente por via das cláusulas contratuais gerais, sendo que a LCGC dispõe que tem
legitimidade activa para interpor acção inibitória destinada a obter a condenação pela utilização
de cláusulas contratuais gerais que violem a referida lei, o Ministério Público, oficiosamente ou
mediante solicitação fundamentada de qualquer interessado, de acordo com o disposto na al. c)
do n.º 1do art. 19.º da LCGC.
«Pensar no Direito do Consumidor, em certa medida, significa pensar no alcance da actuação
do Ministério Público, definir para onde e até que ponto intervir, pensar no quanto e no que
pode e deve ser feito em benefício da colectividade»196.
Pelo exposto, fica o entendimento de que, além de ao MP competir a defesa dos interesses
colectivos e difusos, de acordo com o art. 186.º, al. d) da CRA, lhe é também reconhecida
legitimidade activa, na LDC e na LCGC, para intervir nos casos em que se verifiquem práticas
lesivas dos direitos e interesses do consumidor.
Entretanto, apesar da legitimidade que lhe é conferida por lei, para agir em nome e no interesse
do consumidor, não há, na prática judicial angolana, relato de caso algum revelador da actuação
do MP em defesa do interesse do consumidor.
Associações de Consumidores
As associações de consumidores são pessoas colectivas dotadas de personalidade jurídica, sem
fins lucrativos, cujo objectivo principal consiste na protecção dos direitos e interesses dos
consumidores em geral e, em particular, dos consumidores seus associados200. Estas podem ser
de âmbito nacional201 ou local, consoante a área em que se que se circunscreve a sua acção
(art. 31.º, n.º 1 e 2 da LDC e art. 1.º da Lei das Associações)202.
A LDC não faz referência às associações de âmbito regional. Todavia, a Lei das Associações
faz essa referência e define-as, no art. 3.º, n.º 3, como aquelas cuja actividade se circunscreve a
uma região socioeconômica, abrangendo o território de mais de uma província.
A LDC consagra vários direitos inerentes às associações de consumidores no art. 32.º do
referido diploma, nomeadamente o direito de, junto das autoridades administrativas ou judiciais
competentes em matéria de direito do consumo, solicitar que sejam apreendidos e retirados do
mercado determinados bens e serviços, assim como a interdição da comercialização de certos
bens e serviços no mercado, em virtude do seu potencial lesivo dos direitos e interesses dos
consumidores n.º 1 al. b), solicitar ainda que sejam retiradas do mercado mensagens
publicitárias enganosas ou abusivas, al. c) e solicitar também que sejam prestados
esclarecimentos sobre a formação dos preços dos bens e serviço, al. e), etc.
Os seus programas de defesa são levados a cabo com o auxílio do Estado, especificamente do
INADEC203. Por outro lado, a actuação em tribunal das entidades associativas na defesa dos
consumidores estão isentas de qualquer custo judicial (art. 29.º da LDC). Com o regime
estabelecido pela LDC, as associações de consumidores estão legitimadas para acordos de boa
conduta com os profissionais ou as suas organizações representativas, destinados a gerir as
relações de consumo (art. 33.º da LDC). Na sua actuação, são fundamentalmente relevantes os
procedimentos fundados na colaboração e cooperação, baseados no diálogo entre distintas
organizações para a defesa dos interesses dos consumidores204.
A AADIC é a única destas associações existente em Angola e é de âmbito nacional.
A AADIC tem como objecto o estabelecimento das bases gerais e regras de intermediação para
a resolução de conflitos entre consumidores e fornecedores, assim como a realização de
actividades associativas de informação205 às comunidades (art. 2.º do seu Estatuto).
A AADIC tem como principais objectivos criar programas no âmbito da formação, educação e
sensibilização permanente em matérias relacionadas com o consumo, denunciar actos lesivos do
consumidor, praticados pelos estabelecimentos comercias, mercados (informais) e outros,
reservando-se o direito de solicitar junto das autoridades administrativas ou judiciais
competentes, a apreensão de bens ou a interdição de serviços lesivos dos direitos do consumidor
(art. 7.º do seu Estatuto).
A intervenção desta Associação nas políticas relacionadas com o consumo e com os direitos do
consumidor tem sido fundamental para a tomada de muitas decisões, sobretudo no que diz
respeito à exigência ao INADEC de uma melhor fiscalização da qualidade dos bens e serviços
colocados no mercado de consumo.
Introdução
A aplicação do Código de Defesa do Consumidor exige que se vislumbre a ocorrência de uma
relação de consumo, razão pela qual, para que possamos avançar com o estudo dos Direitos
Básicos dos Consumidores (Capítulo 3), é necessário identificar os elementos que compõem a
relação jurídica de consumo, quais sejam: o consumidor, o fornecedor, o produto e o serviço.
A relação jurídica deriva da vida em sociedade, a qual enseja interações de natureza distinta:
afectiva, cultural, religiosa, recreativa, que, em si, são destituídas de relevância jurídica; outras,
entretanto, têm natureza econômica, familiar, funcional, pública, exigindo, por sua importância
social, disciplina jurídica. As relações sociais reguladas pelo Direito tornam-se relações
jurídicas (CAVALIERI FILHO, 2011, p. 57).
O conceito de relação jurídica foi pontuado, de forma clássica, por Savigny no século passado,
como ressalta Leaês (1991, p. 15). Em linhas bem gerais, o termo indica que o Direito
reconhece de plano a prevalência do interesse de um indivíduo, relativo a determinado bem
jurídico destinado a satisfazer certa necessidade, sobre o interesse de outro(s) indivíduo(s),
resultando duas posições distintas que correspondem às situações de vantagem e subordinação
entre os integrantes da relação jurídica, aqui denominados como: sujeito activo e sujeito
passivo, respectivamente (LUCCA, 2008, p. 83).
Baseando-se nesse fundamento, relação jurídica pode ser conceituada como toda relação civil
disciplinada pelo Direito. Tal relação possui elementos integrantes, considerados subjectivos e
objectivos. Os primeiros são relacionados ao(s) sujeito(s) da relação jurídica (activo e passivo),
ao passo que o(s) objectivo(s) vinculam-se ao(s) objecto(s) da relação jurídica.
É interessante observar que, de acordo com o ramo do Direito abordado, as denominações dos
elementos objectivos e subjectivos sofrem mutações e aquela relação jurídica primária se
amolda ao pertinente campo do Direito. Tal construção produz laços simbióticos, que
proporcionam designação própria ligada ao campo do direito proposto.
Aplicando-se essa premissa ao campo do direito em tela, o elemento subjectivo activo é
denominado consumidor (sujeito activo); o elemento subjectivo passivo é representado pelo
fornecedor (sujeito passivo) e o elemento objectivo é identificado como produto ou serviço
(objecto), sendo que a relação jurídica passa a ser definida como relação de consumo.
Consumir é um acto de cidadania através do qual o cidadão contribui sinergicamente para a
movimentação da teia existente entre consumidores, empresas e Estado, ao mesmo tempo em
que atende às necessidades daqueles (PORTO, 2014, p. 88).
A teoria finalista
A corrente finalista defende a teoria que o consumidor – destinatário final seria apenas aquela
pessoa física ou jurídica que adquire o produto ou contrata o serviço para utilizar para si ou para
outrem de forma que satisfaça uma necessidade privada, e que não haja, de maneira alguma, a
utilização deste bem ou deste serviço com a finalidade de produzir, desenvolver atividade
comercial ou mesmo profissional. Os finalistas afirmam que, ao se adquirir um produto ou
serviço com a finalidade de desenvolver uma actividade de produção, seja para compor o
estabelecimento ou para revender o produto, mesmo que transformado, este não estaria
utilizando o produto ou serviço como destinatário final. Nesta conjuntura estaria se
caracterizando a compra do produto ou a contratação do serviço para a produção ou
comercialização, pois este seria destinado, tão somente, para a revenda, transformação ou
incorporação ao estabelecimento, para que um consumidor – destinatário final adquira ou
contrate com este profissional ou empresa. “Destinatário final seria aquele destinatário fático e
econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segundo esta
interpretação teleológica, não basta ser destinatário fático do produto, retirá-lo da cadeia de
produção, levá-lo para o escritório ou residência – é necessário ser destinatário final econômico
do bem, não adquiri-lo para revenda, não adquiri-lo para uso profissional, pois o bem seria
novamente um instrumento de produção cujo preço será incluído no preço final do profissional
que o adquiriu. Neste caso, não haveria a exigida ‘destinação final’ do produto ou do serviço,
ou, como afirma o STJ, haveria consumo intermediário, ainda dentro das cadeias de produção e
de distribuição.”179 De acordo com a corrente finalista, o comerciante e o profissional poderão
ser considerados como consumidores, quando adquirirem produtos ou contratarem serviços para
o uso não profissional, ou seja, que não tenham nenhuma ligação com a sua atividade produtiva.
Desta maneira, estariam utilizando o produto ou o serviço para uso privado, por uma
necessidade ou satisfação pessoal, de tal modo, poderiam ser considerados como vulneráveis.
A teoria maximalista
A corrente maximalista defende a teoria de que o consumidor – destinatário final seria toda e
qualquer pessoa física ou jurídica que retira o produto ou o serviço do mercado e o utiliza como
destinatário final. Nesta corrente não importa se a pessoa adquire ou utiliza o produto ou serviço
para o uso privado ou para o uso profissional, com a finalidade de obter o lucro. Os
maximalistas veem “nas normas do CDC o novo regulamento do mercado de consumo
brasileiro, e não normas orientadas para proteger somente o consumidor não-profissional. O
CDC seria um código geral sobre o consumo, um código para a sociedade de consumo, que
institui normas e princípios para todos os agentes do mercado, os quais podem assumir os
papéis ora de fornecedores, ora de consumidores. A definição do art. 2.° deve ser interpretada o
mais extensamente possível, segundo esta corrente, para que as normas do CDC possam ser
aplicadas a um número cada vez maior de relações no mercado. Consideram que a definição do
art. 2.° é puramente objetiva, não importando se a pessoa física ou jurídica tem ou não fim de
lucro quando adquire um produto ou utiliza um serviço. Destinatário final seria o destinatário
fático do produto, aquele que o retira do mercado e o utiliza, consome, por exemplo, a fábrica
de toalhas que compra algodão para reutilizar e a destrói. Segundo esta teoria maximalista, a
pergunta da vulnerabilidade in concreto não seria importante. Defende que, diante de métodos
contratuais massificados, como o uso de contratos de adesão, todo e qualquer co-contratante
seria considerado vulnerável.”180 Os maximalistas defendem que será considerado como
consumidor aquele que retire o produto ou serviço do mercado e que o utilize como destinatário
final, sem importar se este produto ou serviço adquirido seja utilizado para satisfazer uma
necessidade pessoal, ou para ser incorporado a um novo processo de produção. Nota-se,
portanto, que o elemento fático para definição do status de consumidor à pessoa física ou
jurídica, nesta corrente, não se dará, pelo sujeito de direitos que adquiriu o produto ou o serviço.
Este sujeito será definido como consumidor, tão somente, por realizar a compra do produto ou a
contratação do serviço. Cabe ainda, uma observação quanto a esta corrente: Se todas as pessoas,
profissionais ou não, que adquirem ou utilizam um produto ou um serviço serão consideradas
como consumidores, dessa maneira, somente uma pessoa que estiver vinculada ao processo de
produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição
ou comercialização do produto que está sendo adquirido, não poderá ser considerada como
consumidor.
A teoria mista
Esta corrente, também é conhecida como teoria finalista temperada ou teoria finalista
aprofundada. Porém, não consideramos que esta teoria seria um mero aprofundamento da teoria
finalista. É bem verdade que esta teoria mescla elementos da teoria finalista e também da teoria
maximalista. Desta forma, consideramos errônea a denominação finalista temperada ou finalista
aprofundada, sendo, pois, mais adequado denominá-la como teoria mista. Nesta corrente
doutrinária, o consumidor – destinatário final seria aquela pessoa que adquire o produto ou o
serviço para o uso privado, porém, admitindo-se esta utilização em atividade de produção, com
a finalidade de desenvolver atividade comercial ou profissional, desde que seja provada a
vulnerabilidade desta pessoa física ou jurídica que está adquirindo o produto ou contratando o
serviço. “Em casos difíceis envolvendo pequenas empresas que utilizam insumos para a sua
produção, mas não em sua área de expertise ou com uma utilização mista, principalmente na
área dos serviços, provada a vulnerabilidade, concluiu-se pela destinação final de consumo
prevalente. Esta nova linha, em especial do STJ, tem utilizado, sob o critério finalista e
subjetivo, expressamente a equiparação do art. 29 do CDC, em se tratando de pessoa jurídica
que comprove ser vulnerável e atue fora do âmbito de sua especialidade, como hotel que
compra gás. Isso porque o CDC conhece outras definições de consumidor. O conceito-chave é o
da vulnerabilidade.”181 A teoria mista trata diferenciadamente aqueles que adquirem um
produto ou serviço para utilizá-lo como forma de produção, pois estes adquirentes podem
possuir tanta vulnerabilidade em relação ao produto ou serviço que está sendo adquirido, como
qualquer outra pessoa que o utilizaria para satisfação de uma necessidade própria. Seria, por
exemplo, a padaria que compra um veículo automotor para utilizá-lo na entrega das encomendas
e este apresenta diversos vícios de produção; ou ainda, a empresa de entrega de
correspondências que adquire um veículo para utilizar no transporte de mercadorias e este
apresenta os mesmos problemas encontrados no automóvel adquirido pela padaria. Há de se
notar que tanto o padeiro como a empresa de entrega de correspondências possuem habilidades
distantes da produção de automóveis, portanto podem não ter o menor conhecimento técnico
sobre veículos, da mesma maneira que qualquer outra pessoa que adquire o veículo para uso
privado. Para a teoria mista, são todos igualmente vulneráveis neste aspecto. Esta corrente, entre
as três já mencionadas, apresenta mais concordância com o princípio fundamental do Código de
Defesa do Consumidor, que é a proteção dos mais fracos perante os mais fortes, daqueles que
são, portanto, notadamente, vulneráveis. O Código do Consumidor brasileiro tem como
elemento fático a proteção dos vulneráveis, em observância da boa-fé empregada na relação
jurídica de consumo. Seguindo a corrente finalista, o padeiro e a empresa de entrega de
correspondências, sujeitos de direitos que utilizamos como exemplo neste item, mesmo sendo,
visivelmente, as partes vulneráveis da relação jurídica estabelecida com a fabricante dos
automóveis, não poderiam se utilizar do CDC para elucidar seu problema, pois não seriam
considerados consumidores. Assim sendo, fica evidenciado uma proteção incompleta do Código
de Proteção e Defesa do Consumidor, pois não estaria atingindo o objetivo de harmonizar as
relações jurídicas de consumo entre os sujeitos de direitos vulneráveis e os sujeitos que estão na
posição de comando. Se a corrente finalista não transmite uma proteção integral, a teoria
maximalista, por sua vez, faz uma proteção demasiada, quando incumbe ao CDC uma tarefa que
seria do Código Civil brasileiro: regulamentar a relação jurídica entre dois fornecedores, que
devem ser tratados como iguais. Destarte, não restam dúvidas de que a corrente que adota a
teoria mista é a mais condizente com o intento e com os princípios que conduzem todo o Código
de Proteção e Defesa do Consumidor, a saber: o reconhecimento da vulnerabilidade do
consumidor e a aferição da boa-fé nas relações entre consumidores e fornecedores. Portanto, a
teoria mista, corrente da qual faço parte, determina de forma mais acertada o conceito de
consumidor – destinatário final.
Consumidores equiparados
Até este momento, tratamos neste capítulo da explicitação do termo consumidor, quando
conferido àquela pessoa individual, determinável, que, como destinatário final, adquire ou
utiliza produto ou serviço. Ocorre que o Código de Proteção e Defesa do Consumidor vai mais
além, e confere, também, à coletividade de pessoas e vítimas do evento o status de consumidor.
A coletividade de pessoas
O parágrafo único do artigo segundo do CDC decide que a coletividade de pessoas,
determináveis ou não, que haja intervindo nas relações de consumo, são equiparáveis aos
consumidores. Assevera Filomeno que, “Dessa forma, além dos aspectos já tratados em passos
anteriores, o que se tem em mira no parágrafo único do art. 2° do Código do Consumidor é a
universalidade, conjunto de consumidores de produtos e serviços, ou mesmo grupo, classe ou
categoria deles, e desde que relacionados a determinado produto ou serviço. Tal perspectiva é
extremamente relevante e realista, porquanto é natural que se previna, por exemplo, o consumo
de produtos e serviços perigosos ou então nocivos, beneficiando-se assim, abstratamente, as
referidas universalidades e categorias de potenciais consumidores. Ou, então, se já provado o
dano efetivo pelo consumo de tais produtos ou serviços, o que se pretende é conferir à
universalidade ou grupo de consumidores os devidos instrumentos jurídico-processuais para que
possam obter a justa e mais completa possível reparação dos responsáveis, circunstâncias essas
pormenorizadamente previstas a partir do art. 8° e seguintes do Código do Consumidor, e,
sobretudo pelo art. 81 e seguintes.”182 O Código de Proteção e Defesa do Consumidor
reconhece que as pessoas, mesmo sem adquirir ou utilizar produto ou serviço como destinatário
final, ou que estejam em grupos indetermináveis, podem estar em condição de vulnerabilidade
às práticas comerciais cometidas pelos fornecedores. Sendo assim, esse grupo de pessoas
necessita ser defendido, amparado através das normas e princípios do CDC, de forma
equiparada àqueles consumidores individuais e determináveis que participaram da relação
jurídica de consumo, ou seja, adquiriram produtos ou serviços como destinatário final. A
coletividade de pessoas (consumidores equiparados), que, de algum modo, tiver sido
prejudicada pelos atos cometidos pelos fornecedores goza de toda a garantia oferecida pelo
Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Este regramento se completa com o artigo 29 do
CDC, que também iguala aos consumidores, todas as pessoas, determináveis ou não, expostas a
práticas comerciais abusivas. “A leitura adequada do art. 29 permite, inclusive, uma afirmação
muito simples e clara: não se trata de equiparação eventual a consumidor das pessoas que foram
expostas às práticas. É mais do que isso. O que a lei diz é que, uma vez existindo qualquer
prática comercial, toda a coletividade de pessoas já está exposta a ela, ainda que em nenhum
momento se possa identificar um único consumidor real que pretenda insurgir-se contra tal
prática.”183 A norma do referido artigo estabelece, portanto, que a coletividade de pessoas,
mesmo que sejam representadas por órgãos de defesa do consumidor, podem ser amparadas
através das diretrizes estabelecidas pelo Código de Proteção e Defesa do Consumidor, para se
defenderem dos atos abusivos praticados pelos fornecedores no meio social.
Vítimas do evento
Quando versa sobre a responsabilidade pelo fato do produto e do serviço, o Código de Defesa
do Consumidor, em seu artigo 17, trata como sendo consumidor, através de equiparação, todas
as vítimas de um acidente de consumo. Este consumidor equiparado, denominado como
consumidor bystander, mesmo não tendo uma participação direta em uma determinada relação
de consumo, pode tornar-se vítima de um evento danoso causado por um acidente de consumo e
sofrer consequências da mesma forma como o consumidor que adquiriu o produto ou o serviço.
Sendo assim, basta que a pessoa física ou jurídica tenha sua segurança ou saúde atingida por um
evento decorrente de um produto ou serviço, mesmo que não tenha adquirido ou utilizado este
produto ou serviço, podendo até, esta pessoa, ser estranha à relação de consumo, para que seja
igualada a condição de consumidor e tenha toda a proteção das normas e princípios presentes no
Código de Defesa do Consumidor. Como exemplo, tome a seguinte situação: um estudante que
acaba de ser aprovado no vestibular de direito, encontra em cima da sua mesa de estudos um
bilhete dos seus pais dizendo que ele fosse, o quanto antes, à concessionária de automóveis que
fica localizada na avenida principal da cidade, pois eles haviam comprado um automóvel como
prêmio pela sua aprovação no vestibular. O estudante apanha todos os seus documentos e vai
até a concessionária buscar o seu automóvel novo. Ao sair da loja guiando o veículo, o
estudante observa que a luz vermelha do semáforo acende, ele pisa no pedal do freio e constata
que este não está funcionando, ele ainda tenta controlar o automóvel, porém a direção também
não obedece aos seus comandos e o veículo vai de encontro a um ponto de ônibus, atingindo
uma médica, um padeiro e um veterinário que estavam no local. Feita a perícia, constata-se que
o veículo, apesar de novo, foi entregue ao consumidor sem uma peça que serve de encaixe ao
pedal do freio e, além disso, com a barra de direção quebrada. Neste caso, todas as pessoas
atingidas pelo veículo são vítimas do acidente de consumo, sendo, portanto, consumidores
equiparados ao estudante (o estudante, por sua vez, é consumidor porque seus pais adquiriram o
veículo para lhe satisfazer um desejo ou uma necessidade). Todas essas pessoas (o estudante, a
médica, o padeiro e o veterinário) podem reclamar os seus direitos junto ao fornecedor.
Conceito de Fornecedor
Após explicitar a conceituação do consumidor, bem como das teorias sobre o assunto e das
espécies de consumidor, definir-se-á agora o outro polo da relação jurídica de consumo, o
fornecedor. A LDC conceitua o fornecedor no artigo 3.º, e traz as definições para produto e para
serviço em seus nos números seguintes, sendo estes últimos os elementos objectivos da relação
de consumo.
Segundo o supracitado artigo no seu n.º 2, Fornecedor é toda a pessoa física ou jurídica, pública
ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados que desenvolvem
actividades de produção, montagem, criação, construção, transportação, importação, exportação,
distribuição ou comercialização de bens ou prestação de serviços.
Da mesma forma que procedemos na acepção do termo consumidor, tomaremos, para uma
melhor explicitação, além da conceituação expressa na Lei, definições do termo fornecedor,
também, a partir de dicionários da língua portuguesa e dicionários jurídicos. O Dicionário
Houaiss da língua portuguesa considera fornecedor como sendo: “adj.s.m. 1 que ou o que
fornece (algo) 2 que ou aquele que abastece com regularidade (alguém) com algum produto,
matéria-prima, água, gás, eletricidade etc. 3 que ou o que produz, que é fonte de; produtor.”184
O Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa traz o seguinte significado para fornecedor:
“adj. 1. Que fornece. S. m. 2. Aquele que fornece ou se obriga a fornecer mercadorias.”185
Para Maria Helena Diniz, em seu Dicionário Jurídico, encontramos o seguinte sentido para
fornecedor: “1. É a pessoa natural ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, ou
ente despersonalizado, que desenvolve actividade de produção, montagem, criação, construção,
transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou
prestação de serviços.”186 Segundo Pedro Nunes, em seu Dicionário de Tecnologia Jurídica, o
conceito de fornecedor seria: “Aquele que fornece ou abastece de víveres ou mercadorias
necessárias. Produtor.”187
Nota-se que, entre os conceitos de fornecedor explicitados acima, incluindo o disposto pelo
próprio Diploma Legal, apenas o Dicionário Houaiss da língua portuguesa traz em sua definição
do termo fornecedor, o pré-requisito essencial para se determinar a pessoa física ou jurídica,
pública ou privada, nacional ou estrangeira, e os entes despersonalizados, como sendo um
fornecedor: a habitualidade.
Importantíssimo se faz a expressa disposição no conceito de fornecedor: somente poderá ser
determinado como sendo fornecedor, aquela pessoa que coloque produtos ou serviços no
mercado de consumo de forma habitual. Se, por exemplo, uma padaria que possua um veículo
automotor e o utilize para transportar suas encomendas, decidir vender este veículo para uma
pessoa particular, este estabelecimento não pode ser considerado como fornecedor nessa
relação, pois ela não tem habitualidade de negociar a compra e venda de veículos automotores.
A padaria tem a habitualidade, apenas, de produzir alimentos.
No exemplo supramencionado, inexiste um fornecedor nesta relação de consumo, portanto esta
relação não poderá ser normatizada pela LDC, visto que o consumidor carece da presença do
fornecedor para que exista a relação jurídica de consumo e para que esta seja regulada pelo
referida Lei. Assim, esta relação deverá ser regida pelo Código Civil. Justamente pela
obrigatoriedade da existência de um fornecedor para que o consumidor possa ser tutelado pela
LDC, é que a definição de fornecedor recebe tanta amplidão. A Lei determina que fornecedor
seria aquela pessoa que desempenha atividade de produzir, montar, criar, construir, transformar,
importar, exportar, distribuir ou comercializar produtos ou prestar serviços. Sendo assim, é
fornecedor aquele que coloca produtos ou serviços à disposição no mercado de consumo, desde
que de forma habitual.
Conceito de Produto
Vamos tratar agora do produto, e em seguida do serviço, elementos objetivos da relação jurídica
de consumo.
Produto é a consequência da produção, é a coisa que foi fabricada para ser colocada no mercado
de consumo, tornando-se, por subsecutivo, o direito do consumidor e a obrigação do fornecedor
no processo da relação jurídica de consumo.
O n.º 3 do artigo 3° da LDC define Bem nos seguintes termos: “Bem é qualquer objecto de
consumo ou um meio de produção, móvel ou imóvel, material ou imaterial.” Sendo assim, para
as relações jurídicas de consumo, bem tem o mesmo significado de produto, mesmo que móvel
ou imóvel, material ou imaterial, durável ou não durável, novo ou usado.
Destarte, produto sendo tomado como qualquer bem, vamos, pois, elucidar a concepção do
termo bem: Bem é uma coisa que pode ser útil e almejada, sendo suscetível de ser apropriada.
“Assim, todos os bens são coisas, mas nem todas as coisas são bens. O sol, o mar, a lua são
coisas, mas não são bens, porque não podem ser apropriados pelo homem.”188 Na acepção
consumerista, bem – produto deve ser entendido como o objecto da relação jurídica de
consumo. Este objecto satisfaz a necessidade do consumidor que o adquire ou o utiliza como
destinatário final.
Conceito de Serviço
No n.º 4 do artigo 3.º da LDC encontramos a definição legal de serviço. Segundo o preceituado:
“Serviço é qualquer actividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração,
inclusive às de natureza bancária, financeira, crédito e securitária, excepto as decorrentes das
relações de carácter laboral”. Para a Lei, serviço é, portanto, aquela actividade que é fornecida
mediante pagamento, ou seja, os serviços prestados sem remuneração não são regulados pela
LDC.
Deve-se entender aqui que, por vezes o produto e o serviço são ofertados como se fossem
gratuitos ao consumidor, mas na realidade o preço deste produto ou serviço está incumbido no
valor de outro produto ou serviço que o consumidor deverá adquirir – É o pagamento indireto.
Este tipo de serviço deve ser considerado como um serviço efectuado mediante pagamento, já
que o consumidor, indiretamente, paga pelo serviço, portanto, tutelado pela LDC.
Importante se faz ressaltar que, a prestação de serviços pode ou não vir acompanhada de um
produto, mas quando o fornecedor se presta a vender um produto, este processo sempre
acompanha a prestação de um serviço. Veja o exemplo: Quando o cabeleireiro corta o cabelo do
consumidor, somente se verifica a prestação de serviço; porém quando o consumidor vai
adquirir um automóvel, o vendedor presta serviço ao atendê-lo, ao fornecer-lhe o test drive etc.
Os serviços podem ser duráveis e duráveis. Consideramos um serviço não durável aquele que se
completa com uma prestação, sem a necessidade de prosseguimento nesta prestação. Um
exemplo de uma prestação de serviço não durável é o corte de cabelo. Já o serviço durável é
aquele que é prestado de forma contínua. Neste tipo de serviço é estabelecido um prazo para a
sua prestação. Como por exemplo, o serviço de ensino prestado aos acadêmicos, por uma
faculdade.
CAPÍTULO IV - DIREITOS BÁSICOS DO CONSUMIDOR E A PROTEÇÃO
CONTRATUAL NO DIREITO DO CONSUMIDOR
Introdução
O tema direitos básicos constitui um dos tópicos mais relevantes para a compreensão do Direito
do Consumidor. Por isso, serão abordados inúmeros direitos, tais como, proteção à vida, saúde e
segurança, informação e educação para o consumo, proteção contra danos materiais e morais, as
questões inerentes à publicidade (enganosa, abusiva e enganosa por omissão), cláusulas
abusivas, inversão do ônus da prova, entre outros direitos que, reunidos, serão capazes de
transformar o cotidiano do estudioso do Direito do Consumidor.
Direito à informação
A necessidade do estabelecimento de relações jurídicas de consumo mais equilibradas passa
pelo reconhecimento do direito à informação, em particular ao consumidor, por forma a
permitir-lhe aferir as melhores opções existentes no mercado de consumo.
A informação tratada aqui não se refere à informação geral como uma das incumbências do
Estado, para a formação do consumidor sobre os bens e serviços colocados no mercado de
consumo, como vimos anteriormente. Refere-se a um direito particular do consumidor à
informação acerca de todos os elementos essenciais de um bem ou serviço, bem como a todos
os esclarecimentos71 (informação) prestados pelo profissional, no momento da celebração de
qualquer contrato de consumo, ou seja, constante da declaração do profissional que influencia a
decisão do consumidor de celebrar ou não determinado contrato.
O direito à informação em particular, como direito fundamental (art. 78.º da CRA), vem
previsto nos art.s 4.º, n.º 1, c) e 9.º da LDC, onde se reconhece um direito de que os
consumidores em concreto não podem abdicar, isto é, o de serem devidamente esclarecidos de
todos os termos que fazem parte de qualquer contrato de consumo, ou seja, os profissionais e
todas as entidades envolvidas numa relação de consumo estão sujeitos ao dever de informar o
consumidor, de forma clara e adequada, sobre os diferentes bens e serviços, quanto à
especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como
sobre os riscos a eles inerentes (art. 9.º, n.º 1).
O consumidor está assim protegido por um princípio fundamental constitucionalmente
consagrado, o de lhe serem prestados toda a informação e esclarecimentos necessários para a
contratação, permitindo-lhe, deste modo, a tomada de uma decisão correta, no momento da
celebração do contrato em causa72. Caso as informações essenciais para a celebração do
contrato de aquisição de bens ou prestação de serviços não lhe sejam devidamente
transmitidas73, o legislador prevê a possibilidade da resolução do contrato, num período de sete
dias a contar da data da recepção do bem ou da celebração do contrato de prestação de serviços,
bem como a reparação dos danos pela falta ou insuficiência de informação, não só por parte do
fornecedor, ou seja, para além do próprio vendedor, mas por parte de todos os restantes elos da
cadeia, desde o produtor ao distribuidor, responsáveis pelas informações prestadas ao
consumidor, desde que tenham violado igualmente o dever de informação (art. 9.º, n.ºs 2 e 3).
Assim, o consumidor tem direito a ser informado completa e lealmente, com vista à formação
da sua correta decisão no momento da celebração do contrato. As informações constantes dos
rótulos, prestadas nos locais em que são comercializados diversos produtos ou divulgados por
meio de publicidade, devem ser rigorosamente verdadeiras, precisas e esclarecedoras quanto a
todos os elementos essenciais que compõem determinado bem ou serviço.
O Regulamento sobre a Afixação dos Preços em Estabelecimentos Comerciais74 faz referência,
nos seus vários artigos, ao direito à informação em especial do consumidor, estabelecendo, no
seu art. 1.º, que «todos os bens destinados à venda ao público devem indicar o respectivo
preço»75 de venda ao consumidor e que, seja qual for o suporte utilizado, a indicação deve ser
feita de modo a que o consumidor não tenha dúvidas, ou seja, é necessário que a indicação do
preço seja feita em letra legível, através da utilização de letreiros, etiquetas ou listas, em
conformidade com o art. 4.º, n.º 1, do referido Regulamento, de modo a permitir ao consumidor
ter o conhecimento do valor total ou por unidade do produto a pagar.
No que se refere à prestação de serviços, seja qual for a sua natureza, os preços devem ser
afixados em locais visíveis, no espaço onde os serviços são propostos ou prestados ao
consumidor (art. 7.º, n.º 1, do mesmo diploma).
A protecção conferida pela LDC ao consumidor ocorre fundamentalmente em três fases: na
fase pré-contratual76, na fase contratual e na fase pós-contratual (consubstanciando-se na
prestação de assistência técnica, reparação, substituição do bem ou serviço, etc.), buscando-se
em qualquer dessas fases o equilíbrio contratual. É evidente que, para que se efective este
equilíbrio, se torna necessária uma maior disponibilidade de informações essenciais ao
consumidor, por parte do fornecedor, dos bens e serviços oferecidos no mercado. Por exemplo:
caso se compre uma máquina fotocopiadora e as instruções e demais informações apenas
estiverem redigidas em inglês ou noutra língua, o consumidor tem o direito de exigir do
fornecedor um novo manual em português, em virtude de, em Angola, a língua oficial ser o
português.
Oferta e Publicidade
A publicidade é, nos dias de hoje, um dos instrumentos150 mais utilizados pelo fornecedor,
com o propósito de fazer com que os seus produtos ou serviços sejam do conhecimento de
todos, tendo efectivamente uma quota parte de responsabilidade no aumento das vendas e na
colocação e escoamento dos diversos bens e serviços que se publicitam151.
O desenvolvimento dos meios de produção e distribuição de produtos e serviços nos dias actuais
só alcançou os níveis observados e já noticiados nos capítulos anteriores graças à atuação da
chamada indústria da comunicação. Principalmente a partir do pós segunda-guerra mundial, as
relações entre fornecedores e consumidores passaram a ser cada vez menos directas e pessoais
ou pautadas pela simples necessidade de se adquirir um produto ou serviço.
Ao contrário, essa relação passa cada vez mais a ser intermediada pelas mensagens veiculadas
nos diversos suportes de mídia: em um primeiro momento massivamente em rádio e TV e cada
vez mais nas mídias sociais e redes de compartilhamento de informações online.
Paradoxalmente, na actual sociedade de consumo os mercados são cada vez mais segmentados e
direccionados e menos personalizados, no sentido de que a relação directa entre fornecedor e
consumidor hoje em dia é inclusive desmaterializada – no caso do crescente uso dos meios
electrônicos para a contratação de produtos ou serviços. Nesse contexto é que o fornecedor
precisa se empenhar para divulgar seu produto ou serviço e cativar o consumidor, seduzindo-o a
adquiri-lo.
De certo, há comerciantes que atraem consumidores tão-somente com a existência de seu
estabelecimento em uma determinada localidade. É o caso da única padaria de um bairro inteiro;
a oferta deste empresário costuma ser de simples apresentação de seus produtos nas prateleiras
com qualidade, pois a procura dos consumidores é certa. Mas, não é esta a regra. A circulação
de produtos e serviços, hoje, é feita entre países, estados e cidades, através de importações e
exportações que não mais permitem ao consumidor conhecer os estabelecimentos comerciais.
A confiança e o trato pessoal e directo com o fornecedor é algo cada vez mais raro. No entanto,
para que o consumidor sinta-se motivado a adquirir um produto ou serviço, precisa antes de
mais nada confiar no fornecedor. A oferta e a publicidade se apresentam então como centrais
para o dinamismo da actual sociedade de consumo, na medida em que estabelece uma relação
entre fornecedor e consumidor, incentivando a confiança no fornecedor e o desejo por
determinado produto ou serviço²⁸.
A publicidade pode ser entendida como o instrumento pelo qual o fornecedor faz com que seu
produto ou serviço seja conhecido pela colectividade. Mas, em verdade, é muito mais do que
isso. A publicidade, na actual sociedade de consumo de massa estimula não apenas o interesse
dos consumidores acerca de determinados bens, como também induz ao seu consumo. A
publicidade, na sociedade de massa, dissemina, portanto, não apenas informações sobre os
produtos, mas busca convencer os consumidores da imprescindibilidade, conveniência ou
importância de se adquirir certos bens.
Com isso, difunde também valores e noções sobre estilos de vida e padrões do que pode ser
considerado normal, esperado, interessante ou mesmo desejável. Para ser bem sucedida, a
mensagem deve dialogar ou reflectir, em alguma medida, valores e sentimentos dos indivíduos
de determinada sociedade. Nesse sentido, e como veremos mais a frente, discutir publicidade
implica discutir também, em alguma medida, valores, o que torna o tema bastante controvertido
e objecto de acaloradas discussões. Tecnicamente, alguns doutrinadores diferenciam
publicidade de propaganda, sendo a primeira aquela com o intuito manifestamente comercial e a
segunda com o objectivo de disseminar ideias políticas, filosóficas, religiosas (campanhas
políticas, governamentais, etc.). Para fins de estudo e aplicação da LDC, será utilizado apenas o
termo publicidade, que é a mensagem que se insere no contexto de uma relação de consumo.
A publicidade, como acção empresarial destinada a promover o incremento da comercialização
de produtos e serviços é regulada pela LDC, que estabelece uma disciplina, indicando limites
para que esta mensagem seja considerada lícita. A matéria é regulada no Capítulo V, art.º 21.º
da LDC, sobre as práticas comerciais.
Relativamente à oferta, segundo a doutrina, é a etapa que antecede os contratos, ou seja, o
conjunto de esforços, informações e práticas adoptadas pelo fornecedor para que o consumidor
com ele contrate. Isto decorre logicamente da função essencial da oferta: apresentar uma
proposta de contratação aos consumidores sugerindo preço, destacando qualidades dos produtos
e serviços, promoções, e demais recursos atractivos que os convidam a consumir.
Deveras, a assinatura do contrato, ou mesmo a celebração de um contrato oral (verbal), não é,
de regra, o início da relação estabelecida entre fornecedor e consumidor. Antes disso, várias e
sofisticadas técnicas de marketing são utilizadas para atrair o comprador, tais como publicidade,
oferta, promoções, “brindes”, etc.
O contrato, sob a óptica da LDC, deve ser visto integralmente, abrangendo, inclusive, a fase
pré-contratual. Como visto, praticamente tudo que é dito e anunciado por meio de oferta verbal,
recibos, pré-contratos e publicidade já possui efeitos em relação ao fornecedor (cfr. Art.º 20 da
LDC).
Cuida-se do princípio da vinculação da oferta e da publicidade que está expresso no art. 20 da
LDC, com a seguinte redação: “Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa,
veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços
oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra
o contrato que vier a ser celebrado”.
Em síntese, tudo que é objectivamente oferecido nesta fase pré-contratual (preço, condições de
pagamento, qualidade do produto, garantia, etc.) vincula o fornecedor. Acrescente-se que,
independentemente de acordo ou conciliação com o consumidor, o descumprimento da oferta
pode acarretar a aplicação de sanção administrativa (art.º 26.º da LDC).
Quando falamos da publicidade, é necessário que tomemos algumas precauções quanto à sua
difusão, porque «ela é idealizada, produzida e veiculada com vista a convencer o público
consumidor»152 a adquirir os bens ou serviços publicitados. Este convencimento normalmente
ocorre mediante persuasão do consumidor, no sentido de manter certos hábitos de consumo ou
de modificar esses mesmos hábitos153.
Convencer o público consumidor a adquirir bens e serviços e mudar os hábitos de consumo
através da publicidade154 faz com que, muitas das vezes (se não mesmo na maioria), os
operadores económicos ajam de forma desleal, dando assim origem a uma prática comercial
desleal155, facto que nos parece ter sido determinante para que o legislador inserisse a matéria
sobre a publicidade no Capítulo V da LDC, sobre as práticas comerciais.
A Publicidade e os Consumidores
Desde a década de 50 (pós Segunda Guerra Mundial), a introdução de um novo produto ou
serviço posto em circulação no mercado passou a ser acompanhada necessariamente da
criatividade de profissionais e empresas especializadas em promover mensagens comerciais, a
partir dos mais diferentes meios, formas e técnicas destinadas à promoção destes lançamentos
perante os consumidores, despertando-lhes o desejo de consumi-los.
Os meios de comunicação (ou veículos de mídia), desde a criação e considerável circulação dos
jornais, seguida pela era do rádio, pela televisão, o cinema, até a chegada da rede mundial de
computadores (internet), praticamente invadiram a vida e o dia-a-dia dos consumidores em todo
o planeta; ao ponto de ser difícil encontrar uma pessoa que não passe um dia sem ter contacto
com um televisor, um aparelho de rádio, um letreiro (outdoor), ou ao caminhar na rua sem
receber um panfleto relativo à oferta de um produto ou serviço.
Actualmente, discute-se muito a publicidade “360°”, aquela que invade todos os espaços
quotidianos da vida do consumidor. Não são apenas as mídias tradicionais que disseminam
apelos ao consumo, mas também as novas redes sociais, as mensagens enviadas por telefones
celulares (que hoje assumem múltiplas funções) e até mesmo as ações de marketing realizadas
em ambientes escolares ou na forma de promoção de eventos desportivos, artísticos ou culturais.
Com isso, as pessoas encontram-se frequentemente expostas às mais diferentes formas de
publicidade, nem sempre éticas ou legais.
Assim, entende-se por publicidade toda e qualquer forma comercial e massificada de oferta de
produtos ou serviços patrocinada por um fornecedor identificado (directa ou indiretamente),
persuadindo sujeitos dispostos a consumi-los. A LDC refere-se à publicidade como actividade
do fornecedor oferecer ao público seus produtos e serviços 3.
É comum pessoas confundirem publicidade com propaganda, apesar de não ser a mesma coisa.
Enquanto a publicidade tem cunho comercial, a propaganda refere-se à divulgação de
mensagens ideológicas, políticas ou religiosas, como já apontado. Neste sentido, o correcto é se
referir aos anúncios relativos a produtos e serviços como publicidades.
Outra palavra muito comumente utilizada para indicar anúncios é o marketing. Oriundo da
língua inglesa, este verbete comporta um sentido mais amplo que a publicidade, pois
compreende todas as etapas de disponibilidade do produto ou serviço, isto é, tanto na sua
origem até sua distribuição. Logo, é correcto afirmar que uma das ferramentas do marketing é a
publicidade. Além do consumidor e do fornecedor há, também, trabalhando directamente com a
publicidade, as chamadas agências publicitárias, os veículos de comunicação e, eventualmente,
as celebridades.
As agências publicitárias (ou de comunicação) compreendem profissionais (publicitários) ou
empresas que exercem a actividade de desenvolver – com recursos, métodos e técnicas
específicas – campanhas publicitárias, sejam elas transmitidas em qualquer veículo, directa ou
indirectamente aos fornecedores em busca da divulgação de seus produtos, serviços ou até
mesmo de seu nome e marca.
Com efeito, a publicidade disponível no mercado sem limitações externas permitiu que os
consumidores fossem muito facilmente induzidos em erro ou vessem, em contacto com os
meios de comunicação, agredidos valores e preceitos éticos, religiosos ou morais. A LDC
trouxe, por sua vez, regras específicas de disciplina construtiva e positiva das publicidades
3
Atenção! A LDC não veio para repreender publicidades, mas apenas para corrigir seus excessos, evitando que sejam elas
instrumentos de prejuízo e indução em erro dos consumidores, permitindo outras vantagens indevidas a fornecedores que, para
tanto, apoiem-se na vulnerabilidade do público.
disponíveis no mercado, conforme adiante apreciado.
Princípios da Publicidade
Pode-se indicar dois princípios basilares a reger a publicidade: o da identificação 4 da mensagem
publicitária e o da veracidade.
O primeiro determina que o consumidor deve ter ciência de que está sendo exposto a uma
mensagem comercial, que teve sua inserção em determinado conteúdo de mídia pago pelo
anunciante. Este aspecto é importante para que o consumidor não confunda conteúdo
jornalístico com publicidade ou mesmo não seja induzido a pensar que eventual conteúdo
apresentado na mídia como a manifestação de personalidade, ao recomendar o uso de um
produto, por exemplo, corresponda a verdadeira opinião desta pessoa.
O segundo relaciona-se com o princípio geral de boa-fé e transparência nas relações de
consumo, segundo o qual as informações veiculadas pelos fornecedores devem ser correctas e
verdadeiras, permitindo ao consumidor compreender exactamente as qualidades do produto ou
serviço que está sendo anunciado.
Um exemplo de publicidade não identificada, ou de difícil identificação, é a chamada
subliminar, assim considerada quando a mensagem publicitária é passada por meio de recursos
visuais ou sonoros estimulantes e capazes de influenciar os consumidores no momento de
escolha, mas que operam em seu subconsciente.
Com certeza, apesar de parecer algo muito complexo e avançado, esta já é a realidade do
mercado actual e se demonstra abusiva em relação à fragilidade dos consumidores,
especialmente quando para atingir um público menos informado. Esta delimitação é bastante
importante. O consumidor tem o direito de saber que está diante de uma peça publicitária,
inclusive para garantir a efectividade de seu direito de escolha. Ou seja, sabendo tratar-se de
mensagem veiculada pelo anunciante, resta claro que seu intuito é meramente comercial, de
indução ao consumo. Estes dois princípios devem ser interpretados em consonância com
liberdade de expressão, mas levando em consideração a vulnerabilidade dos consumidores.
4
Atenção! Nem sempre, o princípio da identificação é obedecido. É bastante comum os meios de comunicação misturarem a
publicidade com filmes, novelas, reportagens, de modo que o consumidor torna-se um alvo mais frágil para as metas dos
anunciantes. A prática estabelecida no exemplo acima é conhecida como merchandising e ocorre com frequência no País. Ela só
pode ser admitida se houver a fácil e imediata identificação de que se trata de uma publicidade. No caso de revistas, é comum que
haja a expressão informe publicitário para os casos de anúncios muito próximos de reportagens.
Este princípio tem igualmente consagração constitucional, por via do art. 78.º, n.º 3 da CRA.
Segundo o art. 21.º, n.º 1 da LDC, a publicidade deve ser lícita, inequivocamente identificada e
respeitar a verdade e os direitos do consumidor. Por sua vez, o art. 9.º do mesmo diploma
estabelece que o fornecedor de bens e serviços deve informar de forma clara, objectiva e
adequada o consumidor, sobre o período de vigência do contrato, garantias, prazos, etc.
Determinado produto pode ser produzido com melhor tecnologia sem apresentar defeito algum,
mas se o consumidor não é informado clara e adequadamente sobre a forma como o utilizar,
evitando deste modo sua exposição a riscos de acidentes de consumo, o fornecedor responde
pelos danos causados, como se houvesse um defeito de concepção ou de fabrico162.
O princípio da licitude, entendido como o princípio de todos os princípios163 que regem a
publicidade, consiste na preservação da ordem pública social, que não poderá ser afectada pela
publicidade ilícita. Isto implica por parte de todos os operadores económicos que pretendam
comercializar por via da pulicidade os seus bens ou serviços, «o respeito pela lei, pelos valores,
princípios e instituições fundamentais para a vida em sociedade, tais como a liberdade, a
democracia, a igualdade, a privacidade, a dignidade humana, a paz, a segurança [..], valores que
estão consagrados constitucionalmente e cujas violações constituem infracções muito
graves»164.
O legislador consagrou no art. 9.º da LDC alguns dos direitos fundamentais entre aqueles que
são reconhecidos ao consumidor, com o objectivo de proporcionar ao consumidor uma escolha
consciente, pelo facto de que nas sociedades de consumo, incentivadas pelo mercado aberto,
vigora o princípio da livre concorrência165, factor que leva o legislador a impor uma protecção
adequada dos consumidores, através de formas operativas eficazes166. Essa proteção estende-se
à regulamentação do exercício da publicidade e da actividade publicitária, tendo como linha
orientadora a protecção dos «interesses legítimos do consumidor, através da salvaguarda dos
interesses económicos e da defesa da sua integridade, saúde e segurança167.
A publicidade deve ser feita respeitando os princípios da licitude, identificabilidade,
veracidade, livre e leal concorrência e os direitos do consumidor (art.s 21.º da LDC e 7.º da
LGP), e, para que se efective, é necessário que o conteúdo da publicidade seja útil para o
consumidor e não se transforme num obstáculo à livre escolha face à sua vulnerabilidade168,
evitando, deste modo, situações que configurem publicidade enganosa ou abusiva.
5
Cfr. Art. 406.º CC
o conteúdo do contrato, foi desmentida pela realidade: as pessoas são, em regra, diferentes e os
economicamente mais fortes impõem seus interesses nas mais diversas situações,
principalmente nas relações de consumo. Como reação, o Estado dos séculos XX e XXI (Estado
Social) assume expressamente a necessidade de editar leis para defender os vulneráveis,
trazendo um certo equilíbrio material às relações.
A concepção actual do contrato – denominada nova teoria contratual – impõe análise
diferenciada aos princípios contratuais clássicos. Agora, devem eles conviver com a boa-fé
objectiva, o equilíbrio econômico e função contratual do contrato. Em resumo, o contrato não é
mais visto apenas como instrumento de satisfação de interesses individuais e egoísticos. Importa
analisar outros aspectos, como a possibilidade de gerar eventual vantagem exagerada,
enriquecimento sem causa, adequação aos interesses da sociedade.
A vulnerabilidade do consumidor no mercado é especialmente sensível no campo contratual,
pois a possibilidade de o consumidor influenciar o conteúdo e a redação das cláusulas é mínima,
senão mesmo inexistente. Sua vontade pouco ou nada vale.
Actualmente, é praticamente impossível encontrar no mercado de consumo um contrato que
tenha sido elaborado a partir da discussão de cláusula por cláusula, de uma avaliação cuidadosa
das consequências da assinatura do documento. De regra, o que se vê são contratos de adesão,
ou seja, documentos elaborados unilateralmente pelo fornecedor. O consumidor não tem
possibilidade real de alterar as condições apresentadas, cabendo-lhe apenas assinar e aderir ao
que foi estabelecido pelo empresário.
Como o conteúdo do contrato é feito apenas pelo fornecedor, é natural que suas cláusulas sejam
mais vantajosas para a empresa, afectando um desejado equilíbrio entre as obrigações das
partes. Além disso, por vezes, são utilizadas palavras complicadas, terminologia técnica, de
difícil entendimento.
Em razão desse quadro de desigualdade, o Direito do Consumidor em geral, e a LDC, em
particular, dedica especial atenção ao contrato. De um modo geral, pode-se afirmar que o
objectivo maior da lei é que as relações contratuais entre fornecedor e consumidor sejam
pautadas pela lealdade, transparência e equilíbrio.
É nesse contexto que a LDC disciplina o contrato: objectiva-se proteger a parte mais frágil na
relação – o consumidor. A disciplina da lei abrange todas as espécies de contratos, verbais,
escritos, de adesão, paritários etc. Para a incidência ou não do Código, deve-se verificar se as
partes caracterizam-se como consumidor e fornecedor, com base nos respectivos conceitos
legais.
A preocupação inicial é com o modo de apresentação do documento. Os contratos devem ser
legíveis, além de utilizar termos claros e de fácil compreensão. As cláusulas que estabelecem as
principais obrigações do consumidor devem ser redigidas com destaque (em tamanho maior,
letras maiúsculas, em negrito, etc.).
Além da preocupação com clareza, transparência e lealdade, a LDC considera, no seu art. 16.º,
uma série de cláusulas nulas, ou seja, sem qualquer valor jurídico. Portanto, nem tudo que está
escrito no contrato possui valor jurídico. O juiz pode, ao analisar determinado contrato,
promover a revisão do seu conteúdo ou simplesmente negar eficácia a algumas cláusulas.
Ao lado de indicar diretrizes genéricas para o reconhecimento da nulidade de algumas
disposições contratuais, o mesmo artigo, parece ser mais objectivo ainda, o qual declara serem
nulas as cláusulas que “impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor
por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de
direitos” ou, ainda, retirando a validade jurídica das disposições contratuais que “autorizem o
fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao
consumidor”.
Em síntese, a LDC pretende que as relações contratuais sejam pautadas pela lealdade e
transparência, com definição clara dos direitos e deveres das partes, e, também, que o contrato
não seja objecto de obtenção de vantagem exagerada por parte do fornecedor.
O objectivo da LDC ao proteger o consumidor não é apenas a protecção em si, mas a busca
permanente do equilíbrio contratual entre o consumidor e o fornecedor de bens e serviços. Este
é, em princípio, o mais forte economicamente, e em condições de impor a sua vontade
unilateralmente, com o intuito de conseguir maiores vantagens económicas contra o consumidor
nas relações de consumo138.
Ao reconhecer direitos ao consumidor e não aos fornecedores, a LDC teve como finalidade não
só a protecção do consumidor face à posição vantajosa do profissional nas relações de
consumo139, mas também a protecção do mercado140, pois «um dos principais objectivos da
legislação de consumo passa por estimular a confiança do consumidor, para que este adquira
mais bens e serviços»141, contribuindo desta forma para o desenvolvimento do mercado.
Para garantir essa confiança, a lei proíbe a inserção nos contratos de consumo de cláusulas
abusivas e determina que, nas relações de consumo, deve haver igualdade material dos
intervenientes na mesma relação, respeitando o princípio da boa-fé e da lealdade, nos
preliminares, na formação e na vigência dos contratos, protegendo-se, deste modo, os interesses
económicos do consumidor (art. 15.º da LDC).
«O princípio da boa-fé ajusta-se a – e contribui para – uma visão do direito em conformidade
com o que subjaz ao Estado de Direito Social dos nossos dias, intervencionista e preocupado
por corrigir desequilíbrios e injustiças, para lá das meras justificações formais»142
Portanto, com a aprovação da LDC, houve avanços no tratamento da protecção contratual do
consumidor, nomeadamente, no art. 16.º102, onde encontramos uma lista exemplificativa de
cláusulas abusivas, que abordaremos de seguida.
A LDC prevê igualmente a proibição da utilização de qualquer cláusula abusiva, com o
objectivo de proporcionar vantagens unilaterais para o fornecedor dos bens e serviços, em total
desrespeito pelo princípio da boa fé103 e da equidade, por força do princípio da igualdade
material entre os intervenientes nas diversas relações de consumo (art. 15.º).
O direito contratual angolano, antes centrado de forma inflexível nos princípios clássicos que
informam os contratos, viu-se revolucionado com o surgimento da LDC, pelo facto de a mesma
actualmente estender o seu leque de princípios e protecção legal a todos os contratos em que
exista uma relação de consumo, em claro reconhecimento da vulnerabilidade do
consumidor104.
Contrato de adesão
As relações entre fornecedores e consumidores evoluíram de forma significativa na economia
de mercado e trouxeram à tona a grande preocupação quanto ao equilíbrio entre as partes
contratantes, face ao recurso, agora em voga, da utilização de cláusulas preestabelecidas
unilateralmente pelo fornecedor, quase sempre mediante condições gerais na maioria dos
contratos celebrados com o consumidor, situação que, a par das vantagens consubstanciadas na
celeridade na celebração dos contratos, principalmente por parte do fornecedor, faz com que o
consumidor se encontre em relativa desvantagem ocasionada pela sua débil intervenção
negocial, propiciando que seja injustificadamente prejudicado na relação de consumo, facto que,
consequentemente, justifica que seja alvo de uma maior protecção face à posição privilegiada
em que se encontra o fornecedor.
A LDC define o contrato de adesão art.º 19.º com os seguintes dizeres: “Contrato de adesão é
aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas
unilateralmente pelo fornecedor de bens ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou
modificar substancialmente o seu conteúdo.”.
Em regra, são documentos impressos, digitados, com um ou outro espaço em branco para ser
preenchido com dados pessoais do consumidor. A inserção de uma ou outra disposição
manuscrita não afecta a característica do contrato de adesão. O próprio § 1º do art. 20.º
esclarece: “A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do
contrato”.
É importante destacar que a lei não proíbe a utilização dos contratos de adesão nas relações de
consumo. Entretanto, são estabelecidas regras e procedimentos que, se descumpridos, retiram
todo o valor jurídico da contratação, permitem a aplicação de sanções administrativas e
indenização (danos materiais e morais) do consumidor.
Nos parágrafos seguintes do supracitado artigo, são detalhadas algumas importantes regras a
serem observadas pelos fornecedores.
Cláusulas abusivas
O estudo relativo às cláusulas abusivas possui, como norte, a equidade, a isonomia e a produção
de relações jurídicas em que a ética seja capaz de pautar o instrumento contratual que se
desenha.
O direito subjectivo do consumidor ao equilíbrio contratual constitui efeito da principiologia do
Direito, mais especificamente quanto aos atributos trazidos pela boa-fé, vulnerabilidade e
equidade. O equilíbrio aliás, é o interesse precípuo de todo e qualquer contratante. Em boa parte
das situações práticas que se apresentam nas relações de consumo, pelo próprio carácter
econômico de que se reveste o acto de consumir, é importante uma visão que seja capaz de
discernir o equilíbrio: econômico, informacional ou detentor do poder de direção do contrato
(MIRAGEM, 2008, p. 125).
Quanto ao critério econômico, este guarda relação com a desproporção financeira e seus
reflexos no equilíbrio econômico da relação (MIRAGEM, 2008, p. 125). É o que acontece na
hipótese de um contrato que só onere uma das partes em caso de seu descumprimento.
Com relação ao aspecto informacional, decorre da produção de um ruído no momento do
conhecimento das reais intenções do fornecedor. É o que acontece na entrega do manual de uso
do veículo, onde o excesso de informação acaba por produzir a desinformação.
Finalmente, o poder de direção contratual decorre da vulnerabilidade do consumidor, uma vez
que o fornecedor acaba por assumir uma situação de dominância, onde resta flagrante o maior
poder fáctico nas decisões sobre o curso e o cumprimento do contrato (MIRAGEM, 2008, p.
125), por isso, a LDC estabelece, em seu art. 16.º, um rol exemplificativo de cláusulas
contratuais que merecem ser consideradas como abusivas.
A clássica disciplina jurídica dos contratos sofreu grande modificação, na medida em que foram
sendo implantadas na sociedade de consumo modalidades de produção em massa. Esse
fenômeno impôs uma revisão dos paradigmas contratuais estabelecidos, além de uma completa
revisão de valores e princípios, pautados na equidade e boa-fé (CAVALIERI FILHO, Programa
de Direito do Consumidor, 2011, p. 102).
DICIONÁRIO
Acidente de Consumo: É quando o consumidor é afetado em sua saúde, integridade corporal,
física ou psicológica, bem como tem diminuído seu patrimônio em decorrência de produtos ou
serviços defeituosos. Fala-se também em responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço.
Acordo: É a forma de extinção de uma obrigação pela qual as partes cedem, reciprocamente,
em seus direitos e interesses, encontrando um resultado comum que ponha fim a
desentendimento.
Administração Pública: É o próprio Estado compreendido a partir do conjunto de órgãos e
servidores públicos do Poder Executivo.
Agências Reguladoras: São entes autônomos do Poder Público destinados a fiscalização e
disciplina (regulação) de serviços públicos prestados por empresas privadas concessionárias e
permissionárias. As agências são criadas por lei específica que estabelece suas funções e
competências.
Bancos de Dados de Proteção ao Crédito: Reunião organizada de informações (arquivo) sobre
consumidores que são úteis para análise do risco de concessão de crédito.
Boa-fé: É o princípio (dever) que todos têm de agir com lealdade, honestidade e cooperação nas
suas relações com outras pessoas.
Cadastros de Consumo: Reunião organizada de informações (arquivo) sobre consumidores
para uso de determinado fornecedor. As informações são obtidas, em regra, do próprio
consumidor (normalmente para conhecer melhor o perfil de seus clientes ou, mesmo, para
enviar correspondências, etc.).
Cadastro de reclamações fundamentadas: É o conjunto de informações organizadas e
mantidas pelos órgãos de defesa do consumidor, relavas às reclamações fundamentadas contra
fornecedores de produtos e serviços. O cadastro deve informar se tais reclamações foram ou não
atendidas pelo fornecedor.
Lei de Defesa do Consumidor (Lei n.º 15/03, de 22 de Julho) : É uma lei de ordem pública
e interesse social que organiza e estrutura uma série de normas e princípios que, dentre outras
finalidades, reconhecem a vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo protegendo-
o e prevenindo-o em relação ao fornecedor, para que a relação entre ambos seja equilibrada.
Código Civil: Diploma legal que disciplina e estrutura os direitos, obrigações e bens relativos a
relações entre particulares, bem como entre particulares e o Estado despido do seu poder de
império.
Concessionárias de serviços públicos: Empresas privadas que, por acto do Poder Público,
possuem autorização para explorar economicamente serviços públicos, tais como distribuição de
energia elétrica e transporte colectivo.
Constituição da República de Angola: Conjunto de normas que organizam todo um país
quanto à forma de governo, distribuição de competências e definição de autoridades,
estabelecendo os direitos e valores fundamentais da sociedade. A Constituição é a lei maior de
um país, hierarquicamente superior a todas as demais (leis ordinárias, decretos, etc.), que não
podem contrariá-la.
Contrapropaganda: É uma espécie de sanção administrava, consistente na imposição de
realizar nova publicidade, para esclarecer e corrigir falhas da publicidade abusiva ou enganosa,
anteriormente veiculada.
Consumidor: De acordo com o conceito básico da LDC, é pessoa natural ou jurídica (empresa,
Estado, etc.) que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Ao lado do
conceito básico, existem situações de consumidor equiparado.
Consumidor equiparado: São as pessoas que, apesar de não se configurarem como
consumidores originalmente, são a eles equiparados (com os mesmos direitos) quando
configuradas as hipóteses previstas na LDC.
Contrato: É um acordo de vontades entre pessoas capazes, envolvendo objecto lícito, com a
finalidade de criar, extinguir, conservar ou transferir direitos e obrigações.
Contrato de adesão: É contrato padrão cujas cláusulas são estabelecidas unilateralmente pelo
fornecedor de produtos ou serviços.
Crime: É conduta humana (ação ou omissa) consistente na violação de uma norma penal já
vigente ao tempo do facto, impondo a aplicação de uma sanção (pena) ao causador. Constitui a
ofensa a um valor ou bem socialmente relevante.
Culpa: Elemento da conduta humana que indica se determinado facto foi causado
intencionalmente (dolo) ou com falta ao dever que todos têm agir com prudência e cuidado,
mensurando os resultados de cada acto.
Danos materiais: São prejuízos de ordem patrimonial (pecuniário ou economicamente aferível)
experimentados pela vítima de violação a um direito.
Danos morais: São ofensas a direitos da personalidade tais como integridade física ou psíquica,
honra, privacidade, nome, etc., independentemente de perdas econômicas.
Defeito: Falha no produto ou no serviço que pode afectar o consumidor em sua saúde e
segurança, integridade corporal, física ou psicológica, bem como na diminuição do seu
patrimônio (acidente de consumo).
Direito: Conjunto de normas e princípios do Estado que disciplinam as relações sociais (sentido
objectivo). Também, a faculdade ou poder de uma pessoa exigir ou pretender de outrem um
comportamento positivo ou negativo, ou de, por acto livre de vontade, baseado ou não numa
decisão judicial, tomar posições que inelutavelmente se impõem na esfera jurídica da
contraparte (Sentido subjectivo).
Direitos Básicos do Consumidor: Relação de direitos elementares do consumidor estabelecida
no artigo 4.º da LDC.
Doutrina: Conjunto de obras escritas, da literatura jurídica, voltadas ao estudo do Direito.
Enriquecimento sem Causa: Princípio de direito pelo qual ninguém pode angariar patrimônio
de outrem sem justo motivo ou contraprestação.
Entidade Civil de Proteção ao Consumidor: Associações, fundações, agremiações e demais
sociedades não estatais com objectivo de promover a protecção e defesa dos interesses do
consumidor.
Fornecedor: Toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem
como entes despersonalizados, que desempenham actividades de produção, montagem, criação,
construção, transformação, importação, distribuição ou comercialização de produtos ou
prestação de serviços. É aquele que disponibiliza produtos ou serviços no mercado
profissionalmente ou com certa habitualidade.
Garantia Contratual: Termo escrito oferecido pelo fornecedor, mediante o qual é estabelecido
o bom funcionamento do produto ou serviço por determinado prazo. Não se confunde com a
garantia legal.
Garantia Legal: Dever do fornecedor de assegurar ao consumidor, nos prazos estipulados na
lei, a troca (ou reexecução), devolução ou reparação de produto ou serviço viciado.
Infração Penal: o mesmo que crime.
Inquérito Civil: É procedimento administrativo investigatório dirigido por Promotor de Justiça
(Ministério Público) que visa a reunir provas voltadas à apuração de lesão a direito colectivo nas
mais diversas áreas (consumidor, meio ambiente etc.).
Inquérito Policial: É procedimento administrativo investigatório dirigido por Serviços
Criminais com a finalidade de reunir provas voltadas à apuração da existência de uma infração
penal (crime).
Inversão do ônus da prova: É a possibilidade de o juiz considerar provados os fatos alegados
pelo consumidor, desde que as afirmações sejam verossímeis (coerentes, plausíveis, razoáveis)
ou ficar evidente a dificuldade de produzir determinada prova (hipossuficiência). Caberá ao
fornecedor, para não perder a causa, demonstrar o contrário, ou seja, que os fatos não ocorreram
como alegado pelo consumidor na ação.
Jurisprudência: Conjunto de decisões judiciais reiteradas em um determinado sentido.
Livre concorrência: É característica positiva do mercado no qual os fornecedores competem
entre si com lealdade, inexistindo práticas pré-ajustadas para beneficiar apenas determinados
sujeitos.
Marketing: Todos os métodos e técnicas utilizados pelos fornecedores para promover a
circulação de bens e serviços.
Mídia: Conjunto de meios de comunicação em massa (televisão, rádio, jornais etc.).
Ministério Público: É instituição prevista na Constituição cujos integrantes actuam, com
independência funcional, zelando pela aplicação e respeito das leis, manutenção da ordem
pública, além da defesa de direitos e interesses da colectividade. Entre outras atribuições, é
responsável pela direção do inquérito civil.
Pessoa jurídica: Reunião de pessoas com objectivos comuns que possui direitos e obrigações
próprios. Exemplo: uma empresa.
Poder Judiciário: Órgãos do Estado que possuem a atribuição legal de oferecer solução aos
conflitos entre sujeitos formalmente apresentados a partir de um processo.
Poder Público: o mesmo que Administração Pública.
Política de defesa do consumidor: Conjunto de normas e princípios que orientam as
actividades dos órgãos de proteção e defesa do consumidor.
Produto: Bem material ou imaterial, móvel ou imóvel, ofertado no mercado de consumo.
Publicidade: Toda e qualquer forma comercial e massificada de oferta de produtos ou serviços.
Publicidade abusiva: Publicidade vedada pela LDC por veicular mensagem que atenta contra
valores individuais ou colectivos, tais como a discriminação de qualquer natureza, a incitação à
violência e outros comportamentos anti-sociais e prejudiciais à saúde, vida ou segurança do
consumidor, exploração da fragilidade das crianças.
Publicidade enganosa: Publicidade que, por omissão ou afirmação, atribui, no todo ou em
parte, uma informação, qualidade ou atributo falso a produto ou serviço ou, por qualquer outro
modo, capaz de induzir o consumidor em erro.
Oferta: É informação sobre as qualidades e características dos bens ou simplesmente o acto de
colocar em circulação um produto ou serviço no mercado.
Ordem econômica: Conjunto de normas e princípios constitucionais que regulam as
actividades econômicas.
Recall: Dever que tem o fornecedor de comunicar às autoridades e aos consumidores quanto à
existência de defeito de determinado produto ou serviço, após a sua introdução no mercado.
Oriundo da palavra inglesa recall, que tem o sentido de chamamento, convocação.
Relação de consumo: Vínculo estabelecido entre fornecedor e consumidor no mercado do qual
decorrem direitos e obrigações.
Responsabilidade objectiva: Dever de indemnizar cuja configuração independe de eventual
culpa do causador do dano. Não há necessidade de demonstrar conduta intencional (negligente,
com imperícia ou imprudência) do autor do facto.
Responsabilidade pelo facto do produto ou serviço: Ver Acidente de Consumo.
Responsabilidade pelo vício do produto ou serviço: Dever que tem o fornecedor de satisfazer
o interesse do consumidor que adquiriu produto ou serviço viciado.
Responsabilidade solidária: Dever de atender a um direito do consumidor atribuído a duas ou
mais pessoas (fornecedores, por exemplo). Neste caso, qualquer sujeito responsável deve
atender individual e integralmente à obrigação.
Sanções administravas: São as penas aplicadas por órgão público decorrente de violação de
lei.
Serviço: Actividade oferecida no mercado de consumo, mediante remuneração directa ou
indirecta.
Superendividamento: Ocorre quando o consumidor, leigo e de boa-fé, perde a capacidade de
arcar com suas obrigações em dinheiro actuais e futuras (excepto as tributárias, de alimentos ou
delitos) em virtude do excesso de dívidas contraídas.
Termo circunstanciado: Procedimento investigatório simplificado pelo qual a autoridade
policial registra e descreve factos e circunstâncias relativos a crimes de menor potencial
ofensivo.
Termo de ajustamento de conduta: Instrumento pelo qual o fornecedor, que tenha violado
alguma norma, compromete-se formalmente perante ou Ministério Público, DPDC, ou outro
órgão público a não repetir a infração e, eventualmente, indenizar os danos causados, sob pena
de pagamento de multa fixada no próprio documento.
Venda casada: É o condicionamento da aquisição de um produto ou serviço individualizado se,
e somente se, outro produto ou serviço for adquirido pelo consumidor conjuntamente.
Vício de produto ou serviço: Impropriedade (oculta ou aparente) do produto ou do serviço, de
qualidade ou de quantidade, que o torne impróprio ao consumo, diminua-lhe o valor ou que
tenha qualidades diversas das apresentadas em oferta ou publicidade.
Vulnerabilidade: Princípio que reconhece o consumidor como parte frágil no mercado de
consumo.209