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Material Complementar

Pós-Graduação de Direito

Disciplina “Processo do Trabalho 1”


Curso de Especialização em Direito e
Processo do Trabalho da UFN

Considerando a previsão do art. 46 inciso VIII da Lei nº 9.610 de 19 de feveiro de 1998, informo
quetodos os alunos devem buscar obter a integralidade das obras, todas de excelente qualidade e
atualização e disponível em diversos formatos.

Profº Mestre Felipe Stribe da


SilvaContato:
<felipe.silva@unifra.br>
Sala 711, Prédio 17 Fone (55) 3220-1315
Fone/WhatsApp nº (55) 99944-0701, (55) 3220-1315
CAPÍTULO I
Teoria Geral do Direito Processual do Trabalho

1. O ESTADO, A POLÍTICA, O PROCESSO E OS DIREITOS


HUMANOS
Um sistema judiciário eficiente e eficaz deve propiciar a toda pessoa um
serviço público essencial: o acesso à justiça. É preciso reconhecer, nesse passo,
que a temática do acesso à justiça está intimamente vinculada ao modelo político
do Estado e à hermenêutica do direito processual como instrumento de
efetivação dos direitos reconhecidos e positivados pelo próprio Estado.
Há, pois, estreita relação entre o Estado, a Política, os Direitos Humanos e
Fundamentais e o Processo.
Assim, em qualquer setor do conhecimento jurídico, o intérprete se depara
com as seguintes indagações: quais os valores mais importantes segundo a
ideologia política do Estado? Como o Estado-Juiz pode contribuir na promoção
da liberdade, igualdade e dignidade das pessoas? Como proteger o meio
ambiente (incluindo o do trabalho), o consumidor e os grupos vulneráveis
(mulheres, negros, homoafetivos, crianças, idosos, trabalhador escravo, sem-
terra e indígenas)? A politização da justiça ou a judicialização da política podem
contribuir para a promoção de um sistema juridicamente justo? A
constitucionalização do direito processual (incluindo o direito processual do
trabalho) pode contribuir para a efetividade do acesso à justiça?
As respostas, a nosso ver, exigem reflexão a respeito dos ordenamentos
jurídicos (e suas ideologias) à luz dos modelos de Estado e de sociedade.
1.1. O Processo no Estado Liberal
O Estado Liberal, que emergiu das Revoluções Burguesas dos séculos XVII e
XVIII, caracteriza-se pela sua subordinação total dos cidadãos ao direito positivo
editado pela burguesia, uma vez que a atuação estatal deveria estar em
conformidade aos exatos limites prescritos na lei.
O direito posto pela classe dominante, portanto, constituiu um limitador da
ação estatal, ao mesmo tempo em que se apresentava como um conjunto de
garantias individuais oponíveis ao próprio Estado, cuja função seria apenas a de
proteger/garantir a liberdade e a propriedade (como direito natural e absoluto)
sob uma perspectiva individualista e nutrida pelo dogma da igualdade formal
perante a lei, o que implicava, naturalmente, a supremacia do Legislativo sobre
o Executivo e o Judiciário.
No Estado Liberal, no qual só se reconhecem os chamados direitos humanos
de primeira dimensão (direitos civis e políticos) e, ainda assim, numa
perspectiva individualista, o processo é caracterizado pelo tecnicismo, legalismo,
positivismo jurídico acrítico, formalismo e “neutralismo” do Poder Judiciário
(juiz “boca da lei”). A ação, no Estado Liberal, nada mais seria do que a
derivação do direito de propriedade em juízo. Daí a supremacia, quase que
absoluta, do princípio dispositivo.
Outra característica do processo no Estado Liberal é o conceitualismo, em que
todos são tratados em juízo como sujeitos de direito (Tício x Caio),
independentemente de suas diferentes condições sociais, econômicas, políticas e
morais. De tal arte, crianças e adultos, ricos e pobres, empresários e
trabalhadores são, conceitualmente, tratados como iguais.
No Brasil, desde o descobrimento até meados do século XX, foram
destinatários do direito civil e processo civil os ricos e os brancos; os negros e
pobres eram destinatários, em regra, do direito penal e do processo penal. Em
consequência, o Estado Liberal assegurava o acesso à justiça civil aos ricos e
brancos; aos pobres e negros, acesso apenas à justiça penal, e na condição de
réus, evidentemente.
Como bem registra Douglas Cesar Lucas:
A jurisdição estatal foi afastada da política e conduzida a um isolamento das questões sociais
importantes. Foi tomada como reprodutora da racionalidade legislativa, constituindo uma
operacionalidade dogmática alienante, incapaz de pensar o conteúdo do direito, tornando-se fiel
1
promotora da ordem jurídica e econômica liberal .
Esse quadro de injustiças e desigualdades sociais (e regionais) propiciou o
acúmulo de riqueza para poucos e bolsões de pobreza e miséria para muitos.
Com o passar dos anos, o modelo político liberal perdeu a capacidade de
organizar uma sociedade marcada pelas diferenças sociais decorrentes da
Revolução Industrial.
1.2. O Processo no Estado Social
Surge, então, o chamado Estado Social, que é compelido a adotar políticas
públicas destinadas à melhoria das condições de vida dos mais pobres,
especialmente da classe trabalhadora, como forma de compensar as
desigualdades originadas pelos novos modos de produção.
São características do Estado Social o constitucionalismo social (México,
1917, e Alemanha, 1919), a função social da propriedade, a participação política
dos trabalhadores na elaboração da ordem jurídica e o intervencionismo
(dirigismo) estatal na economia mediante prestações positivas (status positivus)
por meio de leis que criam direitos sociais. O Estado Social tem por escopo o
estabelecimento da igualdade substancial (real) entre as pessoas, por meio de
positivação de direitos sociais mínimos (piso vital mínimo).
O Poder mais fortalecido no Estado Social deixa de ser o Legislativo e passa a
ser o Executivo, ao qual é reconhecida a competência para editar políticas
públicas de intervenção na economia que dependem da legitimação do direito, a
fim de que este passe a ser “instrumento de intervenção e assistencialismo,
resultando na politização do jurídico e sua dependência, além da política, das
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relações econômicas e culturais” .
O processo, no Estado Social, sofre algumas transformações importantes, pois
o seu objeto passa a ser a jurisdição, e não apenas a ação, havendo, assim,
relativização do princípio dispositivo, com vistas a permitir o acesso do
economicamente fraco à Justiça (isenção de custas, escritórios de vizinhança
etc.).
No Brasil, a criação da Justiça do Trabalho (1939), a assistência judiciária (Lei
n. 1.060/50) aos pobres, o ius postulandi e a coletivização do processo
trabalhista (dissídio coletivo e ação de cumprimento) caracterizam o processo
brasileiro no Estado Social.
Leciona Celso Fernandes Campilongo que:
o desafio do Judiciário, no campo dos direitos sociais, era e continua sendo conferir eficácia aos
programas de ação do Estado, isto é, às políticas públicas, que nada mais são do que os direitos
decorrentes dessa “seletividade inclusiva”. Altera-se significativamente a relação entre os Poderes do
Estado, e a independência política do Poder Judiciário torna-se um grande dilema. O Judiciário é
constitucionalmente obrigado a intervir em espaços tradicionalmente reservados ao Executivo para
garantir direitos sociais e a se manifestar sobre um novo campo de litigiosidade, marcadamente
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coletivo e de orientação fortemente política .
Lamentavelmente, o Estado Social brasileiro recebeu forte influência do
positivismo jurídico, o que impediu a politização da justiça e a judicialização da
política.
No campo do ensino jurídico, por exemplo, a ênfase continuou sendo direito
civil e processo civil, inexistindo, inclusive, em diversas faculdades de direito,
disciplinas importantíssimas para a compreensão transdisciplinar dos fenômenos
jurídicos, econômicos e sociais, como direitos humanos, direito processual do
trabalho, direito agrário, direito econômico etc.
1.2.1. A crise do Estado Social
A partir dos dois choques do petróleo na década de 1970, o Estado Social (ou
Welfare State) entra em crise, colocando em xeque a lógica do dirigismo estatal.
A expansão desordenada do Estado, a explosão demográfica e o envelhecimento
populacional decorrentes dos avanços na medicina e da melhoria do saneamento
básico geram perigosa crise de financiamento da saúde e da previdência, que são
os dois pilares fundamentais do Estado Social.
A par disso, com a globalização econômica, o Estado vai perdendo o domínio
sobre as variáveis que influenciavam sua economia. Nota-se, claramente, a perda
da capacidade estatal de formular e implementar políticas públicas,
comprometendo o seu poder de garantir os direitos sociais.
Com a queda do modelo socialista da então União Soviética, o capitalismo
abandona as concessões que fazia aos mais fracos e surge uma Nova Direita que
ganha força com os governos de Margareth Thatcher, na Inglaterra, e de Ronald
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Reagan, nos Estados Unidos da América . Surgem o G-7 e o neoliberalismo, cuja
ideologia, estabelecida no Consenso de Washington, consiste em diminuição do
tamanho do Estado, abertura dos mercados internos, rígida disciplina fiscal,
reforma tributária, redução drástica dos gastos públicos na área social,
desconstrução dos direitos fundamentais sociais por meio de desregulamentação
do mercado, flexibilização e terceirização das relações de trabalho.
Adverte Noam Chomsky que:
os grandes arquitetos do Consenso (neoliberal) de Washington são os senhores da economia privada,
em geral empresas gigantescas que controlam a maior parte da economia internacional e têm meios
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de ditar a formulação de políticas e a estruturação do pensamento e da opinião .
Enfim, o neoliberalismo enfraquece o Estado, gerando alarmante e
progressiva exclusão social. Segundo dados da ONU, em 1994, os 20% mais
ricos da população mundial detinham patrimônio 60 vezes superior ao dos 20%
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mais pobres. Em 1997, esse número aumentou para 74 vezes . Será isso mera
fatalidade decorrente do mercado?
Na verdade, lembra Daniel Sarmento, no contexto do neoliberalismo
globalizado, que a exclusão
é ainda mais cruel que no Estado Liberal, pois naquele as forças produtivas necessitavam da mão de
obra para produção da mais-valia. Hoje, com os avanços da automação, o trabalhador desqualificado
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não tem mais nenhuma utilidade para o capital, e torna-se simplesmente descartável .
Além dos problemas relativos à exclusão social, à fome e à miséria, há, ainda,
a preocupação com a própria sobrevivência da família humana.
Diante desse quadro, indaga-se: como promover a liberdade, a igualdade e a
dignidade das pessoas e do cidadão trabalhador? Em outros termos: como
proteger o meio ambiente (incluindo o do trabalho), o consumidor e os grupos
vulneráveis (mulheres, negros, homoafetivos, crianças, idosos, analfabetos,
trabalhadores em condição de escravidão, sem-terras e indígenas)?
1.3. O Processo no Estado Democrático de Direito
Surge, então, o Estado Democrático de Direito, também chamado de Estado
Constitucional, Estado Pós-Social ou Estado Pós-Moderno, cujos fundamentos
assentam-se não apenas na proteção e efetivação dos direitos humanos de
primeira dimensão (direitos civis e políticos) e segunda dimensão (direitos
sociais, econômicos e culturais), mas, também, dos direitos de terceira dimensão
(direitos ou interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos).
Podemos dizer, portanto, que o Estado Democrático de Direito tem por
objetivos fundamentais a construção de uma sociedade mais livre, justa e
solidária, a correção das desigualdades sociais e regionais, a promoção do bem-
estar e justiça sociais para todas as pessoas, o desenvolvimento socioambiental, a
paz e a democracia. O art. 3º da CF clarifica os objetivos fundamentais da
República Federativa do Brasil.
O principal objetivo do Estado Democrático de Direito não é apenas justificar
os direitos sociais como direitos humanos e fundamentais, como também
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garanti-los . Daí a importância do Poder Judiciário (e do processo) na promoção
da defesa dos direitos fundamentais e da inclusão social, especialmente por meio
do controle judicial de políticas públicas.
Afinal, se o nosso tempo é marcado por uma sociedade de massa,
profundamente desigual e contraditória, então as lesões aos direitos humanos,
notadamente os de ordem social, alcançam dezenas, centenas, milhares ou
milhões de cidadãos. São lesões de massa (macrolesões) que exigem um novo
comportamento dos atores jurídicos em geral e do juiz em particular, voltado
para tornar efetivos os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos,
cujos conceitos são extraídos do CDC (art. 81, § único), verdadeiro código de
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acesso à justiça na pós-modernidade .
A jurisdição passa, então, a ser a gênese do sistema pós-moderno de acesso
individual e coletivo à justiça (CF, art. 5º, XXXV), em função do que o
Judiciário torna-se o Poder mais importante na “era dos direitos”. A principal
luta do povo não é mais pela criação de leis, e sim pela manutenção dos direitos.
Na verdade, a luta é por democracia e direitos.
O Processo, no Estado Democrático de Direito, passa a ser compreendido a
partir dos princípios constitucionais de acesso à justiça insculpidos no Título II
(“Dos Direitos e Garantias Fundamentais”), Capítulo I (“Dos Direitos e Deveres
Individuais e Coletivos”), especialmente os princípios da indeclinabilidade da
jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), do devido processo legal (idem, incisos LIV e
LV), da ampla defesa (autor e réu) e contraditório e o da duração razoável do
processo (idem, inciso LXXVIII).
Trata-se do fenômeno conhecido como constitucionalização do processo, o
qual, como lembra Cassio Scarpinella Bueno:
convida o estudioso do direito processual civil (e do trabalho, acrescentamos) a lidar com métodos
hermenêuticos diversos – a filtragem constitucional de que tanto falam alguns constitucionalistas –,
tomando consciência de que a interpretação do direito é valorativa e que o processo, como método de
atuação do Estado, não tem como deixar de ser, em igual medida, valorativo, até como forma de
realizar adequadamente aqueles valores: no e pelo processo. A dificuldade reside em identificar
adequadamente estes valores e estabelecer parâmetros os mais objetivos possíveis para que a
interpretação e aplicação do direito não se tornem aleatórias, arbitrárias ou subjetivas. A neutralidade
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científica de outrora não pode, a qualquer título, ser aceita nos dias atuais .
A constitucionalização do processo, que tem por escopo a efetividade do
acesso, tanto individual quanto coletivo, ao Poder Judiciário brasileiro,
caracteriza-se:
• pela inversão dos papéis da lei e da CF, pois a legislação deve ser compreendida a partir dos
princípios constitucionais de justiça e dos direitos fundamentais;
• pelo novo conceito de princípios jurídicos, uma vez que os princípios jurídicos, especialmente os
que têm assento constitucional, passam a ser normas de introdução ao ordenamento jurídico,
superando, assim, a posição de meras fontes subsidiárias tal como previsto na Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro (art. 4º);
• pelos novos métodos de prestação da tutela jurisdicional, que impõem ao juiz o dever de
interpretar a lei conforme a Constituição, de controlar a constitucionalidade da lei, especialmente
atribuindo-lhe novo sentido para evitar a declaração de inconstitucionalidade, e de suprir a omissão
legal que impede a proteção de um direito fundamental;
• pela coletivização do processo por meio de instrumentos judiciais para proteção do meio ambiente,
patrimônio público e social e outros interesses metaindividuais (difusos, coletivos e individuais
homogêneos dos trabalhadores, aposentados, mulheres, negros, pobres, crianças, adolescentes,
consumidores etc.), como a ação civil pública, o mandado de segurança coletivo, a ação popular, o
mandado de injunção coletivo;
• pela ampliação da legitimação ad causam para promoção das ações coletivas reconhecida ao
Ministério Público, aos corpos intermediários (associações civis, sindicais etc.) e ao próprio Estado
(e suas descentralizações administrativas);
• pela ampliação dos efeitos da coisa julgada (erga omnes ou ultra pars) e sua relativização
secundum eventum litis (segundo o resultado da demanda) para não prejudicar os direitos individuais;
• pelo ativismo judicial (CF, art. 5º, XXXV; CDC, art. 84; LACP, art. 12; CPC, arts. 273 e 461);
• pela supremacia das tutelas alusivas à dignidade humana e aos direitos da personalidade sobre os
direitos de propriedade, o que permite, inclusive, tutelas inibitórias ou específicas, além de tutelas
ressarcitórias nos casos de danos morais individuais e coletivos;
• pela possibilidade de controle judicial de políticas públicas, conforme previsto no art. 2º do Pacto
Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais – PIDESC, ratificado pelo Brasil em 1992
etc.
Em suma, no Estado Democrático de Direito, o processo pode ser definido
como o “direito constitucional aplicado”, enquanto o acesso à justiça passa a ser,
a um só tempo, em nosso ordenamento jurídico, direito humano e direito
fundamental.
É direito humano, porque é previsto em tratados internacionais de direitos
humanos e tem por objeto a dignidade, a liberdade, a igualdade e a solidariedade
entre todos os seres humanos, independentemente de origem, raça, cor, sexo,
crença, religião, orientação sexual, idade ou estado civil.
Com efeito, o art. 8º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948,
dispõe textualmente: “Toda a pessoa tem direito a recurso efetivo para as
jurisdições nacionais competentes contra os atos que violem os direitos
fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela Lei”.
O acesso à justiça é, também, direito fundamental, porquanto catalogado no
elenco dos direitos e deveres individuais e coletivos constantes do Título II da
Constituição da República de 1988, cujo art. 5º, inciso XXXV, prescreve que a
“lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
O Novo Código de Processo Civil, instituído pela Lei n. 13.105/2015, que
entrará em vigor um ano depois de sua publicação (DOU 17-3-2015), contempla
inúmeros dispositivos que foram objeto de ampla discussão no seio da
comunidade jurídica nacional, sendo, por isso, considerado, diferentemente dos
Códigos de 1939 e 1973, um Código inspirado no Estado Democrático de
Direito.
1.4. Pela formação de uma nova mentalidade
É preciso que as inteligências tenham como norte a efetivação do acesso –
individual e metaindividual – dos fracos e vulneráveis, como consumidores,
trabalhadores, crianças, adolescentes, idosos, os excluídos em geral, não apenas
ao aparelho judiciário e à democratização das suas decisões, mas, sobretudo, a
uma ordem jurídica justa.
Para tanto, é condição necessária a formação de uma nova mentalidade que
culmine com uma autêntica transformação cultural não apenas dos juristas,
juízes e membros do Ministério Público e demais operadores jurídicos, mas,
também, dos governantes, dos empresários, dos trabalhadores, dos
ambientalistas e dos sindicalistas.
A efetivação do acesso coletivo à justiça exige, sobretudo, um “pensar
coletivo”, consentâneo com a nova ordem política, econômica e social
implantada em nosso ordenamento jurídico a partir da Constituição brasileira de
1988.
Quanto ao Ministério Público, o art. 127 da Constituição de 1988 deixa
evidente o seu novo papel político no seio da sociedade brasileira, pois a ele foi
cometida a nobre missão de promover a defesa não apenas do ordenamento
jurídico e dos direitos sociais e individuais indisponíveis, mas, também, do
regime democrático.
Deixa, pois, o Ministério Público a função de mero custos legis, para se
transformar em agente político, cuja função institucional é zelar pela soberania e
representatividade popular; pelos direitos políticos; pela dignidade da pessoa
humana; pela ordem social (valor social do trabalho) e econômica (valor social
da livre-iniciativa); pelos princípios e objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil; pela independência e harmonia dos Poderes constituídos;
pelos princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e
eficiência relativos à Administração Pública; pelo patrimônio público e social;
pelo meio ambiente em todas as suas formas, inclusive o do trabalho etc.
É preciso substituir a velha e ultrapassada expressão custos legis pela de
custos iuris, pois esta abrange não apenas a lei em sentido estrito, mas, também,
os princípios, os valores e os objetivos fundamentais que se encontram no
vértice do nosso ordenamento jurídico.
As transformações e a complexidade das relações sociais, o aumento da
pobreza e do desemprego, a banalização da violência, a generalização do
descumprimento da legislação, a flexibilização do Direito do Trabalho, a criação
de novos institutos jurídicos e a massificação dos conflitos estão a exigir um
aperfeiçoamento técnico multidisciplinar e permanente dos membros do
Ministério Público.
Não basta, contudo, o aperfeiçoamento técnico. É preciso, paralelamente, que
as escolas do Ministério Público incluam, entre as suas finalidades, a formação
prévia e constante dos seus membros a respeito dos valores da ética republicana
e democrática consagrada na nossa Constituição de 1988.
No que concerne aos juízes, decididamente, a Constituição cidadã, como foi
batizada por Ulisses Guimarães, também lhes atribui o papel político de agentes
de transformação social. Não é por outra razão que o art. 93, inciso IV, da CF
determina que o Estatuto da Magistratura nacional deverá observar, como
princípio, “a previsão de cursos oficiais de preparação e aperfeiçoamento de
magistrados como requisitos para ingresso e promoção na carreira”.
E nem poderia ser diferente, pois a crescente complexidade das relações
sociais; as transformações sociais rápidas e profundas; a criação assistemática de
leis que privilegiam mais a eficácia de planos econômicos que a equidade e a
justiça das relações jurídicas; a crescente administrativização do direito que é
utilizado como instrumento de governo e da economia de massa a gerar intensa
conflituosidade; a configuração coletiva dos conflitos de interesses relativos a
relevantes valores da comunidade, como o meio ambiente e outros interesses
difusos, exigem o recrutamento mais aprimorado de juízes e seu permanente
aperfeiçoamento técnico e cultural.
Trata-se de aperfeiçoamento multidisciplinar, que abrange não apenas o
direito, como também a sociologia, a economia, a psicologia, a política, enfim
“um aperfeiçoamento que propicie a visão global do momento histórico e do
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contexto socioeconômico-cultural em que atuam os juízes” .
Somente assim, salienta Kazuo Watanabe, “teremos uma Justiça mais rente à
realidade social e à necessária mudança de mentalidade pelos operadores do
12
Direito, que torne factível o acesso à ordem jurídica mais justa” .
A par do aperfeiçoamento dos juízes, faz-se necessário um apoio decisivo aos
mesmos pelos órgãos de cúpula do Judiciário, tal como ocorre atualmente no
seio do Ministério Público, que vem criando Coordenadorias Especializadas de
Defesa dos Interesses Difusos e Coletivos, além de outros órgãos destinados à
pesquisa permanente, à orientação e ao apoio material a seus membros.
Atualmente, a ENAMAT – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de
Magistrados do Trabalho – vem cumprindo tal papel na preparação inicial e na
formação continuada para o exercício da magistratura trabalhista.
2. TEORIA GERAL DO DIREITO PROCESSUAL E O DIREITO
PROCESSUAL DO TRABALHO
A teoria geral do processo compreende um sistema metodológico reconhecido
pelos diversos ordenamentos jurídicos. Como assinala Cândido Rangel
Dinamarco, constitui uma
síntese indutiva do significado e diretrizes do direito processual como sistema de institutos,
princípios e normas estruturados para o exercício do poder, segundo determinados objetivos: passar
dos campos particularizados do processo civil, trabalhista ou penal (administrativo, legislativo e
mesmo não estatal) à integração de todos eles num só quadro e mediante uma só inserção no universo
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do direito é lavor árduo e incipiente, que a teoria geral do processo se propõe a levar avante .
Por tal razão, a teoria geral do processo encerra um sistema de conceitos e
princípios elevados ao grau máximo de generalização útil e condensados
indutivamente a partir do confronto dos diversos ramos do direito processual,
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como o civil, o trabalhista e o penal .
O sistema processual pátrio (teoria geral do processo) abarca três subsistemas
processuais que constituem objeto de investigação da teoria geral do processo
civil, da teoria geral do processo penal e da teoria geral do processo do trabalho.
Os três subsistemas cumprem, no seu conjunto e com generalização máxima,
uma função axiológica fundamental, relacionada à implementação dos valores
fundamentais concebidos em uma sociedade democrática e pluralista.
Não há negar que o Estado Democrático de Direito brasileiro é, na sua
essência, um aperfeiçoamento do Estado Social, cuja função primordial repousa
na plena realização dos direitos (e valores) humanos, por meio da efetivação da
Justiça Social.
O objetivo-síntese do Estado Democrático de Direito é promover o bem
comum. Tanto isso é verdade que nossa Constituição enaltece uma ordem
econômica “fundada na valorização do trabalho humano e na livre-iniciativa”,
cujo fim consiste em “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames
da justiça social” (CF, arts. 1º, III e IV, e 193).
Os arts. 1º e 15 do CPC reafirmam e positivam definitivamente no Brasil a
constitucionalização do direito processual civil, trabalhista, eleitoral e
administrativo.
São, pois, escopos do sistema processual, em geral, e dos três subsistemas
processuais (civil, penal e trabalhista), em particular:
• social: pacificação dos conflitos jurídicos com justiça social e correção das desigualdades sociais e
regionais, promovendo o bem de todos, sem preconceitos por motivos de raça, cor, sexo, orientação
sexual, idade, condição socioeconômica ou quaisquer outras formas de discriminação;
• político: participação democrática dos cidadãos na administração da Justiça e implementação de
políticas públicas que facilitem a democratização do acesso ao Poder Judiciário, especialmente por
meio da coletivização do processo;
• jurídico: efetivação dos direitos individuais e metaindividuais, observando-se a técnica processual
adequada, fundada em uma hermenêutica jurídica voltada para a efetivação de tais direitos. Trata-se,
aqui, do devido processo justo, que visa, por meio da tutela jurisdicional, à tempestiva e efetiva
realização dos direitos reconhecidos e positivados no ordenamento jurídico.
A teoria geral do processo identifica quais são os pontos comuns a todos os
ramos do direito processual, como os conceitos de jurisdição, ação, defesa,
processo, procedimento. Também indica os princípios gerais aplicáveis a todos
os subsistemas processuais, como os princípios do juiz natural, do promotor
natural, do contraditório, da imparcialidade, da persuasão racional, da
publicidade, do duplo grau de jurisdição, da economia processual, bem como as
garantias gerais relacionadas à ampla defesa, aos recursos em geral, à preclusão,
à coisa julgada, à noção geral de competência e à reciprocidade existente entre as
“jurisdições” civil, penal e trabalhista.
Com razão, Jorge Pinheiro Castelo afirma:
Todas estas igualdades impõem uma unidade de raciocínio e método e deixam claro que todos os
sistemas processuais são sensíveis aos escopos capitais indicados pela teoria geral do processo. Essas
igualdades garantem a unidade e universalização de raciocínio e método de estudos dos grandes
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conceitos, garantias e princípios, porém não significa uma homogeneidade de soluções .
Numa palavra, a teoria geral do processo permite, a um só tempo, o livre
trânsito de ideias entre os diversos ramos do direito processual, propiciando uma
fonte permanente de atualização dos diferentes subsistemas processuais, bem
como as noções gerais das finalidades do direito processual.
Isso não significa, porém, que não haja diferenças entre os diversos
subsistemas do direito processual. Ao revés, é absolutamente necessário
reconhecer as peculiaridades inerentes a cada um desses subsistemas, o que
permite um estudo separado para cada espécie de processo. Essa separação
decorre das diferentes origens e evoluções dos diversos tipos de processo, bem
como pelo caráter instrumental de cada processo.
Afinal, o processo contemporâneo deve estar a serviço do direito material, de
modo a propiciar ao cidadão não apenas o acesso à jurisdição, mas, sobretudo, o
acesso a uma ordem justa, a fim de que sejam realizados os escopos social,
político e jurídico acima apontados.
Nessa perspectiva, é que se deve compreender a autonomia de cada
subsistema do direito processual, propiciando, assim, que os diversos processos
cumpram os seus escopos em harmonia com os valores objetivados pelo
ordenamento jurídico destinado a tutelar os direitos materiais.
Sintetizando, a teoria geral do direito processual tem por objeto a investigação
ampla dos grandes princípios, dos grandes institutos, das grandes estruturas, das
grandes garantias, dos grandes conceitos, dos grandes esquemas lógicos e
universais comuns a todos os subsistemas do direito processual.
Já a teoria geral do direito processual do trabalho tem objeto mais delimitado,
porquanto investiga setores específicos do processo do trabalho, as suas
estruturas peculiares, os conceitos próprios e os valores especiais almejados pelo
direito material do trabalho. Sua finalidade primordial reside, portanto, na
realização dos escopos social, político e jurídico do processo, sob a perspectiva
do direito material do trabalho, bem como, por força da EC n. 45/2004, no que
couber, de outros ramos do direito material, como o direito civil, o direito
administrativo, o direito penal etc.
3. DIREITO PROCESSUAL CONSTITUCIONAL E DIREITO
CONSTITUCIONAL PROCESSUAL: A
CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO PROCESSUAL DO
TRABALHO
Com a instituição do Estado Democrático de Direito, fruto da vontade
inequívoca do Poder Constituinte encarregado de edificar a Lex Fundamentalis
de 1988, passou-se ao reconhecimento do fenômeno da constitucionalização do
direito. Daí falar-se na existência de um “direito processual constitucional” e de
um “direito constitucional processual”, compondo ambos a denominada justiça
constitucional, que se consubstancia na forma e nos instrumentos de garantia e
16
efetividade das normas constitucionais .
O Direito Processual Constitucional diz respeito à própria jurisdição
constitucional, que reúne os instrumentos jurídicos destinados à garantia dos
direitos fundamentais contidos na própria Constituição, como os institutos do
habeas corpus, habeas data, o mandado de segurança, a ação civil pública, a
ação direta de inconstitucionalidade etc.
Já o Direito Constitucional Processual tem como ponto de partida nos
princípios constitucionais do devido processo legal/justo e do acesso à justiça e
se desenvolve por meio de outros princípios constitucionais e
infraconstitucionais referentes às partes, ao juiz, à advocacia, à Defensoria
Pública e ao Ministério Público, como os princípios do juiz e promotor naturais,
do contraditório, da proibição das provas ilícitas, da publicidade dos atos
processuais, da fundamentação das decisões, da efetividade, servindo, pois, de
base para a aplicabilidade e a hermenêutica de todo o sistema processual
brasileiro.
São normas de Direito Constitucional Processual, por exemplo, a prevista no
art. 5º, XXXV, que consagra o princípio da inafastabilidade do acesso ao Poder
Judiciário e a contida no art. 8º, III, ambos da CF, que confere aos sindicatos a
legitimação para defender judicialmente, como substituto processual, os
interesses individuais ou coletivos da categoria profissional ou econômica
17
correspondente .
Os arts. 1º e 8º do CPC, aplicáveis subsidiária e supletivamente ao processo
do trabalho (CLT, art. 769; CPC, art. 15), reconhecem expressamente a
constitucionalização do direito processual (civil, trabalhista, eleitoral e
administrativo), o que nos autoriza dizer que o processo do trabalho também
deve ser ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas
fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil,
observando-se as disposições da legislação processual trabalhista, em especial a
CLT, que, por sua vez, autoriza a aplicação supletiva e subsidiária do direito
processual comum (civil) nas hipóteses de lacunas e desde que seja possível a
compatibilização com os princípios e procedimentos peculiares do direito
processual do trabalho.
3.1. A Reforma Trabalhista e a desconstitucionalização do Direito
Processual do Trabalho
Em direção contrária ao neoconstitucionalismo (ou neopositivismo), que
enaltece a força normativa da Constituição e adota a supremacia dos princípios e
dos direitos fundamentais, a chamada Reforma Trabalhista, instituída pela Lei n.
13.467/2017, restringe a função interpretativa dos Tribunais e Juízes do Trabalho
na aplicação do ordenamento jurídico.
É o que se depreende da leitura dos §§ 2º e 3º do art. 8º da CLT, inseridos pela
referida lei, os quais revelam a verdadeira intenção do legislador reformador:
desconstitucionalizar o Direito do Trabalho e o Direito Processual do Trabalho e
introduzir o chamado modelo do negociado sobre o legislado.
Entretanto, esse mesmo legislador (mesma composição do Congresso
Nacional) que editou o Código de Processo Civil, cujos arts. 1º e 8º reconhecem
a constitucionalização do Direito e do Processo, enaltecendo como dever do juiz,
ao interpretar e aplicar o ordenamento jurídico, observar a supremacia dos
“valores e normas fundamentais estabelecidos na Constituição”, restringe, com a
Lei n. 13.467/2017, o papel dos magistrados trabalhistas, pois estes, na dicção
dos novos §§ 2º e 3º do art. 8º da CLT, deverão apenas aplicar o que dispõe a lei,
transformando-os em meros “servos da lei”, tal como ocorria no Estado Liberal.
Esses novos dispositivos (§§ 2º e 3º do art. 8º da CLT), a nosso sentir, são
claramente inconstitucionais, por violarem os princípios que asseguram o amplo
acesso à Justiça, pois nenhuma lei pode impedir qualquer órgão do Poder
Judiciário brasileiro de apreciar e julgar ação que veicule lesão ou ameaça a
direito, e os princípios de autonomia e independência do Poder Judiciário, na
medida em que os juízes, no Estado Democrático de Direito e no modelo
constitucional de processo, têm a garantia (e o dever) de interpretar a lei e todos
os dispositivos que compõem o ordenamento jurídico conforme os valores e
normas da Constituição, cabendo-lhes, ainda, nessa perspectiva, atender aos fins
sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade
da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoa-bilidade, a
legalidade, a publicidade e a eficiência, como se infere dos arts. 1º e 8º do CPC
de 2015, os quais devem ser aplicados ao processo do trabalho por força do art.
15 do mesmo Código e do art. 769 da CLT.
4. FONTES DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO
Não há a desejável uniformidade doutrinária quando o assunto diz respeito à
conceituação das fontes do direito. Há quem sustente que as fontes seriam a
pedra fundamental de todos os estudos jurídicos, ou seja, a própria origem do
direito, o lugar de onde ele se origina. Alguns advogam que fontes do direito
constituem o fundamento para que se possa considerar válida a norma jurídica.
Outros veem as fontes sob o aspecto da exteriorização do direito.
Não há negar, porém, que a expressão “fonte do direito” é metafórica. Do
mesmo modo que as águas surgem das fontes, as fontes do direito surgem da
convivência social e da necessidade natural humana de ter um regramento
jurídico dessa convivência. Talvez seja por essa razão que a doutrina prefira
classificar as fontes em vez de conceituá-las.
Há, assim, os que classificam as fontes do direito em primárias (lei) e
secundárias (costume, jurisprudência e doutrina). Outros adotam semelhante
critério, mas empregam terminologia diferente, isto é, dividem as fontes em
mediatas e imediatas. Finalmente, há os que sustentam que as fontes podem ser
materiais (fato social) e formais (lei, costume, jurisprudência, analogia,
equidade, princípios gerais de direito).
Por questões meramente didáticas, preferimos classificar as fontes do direito
processual do trabalho em fontes materiais e fontes formais, sendo estas últimas
18
divididas em fontes formais diretas, indiretas e de explicitação .
4.1. Fontes materiais
As fontes materiais são as fontes potenciais do direito processual do trabalho e
emergem, em regra, do próprio direito material do trabalho. Este, por sua vez,
encontra a sua fonte substancial nos fatos sociais, políticos, econômicos,
culturais, éticos e morais de determinado povo em dado momento histórico. Em
outros termos, como sublinham Marinoni, Arenhart e Mitidiero:
O direito material atribui bens às pessoas dentro da ordem jurídica mediante direitos, pretensões,
deveres e exceções. O direito material depende para a sua realização de comportamentos pessoais. O
direito processual visa a prevenir ou reprimir crises comportamentais de colaboração na realização do
direito material. Em regra, o direito material realiza-se independentemente da intervenção do direito
processual. Por vezes, porém, podem surgir dúvidas a respeito do significado e da existência de
determinados fatos, a respeito de determinados dispositivos e do respectivo âmbito de aplicação que
podem levar a diferentes visões a respeito de qual solução deve ser dada a certo caso. Por vezes
inclusive pode haver pura e simples recusa na adoção do comportamento esperado pela ordem
19
jurídica .
Nesses casos em que se verifica o descumprimento do direito material
reconhecido pela ordem jurídica ou dúvidas a respeito da existência de fatos ou
da interpretação de determinados dispositivos de lei as pessoas ou entes
detentores de legitimidade e interesse podem utilizar o processo (civil,
trabalhista, eleitoral etc.) em busca da solução do conflito.
Afinal, entre os escopos do processo está o de promover a realização do
direito material. Com a ampliação da competência da Justiça do Trabalho para
processar e julgar ações oriundas das relações de trabalho diversas da relação de
emprego, além de outras demandas pertinentes ao direito previdenciário
(execução das contribuições previdenciárias), ao direito tributário (retenção do
imposto de renda), à representação sindical e à greve, houve extraordinário
elastecimento das fontes materiais do direito processual do trabalho.
Sob tal prisma, o direito processual adquire a função instrumental, pois o
processo não constitui um fim em si mesmo. Ao revés, ele deve estar a serviço
da realização dos valores sociais contemporâneos, que traduzem um sentimento
universal em prol da verdadeira justiça. Daí o surgimento de uma nova doutrina
20
guiada pela ideia da socialização do direito processual .
4.2. Fontes formais
As fontes formais do direito processual do trabalho são as que lhe conferem o
caráter de direito positivo. Noutro falar, as fontes formais são aquelas que estão
positivadas no ordenamento jurídico. Dividem-se em:
• fontes formais diretas, que abrangem a lei em sentido genérico (atos normativos e administrativos
editados pelo Poder Público) e o costume;
• fontes formais indiretas, que são aquelas extraídas da doutrina e da jurisprudência;
• fontes formais de explicitação, também chamadas de fontes integrativas do direito processual, tais
como a analogia, os princípios gerais de direito e a equidade.
4.2.1. Fontes formais diretas
No topo das fontes formais diretas do direito processual do trabalho,
encontram-se as normas constitucionais, pois é cediço que a Constituição é a Lex
Fundamentalis dos ordenamentos jurídicos estatais.
A Constituição brasileira de 1988 contém não apenas normas (princípios e
regras) gerais do direito processual, mas, também, normas (princípios e regras)
específicas do direito processual do trabalho, tais como as que dispõem sobre a
competência da Justiça do Trabalho (CF, art. 114, incisos e parágrafos, com
redação dada pela EC n. 45/2004).
Abaixo da Constituição Federal, vamos encontrar as espécies normativas
arroladas no dispositivo que trata do processo legislativo pátrio (CF, art. 59), que
são as leis complementares, as leis ordinárias, as leis delegadas, as medidas
provisórias, os decretos legislativos e as resoluções do Congresso Nacional,
incluindo os decretos-leis (anteriores à Carta de 1988), que disponham sobre
normas (princípios e regras) de direito processual.
Atualmente, no patamar infraconstitucional, podemos destacar as seguintes
fontes formais diretas básicas do direito processual do trabalho:
• Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943), que dedica o
Título X ao “Processo Judiciário do Trabalho”;
• Lei n. 5.584/70, que estabelece algumas importantes normas procedimentais e complementares
aplicáveis ao processo do trabalho;
• Novo Código de Processo Civil, aplicado supletiva e subsidiariamente (CPC, art. 15) em caso de
lacuna da legislação processual trabalhista, desde que haja compatibilidade daquele com os valores,
princípios e regras do direito processual do trabalho (CLT, art. 769);
• Lei n. 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal), aplicada subsidiariamente (CLT, art. 889) na execução
trabalhista;
• Lei n. 7.701/88, que dispõe sobre organização e especialização dos tribunais para processar e julgar
dissídios coletivos e individuais.
Nos casos de tutela dos direitos ou interesses metaindividuais trabalhistas, há
a Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, que instituiu o Estatuto do
Ministério Público da União, do qual faz parte o Ministério Público do Trabalho.
Esse Estatuto, também chamado de LOMPU (Lei Orgânica do Ministério
Público da União), contém inúmeros instrumentos de atuação do Parquet
Laboral no âmbito da Justiça do Trabalho, dentre eles, a ação civil pública, a
ação anulatória de cláusula convencional etc., constituindo, assim, inegável fonte
formal do direito processual do trabalho.
Pode-se dizer, portanto, que também integram o elenco das fontes formais
diretas do direito processual do trabalho:
• Lei n. 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública);
• Parte processual da Lei n. 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor);
• Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente);
• Lei n. 7.853/89 (Lei de Proteção à Pessoa Portadora de Deficiência).
Há, ainda, os decretos-leis que foram atos normativos com força de lei
utilizados largamente durante os regimes ditatoriais instalados em nosso país. Os
principais diplomas dessa espécie normativa na seara do direito processual do
trabalho são o Decreto-Lei n. 779/69 (prerrogativas processuais da Fazenda
Pública) e o Decreto-Lei n. 75/66 (correção monetária).
Algumas normas sobre procedimento nos Tribunais são encontradas nos seus
Regimentos Internos. Essas espécies normativas são autorizadas pelo art. 96, I,
a, da Constituição Federal e somente podem dispor, com observância das normas
de processo e das garantias processuais das partes, sobre a competência e o
funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos.
Na prática, porém, os Tribunais acabam criando normas regimentais, além de
Resoluções, Instruções Normativas e Atos Normativos que dispõem sobre
normas processuais em suspeitável ofensa ao art. 22, I, da CF.
Com efeito, o TST vem editando Instruções Normativas (INs), como a IN n.
39/2016, dispondo sobre a aplicabilidade de normas do CPC no processo do
trabalho. Entretanto, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do
Trabalho ajuizou no STF Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5.516), de
relatoria da Min. Cármen Lúcia, questionando a constitucionalidade formal e
material da referida IN n. 39/2016 do TST. Dentre os fundamentos, com os quais
concordamos, destacam-se a violação do princípio da independência dos
magistrados, contida nos arts. 95, I, II e III, e 5º, XXXVII e LIII, da CF, além da
invasão da competência do legislador ordinário federal (CF, art. 22, I) para
legislar sobre direito processual e do princípio da reserva legal (CF, art. 5º, II).
Com a palavra, o Pretório Excelso...
4.2.2. Fontes formais indiretas
No que concerne às fontes formais indiretas, não há negar que a doutrina e a
jurisprudência cumprem importante papel na interpretação do direito processual
do trabalho.
A doutrina fornece o substrato teórico para a boa hermenêutica, o que exige do
intérprete do direito uma formação educativa continuada, sendo de extrema
importância para o profissional e o estudioso da área trabalhista conhecer os
verbetes jurisprudenciais (Súmulas, Orientações Jurisprudenciais e Precedentes)
do TST, que têm a finalidade de uniformizar a jurisprudência sobre a
interpretação e aplicação de normas de direito processual do trabalho.
No que tange à chamada “súmula vinculante”, introduzida pela EC n.
45/2004, que acrescentou o art. 103-A à CF, salta aos olhos que ela passa a ser
fonte formal direta, na medida em que o STF “poderá, de ofício ou por
provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas
decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua
publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais
órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas
federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou
cancelamento, na forma estabelecida em lei”. A Lei n. 11.417, de 19 de
dezembro de 2006, regulamentou o art. 103-A da CF e alterou a Lei n. 9.784, de
29 de janeiro de 1999, disciplinando a edição, a revisão e o cancelamento de
enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal.
4.2.2.1. O CPC e o sistema de precedentes judiciais
No que tange à jurisprudência, salta aos olhos que o CPC buscou implantar no
Brasil o sistema dos precedentes judiciais da common law, na medida em que
impõe aos tribunais o dever de “uniformizar sua jurisprudência e mantê-la
estável, íntegra e coerente” (CPC, art. 926) e determina que os “juízes e os
tribunais observarão: I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle
concentrado de constitucionalidade; II – os enunciados de súmula vinculante; III
– os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de
demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial
repetitivos; IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em
matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria
infraconstitucional; V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais
estiverem vinculados” (CPC, art. 927).
Há, porém, quem sustente a inconstitucionalidade formal dos incisos III, IV e
V do art. 927 do CPC, porquanto somente emenda constitucional poderia
estabelecer efeitos vinculantes a decisões judiciais.
Além disso, pondera Nery:
Saímos, portanto, do perigo e da inconveniência do juiz boca da lei, para ingressarmos no incógnito
juiz boca dos tribunais. Assim como o juiz não é a boca da lei, pois interpreta, analisa os fins sociais
a que ela se destina para aplicá-la no caso concreto, culminando com a sentença de mérito que é a
norma jurídica que faz lei entre as partes, o juiz também não é a boca dos tribunais, pois deve aplicar
a súmula vinculante e o resultado da procedência da ADIn ao caso concreto (CF, 102, § 2º, e 103-A;
CPC, 927, I e II), e, nas demais situações (CPC, 927, III a V), aplicar livremente os preceitos
abstratos e gerais (leis, lato sensu) constantes da súmula simples dos tribunais, orientações do
plenário ou do órgão especial do TRT e TJ, justificando a aplicação ou não do dispositivo oriundo do
tribunal (...) Vinculação a preceitos abstratos, gerais, vale dizer, com características de lei, só
mediante autorização da Carta Política, que até agora não existe (...) Fazer valer e dar eficácia ao
21
CPC 927 III a V é deixar de observar o due process of law, o texto e o espírito da Constituição” .
4.2.2.2. A Reforma Trabalhista e o papel da jurisprudência
Na contramão do sistema de precedentes instituído pelo CPC de 2015, o novel
§ 2º do art. 8º da CLT dispõe, in verbis:
Art. 8º (...) § 2º Súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo Tribunal Superior do
Trabalho e pelos Tribunais Regionais do Trabalho não poderão restringir direitos legalmente
previstos nem criar obrigações que não estejam previstas em lei.
Trata-se de uma tentativa do legislador de transformar o TST e os TRTs em
meros “órgãos aplicadores de leis” e, com isso, reduzir a atividade hermenêutica
jurisdicional desses órgãos do Poder Judiciário.
Ocorre que, no modelo constitucional de processo, cabe a todos os órgãos do
Judiciário brasileiro – sem nenhuma distinção tal como pretendeu o legislador
ordinário – interpretar e aplicar o ordenamento jurídico, sendo este constituído
não apenas por leis, como também por valores, princípios e regras, devendo
qualquer magistrado, inclusive os da Justiça do Trabalho, observar o disposto
nos arts. 1º e 8º do CPC/2015, ou seja, todas as leis devem ser interpretadas em
conformidade aos valores democráticos e republicanos e aos princípios
albergados na Constituição Federal, em especial o princípio da dignidade da
pessoa humana.
De modo que nos parece que o novel § 2º do art. 8º da CLT deve ser
interpretado conforme a Constituição, a fim de se permitir a plenitude da
atividade jurisdicional (CF, art. 5º, XXXV) da Justiça do Trabalho para que as
súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo TST e pelos TRTs
não possam restringir direitos nem criar obrigações que não estejam previstas no
ordenamento jurídico.
4.2.3. Fontes formais de explicitação
Quanto às fontes formais de explicitação ou fontes integrativas do direito
processual do trabalho, o art. 769 da CLT autorizava a aplicação subsidiária do
art. 126 do CPC de 1973, que dispunha, in verbis: “O juiz não se exime de
sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento
da lide, caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à
analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito”, sendo certo que o art.
127 do mesmo digesto preceituava que o “juiz só decidirá por equidade nos
casos previstos em lei”.
Ocorre que o CPC inovou consideravelmente a respeito das fontes formais de
explicitação, uma vez que o seu art. 140 dispõe que o “juiz não se exime de
decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico”,
sendo que o parágrafo único desse dispositivo prevê que o “juiz só decidirá por
equidade nos casos previstos em lei”.
Em outros termos, o CPC não estabelece uma gradação das fontes normativas
que o juiz poderia utilizar para colmatar lacunas, ou seja, a analogia, os costumes
e, por último, os princípios gerais de direito. Isso ocorre porque os arts. 1º e 8º
do CPC, em harmonia com o fenômeno da constitucionalização do direito
processual, enaltecem a supremacia dos princípios jurídicos, sobretudo os que
residem na Constituição, não apenas na interpretação como também na aplicação
do ordenamento jurídico. Há, assim, o rompimento com a velha ideologia do
Estado Liberal em que o juiz atuava apenas como a “boca da lei”.
No Estado Democrático de Direito o juiz passa a ser a “boca da Constituição”,
uma vez que o processo (civil, trabalhista, eleitoral etc.) deve ser “ordenado,
disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais
estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil” (CPC, art. 1º)
e, ao “aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às
exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa
humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a
publicidade e a eficiência” (CPC, art. 8º).
Nessa perspectiva, parece-nos que, por força dos referidos dispositivos do
CPC, que apenas reconhecem positivamente o fenômeno da constitucionalização
de todos os ramos da árvore jurídica, tanto o art. 8º da CLT (“As autoridades
administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou
contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por
equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito
do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado,
mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça
sobre o interesse público”) quanto os arts. 4º (“Quando a lei for omissa, o juiz
decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de
direito”) e 5º da LINDB (“Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a
que ela se dirige e às exigências do bem comum”) devem ser reinterpretados
conforme a Constituição, de modo a reconhecer, primeiramente, a força
normativa dos princípios constitucionais como ponto de partida da interpretação
e aplicação de todo o ordenamento jurídico, incluindo, é claro, todas as fontes
formais do direito processual do trabalho.
O art. 766 da CLT, por exemplo, contempla, implicitamente, um julgamento
por equidade, pois, “nos dissídios sobre estipulação de salários, serão
estabelecidas condições que, assegurando justos salários aos trabalhadores,
permitam também justa retribuição às empresas interessadas”. Trata-se, aqui, de
possível colisão de normas de direitos fundamentais (direito social do
trabalhador ao salário justo e direito de propriedade do empregador), em que o
juiz do trabalho deverá se socorrer da regra contida no § 2º do art. 489 do CPC:
“No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios
gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a
interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a
conclusão”.
Há quem sustente que as normas de direito processual podem derivar de
outras fontes não estatais, como os costumes e os tratados internacionais
firmados pelo Brasil. Parece-nos, contudo, que os costumes somente passam a
ser fontes normativas quando judicializados, ou seja, quando o próprio
ordenamento prevê autorização para o juiz aplicá-los, tal como o prevê o art. 8º
da CLT. Um exemplo de costume, como fonte do direito processual do trabalho,
é o conhecido “protesto nos autos”, que tem a finalidade de atacar decisão
interlocutória e evitar a preclusão (CLT, art. 795, caput).
No que tange aos tratados internacionais, pensamos que essas fontes são, a
rigor, normas de origem estatal, porquanto firmadas por, pelo menos, dois
Estados soberanos, como é o caso do Tratado de Itaipu, que prevê a competência
da Justiça do Trabalho brasileira para processar e julgar as demandas que
envolvem os trabalhadores brasileiros, e o Tratado de Assunção (Mercosul), cujo
Anexo III prevê a instituição de um sistema de solução de conflitos trabalhistas,
em especial, a arbitragem. O STF vinha decidindo – bem ou mal – que os
tratados internacionais ratificados pelo Brasil, mesmo os que versassem sobre
direitos humanos, ingressariam no ordenamento jurídico doméstico na categoria
de leis ordinárias. Por força da EC n. 45/2004, que acrescentou o § 3º ao art. 5º
da CF, os tratados internacionais sobre direitos humanos podem ter força de
emendas constitucionais, desde que observado um quórum especial no processo
22
legislativo de ratificação .
O art. 13 do CPC, aplicado supletiva e subsidiariamente ao processo do
trabalho, pode ser interpretado no sentido de que a jurisdição trabalhista será
“regida pelas normas processuais brasileiras, ressalvadas as disposições
específicas previstas em tratados, convenções ou acordos internacionais de que o
Brasil seja parte” e desde que propiciem melhores condições socioeconômicas
para os trabalhadores no tocante ao efetivo, adequado, tempestivo e justo acesso
à justiça.
5. PRINCÍPIOS
5.1. Conceito e importância
A coerência interna de um sistema jurídico decorre dos princípios sobre os
quais se organiza. Para operacionalizar o funcionamento desse sistema, torna-se
necessária a subdivisão dos princípios jurídicos. Extraem-se, assim, os princípios
gerais e os princípios especiais, conforme a natureza de cada subdivisão.
Debruçando-nos, por exemplo, sobre o direito processual e o direito
processual civil, verificaremos que o direito processual possui seus princípios
gerais, e o direito processual civil, que é um dos seus ramos, possui princípios
especiais.
A harmonização do sistema ocorre porque os princípios especiais ou estão de
acordo com os princípios gerais ou funcionam como exceção. Nessa ordem, as
normas, regras, princípios especiais e princípios gerais seguem a mesma linha de
raciocínio, com coerência lógica entre si.
Além da coerência lógica, deve haver uma coerência teleológica entre os
princípios que compõem o sistema, consentânea com determinados fins
políticos, filosóficos, éticos e sociológicos. Com isso, as normas assumem, no
sistema, um caráter instrumental na busca de determinados valores idealizados
pela sociedade.
Nesse sentido, Claus-Wilhelm Canaris define “o sistema jurídico como ordem
23
axiológica ou teleológica de princípios jurídicos gerais” .
A importância dos princípios foi identificada por Jorge Miranda nos seguintes
termos:
O Direito não é mero somatório de regras avulsas, produto de atos de vontade, ou mera concatenação
de fórmulas verbais articuladas entre si, o Direito é ordenamento ou conjunto significativo e não
conjunção resultante de vigência simultânea; é coerência ou, talvez mais rigorosamente, consistência;
é unidade de sentido, é valor incorporado em regra. E esse ordenamento, esse conjunto, essa unidade,
esse valor, projeta-se ou traduz-se em princípios, logicamente anteriores aos preceitos. Os princípios
não se colocam, pois, além ou acima do Direito (ou do próprio Direito positivo); também eles – numa
visão ampla, superadora de concepções positivistas, literalistas e absolutizantes das fontes legais –
fazem parte do complexo ordenamental. Não se contrapõem às normas, contrapõem-se tão somente
24
aos preceitos; as normas jurídicas é que se dividem em normas-princípios e normas-disposições .
O jusfilósofo Norberto Bobbio refere a importância dos princípios gerais de
direito como fator determinante da completude do ordenamento jurídico.
Segundo esse notável mestre, os princípios gerais são apenas
normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. A palavra princípios leva
a engano, tanto que é velha questão entre os juristas se os princípios gerais são normas. Para mim não
há dúvida: os princípios gerais são normas como todas as outras. E esta é também a tese sustentada
por Crisafulli. Para sustentar que os princípios gerais são normas, os argumentos são dois, e ambos
válidos: antes de mais nada, se são normas aquelas das quais os princípios gerais são extraídos,
através de um procedimento de generalização sucessiva, não se vê por que não devam ser normas
também eles: se abstraio da espécie animal obtenho sempre animais, e não flores ou estrelas. Em
segundo lugar, a função para a qual são extraídos e empregados é a mesma cumprida por todas as
normas, isto é, a função de regular um caso. E com que finalidade são extraídos em caso de lacuna?
Para regular um comportamento não regulamentado: mas então servem ao mesmo escopo a que
25
servem as normas expressas. E por que não deveriam ser normas? .
Mais adiante, o mestre peninsular sublinha, com inteira razão, que:
Ao lado dos princípios gerais expressos há os não expressos, ou seja, aqueles que se podem tirar por
abstração de normas específicas ou pelo menos não muito gerais: são princípios, ou normas
generalíssimas, formuladas pelo intérprete, que busca colher, comparando normas aparentemente
26
diversas entre si, aquilo a que comumente se chama o espírito do sistema .

5.2. Princípios constitucionais fundamentais


A doutrina de Bobbio sobre princípios assume especial importância para o
ordenamento jurídico brasileiro, mormente depois da promulgação da
Constituição Federal de 1988.
Com efeito, a norma-ápice do ordenamento jurídico pátrio, logo no seu Título
I, confere aos princípios o caráter de autênticas normas constitucionais. Vale
dizer, já não há mais razão para a velha discussão sobre a posição dos princípios
entre as fontes do direito, porquanto os princípios fundamentais inscritos na
Constituição Federal passam a ser as fontes normativas primárias do nosso
sistema.
Daí a pertinência, com maior razão ainda diante do texto constitucional, da
afirmação de Celso Antônio Bandeira de Mello, para quem princípio:
é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição
fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério
para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do
sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido humano. É o conhecimento dos
princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por
nome sistema jurídico positivo. Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma.
É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio
atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores
27
fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço e corrosão de sua estrutura mestra .
Colhe-se, neste passo, a observação de Geraldo Ataliba, para quem, em
direito, “o princípio é muito mais importante do que uma norma”, uma vez que o
princípio é, também, uma norma; mas “é muito mais do que uma norma, uma
diretriz, é um norte do sistema, é um rumo apontado para ser seguido por todo o
28
sistema, sempre que se vai debruçar sobre os preceitos contidos no sistema” .
Vê-se, pois, que esses dois autores brasileiros consideram os princípios mais
importantes que as normas. No entanto, é importante assinalar que, atualmente,
surge na academia uma nova compreensão do papel dos princípios
constitucionais fundamentais em nosso ordenamento jurídico, o que passa,
29
necessariamente, pela adoção do pensamento de Ronald Dworkin e Robert
30
Alexy , pois ambos inspiraram novos estudos sobre hermenêutica nas modernas
democracias ocidentais. Dworkin, consagrado professor de filosofia jurídica da
Universidade de Oxford, criticando o modelo de “regras”, propõe que a “norma”
(norm) em sentido lato alberga tanto as “regras” (rules) quanto os “princípios”
(principles).
Transplantando a teoria de Dworkin para o nosso ordenamento, poderíamos
dizer que as normas constitucionais são o gênero que tem como espécies os
princípios e as regras. Essa teoria possui o grande mérito, com o qual
concordamos, de desvendar que, ao contrário das regras, princípio não revoga
princípio; antes se harmonizam, abrindo espaço para a aplicação da justiça no
caso concreto, mediante outro princípio: o da razoabilidade, proporcionalidade
ou ponderação de bens.
Alexy, por sua vez, enfatiza o aspecto deontológico dos princípios. Diz ele
que:
tanto las reglas como los principios son normas porque ambos dicen lo que debe ser. Ambos pueden
ser formulados con la ayuda de las expresiones deónticas básicas del mandato, la permisión y la
proibición. Los principios, al igual que las reglas, son razones para juicios concretos de debe ser,
aun cuando sean razones de un tipo muy diferente. La distinción entre reglas y principios es pues
31
una distinción entre dos tipos de normas .
Parece-nos inegável que o CPC recebeu influência do neoconstitucionalismo e
do neopositivismo jurídico, uma vez que reconhece, mormente na sua Parte
Geral, Livro I, Título Único, que as Normas Fundamentais compõem-se dos
mesmos princípios, regras e valores que também estão, em grande parte,
previstos na Constituição Federal.
Pensamos, neste passo, que os princípios positivados no CPC (arts. 1º a 12),
em especial os que também estão coincidentemente previstos na CF, como os
princípios da dignidade da pessoa humana, do efetivo acesso à justiça, do devido
processo legal/constitucional, da duração razoável do processo, do contraditório,
da ampla defesa, da publicidade, do atendimento aos fins sociais do
ordenamento jurídico, das exigências do bem comum, da razoabilidade, da
proporcionalidade, da eficiência e da fundamentação das decisões, são
aplicáveis, no que couber, ao processo do trabalho não por conta do art. 15 do
CPC ou do art. 769 da CLT, mas pela força normativa da Constituição Federal.
5.3. Função dos princípios constitucionais fundamentais
Os princípios constitucionais fundamentais exercem tríplice função no
ordenamento jurídico, a saber: informativa, interpretativa e normativa.
A função informativa é destinada ao legislador, inspirando a atividade
legislativa em sintonia com os princípios e valores políticos, sociais, éticos e
econômicos do ordenamento jurídico. Sob essa perspectiva, os princípios atuam
com propósitos prospectivos, impondo sugestões para a adoção de formulações
novas ou de regras jurídicas mais atualizadas, em sintonia com os anseios da
sociedade e atendimento às justas reivindicações dos jurisdicionados.
A função interpretativa é destinada ao aplicador do direito, pois os princípios
se prestam à compreensão dos significados e sentidos das normas que compõem
o ordenamento jurídico. Entre os diversos métodos de interpretação oferecidos
pela hermenêutica jurídica, os princípios podem desempenhar um importante
papel na própria delimitação e escolha do método a ser adotado nos casos
submetidos à decidibilidade.
A função normativa, também destinada ao aplicador do direito, decorre da
constatação de que os princípios podem ser aplicados tanto de forma direta, isto
é, na solução dos casos concretos mediante a derrogação de uma norma por um
princípio, por exemplo, o princípio da norma mais favorável aos trabalhadores
(CF, art. 7º, caput), quanto de forma indireta, por meio da integração do sistema
nas hipóteses de lacuna (CPC, art. 128), como se dá, por exemplo, com a
aplicação do princípio da preclusão no campo processual.
Cremos ser possível alinhar outras importantes funções que os princípios
constitucionais fundamentais desempenham no ordenamento jurídico brasileiro:
• integram o direito positivo como normas fundamentais;
• ocupam o mais alto posto na escala normativa;
• são fontes formais primárias do direito (superação da LINDB – Lei de Introdução às Normas do
Direito Brasileiro, art. 4º, que coloca os princípios gerais na posição de meras fontes subsidiárias nas
hipóteses de lacunas do sistema);
• passam a ser normas de introdução ao ordenamento jurídico brasileiro;
• em caso de conflito entre princípio (justiça) e regra (lei), preferência para o primeiro;
• propiciam a atividade criativa (e vinculativa) do juiz, impedindo o dogma da neutralidade e os
formalismos legalistas (supremacia dos valores superiores na interpretação do direito sobre o
legalismo restrito);
• prestigiam a verdadeira segurança jurídica, pois a atividade legislativa e a judicante ficam
vinculadas à observância dos princípios constitucionais fundamentais;
• vinculam todos os Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário): judicialização da política e
politização da justiça (Judiciário);
• estabelecem a função promocional do Ministério Público (defesa do regime democrático e do
32
ordenamento jurídico) .

5.4. Princípios gerais do direito processual


A doutrina costuma classificar os princípios do direito processual em
princípios informativos e princípios fundamentais.
5.4.1. Princípios informativos
Os princípios informativos do direito processual, também chamados por
alguns de meras regras informativas do processo, são considerados axiomas,
prescindindo, pois, de demonstração. Não se baseiam em outros critérios que não
os estritamente técnicos e lógicos, não possuindo praticamente nenhum conteúdo
ideológico. Os princípios informativos são universais e, por tal razão, são
33
praticamente incontroversos .
Por serem axiomas, os princípios informativos servem de base para a
elaboração de uma teoria geral do processo.
Segundo Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido
34
Rangel Dinamarco , são princípios informativos do direito processual:
• Princípio Lógico – Consiste na escolha dos fatos e forma mais aptos para descobrir a verdade e
evitar o erro. Este princípio informa a logicidade a que está jungido o processo, de maneira que a
petição inicial deve preceder a contestação, a decisão judicial ao recurso etc.;
• Princípio Jurídico – Seu papel é proporcionar aos litigantes igualdade de tratamento na demanda e
justiça na decisão, mediante regras claras e preestabelecidas, evitando-se que o processo seja uma
“caixinha de surpresas”;
• Princípio Político – Seu objetivo é prover os direitos dos cidadãos da máxima garantia social com
o mínimo de sacrifício da liberdade individual. Este princípio estabelece a regra política que
determina ao juiz o dever de sentenciar, mesmo no caso de lacunas. É este princípio, portanto, que
justifica a completude do ordenamento jurídico; e
• Princípio Econômico – Consiste, de um lado, em fazer com que as lides não sejam tão
dispendiosas e demoradas, e, de outro, em propiciar o acesso dos pobres ou dos hipossuficientes
econômicos ao aparelho judiciário, por meio dos institutos da assistência judiciária e da justiça
gratuita.
5.4.2. Princípios fundamentais
Os princípios fundamentais do processo, também chamados de princípios
gerais do processo, são os princípios “sobre os quais o sistema jurídico pode
fazer opção, considerando aspectos políticos e ideológicos. Por essa razão,
admitem que em contrário se oponham outros, de conteúdo diverso, dependendo
35
do alvedrio do sistema que os está adotando” .
Além do princípio do acesso à justiça, sobre o qual nos debruçaremos com
maior profundidade no Capítulo III, são princípios fundamentais ou gerais do
direito processual:
5.4.2.1. Princípio da igualdade ou isonomia
O princípio da igualdade está consagrado no art. 5º, caput, da CF, segundo a
qual todos são iguais perante a lei. É importante notar que a igualdade aqui
mencionada é apenas a formal. Todavia, essa norma constitucional deve se
amoldar ao figurino das normas-princípios constitucionais fundamentais da
dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho e da livre-iniciativa,
bem como aos objetivos fundamentais da República, consubstanciados, dentre
outros, na erradicação da pobreza e da marginalização e na redução das
desigualdades sociais e regionais (CF, arts. 1º e 3º).
O princípio da isonomia é tratado no CPC como princípio da paridade de
armas. É o que se infere do seu art. 7º, que assegura “às partes paridade de
tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos
meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais,
competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório”.
Vale dizer, o princípio da igualdade ou da paridade de armas há de ser
entendido no seu sentido amplo, isto é, tanto no aspecto da igualdade formal
quanto no da igualdade substancial. Disso resulta a necessidade de adaptação da
aplicabilidade deste princípio nos domínios do direito processual do trabalho, no
qual se observa, não raro, manifesta desigualdade econômica entre as partes que
figuram no processo.
Por outro lado, o próprio sistema jurídico cuida de estabelecer exceções ao
princípio da igualdade das partes, como, por exemplo, as normas que outorgam
prerrogativas materiais e processuais a certas instituições, como a Fazenda
Pública, o Ministério Público e a Defensoria Pública, as quais foram instituídas
em nome do interesse público e em razão da natureza e organização do Estado.
É o que ocorre, também, com a ampliação dos prazos estabelecida nos arts.
180 e 183 do CPC e no art. 1º do Decreto-Lei n. 779/69. Tais prerrogativas não
se confundem com privilégios, pois encontram justificativa no interesse público
na proteção dos bens públicos e em função das características de tais entes: a
Fazenda, diante da complexidade dos serviços estatais e da necessidade de
formalidades burocráticas; o MP, por causa do número geralmente deficiente de
membros, da sobrecarga de trabalho, do desaparelhamento funcional e da
distância das fontes de informação e das provas, bem como das novas funções de
órgão agente que lhe foram cometidas pela Constituição e pelas leis; a
Defensoria Pública, por semelhantes razões.
Além da dilação do prazo, há também outras formas de mitigação do princípio
da isonomia formal ou substancial, como o caso da dispensa de custas aos
necessitados e carentes, desde que beneficiários de justiça gratuita, assim
declarados na decisão judicial; a isenção de caução para os trabalhadores; o
duplo grau de jurisdição, obrigatório nas causas em que as pessoas jurídicas de
direito público são vencidas total ou parcialmente (CPC, art. 496; Decreto-Lei n.
779/69, art. 1º; Súmula 303 do TST), a inversão do ônus da prova em favor da
parte hipossuficiente etc.
5.4.2.2. Princípio do contraditório
O princípio do contraditório é, também, garantia constitucional, estabelecido
entre nós pelo art. 5º, LV, da CF de 1988.
Esse princípio é de mão dupla, isto é, implica a bilateralidade da ação e a
bilateralidade do processo, aproveitando, portanto, autor, réu e terceiros
participantes da relação jurídica processual.
O princípio em tela também é útil para estabelecer o moderno conceito de
parte no processo. Vale dizer, parte é quem participa, efetiva ou potencialmente,
do contraditório na relação jurídica processual.
O CPC enaltece em diversos dispositivos o princípio do contraditório. É o que
se infere da leitura dos arts. 7º, 98, VIII, 115, 329, II, 372, 503, § 1º, II, e 962, §
2º.
Além disso, o art. 10 do CPC dispõe, categoricamente, que o “juiz não pode
decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do
qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se
trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.
5.4.2.3. Princípio da ampla defesa
Encontra-se positivado no art. 5º, LV, da CF, funcionando como complemento
do princípio do contraditório.
Com efeito, a não se admitir a relação processual sem a presença do réu, não
teria sentido tal regramento se, comparecendo a juízo para se defender e opor-se
à pretensão autoral, o réu ficasse impedido ou inibido de excepcionar, contestar,
recorrer ou deduzir toda a prova de seu interesse.
Advirta-se, porém, que esse princípio também é de mão dupla, uma vez que a
bilateralidade da ação e da defesa aproveita tanto o réu quanto o autor. Vale
dizer, reconhece-se, atualmente, em virtude da aproximação cada vez maior
entre o direito material e o direito processual, que o autor, quando vai a juízo,
encontra-se em situação de “defesa” do seu direito material lesado ou ameaçado
de lesão pelo réu. É por isso que o princípio da ampla defesa, em favor do autor,
permite ao juiz conceder tutelas antecipatórias para proteção imediata do direito
material do autor.
O princípio da ampla defesa, por ser princípio constitucional, deve ser
obrigatoriamente observado em todos os processos, estando, inclusive,
expressamente previsto no art. 847 da CLT e nos arts. 7º, 98, § 1º, VIII, do CPC.
5.4.2.4. Princípio da imparcialidade do juiz
Avocando a si a missão de prestar a tutela jurisdicional, que não deixa de ser
também a prestação de um serviço público, salta aos olhos que, ao exercer esse
poder-dever-função, o Estado-juiz deverá agir com absoluta imparcialidade.
Imparcialidade, para nós, não se confunde com neutralidade. O juiz, embora
agente público com responsabilidades complexas, é um ser humano como outro
qualquer. Logo, não se pode ignorar que ele tenha a sua própria “visão de
mundo”, com as suas próprias preferências políticas, filosóficas e ideológicas.
Afinal, o homem é um animal político, já dizia Aristóteles. Todavia, ao
desempenhar a função jurisdicional, o juiz deverá agir com imparcialidade, isto
é, sem tendências que possam macular o devido processo legal e favorecer uma
parte em detrimento da outra no que tange ao direito fundamental de acesso à
justiça.
O princípio em tela significa, por outro lado, que, na justa composição da lide,
a solução do conflito de interesses entre as partes só pode ser obtida por meio de
processo regular, em que as partes tenham igualdade de tratamento, sob o regime
do contraditório e da ampla defesa e perante um juiz imparcial. O princípio da
imparcialidade implica repúdio aos juízes secretos e de caráter inquisitivo do
período reinol.
Para efetivar a imparcialidade do juiz, a Constituição Federal (art. 95) confere
à magistratura garantias especiais, a saber: a vitaliciedade, a inamovibilidade e a
irredutibilidade de subsídios.
Além disso, a legislação processual civil (CPC, arts. 144 a 148) e a trabalhista
(CLT, art. 801) estabelecem meios de preservação do princípio da imparcialidade
do juiz, disciplinando as hipóteses de impedimento e suspeição dos órgãos
julgadores que não poderão atuar em determinados processos.
5.4.2.5. Princípio da fundamentação das decisões
Como desdobramento dos princípios da imparcialidade e do devido processo
legal, exsurge um outro: o princípio constitucional da obrigatoriedade da
fundamentação das decisões judiciais (CF, art. 93, IX; CLT, art. 832; CPC, art.
489, II, e § 1º).
Esse princípio constitui uma garantia do cidadão e da sociedade contra o
arbítrio dos juízes. Seu fundamento encontra residência constitucional no art. 93,
IX, da CF, in verbis:
Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as
decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público o exigir, limitar a presença, em
determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes em casos no quais a
preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à
informação.
O preceptivo em causa, na verdade, consagra dois outros princípios: o da
obrigatoriedade da fundamentação das decisões e o da publicidade dos
julgamentos, ressalvando-se, com relação a este último, as hipóteses em que o
interesse público exigir a sua relativização.
O art. 489, § 1º, I a VI, do CPC adota o princípio da fundamentação exaustiva
(ou exauriente) ao prescrever, analiticamente, os casos em que não será
considerada fundamentada a decisão judicial. Esse dispositivo é de duvidosa
aplicação no processo do trabalho, uma vez que não existe lacuna da CLT (art.
769), já que seu art. 832 exige apenas “os fundamentos da decisão e a respectiva
conclusão”, além de se mostrar, em certos casos, incompatível com as
características das demandas trabalhistas, nas quais se verificam, via de regra,
múltiplos pedidos, o que comprometeria a efetividade dos princípios da duração
razoável do processo e da simplicidade que caracterizam o processo laboral.
Voltaremos ao tema no Capítulo XVII, item 5.7.2.
5.4.2.6. Princípio do devido processo legal
O princípio do devido processo legal é a base sobre a qual todos os outros
princípios se sustentam, pois, segundo Nelson Nery Junior, “bastaria a norma
constitucional haver adotado o princípio do due process of law para que, daí,
decorressem todas as consequências processuais que garantiriam aos litigantes o
direito a um processo e a uma sentença justa. É, por assim dizer, o gênero do
36
qual todos os demais princípios constitucionais do processo são espécies” . Daí a
razão pela qual alguns autores preferem o termo “devido processo
constitucional”.
O princípio em tela encontra raízes no due process of law, do direito norte-
americano, e está albergado, explicitamente, no art. 5º, LIV, da CF, in verbis:
“ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal”.
Em sentido genérico, pois, o princípio do devido processo legal caracteriza-se
pelo trinômio vida-liberdade-propriedade.
O princípio ora focalizado não se restringe ao terreno processual (procedural
due process of law), porquanto os valores vida, liberdade e propriedade também
são ínsitos ao direito material. Daí, a afirmação, por exemplo, de que o princípio
da autonomia privada encontra fundamento no sentido substantivo do princípio
do devido processo legal (substantive due process).
Do princípio do devido processo legal extraem-se outros princípios, de ordem
constitucional e infraconstitucional, tais como os princípios do juiz natural, do
promotor natural, do duplo grau de jurisdição, da recorribilidade das decisões e
da motivação das decisões judiciais, do contraditório e ampla defesa, o da
duração razoável do processo etc. Como corolário, é factível dizer que o devido
processo legal deve ser compreendido também como princípio do “devido
processo justo”.
O CPC refere expressamente o princípio do devido processo legal nos arts. 26,
I, e 36.
5.4.2.6.1. Princípio do juiz natural
O princípio do juiz natural encontra residência no art. 5º, LIII, da CF, in
verbis: “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade
competente”.
Por princípio do juiz natural (CF, art. 5º, LIII), entende-se aquele que não só
consagra a tese de que juiz é aquele investido de função jurisdicional, afastando
julgamentos por outro poder, como ainda impede a criação de tribunais de
exceção ou ad hoc para o julgamento de causas cíveis ou penais. Os tribunais
especializados não constituem exceção ao princípio do juiz natural, pois estão
previstos na própria Constituição, que prevê a existência de Justiças
especializadas, com competência para julgar causas trabalhistas, militares e
eleitorais.
O princípio do juiz natural deve ser observado sobretudo na distribuição de
processos, que deve ser pautada em critérios objetivos e aleatórios, impedindo
que a parte escolha propositalmente o juiz que irá julgar a sua causa, salvo em
situações objetivamente previstas em lei (CPC, art. 286).
5.4.2.6.2. Princípio do promotor natural
O princípio do promotor natural decorre da interpretação sistêmica do texto
constitucional. Vale dizer, o princípio do promotor natural está albergado nos
arts. 5º, XXXV e LIII, 127 e 129, I, da Constituição Federal, e se funda nas
cláusulas da independência funcional e da inamovibilidade dos membros do
Ministério Público.
A rigor, bem observa Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, o princípio do promotor
natural, “na realidade, é verdadeira garantia constitucional, menos dos membros
do Parquet e mais da própria sociedade, do próprio cidadão, que tem assegurado,
nos diversos processos que o MP atua, que nenhuma autoridade ou poder poderá
escolher o Promotor ou Procurador específico para determinada causa, bem
como que o pronunciamento deste membro do MP dar-se-á livremente, sem
37
qualquer tipo de interferência de terceiros” .
O princípio do promotor natural interage com o princípio do juiz natural,
sendo que ambos têm por norte a imparcialidade do juiz e do Ministério Público,
garantindo às partes a lisura da prestação jurisdicional. O STF (HC n. 90.277-
DF, Rel. Min. Ellen Gracie), porém, não reconhece o princípio do promotor
natural como inerente ao ordenamento jurídico brasileiro.
5.4.2.6.3. Princípio do duplo grau de jurisdição
Remetemos o leitor ao Capítulo XIX, subitem 6.1.
5.4.2.7. Princípio do acesso individual e coletivo à justiça ou inafastabilidade do controle jurisdicional
ou ubiquidade ou indeclinabilidade da jurisdição
Está consagrado expressamente no art. 5º, XXXV, da CF, in verbis: “a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Este
princípio tem por destinatário não apenas o legislador (“a lei não excluirá ..”.),
pois o comando constitucional atinge a todos indistintamente. Em outros termos,
a ninguém (Estado, sociedade ou cidadão) é permitido impedir o direito
fundamental de qualquer pessoa de ajuizar ação perante o Poder Judiciário.
O problema do acesso à justiça ganhou nova dimensão a partir da Constituição
Federal de 1988, que, inovando substancialmente em relação à Carta que lhe
antecedeu, catalogou os princípios da inafastabilidade do controle jurisdicional e
do devido processo legal no rol dos direitos e garantias fundamentais,
especificamente no capítulo concernente aos direitos e deveres individuais e
coletivos.
Amplia-se, então, no plano mais elevado do nosso ordenamento, o conceito
jurídico de acesso ao Poder Judiciário, não somente para a tutela jurisdicional na
hipótese de lesão, mas, também, na de ameaça a direito.
E mais, a expressão “direito”, embora esteja gramaticalmente empregada no
singular, comporta interpretação extensiva e sistemática, isto é, abarca tanto os
“direitos” como os “interesses”, quer sejam “individuais”, quer sejam
“coletivos” lato sensu.
Não é incorreto afirmar, pois, que esses dois princípios constitucionais –
indeclinabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV) e devido processo legal (CF,
art. 5º, LIV e LV) – servem de aporte à temática do efetivo acesso, tanto
individual quanto coletivo, ao Poder Judiciário brasileiro.
Neste passo, e considerando a existência de diversas normas constitucionais e
infraconstitucionais criadoras de direitos e garantias metaindividuais, bem como
a atual tendência legislativa a ampliar e regular a proteção desses “novos
direitos”, salta aos olhos que o ortodoxo modelo liberal-individualista, inspirador
do CPC e da CLT (Título X, Capítulo III), mostra-se inválido, insuficiente,
inadequado e ineficaz para solucionar os novos conflitos civis e trabalhistas de
massa, pois, como adverte Marcelo Abelha Rodrigues,
tratar-se-ia de, por certo, se assim fosse, uma hedionda forma de inconstitucionalidade, na medida em
que impede o acesso efetivo à justiça e fere, em todos os sentidos, o direito processual do devido
processo legal. Isto porque, falar-se em devido processo legal, em sede de direitos coletivos lato
sensu, é, inexoravelmente, fazer menção ao sistema integrado de tutela processual trazido pelo CDC
38
(Lei n. 8.078/90) e LACP (Lei n. 7.347/85) .
Esse moderno sistema integrado de acesso coletivo à justiça é implementado
por aplicação direta de normas jurídicas da CF (arts. 5º, XXXV, e 129, III), da
LACP, do CDC (Título III) e, por aplicação subsidiária, das normas do CPC,
desde que estas não sejam incompatíveis com aquelas.
Alguns processualistas apelidaram esse novo sistema de “jurisdição civil
coletiva”, o que implica dizer que, atualmente, a “jurisdição civil” abrange dois
sistemas: o da tutela jurisdicional individual, regido basicamente pelo CPC, e o
da tutela jurisdicional coletiva (ou “jurisdição civil coletiva”), disciplinado, em
linhas gerais, pelo sistema integrado de normas contidas na CF, na LACP, no
CDC e, subsidiariamente, no CPC.
O art. 3º do CPC consagra expressamente o princípio do acesso à justiça
estatal, além de reconhecer e estimular o acesso à arbitragem, à mediação, à
conciliação e a outros métodos alternativos de solução consensual de conflitos.
Com relação ao direito processual do trabalho, pode-se inferir que, com a
promulgação da CF, de 1988, do CDC, de 1990, e, mais tarde, da LOMPU, de
1993, a “jurisdição trabalhista”, isto é, o sistema processual de acesso à Justiça
do Trabalho, passou a ser constituída de três subsistemas: a) o subsistema de
acesso individual (dissídios individuais e plúrimos); b) o subsistema de acesso
ao Poder Normativo (dissídios coletivos); c) o subsistema de acesso
39
metaindividual (ação civil pública) .
Sobre esses três subsistemas de acesso à Justiça do Trabalho, voltaremos a
falar no Capítulo III.
5.4.2.8. Princípio da razoabilidade da duração do processo
Com a promulgação da EC n. 45/2004, que acrescentou o inciso LXXVIII ao
art. 5º da CF, um novo princípio fundamental foi insculpido em nosso sistema
processual, segundo o qual “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a
celeridade de sua tramitação”.
O princípio da razoabilidade da duração do processo foi inspirado, certamente,
na constatação de que o sistema processual brasileiro, tanto no âmbito judicial
quanto administrativo, padece de uma enfermidade crônica: a morosidade.
Vê-se, assim, que o nosso ordenamento jurídico passa a se preocupar não
apenas com o acesso do cidadão ao Poder Judiciário, mas, também, que esse
acesso seja célere, de modo que o jurisdicionado e o administrado tenham a
garantia fundamental de que o processo, judicial ou administrativo, em que
figurem como parte, terá duração razoável em sua tramitação.
O escopo do princípio ora focalizado, portanto, reside na efetividade da
prestação jurisdicional, devendo o juiz empregar todos os meios e medidas
judiciais para que o processo tenha uma “razoável duração”, que, na verdade, é
uma expressão que guarda um conceito indeterminado, razão pela qual somente
no caso concreto poder-se-á afirmar se determinado processo teve ou está tendo
tramitação com duração razoável.
Alguns meios que garantirão a celeridade processual foram inseridos na
própria CF, por força da EC n. 45/2004, tais como: a previsão de que “a
atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juízos
e tribunais de segundo grau, funcionando, nos dias em que não houver
expediente forense normal, juízes em plantão permanente” (CF, art. 93, XII); a
permissão para que os servidores recebam “delegação para a prática de atos de
administração e atos de mero expediente sem caráter decisório” (idem, XIV) e a
determinação de que “a distribuição de processos será imediata, em todos os
graus de jurisdição” (idem, XV).
Além disso, a alínea e do inciso II do art. 93 da CF, com redação dada pela EC
n. 45/2004, estabelece uma importante medida de natureza administrativa para
assegurar a celeridade da tramitação do processo, na medida em que será
proibida a promoção do “juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder
além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido
despacho ou decisão”.
O CPC consagra expressamente o princípio da duração razoável do processo
em seu art. 4º, que assegura às partes “o direito de obter em prazo razoável a
solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”. O art. 139, II, do
CPC estabelece como um dos deveres do juiz “velar pela duração razoável do
processo”.
5.4.2.9. Princípio do ativismo judicial
Outra consequência da vinculação do processo ao paradigma do Estado
Democrático de Direito, sendo aquele um dos instrumentos de realização deste, é
o reconhecimento do princípio do ativismo judicial. Como bem lembra Hermes
Zaneti Júnior:
O que é fundamental ao Estado Democrático de Direito é a prevalência dos direitos fundamentais
individuais e coletivos, sua relação com os fins e objetivos da sociedade multicultural (plúrima), e
sua abertura para a construção da futura democracia integral (representativa, direta, política e
40
social) .
Reconhece-se, pois, a expansão do princípio do ativismo judicial nas
sociedades democráticas contemporâneas, alcançando, sobremaneira, o Brasil,
mormente com a promulgação da Constituição Republicana de 1988. Daí a
importante advertência de Gisele Cittadino:
O protagonismo do Poder Judiciário pode ser observado tanto nos Estados Unidos como na Europa,
ainda que nos países da common law esse ativismo judicial seja mais favorecido pelo processo de
criação jurisprudencial do direito. De qualquer forma, mesmo nos países de sistema continental, os
textos constitucionais, ao incorporar princípios, viabilizam o espaço necessário para interpretações
construtivistas, especialmente por parte da jurisdição constitucional, já sendo até mesmo possível
falar em um “direito judicial”. No Brasil, do mesmo modo, também se observa uma ampliação do
controle normativo do Poder Judiciário, favorecida pela Constituição de 1988, que, ao incorporar
direitos e princípios fundamentais, configurar um Estado Democrático de Direito e estabelecer
princípios e fundamentos do Estado, viabiliza uma ação judicial que recorre a procedimentos
interpretativos de legitimação de aspirações sociais (...). Esse processo de ampliação da ação judicial
pode ser analisado à luz das mais diversas perspectivas: o fenômeno da normatização de direitos,
especialmente em face de sua natureza coletiva e difusa; as transições pós-autoritárias e a edição de
constituições democráticas – seja em países europeus ou latino-americanos – e a consequente
preocupação com o reforço das instituições de garantia do estado de direito, dentre elas a
magistratura e o Ministério Público; as diversas investigações voltadas para a elucidação dos casos
de corrupção a envolver a classe política, fenômeno já descrito como “criminalização da
responsabilidade política”; as discussões sobre a instituição de algum tipo de poder judicial
internacional ou transnacional, a exemplo do tribunal penal internacional; e, finalmente, a
emergência de discursos acadêmicos e doutrinários, vinculados à cultura jurídica, que defendem uma
relação de compromisso entre Poder Judiciário e soberania popular. Se considerarmos qualquer uma
dessas chaves interpretativas, podemos compreender porque a expansão do poder judicial é vista
como um reforço da lógica democrática. Com efeito, seja nos países centrais, seja nos países
periféricos, na origem da expansão do poder dos tribunais, percebe-se uma mobilização política da
sociedade. Não é por outra razão que esse vínculo entre democracia e ativismo judicial vem sendo
41
designado como judicialização da política .
O princípio do ativismo judicial está expressamente previsto no art. 2º, i, do
Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, elaborado pelo
42
Instituto Brasileiro de Direito Processual .
O princípio do ativismo, inspirador da conduta habitual do magistrado, auxilia
na formação de material jurídico positivo, na medida em que se reconhece que a
aplicação do direito é produção de direito como norma agendi. Nas palavras de
Evandro Gueiros Leite, ministro aposentado do STJ:
O ativismo condiz, pois, com a contextualidade do Direito Processual Civil, no pertinente à atividade
jurídica e à ação judiciária: atuação de um Poder (política); função do jus dicere (finalidade);
processo e organização (instrumentalidade). Dentro desse quadro, o estudioso pode aderir a um novo
princípio de legitimidade ou a uma nova ideia de direito, com o juiz como figura principal (...) O
ativismo do juiz atua sobre o comportamento deste no processo, em busca de um direito judicial,
menos submisso às leis ou à doutrina estabelecida e às convenções conceituais. Não importa numa
simples, embora ágil, aplicação da norma e que a deixe inalterada. Nem é atitude voluntariosa, mas
tomada de consciência no presente e diretriz de decisões futuras.
É preciso distinguir o juiz ativo do juiz ativista, pois, como bem observa
Roberto C. Berizonce:
o juiz que pronuncia suas decisões e cumpre os seus deveres funcionais com diligência e dentro dos
prazos legais pode ser considerado ativo; será ativista se, ademais disto, e a partir de uma visão
progressista, evolutiva e reformadora, souber interpretar a realidade de sua época e conferir às suas
decisões um sentido construtivo e modernizante, orientando-se para a consagração dos valores
43
essenciais em vigor .
Eis a nova postura do magistrado que os processualistas denominam de
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ativismo-cooperativo, em que se busca não a verdade absoluta , mas a verdade
possível em sintonia com os elementos extraídos do diálogo com as partes e da
análise das suas condições políticas, sociais, culturais e econômicas, o que
possibilitará a máxima aproximação entre a realidade e o “devido processo justo
e de resultados”.
Se o princípio do ativismo judicial encontra-se em franca expansão nos sítios
45
do processo civil , salta aos olhos a necessidade de sua urgente aplicação no
terreno do processo do trabalho. Afinal, neste há, em regra, situações de
desigualdades de armas entre os litigantes, sendo o espaço natural para as
demandas metaindividuais e uma atuação mais ativa do magistrado.
Afinal, o art. 84 do CDC e os arts. 139, 297, 497, 499, 500, 536 e 537 do CPC
e 765 da CLT demonstram que o nosso sistema processual estimula (e
determina) uma atuação mais ativa do magistrado em prol de um devido
processo justo a serviço da tutela efetiva dos direitos.
5.5. Princípios comuns ao direito processual civil e ao direito
processual do trabalho
Tendo em vista que os princípios jurídicos dão coerência lógica e teleológica
ao ordenamento jurídico, investigaremos, a seguir, com os olhos voltados para a
teoria geral do processo, alguns princípios, previstos ou não em lei, que
tradicionalmente transitam de forma interativa nos domínios do direito
processual civil e do direito processual do trabalho.
Os princípios a seguir arrolados encontram inspiração no direito processual
constitucional ou no direito constitucional processual, já estudados nas epígrafes
acima.
5.5.1. Princípio dispositivo ou da demanda
Na esfera civil, o poder de provocar a tutela jurisdicional foi entregue à
própria parte interessada, isto é, àquela que se sentisse atingida pelo
comportamento alheio, podendo ela vir a juízo apresentar a sua pretensão, se
quiser ou da forma que lhe aprouver, assim como dela desistir, respeitadas as
exigências legais.
Trata-se, pois, de um direito-liberdade-faculdade da pessoa que se sente lesada
ou ameaçada em relação a um direito de que se diz titular.
O princípio dispositivo, também chamado de princípio da demanda ou da
inércia da jurisdição, é emanação do princípio da livre-iniciativa. Sua residência
legal estava no art. 2º do CPC/73, sendo reafirmado no art. 2º do CPC: “O
processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial,
salvo as exceções previstas em lei”. O princípio em tela também pode ser
extraído dos arts. 141 e 492 do CPC.
Vale dizer, o nosso sistema adota o apotegma romano nemo judex sine actore,
segundo o qual sem autor não há jurisdição, cabendo aqui a observação de Ada
Pellegrini Grinover, para quem o sistema confere às pessoas o poder dispositivo,
sendo certo que “esse poder dispositivo é quase absoluto, no processo civil,
mercê da natureza do direito material que se visa atuar. Sofre limitação quando o
direito material é de natureza indisponível, por prevalecer o interesse público
46
sobre o privado” .
No direito processual do trabalho, há algumas exceções ao princípio
dispositivo, uma vez que neste setor especializado há previsão, por exemplo, da
reclamação trabalhista instaurada por ofício oriundo da Superintendência
Regional do Trabalho – SRT (CLT, art. 39), da execução promovida ex officio
pelo juiz (CLT, art. 878) e da “instauração da instância” pelo juiz presidente do
Tribunal, nos casos de greve (CLT, art. 856). Sobre esta última norma
consolidada, parece-nos que ela já se mostrava incompatível com a redação
original do art. 114, §§ 2º e 3º, da CF, entendimento que se reforça pela sua
novel redação introduzida pela EC n. 45/2004.
5.5.2. Princípio inquisitivo ou do impulso oficial
O princípio inquisitivo está consagrado expressamente no art. 2º do CPC, que
dispõe textualmente: “O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve
por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei” (grifos nossos).
Após o ajuizamento da ação, o juiz assume o dever de prestar a jurisdição de
acordo com os poderes que o ordenamento jurídico lhe confere.
No que concerne à imbricação deste princípio com o princípio dispositivo, é
importante a advertência de Ada Pellegrini Grinover, para quem “o processo
civil não é mais eminentemente dispositivo como era outrora; impera, portanto,
no campo processual penal, como no campo processual civil, o princípio da livre
investigação das provas, embora com doses maiores de dispositividade no
47
processo civil” .
O princípio do impulso oficial também é extraído do art. 485, II e III, do CPC,
que permite a extinção do processo, sem resolução do mérito, por contumácia
das partes.
No que concerne ao direito processual do trabalho, o art. 765 da CLT
estabelece que “os Juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na
direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo
determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas”.
Além disso, há algumas hipóteses que operacionalizam o princípio inquisitivo
no direito processual do trabalho, a saber: a reclamação trabalhista instaurada
pelo juiz do trabalho em virtude de expediente (processo administrativo) oriundo
da Superintendência Regional do Trabalho (CLT, art. 39) e a execução
promovida ex officio (CLT, art. 878).
Além disso, o art. 139, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX e X, do CPC enaltece o
princípio inquisitivo, sendo estas regras aplicáveis supletiva e subsidiariamente
ao processo do trabalho pela existência de lacuna e ausência de
incompatibilidade com a principiologia do processo laboral (CLT, art. 769; CPC,
art. 15).
5.5.3. Princípio da instrumentalidade
O processo não é um fim em si mesmo. Ao revés, o processo deve ser
instrumento de Justiça. É por meio dele que o Estado presta a jurisdição,
dirimindo conflitos, promovendo a pacificação e a segurança aos
jurisdicionados.
Nesse sentido, é que se diz que o processo deve estar a serviço do direito
material, e não o contrário. O processo é meio, é instrumento, é método de
realização do direito material.
Princípio da instrumentalidade, também chamado de princípio da finalidade,
exsurge quando a lei prescreve que o ato processual deve ser realizado de
determinada forma, sem cominar nulidade, e o juiz considerará válido o ato se,
realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade.
O CPC, em seus arts. 180 e 277, consagra o princípio da instrumentalidade.
Essas normas são aplicáveis subsidiária e supletivamente ao direito processual
do trabalho, por força do art. 769 da CLT e do art. 15 do CPC.
5.5.4. Princípio da impugnação especificada
Corolário do contraditório, o princípio da impugnação especificada está
previsto no art. 341 do CPC, segundo o qual: “Incumbe também ao réu
manifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição
inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas”.
A inobservância do princípio da impugnação especificada deságua na
presunção de veracidade dos fatos não impugnados.
É preciso advertir, no entanto, que esse ônus atribuído ao réu não ocorrerá se:
I – não for admissível, a seu respeito, a confissão; II – a petição inicial não
estiver acompanhada de instrumento que a lei considerar da substância do ato;
III – estiver em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto.
É importante ressaltar que, nos termos do parágrafo único do art. 341 do CPC:
“O ônus da impugnação especificada dos fatos não se aplica ao defensor público,
ao advogado dativo e ao curador especial”.
Há cizânia doutrinária quanto à incidência do princípio da impugnação
específica nos domínios do processo do trabalho. O maior argumento invocado
reside na permissão do jus postulandi (CLT, art. 791), que, em princípio,
impediria a aplicação supletiva do art. 341 do CPC.
Cremos, porém, que a razão está com a corrente que admite a aplicação
subsidiária da norma do direito processual civil.
Como bem salienta Júlio César Bebber, em obra de fôlego, “a incumbência
destinada ao réu para que se manifeste precisamente quanto às alegações do
autor são de ordem lógica e de bom senso, não devendo ser confundida com
48
questões técnicas” .
No mesmo sentido, Wagner Giglio pontifica: “A resposta deve examinar os
fatos com exaustão e fazer-se acompanhar da prova documental. A defesa por
negação geral não produz efeito, correspondendo à inexistência de
49
contestação” .
5.5.5. Princípio da estabilidade da lide
O princípio da estabilidade da lide informa que se o autor já propôs sua
demanda e deduziu os seus pedidos, e se o réu já foi citado para sobre eles se
pronunciar, não poderá mais o autor modificar sua pretensão sem anuência do
réu e, depois de ultrapassado o momento da defesa, nem mesmo com o
consentimento de ambas as partes isso será possível.
O princípio da estabilidade da lide ou da demanda está consagrado no plano
subjetivo e no plano objetivo.
O art. 108 do CPC consagra o critério subjetivo da estabilização da demanda.
No plano objetivo, o princípio em tela está inscrito no art. 329 do CPC,
segundo o qual o autor poderá:
I – até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento
do réu;
II – até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento
do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo
de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo à reconvenção e à respectiva causa de pedir.
No que tange à aplicação do princípio da estabilização da demanda no
processo do trabalho, convém lembrar que não há o instituto do saneamento
processual, razão pela qual, a nosso ver, embora lacunoso o texto obreiro, a
aplicação supletiva do CPC deve merecer a necessária adaptação quando
transplantada para o processo especializado.
Assim, tendo em vista que no processo do trabalho a tentativa de conciliação é
realizada antes mesmo da apresentação da defesa do réu (CLT, arts. 846 e 847),
seria ilógico não permitir a alteração (ou aditamento) do pedido ou da causa de
pedir contidos na petição inicial, desde que – é claro – isso não implique
violação aos princípios do contraditório, da economia e da celeridade, os quais,
segundo pensamos, não serão olvidados se o juiz conceder prazo ao réu para se
pronunciar sobre as alterações ou aditamentos pretendidos pelo autor.
Os arts. 338 e 339 do CPC permitem, em determinados casos, a alteração da
petição inicial para substituição do réu, o que, a rigor, já evidencia uma certa
relativização do princípio da estabilização da lide. Tais dispositivos podem ser
aplicados no processo do trabalho (CLT, art. 769), desde que o autor não sofra as
sanções pecuniárias previstas no parágrafo único do art. 338 do CPC.
5.5.6. Princípio da eventualidade
As partes devem alegar, na oportunidade própria prevista em lei, ou por
ocasião do exercício de faculdade processual, todas as matérias de defesa ou de
seu interesse. É o princípio da eventualidade, que está inserto no art. 336 do
CPC, in verbis: “Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa,
expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e
especificando as provas que pretende produzir”.
Discute-se a aplicação do princípio da eventualidade, que é muito próximo do
princípio da impugnação especificada, nos sítios do processo trabalhista. Os
argumentos pró e contra são praticamente os mesmos já apontados no item 5.5.4,
supra.
Ademais, se admitirmos a aplicação do princípio da impugnação especificada
no processo do trabalho, pensamos ser de todo conveniente, tendo em vista a
lacuna normativa do texto obreiro (CLT, art. 769), também admitirmos a adoção
do princípio da eventualidade, que não é incompatível com a principiologia da
processualística laboral. Todavia, é preciso que o juiz do trabalho aja com
razoabilidade e necessária prudência (CPC, art. 8º). Para tanto, deverá o
magistrado, expressamente, orientar ou advertir as partes no sentido de que
deverão produzir todas as suas alegações no momento oportuno, sob pena de
serem consideradas verdadeiras as alegações do autor (ou do réu) não
impugnadas tempestivamente.
5.5.7. Princípio da preclusão
50
O princípio da preclusão decorre do princípio dispositivo e da própria
logicidade do processo, que é o “andar para a frente”, sem retornos a etapas ou
momentos processuais já ultrapassados.
Este princípio, que já era adotado no CPC/73, é reafirmado no art. 278 do
CPC, segundo o qual “a nulidade dos atos deve ser alegada na primeira
oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão”.
O parágrafo único do referido artigo excepciona a incidência da regra da
preclusão, ao dispor que: “Não se aplica o disposto no caput às nulidades que o
juiz deva decretar de ofício, nem prevalece a preclusão provando a parte
legítimo impedimento”.
O princípio em tela também está previsto no art. 507 do CPC, segundo o qual
“é vedado à parte discutir no processo as questões já decididas a cujo respeito se
operou a preclusão”. Essa norma tem por destinatários todos os que figuram no
processo, inclusive o juiz, na medida em que este não poderá examinar questão
já superada, sendo-lhe permitido, no entanto, a qualquer momento, antes da
prolação da sentença, conhecer de questão de ordem pública, tal como preveem
os arts. 485, § 3º, 337, § 5º, e 342, II, do CPC.
No âmbito do direito processual do trabalho, o princípio da preclusão
encontra-se implícito no art. 795 da CLT, que diz: “As nulidades não serão
declaradas senão mediante provocação das partes, as quais deverão argui-las à
primeira vez em que tiverem de falar em audiência ou nos autos”.
Tem-se entendido que, em virtude da audiência una legalmente prevista no
processo do trabalho, e, também, em razão da inexistência de recurso próprio
para atacar imediatamente as decisões interlocutórias, o prazo para a parte
manifestar sua irresignação – o chamado protesto nos autos – pode ser feito até
as razões finais.
Não há como negar a incidência do princípio da preclusão no direito
processual do trabalho, pois a própria CLT, no seu art. 879, §§ 2º e 3º, o prevê
expressamente.
Analisaremos, a seguir, a classificação que vem sendo adotada pela doutrina a
respeito da preclusão.
5.5.7.1. Preclusão consumativa
É a que ocorre com a própria prática do ato processual, isto é, uma vez
praticado o ato, não poderá a parte fazê-lo novamente (exemplo: interposição
tempestiva do recurso ordinário impede que outro recurso ordinário seja
interposto contra a mesma decisão).
5.5.7.2. Preclusão temporal
É a mais conhecida. Opera-se a preclusão temporal quando a parte não pratica
um ato processual no prazo legalmente previsto, ou quando o pratica
serodiamente (exemplo: perda do prazo para interposição de um recurso).
5.5.7.3. Preclusão lógica
É a perda da prática de um ato, por estar em contradição com atos anteriores,
ofendendo a lógica do comportamento das partes. A preclusão lógica, portanto,
ocorre quando a parte pratica um ato incompatível com o já praticado (exemplos:
CLT, art. 806, que veda à “parte interessada suscitar conflitos de jurisdição
quando já houver oposto na causa exceção de incompetência”, ou seja, se a parte
interessada excepcionou a incompetência, implica preclusão lógica para sua
pretensão posterior de suscitar o conflito de competência; em vez de recorrer da
sentença, a parte simplesmente cumpre o comando nela prescrito; este ato
implica preclusão lógica do direito de recorrer).
5.5.7.4. Preclusão ordinatória
É a perda da possibilidade de praticar o ato (ou exercer faculdade), se
precedido do exercício irregular da mesma possibilidade. Em outros termos, a
validade de um ato posterior depende da prática de um ato anterior (exemplos:
não podem ser recebidos os embargos do devedor antes de garantido o juízo pela
penhora, não será conhecido o recurso se não houve o pagamento das custas).
5.5.7.5. Preclusão máxima
Também conhecida por coisa julgada, consiste na perda do prazo para a
interposição de recurso contra sentença que transitou em julgado com ou sem
resolução de mérito. Por este princípio, é defeso à parte pleitear, e ao juiz
decidir, no mesmo processo em que houve a preclusão máxima (coisa julgada).
A coisa julgada constitui uma garantia fundamental do cidadão e encontra
fundamento na necessidade de segurança das relações jurídicas processuais,
impedindo que no mesmo processo sejam rediscutidas questões já decididas por
sentença não mais sujeita a recurso.
O direito processual do trabalho agasalha, expressamente, o princípio da
preclusão máxima, como se infere do art. 836 da CLT.
5.5.7.6. Preclusão pro judicato
O art. 836 da CLT veda ao juiz conhecer de questões já decididas, salvo nas
hipóteses de interposição de embargos de declaração ou de ajuizamento de ação
rescisória.
Outra exceção ao princípio da preclusão pro judicato no processo do trabalho
é extraída do juízo de admissibilidade do Recurso de Revista, que é feito pelo
órgão a quo e pelo ad quem. O pronunciamento do primeiro não gera preclusão
pro judicato para o segundo, que tem o poder-dever de proceder a novo exame
dos pressupostos de admissibilidade do recurso independentemente de
provocação da parte contrária.
5.5.8. Princípio da economia processual
Trata-se de princípio aplicável em todos os ramos do direito processual, e
consiste em obter da prestação jurisdicional o máximo de resultado com o
mínimo de atos processuais, evitando-se dispêndios desnecessários de tempo e
dinheiro para os jurisdicionados.
O princípio da economia processual autoriza o juiz a aproveitar ao máximo os
atos processuais já praticados, tal como prevê, por exemplo, o § 3º do art. 1.013
do CPC, que permite ao tribunal decidir desde logo o mérito quando, em alguns
casos, reformar ou anular a sentença.
5.5.9. Princípio da perpetuatio jurisdictionis
Melhor seria falar não em princípio da perpetuação da jurisdição, mas, sim,
em princípio da perpetuação da competência. Este princípio, que já estava
previsto no art. 87 do CPC/73, foi mantido pelo art. 43 do CPC, segundo o qual a
competência é fixada no momento em que a ação é proposta, sendo irrelevantes
as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo
quando suprimirem o órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta.
Este princípio é relativizado nos domínios dos processos coletivos, como se
infere do art. 98, § 2º, I, do CDC.
5.5.10. Princípio do ônus da prova
Este princípio já estava previsto no art. 333 do CPC/73, que diz: “O ônus da
prova incumbe: I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito; II – ao
réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito
do autor”.
O direito processual do trabalho consagrava-o na redação original do art. 818
da CLT, in verbis: “A prova das alegações incumbe à parte que as fizer”.
Modernamente, tem-se mitigado o rigor das normas acima transcritas, quando
o juiz, diante do caso concreto, verificar a existência de dificuldades para o
trabalhador se desincumbir do onus probandi. Daí o surgimento de um novo
princípio, que permite ao juiz inverter o ônus da prova de acordo com a aptidão
de quem se encontra em melhores condições de trazer a juízo a prova da verdade
real.
O próprio CDC, que, segundo pensamos, aceita a aplicação subsidiária na
espécie, admite a inversão do ônus da prova, como se depreende do seu art. 6º,
VIII, que prescreve, entre os direitos básicos do consumidor, a “facilitação da
defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor,
no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando
for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias da experiência”.
Ora, se é uma regra aplicável ao processo civil, cremos que, a par da omissão
do texto consolidado, não existe qualquer incompatibilidade na sua aplicação
supletória, porquanto em perfeita sintonia com a principiologia protetiva do
direito processual do trabalho (CLT, art. 769). Aliás, há nítida correlação social e
política entre trabalhadores e consumidores hipossuficientes.
Ademais, a jurisprudência trabalhista já trilhava a direção aqui proposta, como
se depreende da Súmula 212 do TST, segundo a qual “o ônus de provar o
término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o
despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de
emprego constitui presunção favorável ao empregado”.
Nas ações trabalhistas submetidas ao procedimento sumaríssimo, há franca
abertura para o juiz do trabalho operacionalizar a aplicação do princípio da
inversão do ônus da prova. Com efeito, diz o art. 852-D, da CLT, que o “juiz
dirigirá o processo com liberdade para determinar as provas a serem produzidas,
considerado o ônus probatório de cada litigante, podendo limitar ou excluir as
que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias, bem como para
apreciá-las e dar especial valor às regras de experiência comum ou técnica”.
O Novo Código de Processo Civil (art. 373, caput, I e II) mantém o princípio
da distribuição estática do ônus da prova previsto no CPC de 1973, mas inova,
substancialmente, ao permitir que “nos casos previstos em lei ou diante de
peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva
dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de
obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de
modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá
dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído”
(CPC, art. 373, § 1º). Vale dizer, o CPC consagra, também, o princípio da
distribuição dinâmica da carga probatória, sendo este novel princípio aplicável
supletiva e subsidiariamente ao processo do trabalho em função da lacuna da
legislação processual obreira, desde que o órgão julgador observe a situação de
hipossuficiência da parte e as peculiaridades do caso concreto.
O novel art. 818 da CLT, com redação dada pela Lei n. 13.467/2017 e
recebendo influência do CPC, passou a dispor expressamente sobre o ônus da
prova no processo do trabalho, inclusive com a possibilidade de distribuição
dinâmica do encargo probatório.
Voltaremos a falar sobre ônus da prova no Capítulo XV, item 5.
5.5.11. Princípio da oralidade
Este princípio não encontra residência em nenhuma norma expressa do CPC
ou da CLT. A rigor, ele se exterioriza interagindo com outros quatro princípios: I
– princípio da imediatidade; II – princípio da identidade física do juiz; III –
princípio da concentração; e IV – princípio da irrecorribilidade imediata das
decisões interlocutórias.
Com a instituição dos chamados Juizados Especiais, o princípio da oralidade
passou a ter um papel de destaque no direito processual civil, que, finalmente,
reconheceu que os resultados, a eficácia do processo e a efetividade da prestação
jurisdicional encontram forte aliado na discussão oral da causa, na presença do
magistrado, a fim de que este possa sopesar a validez e a confiabilidade dos
elementos probatórios nos autos.
No direito processual do trabalho, o princípio da oralidade encontra solo fértil
para a sua aplicação, a começar pela previsão expressa da chamada reclamação
verbal (petição inicial verbal), de que cuida o art. 840, § 2º, da CLT, ou a
possibilidade de defesa oral do reclamado (CLT, art. 847, caput).
Outra manifestação do princípio da oralidade na seara laboral se revela em
audiência, oportunidade em que as partes se dirigem direta e oralmente ao
magistrado, propiciando diversos debates orais (requerimentos, contraditas,
razões finais, protestos etc.), sendo certo que, também oralmente, o magistrado,
via de regra, resolve as questões surgidas em audiência, mediante registro em
ata.
Pode-se dizer, ainda, que, nas chamadas “ações trabalhistas de alçada”,
disciplinadas pela Lei n. 5.584/70 (art. 2º, § 3º), há o nítido predomínio da
palavra falada sobre a escrita.
5.5.11.1. Princípio da imediatidade ou da imediação
O princípio da imediatidade ou da imediação significa que o juiz da causa está
obrigado ao contato direto com as partes e a prova testemunhal ou pericial, com
a própria coisa litigiosa ou com terceiros, para que possa obter os elementos
necessários ao esclarecimento dos fatos alegados pelas partes, e, em
consequência, decidir fundamentadamente o processo.
A base legal de sua inserção no direito processual do trabalho está no art. 820
da CLT, segundo o qual as partes e testemunhas serão inquiridas pelo juiz ou
presidente, podendo ser reinquiridas, por seu intermédio, a requerimento das
partes, seus representantes ou advogados.
O princípio da imediatidade é aplicável, com maior ênfase, no direito
processual do trabalho, em razão da larga incidência da prova oral.
Este princípio estava previsto no CPC de 1973 e também comparece, de
roupagem nova, nos arts. 139, VIII, e 481 do CPC. O art. 459 do CPC, ao dispor
que as “perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha,
começando pela que a arrolou”, relativiza o princípio da imediatidade. O art. 11
da IN n. 39 do TST, no entanto, dispõe que: “Não se aplica ao Processo do
Trabalho a norma do art. 459 do CPC no que permite a inquirição direta das
testemunhas pela parte (CLT, art. 820)”.
5.5.11.2. Princípio da identidade física do juiz
O princípio da identidade física do juiz estava previsto no art. 132 do CPC/73,
in verbis: “O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide,
salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido
ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor”.
Este princípio, segundo entendimento adotado pela Súmula 136 do TST,
mesmo depois da extinção da representação classista nas Varas do Trabalho pela
EC n. 24/99, não foi aplicado durante muito tempo no direito processual do
trabalho. Em 2012, porém, o TST editou a Resolução n. 185, cancelando a
Súmula 136, com o que o princípio da identidade física passou a ser aplicado nas
Varas do Trabalho.
O CPC atual não contém nenhum dispositivo semelhante ao art. 132 do CPC
revogado, o que certamente reacenderá as discussões a respeito da própria
existência do princípio da identidade física do juiz nas Varas do Trabalho.
Parece-nos, realmente, que o princípio da identidade física foi extinto na
51
primeira instância .
Nos tribunais, no entanto, o princípio da identidade física é aplicável ao
Relator do processo, uma vez que a simples distribuição do recurso (ou da ação
originária) já vincula esse órgão julgador nos tribunais.
5.5.11.3. Princípio da concentração
O princípio da concentração decorre da aplicação conjunta de vários
princípios procedimentais destinados a regulamentar e orientar a apuração de
provas e a decisão judicial em uma única audiência. Daí o termo “concentração”.
No processo civil, estava previsto nos arts. 331 e 450 do CPC/73 e reaparece
nos arts. 334, 357 e 358 do CPC.
No que concerne ao processo do trabalho, o princípio da concentração está
explícito nos arts. 849 e 852-C da CLT, in verbis:
“Art. 849. A audiência de julgamento será contínua; mas se não for possível, por motivo de força
maior, concluí-la no mesmo dia, o juiz ou presidente marcará a sua continuação para a primeira
desimpedida, independentemente de nova notificação”.
“Art. 852-C. As demandas sujeitas a rito sumaríssimo serão instruídas e julgadas em audiência única,
sob a direção de juiz presidente ou substituto, que poderá ser convocado para atuar simultaneamente
com o titular”.
5.5.11.4. Princípio da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias
No direito processual civil, o princípio em tela encontrava fundamento na
conjugação dos arts. 522, caput, e 497, segunda parte, do CPC/73. O CPC, em
seus arts. 995 e 1.015, restringiu sobremaneira a recorribilidade imediata das
decisões interlocutórias, na medida em que só são agraváveis as decisões
interlocutórias expressa e legalmente previstas.
A base legal do princípio em estudo no direito processual do trabalho está no
art. 893, § 1º, da CLT, segundo o qual “os incidentes do processo serão
resolvidos pelo próprio Juízo ou Tribunal, admitindo-se a apreciação do
merecimento das decisões interlocutórias somente em recurso da decisão
definitiva”.
Vê-se que, na seara laboral, o princípio da irrecorribilidade imediata das
decisões interlocutórias tem aplicabilidade mais enfática, na medida em que a
apreciação das impugnações contra as decisões interlocutórias somente será
admitida em recursos interpostos contra decisão final (sentença, acórdão e
algumas decisões interlocutórias), sendo certo que os arts. 995 e 1.015 do CPC,
ao que nos parece, não são aplicáveis no processo do trabalho, tanto pela
inexistência de lacunas normativas, ontológicas ou axiológicas neste setor
especializado quanto pela incompatibilidade com o princípio da celeridade que
52
informa o processo do trabalho .
5.5.12. Princípio da boa-fé processual
Trata-se de princípio que está intimamente ligado ao princípio da dignidade da
pessoa humana e a um dos objetivos fundamentais da República,
consubstanciado no art. 3º, I, da CF, qual seja, o de “construir uma sociedade
livre, justa e solidária”.
Também chamado de princípio da probidade ou da lealdade, o princípio da
boa-fé processual, que era tratado como dever das partes não proceder com má-
fé, está agora consignado expressamente no art. 5º do CPC (“Aquele que de
qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-
fé”) e reproduzido nos arts. 79, 80 e 81 do mesmo diploma legal.
O princípio da boa-fé processual, portanto, que também constitui um
desdobramento do princípio da boa-fé objetiva do Código Civil, tem por escopo
impor aos litigantes uma conduta ética e de respeito mútuo, que possa ensejar o
curso natural do processo e levá-lo à consecução de seus objetivos: a prestação
jurisdicional de modo célere, adequado, tempestivo e justo.
Havia lacuna normativa na CLT e não víamos qualquer incompatibilidade na
aplicação subsidiária das regras do CPC ao processo do trabalho, sendo certo
que a jurisprudência especializada já vinha admitindo a aplicação do princípio
ora focalizado, conforme se infere dos seguintes julgados:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. FATO NOVO. INEXISTÊNCIA. ARGUIÇÃO DE INCIDENTE
MANIFESTAMENTE INFUNDADO. CONFIGURAÇÃO DE MÁ-FÉ PROCESSUAL. A
interposição de embargos de declaração, a pretexto de apreciação de documento novo, o qual, na
realidade, se refere a fato pretérito, portanto anterior ao julgamento do recurso de revista, evidencia a
má-fé processual do embargante, ao pretender alterar a realidade processual, passível de repreensão
com multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, devidamente corrigido, a reverter ao
reclamante, nos termos dos arts. 17, II, VI e VII, e 18, caput, do Código de Processo Civil. Embargos
de declaração a que se nega provimento, com aplicação de multa (TST-ED-RR 177000-
03.2007.5.09.0022, Rel. Min. Walmir Oliveira da Costa, j. 26-6-2013, 1ª T., DEJT 28-6-2013).
MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONFISSÃO AUTORA QUANTO AO PEDIDO DE
DEMISSÃO. MÁ-FÉ PROCESSUAL CONFIGURADA. A reclamante alegou inicialmente ter sido
dispensada sem justa causa e que “a reclamada, agindo de má-fé processual, com intuito único de
burlar a legislação obreira com relação ao pagamento dos direitos da autora, impôs que a mesma
assinasse um pedido de demissão” (item 3 da exordial). No entanto, em audiência confessou que foi
sua a iniciativa de romper o contrato de trabalho. Má-fé configurada, com a aplicação de multa à
autora. Recurso da reclamante a que se nega provimento (TRT-2 – RO 00028618120125020090, Rel.
Des. Cíntia Táffari, j. 26-11-2013, 13ª T., DEJT 4-12-2013).
Parece-nos que o princípio da boa-fé abarca tanto a boa-fé subjetiva quanto a
boa-fé objetiva. Aquela relaciona-se à esfera psicológica do ser humano, mais
precisamente a processos internos da psique da pessoa (representações mentais,
intenções e resoluções) para a prática dos atos processuais, sendo, portanto, de
difícil aferição. Esta, ou seja, a boa-fé objetiva, é extraída externamente das
ações e condutas humanas.
Noutro falar, a boa-fé objetiva impõe a todos os que participam do processo
um padrão de comportamento ético e objetivo de honestidade, diligência e
confiança, exigindo, ainda, um estado de cortesia, urbanidade e respeitabilidade
recíprocas .53

5.5.12.1. Dano Processual


A Lei n. 13.467/2017 inseriu na CLT os arts. 793-A a 793-D, que tratam da
responsabilidade por dano processual, nos seguintes termos:
Art. 793-A. Responde por perdas e danos aquele que litigar de má-fé como reclamante, reclamado ou
interveniente.
Art. 793-B. Considera-se litigante de má-fé aquele que:
I – deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;
II – alterar a verdade dos fatos;
III – usar do processo para conseguir objetivo ilegal;
IV – opuser resistência injustificada ao andamento do processo;
V – proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;
VI – provocar incidente manifestamente infundado;
VII – interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.
Art. 793-C. De ofício ou a requerimento, o juízo condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que
deverá ser superior a 1% (um por cento) e inferior a 10% (dez por cento) do valor corrigido da causa,
a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios
e com todas as despesas que efetuou.
§ 1º Quando forem dois ou mais os litigantes de má-fé, o juízo condenará cada um na proporção de
seu respectivo interesse na causa ou solidariamente aqueles que se coligaram para lesar a parte
contrária.
§ 2º Quando o valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa poderá ser fixada em até duas
vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
§ 3º O valor da indenização será fixado pelo juízo ou, caso não seja possível mensurá-lo, liquidado
por arbitramento ou pelo procedimento comum, nos próprios autos.
Art. 793-D. Aplica-se a multa prevista no art. 793-C desta Consolidação à testemunha que
intencionalmente alterar a verdade dos fatos ou omitir fatos essenciais ao julgamento da causa.
Parágrafo único. A execução da multa prevista neste artigo dar-se-á nos mesmos autos.
O princípio da boa-fé, portanto, deve ser observado por “todos os sujeitos do
processo”, e não apenas os sujeitos da lide. Vale dizer, o princípio sob exame
vincula não somente as partes e os terceiros que participam como litigantes da
relação jurídica processual, como também o próprio magistrado, o Ministério
Público (como parte ou custos legis), a Defensoria Pública, os advogados, os
auxiliares da justiça, as testemunhas, os intérpretes, os peritos etc.
O art. 793-A da CLT, no entanto, dispõe que somente responderá por dano
processual o reclamante, o reclamado e o interveniente que litigarem de má-fé.
Já o art. 793-D da CLT prevê que responderá por dano processual a testemunha
que intencionalmente alterar a verdade dos fatos ou omitir fatos essenciais ao
julgamento da causa. As multas aplicadas a título de dano processual serão
cobradas nos próprios autos em que se verificou a prática do ato contrário à boa-
fé processual.
No que concerne à eficácia temporal dos dispositivos supracitados, os arts. 7º
a 10 da IN n. 41/2018 do TST dispõem:
Art. 7º Os arts. 793-A, 793-B e 793-C, § 1º, da CLT têm aplicação autônoma e imediata.
Art. 8º A condenação de que trata o art. 793-C, caput, da CLT, aplica-se apenas às ações ajuizadas a
partir de 11 de novembro de 2017 (Lei n. 13.467/2017).
Art. 9º O art. 793-C, §§ 2º e 3º, da CLT tem aplicação apenas nas ações ajuizadas a partir de 11 de
novembro de 2017 (Lei n. 13.467/2017).
Art. 10. O disposto no caput do art. 793-D será aplicável às ações ajuizadas a partir de 11 de
novembro de 2017 (Lei n. 13.467/2017).
Parágrafo único. Após a colheita da prova oral, a aplicação de multa à testemunha dar-se-á na
sentença e será precedida de instauração de incidente mediante o qual o juiz indicará o ponto ou os
pontos controvertidos no depoimento, assegurados o contraditório, a defesa, com os meios a ela
inerentes, além de possibilitar a retratação.
5.5.13. Princípio da cooperação ou colaboração
Como já adiantamos em linhas pretéritas, o principal objetivo do Estado
Democrático de Direito não é somente positivar os direitos fundamentais,
especialmente os sociais, como também, e principalmente, garanti-los. Daí a
importância do Poder Judiciário (e do processo) na promoção da defesa dos
direitos fundamentais, especialmente por meio do princípio da cooperação que,
segundo lição de Fredie Didier Jr.,
orienta o magistrado a tomar uma posição de agente-colaborador do processo, de participante ativo
do contraditório e não mais a de um mero fiscal de regras. Essa participação não se resumiria à
ampliação dos seus poderes instrutórios ou de efetivação de decisões judiciais (arts. 131 e 461, § 5º,
do CPC). O magistrado deveria adotar uma postura de diálogo com as partes e com os demais
sujeitos do processo: esclarecendo suas dúvidas, pedindo esclarecimentos quando estiver com
dúvidas e, ainda, dando orientações necessárias quando for o caso. Encara-se o processo como
produto de atividade cooperativa: cada qual com as suas funções, mas todos com o objetivo comum,
que é a prolação do ato final (...). O princípio da cooperação gera os seguintes deveres para o
magistrado (seus três aspectos): a) dever de esclarecimento; b) dever de consultar; c) dever de
54
prevenir .
O art. 6º do CPC reconhece expressamente o princípio em tela ao prescrever
que: “Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se
obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.
O princípio da cooperação vincula-se ao princípio da boa-fé previsto no art. 5º
do CPC e já analisado no item precedente.
5.5.14. Princípio da vedação da decisão surpresa
O princípio da vedação da decisão surpresa é expressamente extraído do art.
10 do CPC, segundo o qual:
O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual
não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual
deva decidir de ofício.
O princípio em tela encontra suporte no direito fundamental de participação
do cidadão na Administração Pública da Justiça e se conexiona intimamente com
o princípio do contraditório, na medida em que impõe ao órgão julgador, em
todos os graus de jurisdição, o dever de ouvir as partes sobre as decisões
adotadas, ainda que se trate de matéria conhecível de ofício.
Trata-se de alteração relevante em relação ao CPC de 1973, que implicará
mudanças na prática das decisões dos juízes e tribunais, com repercussões no
processo do trabalho, em função da lacuna do texto consolidado.
A título de exemplos, à luz do princípio da vedação da decisão surpresa, o
juiz, sem antes intimar previamente as partes para que se manifestem nos autos,
não poderá: indeferir a petição inicial por inépcia, pronunciar de ofício a
prescrição ou a decadência etc.
Ficam, porém, excepcionadas da aplicação do princípio da vedação da decisão
surpresa as hipóteses expressamente previstas no parágrafo único do art. 9º do
CPC.
Para concluir este tópico, é importante lembrar que o art. 4º da IN n. 39/2016
do TST (de suspeitável inconstitucionalidade, segundo a Anamatra na ADI
5.516) manda aplicar ao Processo do Trabalho as normas do CPC que regulam o
princípio do contraditório, em especial os arts. 9º e 10, no que vedam a decisão
surpresa. Interessante notar que os §§ 1º e 2º do referido art. 4º da IN n. 39
definem quando ocorre “decisão surpresa”, in verbis:
Art. 4º (...)
§ 1º Entende-se por “decisão surpresa” a que, no julgamento final do mérito da causa, em qualquer
grau de jurisdição, aplicar fundamento jurídico ou embasar-se em fato não submetido à audiência
prévia de uma ou de ambas as partes.
§ 2º Não se considera “decisão surpresa” a que, à luz do ordenamento jurídico nacional e dos
princípios que informam o Direito Processual do Trabalho, as partes tinham obrigação de prever,
concernente às condições da ação, aos pressupostos de admissibilidade de recurso e aos pressupostos
processuais, salvo disposição legal expressa em contrário.
5.5.15. Princípio da primazia da decisão de mérito
O princípio da primazia da decisão de mérito é extraído dos seguintes
dispositivos do CPC:
a) art. 6º, in fine, o qual estabelece o dever de todos os sujeitos do processo para que se obtenha, em
tempo razoável, “decisão de mérito justa e efetiva”;
b) art. 317, que determina ao juiz, antes de proferir decisão sem resolução de mérito, “conceder à
parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício”;
c) art. 321, segundo o qual o juiz deverá, antes de indeferir a petição inicial, conceder prazo ao autor
para que a emende ou a complete, “indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado”;
d) art. 488, que enaltece, desde que possível, a resolução do mérito sempre que for favorável à parte a
quem aproveitaria eventual sentença terminativa.
Dessa forma, o princípio da primazia da decisão de mérito, que é aplicável ao
processo do trabalho (CLT, art. 769; CPC, art. 15), informa que somente em
situações excepcionais e quando não for possível a correção de vícios ou
irregularidades o juiz, depois de conceder oportunidade às partes, poderá
extinguir o processo sem resolução de mérito.
5.5.16. Princípio da observância da ordem cronológica de conclusão de
processos
O princípio da observância da ordem cronológica de conclusão de processos
para proferir sentença ou acórdão está previsto expressamente no art. 12, caput,
do CPC e constitui desdobramento de dois outros princípios: igualdade e
publicidade.
Para concretizar o princípio em exame, os órgãos jurisdicionais deverão
elaborar lista de processos aptos a julgamento, que deverá estar
permanentemente à disposição para consulta pública em cartório e na rede
mundial de computadores.
Nos termos do § 6º do art. 12 do CPC, ocupará o primeiro lugar na lista o
processo que:
I – tiver sua sentença ou acórdão anulado, salvo quando houver necessidade de realização de
diligência ou de complementação da instrução;
II – se enquadrar na hipótese do art. 1.040, II, do CPC.
Não há obrigatoriedade de observância do princípio sob exame (CPC, art. 12,
§ 2º) quando se tratar de:
I – sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do
pedido;
II – julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de
casos repetitivos;
III – julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas;
IV – decisões proferidas com base nos arts. 485 e 932 do CPC;
V – julgamento de embargos de declaração;
VI – julgamento de agravo interno;
VII – preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça;
VIII – processos criminais, nos órgãos jurisdicionais que tenham competência penal;
IX – causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada.
Elaborada a lista dos processos aptos a julgamento, deverá ser respeitada a
ordem cronológica das conclusões entre as preferências legais. Após a inclusão
do processo na referida lista, o requerimento formulado pela parte não altera a
ordem cronológica para a decisão, exceto quando implicar a reabertura da
instrução ou a conversão do julgamento em diligência.
Decidido o requerimento previsto no § 4º do art. 12 do CPC, o processo
retornará à mesma posição em que anteriormente se encontrava na lista.
O princípio da observância da ordem cronológica para proferir sentença ou
acórdão, por estar em sintonia com os princípios da isonomia e publicidade,
deverá ser aplicado com razoabilidade e proporcionalidade tanto no processo
civil quanto no processo do trabalho. Nesse sentido, a Lei n. 13.256, de 4-2-
2016, alterou o art. 12 do CPC, passando a dispor que os “juízes e os tribunais
atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir
sentença ou acórdão”.
6. PRINCÍPIOS PECULIARES DO DIREITO PROCESSUAL DO
TRABALHO
Não há a desejável uniformidade entre os teóricos a respeito da existência de
princípios peculiares (ou próprios) do direito processual do trabalho. Alguns
entendem que os princípios do direito processual do trabalho são os mesmos do
direito processual civil, apenas ressaltando ênfase maior quando da aplicação de
alguns princípios procedimentais no processo laboral. Outros sustentam que
existem apenas dois ou três princípios próprios do direito processual do trabalho.
É de suma importância reconhecer e comprovar a existência, ou não, de
princípios próprios do direito processual do trabalho, pois isso constitui um dos
critérios para justificar a própria autonomia desse segmento da ciência
processual.
Cerramos fileira com a corrente doutrinária que sustenta a existência de
princípios próprios do direito processual do trabalho que o diferencia do direito
processual comum. Reconhecemos, porém, que a EC n. 45/2004, ao transferir
para a competência da Justiça do Trabalho outras demandas diversas das
oriundas da relação de emprego, e até mesmo relações entre empregadores e o
Estado, bem como entre sindicatos, acabou colocando em xeque a afirmação da
existência dos princípios específicos do processo do trabalho.
É preciso, contudo, atentar para a especialidade do direito processual do
trabalho, o qual se notabilizou pela efetivação dos direitos sociais
constitucionalmente assegurados aos trabalhadores subordinados. No momento
em que a especialidade do direito processual do trabalho é desfocada, corre-se o
risco de desmoronamento dos seus princípios, o que recomenda ao intérprete e
ao aplicador do novo texto constitucional redobrada cautela, pois a
“desestruturação dos princípios significa uma tentativa ignóbil de desmantelo do
aparato jurisdicional trabalhista, uma vez que sua atenuação reflete o
55
esfacelamento da Justiça do Trabalho” .
Reconhecemos, outrossim, que alguns princípios fundamentais do Novo
Código de Processo Civil deverão ser aplicados ao processo do trabalho por
meio da heterointegração desses dois subsistemas processuais.
Assim, parece-nos inegável que os princípios explícitos do art. 8º do CPC
devem ser aplicados ao processo do trabalho, seja pelas suas lacunas normativa,
axiológica ou ontológica, seja por guardarem rigorosa compatibilidade com a
sua principiologia peculiar.
Noutro dizer, também passam a ser princípios fundamentais do processo do
trabalho: a dignidade da pessoa humana, a razoabilidade, a proporcionalidade, a
legalidade, a impessoalidade, a publicidade e a eficiência.
Plasma-se do citado art. 8º do CPC que o legislador invocou princípios
fundamentais da própria Constituição (dignidade da pessoa humana e
razoabilidade) e princípios específicos da Administração Pública (legalidade,
publicidade e eficiência), de modo a considerar que a prestação jurisdicional
também passa a ser considerada um serviço público essencial e indispensável à
população e à realização dos direitos e deveres fundamentais.
Vale dizer, a prestação jurisdicional, por força do art. 8º do CPC, passará
definitivamente a observar os princípios regentes da Administração Pública, o
que, certamente, influenciará o próprio conceito de jurisdição, uma vez que esta,
além de ser função-dever-poder-atividade estatal de pacificar os conflitos sociais,
passará a ser também um serviço público a ser prestado com arrimo nos
princípios dispostos no art. 37, caput, da CF.
De tal arte, o magistrado, além das suas funções institucionais tradicionais
voltadas à prestação jurisdicional, também deverá atuar como um verdadeiro
administrador público da Justiça, um autêntico gestor público dos processos sob
sua responsabilidade.
Para tanto, haverá necessidade de formação continuada dos juízes, de modo a
propiciar-lhes capacitação em gestão:
a) de pessoas, a fim de que o “serviço público da justiça” seja prestado para
promover a dignidade humana tanto dos jurisdicionados (partes, terceiros,
advogados etc.) como também dos próprios servidores públicos do Judiciário e
demais auxiliares judiciários; e
b) de processos, pois estes deverão ser ordenados, disciplinados e
interpretados sob o enfoque dos princípios norteadores dos atos praticados pela
Administração Pública, quais sejam os princípios da legalidade, moralidade,
impessoalidade, publicidade e eficiência.
Passaremos, em seguida, a enumerar os princípios tradicionalmente peculiares
do direito processual do trabalho.
6.1. Princípio da proteção processual
56
Nas pegadas de Américo Plá Rodriguez , podemos dizer que o princípio da
proteção ou tutelar é peculiar tanto ao direito do trabalho quanto ao direito
processual do trabalho. Por meio dele, busca-se compensar a desigualdade
existente na realidade socioeconômica (entre empregado, geralmente o
reclamante, e empregador, via de regra o reclamado) com uma desigualdade
jurídica em sentido oposto.
57
Daí a razão pela qual Manoel Antonio Teixeira Filho advoga a existência, no
processo do trabalho, do princípio da correção da desigualdade, tendo em vista
a inferioridade de natureza econômica e técnica do trabalhador em relação ao
empregador.
No Estado Democrático de Direito, que tem como um dos seus objetivos a
redução das desigualdades sociais e regionais (CF, art. 3º, III), parece-nos que tal
redução é efetivada por meio da proteção jurídica da parte fraca tanto na relação
de direito material quanto na relação de direito processual.
O princípio da proteção processual, portanto, deriva da própria razão de ser do
processo do trabalho, o qual foi concebido para efetivar os direitos materiais
reconhecidos pelo Direito do Trabalho, sendo este ramo da árvore jurídica criado
exatamente para compensar ou reduzir a desigualdade real existente entre
empregado e empregador, naturais litigantes do processo laboral.
Sublinha a propósito o mexicano Enrique Alvarez del Castillo: “Restabelecer
e manter a verdadeira igualdade processual é um propósito fundamental do
58
direito processual do trabalho” no que é seguido por Mario Pasco, cuja reflexão
merece ser transcrita literalmente:
Lo dicho respecto del derecho sustantivo es plenamente válido para el procesal. Las desigualdades, el
desequilibrio, la posición preeminente del empleador frente al trabajador propios de la relación del
trabajo, se trasladan a la relación jurídico procesal, donde adquiren nuevas manifestaciones. Dentro
de las diferencias que se marcan entre la controversia común y la laboral, acaso la más evidente es la
múltiple desigualdad jurídica, económica y probatoria que separa a los contendientes en un litigio de
59
trabajo y que hacen de un – el empleador – la parte fuerte y del otro – el trabajador – la parte débil .
Entre os autores pátrios que reconhecem ser o princípio da proteção peculiar
ao processo do trabalho destaca-se Wagner D. Giglio, para quem,
embora muitas outras fossem necessárias, algumas normas processuais de proteção ao trabalhador já
existem, a comprovar o princípio protecionista. Assim, a gratuidade do processo, com isenção de
pagamento de custas e despesas, aproveita aos trabalhadores, mas não aos patrões; a assistência
judiciária gratuita é fornecida ao empregado, mas não ao empregador; a inversão do ônus da prova
por meio de presunções favorece o trabalhador, nunca ou raramente o empregador; o impulso
processual ex officio beneficia o empregado, já que o empregador, salvo raras exceções, é o réu,
60
demandado, e não aufere proveito da decisão: na melhor das hipóteses, deixa de perder .
Acrescentamos, ainda, que a ausência dos litigantes à audiência trabalhista
implica o arquivamento dos autos para o autor (geralmente, o empregado) e
revelia e confissão ficta para o réu (em regra, o empregador). Esse tratamento
legal diferenciado constitui a exteriorização do princípio de proteção ao
trabalhador (natural litigante no polo ativo da demanda) no âmbito do processo
laboral. É o que deflui do art. 844 da CLT, segundo o qual o “não
comparecimento do reclamante à audiência importa o arquivamento da
reclamação, e o não comparecimento do reclamado importa revelia, além de
confissão, quanto à matéria de fato”.
Na mesma esteira, Coqueijo Costa convida-nos à seguinte reflexão:
O processo não é um fim em si mesmo, mas instrumento de composição de lides, que garante
efetividade do direito material. E como este pode ter natureza diversa, o direito processual, por seu
61
caráter instrumental, deve saber adaptar-se a essa natureza diversa .
A desigualdade econômica, o desequilíbrio para a produção de provas, a
ausência de um sistema de proteção contra a despedida imotivada, o desemprego
estrutural e o desnível social e cultural entre empregado e empregador,
certamente, são realidades trasladadas para o processo do trabalho, sendo,
portanto, imprescindível a existência de um princípio de proteção ao trabalhador,
que é destinatário de direitos humanos sociais e fundamentais. Na verdade, o
princípio da proteção visa salvaguardar direitos sociais, cujos titulares são
juridicamente fracos e, por isso, dependem da intervenção do Estado-Juiz para o
restabelecimento dos postulados da liberdade e da igualdade material entre as
partes da relação jurídica processual.
Com efeito, a própria ideia de justiça deixa patente que “justo é tratar
desigualmente os desiguais, na mesma proporção em que se desigualam, e o
favorecimento é qualidade da lei, e não defeito do juiz, que deve aplicá-la com
objetividade, sem permitir que suas tendências pessoais influenciem seu
62
comportamento” .
A jurisprudência vem admitindo a aplicação do princípio da proteção no
processo do trabalho, como se vê dos seguintes arestos:
Da aplicação do Princípio da Proteção, que vigora no processo do trabalho, tem-se que toda prestação
de serviço traz, em si, a presunção (relativa) da subordinação, salvo demonstração cabal em
contrário, a cargo do empregador (TRT, 6ª R., RO 00027.2003.006.06.00-9, 1ª T., Rel. Juíza Valéria
Gondim Sampaio, j. 23-9-2003, unânime, DOE 25-10-2003).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. DESCABIMENTO. (...)
HONORÁRIOS PERICIAIS. SUCUMBÊNCIA PARCIAL. PROPORCIONALIDADE NO
PAGAMENTO. DESCABIMENTO. Na Justiça do Trabalho, em face do princípio da proteção do
trabalhador, não prevalece a regra do art. 21 do CPC. Sucumbente a Reclamada, ainda que apenas em
parte, no objeto da perícia, é sua a responsabilidade pelo pagamento integral dos honorários devidos
ao expert. Agravo de instrumento conhecido e desprovido (TST-AIRR 43385/2002-902-02-40, 3ª T.,
Rel. Min. Alberto Bresciani, j. 30-5-2007, DJU 22-6-2007).
REMESSA OFICIAL. DECRETO-LEI N. 779/69. LEI N. 10.352/2001. ART. 475, § 2º, DO CPC.
LIMITAÇÃO A 60 (SESSENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. APLICABILIDADE AO PROCESSO
DO TRABALHO. Aplica-se ao processo do trabalho as disposições constantes do § 2º do art. 475 do
CPC, inseridas pela Lei n. 10.352/2001, que dispensa a remessa oficial nas condenações de valor não
excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, tendo em vista a omissão existente na legislação
processual trabalhista, que não contém limitação relacionada ao valor da condenação e, também, em
face da compatibilidade com o processo laboral. Registre-se, ainda, que tal aplicabilidade vem ao
encontro dos princípios que influenciam ou orientam o processo do trabalho, principalmente os
princípios da proteção ao hipossuficiente, da razoabilidade, da celeridade e da economia processual.
Remessa oficial não conhecida (TRT, 23ª R., AI e Recurso Ordinário de Ofício n.
01284.2002.003.23.00-5, Rel. Juíza Maria Berenice, j. 2-12-2003, publ. 27-1-2004).
Todas essas considerações são aplicáveis na hipótese em que o processo do
trabalho se apresenta como instrumento de realização dos direitos sociais dos
trabalhadores previstos no ordenamento jurídico, tanto no plano constitucional
quanto no plano infraconstitucional.
Reconhecemos, não obstante, que a ampliação da competência da Justiça do
Trabalho para processar e julgar outras relações de trabalho (EC n. 45/2004),
bem como para as ações relativas à cobrança de multas administrativas e
contribuições previdenciárias, passa a exercer grande influência para o
enfraquecimento do princípio da proteção processual. Afinal, nas ações de
cobrança de multas impostas pelos órgãos da fiscalização do trabalho em que
figuram empregador, como réu, e União, como autora, ou nas ações de disputa
de representatividade de categoria entre dois sindicatos, indaga-se: quem é o
hipossuficiente? Há realmente uma parte destinatária do princípio da proteção?
Surgem, nesses casos, “duelos” entre duas pessoas jurídicas, que não permitem
ao juiz adotar o princípio da proteção, já que são partes presumivelmente iguais.
Além disso, a Lei n. 13.467/2017, que alterou diversos dispositivos da CLT,
tanto no aspecto material quanto no processual, desferiu um duro golpe no
princípio de proteção processual ao trabalhador, como, por exemplo, a
obrigatoriedade do depósito recursal (CLT, art. 899, § 4º), que era exigido apenas
do empregador, e nunca do empregado, passou a ser exigível de qualquer parte,
haja vista que deverá ser feito em conta vinculada ao juízo, e não mais em conta
vinculada do FGTS.
Igualmente, no tocante às despesas processuais, pois, com o advento da Lei n.
13.467/2017, o trabalhador poderá ser condenado no pagamento de honorários
advocatícios e honorários periciais, mesmo sendo beneficiário da justiça gratuita
(CLT, arts. 790-B, caput e § 4º, e 791, caput, §§ 3º e 4º).
6.2. Princípio da finalidade social do processo
Segundo Humberto Theodoro Júnior, “o primeiro e mais importante princípio
que informa o processo trabalhista, distinguindo-o do processo civil comum, é o
da finalidade social, de cuja observância decorre uma quebra do princípio da
isonomia entre as partes, pelo menos em relação à sistemática tradicional do
63
direito formal” .
Theodoro Júnior inspira-se no juslaboralista mexicano Néstor de Buen, para
quem há perfeita comunhão entre o direito material e o direito processual do
trabalho:
Em primeiro lugar, é óbvio que tanto o direito substantivo como o processual intentam a realização
da justiça social. Para esse efeito, ambos estimam que existe uma evidente desigualdade entre as
partes, substancialmente derivada da diferença econômica e, como consequência, cultural, em que se
encontram. Em virtude disso a procura da igualdade como meta. O direito substantivo, estabelecendo
de maneira impositiva, inclusive acima da vontade do trabalhador, determinados direitos mínimos e
certas obrigações máximas. O direito processual, reconhecendo que o trabalhador deve ser auxiliado
durante o processo pela própria autoridade julgadora, de maneira que, no momento de chegar o
64
procedimento ao estado de solução, a aportação processual das partes permita uma solução justa .
A diferença básica entre o princípio da proteção processual e o princípio da
finalidade social do processo é que, no primeiro, a própria lei confere a
desigualdade no plano processual; no segundo, permite-se que o juiz tenha uma
atuação mais ativa, na medida em que auxilia o trabalhador, em busca de uma
solução justa, até chegar o momento de proferir a sentença.
Parece-nos, contudo, que os dois princípios – proteção e finalidade social – se
harmonizam e, pelo menos em nosso ordenamento jurídico, permitem que o juiz,
na aplicação da lei, possa corrigir uma injustiça da própria lei. É o que prescreve
o art. 5º do Decreto-Lei n. 4.657/42 (LINDB), segundo o qual, “na aplicação da
lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem
comum”.
Quanto a essa possibilidade conferida ao magistrado no exercício da prestação
jurisdicional, convém colacionar a lúcida observação de José Eduardo Faria,
relativa “ao problema do alcance e do sentido das expressões ‘fins sociais’ e
‘bem comum’, dois princípios gerais do direito sempre presentes nas exposições
de motivos dos legisladores (...) Num contexto socioeconômico como o do
Brasil em que os 20% mais pobres do país detêm apenas 2% da riqueza nacional,
enquanto os 20% mais ricos ficam com 66%, ‘sociais’ e ‘comum’ na perspectiva
de quem? Longe de possuírem um significado evidente, tais conceitos expressam
várias representações conflitantes entre si; em vez de propiciarem uma visão
precisa do sistema jurídico, eles funcionam como barreiras ideológicas
mascarando contradições sociais profundas e antagonismos inconciliáveis.
Assim, em que medida todos os grupos e classes podem ter realmente os
mesmos interesses ‘comuns’ e anseios pelos mesmos ‘fins’? Até que ponto todos
os homens situados numa formação social como a brasileira, em que a miséria e
a pobreza atingem 64% da população, podem ser tomados como cidadãos
efetivamente iguais entre si em seus direitos, seus deveres e em suas capacidades
65
tanto subjetivas quanto objetivas de fazê-los prevalecer?” .
Para enfrentar tais indagações, o referido jurista e sociólogo propõe que o
direito seja uma atividade crítica e especulativa, calcada na experiência vivida e,
como tal, incorporada à própria percepção da realidade por parte dos atores
jurídicos. Daí por que, diz ele, “a proposta de uma ciência do direito reflexiva,
consciente das contradições do direito positivo, nega-se a reduzir a análise das
66
leis e dos códigos apenas nos seus aspectos lógico-formais” . Dessa nova função
prospectiva do direito, que irradia seus efeitos no direito processual, segundo o
mesmo autor, “pode emergir um direito original e legítimo, voltado mais à
questão da justiça do que aos problemas de legalidade, cabe a uma magistratura
com um conhecimento multidisciplinar e poderes decisórios ampliados a
responsabilidade de reformular a partir das próprias contradições sociais os
conceitos fechados e tipificantes dos sistemas legais vigentes. Sob pena de a
magistratura ver progressivamente esgotada tanto a operacionalidade quanto o
67
acatamento de suas decisões face à expansão de conflitos coletivos” .
Colhemos um julgado que adotou expressamente o princípio da finalidade
social do processo:
SINDICATO COMO SUBSTITUTO PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL
PARA ADOÇÃO DE MEDIDAS NECESSÁRIAS AO ANDAMENTO DO FEITO. PRESCRIÇÃO
INTERCORRENTE. INOCORRÊNCIA. Não se pronuncia a prescrição intercorrente em ação
ajuizada por sindicato, como substituto processual, se não houve notificação pessoal do ente coletivo
ou dos substituídos para adoção de medidas necessárias ao andamento do feito, sob pena de ofensa ao
Princípio da Finalidade Social do Processo e ao disposto no § 1º do art. 267 do CPC, aplicado
subsidiariamente. Agravo de Petição provido (TRT, 14ª Reg., AP 00794.2000.005.14.00-5, Rel. Des.
Vânia Maria da Rocha Abensur, j. 14-12-2007, DO 19-12-2007).
Com a ampliação da competência da Justiça do Trabalho para outras lides
diversas da relação de emprego, como as oriundas da relação de trabalho
autônomo, as ações para cobranças de multas administrativas e as ações sobre
representações sindicais, o princípio da finalidade social, bem como o princípio
da proteção processual, acabarão sofrendo grandes transformações, como já
alertamos na epígrafe anterior.
6.3. Princípio da efetividade social
É importante destacar que alguns autores vêm defendendo a existência do
princípio da efetividade social como desdobramento do princípio da finalidade
social. Segundo André Monteiro Barbosa, Brasilino Santos Ramos, Jouber S. S.
Amaral e Juliana Rodrigues de Morais:
Entende-se por princípio da efetividade social o conjunto de concepções, políticas, conceitos, ideias e
mecanismos necessários que devem inspirar a concretização ou materialização da prestação
jurisdicional, evitando-se preventivamente a lesão ao ordenamento jurídico que se avizinha, ou
restabelecendo-se, tempestivamente e com a maior fidelidade possível, o direito que foi violado. É,
por isso mesmo, um verdadeiro princípio do direito processual do trabalho. Esclareça-se que não se
tratam de meras formas procedimentais, mas sim um viés, um norte, uma concepção social na
formação, propulsão, julgamento e entrega da prestação jurisdicional, numa constante oposição à
ótica individualista impregnada no processo e que decorre de sua ultrapassada inspiração do Estado
68
Liberal .
Verifica-se, assim, a ampla possibilidade de aplicação do princípio da
efetividade processual, mormente nas hipóteses de tutelas inibitórias para
69
proteção do meio ambiente do trabalho .
6.4. Princípio da busca da verdade real
Este princípio processual deriva do princípio do direito material do trabalho,
conhecido como princípio da primazia da realidade.
Embora haja divergência sobre a singularidade deste princípio no sítio do
direito processual do trabalho, parece-nos inegável que ele é aplicado com maior
ênfase neste setor da processualística do que no processo civil.
Corrobora tal assertiva o disposto no art. 765 da CLT, que confere aos Juízos e
Tribunais do Trabalho ampla liberdade na direção do processo. Para tanto, os
magistrados do trabalho “velarão pelo andamento rápido das causas, podendo
determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas”.
A jurisprudência tem acolhido o princípio em tela no campo da prova:
RECURSO ORDINÁRIO. INSTRUÇÃO PROCESSUAL. AMPLA LIBERDADE DO JUIZ NA
CONDUÇÃO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. PRINCÍPIO DA BUSCA DA VERDADE REAL.
No processo do trabalho o princípio da verdade real tem residência no art. 765 da CLT c/c art. 130 do
CPC que confere ao juiz ampla liberdade na direção do processo, podendo determinar as provas
necessárias à instrução do feito. O juiz deve conduzir o processo com o objetivo de apurar a verdade
real, podendo determinar as diligências necessárias ao esclarecimento dos fatos e indeferir aquelas
que considerar inúteis ou meramente protelatórias. É evidente que o julgador deve compatibilizar
esse princípio com o princípio da ampla defesa e do contraditório e com o princípio da isonomia. Ao
indeferir a oitiva de testemunhas que confessadamente desconheciam o fato sobre o qual deporiam, o
Juízo de origem agiu com acerto, pois preservou a idoneidade da prova. Desse modo, não há
nulidade, pois a conduta do Juízo alcançou a verdade real na instrução processual sem abandonar a
ampla defesa e o contraditório e a igualdade de tratamento das partes (TRT, 2ª R., RECORD 01116-
2008-372-02-00-9, Rel. Des. Marcelo Freire Gonçalves, j. 6-5-2010, 12ª T., DO 14-5-2010).
SALÁRIO EXTRAFOLHA. INVALIDADE DA PROVA DOCUMENTAL. PRINCÍPIO DA BUSCA
DA VERDADE REAL. INAPLICABILIDADE DO ART. 227, PARÁGRAFO ÚNICO, DO
CÓDIGO CIVIL. No Processo do Trabalho, vigora o princípio da busca da verdade real, que faz com
que a prova documental ceda espaço à testemunhal, quando esta se mostra firme no sentido da
desconstituição daquela. Diante disso, o parágrafo único do art. 227, do CC, segundo o qual,
“qualquer que seja o valor do negócio jurídico, a prova testemunhal é admissível como subsidiária ou
complementar da prova por escrito”, é inaplicável ao Processo do Trabalho, porque incompatível
com esse princípio peculiar. Assim, demonstrado pela prova testemunhal, firme e idônea, o
pagamento de salário extrafolha, são devidas as diferenças reflexas decorrentes da integração daquele
no salário para todos os efeitos legais (TRT, 3ª R., RO 0001070-73.2012.5.03.0147, Rel. Des.
Fernando Luiz G. Rios Neto, 7ª T., DEJT 19-8-2014).

6.5. Princípio da indisponibilidade


Este princípio constitui adaptação do princípio da indisponibilidade ou
irrenunciabilidade do direito material do trabalho no campo do processo do
trabalho.
Justifica-se a peculiaridade do princípio da indisponibilidade nos sítios do
processo do trabalho, pela considerável gama de normas de ordem pública do
direito material do trabalho, o que implica a existência de um interesse social
que transcende a vontade dos sujeitos do processo na efetivação dos direitos
sociais trabalhistas e influencia a própria gênese da prestação jurisdicional
especializada. Numa palavra, o processo do trabalho tem uma função precípua: a
efetiva realização dos direitos sociais indisponíveis dos trabalhadores.
É claro que as normas de direito processual de qualquer ramo são, em regra,
de natureza absoluta e de ordem pública, mas nos sítios do processo do trabalho
a indisponibilidade do direito processual assume importância mais enfática,
tendo em vista a inferioridade econômica do trabalhador destinatário, em regra,
de créditos de natureza alimentícia como um dos sujeitos da relação jurídica
processual. Nesse sentido:
RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE – PRESCRIÇÃO DE OFÍCIO – ART. 219, § 5º, DO
CPC – APLICABILIDADE AO PROCESSO DO TRABALHO. A alteração do artigo 219, § 5º, do
CPC, efetuada pela Lei n. 11.280/2006, autoriza o Juiz a declarar, de ofício, a prescrição. O instituto,
no entanto, não se mostra compatível com o processo do trabalho, em razão de princípios e
peculiaridades que o regem, dentre outros, a indisponibilidade de alguns dos direitos do empregado, a
natureza alimentar do salário, e a própria desigualdade econômica entre empregados e empregadores,
não presentes na relação jurídica disciplinada pelo Código de Processo Civil. Recurso de revista
conhecido e provido (TST-RR 501700-13.2006.5.09.0019, Rel. Min. Milton de Moura França, 4ª T.,
DEJT 28-10-2011).
TRANSAÇÃO EXTRAJUDICIAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO
MÉRITO. As hipóteses de extinção do processo sem resolução do mérito estão taxativamente
previstas pelo Código de Processo Civil, no art. 267. A transação extrajudicial não importa em
extinção do processo com resolução do mérito, como disposto no inciso III do art. 269 do CPC, pois
esta não gera a quitação total do contrato de trabalho, mas tão somente aos valores objeto da
conciliação, em observância ao princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas. Recurso
patronal a que se nega provimento (TRT 1ª R., RO 00021366520125010302, Rel. Des. Leonardo
Dias Borges, 10ª T., DEJT 24-9-2014).
Vislumbramos, ainda, a aplicação do princípio ora focalizado na hipótese de
substituição processual, pois ao sindicato (substituto processual) é vedado
renunciar direitos metaindividuais veiculados em ação civil pública.
Há de se destacar, contudo, que a ampliação de competência da Justiça do
Trabalho para processar e julgar ações oriundas de outras relações de trabalho
(EC n. 45/2004), incluindo o trabalho autônomo, bem como as lides entre os
sindicatos e entre os empregadores e os órgãos de fiscalização do trabalho,
acabará mitigando aplicação do princípio da indisponibilidade nos domínios do
processo do trabalho.
Por fim, cumpre lembrar que o art. 2º, II, da IN/TST 39/2016 dispõe que não
se aplica ao Processo do Trabalho, em razão de inexistência de omissão ou por
incompatibilidade, o art. 190 e parágrafo único do CPC, que tratam da
negociação processual, o que reforça a existência do princípio da
indisponibilidade nos sítios do processo laboral.
6.6. Princípio da conciliação
O princípio da conciliação encontrava fundamento expresso nas Constituições
brasileiras de 1946 (art. 123), de 1967 (art. 134), de 1969 (art. 142, com redação
dada pela EC n. 1/69) e na redação original do art. 114 da Carta de 1988. Todas
essas normas previam a competência da Justiça do Trabalho para “conciliar” e
julgar os dissídios individuais e coletivos.
Com o advento da EC n. 45/2004, que deu nova redação ao art. 114 da CF,
houve supressão do termo “conciliar e julgar”, cabendo agora à Justiça do
Trabalho “processar e julgar”.
A omissão, contudo, não desnatura o princípio em estudo, pois ele continua
existindo no plano infraconstitucional e não se mostra incompatível com o novo
texto da Carta de outubro de 1988.
70
Embora o princípio da conciliação não seja exclusividade do processo
laboral, parece-nos que é aqui que ele se mostra mais evidente, tendo, inclusive,
um iter procedimentalis peculiar.
Com efeito, dispõem o art. 764, caput, e seus parágrafos da CLT, in verbis:
Art. 764. Os dissídios individuais ou coletivos submetidos à apreciação da Justiça do Trabalho serão
sempre sujeitos à conciliação.
§ 1º Para os efeitos deste artigo, os juízes e Tribunais do Trabalho empregarão sempre os seus bons
ofícios e persuasão no sentido de uma solução conciliatória dos conflitos.
§ 2º Não havendo acordo, o juízo conciliatório converter-se-á obrigatoriamente em arbitral,
proferindo decisão na forma prescrita neste Título.
§ 3º É lícito às partes celebrar acordo que ponha termo ao processo, ainda mesmo depois de
encerrado o juízo conciliatório.
No mesmo sentido, o art. 831 da CLT estabelece uma condição intrínseca para
a validade da sentença trabalhista, ao determinar que ela somente “será proferida
depois de rejeitada pelas partes a proposta de conciliação”.
Há, no procedimento comum ordinário trabalhista, dois momentos
obrigatórios para a proposta judicial de conciliação.
O primeiro está previsto no art. 846 da CLT e ocorre por ocasião da abertura
da audiência, nos seguintes termos: “Aberta a audiência, o Juiz ou Presidente
proporá a conciliação”.
A segunda tentativa de conciliação ocorre após o término da instrução e da
apresentação das razões finais pelas partes. Está prevista no art. 850 da CLT, in
verbis:
Art. 850. Terminada a instrução, poderão as partes aduzir razões finais, em prazo não excedente de
10 minutos para cada uma. Em seguida, o juiz ou presidente renovará a proposta de conciliação, e
não se realizando esta, será proferida a decisão.
Outra peculiaridade do processo do trabalho repousa na equiparação prática
do termo de conciliação à coisa julgada. É o que diz o parágrafo único do art.
831 da CLT: “No caso de conciliação, o termo que for lavrado valerá como
decisão irrecorrível, salvo para a Previdência Social quanto às contribuições que
lhe forem devidas”.
Em 2007, o CNJ instituiu o movimento “Conciliar é Legal”, que resultou na
instalação de Gabinetes de Conciliação em vários órgãos do Poder Judiciário nos
quais são realizados periodicamente mutirões de conciliação nos órgãos
jurisdicionais de primeiro grau.
Acreditamos que o CNJ tenha utilizado a expressão “conciliar é legal” no
sentido leigo, popular, e não no sentido jurídico. Vale dizer, para o CNJ conciliar
é uma boa ação, faz bem a todos e, por isso, deve ser estimulada.
O procedimento dos mutirões inicia-se com uma triagem dos processos em
que o magistrado vislumbra a existência de probabilidade de negociação inicial
entre as partes, levando em conta a pequena complexidade das questões ou a
existência de provas suficientes nos autos para o pronto julgamento. Depois,
marcam-se audiências prévias de conciliação, com designação de dias ou
semanas específicas organizadas de acordo com o perfil de litigância dos réus.
Há, assim, os chamados “litigantes habituais”, que figuram no polo passivo em
grande parte das demandas ajuizadas na Justiça do Trabalho, de acordo com os
dados divulgados nos sites do TST e do próprio CNJ.
Sobreleva lembrar que o art. 2º, IV, da IN/TST 39/2016 não autoriza a
aplicação subsidiária ou supletiva do art. 334 do CPC, que trata da audiência de
conciliação ou de mediação, ao Processo do Trabalho.
Além disso, o art. 14 da referida IN n. 39 dispõe que não se aplica ao Processo
do Trabalho o art. 165 do CPC, salvo nos conflitos coletivos de natureza
econômica (CF, art. 114, §§ 1º e 2º). Vale registrar que o art. 165 do CPC
determina a criação, no âmbito dos tribunais, de “centros judiciários de solução
consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de
conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a
auxiliar, orientar e estimular a autocomposição”.
Voltaremos a falar sobre conciliação no Capítulo XIII, itens 5, 11 e 12, e no
Capítulo XVII, itens 2, 3 e 5.6.
6.7. Princípio da normatização coletiva
A Justiça do Trabalho brasileira é a única que pode exercer o chamado poder
normativo, que consiste no poder de criar normas e condições gerais e abstratas
(atividade típica do Poder Legislativo), proferindo sentença normativa (rectius,
acórdão normativo) com eficácia ultra partes, cujos efeitos irradiarão para os
contratos individuais dos trabalhadores integrantes da categoria profissional
representada pelo sindicato que ajuizou o dissídio coletivo.
Essa função especial (competência) conferida aos tribunais trabalhistas é
autorizada pelo art. 114, § 2º, da CF, segundo o qual:
Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de
comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho
decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as
convencionadas anteriormente.
O princípio da normatização coletiva não é absoluto, pois encontra limites na
própria Constituição, nas leis de ordem pública de proteção ao trabalhador (CF,
art. 7º; CLT, arts. 8º e 444) e nas cláusulas (normas) anteriores previstas em
convenções e acordos coletivos que disponham sobre condições mínimas de
determinada categoria profissional (CF, art. 7º, XXVI).
6.8. Outros princípios do processo trabalhista
Além dos princípios acima arrolados, a doutrina invoca outros princípios
como peculiares ao processo do trabalho, como os princípios da simplicidade, da
celeridade, da despersonalização do empregador e da extrapetição. Todavia,
pensamos que esses princípios são comuns ao processo do trabalho e ao processo
civil.
6.8.1. Princípio da simplicidade das formas
Com efeito, o princípio da simplicidade das formas decorre dos princípios da
instrumentalidade e da oralidade, já estudados nas linhas pretéritas, e – é
inegável – constitui objetivo de todo e qualquer sistema processual, seja ele civil,
penal ou trabalhista.
O art. 899 da CLT consagra expressamente que os recursos serão interpostos
por simples petição, isto é, sem os formalismos extremos exigidos nos recursos
de natureza extraordinária.
Os juizados especiais cíveis e criminais também são exemplos de aplicação do
princípio da simplicidade. É importante ressaltar, porém, que as raízes
deontológicas e fenomenológicas desses órgãos da justiça comum provêm do
direito processual do trabalho.
6.8.2. Princípio da celeridade
O princípio da celeridade, embora comum a todos os ramos do direito
processual, é um desdobramento do princípio constitucional da duração razoável
do processo (CF, art. 5º, LXXVIII) e assume ênfase muito maior nos sítios do
processo do trabalho, uma vez que, em regra, os créditos trabalhistas nele
veiculados têm natureza alimentícia.
É bem de ver que o princípio da celeridade encontra abrigo expresso no art.
765 da CLT, segundo o qual os Juízes e os Tribunais do Trabalho terão ampla
liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas.
6.8.3. Princípio da despersonificação do empregador (desconsideração da
personalidade jurídica)
A despersonificação do empregador, ou desconsideração da personalidade
jurídica do empregador, constitui, a rigor, princípio do direito material trabalhista
(CLT, arts. 2º, 10 e 448).
Além disso, o princípio da desconsideração da personalidade jurídica é
encontrado em outros ramos, como o direito comercial, o direito civil, o direito
das relações de consumo, o direito tributário.
No direito das relações de consumo, por exemplo, ele está consagrado
explicitamente, nos termos do art. 28 do CDC, in verbis:
O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do
consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação
dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência,
estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má
administração.
Cumpre esclarecer, por oportuno, que o princípio da desconsideração da
personalidade jurídica do empregador tem sido bastante utilizado no processo do
71
trabalho, mormente em sede de execução trabalhista .
O CPC (arts. 133 a 137) instituiu o incidente da desconsideração da
personalidade jurídica, cabível em qualquer fase do processo, como uma espécie
de intervenção de terceiro na lide.
Parece-nos, porém, que tal incidente, por implicar suspensão do processo,
mostra-se incompatível com o processo do trabalho, mormente nas ações
oriundas da relação de emprego ou de trabalho avulso, em função da natureza
alimentícia dos créditos veiculados em tais ações, nas quais deve prevalecer o
princípio da máxima celeridade da prestação jurisidicional.
Contudo, pensamos que é possível a aplicação do § 2º do art. 134 do CPC nos
sítios do processo laboral, caso em que, mediante requerimento fundamentado
do reclamante/autor, poderá haver formação de litisconsórcio passivo entre a
empresa empregadora e seus sócios. Neste caso, não haverá incidente nem
suspensão processual, e sim citação dos litisconsortes para se defenderem na
demanda.
O art. 6º da IN/TST 39/2016, no entanto, manda aplicar “ao Processo do
Trabalho o incidente de desconsideração da personalidade jurídica regulado no
CPC (arts. 133 a 137), assegurada a iniciativa também do juiz do trabalho na
fase de execução (CLT, art. 878)”. O novel art. 855-A da CLT também autoriza a
aplicação dos arts. 133 a 137 do CPC no processo do trabalho.
Sobre este tema, remetemos o leitor ao Capítulo XI, item 3.6.
6.8.4. Princípio da extrapetição
O princípio da extrapetição é admitido no processo civil, mormente nos casos
em que o juiz acrescenta à condenação juros legais e correção monetária (CPC,
art. 322, § 1º), ainda que não pedidos pelo autor.
A CLT reconhece o princípio da extrapetição, como se infere dos seus arts.
137, § 2º, 467 e 496. O item II da Súmula 396 do TST também o consagra, ao
dispor: “Não há nulidade por julgamento extra petita da decisão que deferir
salário quando o pedido for de reintegração, dados os termos do art. 496 da
CLT”.
5. PRINCÍPIOS
5.1. Conceito e importância
A coerência interna de um sistema jurídico decorre dos princípios sobre os
quais se organiza. Para operacionalizar o funcionamento desse sistema, torna-se
necessária a subdivisão dos princípios jurídicos. Extraem-se, assim, os princípios
gerais e os princípios especiais, conforme a natureza de cada subdivisão.
Debruçando-nos, por exemplo, sobre o direito processual e o direito
processual civil, verificaremos que o direito processual possui seus princípios
gerais, e o direito processual civil, que é um dos seus ramos, possui princípios
especiais.
A harmonização do sistema ocorre porque os princípios especiais ou estão de
acordo com os princípios gerais ou funcionam como exceção. Nessa ordem, as
normas, regras, princípios especiais e princípios gerais seguem a mesma linha de
raciocínio, com coerência lógica entre si.
Além da coerência lógica, deve haver uma coerência teleológica entre os
princípios que compõem o sistema, consentânea com determinados fins
políticos, filosóficos, éticos e sociológicos. Com isso, as normas assumem, no
sistema, um caráter instrumental na busca de determinados valores idealizados
pela sociedade.
Nesse sentido, Claus-Wilhelm Canaris define “o sistema jurídico como ordem
23
axiológica ou teleológica de princípios jurídicos gerais” .
A importância dos princípios foi identificada por Jorge Miranda nos seguintes
termos:
O Direito não é mero somatório de regras avulsas, produto de atos de vontade, ou mera concatenação
de fórmulas verbais articuladas entre si, o Direito é ordenamento ou conjunto significativo e não
conjunção resultante de vigência simultânea; é coerência ou, talvez mais rigorosamente, consistência;
é unidade de sentido, é valor incorporado em regra. E esse ordenamento, esse conjunto, essa unidade,
esse valor, projeta-se ou traduz-se em princípios, logicamente anteriores aos preceitos. Os princípios
não se colocam, pois, além ou acima do Direito (ou do próprio Direito positivo); também eles – numa
visão ampla, superadora de concepções positivistas, literalistas e absolutizantes das fontes legais –
fazem parte do complexo ordenamental. Não se contrapõem às normas, contrapõem-se tão somente
24
aos preceitos; as normas jurídicas é que se dividem em normas-princípios e normas-disposições .
O jusfilósofo Norberto Bobbio refere a importância dos princípios gerais de
direito como fator determinante da completude do ordenamento jurídico.
Segundo esse notável mestre, os princípios gerais são apenas
normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. A palavra princípios leva
a engano, tanto que é velha questão entre os juristas se os princípios gerais são normas. Para mim não
há dúvida: os princípios gerais são normas como todas as outras. E esta é também a tese sustentada
por Crisafulli. Para sustentar que os princípios gerais são normas, os argumentos são dois, e ambos
válidos: antes de mais nada, se são normas aquelas das quais os princípios gerais são extraídos,
através de um procedimento de generalização sucessiva, não se vê por que não devam ser normas
também eles: se abstraio da espécie animal obtenho sempre animais, e não flores ou estrelas. Em
segundo lugar, a função para a qual são extraídos e empregados é a mesma cumprida por todas as
normas, isto é, a função de regular um caso. E com que finalidade são extraídos em caso de lacuna?
Para regular um comportamento não regulamentado: mas então servem ao mesmo escopo a que
25
servem as normas expressas. E por que não deveriam ser normas? .
Mais adiante, o mestre peninsular sublinha, com inteira razão, que:
Ao lado dos princípios gerais expressos há os não expressos, ou seja, aqueles que se podem tirar por
abstração de normas específicas ou pelo menos não muito gerais: são princípios, ou normas
generalíssimas, formuladas pelo intérprete, que busca colher, comparando normas aparentemente
26
diversas entre si, aquilo a que comumente se chama o espírito do sistema .

5.2. Princípios constitucionais fundamentais


A doutrina de Bobbio sobre princípios assume especial importância para o
ordenamento jurídico brasileiro, mormente depois da promulgação da
Constituição Federal de 1988.
Com efeito, a norma-ápice do ordenamento jurídico pátrio, logo no seu Título
I, confere aos princípios o caráter de autênticas normas constitucionais. Vale
dizer, já não há mais razão para a velha discussão sobre a posição dos princípios
entre as fontes do direito, porquanto os princípios fundamentais inscritos na
Constituição Federal passam a ser as fontes normativas primárias do nosso
sistema.
Daí a pertinência, com maior razão ainda diante do texto constitucional, da
afirmação de Celso Antônio Bandeira de Mello, para quem princípio:
é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição
fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério
para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do
sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido humano. É o conhecimento dos
princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por
nome sistema jurídico positivo. Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma.
É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio
atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores
27
fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço e corrosão de sua estrutura mestra .
Colhe-se, neste passo, a observação de Geraldo Ataliba, para quem, em
direito, “o princípio é muito mais importante do que uma norma”, uma vez que o
princípio é, também, uma norma; mas “é muito mais do que uma norma, uma
diretriz, é um norte do sistema, é um rumo apontado para ser seguido por todo o
28
sistema, sempre que se vai debruçar sobre os preceitos contidos no sistema” .
Vê-se, pois, que esses dois autores brasileiros consideram os princípios mais
importantes que as normas. No entanto, é importante assinalar que, atualmente,
surge na academia uma nova compreensão do papel dos princípios
constitucionais fundamentais em nosso ordenamento jurídico, o que passa,
29
necessariamente, pela adoção do pensamento de Ronald Dworkin e Robert
30
Alexy , pois ambos inspiraram novos estudos sobre hermenêutica nas modernas
democracias ocidentais. Dworkin, consagrado professor de filosofia jurídica da
Universidade de Oxford, criticando o modelo de “regras”, propõe que a “norma”
(norm) em sentido lato alberga tanto as “regras” (rules) quanto os “princípios”
(principles).
Transplantando a teoria de Dworkin para o nosso ordenamento, poderíamos
dizer que as normas constitucionais são o gênero que tem como espécies os
princípios e as regras. Essa teoria possui o grande mérito, com o qual
concordamos, de desvendar que, ao contrário das regras, princípio não revoga
princípio; antes se harmonizam, abrindo espaço para a aplicação da justiça no
caso concreto, mediante outro princípio: o da razoabilidade, proporcionalidade
ou ponderação de bens.
Alexy, por sua vez, enfatiza o aspecto deontológico dos princípios. Diz ele
que:
tanto las reglas como los principios son normas porque ambos dicen lo que debe ser. Ambos pueden
ser formulados con la ayuda de las expresiones deónticas básicas del mandato, la permisión y la
proibición. Los principios, al igual que las reglas, son razones para juicios concretos de debe ser,
aun cuando sean razones de un tipo muy diferente. La distinción entre reglas y principios es pues
31
una distinción entre dos tipos de normas .
Parece-nos inegável que o CPC recebeu influência do neoconstitucionalismo e
do neopositivismo jurídico, uma vez que reconhece, mormente na sua Parte
Geral, Livro I, Título Único, que as Normas Fundamentais compõem-se dos
mesmos princípios, regras e valores que também estão, em grande parte,
previstos na Constituição Federal.
Pensamos, neste passo, que os princípios positivados no CPC (arts. 1º a 12),
em especial os que também estão coincidentemente previstos na CF, como os
princípios da dignidade da pessoa humana, do efetivo acesso à justiça, do devido
processo legal/constitucional, da duração razoável do processo, do contraditório,
da ampla defesa, da publicidade, do atendimento aos fins sociais do
ordenamento jurídico, das exigências do bem comum, da razoabilidade, da
proporcionalidade, da eficiência e da fundamentação das decisões, são
aplicáveis, no que couber, ao processo do trabalho não por conta do art. 15 do
CPC ou do art. 769 da CLT, mas pela força normativa da Constituição Federal.
5.3. Função dos princípios constitucionais fundamentais
Os princípios constitucionais fundamentais exercem tríplice função no
ordenamento jurídico, a saber: informativa, interpretativa e normativa.
A função informativa é destinada ao legislador, inspirando a atividade
legislativa em sintonia com os princípios e valores políticos, sociais, éticos e
econômicos do ordenamento jurídico. Sob essa perspectiva, os princípios atuam
com propósitos prospectivos, impondo sugestões para a adoção de formulações
novas ou de regras jurídicas mais atualizadas, em sintonia com os anseios da
sociedade e atendimento às justas reivindicações dos jurisdicionados.
A função interpretativa é destinada ao aplicador do direito, pois os princípios
se prestam à compreensão dos significados e sentidos das normas que compõem
o ordenamento jurídico. Entre os diversos métodos de interpretação oferecidos
pela hermenêutica jurídica, os princípios podem desempenhar um importante
papel na própria delimitação e escolha do método a ser adotado nos casos
submetidos à decidibilidade.
A função normativa, também destinada ao aplicador do direito, decorre da
constatação de que os princípios podem ser aplicados tanto de forma direta, isto
é, na solução dos casos concretos mediante a derrogação de uma norma por um
princípio, por exemplo, o princípio da norma mais favorável aos trabalhadores
(CF, art. 7º, caput), quanto de forma indireta, por meio da integração do sistema
nas hipóteses de lacuna (CPC, art. 128), como se dá, por exemplo, com a
aplicação do princípio da preclusão no campo processual.
Cremos ser possível alinhar outras importantes funções que os princípios
constitucionais fundamentais desempenham no ordenamento jurídico brasileiro:
• integram o direito positivo como normas fundamentais;
• ocupam o mais alto posto na escala normativa;
• são fontes formais primárias do direito (superação da LINDB – Lei de Introdução às Normas do
Direito Brasileiro, art. 4º, que coloca os princípios gerais na posição de meras fontes subsidiárias nas
hipóteses de lacunas do sistema);
• passam a ser normas de introdução ao ordenamento jurídico brasileiro;
• em caso de conflito entre princípio (justiça) e regra (lei), preferência para o primeiro;
• propiciam a atividade criativa (e vinculativa) do juiz, impedindo o dogma da neutralidade e os
formalismos legalistas (supremacia dos valores superiores na interpretação do direito sobre o
legalismo restrito);
• prestigiam a verdadeira segurança jurídica, pois a atividade legislativa e a judicante ficam
vinculadas à observância dos princípios constitucionais fundamentais;
• vinculam todos os Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário): judicialização da política e
politização da justiça (Judiciário);
• estabelecem a função promocional do Ministério Público (defesa do regime democrático e do
32
ordenamento jurídico) .

5.4. Princípios gerais do direito processual


A doutrina costuma classificar os princípios do direito processual em
princípios informativos e princípios fundamentais.
5.4.1. Princípios informativos
Os princípios informativos do direito processual, também chamados por
alguns de meras regras informativas do processo, são considerados axiomas,
prescindindo, pois, de demonstração. Não se baseiam em outros critérios que não
os estritamente técnicos e lógicos, não possuindo praticamente nenhum conteúdo
ideológico. Os princípios informativos são universais e, por tal razão, são
33
praticamente incontroversos .
Por serem axiomas, os princípios informativos servem de base para a
elaboração de uma teoria geral do processo.
Segundo Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido
34
Rangel Dinamarco , são princípios informativos do direito processual:
• Princípio Lógico – Consiste na escolha dos fatos e forma mais aptos para descobrir a verdade e
evitar o erro. Este princípio informa a logicidade a que está jungido o processo, de maneira que a
petição inicial deve preceder a contestação, a decisão judicial ao recurso etc.;
• Princípio Jurídico – Seu papel é proporcionar aos litigantes igualdade de tratamento na demanda e
justiça na decisão, mediante regras claras e preestabelecidas, evitando-se que o processo seja uma
“caixinha de surpresas”;
• Princípio Político – Seu objetivo é prover os direitos dos cidadãos da máxima garantia social com
o mínimo de sacrifício da liberdade individual. Este princípio estabelece a regra política que
determina ao juiz o dever de sentenciar, mesmo no caso de lacunas. É este princípio, portanto, que
justifica a completude do ordenamento jurídico; e
• Princípio Econômico – Consiste, de um lado, em fazer com que as lides não sejam tão
dispendiosas e demoradas, e, de outro, em propiciar o acesso dos pobres ou dos hipossuficientes
econômicos ao aparelho judiciário, por meio dos institutos da assistência judiciária e da justiça
gratuita.
5.4.2. Princípios fundamentais
Os princípios fundamentais do processo, também chamados de princípios
gerais do processo, são os princípios “sobre os quais o sistema jurídico pode
fazer opção, considerando aspectos políticos e ideológicos. Por essa razão,
admitem que em contrário se oponham outros, de conteúdo diverso, dependendo
35
do alvedrio do sistema que os está adotando” .
Além do princípio do acesso à justiça, sobre o qual nos debruçaremos com
maior profundidade no Capítulo III, são princípios fundamentais ou gerais do
direito processual:
5.4.2.1. Princípio da igualdade ou isonomia
O princípio da igualdade está consagrado no art. 5º, caput, da CF, segundo a
qual todos são iguais perante a lei. É importante notar que a igualdade aqui
mencionada é apenas a formal. Todavia, essa norma constitucional deve se
amoldar ao figurino das normas-princípios constitucionais fundamentais da
dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho e da livre-iniciativa,
bem como aos objetivos fundamentais da República, consubstanciados, dentre
outros, na erradicação da pobreza e da marginalização e na redução das
desigualdades sociais e regionais (CF, arts. 1º e 3º).
O princípio da isonomia é tratado no CPC como princípio da paridade de
armas. É o que se infere do seu art. 7º, que assegura “às partes paridade de
tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos
meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais,
competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório”.
Vale dizer, o princípio da igualdade ou da paridade de armas há de ser
entendido no seu sentido amplo, isto é, tanto no aspecto da igualdade formal
quanto no da igualdade substancial. Disso resulta a necessidade de adaptação da
aplicabilidade deste princípio nos domínios do direito processual do trabalho, no
qual se observa, não raro, manifesta desigualdade econômica entre as partes que
figuram no processo.
Por outro lado, o próprio sistema jurídico cuida de estabelecer exceções ao
princípio da igualdade das partes, como, por exemplo, as normas que outorgam
prerrogativas materiais e processuais a certas instituições, como a Fazenda
Pública, o Ministério Público e a Defensoria Pública, as quais foram instituídas
em nome do interesse público e em razão da natureza e organização do Estado.
É o que ocorre, também, com a ampliação dos prazos estabelecida nos arts.
180 e 183 do CPC e no art. 1º do Decreto-Lei n. 779/69. Tais prerrogativas não
se confundem com privilégios, pois encontram justificativa no interesse público
na proteção dos bens públicos e em função das características de tais entes: a
Fazenda, diante da complexidade dos serviços estatais e da necessidade de
formalidades burocráticas; o MP, por causa do número geralmente deficiente de
membros, da sobrecarga de trabalho, do desaparelhamento funcional e da
distância das fontes de informação e das provas, bem como das novas funções de
órgão agente que lhe foram cometidas pela Constituição e pelas leis; a
Defensoria Pública, por semelhantes razões.
Além da dilação do prazo, há também outras formas de mitigação do princípio
da isonomia formal ou substancial, como o caso da dispensa de custas aos
necessitados e carentes, desde que beneficiários de justiça gratuita, assim
declarados na decisão judicial; a isenção de caução para os trabalhadores; o
duplo grau de jurisdição, obrigatório nas causas em que as pessoas jurídicas de
direito público são vencidas total ou parcialmente (CPC, art. 496; Decreto-Lei n.
779/69, art. 1º; Súmula 303 do TST), a inversão do ônus da prova em favor da
parte hipossuficiente etc.
5.4.2.2. Princípio do contraditório
O princípio do contraditório é, também, garantia constitucional, estabelecido
entre nós pelo art. 5º, LV, da CF de 1988.
Esse princípio é de mão dupla, isto é, implica a bilateralidade da ação e a
bilateralidade do processo, aproveitando, portanto, autor, réu e terceiros
participantes da relação jurídica processual.
O princípio em tela também é útil para estabelecer o moderno conceito de
parte no processo. Vale dizer, parte é quem participa, efetiva ou potencialmente,
do contraditório na relação jurídica processual.
O CPC enaltece em diversos dispositivos o princípio do contraditório. É o que
se infere da leitura dos arts. 7º, 98, VIII, 115, 329, II, 372, 503, § 1º, II, e 962, §
2º.
Além disso, o art. 10 do CPC dispõe, categoricamente, que o “juiz não pode
decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do
qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se
trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.
5.4.2.3. Princípio da ampla defesa
Encontra-se positivado no art. 5º, LV, da CF, funcionando como complemento
do princípio do contraditório.
Com efeito, a não se admitir a relação processual sem a presença do réu, não
teria sentido tal regramento se, comparecendo a juízo para se defender e opor-se
à pretensão autoral, o réu ficasse impedido ou inibido de excepcionar, contestar,
recorrer ou deduzir toda a prova de seu interesse.
Advirta-se, porém, que esse princípio também é de mão dupla, uma vez que a
bilateralidade da ação e da defesa aproveita tanto o réu quanto o autor. Vale
dizer, reconhece-se, atualmente, em virtude da aproximação cada vez maior
entre o direito material e o direito processual, que o autor, quando vai a juízo,
encontra-se em situação de “defesa” do seu direito material lesado ou ameaçado
de lesão pelo réu. É por isso que o princípio da ampla defesa, em favor do autor,
permite ao juiz conceder tutelas antecipatórias para proteção imediata do direito
material do autor.
O princípio da ampla defesa, por ser princípio constitucional, deve ser
obrigatoriamente observado em todos os processos, estando, inclusive,
expressamente previsto no art. 847 da CLT e nos arts. 7º, 98, § 1º, VIII, do CPC.
5.4.2.4. Princípio da imparcialidade do juiz
Avocando a si a missão de prestar a tutela jurisdicional, que não deixa de ser
também a prestação de um serviço público, salta aos olhos que, ao exercer esse
poder-dever-função, o Estado-juiz deverá agir com absoluta imparcialidade.
Imparcialidade, para nós, não se confunde com neutralidade. O juiz, embora
agente público com responsabilidades complexas, é um ser humano como outro
qualquer. Logo, não se pode ignorar que ele tenha a sua própria “visão de
mundo”, com as suas próprias preferências políticas, filosóficas e ideológicas.
Afinal, o homem é um animal político, já dizia Aristóteles. Todavia, ao
desempenhar a função jurisdicional, o juiz deverá agir com imparcialidade, isto
é, sem tendências que possam macular o devido processo legal e favorecer uma
parte em detrimento da outra no que tange ao direito fundamental de acesso à
justiça.
O princípio em tela significa, por outro lado, que, na justa composição da lide,
a solução do conflito de interesses entre as partes só pode ser obtida por meio de
processo regular, em que as partes tenham igualdade de tratamento, sob o regime
do contraditório e da ampla defesa e perante um juiz imparcial. O princípio da
imparcialidade implica repúdio aos juízes secretos e de caráter inquisitivo do
período reinol.
Para efetivar a imparcialidade do juiz, a Constituição Federal (art. 95) confere
à magistratura garantias especiais, a saber: a vitaliciedade, a inamovibilidade e a
irredutibilidade de subsídios.
Além disso, a legislação processual civil (CPC, arts. 144 a 148) e a trabalhista
(CLT, art. 801) estabelecem meios de preservação do princípio da imparcialidade
do juiz, disciplinando as hipóteses de impedimento e suspeição dos órgãos
julgadores que não poderão atuar em determinados processos.
5.4.2.5. Princípio da fundamentação das decisões
Como desdobramento dos princípios da imparcialidade e do devido processo
legal, exsurge um outro: o princípio constitucional da obrigatoriedade da
fundamentação das decisões judiciais (CF, art. 93, IX; CLT, art. 832; CPC, art.
489, II, e § 1º).
Esse princípio constitui uma garantia do cidadão e da sociedade contra o
arbítrio dos juízes. Seu fundamento encontra residência constitucional no art. 93,
IX, da CF, in verbis:
Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as
decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público o exigir, limitar a presença, em
determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes em casos no quais a
preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à
informação.
O preceptivo em causa, na verdade, consagra dois outros princípios: o da
obrigatoriedade da fundamentação das decisões e o da publicidade dos
julgamentos, ressalvando-se, com relação a este último, as hipóteses em que o
interesse público exigir a sua relativização.
O art. 489, § 1º, I a VI, do CPC adota o princípio da fundamentação exaustiva
(ou exauriente) ao prescrever, analiticamente, os casos em que não será
considerada fundamentada a decisão judicial. Esse dispositivo é de duvidosa
aplicação no processo do trabalho, uma vez que não existe lacuna da CLT (art.
769), já que seu art. 832 exige apenas “os fundamentos da decisão e a respectiva
conclusão”, além de se mostrar, em certos casos, incompatível com as
características das demandas trabalhistas, nas quais se verificam, via de regra,
múltiplos pedidos, o que comprometeria a efetividade dos princípios da duração
razoável do processo e da simplicidade que caracterizam o processo laboral.
Voltaremos ao tema no Capítulo XVII, item 5.7.2.
5.4.2.6. Princípio do devido processo legal
O princípio do devido processo legal é a base sobre a qual todos os outros
princípios se sustentam, pois, segundo Nelson Nery Junior, “bastaria a norma
constitucional haver adotado o princípio do due process of law para que, daí,
decorressem todas as consequências processuais que garantiriam aos litigantes o
direito a um processo e a uma sentença justa. É, por assim dizer, o gênero do
36
qual todos os demais princípios constitucionais do processo são espécies” . Daí a
razão pela qual alguns autores preferem o termo “devido processo
constitucional”.
O princípio em tela encontra raízes no due process of law, do direito norte-
americano, e está albergado, explicitamente, no art. 5º, LIV, da CF, in verbis:
“ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal”.
Em sentido genérico, pois, o princípio do devido processo legal caracteriza-se
pelo trinômio vida-liberdade-propriedade.
O princípio ora focalizado não se restringe ao terreno processual (procedural
due process of law), porquanto os valores vida, liberdade e propriedade também
são ínsitos ao direito material. Daí, a afirmação, por exemplo, de que o princípio
da autonomia privada encontra fundamento no sentido substantivo do princípio
do devido processo legal (substantive due process).
Do princípio do devido processo legal extraem-se outros princípios, de ordem
constitucional e infraconstitucional, tais como os princípios do juiz natural, do
promotor natural, do duplo grau de jurisdição, da recorribilidade das decisões e
da motivação das decisões judiciais, do contraditório e ampla defesa, o da
duração razoável do processo etc. Como corolário, é factível dizer que o devido
processo legal deve ser compreendido também como princípio do “devido
processo justo”.
O CPC refere expressamente o princípio do devido processo legal nos arts. 26,
I, e 36.
5.4.2.6.1. Princípio do juiz natural
O princípio do juiz natural encontra residência no art. 5º, LIII, da CF, in
verbis: “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade
competente”.
Por princípio do juiz natural (CF, art. 5º, LIII), entende-se aquele que não só
consagra a tese de que juiz é aquele investido de função jurisdicional, afastando
julgamentos por outro poder, como ainda impede a criação de tribunais de
exceção ou ad hoc para o julgamento de causas cíveis ou penais. Os tribunais
especializados não constituem exceção ao princípio do juiz natural, pois estão
previstos na própria Constituição, que prevê a existência de Justiças
especializadas, com competência para julgar causas trabalhistas, militares e
eleitorais.
O princípio do juiz natural deve ser observado sobretudo na distribuição de
processos, que deve ser pautada em critérios objetivos e aleatórios, impedindo
que a parte escolha propositalmente o juiz que irá julgar a sua causa, salvo em
situações objetivamente previstas em lei (CPC, art. 286).
5.4.2.6.2. Princípio do promotor natural
O princípio do promotor natural decorre da interpretação sistêmica do texto
constitucional. Vale dizer, o princípio do promotor natural está albergado nos
arts. 5º, XXXV e LIII, 127 e 129, I, da Constituição Federal, e se funda nas
cláusulas da independência funcional e da inamovibilidade dos membros do
Ministério Público.
A rigor, bem observa Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, o princípio do promotor
natural, “na realidade, é verdadeira garantia constitucional, menos dos membros
do Parquet e mais da própria sociedade, do próprio cidadão, que tem assegurado,
nos diversos processos que o MP atua, que nenhuma autoridade ou poder poderá
escolher o Promotor ou Procurador específico para determinada causa, bem
como que o pronunciamento deste membro do MP dar-se-á livremente, sem
37
qualquer tipo de interferência de terceiros” .
O princípio do promotor natural interage com o princípio do juiz natural,
sendo que ambos têm por norte a imparcialidade do juiz e do Ministério Público,
garantindo às partes a lisura da prestação jurisdicional. O STF (HC n. 90.277-
DF, Rel. Min. Ellen Gracie), porém, não reconhece o princípio do promotor
natural como inerente ao ordenamento jurídico brasileiro.
5.4.2.6.3. Princípio do duplo grau de jurisdição
Remetemos o leitor ao Capítulo XIX, subitem 6.1.
5.4.2.7. Princípio do acesso individual e coletivo à justiça ou inafastabilidade do controle jurisdicional
ou ubiquidade ou indeclinabilidade da jurisdição
Está consagrado expressamente no art. 5º, XXXV, da CF, in verbis: “a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Este
princípio tem por destinatário não apenas o legislador (“a lei não excluirá ..”.),
pois o comando constitucional atinge a todos indistintamente. Em outros termos,
a ninguém (Estado, sociedade ou cidadão) é permitido impedir o direito
fundamental de qualquer pessoa de ajuizar ação perante o Poder Judiciário.
O problema do acesso à justiça ganhou nova dimensão a partir da Constituição
Federal de 1988, que, inovando substancialmente em relação à Carta que lhe
antecedeu, catalogou os princípios da inafastabilidade do controle jurisdicional e
do devido processo legal no rol dos direitos e garantias fundamentais,
especificamente no capítulo concernente aos direitos e deveres individuais e
coletivos.
Amplia-se, então, no plano mais elevado do nosso ordenamento, o conceito
jurídico de acesso ao Poder Judiciário, não somente para a tutela jurisdicional na
hipótese de lesão, mas, também, na de ameaça a direito.
E mais, a expressão “direito”, embora esteja gramaticalmente empregada no
singular, comporta interpretação extensiva e sistemática, isto é, abarca tanto os
“direitos” como os “interesses”, quer sejam “individuais”, quer sejam
“coletivos” lato sensu.
Não é incorreto afirmar, pois, que esses dois princípios constitucionais –
indeclinabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV) e devido processo legal (CF,
art. 5º, LIV e LV) – servem de aporte à temática do efetivo acesso, tanto
individual quanto coletivo, ao Poder Judiciário brasileiro.
Neste passo, e considerando a existência de diversas normas constitucionais e
infraconstitucionais criadoras de direitos e garantias metaindividuais, bem como
a atual tendência legislativa a ampliar e regular a proteção desses “novos
direitos”, salta aos olhos que o ortodoxo modelo liberal-individualista, inspirador
do CPC e da CLT (Título X, Capítulo III), mostra-se inválido, insuficiente,
inadequado e ineficaz para solucionar os novos conflitos civis e trabalhistas de
massa, pois, como adverte Marcelo Abelha Rodrigues,
tratar-se-ia de, por certo, se assim fosse, uma hedionda forma de inconstitucionalidade, na medida em
que impede o acesso efetivo à justiça e fere, em todos os sentidos, o direito processual do devido
processo legal. Isto porque, falar-se em devido processo legal, em sede de direitos coletivos lato
sensu, é, inexoravelmente, fazer menção ao sistema integrado de tutela processual trazido pelo CDC
38
(Lei n. 8.078/90) e LACP (Lei n. 7.347/85) .
Esse moderno sistema integrado de acesso coletivo à justiça é implementado
por aplicação direta de normas jurídicas da CF (arts. 5º, XXXV, e 129, III), da
LACP, do CDC (Título III) e, por aplicação subsidiária, das normas do CPC,
desde que estas não sejam incompatíveis com aquelas.
Alguns processualistas apelidaram esse novo sistema de “jurisdição civil
coletiva”, o que implica dizer que, atualmente, a “jurisdição civil” abrange dois
sistemas: o da tutela jurisdicional individual, regido basicamente pelo CPC, e o
da tutela jurisdicional coletiva (ou “jurisdição civil coletiva”), disciplinado, em
linhas gerais, pelo sistema integrado de normas contidas na CF, na LACP, no
CDC e, subsidiariamente, no CPC.
O art. 3º do CPC consagra expressamente o princípio do acesso à justiça
estatal, além de reconhecer e estimular o acesso à arbitragem, à mediação, à
conciliação e a outros métodos alternativos de solução consensual de conflitos.
Com relação ao direito processual do trabalho, pode-se inferir que, com a
promulgação da CF, de 1988, do CDC, de 1990, e, mais tarde, da LOMPU, de
1993, a “jurisdição trabalhista”, isto é, o sistema processual de acesso à Justiça
do Trabalho, passou a ser constituída de três subsistemas: a) o subsistema de
acesso individual (dissídios individuais e plúrimos); b) o subsistema de acesso
ao Poder Normativo (dissídios coletivos); c) o subsistema de acesso
39
metaindividual (ação civil pública) .
Sobre esses três subsistemas de acesso à Justiça do Trabalho, voltaremos a
falar no Capítulo III.
5.4.2.8. Princípio da razoabilidade da duração do processo
Com a promulgação da EC n. 45/2004, que acrescentou o inciso LXXVIII ao
art. 5º da CF, um novo princípio fundamental foi insculpido em nosso sistema
processual, segundo o qual “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a
celeridade de sua tramitação”.
O princípio da razoabilidade da duração do processo foi inspirado, certamente,
na constatação de que o sistema processual brasileiro, tanto no âmbito judicial
quanto administrativo, padece de uma enfermidade crônica: a morosidade.
Vê-se, assim, que o nosso ordenamento jurídico passa a se preocupar não
apenas com o acesso do cidadão ao Poder Judiciário, mas, também, que esse
acesso seja célere, de modo que o jurisdicionado e o administrado tenham a
garantia fundamental de que o processo, judicial ou administrativo, em que
figurem como parte, terá duração razoável em sua tramitação.
O escopo do princípio ora focalizado, portanto, reside na efetividade da
prestação jurisdicional, devendo o juiz empregar todos os meios e medidas
judiciais para que o processo tenha uma “razoável duração”, que, na verdade, é
uma expressão que guarda um conceito indeterminado, razão pela qual somente
no caso concreto poder-se-á afirmar se determinado processo teve ou está tendo
tramitação com duração razoável.
Alguns meios que garantirão a celeridade processual foram inseridos na
própria CF, por força da EC n. 45/2004, tais como: a previsão de que “a
atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juízos
e tribunais de segundo grau, funcionando, nos dias em que não houver
expediente forense normal, juízes em plantão permanente” (CF, art. 93, XII); a
permissão para que os servidores recebam “delegação para a prática de atos de
administração e atos de mero expediente sem caráter decisório” (idem, XIV) e a
determinação de que “a distribuição de processos será imediata, em todos os
graus de jurisdição” (idem, XV).
Além disso, a alínea e do inciso II do art. 93 da CF, com redação dada pela EC
n. 45/2004, estabelece uma importante medida de natureza administrativa para
assegurar a celeridade da tramitação do processo, na medida em que será
proibida a promoção do “juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder
além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido
despacho ou decisão”.
O CPC consagra expressamente o princípio da duração razoável do processo
em seu art. 4º, que assegura às partes “o direito de obter em prazo razoável a
solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”. O art. 139, II, do
CPC estabelece como um dos deveres do juiz “velar pela duração razoável do
processo”.
5.4.2.9. Princípio do ativismo judicial
Outra consequência da vinculação do processo ao paradigma do Estado
Democrático de Direito, sendo aquele um dos instrumentos de realização deste, é
o reconhecimento do princípio do ativismo judicial. Como bem lembra Hermes
Zaneti Júnior:
O que é fundamental ao Estado Democrático de Direito é a prevalência dos direitos fundamentais
individuais e coletivos, sua relação com os fins e objetivos da sociedade multicultural (plúrima), e
sua abertura para a construção da futura democracia integral (representativa, direta, política e
40
social) .
Reconhece-se, pois, a expansão do princípio do ativismo judicial nas
sociedades democráticas contemporâneas, alcançando, sobremaneira, o Brasil,
mormente com a promulgação da Constituição Republicana de 1988. Daí a
importante advertência de Gisele Cittadino:
O protagonismo do Poder Judiciário pode ser observado tanto nos Estados Unidos como na Europa,
ainda que nos países da common law esse ativismo judicial seja mais favorecido pelo processo de
criação jurisprudencial do direito. De qualquer forma, mesmo nos países de sistema continental, os
textos constitucionais, ao incorporar princípios, viabilizam o espaço necessário para interpretações
construtivistas, especialmente por parte da jurisdição constitucional, já sendo até mesmo possível
falar em um “direito judicial”. No Brasil, do mesmo modo, também se observa uma ampliação do
controle normativo do Poder Judiciário, favorecida pela Constituição de 1988, que, ao incorporar
direitos e princípios fundamentais, configurar um Estado Democrático de Direito e estabelecer
princípios e fundamentos do Estado, viabiliza uma ação judicial que recorre a procedimentos
interpretativos de legitimação de aspirações sociais (...). Esse processo de ampliação da ação judicial
pode ser analisado à luz das mais diversas perspectivas: o fenômeno da normatização de direitos,
especialmente em face de sua natureza coletiva e difusa; as transições pós-autoritárias e a edição de
constituições democráticas – seja em países europeus ou latino-americanos – e a consequente
preocupação com o reforço das instituições de garantia do estado de direito, dentre elas a
magistratura e o Ministério Público; as diversas investigações voltadas para a elucidação dos casos
de corrupção a envolver a classe política, fenômeno já descrito como “criminalização da
responsabilidade política”; as discussões sobre a instituição de algum tipo de poder judicial
internacional ou transnacional, a exemplo do tribunal penal internacional; e, finalmente, a
emergência de discursos acadêmicos e doutrinários, vinculados à cultura jurídica, que defendem uma
relação de compromisso entre Poder Judiciário e soberania popular. Se considerarmos qualquer uma
dessas chaves interpretativas, podemos compreender porque a expansão do poder judicial é vista
como um reforço da lógica democrática. Com efeito, seja nos países centrais, seja nos países
periféricos, na origem da expansão do poder dos tribunais, percebe-se uma mobilização política da
sociedade. Não é por outra razão que esse vínculo entre democracia e ativismo judicial vem sendo
41
designado como judicialização da política .
O princípio do ativismo judicial está expressamente previsto no art. 2º, i, do
Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, elaborado pelo
42
Instituto Brasileiro de Direito Processual .
O princípio do ativismo, inspirador da conduta habitual do magistrado, auxilia
na formação de material jurídico positivo, na medida em que se reconhece que a
aplicação do direito é produção de direito como norma agendi. Nas palavras de
Evandro Gueiros Leite, ministro aposentado do STJ:
O ativismo condiz, pois, com a contextualidade do Direito Processual Civil, no pertinente à atividade
jurídica e à ação judiciária: atuação de um Poder (política); função do jus dicere (finalidade);
processo e organização (instrumentalidade). Dentro desse quadro, o estudioso pode aderir a um novo
princípio de legitimidade ou a uma nova ideia de direito, com o juiz como figura principal (...) O
ativismo do juiz atua sobre o comportamento deste no processo, em busca de um direito judicial,
menos submisso às leis ou à doutrina estabelecida e às convenções conceituais. Não importa numa
simples, embora ágil, aplicação da norma e que a deixe inalterada. Nem é atitude voluntariosa, mas
tomada de consciência no presente e diretriz de decisões futuras.
É preciso distinguir o juiz ativo do juiz ativista, pois, como bem observa
Roberto C. Berizonce:
o juiz que pronuncia suas decisões e cumpre os seus deveres funcionais com diligência e dentro dos
prazos legais pode ser considerado ativo; será ativista se, ademais disto, e a partir de uma visão
progressista, evolutiva e reformadora, souber interpretar a realidade de sua época e conferir às suas
decisões um sentido construtivo e modernizante, orientando-se para a consagração dos valores
43
essenciais em vigor .
Eis a nova postura do magistrado que os processualistas denominam de
44
ativismo-cooperativo, em que se busca não a verdade absoluta , mas a verdade
possível em sintonia com os elementos extraídos do diálogo com as partes e da
análise das suas condições políticas, sociais, culturais e econômicas, o que
possibilitará a máxima aproximação entre a realidade e o “devido processo justo
e de resultados”.
Se o princípio do ativismo judicial encontra-se em franca expansão nos sítios
45
do processo civil , salta aos olhos a necessidade de sua urgente aplicação no
terreno do processo do trabalho. Afinal, neste há, em regra, situações de
desigualdades de armas entre os litigantes, sendo o espaço natural para as
demandas metaindividuais e uma atuação mais ativa do magistrado.
Afinal, o art. 84 do CDC e os arts. 139, 297, 497, 499, 500, 536 e 537 do CPC
e 765 da CLT demonstram que o nosso sistema processual estimula (e
determina) uma atuação mais ativa do magistrado em prol de um devido
processo justo a serviço da tutela efetiva dos direitos.
5.5. Princípios comuns ao direito processual civil e ao direito
processual do trabalho
Tendo em vista que os princípios jurídicos dão coerência lógica e teleológica
ao ordenamento jurídico, investigaremos, a seguir, com os olhos voltados para a
teoria geral do processo, alguns princípios, previstos ou não em lei, que
tradicionalmente transitam de forma interativa nos domínios do direito
processual civil e do direito processual do trabalho.
Os princípios a seguir arrolados encontram inspiração no direito processual
constitucional ou no direito constitucional processual, já estudados nas epígrafes
acima.
5.5.1. Princípio dispositivo ou da demanda
Na esfera civil, o poder de provocar a tutela jurisdicional foi entregue à
própria parte interessada, isto é, àquela que se sentisse atingida pelo
comportamento alheio, podendo ela vir a juízo apresentar a sua pretensão, se
quiser ou da forma que lhe aprouver, assim como dela desistir, respeitadas as
exigências legais.
Trata-se, pois, de um direito-liberdade-faculdade da pessoa que se sente lesada
ou ameaçada em relação a um direito de que se diz titular.
O princípio dispositivo, também chamado de princípio da demanda ou da
inércia da jurisdição, é emanação do princípio da livre-iniciativa. Sua residência
legal estava no art. 2º do CPC/73, sendo reafirmado no art. 2º do CPC: “O
processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial,
salvo as exceções previstas em lei”. O princípio em tela também pode ser
extraído dos arts. 141 e 492 do CPC.
Vale dizer, o nosso sistema adota o apotegma romano nemo judex sine actore,
segundo o qual sem autor não há jurisdição, cabendo aqui a observação de Ada
Pellegrini Grinover, para quem o sistema confere às pessoas o poder dispositivo,
sendo certo que “esse poder dispositivo é quase absoluto, no processo civil,
mercê da natureza do direito material que se visa atuar. Sofre limitação quando o
direito material é de natureza indisponível, por prevalecer o interesse público
46
sobre o privado” .
No direito processual do trabalho, há algumas exceções ao princípio
dispositivo, uma vez que neste setor especializado há previsão, por exemplo, da
reclamação trabalhista instaurada por ofício oriundo da Superintendência
Regional do Trabalho – SRT (CLT, art. 39), da execução promovida ex officio
pelo juiz (CLT, art. 878) e da “instauração da instância” pelo juiz presidente do
Tribunal, nos casos de greve (CLT, art. 856). Sobre esta última norma
consolidada, parece-nos que ela já se mostrava incompatível com a redação
original do art. 114, §§ 2º e 3º, da CF, entendimento que se reforça pela sua
novel redação introduzida pela EC n. 45/2004.
5.5.2. Princípio inquisitivo ou do impulso oficial
O princípio inquisitivo está consagrado expressamente no art. 2º do CPC, que
dispõe textualmente: “O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve
por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei” (grifos nossos).
Após o ajuizamento da ação, o juiz assume o dever de prestar a jurisdição de
acordo com os poderes que o ordenamento jurídico lhe confere.
No que concerne à imbricação deste princípio com o princípio dispositivo, é
importante a advertência de Ada Pellegrini Grinover, para quem “o processo
civil não é mais eminentemente dispositivo como era outrora; impera, portanto,
no campo processual penal, como no campo processual civil, o princípio da livre
investigação das provas, embora com doses maiores de dispositividade no
47
processo civil” .
O princípio do impulso oficial também é extraído do art. 485, II e III, do CPC,
que permite a extinção do processo, sem resolução do mérito, por contumácia
das partes.
No que concerne ao direito processual do trabalho, o art. 765 da CLT
estabelece que “os Juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na
direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo
determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas”.
Além disso, há algumas hipóteses que operacionalizam o princípio inquisitivo
no direito processual do trabalho, a saber: a reclamação trabalhista instaurada
pelo juiz do trabalho em virtude de expediente (processo administrativo) oriundo
da Superintendência Regional do Trabalho (CLT, art. 39) e a execução
promovida ex officio (CLT, art. 878).
Além disso, o art. 139, II, III, IV, VI, VII, VIII, IX e X, do CPC enaltece o
princípio inquisitivo, sendo estas regras aplicáveis supletiva e subsidiariamente
ao processo do trabalho pela existência de lacuna e ausência de
incompatibilidade com a principiologia do processo laboral (CLT, art. 769; CPC,
art. 15).
5.5.3. Princípio da instrumentalidade
O processo não é um fim em si mesmo. Ao revés, o processo deve ser
instrumento de Justiça. É por meio dele que o Estado presta a jurisdição,
dirimindo conflitos, promovendo a pacificação e a segurança aos
jurisdicionados.
Nesse sentido, é que se diz que o processo deve estar a serviço do direito
material, e não o contrário. O processo é meio, é instrumento, é método de
realização do direito material.
Princípio da instrumentalidade, também chamado de princípio da finalidade,
exsurge quando a lei prescreve que o ato processual deve ser realizado de
determinada forma, sem cominar nulidade, e o juiz considerará válido o ato se,
realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade.
O CPC, em seus arts. 180 e 277, consagra o princípio da instrumentalidade.
Essas normas são aplicáveis subsidiária e supletivamente ao direito processual
do trabalho, por força do art. 769 da CLT e do art. 15 do CPC.
5.5.4. Princípio da impugnação especificada
Corolário do contraditório, o princípio da impugnação especificada está
previsto no art. 341 do CPC, segundo o qual: “Incumbe também ao réu
manifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição
inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas”.
A inobservância do princípio da impugnação especificada deságua na
presunção de veracidade dos fatos não impugnados.
É preciso advertir, no entanto, que esse ônus atribuído ao réu não ocorrerá se:
I – não for admissível, a seu respeito, a confissão; II – a petição inicial não
estiver acompanhada de instrumento que a lei considerar da substância do ato;
III – estiver em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto.
É importante ressaltar que, nos termos do parágrafo único do art. 341 do CPC:
“O ônus da impugnação especificada dos fatos não se aplica ao defensor público,
ao advogado dativo e ao curador especial”.
Há cizânia doutrinária quanto à incidência do princípio da impugnação
específica nos domínios do processo do trabalho. O maior argumento invocado
reside na permissão do jus postulandi (CLT, art. 791), que, em princípio,
impediria a aplicação supletiva do art. 341 do CPC.
Cremos, porém, que a razão está com a corrente que admite a aplicação
subsidiária da norma do direito processual civil.
Como bem salienta Júlio César Bebber, em obra de fôlego, “a incumbência
destinada ao réu para que se manifeste precisamente quanto às alegações do
autor são de ordem lógica e de bom senso, não devendo ser confundida com
48
questões técnicas” .
No mesmo sentido, Wagner Giglio pontifica: “A resposta deve examinar os
fatos com exaustão e fazer-se acompanhar da prova documental. A defesa por
negação geral não produz efeito, correspondendo à inexistência de
49
contestação” .
5.5.5. Princípio da estabilidade da lide
O princípio da estabilidade da lide informa que se o autor já propôs sua
demanda e deduziu os seus pedidos, e se o réu já foi citado para sobre eles se
pronunciar, não poderá mais o autor modificar sua pretensão sem anuência do
réu e, depois de ultrapassado o momento da defesa, nem mesmo com o
consentimento de ambas as partes isso será possível.
O princípio da estabilidade da lide ou da demanda está consagrado no plano
subjetivo e no plano objetivo.
O art. 108 do CPC consagra o critério subjetivo da estabilização da demanda.
No plano objetivo, o princípio em tela está inscrito no art. 329 do CPC,
segundo o qual o autor poderá:
I – até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento
do réu;
II – até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento
do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo
de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo à reconvenção e à respectiva causa de pedir.
No que tange à aplicação do princípio da estabilização da demanda no
processo do trabalho, convém lembrar que não há o instituto do saneamento
processual, razão pela qual, a nosso ver, embora lacunoso o texto obreiro, a
aplicação supletiva do CPC deve merecer a necessária adaptação quando
transplantada para o processo especializado.
Assim, tendo em vista que no processo do trabalho a tentativa de conciliação é
realizada antes mesmo da apresentação da defesa do réu (CLT, arts. 846 e 847),
seria ilógico não permitir a alteração (ou aditamento) do pedido ou da causa de
pedir contidos na petição inicial, desde que – é claro – isso não implique
violação aos princípios do contraditório, da economia e da celeridade, os quais,
segundo pensamos, não serão olvidados se o juiz conceder prazo ao réu para se
pronunciar sobre as alterações ou aditamentos pretendidos pelo autor.
Os arts. 338 e 339 do CPC permitem, em determinados casos, a alteração da
petição inicial para substituição do réu, o que, a rigor, já evidencia uma certa
relativização do princípio da estabilização da lide. Tais dispositivos podem ser
aplicados no processo do trabalho (CLT, art. 769), desde que o autor não sofra as
sanções pecuniárias previstas no parágrafo único do art. 338 do CPC.
5.5.6. Princípio da eventualidade
As partes devem alegar, na oportunidade própria prevista em lei, ou por
ocasião do exercício de faculdade processual, todas as matérias de defesa ou de
seu interesse. É o princípio da eventualidade, que está inserto no art. 336 do
CPC, in verbis: “Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa,
expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e
especificando as provas que pretende produzir”.
Discute-se a aplicação do princípio da eventualidade, que é muito próximo do
princípio da impugnação especificada, nos sítios do processo trabalhista. Os
argumentos pró e contra são praticamente os mesmos já apontados no item 5.5.4,
supra.
Ademais, se admitirmos a aplicação do princípio da impugnação especificada
no processo do trabalho, pensamos ser de todo conveniente, tendo em vista a
lacuna normativa do texto obreiro (CLT, art. 769), também admitirmos a adoção
do princípio da eventualidade, que não é incompatível com a principiologia da
processualística laboral. Todavia, é preciso que o juiz do trabalho aja com
razoabilidade e necessária prudência (CPC, art. 8º). Para tanto, deverá o
magistrado, expressamente, orientar ou advertir as partes no sentido de que
deverão produzir todas as suas alegações no momento oportuno, sob pena de
serem consideradas verdadeiras as alegações do autor (ou do réu) não
impugnadas tempestivamente.
5.5.7. Princípio da preclusão
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O princípio da preclusão decorre do princípio dispositivo e da própria
logicidade do processo, que é o “andar para a frente”, sem retornos a etapas ou
momentos processuais já ultrapassados.
Este princípio, que já era adotado no CPC/73, é reafirmado no art. 278 do
CPC, segundo o qual “a nulidade dos atos deve ser alegada na primeira
oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão”.
O parágrafo único do referido artigo excepciona a incidência da regra da
preclusão, ao dispor que: “Não se aplica o disposto no caput às nulidades que o
juiz deva decretar de ofício, nem prevalece a preclusão provando a parte
legítimo impedimento”.
O princípio em tela também está previsto no art. 507 do CPC, segundo o qual
“é vedado à parte discutir no processo as questões já decididas a cujo respeito se
operou a preclusão”. Essa norma tem por destinatários todos os que figuram no
processo, inclusive o juiz, na medida em que este não poderá examinar questão
já superada, sendo-lhe permitido, no entanto, a qualquer momento, antes da
prolação da sentença, conhecer de questão de ordem pública, tal como preveem
os arts. 485, § 3º, 337, § 5º, e 342, II, do CPC.
No âmbito do direito processual do trabalho, o princípio da preclusão
encontra-se implícito no art. 795 da CLT, que diz: “As nulidades não serão
declaradas senão mediante provocação das partes, as quais deverão argui-las à
primeira vez em que tiverem de falar em audiência ou nos autos”.
Tem-se entendido que, em virtude da audiência una legalmente prevista no
processo do trabalho, e, também, em razão da inexistência de recurso próprio
para atacar imediatamente as decisões interlocutórias, o prazo para a parte
manifestar sua irresignação – o chamado protesto nos autos – pode ser feito até
as razões finais.
Não há como negar a incidência do princípio da preclusão no direito
processual do trabalho, pois a própria CLT, no seu art. 879, §§ 2º e 3º, o prevê
expressamente.
Analisaremos, a seguir, a classificação que vem sendo adotada pela doutrina a
respeito da preclusão.
5.5.7.1. Preclusão consumativa
É a que ocorre com a própria prática do ato processual, isto é, uma vez
praticado o ato, não poderá a parte fazê-lo novamente (exemplo: interposição
tempestiva do recurso ordinário impede que outro recurso ordinário seja
interposto contra a mesma decisão).
5.5.7.2. Preclusão temporal
É a mais conhecida. Opera-se a preclusão temporal quando a parte não pratica
um ato processual no prazo legalmente previsto, ou quando o pratica
serodiamente (exemplo: perda do prazo para interposição de um recurso).
5.5.7.3. Preclusão lógica
É a perda da prática de um ato, por estar em contradição com atos anteriores,
ofendendo a lógica do comportamento das partes. A preclusão lógica, portanto,
ocorre quando a parte pratica um ato incompatível com o já praticado (exemplos:
CLT, art. 806, que veda à “parte interessada suscitar conflitos de jurisdição
quando já houver oposto na causa exceção de incompetência”, ou seja, se a parte
interessada excepcionou a incompetência, implica preclusão lógica para sua
pretensão posterior de suscitar o conflito de competência; em vez de recorrer da
sentença, a parte simplesmente cumpre o comando nela prescrito; este ato
implica preclusão lógica do direito de recorrer).
5.5.7.4. Preclusão ordinatória
É a perda da possibilidade de praticar o ato (ou exercer faculdade), se
precedido do exercício irregular da mesma possibilidade. Em outros termos, a
validade de um ato posterior depende da prática de um ato anterior (exemplos:
não podem ser recebidos os embargos do devedor antes de garantido o juízo pela
penhora, não será conhecido o recurso se não houve o pagamento das custas).
5.5.7.5. Preclusão máxima
Também conhecida por coisa julgada, consiste na perda do prazo para a
interposição de recurso contra sentença que transitou em julgado com ou sem
resolução de mérito. Por este princípio, é defeso à parte pleitear, e ao juiz
decidir, no mesmo processo em que houve a preclusão máxima (coisa julgada).
A coisa julgada constitui uma garantia fundamental do cidadão e encontra
fundamento na necessidade de segurança das relações jurídicas processuais,
impedindo que no mesmo processo sejam rediscutidas questões já decididas por
sentença não mais sujeita a recurso.
O direito processual do trabalho agasalha, expressamente, o princípio da
preclusão máxima, como se infere do art. 836 da CLT.
5.5.7.6. Preclusão pro judicato
O art. 836 da CLT veda ao juiz conhecer de questões já decididas, salvo nas
hipóteses de interposição de embargos de declaração ou de ajuizamento de ação
rescisória.
Outra exceção ao princípio da preclusão pro judicato no processo do trabalho
é extraída do juízo de admissibilidade do Recurso de Revista, que é feito pelo
órgão a quo e pelo ad quem. O pronunciamento do primeiro não gera preclusão
pro judicato para o segundo, que tem o poder-dever de proceder a novo exame
dos pressupostos de admissibilidade do recurso independentemente de
provocação da parte contrária.
5.5.8. Princípio da economia processual
Trata-se de princípio aplicável em todos os ramos do direito processual, e
consiste em obter da prestação jurisdicional o máximo de resultado com o
mínimo de atos processuais, evitando-se dispêndios desnecessários de tempo e
dinheiro para os jurisdicionados.
O princípio da economia processual autoriza o juiz a aproveitar ao máximo os
atos processuais já praticados, tal como prevê, por exemplo, o § 3º do art. 1.013
do CPC, que permite ao tribunal decidir desde logo o mérito quando, em alguns
casos, reformar ou anular a sentença.
5.5.9. Princípio da perpetuatio jurisdictionis
Melhor seria falar não em princípio da perpetuação da jurisdição, mas, sim,
em princípio da perpetuação da competência. Este princípio, que já estava
previsto no art. 87 do CPC/73, foi mantido pelo art. 43 do CPC, segundo o qual a
competência é fixada no momento em que a ação é proposta, sendo irrelevantes
as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo
quando suprimirem o órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta.
Este princípio é relativizado nos domínios dos processos coletivos, como se
infere do art. 98, § 2º, I, do CDC.
5.5.10. Princípio do ônus da prova
Este princípio já estava previsto no art. 333 do CPC/73, que diz: “O ônus da
prova incumbe: I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito; II – ao
réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito
do autor”.
O direito processual do trabalho consagrava-o na redação original do art. 818
da CLT, in verbis: “A prova das alegações incumbe à parte que as fizer”.
Modernamente, tem-se mitigado o rigor das normas acima transcritas, quando
o juiz, diante do caso concreto, verificar a existência de dificuldades para o
trabalhador se desincumbir do onus probandi. Daí o surgimento de um novo
princípio, que permite ao juiz inverter o ônus da prova de acordo com a aptidão
de quem se encontra em melhores condições de trazer a juízo a prova da verdade
real.
O próprio CDC, que, segundo pensamos, aceita a aplicação subsidiária na
espécie, admite a inversão do ônus da prova, como se depreende do seu art. 6º,
VIII, que prescreve, entre os direitos básicos do consumidor, a “facilitação da
defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor,
no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando
for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias da experiência”.
Ora, se é uma regra aplicável ao processo civil, cremos que, a par da omissão
do texto consolidado, não existe qualquer incompatibilidade na sua aplicação
supletória, porquanto em perfeita sintonia com a principiologia protetiva do
direito processual do trabalho (CLT, art. 769). Aliás, há nítida correlação social e
política entre trabalhadores e consumidores hipossuficientes.
Ademais, a jurisprudência trabalhista já trilhava a direção aqui proposta, como
se depreende da Súmula 212 do TST, segundo a qual “o ônus de provar o
término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o
despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de
emprego constitui presunção favorável ao empregado”.
Nas ações trabalhistas submetidas ao procedimento sumaríssimo, há franca
abertura para o juiz do trabalho operacionalizar a aplicação do princípio da
inversão do ônus da prova. Com efeito, diz o art. 852-D, da CLT, que o “juiz
dirigirá o processo com liberdade para determinar as provas a serem produzidas,
considerado o ônus probatório de cada litigante, podendo limitar ou excluir as
que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias, bem como para
apreciá-las e dar especial valor às regras de experiência comum ou técnica”.
O Novo Código de Processo Civil (art. 373, caput, I e II) mantém o princípio
da distribuição estática do ônus da prova previsto no CPC de 1973, mas inova,
substancialmente, ao permitir que “nos casos previstos em lei ou diante de
peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva
dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de
obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de
modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá
dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído”
(CPC, art. 373, § 1º). Vale dizer, o CPC consagra, também, o princípio da
distribuição dinâmica da carga probatória, sendo este novel princípio aplicável
supletiva e subsidiariamente ao processo do trabalho em função da lacuna da
legislação processual obreira, desde que o órgão julgador observe a situação de
hipossuficiência da parte e as peculiaridades do caso concreto.
O novel art. 818 da CLT, com redação dada pela Lei n. 13.467/2017 e
recebendo influência do CPC, passou a dispor expressamente sobre o ônus da
prova no processo do trabalho, inclusive com a possibilidade de distribuição
dinâmica do encargo probatório.
Voltaremos a falar sobre ônus da prova no Capítulo XV, item 5.
5.5.11. Princípio da oralidade
Este princípio não encontra residência em nenhuma norma expressa do CPC
ou da CLT. A rigor, ele se exterioriza interagindo com outros quatro princípios: I
– princípio da imediatidade; II – princípio da identidade física do juiz; III –
princípio da concentração; e IV – princípio da irrecorribilidade imediata das
decisões interlocutórias.
Com a instituição dos chamados Juizados Especiais, o princípio da oralidade
passou a ter um papel de destaque no direito processual civil, que, finalmente,
reconheceu que os resultados, a eficácia do processo e a efetividade da prestação
jurisdicional encontram forte aliado na discussão oral da causa, na presença do
magistrado, a fim de que este possa sopesar a validez e a confiabilidade dos
elementos probatórios nos autos.
No direito processual do trabalho, o princípio da oralidade encontra solo fértil
para a sua aplicação, a começar pela previsão expressa da chamada reclamação
verbal (petição inicial verbal), de que cuida o art. 840, § 2º, da CLT, ou a
possibilidade de defesa oral do reclamado (CLT, art. 847, caput).
Outra manifestação do princípio da oralidade na seara laboral se revela em
audiência, oportunidade em que as partes se dirigem direta e oralmente ao
magistrado, propiciando diversos debates orais (requerimentos, contraditas,
razões finais, protestos etc.), sendo certo que, também oralmente, o magistrado,
via de regra, resolve as questões surgidas em audiência, mediante registro em
ata.
Pode-se dizer, ainda, que, nas chamadas “ações trabalhistas de alçada”,
disciplinadas pela Lei n. 5.584/70 (art. 2º, § 3º), há o nítido predomínio da
palavra falada sobre a escrita.
5.5.11.1. Princípio da imediatidade ou da imediação
O princípio da imediatidade ou da imediação significa que o juiz da causa está
obrigado ao contato direto com as partes e a prova testemunhal ou pericial, com
a própria coisa litigiosa ou com terceiros, para que possa obter os elementos
necessários ao esclarecimento dos fatos alegados pelas partes, e, em
consequência, decidir fundamentadamente o processo.
A base legal de sua inserção no direito processual do trabalho está no art. 820
da CLT, segundo o qual as partes e testemunhas serão inquiridas pelo juiz ou
presidente, podendo ser reinquiridas, por seu intermédio, a requerimento das
partes, seus representantes ou advogados.
O princípio da imediatidade é aplicável, com maior ênfase, no direito
processual do trabalho, em razão da larga incidência da prova oral.
Este princípio estava previsto no CPC de 1973 e também comparece, de
roupagem nova, nos arts. 139, VIII, e 481 do CPC. O art. 459 do CPC, ao dispor
que as “perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha,
começando pela que a arrolou”, relativiza o princípio da imediatidade. O art. 11
da IN n. 39 do TST, no entanto, dispõe que: “Não se aplica ao Processo do
Trabalho a norma do art. 459 do CPC no que permite a inquirição direta das
testemunhas pela parte (CLT, art. 820)”.
5.5.11.2. Princípio da identidade física do juiz
O princípio da identidade física do juiz estava previsto no art. 132 do CPC/73,
in verbis: “O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide,
salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido
ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor”.
Este princípio, segundo entendimento adotado pela Súmula 136 do TST,
mesmo depois da extinção da representação classista nas Varas do Trabalho pela
EC n. 24/99, não foi aplicado durante muito tempo no direito processual do
trabalho. Em 2012, porém, o TST editou a Resolução n. 185, cancelando a
Súmula 136, com o que o princípio da identidade física passou a ser aplicado nas
Varas do Trabalho.
O CPC atual não contém nenhum dispositivo semelhante ao art. 132 do CPC
revogado, o que certamente reacenderá as discussões a respeito da própria
existência do princípio da identidade física do juiz nas Varas do Trabalho.
Parece-nos, realmente, que o princípio da identidade física foi extinto na
51
primeira instância .
Nos tribunais, no entanto, o princípio da identidade física é aplicável ao
Relator do processo, uma vez que a simples distribuição do recurso (ou da ação
originária) já vincula esse órgão julgador nos tribunais.
5.5.11.3. Princípio da concentração
O princípio da concentração decorre da aplicação conjunta de vários
princípios procedimentais destinados a regulamentar e orientar a apuração de
provas e a decisão judicial em uma única audiência. Daí o termo “concentração”.
No processo civil, estava previsto nos arts. 331 e 450 do CPC/73 e reaparece
nos arts. 334, 357 e 358 do CPC.
No que concerne ao processo do trabalho, o princípio da concentração está
explícito nos arts. 849 e 852-C da CLT, in verbis:
“Art. 849. A audiência de julgamento será contínua; mas se não for possível, por motivo de força
maior, concluí-la no mesmo dia, o juiz ou presidente marcará a sua continuação para a primeira
desimpedida, independentemente de nova notificação”.
“Art. 852-C. As demandas sujeitas a rito sumaríssimo serão instruídas e julgadas em audiência única,
sob a direção de juiz presidente ou substituto, que poderá ser convocado para atuar simultaneamente
com o titular”.
5.5.11.4. Princípio da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias
No direito processual civil, o princípio em tela encontrava fundamento na
conjugação dos arts. 522, caput, e 497, segunda parte, do CPC/73. O CPC, em
seus arts. 995 e 1.015, restringiu sobremaneira a recorribilidade imediata das
decisões interlocutórias, na medida em que só são agraváveis as decisões
interlocutórias expressa e legalmente previstas.
A base legal do princípio em estudo no direito processual do trabalho está no
art. 893, § 1º, da CLT, segundo o qual “os incidentes do processo serão
resolvidos pelo próprio Juízo ou Tribunal, admitindo-se a apreciação do
merecimento das decisões interlocutórias somente em recurso da decisão
definitiva”.
Vê-se que, na seara laboral, o princípio da irrecorribilidade imediata das
decisões interlocutórias tem aplicabilidade mais enfática, na medida em que a
apreciação das impugnações contra as decisões interlocutórias somente será
admitida em recursos interpostos contra decisão final (sentença, acórdão e
algumas decisões interlocutórias), sendo certo que os arts. 995 e 1.015 do CPC,
ao que nos parece, não são aplicáveis no processo do trabalho, tanto pela
inexistência de lacunas normativas, ontológicas ou axiológicas neste setor
especializado quanto pela incompatibilidade com o princípio da celeridade que
52
informa o processo do trabalho .
5.5.12. Princípio da boa-fé processual
Trata-se de princípio que está intimamente ligado ao princípio da dignidade da
pessoa humana e a um dos objetivos fundamentais da República,
consubstanciado no art. 3º, I, da CF, qual seja, o de “construir uma sociedade
livre, justa e solidária”.
Também chamado de princípio da probidade ou da lealdade, o princípio da
boa-fé processual, que era tratado como dever das partes não proceder com má-
fé, está agora consignado expressamente no art. 5º do CPC (“Aquele que de
qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-
fé”) e reproduzido nos arts. 79, 80 e 81 do mesmo diploma legal.
O princípio da boa-fé processual, portanto, que também constitui um
desdobramento do princípio da boa-fé objetiva do Código Civil, tem por escopo
impor aos litigantes uma conduta ética e de respeito mútuo, que possa ensejar o
curso natural do processo e levá-lo à consecução de seus objetivos: a prestação
jurisdicional de modo célere, adequado, tempestivo e justo.
Havia lacuna normativa na CLT e não víamos qualquer incompatibilidade na
aplicação subsidiária das regras do CPC ao processo do trabalho, sendo certo
que a jurisprudência especializada já vinha admitindo a aplicação do princípio
ora focalizado, conforme se infere dos seguintes julgados:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. FATO NOVO. INEXISTÊNCIA. ARGUIÇÃO DE INCIDENTE
MANIFESTAMENTE INFUNDADO. CONFIGURAÇÃO DE MÁ-FÉ PROCESSUAL. A
interposição de embargos de declaração, a pretexto de apreciação de documento novo, o qual, na
realidade, se refere a fato pretérito, portanto anterior ao julgamento do recurso de revista, evidencia a
má-fé processual do embargante, ao pretender alterar a realidade processual, passível de repreensão
com multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, devidamente corrigido, a reverter ao
reclamante, nos termos dos arts. 17, II, VI e VII, e 18, caput, do Código de Processo Civil. Embargos
de declaração a que se nega provimento, com aplicação de multa (TST-ED-RR 177000-
03.2007.5.09.0022, Rel. Min. Walmir Oliveira da Costa, j. 26-6-2013, 1ª T., DEJT 28-6-2013).
MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONFISSÃO AUTORA QUANTO AO PEDIDO DE
DEMISSÃO. MÁ-FÉ PROCESSUAL CONFIGURADA. A reclamante alegou inicialmente ter sido
dispensada sem justa causa e que “a reclamada, agindo de má-fé processual, com intuito único de
burlar a legislação obreira com relação ao pagamento dos direitos da autora, impôs que a mesma
assinasse um pedido de demissão” (item 3 da exordial). No entanto, em audiência confessou que foi
sua a iniciativa de romper o contrato de trabalho. Má-fé configurada, com a aplicação de multa à
autora. Recurso da reclamante a que se nega provimento (TRT-2 – RO 00028618120125020090, Rel.
Des. Cíntia Táffari, j. 26-11-2013, 13ª T., DEJT 4-12-2013).
Parece-nos que o princípio da boa-fé abarca tanto a boa-fé subjetiva quanto a
boa-fé objetiva. Aquela relaciona-se à esfera psicológica do ser humano, mais
precisamente a processos internos da psique da pessoa (representações mentais,
intenções e resoluções) para a prática dos atos processuais, sendo, portanto, de
difícil aferição. Esta, ou seja, a boa-fé objetiva, é extraída externamente das
ações e condutas humanas.
Noutro falar, a boa-fé objetiva impõe a todos os que participam do processo
um padrão de comportamento ético e objetivo de honestidade, diligência e
confiança, exigindo, ainda, um estado de cortesia, urbanidade e respeitabilidade
recíprocas .53

5.5.12.1. Dano Processual


A Lei n. 13.467/2017 inseriu na CLT os arts. 793-A a 793-D, que tratam da
responsabilidade por dano processual, nos seguintes termos:
Art. 793-A. Responde por perdas e danos aquele que litigar de má-fé como reclamante, reclamado ou
interveniente.
Art. 793-B. Considera-se litigante de má-fé aquele que:
I – deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;
II – alterar a verdade dos fatos;
III – usar do processo para conseguir objetivo ilegal;
IV – opuser resistência injustificada ao andamento do processo;
V – proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;
VI – provocar incidente manifestamente infundado;
VII – interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.
Art. 793-C. De ofício ou a requerimento, o juízo condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que
deverá ser superior a 1% (um por cento) e inferior a 10% (dez por cento) do valor corrigido da causa,
a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios
e com todas as despesas que efetuou.
§ 1º Quando forem dois ou mais os litigantes de má-fé, o juízo condenará cada um na proporção de
seu respectivo interesse na causa ou solidariamente aqueles que se coligaram para lesar a parte
contrária.
§ 2º Quando o valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa poderá ser fixada em até duas
vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
§ 3º O valor da indenização será fixado pelo juízo ou, caso não seja possível mensurá-lo, liquidado
por arbitramento ou pelo procedimento comum, nos próprios autos.
Art. 793-D. Aplica-se a multa prevista no art. 793-C desta Consolidação à testemunha que
intencionalmente alterar a verdade dos fatos ou omitir fatos essenciais ao julgamento da causa.
Parágrafo único. A execução da multa prevista neste artigo dar-se-á nos mesmos autos.
O princípio da boa-fé, portanto, deve ser observado por “todos os sujeitos do
processo”, e não apenas os sujeitos da lide. Vale dizer, o princípio sob exame
vincula não somente as partes e os terceiros que participam como litigantes da
relação jurídica processual, como também o próprio magistrado, o Ministério
Público (como parte ou custos legis), a Defensoria Pública, os advogados, os
auxiliares da justiça, as testemunhas, os intérpretes, os peritos etc.
O art. 793-A da CLT, no entanto, dispõe que somente responderá por dano
processual o reclamante, o reclamado e o interveniente que litigarem de má-fé.
Já o art. 793-D da CLT prevê que responderá por dano processual a testemunha
que intencionalmente alterar a verdade dos fatos ou omitir fatos essenciais ao
julgamento da causa. As multas aplicadas a título de dano processual serão
cobradas nos próprios autos em que se verificou a prática do ato contrário à boa-
fé processual.
No que concerne à eficácia temporal dos dispositivos supracitados, os arts. 7º
a 10 da IN n. 41/2018 do TST dispõem:
Art. 7º Os arts. 793-A, 793-B e 793-C, § 1º, da CLT têm aplicação autônoma e imediata.
Art. 8º A condenação de que trata o art. 793-C, caput, da CLT, aplica-se apenas às ações ajuizadas a
partir de 11 de novembro de 2017 (Lei n. 13.467/2017).
Art. 9º O art. 793-C, §§ 2º e 3º, da CLT tem aplicação apenas nas ações ajuizadas a partir de 11 de
novembro de 2017 (Lei n. 13.467/2017).
Art. 10. O disposto no caput do art. 793-D será aplicável às ações ajuizadas a partir de 11 de
novembro de 2017 (Lei n. 13.467/2017).
Parágrafo único. Após a colheita da prova oral, a aplicação de multa à testemunha dar-se-á na
sentença e será precedida de instauração de incidente mediante o qual o juiz indicará o ponto ou os
pontos controvertidos no depoimento, assegurados o contraditório, a defesa, com os meios a ela
inerentes, além de possibilitar a retratação.
5.5.13. Princípio da cooperação ou colaboração
Como já adiantamos em linhas pretéritas, o principal objetivo do Estado
Democrático de Direito não é somente positivar os direitos fundamentais,
especialmente os sociais, como também, e principalmente, garanti-los. Daí a
importância do Poder Judiciário (e do processo) na promoção da defesa dos
direitos fundamentais, especialmente por meio do princípio da cooperação que,
segundo lição de Fredie Didier Jr.,
orienta o magistrado a tomar uma posição de agente-colaborador do processo, de participante ativo
do contraditório e não mais a de um mero fiscal de regras. Essa participação não se resumiria à
ampliação dos seus poderes instrutórios ou de efetivação de decisões judiciais (arts. 131 e 461, § 5º,
do CPC). O magistrado deveria adotar uma postura de diálogo com as partes e com os demais
sujeitos do processo: esclarecendo suas dúvidas, pedindo esclarecimentos quando estiver com
dúvidas e, ainda, dando orientações necessárias quando for o caso. Encara-se o processo como
produto de atividade cooperativa: cada qual com as suas funções, mas todos com o objetivo comum,
que é a prolação do ato final (...). O princípio da cooperação gera os seguintes deveres para o
magistrado (seus três aspectos): a) dever de esclarecimento; b) dever de consultar; c) dever de
54
prevenir .
O art. 6º do CPC reconhece expressamente o princípio em tela ao prescrever
que: “Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se
obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.
O princípio da cooperação vincula-se ao princípio da boa-fé previsto no art. 5º
do CPC e já analisado no item precedente.
5.5.14. Princípio da vedação da decisão surpresa
O princípio da vedação da decisão surpresa é expressamente extraído do art.
10 do CPC, segundo o qual:
O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual
não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual
deva decidir de ofício.
O princípio em tela encontra suporte no direito fundamental de participação
do cidadão na Administração Pública da Justiça e se conexiona intimamente com
o princípio do contraditório, na medida em que impõe ao órgão julgador, em
todos os graus de jurisdição, o dever de ouvir as partes sobre as decisões
adotadas, ainda que se trate de matéria conhecível de ofício.
Trata-se de alteração relevante em relação ao CPC de 1973, que implicará
mudanças na prática das decisões dos juízes e tribunais, com repercussões no
processo do trabalho, em função da lacuna do texto consolidado.
A título de exemplos, à luz do princípio da vedação da decisão surpresa, o
juiz, sem antes intimar previamente as partes para que se manifestem nos autos,
não poderá: indeferir a petição inicial por inépcia, pronunciar de ofício a
prescrição ou a decadência etc.
Ficam, porém, excepcionadas da aplicação do princípio da vedação da decisão
surpresa as hipóteses expressamente previstas no parágrafo único do art. 9º do
CPC.
Para concluir este tópico, é importante lembrar que o art. 4º da IN n. 39/2016
do TST (de suspeitável inconstitucionalidade, segundo a Anamatra na ADI
5.516) manda aplicar ao Processo do Trabalho as normas do CPC que regulam o
princípio do contraditório, em especial os arts. 9º e 10, no que vedam a decisão
surpresa. Interessante notar que os §§ 1º e 2º do referido art. 4º da IN n. 39
definem quando ocorre “decisão surpresa”, in verbis:
Art. 4º (...)
§ 1º Entende-se por “decisão surpresa” a que, no julgamento final do mérito da causa, em qualquer
grau de jurisdição, aplicar fundamento jurídico ou embasar-se em fato não submetido à audiência
prévia de uma ou de ambas as partes.
§ 2º Não se considera “decisão surpresa” a que, à luz do ordenamento jurídico nacional e dos
princípios que informam o Direito Processual do Trabalho, as partes tinham obrigação de prever,
concernente às condições da ação, aos pressupostos de admissibilidade de recurso e aos pressupostos
processuais, salvo disposição legal expressa em contrário.
5.5.15. Princípio da primazia da decisão de mérito
O princípio da primazia da decisão de mérito é extraído dos seguintes
dispositivos do CPC:
a) art. 6º, in fine, o qual estabelece o dever de todos os sujeitos do processo para que se obtenha, em
tempo razoável, “decisão de mérito justa e efetiva”;
b) art. 317, que determina ao juiz, antes de proferir decisão sem resolução de mérito, “conceder à
parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício”;
c) art. 321, segundo o qual o juiz deverá, antes de indeferir a petição inicial, conceder prazo ao autor
para que a emende ou a complete, “indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado”;
d) art. 488, que enaltece, desde que possível, a resolução do mérito sempre que for favorável à parte a
quem aproveitaria eventual sentença terminativa.
Dessa forma, o princípio da primazia da decisão de mérito, que é aplicável ao
processo do trabalho (CLT, art. 769; CPC, art. 15), informa que somente em
situações excepcionais e quando não for possível a correção de vícios ou
irregularidades o juiz, depois de conceder oportunidade às partes, poderá
extinguir o processo sem resolução de mérito.
5.5.16. Princípio da observância da ordem cronológica de conclusão de
processos
O princípio da observância da ordem cronológica de conclusão de processos
para proferir sentença ou acórdão está previsto expressamente no art. 12, caput,
do CPC e constitui desdobramento de dois outros princípios: igualdade e
publicidade.
Para concretizar o princípio em exame, os órgãos jurisdicionais deverão
elaborar lista de processos aptos a julgamento, que deverá estar
permanentemente à disposição para consulta pública em cartório e na rede
mundial de computadores.
Nos termos do § 6º do art. 12 do CPC, ocupará o primeiro lugar na lista o
processo que:
I – tiver sua sentença ou acórdão anulado, salvo quando houver necessidade de realização de
diligência ou de complementação da instrução;
II – se enquadrar na hipótese do art. 1.040, II, do CPC.
Não há obrigatoriedade de observância do princípio sob exame (CPC, art. 12,
§ 2º) quando se tratar de:
I – sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do
pedido;
II – julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de
casos repetitivos;
III – julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas;
IV – decisões proferidas com base nos arts. 485 e 932 do CPC;
V – julgamento de embargos de declaração;
VI – julgamento de agravo interno;
VII – preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça;
VIII – processos criminais, nos órgãos jurisdicionais que tenham competência penal;
IX – causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada.
Elaborada a lista dos processos aptos a julgamento, deverá ser respeitada a
ordem cronológica das conclusões entre as preferências legais. Após a inclusão
do processo na referida lista, o requerimento formulado pela parte não altera a
ordem cronológica para a decisão, exceto quando implicar a reabertura da
instrução ou a conversão do julgamento em diligência.
Decidido o requerimento previsto no § 4º do art. 12 do CPC, o processo
retornará à mesma posição em que anteriormente se encontrava na lista.
O princípio da observância da ordem cronológica para proferir sentença ou
acórdão, por estar em sintonia com os princípios da isonomia e publicidade,
deverá ser aplicado com razoabilidade e proporcionalidade tanto no processo
civil quanto no processo do trabalho. Nesse sentido, a Lei n. 13.256, de 4-2-
2016, alterou o art. 12 do CPC, passando a dispor que os “juízes e os tribunais
atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir
sentença ou acórdão”.
6. PRINCÍPIOS PECULIARES DO DIREITO PROCESSUAL DO
TRABALHO
Não há a desejável uniformidade entre os teóricos a respeito da existência de
princípios peculiares (ou próprios) do direito processual do trabalho. Alguns
entendem que os princípios do direito processual do trabalho são os mesmos do
direito processual civil, apenas ressaltando ênfase maior quando da aplicação de
alguns princípios procedimentais no processo laboral. Outros sustentam que
existem apenas dois ou três princípios próprios do direito processual do trabalho.
É de suma importância reconhecer e comprovar a existência, ou não, de
princípios próprios do direito processual do trabalho, pois isso constitui um dos
critérios para justificar a própria autonomia desse segmento da ciência
processual.
Cerramos fileira com a corrente doutrinária que sustenta a existência de
princípios próprios do direito processual do trabalho que o diferencia do direito
processual comum. Reconhecemos, porém, que a EC n. 45/2004, ao transferir
para a competência da Justiça do Trabalho outras demandas diversas das
oriundas da relação de emprego, e até mesmo relações entre empregadores e o
Estado, bem como entre sindicatos, acabou colocando em xeque a afirmação da
existência dos princípios específicos do processo do trabalho.
É preciso, contudo, atentar para a especialidade do direito processual do
trabalho, o qual se notabilizou pela efetivação dos direitos sociais
constitucionalmente assegurados aos trabalhadores subordinados. No momento
em que a especialidade do direito processual do trabalho é desfocada, corre-se o
risco de desmoronamento dos seus princípios, o que recomenda ao intérprete e
ao aplicador do novo texto constitucional redobrada cautela, pois a
“desestruturação dos princípios significa uma tentativa ignóbil de desmantelo do
aparato jurisdicional trabalhista, uma vez que sua atenuação reflete o
55
esfacelamento da Justiça do Trabalho” .
Reconhecemos, outrossim, que alguns princípios fundamentais do Novo
Código de Processo Civil deverão ser aplicados ao processo do trabalho por
meio da heterointegração desses dois subsistemas processuais.
Assim, parece-nos inegável que os princípios explícitos do art. 8º do CPC
devem ser aplicados ao processo do trabalho, seja pelas suas lacunas normativa,
axiológica ou ontológica, seja por guardarem rigorosa compatibilidade com a
sua principiologia peculiar.
Noutro dizer, também passam a ser princípios fundamentais do processo do
trabalho: a dignidade da pessoa humana, a razoabilidade, a proporcionalidade, a
legalidade, a impessoalidade, a publicidade e a eficiência.
Plasma-se do citado art. 8º do CPC que o legislador invocou princípios
fundamentais da própria Constituição (dignidade da pessoa humana e
razoabilidade) e princípios específicos da Administração Pública (legalidade,
publicidade e eficiência), de modo a considerar que a prestação jurisdicional
também passa a ser considerada um serviço público essencial e indispensável à
população e à realização dos direitos e deveres fundamentais.
Vale dizer, a prestação jurisdicional, por força do art. 8º do CPC, passará
definitivamente a observar os princípios regentes da Administração Pública, o
que, certamente, influenciará o próprio conceito de jurisdição, uma vez que esta,
além de ser função-dever-poder-atividade estatal de pacificar os conflitos sociais,
passará a ser também um serviço público a ser prestado com arrimo nos
princípios dispostos no art. 37, caput, da CF.
De tal arte, o magistrado, além das suas funções institucionais tradicionais
voltadas à prestação jurisdicional, também deverá atuar como um verdadeiro
administrador público da Justiça, um autêntico gestor público dos processos sob
sua responsabilidade.
Para tanto, haverá necessidade de formação continuada dos juízes, de modo a
propiciar-lhes capacitação em gestão:
a) de pessoas, a fim de que o “serviço público da justiça” seja prestado para
promover a dignidade humana tanto dos jurisdicionados (partes, terceiros,
advogados etc.) como também dos próprios servidores públicos do Judiciário e
demais auxiliares judiciários; e
b) de processos, pois estes deverão ser ordenados, disciplinados e
interpretados sob o enfoque dos princípios norteadores dos atos praticados pela
Administração Pública, quais sejam os princípios da legalidade, moralidade,
impessoalidade, publicidade e eficiência.
Passaremos, em seguida, a enumerar os princípios tradicionalmente peculiares
do direito processual do trabalho.
6.1. Princípio da proteção processual
56
Nas pegadas de Américo Plá Rodriguez , podemos dizer que o princípio da
proteção ou tutelar é peculiar tanto ao direito do trabalho quanto ao direito
processual do trabalho. Por meio dele, busca-se compensar a desigualdade
existente na realidade socioeconômica (entre empregado, geralmente o
reclamante, e empregador, via de regra o reclamado) com uma desigualdade
jurídica em sentido oposto.
57
Daí a razão pela qual Manoel Antonio Teixeira Filho advoga a existência, no
processo do trabalho, do princípio da correção da desigualdade, tendo em vista
a inferioridade de natureza econômica e técnica do trabalhador em relação ao
empregador.
No Estado Democrático de Direito, que tem como um dos seus objetivos a
redução das desigualdades sociais e regionais (CF, art. 3º, III), parece-nos que tal
redução é efetivada por meio da proteção jurídica da parte fraca tanto na relação
de direito material quanto na relação de direito processual.
O princípio da proteção processual, portanto, deriva da própria razão de ser do
processo do trabalho, o qual foi concebido para efetivar os direitos materiais
reconhecidos pelo Direito do Trabalho, sendo este ramo da árvore jurídica criado
exatamente para compensar ou reduzir a desigualdade real existente entre
empregado e empregador, naturais litigantes do processo laboral.
Sublinha a propósito o mexicano Enrique Alvarez del Castillo: “Restabelecer
e manter a verdadeira igualdade processual é um propósito fundamental do
58
direito processual do trabalho” no que é seguido por Mario Pasco, cuja reflexão
merece ser transcrita literalmente:
Lo dicho respecto del derecho sustantivo es plenamente válido para el procesal. Las desigualdades, el
desequilibrio, la posición preeminente del empleador frente al trabajador propios de la relación del
trabajo, se trasladan a la relación jurídico procesal, donde adquiren nuevas manifestaciones. Dentro
de las diferencias que se marcan entre la controversia común y la laboral, acaso la más evidente es la
múltiple desigualdad jurídica, económica y probatoria que separa a los contendientes en un litigio de
59
trabajo y que hacen de un – el empleador – la parte fuerte y del otro – el trabajador – la parte débil .
Entre os autores pátrios que reconhecem ser o princípio da proteção peculiar
ao processo do trabalho destaca-se Wagner D. Giglio, para quem,
embora muitas outras fossem necessárias, algumas normas processuais de proteção ao trabalhador já
existem, a comprovar o princípio protecionista. Assim, a gratuidade do processo, com isenção de
pagamento de custas e despesas, aproveita aos trabalhadores, mas não aos patrões; a assistência
judiciária gratuita é fornecida ao empregado, mas não ao empregador; a inversão do ônus da prova
por meio de presunções favorece o trabalhador, nunca ou raramente o empregador; o impulso
processual ex officio beneficia o empregado, já que o empregador, salvo raras exceções, é o réu,
60
demandado, e não aufere proveito da decisão: na melhor das hipóteses, deixa de perder .
Acrescentamos, ainda, que a ausência dos litigantes à audiência trabalhista
implica o arquivamento dos autos para o autor (geralmente, o empregado) e
revelia e confissão ficta para o réu (em regra, o empregador). Esse tratamento
legal diferenciado constitui a exteriorização do princípio de proteção ao
trabalhador (natural litigante no polo ativo da demanda) no âmbito do processo
laboral. É o que deflui do art. 844 da CLT, segundo o qual o “não
comparecimento do reclamante à audiência importa o arquivamento da
reclamação, e o não comparecimento do reclamado importa revelia, além de
confissão, quanto à matéria de fato”.
Na mesma esteira, Coqueijo Costa convida-nos à seguinte reflexão:
O processo não é um fim em si mesmo, mas instrumento de composição de lides, que garante
efetividade do direito material. E como este pode ter natureza diversa, o direito processual, por seu
61
caráter instrumental, deve saber adaptar-se a essa natureza diversa .
A desigualdade econômica, o desequilíbrio para a produção de provas, a
ausência de um sistema de proteção contra a despedida imotivada, o desemprego
estrutural e o desnível social e cultural entre empregado e empregador,
certamente, são realidades trasladadas para o processo do trabalho, sendo,
portanto, imprescindível a existência de um princípio de proteção ao trabalhador,
que é destinatário de direitos humanos sociais e fundamentais. Na verdade, o
princípio da proteção visa salvaguardar direitos sociais, cujos titulares são
juridicamente fracos e, por isso, dependem da intervenção do Estado-Juiz para o
restabelecimento dos postulados da liberdade e da igualdade material entre as
partes da relação jurídica processual.
Com efeito, a própria ideia de justiça deixa patente que “justo é tratar
desigualmente os desiguais, na mesma proporção em que se desigualam, e o
favorecimento é qualidade da lei, e não defeito do juiz, que deve aplicá-la com
objetividade, sem permitir que suas tendências pessoais influenciem seu
62
comportamento” .
A jurisprudência vem admitindo a aplicação do princípio da proteção no
processo do trabalho, como se vê dos seguintes arestos:
Da aplicação do Princípio da Proteção, que vigora no processo do trabalho, tem-se que toda prestação
de serviço traz, em si, a presunção (relativa) da subordinação, salvo demonstração cabal em
contrário, a cargo do empregador (TRT, 6ª R., RO 00027.2003.006.06.00-9, 1ª T., Rel. Juíza Valéria
Gondim Sampaio, j. 23-9-2003, unânime, DOE 25-10-2003).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. DESCABIMENTO. (...)
HONORÁRIOS PERICIAIS. SUCUMBÊNCIA PARCIAL. PROPORCIONALIDADE NO
PAGAMENTO. DESCABIMENTO. Na Justiça do Trabalho, em face do princípio da proteção do
trabalhador, não prevalece a regra do art. 21 do CPC. Sucumbente a Reclamada, ainda que apenas em
parte, no objeto da perícia, é sua a responsabilidade pelo pagamento integral dos honorários devidos
ao expert. Agravo de instrumento conhecido e desprovido (TST-AIRR 43385/2002-902-02-40, 3ª T.,
Rel. Min. Alberto Bresciani, j. 30-5-2007, DJU 22-6-2007).
REMESSA OFICIAL. DECRETO-LEI N. 779/69. LEI N. 10.352/2001. ART. 475, § 2º, DO CPC.
LIMITAÇÃO A 60 (SESSENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. APLICABILIDADE AO PROCESSO
DO TRABALHO. Aplica-se ao processo do trabalho as disposições constantes do § 2º do art. 475 do
CPC, inseridas pela Lei n. 10.352/2001, que dispensa a remessa oficial nas condenações de valor não
excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, tendo em vista a omissão existente na legislação
processual trabalhista, que não contém limitação relacionada ao valor da condenação e, também, em
face da compatibilidade com o processo laboral. Registre-se, ainda, que tal aplicabilidade vem ao
encontro dos princípios que influenciam ou orientam o processo do trabalho, principalmente os
princípios da proteção ao hipossuficiente, da razoabilidade, da celeridade e da economia processual.
Remessa oficial não conhecida (TRT, 23ª R., AI e Recurso Ordinário de Ofício n.
01284.2002.003.23.00-5, Rel. Juíza Maria Berenice, j. 2-12-2003, publ. 27-1-2004).
Todas essas considerações são aplicáveis na hipótese em que o processo do
trabalho se apresenta como instrumento de realização dos direitos sociais dos
trabalhadores previstos no ordenamento jurídico, tanto no plano constitucional
quanto no plano infraconstitucional.
Reconhecemos, não obstante, que a ampliação da competência da Justiça do
Trabalho para processar e julgar outras relações de trabalho (EC n. 45/2004),
bem como para as ações relativas à cobrança de multas administrativas e
contribuições previdenciárias, passa a exercer grande influência para o
enfraquecimento do princípio da proteção processual. Afinal, nas ações de
cobrança de multas impostas pelos órgãos da fiscalização do trabalho em que
figuram empregador, como réu, e União, como autora, ou nas ações de disputa
de representatividade de categoria entre dois sindicatos, indaga-se: quem é o
hipossuficiente? Há realmente uma parte destinatária do princípio da proteção?
Surgem, nesses casos, “duelos” entre duas pessoas jurídicas, que não permitem
ao juiz adotar o princípio da proteção, já que são partes presumivelmente iguais.
Além disso, a Lei n. 13.467/2017, que alterou diversos dispositivos da CLT,
tanto no aspecto material quanto no processual, desferiu um duro golpe no
princípio de proteção processual ao trabalhador, como, por exemplo, a
obrigatoriedade do depósito recursal (CLT, art. 899, § 4º), que era exigido apenas
do empregador, e nunca do empregado, passou a ser exigível de qualquer parte,
haja vista que deverá ser feito em conta vinculada ao juízo, e não mais em conta
vinculada do FGTS.
Igualmente, no tocante às despesas processuais, pois, com o advento da Lei n.
13.467/2017, o trabalhador poderá ser condenado no pagamento de honorários
advocatícios e honorários periciais, mesmo sendo beneficiário da justiça gratuita
(CLT, arts. 790-B, caput e § 4º, e 791, caput, §§ 3º e 4º).
6.2. Princípio da finalidade social do processo
Segundo Humberto Theodoro Júnior, “o primeiro e mais importante princípio
que informa o processo trabalhista, distinguindo-o do processo civil comum, é o
da finalidade social, de cuja observância decorre uma quebra do princípio da
isonomia entre as partes, pelo menos em relação à sistemática tradicional do
63
direito formal” .
Theodoro Júnior inspira-se no juslaboralista mexicano Néstor de Buen, para
quem há perfeita comunhão entre o direito material e o direito processual do
trabalho:
Em primeiro lugar, é óbvio que tanto o direito substantivo como o processual intentam a realização
da justiça social. Para esse efeito, ambos estimam que existe uma evidente desigualdade entre as
partes, substancialmente derivada da diferença econômica e, como consequência, cultural, em que se
encontram. Em virtude disso a procura da igualdade como meta. O direito substantivo, estabelecendo
de maneira impositiva, inclusive acima da vontade do trabalhador, determinados direitos mínimos e
certas obrigações máximas. O direito processual, reconhecendo que o trabalhador deve ser auxiliado
durante o processo pela própria autoridade julgadora, de maneira que, no momento de chegar o
64
procedimento ao estado de solução, a aportação processual das partes permita uma solução justa .
A diferença básica entre o princípio da proteção processual e o princípio da
finalidade social do processo é que, no primeiro, a própria lei confere a
desigualdade no plano processual; no segundo, permite-se que o juiz tenha uma
atuação mais ativa, na medida em que auxilia o trabalhador, em busca de uma
solução justa, até chegar o momento de proferir a sentença.
Parece-nos, contudo, que os dois princípios – proteção e finalidade social – se
harmonizam e, pelo menos em nosso ordenamento jurídico, permitem que o juiz,
na aplicação da lei, possa corrigir uma injustiça da própria lei. É o que prescreve
o art. 5º do Decreto-Lei n. 4.657/42 (LINDB), segundo o qual, “na aplicação da
lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem
comum”.
Quanto a essa possibilidade conferida ao magistrado no exercício da prestação
jurisdicional, convém colacionar a lúcida observação de José Eduardo Faria,
relativa “ao problema do alcance e do sentido das expressões ‘fins sociais’ e
‘bem comum’, dois princípios gerais do direito sempre presentes nas exposições
de motivos dos legisladores (...) Num contexto socioeconômico como o do
Brasil em que os 20% mais pobres do país detêm apenas 2% da riqueza nacional,
enquanto os 20% mais ricos ficam com 66%, ‘sociais’ e ‘comum’ na perspectiva
de quem? Longe de possuírem um significado evidente, tais conceitos expressam
várias representações conflitantes entre si; em vez de propiciarem uma visão
precisa do sistema jurídico, eles funcionam como barreiras ideológicas
mascarando contradições sociais profundas e antagonismos inconciliáveis.
Assim, em que medida todos os grupos e classes podem ter realmente os
mesmos interesses ‘comuns’ e anseios pelos mesmos ‘fins’? Até que ponto todos
os homens situados numa formação social como a brasileira, em que a miséria e
a pobreza atingem 64% da população, podem ser tomados como cidadãos
efetivamente iguais entre si em seus direitos, seus deveres e em suas capacidades
65
tanto subjetivas quanto objetivas de fazê-los prevalecer?” .
Para enfrentar tais indagações, o referido jurista e sociólogo propõe que o
direito seja uma atividade crítica e especulativa, calcada na experiência vivida e,
como tal, incorporada à própria percepção da realidade por parte dos atores
jurídicos. Daí por que, diz ele, “a proposta de uma ciência do direito reflexiva,
consciente das contradições do direito positivo, nega-se a reduzir a análise das
66
leis e dos códigos apenas nos seus aspectos lógico-formais” . Dessa nova função
prospectiva do direito, que irradia seus efeitos no direito processual, segundo o
mesmo autor, “pode emergir um direito original e legítimo, voltado mais à
questão da justiça do que aos problemas de legalidade, cabe a uma magistratura
com um conhecimento multidisciplinar e poderes decisórios ampliados a
responsabilidade de reformular a partir das próprias contradições sociais os
conceitos fechados e tipificantes dos sistemas legais vigentes. Sob pena de a
magistratura ver progressivamente esgotada tanto a operacionalidade quanto o
67
acatamento de suas decisões face à expansão de conflitos coletivos” .
Colhemos um julgado que adotou expressamente o princípio da finalidade
social do processo:
SINDICATO COMO SUBSTITUTO PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL
PARA ADOÇÃO DE MEDIDAS NECESSÁRIAS AO ANDAMENTO DO FEITO. PRESCRIÇÃO
INTERCORRENTE. INOCORRÊNCIA. Não se pronuncia a prescrição intercorrente em ação
ajuizada por sindicato, como substituto processual, se não houve notificação pessoal do ente coletivo
ou dos substituídos para adoção de medidas necessárias ao andamento do feito, sob pena de ofensa ao
Princípio da Finalidade Social do Processo e ao disposto no § 1º do art. 267 do CPC, aplicado
subsidiariamente. Agravo de Petição provido (TRT, 14ª Reg., AP 00794.2000.005.14.00-5, Rel. Des.
Vânia Maria da Rocha Abensur, j. 14-12-2007, DO 19-12-2007).
Com a ampliação da competência da Justiça do Trabalho para outras lides
diversas da relação de emprego, como as oriundas da relação de trabalho
autônomo, as ações para cobranças de multas administrativas e as ações sobre
representações sindicais, o princípio da finalidade social, bem como o princípio
da proteção processual, acabarão sofrendo grandes transformações, como já
alertamos na epígrafe anterior.
6.3. Princípio da efetividade social
É importante destacar que alguns autores vêm defendendo a existência do
princípio da efetividade social como desdobramento do princípio da finalidade
social. Segundo André Monteiro Barbosa, Brasilino Santos Ramos, Jouber S. S.
Amaral e Juliana Rodrigues de Morais:
Entende-se por princípio da efetividade social o conjunto de concepções, políticas, conceitos, ideias e
mecanismos necessários que devem inspirar a concretização ou materialização da prestação
jurisdicional, evitando-se preventivamente a lesão ao ordenamento jurídico que se avizinha, ou
restabelecendo-se, tempestivamente e com a maior fidelidade possível, o direito que foi violado. É,
por isso mesmo, um verdadeiro princípio do direito processual do trabalho. Esclareça-se que não se
tratam de meras formas procedimentais, mas sim um viés, um norte, uma concepção social na
formação, propulsão, julgamento e entrega da prestação jurisdicional, numa constante oposição à
ótica individualista impregnada no processo e que decorre de sua ultrapassada inspiração do Estado
68
Liberal .
Verifica-se, assim, a ampla possibilidade de aplicação do princípio da
efetividade processual, mormente nas hipóteses de tutelas inibitórias para
69
proteção do meio ambiente do trabalho .
6.4. Princípio da busca da verdade real
Este princípio processual deriva do princípio do direito material do trabalho,
conhecido como princípio da primazia da realidade.
Embora haja divergência sobre a singularidade deste princípio no sítio do
direito processual do trabalho, parece-nos inegável que ele é aplicado com maior
ênfase neste setor da processualística do que no processo civil.
Corrobora tal assertiva o disposto no art. 765 da CLT, que confere aos Juízos e
Tribunais do Trabalho ampla liberdade na direção do processo. Para tanto, os
magistrados do trabalho “velarão pelo andamento rápido das causas, podendo
determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas”.
A jurisprudência tem acolhido o princípio em tela no campo da prova:
RECURSO ORDINÁRIO. INSTRUÇÃO PROCESSUAL. AMPLA LIBERDADE DO JUIZ NA
CONDUÇÃO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. PRINCÍPIO DA BUSCA DA VERDADE REAL.
No processo do trabalho o princípio da verdade real tem residência no art. 765 da CLT c/c art. 130 do
CPC que confere ao juiz ampla liberdade na direção do processo, podendo determinar as provas
necessárias à instrução do feito. O juiz deve conduzir o processo com o objetivo de apurar a verdade
real, podendo determinar as diligências necessárias ao esclarecimento dos fatos e indeferir aquelas
que considerar inúteis ou meramente protelatórias. É evidente que o julgador deve compatibilizar
esse princípio com o princípio da ampla defesa e do contraditório e com o princípio da isonomia. Ao
indeferir a oitiva de testemunhas que confessadamente desconheciam o fato sobre o qual deporiam, o
Juízo de origem agiu com acerto, pois preservou a idoneidade da prova. Desse modo, não há
nulidade, pois a conduta do Juízo alcançou a verdade real na instrução processual sem abandonar a
ampla defesa e o contraditório e a igualdade de tratamento das partes (TRT, 2ª R., RECORD 01116-
2008-372-02-00-9, Rel. Des. Marcelo Freire Gonçalves, j. 6-5-2010, 12ª T., DO 14-5-2010).
SALÁRIO EXTRAFOLHA. INVALIDADE DA PROVA DOCUMENTAL. PRINCÍPIO DA BUSCA
DA VERDADE REAL. INAPLICABILIDADE DO ART. 227, PARÁGRAFO ÚNICO, DO
CÓDIGO CIVIL. No Processo do Trabalho, vigora o princípio da busca da verdade real, que faz com
que a prova documental ceda espaço à testemunhal, quando esta se mostra firme no sentido da
desconstituição daquela. Diante disso, o parágrafo único do art. 227, do CC, segundo o qual,
“qualquer que seja o valor do negócio jurídico, a prova testemunhal é admissível como subsidiária ou
complementar da prova por escrito”, é inaplicável ao Processo do Trabalho, porque incompatível
com esse princípio peculiar. Assim, demonstrado pela prova testemunhal, firme e idônea, o
pagamento de salário extrafolha, são devidas as diferenças reflexas decorrentes da integração daquele
no salário para todos os efeitos legais (TRT, 3ª R., RO 0001070-73.2012.5.03.0147, Rel. Des.
Fernando Luiz G. Rios Neto, 7ª T., DEJT 19-8-2014).

6.5. Princípio da indisponibilidade


Este princípio constitui adaptação do princípio da indisponibilidade ou
irrenunciabilidade do direito material do trabalho no campo do processo do
trabalho.
Justifica-se a peculiaridade do princípio da indisponibilidade nos sítios do
processo do trabalho, pela considerável gama de normas de ordem pública do
direito material do trabalho, o que implica a existência de um interesse social
que transcende a vontade dos sujeitos do processo na efetivação dos direitos
sociais trabalhistas e influencia a própria gênese da prestação jurisdicional
especializada. Numa palavra, o processo do trabalho tem uma função precípua: a
efetiva realização dos direitos sociais indisponíveis dos trabalhadores.
É claro que as normas de direito processual de qualquer ramo são, em regra,
de natureza absoluta e de ordem pública, mas nos sítios do processo do trabalho
a indisponibilidade do direito processual assume importância mais enfática,
tendo em vista a inferioridade econômica do trabalhador destinatário, em regra,
de créditos de natureza alimentícia como um dos sujeitos da relação jurídica
processual. Nesse sentido:
RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE – PRESCRIÇÃO DE OFÍCIO – ART. 219, § 5º, DO
CPC – APLICABILIDADE AO PROCESSO DO TRABALHO. A alteração do artigo 219, § 5º, do
CPC, efetuada pela Lei n. 11.280/2006, autoriza o Juiz a declarar, de ofício, a prescrição. O instituto,
no entanto, não se mostra compatível com o processo do trabalho, em razão de princípios e
peculiaridades que o regem, dentre outros, a indisponibilidade de alguns dos direitos do empregado, a
natureza alimentar do salário, e a própria desigualdade econômica entre empregados e empregadores,
não presentes na relação jurídica disciplinada pelo Código de Processo Civil. Recurso de revista
conhecido e provido (TST-RR 501700-13.2006.5.09.0019, Rel. Min. Milton de Moura França, 4ª T.,
DEJT 28-10-2011).
TRANSAÇÃO EXTRAJUDICIAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO
MÉRITO. As hipóteses de extinção do processo sem resolução do mérito estão taxativamente
previstas pelo Código de Processo Civil, no art. 267. A transação extrajudicial não importa em
extinção do processo com resolução do mérito, como disposto no inciso III do art. 269 do CPC, pois
esta não gera a quitação total do contrato de trabalho, mas tão somente aos valores objeto da
conciliação, em observância ao princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas. Recurso
patronal a que se nega provimento (TRT 1ª R., RO 00021366520125010302, Rel. Des. Leonardo
Dias Borges, 10ª T., DEJT 24-9-2014).
Vislumbramos, ainda, a aplicação do princípio ora focalizado na hipótese de
substituição processual, pois ao sindicato (substituto processual) é vedado
renunciar direitos metaindividuais veiculados em ação civil pública.
Há de se destacar, contudo, que a ampliação de competência da Justiça do
Trabalho para processar e julgar ações oriundas de outras relações de trabalho
(EC n. 45/2004), incluindo o trabalho autônomo, bem como as lides entre os
sindicatos e entre os empregadores e os órgãos de fiscalização do trabalho,
acabará mitigando aplicação do princípio da indisponibilidade nos domínios do
processo do trabalho.
Por fim, cumpre lembrar que o art. 2º, II, da IN/TST 39/2016 dispõe que não
se aplica ao Processo do Trabalho, em razão de inexistência de omissão ou por
incompatibilidade, o art. 190 e parágrafo único do CPC, que tratam da
negociação processual, o que reforça a existência do princípio da
indisponibilidade nos sítios do processo laboral.
6.6. Princípio da conciliação
O princípio da conciliação encontrava fundamento expresso nas Constituições
brasileiras de 1946 (art. 123), de 1967 (art. 134), de 1969 (art. 142, com redação
dada pela EC n. 1/69) e na redação original do art. 114 da Carta de 1988. Todas
essas normas previam a competência da Justiça do Trabalho para “conciliar” e
julgar os dissídios individuais e coletivos.
Com o advento da EC n. 45/2004, que deu nova redação ao art. 114 da CF,
houve supressão do termo “conciliar e julgar”, cabendo agora à Justiça do
Trabalho “processar e julgar”.
A omissão, contudo, não desnatura o princípio em estudo, pois ele continua
existindo no plano infraconstitucional e não se mostra incompatível com o novo
texto da Carta de outubro de 1988.
70
Embora o princípio da conciliação não seja exclusividade do processo
laboral, parece-nos que é aqui que ele se mostra mais evidente, tendo, inclusive,
um iter procedimentalis peculiar.
Com efeito, dispõem o art. 764, caput, e seus parágrafos da CLT, in verbis:
Art. 764. Os dissídios individuais ou coletivos submetidos à apreciação da Justiça do Trabalho serão
sempre sujeitos à conciliação.
§ 1º Para os efeitos deste artigo, os juízes e Tribunais do Trabalho empregarão sempre os seus bons
ofícios e persuasão no sentido de uma solução conciliatória dos conflitos.
§ 2º Não havendo acordo, o juízo conciliatório converter-se-á obrigatoriamente em arbitral,
proferindo decisão na forma prescrita neste Título.
§ 3º É lícito às partes celebrar acordo que ponha termo ao processo, ainda mesmo depois de
encerrado o juízo conciliatório.
No mesmo sentido, o art. 831 da CLT estabelece uma condição intrínseca para
a validade da sentença trabalhista, ao determinar que ela somente “será proferida
depois de rejeitada pelas partes a proposta de conciliação”.
Há, no procedimento comum ordinário trabalhista, dois momentos
obrigatórios para a proposta judicial de conciliação.
O primeiro está previsto no art. 846 da CLT e ocorre por ocasião da abertura
da audiência, nos seguintes termos: “Aberta a audiência, o Juiz ou Presidente
proporá a conciliação”.
A segunda tentativa de conciliação ocorre após o término da instrução e da
apresentação das razões finais pelas partes. Está prevista no art. 850 da CLT, in
verbis:
Art. 850. Terminada a instrução, poderão as partes aduzir razões finais, em prazo não excedente de
10 minutos para cada uma. Em seguida, o juiz ou presidente renovará a proposta de conciliação, e
não se realizando esta, será proferida a decisão.
Outra peculiaridade do processo do trabalho repousa na equiparação prática
do termo de conciliação à coisa julgada. É o que diz o parágrafo único do art.
831 da CLT: “No caso de conciliação, o termo que for lavrado valerá como
decisão irrecorrível, salvo para a Previdência Social quanto às contribuições que
lhe forem devidas”.
Em 2007, o CNJ instituiu o movimento “Conciliar é Legal”, que resultou na
instalação de Gabinetes de Conciliação em vários órgãos do Poder Judiciário nos
quais são realizados periodicamente mutirões de conciliação nos órgãos
jurisdicionais de primeiro grau.
Acreditamos que o CNJ tenha utilizado a expressão “conciliar é legal” no
sentido leigo, popular, e não no sentido jurídico. Vale dizer, para o CNJ conciliar
é uma boa ação, faz bem a todos e, por isso, deve ser estimulada.
O procedimento dos mutirões inicia-se com uma triagem dos processos em
que o magistrado vislumbra a existência de probabilidade de negociação inicial
entre as partes, levando em conta a pequena complexidade das questões ou a
existência de provas suficientes nos autos para o pronto julgamento. Depois,
marcam-se audiências prévias de conciliação, com designação de dias ou
semanas específicas organizadas de acordo com o perfil de litigância dos réus.
Há, assim, os chamados “litigantes habituais”, que figuram no polo passivo em
grande parte das demandas ajuizadas na Justiça do Trabalho, de acordo com os
dados divulgados nos sites do TST e do próprio CNJ.
Sobreleva lembrar que o art. 2º, IV, da IN/TST 39/2016 não autoriza a
aplicação subsidiária ou supletiva do art. 334 do CPC, que trata da audiência de
conciliação ou de mediação, ao Processo do Trabalho.
Além disso, o art. 14 da referida IN n. 39 dispõe que não se aplica ao Processo
do Trabalho o art. 165 do CPC, salvo nos conflitos coletivos de natureza
econômica (CF, art. 114, §§ 1º e 2º). Vale registrar que o art. 165 do CPC
determina a criação, no âmbito dos tribunais, de “centros judiciários de solução
consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de
conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a
auxiliar, orientar e estimular a autocomposição”.
Voltaremos a falar sobre conciliação no Capítulo XIII, itens 5, 11 e 12, e no
Capítulo XVII, itens 2, 3 e 5.6.
6.7. Princípio da normatização coletiva
A Justiça do Trabalho brasileira é a única que pode exercer o chamado poder
normativo, que consiste no poder de criar normas e condições gerais e abstratas
(atividade típica do Poder Legislativo), proferindo sentença normativa (rectius,
acórdão normativo) com eficácia ultra partes, cujos efeitos irradiarão para os
contratos individuais dos trabalhadores integrantes da categoria profissional
representada pelo sindicato que ajuizou o dissídio coletivo.
Essa função especial (competência) conferida aos tribunais trabalhistas é
autorizada pelo art. 114, § 2º, da CF, segundo o qual:
Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de
comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho
decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as
convencionadas anteriormente.
O princípio da normatização coletiva não é absoluto, pois encontra limites na
própria Constituição, nas leis de ordem pública de proteção ao trabalhador (CF,
art. 7º; CLT, arts. 8º e 444) e nas cláusulas (normas) anteriores previstas em
convenções e acordos coletivos que disponham sobre condições mínimas de
determinada categoria profissional (CF, art. 7º, XXVI).
6.8. Outros princípios do processo trabalhista
Além dos princípios acima arrolados, a doutrina invoca outros princípios
como peculiares ao processo do trabalho, como os princípios da simplicidade, da
celeridade, da despersonalização do empregador e da extrapetição. Todavia,
pensamos que esses princípios são comuns ao processo do trabalho e ao processo
civil.
6.8.1. Princípio da simplicidade das formas
Com efeito, o princípio da simplicidade das formas decorre dos princípios da
instrumentalidade e da oralidade, já estudados nas linhas pretéritas, e – é
inegável – constitui objetivo de todo e qualquer sistema processual, seja ele civil,
penal ou trabalhista.
O art. 899 da CLT consagra expressamente que os recursos serão interpostos
por simples petição, isto é, sem os formalismos extremos exigidos nos recursos
de natureza extraordinária.
Os juizados especiais cíveis e criminais também são exemplos de aplicação do
princípio da simplicidade. É importante ressaltar, porém, que as raízes
deontológicas e fenomenológicas desses órgãos da justiça comum provêm do
direito processual do trabalho.
6.8.2. Princípio da celeridade
O princípio da celeridade, embora comum a todos os ramos do direito
processual, é um desdobramento do princípio constitucional da duração razoável
do processo (CF, art. 5º, LXXVIII) e assume ênfase muito maior nos sítios do
processo do trabalho, uma vez que, em regra, os créditos trabalhistas nele
veiculados têm natureza alimentícia.
É bem de ver que o princípio da celeridade encontra abrigo expresso no art.
765 da CLT, segundo o qual os Juízes e os Tribunais do Trabalho terão ampla
liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas.
6.8.3. Princípio da despersonificação do empregador (desconsideração da
personalidade jurídica)
A despersonificação do empregador, ou desconsideração da personalidade
jurídica do empregador, constitui, a rigor, princípio do direito material trabalhista
(CLT, arts. 2º, 10 e 448).
Além disso, o princípio da desconsideração da personalidade jurídica é
encontrado em outros ramos, como o direito comercial, o direito civil, o direito
das relações de consumo, o direito tributário.
No direito das relações de consumo, por exemplo, ele está consagrado
explicitamente, nos termos do art. 28 do CDC, in verbis:
O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do
consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação
dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência,
estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má
administração.
Cumpre esclarecer, por oportuno, que o princípio da desconsideração da
personalidade jurídica do empregador tem sido bastante utilizado no processo do
71
trabalho, mormente em sede de execução trabalhista .
O CPC (arts. 133 a 137) instituiu o incidente da desconsideração da
personalidade jurídica, cabível em qualquer fase do processo, como uma espécie
de intervenção de terceiro na lide.
Parece-nos, porém, que tal incidente, por implicar suspensão do processo,
mostra-se incompatível com o processo do trabalho, mormente nas ações
oriundas da relação de emprego ou de trabalho avulso, em função da natureza
alimentícia dos créditos veiculados em tais ações, nas quais deve prevalecer o
princípio da máxima celeridade da prestação jurisidicional.
Contudo, pensamos que é possível a aplicação do § 2º do art. 134 do CPC nos
sítios do processo laboral, caso em que, mediante requerimento fundamentado
do reclamante/autor, poderá haver formação de litisconsórcio passivo entre a
empresa empregadora e seus sócios. Neste caso, não haverá incidente nem
suspensão processual, e sim citação dos litisconsortes para se defenderem na
demanda.
O art. 6º da IN/TST 39/2016, no entanto, manda aplicar “ao Processo do
Trabalho o incidente de desconsideração da personalidade jurídica regulado no
CPC (arts. 133 a 137), assegurada a iniciativa também do juiz do trabalho na
fase de execução (CLT, art. 878)”. O novel art. 855-A da CLT também autoriza a
aplicação dos arts. 133 a 137 do CPC no processo do trabalho.
Sobre este tema, remetemos o leitor ao Capítulo XI, item 3.6.
6.8.4. Princípio da extrapetição
O princípio da extrapetição é admitido no processo civil, mormente nos casos
em que o juiz acrescenta à condenação juros legais e correção monetária (CPC,
art. 322, § 1º), ainda que não pedidos pelo autor.
A CLT reconhece o princípio da extrapetição, como se infere dos seus arts.
137, § 2º, 467 e 496. O item II da Súmula 396 do TST também o consagra, ao
dispor: “Não há nulidade por julgamento extra petita da decisão que deferir
salário quando o pedido for de reintegração, dados os termos do art. 496 da
CLT”.
II

PROPEDÊUTICA – CONCEITO,
FINALIDADES, NATUREZA JURÍDICA,
AUTONOMIA, HERMENÊUTICA E
FONTES DO DIREITO PROCESSUAL
DO TRABALHO

1 Conceito
Direito Processual do Trabalho é o ramo da ciência jurídica que se
constitui de um conjunto de princípios, regras, instituições e institutos
próprios que regulam a aplicação do Direito do Trabalho às lides
trabalhistas (relação de emprego e relação de trabalho), disciplinando as
atividades da Justiça do Trabalho, dos operadores do Direito e das partes,
nos processos individuais, coletivos e transindividuais do trabalho.
Mauro Schiavi1 assim define o Direito Processual do Trabalho: “o
conjunto de princípios, normas e instituições que regem a atividade da
Justiça do Trabalho, com o objetivo de dar efetividade à legislação
trabalhista e social, assegurar o acesso do trabalhador à Justiça e dirimir,
com justiça, o conflito trabalhista”.
Na visão de Carlos Henrique Bezerra Leite2, “o ramo da ciência jurídica,
constituído por um sistema de normas, princípios, regras e instituições
próprias, que tem por objeto promover a pacificação justa dos conflitos
individuais, coletivos e difusos decorrentes direta ou indiretamente das
relações de emprego e de trabalho, bem como regular o funcionamento dos
órgãos que compõem a Justiça do Trabalho”.

2 Finalidades
O Direito Processual do Trabalho apresenta as seguintes finalidades:
1ª) dar efetividade à legislação trabalhista e social – ao Direito Material
do Trabalho;
2ª) assegurar ao trabalhador o acesso à Justiça do Trabalho – à ordem
jurídica justa;
3ª) resguardar a dignidade da pessoa do trabalhador;
4ª) garantir os valores sociais do trabalho;
5ª) trazer a pacificação social;
6ª) promover a justa composição dos conflitos individuais, coletivos e
metaindividuais trabalhistas.

3 Natureza jurídica
Em primeiro lugar, é importante trazer uma definição do que seja
natureza jurídica. Em nossas aulas, sempre nos deparamos com uma
grande preocupação – aliás, natural – dos alunos com a memorização e o
entendimento da natureza jurídica dos inúmeros institutos jurídicos, mas
dificilmente paramos para pensar o que é natureza jurídica.
A natureza jurídica é formada por duas ideias centrais:
1ª) definição – busca da essência;
2ª) classificação – busca do posicionamento comparativo.
Esta é a fórmula da natureza jurídica: definição + classificação.
Nessa linha de raciocínio, é oportuno consignar os ensinamentos do
Professor Mauricio Godinho Delgado3:
“Encontrar a natureza jurídica de um instituto do Direito (ou até de um
ramo jurídico, como o Direito do Trabalho) consiste em se apreenderem
os elementos fundamentais que integram sua composição específica,
contrapondo-os, em seguida, ao conjunto mais próximo de figuras
jurídicas (ou de segmentos jurídicos, no caso do ramo justrabalhista), de
modo a classificar o instituto enfocado no universo de figuras existentes
no Direito.
(...)
Encontrar a natureza jurídica do Direito do Trabalho consiste em se
fixarem seus elementos componentes essenciais, contrapondo-os ao
conjunto mais próximo de segmentos jurídicos sistematizados, de modo
a classificar aquele ramo jurídico no conjunto do universo do Direito. À
medida que esse universo do Direito tem sido subdividido em dois
grandes grupos (Direito Público versus Direito Privado), a pesquisa da
natureza jurídica do Direito do Trabalho importa em classificar tal ramo
especializado em algum dos grandes grupos clássicos componentes do
Direito”.
O Direito Processual do Trabalho é ramo do Direito Público. E compõe-
se de um conjunto de princípios, regras, instituições e institutos próprios
definido em normas estatais cogentes, imperativas ou de ordem pública, de
observância obrigatória.
Com a evolução da sociedade, o Estado chamou para si, de forma quase
monopolizada, o exercício da função jurisdicional. Na verdade, esse papel
do ente público é o poder, o dever, a função ou a atividade de,
imparcialmente, substituir a vontade das partes, dizer o direito e aplicar o
direito objetivo ao caso concreto para resolver a lide – lembrando, pela
definição tradicional, que a lide consiste no conflito de interesses qualificado
por uma pretensão resistida de interesses, objetivando a sua justa
composição e a pacificação social.
Assim, sendo a jurisdição grande exemplo de heterocomposição e a forma
mais comum de solução dos conflitos de interesses, o direito processual
em geral, abrangendo o direito processual trabalhista, civil e penal, é
classificado como pertencente ao Direito Público.
Confirmando a posição acima adotada, o Direito Processual do Trabalho
possui suas fontes normativas oriundas do ordenamento jurídico estatal.
Com efeito, a edição de normas processuais trabalhistas somente pode ser
conduzida pelo Estado, com base no princípio da legalidade.
O enquadramento do Direito Processual do Trabalho como ramo do
Direito Público é correto e encontra fundamento na própria Constituição
Cidadã de 1988, em seu art. 22, I, que aduz competir privativamente à
União legislar sobre direito processual.

4 Autonomia
Sobre a autonomia de determinado ramo do Direito, insta consignar os
ensinamentos do eminente jurista Mauricio Godinho Delgado4:
“Autonomia (do grego auto, próprio, e nomé, regra), no Direito, traduz
a qualidade atingida por determinado ramo jurídico de ter enfoques,
princípios, regras, teorias e condutas metodológicas próprias de
estruturação e dinâmica.
A conquista da autonomia confirma a maturidade alcançada pelo ramo
jurídico, que se desgarra dos laços mais rígidos que o prendiam a
ramo(s) próximo(s), sedimentando via própria de construção e
desenvolvimento de seus componentes específicos. Nessa linha, pode-se
afirmar que um determinado complexo de princípios, regras e institutos
jurídicos assume caráter de ramo jurídico específico e próprio quando
alcança autonomia perante os demais ramos do Direito que lhe sejam
próximos ou contrapostos.
O problema da autonomia não é exclusivo do Direito e seus ramos
integrantes. As próprias ciências o enfrentam, necessariamente. Neste
plano científico específico, pode-se dizer que um determinado conjunto
de proposições, métodos e enfoques de pesquisa acerca de um universo
de problemas assume o caráter de ramo de conhecimento específico e
próprio quando também alcança autonomia perante os demais ramos de
pesquisa e saber que lhe sejam correlatos ou contrapostos.
Quais são os requisitos para a afirmação autonômica de certo campo
do Direito?
O jurista italiano Alfredo Rocco sintetizou, com rara felicidade, a tríade
de requisitos necessários ao alcance de autonomia por certo ramo
jurídico. Trata-se, de um lado, da existência, em seu interior, de um
campo temático vasto e específico; de outro lado, a elaboração de
teorias próprias ao mesmo ramo jurídico investigado; por fim, a
observância de metodologia própria de construção e reprodução da
estrutura e dinâmica desse ramo jurídico enfocado.
A esses três requisitos, acrescentaríamos um quarto, consubstanciado
na existência de perspectivas e questionamentos específicos e próprios,
em contraposição aos prevalecentes nos ramos próximos ou correlatos”.
Há uma grande cizânia doutrinária e jurisprudencial quanto à
autonomia ou não do Direito Processual do Trabalho em relação ao Direito
Processual Civil.
Existem duas correntes sobre essa controvérsia:
a ) Teoria monista – sustenta que o Direito Processual é comum,
abrangendo o Direito Processual Civil, o Direito Processual do Trabalho, o
Direito Processual Penal etc. Além disso, assevera que não há diferença
substancial entre o Processo do Trabalho e o Processo Civil capaz de
justificar a autonomia da lei adjetiva trabalhista. Na verdade, o Direito
Processual do Trabalho seria simples desdobramento do Processo Civil, daí
a improcedência de se justificar a tese de sua autonomia, na medida em
que não contaria com princípios e institutos próprios. Renomados juristas
defendem a Teoria Monista, embora representem, atualmente, a posição
minoritária:
Valentin Carrion 5: “(...) o direito processual do trabalho não é
autônomo com referência ao processual civil e não surge do direito
material laboral. O direito processual do trabalho não possui princípio
próprio algum, pois todos os que o norteiam são do processo civil
(oralidade, celeridade etc.); apenas deu (ou pretendeu dar) a alguns
deles maior ênfase e relevo. O princípio de ‘em dúvida pelo mísero’ não
pode ser levado a sério, pois, se se tratar de dúvida na interpretação dos
direitos materiais, será uma questão de direito do trabalho e não de
direito processual. E, se se tratar deste, as dúvidas se resolvem por
outros meios: ônus da prova, plausibilidade, fontes de experiência
comum, pela observação do que ordinariamente acontece (CPC/15, art.
376) ou contra quem possuía maior facilidade de provar etc. (...)”.
Christovão Piragibe Tostes Malta 6: “a circunstância de o processo
trabalhista poder apresentar peculiaridades, no entanto, não justifica a
conclusão de que é autônomo quando simultaneamente se proclama
que existe autonomia de um ramo do direito se possui campo, princípios
e fundamentos próprios, o que não sucede confrontando-se os processos
civil e trabalhista.
Além disso, há uma tendência dos estudiosos do direito processual do
trabalho de estenderem a este inovações de direito processual civil,
assim visando a obter maior celeridade e melhoria técnica na solução
das lides laborais, o que, no entanto, não tem sido alcançado.
(...) os princípios que regem o direito processual trabalhista são os
mesmos que presidem o processo civil, embora com algumas
adaptações. O essencial, contudo, é que os princípios em si são os
mesmos.
Os princípios processuais, aliás, são, como regra geral, universais, e o
processo do trabalho na maioria dos países é o processo civil, o que bem
mostra que no máximo se poderia falar em autonomia do direito
processual do trabalho brasileiro em paralelo com o direito processual
civil brasileiro.
Não se encontram, ainda, evidenciados fundamentos processuais
trabalhistas diferentes dos fundamentos do direito processual civil. O
estudo dos institutos processuais básicos (ação, processo, jurisdição etc.)
bem mostra que a estrutura do direito processual trabalhista é a mesma
do direito processual civil. São, por exemplo, tratadas no processo civil e
trabalhista de modo análogo às questões concernentes à contagem de
prazo, preclusão, partes, coisa julgada e muitas outras.
Atualmente, há uma inclinação da jurisprudência e da doutrina laborais
no sentido de recepcionarem muitos institutos do direito processual civil
como a ação monitória e a exceção da pré-executividade, que atentam
contra a simplicidade, que deve ser uma tônica do direito processual
trabalhista.
Há, enfim, vários institutos que são tratados de modo análogo no
direito processual civil e no trabalhista brasileiros: enquanto outros
merecem tratamento bastante diferente.
A circunstância de poder aplicar-se o direito processual civil ao
trabalhista, quando não houver incompatibilidade entre ambos, também
contribui para proclamar-se que o direito processual trabalhista não é
autônomo”.
b ) Teoria dualista – sustenta que o Direito Processual do Trabalho é
autônomo em relação ao Direito Processual Civil, apresentando
diferenças substanciais que justificam a sua autonomia. Atualmente,
representa a posição majoritária, defendida por juristas de nomeada:
Mauro Schiavi7: “Estamos convencidos de que, embora o Direito
Processual do Trabalho, hoje, esteja mais próximo do Direito Processual
Civil e sofra os impactos dos Princípios Constitucionais do Processo, não
há como se deixar de reconhecer alguns princípios peculiares do Direito
Processual do Trabalho os quais lhe dão autonomia e o distinguem do
Direito Processual Comum.
De outro lado, embora alguns princípios do Direito Material do
Trabalho, tais como primazia da realidade, razoabilidade, boa-fé, sejam
aplicáveis também ao Direito Processual do Trabalho, a nosso ver, os
Princípios do Direito Material do Trabalho não são os mesmos do
Processo, uma vez que o processo tem caráter instrumental e os
princípios constitucionais da isonomia e imparcialidade, aplicáveis ao
Processo do Trabalho, impedem que o Direito Processual do Trabalho
tenha a mesma intensidade de proteção do trabalhador própria do
Direito Material do Trabalho. Não obstante, não há como se negar um
certo caráter protecionista no Direito Processual do Trabalho, que para
alguns é princípio peculiar do Processo do Trabalho e para outros
características do procedimento trabalhista, para assegurar o acesso
efetivo do trabalhador à Justiça do Trabalho e também a uma ordem
jurídica justa.
Também milita em prol da autonomia do Direito Processual do
Trabalho, o Brasil possuir um ramo especializado do judiciário para
dirimir as lides trabalhistas, uma legislação própria que disciplina o
Processo do Trabalho (CLT, Lei n. 5.584/70 e Lei n. 7.701/88), um objeto
próprio de estudo e vasta bibliografia sobre a matéria.
Reconhecemos, por outro lado, que as ciências processuais devem
caminhar juntas, e o Processo do Trabalho, em razão dos princípios da
subsidiariedade, do acesso à justiça, da duração razoável do processo,
pode se aproveitar dos benefícios obtidos pelo Processo Comum.
Além disso, a autonomia do direito processual do trabalho não pode ser
motivo para isolamento e acomodação do intérprete. Há necessidade de
constante diálogo entre o direito processual do trabalho e os outros
ramos do direito processual, principalmente com os princípios
fundamentais do processo consagrados na Constituição Federal”
(destaques nossos).
Carlos Henrique Bezerra Leite8: “(...) afigura-se-nos que o direito
processual do trabalho dispõe de autonomia em relação ao direito
processual civil (ou direito processual não penal).
Com efeito, o direito processual do trabalho dispõe de vasta matéria
legislativa, possuindo título próprio na Consolidação das Leis do
Trabalho, que, inclusive, confere ao direito processual civil o papel de
mero coadjuvante.
Por outro lado, (...) existem princípios peculiares ao direito processual
do trabalho, como os princípios da proteção, da finalidade social, da
indisponibilidade, da busca da verdade real, da normatização coletiva e
da conciliação.
Ademais, não há negar que o direito processual do trabalho possui
institutos próprios, como, por exemplo, uma Justiça especializada com
juízes especializados e o poder normativo exercido originariamente pelos
Tribunais do Trabalho.
De outra parte, convém lembrar que o direito processual do trabalho
dispõe, atualmente, de autonomia didática, pois a disciplina tem sido
ofertada separadamente nas grades curriculares; de autonomia
jurisdicional, não apenas no Brasil (CF, art. 114) mas, também, em
outros países, como Alemanha, Argentina, Uruguai, México e Espanha;
de autonomia doutrinária, pois são inúmeras as obras, nacionais e
estrangeiras, versando apenas direito processual do trabalho”.
Renato Saraiva9: “Em última análise, embora seja verdade que a
legislação instrumental trabalhista ainda é modesta, carecendo de um
Código de Processo do Trabalho, definindo mais detalhadamente os
contornos do processo laboral, não há dúvida que o Direito Processual
do Trabalho é autônomo em relação ao processo civil, uma vez que
possui matéria legislativa específica regulamentada na Consolidação das
Leis do Trabalho, sendo dotado de institutos, princípios e peculiaridades
próprios, além de independência didática e jurisdicional” (destaques
nossos).
Não se pode dizer, assim, que haja uma autonomia legislativa do
processo do trabalho, pela inexistência de um código sobre a matéria. É
certo, porém, que o Brasil, ao contrário de outros países, como a Itália,
não tem as regras de processo do trabalho insertas no Código de
Processo Civil. Entretanto, existe um número suficientemente grande de
normas a tratar do processo do trabalho, seja na CLT ou na legislação
esparsa.
Do ponto de vista doutrinário, há autonomia do processo do
trabalho.
O Brasil, pode-se dizer, é um dos países que mais tem obras sobre
Direito Processual do Trabalho, muitas delas de qualidade reconhecida
internacionalmente.
No que diz respeito ao desenvolvimento didático, muitas faculdades de
Direito ministram a matéria Direito Processual do Trabalho há muitos
anos no curso de bacharelado seja em um ano, seja em um semestre.
Hoje, existem muitos cursos que estão se especializando na preparação
para ingresso na magistratura do trabalho, possuindo matéria específica
sobre processo do trabalho.
Nos exames da Ordem dos Advogados do Brasil são exigidos
conhecimentos específicos de Direito do Trabalho e Processo do
Trabalho para habilitar o bacharel a atuar como advogado.
No Brasil, a autonomia jurisdicional do processo do trabalho está
bem caracterizada desde 1946, quando a Constituição incluiu a Justiça
do Trabalho como órgão integrante do Poder Judiciário.
A autonomia jurisdicional não é um critério preciso para caracterizar a
autonomia do processo do trabalho. A autonomia não deriva, porém, da
jurisdição, que não é causa, mas o efeito da autonomia.
Há, contudo, instituição própria, que é a Justiça do Trabalho.
No tocante à autonomia científica, podemos verificar que as
instituições do processo do trabalho são diversas das demais áreas do
Direito. Exemplo disso é termos uma justiça especializada em causas
trabalhistas, integrante do Poder Judiciário.
Há conceitos próprios no processo do trabalho, como de ação de
cumprimento para a observância de dissídio coletivo, reclamações
plúrimas, poder normativo etc.
Podemos concluir que o processo do trabalho em muitos aspectos já
era autônomo, mas sua autonomia total vinha sendo conquistada passo
a passo.
Enfim, o processo do trabalho vem merecendo estudos de conjunto,
adequados e particulares, que mostram ser ele uma matéria vasta. A
doutrina se sedimentou no sentido de que existem conceitos gerais
comuns completamente distintos dos conceitos gerais do processo
comum. Tem o processo do trabalho princípios distintos que visam o
conhecimento da matéria que é objeto de sua investigação. Tem
também instituição própria, que é a Justiça do Trabalho. Logo, pode-se
dizer que é autônomo do Processo Civil, embora ligado ao Direito
Processual, que é o gênero. Essa autonomia, porém, não quer dizer que
está isolado do Direito, pois é espécie do gênero Direito” (destaques
nossos).
Amauri Mascaro Nascimento10: “A autonomia do direito processual do
trabalho, nunca de forma a separar-se do direito processual civil, afirma-
se diante dos seguintes aspectos:
• jurisdição especial destinada a julgar dissídios individuais;
• dissídio coletivo econômico, jurídico e de greve como uma das suas
peculiaridades;
• existência de lei processual específica, embora com larga aplicação
subsidiária do direito processual comum;
• singularidade do tipo de contrato que interpreta, o vínculo de trabalho,
que, diante da inafastabilidade entre o trabalho e a pessoa que o
presta, difere dos contratos de direito civil, na medida em que em seu
objeto está envolvida a pessoa que trabalha, seus direitos de
personalidade e o poder de direção daquele que é beneficiado pelo
trabalho, numa troca salário-trabalho, mas, também, diante das
pessoas típicas que figuram como sujeitos do vínculo, o empregado e o
empregador”.
Cleber Lúcio de Almeida11: “O direito processual do trabalho é
autônomo, na medida em que conta com diplomas legais específicos
(autonomia legislativa), doutrina própria (autonomia doutrinária),
princípios e fins próprios (autonomia científica), objetivo próprio (solução
dos conflitos de interesses oriundos de relação de trabalho ou a ela
conexos) e é aplicado por órgãos jurisdicionais especiais (autonomia
jurisdicional). O direito processual do trabalho não é, portanto, um ramo
particular do direito processual civil” (destaque nosso).
Wagner D. Giglio 12: “Considerado do ângulo científico, porém,
entendemos que o Direito Processual do Trabalho já é autônomo”.
José Augusto Rodrigues Pinto13: “Não é unânime a opinião dos
processualistas pátrios sobre a existência autônoma do Direito
Processual do Trabalho brasileiro. Até mesmo juslaboralistas de porte
aludem a ‘características próprias que lhe asseguram relativa
autonomia’. Sem dúvida, atentam os que assim pensam para a larga
aplicação supletiva das regras do Direito Comum de processo, amarra,
aliás, da qual os intérpretes e aplicadores de nossa legislação processual
do trabalho, mais do que ela mesma, estão precisando libertar-se, em
favor de sua eficiência.
Ainda assim, mantemos um alinhamento convicto com os que lhe
reconhecem autonomia plena, ‘pois sua matéria é extensa, sua
doutrina homogênea e tem método próprio’.
Os caminhos para a autonomia do Direito Processual do Trabalho, em
face do processo comum, não poderiam ser diversos dos seguidos por
todos os ramos que obtiveram identidade própria, dentro da unidade
científica do Direito. Foram por ele observados os estágios clássicos da
formação de princípios e doutrina peculiares, legislação típica e aplicação
didática regular.
Todos esses estágios estão cumpridos, no Brasil, sucessivamente, pelo
Direito Processual do Trabalho. Acha-se ele sustentado por princípios
peculiares, ainda que harmonizados com os gerais do processo, por
ampla construção doutrinária, que se retrata em consistente referência
bibliográfica, e por um sistema legal característico, incluindo-se, além do
mais, nos currículos de graduação em Direito, na condição de disciplina
nuclear. Aduza-se, ainda, a observação de Coqueijo Costa sobre ter ‘juiz
próprio’, ou seja, jurisdição especial, o que nem chega a ocorrer em
todos os países do mundo ocidental industrializado”.

Defendemos a Teoria Dualista, de modo que, inegavelmente, o


Direito Processual do Trabalho é autônomo em relação ao Direito
Processual Civil.
O Processo do Trabalho é uma ciência extremamente complexa, e
merece estudo cuidadoso, diferenciado e específico, atendendo-se às
suas peculiaridades.
O Direito Processual do Trabalho apresenta quatro grandes
características que justificam a sua autonomia enquanto ramo da
ciência jurídica:
1ª) campo temático vasto e específico;
2ª) teorias próprias;
3ª) metodologia própria;
4ª) perspectivas e questionamentos específicos e próprios.
São fundamentos da mencionada autonomia:
• autonomia científica: vasta matéria, princípios peculiares e
instituições próprias, por exemplo, o princípio da normatização
coletiva e o jus postulandi;
• autonomia didática: cadeira própria na graduação em Direito;
• autonomia doutrinária: grande número de obras que versam sobre o
Direito Processual do Trabalho, bem como inúmeros juristas de
nomeada e estudiosos do ramo em exame;
• autonomia funcional: apresenta finalidade específica, qual seja,
solucionar os conflitos de interesses individuais, coletivos e
metaindividuais trabalhistas;
• autonomia jurisdicional: a Justiça do Trabalho é uma das três Justiças
Especializadas ou Especiais do ordenamento jurídico brasileiro;
• autonomia legislativa: além da Consolidação das Leis do Trabalho,
temos uma vasta legislação processual trabalhista esparsa, como as
Leis n. 5.584/70 e n. 7.701/88.
Não obstante, resta necessária a evolução da legislação processual
trabalhista à luz da sua adequação às modernas e complexas relações
trabalhistas da sociedade hodierna. Com efeito, os operadores e os
estudiosos do Direito Processual do Trabalho não poderão medir
esforços para o seu caminhar evolutivo enquanto ciência jurídica
autônoma, utilizando de forma subsidiária e supletiva institutos do
Processo Civil que são compatíveis.
Por derradeiro, não podemos perder a esperança de que um dia
teremos um Código de Processo do Trabalho (CPTrab), entabulado por
grandes juristas laborais que conhecem as idiossincrasias da militância
prática na Justiça do Trabalho. Assim, teremos a plena convicção de
que o Direito Processual do Trabalho é uma ciência jurídica autônoma,
evoluída, sem olvidar os benefícios evolutivos do Processo Civil.

5 Hermenêutica
O termo hermenêutica tem origem em Hermés, deus grego que atuava
como mensageiro dos deuses. Assim, tinha a incumbência de explicar e
interpretar as mensagens enviadas aos mortais.
A hermenêutica pode ser conceituada como a ciência que tem por
objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis à determinação
do sentido e alcance das expressões do Direito.
Portanto, a hermenêutica compreende:
• a interpretação;
• a integração;
• a aplicação do Direito.
Sobre o tema, discorre o Professor Mauricio Godinho Delgado14:
“A Hermenêutica Jurídica, do ponto de vista estrito, corresponde,
tecnicamente, à ciência (ou ramo da Ciência do Direito) que trata do
processo de interpretação das normas jurídicas.
Na medida em que os processos de integração e aplicação de normas
são muito próximos, correlatos e combinados à dinâmica de
interpretação, tende-se a arrolar, ainda, no conjunto da Hermenêutica –
apreendida, desse modo, no sentido amplo – também esses dois
processos afins (integração e aplicação). A justificativa para essa
conduta é nitidamente didática – por ser funcional a reunião dos temas
da interpretação, integração e aplicação do Direito –, embora não
atenda ao mais apurado rigor técnico.
Distingue-se a Hermenêutica (no sentido estrito) da interpretação.
Esta, como visto, traduz, no Direito, a compreensão e reprodução
intelectual de uma dada realidade conceitual ou normativa, ao passo que
a Hermenêutica traduz o conjunto de princípios, teorias e métodos que
buscam informar o processo de compreensão e reprodução intelectual do
Direito. Interpretação é, pois, a determinação do ‘sentido e alcance das
expressões de direito’; Hermenêutica Jurídica, a ciência que busca
sistematizar princípios, teorias e métodos aplicáveis ao processo de
interpretação. A Hermenêutica apreende e fixa os critérios que devem
reger a interpretação – que os absorve e concretiza na dinâmica
interpretativa.
A interpretação é, em síntese, um processo, enquanto a Hermenêutica
é a ciência voltada a estudar o referido processo, lançando-lhe princípios,
teorias e métodos de concretização”.
5.1 Interpretação

Por meio da interpretação determina-se o conteúdo, sentido e alcance


das normas jurídicas. Em outras palavras, descobre-se o sentido e o alcance
das expressões contidas nas normas jurídicas.
É oportuno consignar que a interpretação da norma jurídica antecede a
sua respectiva aplicação.
Com efeito, no ato de interpretar, o intérprete busca os princípios, teorias
e métodos desenvolvidos pela Hermenêutica, que é a ciência voltada a
estudar o processo de interpretação.
A função interpretativa é realizada principalmente pelo juiz do trabalho. A
interpretação dos demais operadores do Direito, como advogados,
procuradores do trabalho e jurisdicionados, apenas produz efeitos até o
pronunciamento jurisdicional.
Não há um único método de interpretação nem único método correto. As
diversas técnicas interpretativas complementam-se. Ademais, não há
hierarquia entre as múltiplas técnicas de interpretação. Apenas o intérprete
deverá pautar a sua interpretação em critérios como justiça, segurança ou
oportunidade.
O s meios de interpretação mais importantes para os concursos
públicos ou Exames de Ordem são os seguintes, de acordo com as
respectivas classificações:
I) Quanto à origem:
a) Interpretação autêntica – é a interpretação do mesmo órgão que
construiu a norma jurídica. Como exemplo, temos a interpretação do
dispositivo legal efetuada pelo próprio Poder Legislativo por meio da edição
de uma nova lei.
b) Interpretação jurisprudencial – feita pelos tribunais, consolida-se
a partir da reiteração de decisões similares tomadas em face de casos
semelhantes. A jurisprudência pode ser conceituada como o conjunto de
decisões dos tribunais sobre determinada matéria, em determinado sentido.
Da mesma sorte, a súmula ou a orientação jurisprudencial seria a
cristalização da jurisprudência.
c ) Interpretação doutrinária – é a que provém dos estudiosos do
Direito sobre as normas jurídicas integrantes do ordenamento jurídico.
Embora não possua valor vinculativo, é extremamente importante para a
compreensão dos diversos institutos jurídicos.
II) Quanto aos resultados da interpretação:
a ) Interpretação declarativa – caracteriza-se pela exata
correspondência entre o conteúdo escrito e a vontade da norma (ratio
legis ou mens legis), não havendo necessidade de ampliação ou restrição
da razão da norma.
b) Interpretação extensiva – é a que não estabelece correspondência
entre o conteúdo escrito e a vontade da norma, havendo necessidade de
ampliação da razão da norma. A lei disse menos do que queria, e cabe
ao intérprete ampliar o sentido do texto escrito para alcançar o sentido
real da norma.
c ) Interpretação restritiva – diferentemente da interpretação
extensiva, diante da não correspondência entre o conteúdo escrito e a
vontade da norma, há necessidade de redução da razão da norma. Como
esperado, a lei disse mais do que queria, e cabe ao intérprete reduzir o
sentido do texto escrito para alcançar o sentido real da norma.
III) Quanto aos métodos:
a ) Gramatical (literal, semântico, filológico ou linguístico) – significa
analisar o sentido literal das palavras presentes nas normas jurídicas, e a
observância das regras de gramática e linguística é imprescindível.
Fundamentam esse método os ideários de segurança jurídica e justiça.
O método em comento é muito utilizado no sistema jurídico romano-
germânico (civil law), que traduz um direito escrito, ao passo que nos
países que adotam o sistema jurídico anglo-saxônico (common law),
representando um direito consuetudinário, os costumes e as tradições
prevalecem.
Um grande exemplo de aplicação do método gramatical ou literal no
Direito Processual do Trabalho é a análise realizada pelo Judiciário
Trabalhista do cabimento ou não dos recursos trabalhistas de natureza
extraordinária, que são aqueles que não admitem o reexame de fatos e
provas (recurso de revista e embargos no TST – Súmula 126 do TST). Uma
das hipóteses de cabimento do recurso de revista (fundamentação jurídica)
é a prevista na alínea c do art. 896 da CLT, ou seja, quando o acórdão do
Tribunal Regional do Trabalho for proferido com violação literal de
disposição de lei federal ou afronta direta e literal à Constituição Federal.
b) Lógico ou racional – utiliza-se de raciocínios lógicos. O intérprete
faz uso de técnicas da lógica comum e da lógica jurídica, analisando os
períodos da lei e realizando a combinação entre eles, com o objetivo de se
chegar a uma perfeita compatibilidade. Exemplos: a maioria das regras
jurídicas é relativa, comportando exceção. O prazo de 8 (oito) dias para a
interposição de recursos trabalhistas é uma regra. Assim, o mencionado
prazo comporta exceção. Outrossim, a compreensão de determinados
institutos jurídicos depende da interpretação lógica, como a preclusão
lógica, que é a perda da faculdade de praticar um ato processual pela
incompatibilidade lógica entre um ato processual já praticado e um ato
processual a ser praticado. Assim, o reclamado, que reconhece o teor da
sentença trabalhista condenatória e paga as verbas rescisórias ao
empregado/reclamante, não pode interpor o recurso ordinário no prazo de 8
(oito) dias – art. 1.000 do CPC/2015.
c ) Histórico – como o próprio nome indica, por meio desta técnica o
intérprete busca as razões históricas que motivaram a formação da
norma (ratio legis), tendo por base o contexto econômico, social, político,
cultural e filosófico da época da edição da lei. Aliás, o processo produtivo
que antecedeu a publicação e a vigência da norma é levado em conta no
método histórico.
Co m o exemplo, podemos mencionar que muitas regras contidas na
Consolidação das Leis do Trabalho deverão ser contextualizadas segundo o
momento histórico de sua edição, qual seja a Era Getúlio Vargas (Estado
Novo), visto que o Diploma Consolidado teve por base a Carta del Lavoro de
1927 do direito italiano. A Itália era governada por Benito Mussolini. Assim,
os ideários de corporativismo e fascismo estão naturalmente presentes no
ordenamento justrabalhista vigente atualmente, como a contribuição
sindical obrigatória, o princípio da unicidade sindical, o Poder Normativo da
Justiça do Trabalho etc.
Como dizem os grandes historiadores, para a compreensão do presente, é
imprescindível o estudo do passado, revelando a enorme importância do
estudo da História.
d) Sistemático – parte da premissa do Direito como um todo, como um
sistema. Assim, as normas jurídicas não devem ser interpretadas
isoladamente, mas inseridas em um sistema, em um conjunto
harmônico.
O método sistemático representa a interpretação da norma jurídica
inserida em um sistema coerente, o que exige do intérprete amplo
conhecimento das normas que integram o ordenamento jurídico.
Em face da coerência do sistema jurídico, da harmonia do ordenamento
jurídico vigente, em havendo conflito de normas (antinomia), o próprio
sistema deve prever critérios de solução.
d.1) Antinomia – critérios de solução
A antinomia pode ser conceituada como o fenômeno jurídico
caracterizado pela existência de duas normas jurídicas conflitantes, válidas
e emanadas de autoridade competente. Ademais, a ocorrência da antinomia
parte da ideia da indeterminação de qual das normas conflitantes será
aplicada ao caso concreto em análise.
A caracterização de uma verdadeira antinomia jurídica depende do
preenchimento de três requisitos cumulativos:
1º) incompatibilidade;
2º) indecidibilidade;
3º) necessidade de decisão.
Sobre o tema, ensina a Professora Maria Helena Diniz15:
“Antinomia é o conflito entre duas normas, dois princípios, ou de uma norma e um princípio geral
de direito em sua aplicação prática a um caso particular. (...) para que se tenha presente uma real
antinomia, são imprescindíveis três elementos: incompatibilidade, indecidibilidade e necessidade de
decisão. Só haverá antinomia real se, após a interpretação adequada das duas normas, a
incompatibilidade entre elas perdurar. Para que haja antinomia será mister a existência de duas ou
mais normas relativas ao mesmo caso, imputando-lhe soluções logicamente incompatíveis”.

No caso de antinomia, existem três critérios de solução:


d.1.1) Critério hierárquico – norma superior prevalece sobre norma
inferior. É o critério mais forte, tendo em vista que, na pirâmide de Hans
Kelsen, todas as normas jurídicas devem subserviência ao Texto
Constitucional, de modo que a norma inferior deve respeitar, ser compatível
e encontrar seu fundamento de validade da norma superior, encontrando-se
no ápice a Lei Maior.
d.1.2) Critério da especialidade – norma especial prevalece sobre
norma geral. É o critério intermediário.
d.1.3) Critério cronológico – norma posterior prevalece sobre norma
inferior. É o critério mais fraco.
I – Quanto aos critérios envolvidos, as antinomias são classificadas
em:
d.1.3.1) Antinomia de primeiro grau – quando apenas um dos
critérios acima delineados for utilizado para a solução do conflito de
normas.
d.1.3.2) Antinomia de segundo grau – quando mais de um
metacritério acima delineado for utilizado para a solução do conflito de
normas.
II – Quanto à possibilidade, ou não, de solução do conflito de
normas, as antinomias classificam-se em:
d.1.3.3) Antinomia aparente – quando os metacritérios acima
expostos são suficientes para a solução do conflito de normas.
d.1.3.4) Antinomia real – quando os metacritérios acima expostos
não são suficientes para a solução do conflito de normas.
Perceba o leitor que, no caso de antinomia de primeiro grau, a
solução é singela, devendo ser observada a ordem dos critérios que foi
apresentada, ou seja, o primeiro critério a ser observado é o hierárquico,
depois o da especialidade e por fim o cronológico:
• no caso de conflito entre norma superior e norma inferior, deve
prevalecer a primeira (critério hierárquico – antinomia de primeiro
grau aparente);
• no caso de conflito entre norma especial e norma geral, deve
prevalecer a primeira (critério da especialidade – antinomia de
primeiro grau aparente);
• no caso de conflito entre norma posterior e norma anterior, deve
prevalecer a primeira (critério cronológico – antinomia de primeiro
grau aparente).
Continuando o estudo, nas hipóteses de antinomias de segundo grau,
as situações são mais complexas, abaixo alinhavadas:
• no caso de conflito entre norma superior anterior e norma inferior
posterior, deve prevalecer o critério hierárquico, prevalecendo a
primeira (antinomia de segundo grau aparente);
• no caso de conflito entre norma especial anterior e norma geral
superior, deve prevalecer o critério da especialidade, prevalecendo a
primeira norma (antinomia de segundo grau aparente);
• no caso de conflito de norma geral superior e norma especial inferior,
temos uma antinomia de segundo grau real, na qual os
metacritérios de solução de conflitos de normas não são suficientes, por
si sós.
Na hipótese de antinomia de segundo grau real, caracterizado pelo
confronto entre os critérios da hierarquia e da especialidade, duas
linhas de interpretação são apresentadas pela doutrina para a respectiva
solução:
1ª) solução apresentada pelo Poder Legislativo – edição de uma
terceira norma aduzindo qual das duas normas conflitantes deverá ser
aplicada ao caso concreto;
2ª) solução apresentada pelo Poder Judiciário: o magistrado, de
acordo com as suas convicções, e pautado em critérios axiológicos
extraídos da cultura, da ética, dos princípios fundamentais, do princípio
da proporcionalidade, da razoabilidade etc., aplicará uma das duas
normas jurídicas conflitantes, para a solução da celeuma. A solução do
Judiciário é chamada pela doutrina de princípio máximo de justiça,
com fulcro nos arts. 4º e 5º da LINDB. Dessa forma, quando a lei for
omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e
os princípios gerais de direito. Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos
fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
Sobre o tema antinomia de segundo grau real, explicita a Professora
Maria Helena Diniz16:
“No conflito entre o critério hierárquico e o de especialidade, havendo
uma norma superior-geral e outra inferior-especial, não será possível
estabelecer uma metarregra geral dando prevalência ao critério
hierárquico, ou vice-versa, sem contrariar a adaptabilidade do direito.
Poder-se-á, então, preferir qualquer um dos critérios, não existindo,
portanto, qualquer predominância de um sobre o outro. (...) na prática, a
exigência de se aplicarem as normas gerais de uma Constituição a
situações novas levaria, às vezes, à aplicação de uma lei especial, ainda
que ordinária, sobre a Constituição. A supremacia do critério de
especialidade só se justificaria, nessa hipótese, a partir do mais alto
princípio da justiça: suum cuique tribuere, baseado na interpretação de
que ‘o que é igual deve ser tratado como igual e o que é diferente, de
maneira diferente’.
Em caso extremo de falta de um critério que possa resolver a
antinomia de segundo grau, o critério dos critérios para solucionar o
conflito normativo seria o do princípio supremo da justiça: entre duas
normas incompatíveis dever-se-á escolher a mais justa”.
e ) Teleológico (sociológico ou finalístico): tem por escopo a
finalidade da norma, os fins sociais da norma jurídica. Procura adaptar a
finalidade da norma à realidade econômica, social e política do caso
concreto.
Com efeito, o art. 5º da LINDB aduz que, na aplicação da lei, o juiz
atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem
comum.
Sem dúvida, o método teleológico ou sociológico é o que melhor se
coaduna com as finalidades do Processo do Trabalho, quais sejam,
promover efetividade à legislação trabalhista e social, assegurar o acesso
do trabalhador à Justiça e realizar a justiça social no campo das relações
laborais.
f ) Interpretação conforme a Constituição: de autoria do eminente
constitucionalista português J. J. Gomes Canotilho, o intérprete deve
realizar, sempre que possível, e após esgotar os métodos tradicionais de
interpretação, a interpretação das normas jurídicas em conformidade
com a Constituição, dando amplitude ou restrição de interpretação da
norma, sem afrontar a sua literalidade ou a vontade do legislador,
renunciando ao excesso de formalismo jurídico e atendendo aos ideários de
justiça material e da segurança jurídica.
Sobre a aludida interpretação, explica o Professor Pedro Lenza17:
“Diante de normas plurissignificativas ou polissêmicas (que
possuem mais de uma interpretação), deve-se preferir a exegese que
mais se aproxime da Constituição e, portanto, não seja contrária ao
texto constitucional, de onde surgem várias dimensões a serem
consideradas, seja pela doutrina, seja pela jurisprudência, destacando-se
que a interpretação conforme será implementada pelo Judiciário e, em
última instância, de maneira final, pela Suprema Corte:
• prevalência da Constituição: deve-se preferir a interpretação não
contrária à Constituição;
• conservação de normas: percebendo o intérprete que uma lei pode
ser interpretada em conformidade com a Constituição, ele deve assim
aplicá-la para evitar a sua não continuidade;
• exclusão da interpretação contra legem: o intérprete não pode
contrariar o texto literal e o sentido da norma para obter a sua
concordância com a Constituição;
• espaço de interpretação: só se admite a interpretação conforme a
Constituição se existir um espaço de decisão e, dentre as várias a que
se chegar, deverá ser aplicada aquela em conformidade com a
Constituição;
• rejeição ou não aplicação de normas inconstitucionais: uma vez
realizada a interpretação da norma, pelos vários métodos, se o juiz
chegar a um resultado contrário à Constituição, em realidade, deverá
declarar a inconstitucionalidade da norma, proibindo a sua correção
contra a Constituição;
• intérprete não pode atuar como legislador positivo: não se
aceita a interpretação conforme a Constituição quando, pelo processo
de hermenêutica, se obtiver uma regra nova e distinta daquela
objetivada pelo legislador e com ela contraditória, em seu sentido
literal ou objetivo. Deve-se, portanto, afastar qualquer interpretação
em contradição com os objetivos pretendidos pelo legislador. (...)”.
Vale ressaltar que, conforme a Hermenêutica Jurídica moderna, o
intérprete deve valer-se de todos os métodos de interpretação
simultaneamente. São métodos que não se excluem, mas se
complementam, devendo ser utilizados de modo concomitante em busca da
solução mais justa e satisfatória.

5.2 Integração

A integração pode ser conceituada como o suprimento de lacunas


presentes no ordenamento jurídico vigente. Uma das grandes características
do sistema jurídico é a sua completude, de modo que, em havendo omissão
(lacuna ou anomia) da norma, o próprio ordenamento tem a
responsabilidade do respectivo suprimento.
Com efeito, ainda que não exista norma jurídica específica reguladora do
caso concreto, para se manter a plenitude da ordem jurídica, a integração
deve ser utilizada.
O juiz moderno não pode deixar de decidir alegando lacuna ou
obscuridade da lei, nem de sentenciar sob a alegação de que nenhuma
norma jurídica é aplicável (sistema do non liquet), tampouco suspender o
processo até a edição de norma específica (sistema suspensivo). Ocorre que
o ordenamento jurídico atual adota o sistema integrativo, obrigando o
magistrado a decidir o caso concreto, ainda que não haja a respectiva
norma específica.
Os arts. 766 da CLT, 140, parágrafo único, do CPC/2015 e 4 º da LINDB
traduzem a ideia da integração, conforme abaixo apontado:
CLT
“Art. 766. Nos dissídios sobre estipulação de salários, serão
estabelecidas condições que, assegurando justos salários aos
trabalhadores, permitam também justa retribuição às empresas
interessadas”.
CPC/2015
“Art. 140. O juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou
obscuridade do ordenamento jurídico.
Parágrafo único. O juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em
lei”.
LINDB
“Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a
analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.
Sobre o tema, comenta a Professora Maria Helena Diniz18:
“(...) queremos dizer que o direito apresenta lacunas, porém é,
concomitantemente, sem lacunas, o que poderia parecer paradoxal se se
captasse o direito estaticamente. Ele é lacunoso porque a vida social
apresenta nuanças infinitas nas condutas humanas, problemas surgem,
mudam-se as necessidades com o progresso, o que torna impossível a
regulamentação de todo comportamento por normas jurídicas. Mas é
sem lacunas, porque o seu próprio dinamismo apresenta solução para
qualquer caso sub judice, dada pelo Poder Judiciário ou Legislativo. O
próprio direito supre seus espaços vazios, mediante a aplicação e criação
de normas. De forma que o sistema jurídico não é completo, mas
completável.
Admitida a existência de lacuna jurídica, surge o problema de sua
constatação e preenchimento, que só pode ser resolvido com o emprego
dos meios indicados nos arts. 4º da Lei de Introdução, ou seja, analogia,
costume e princípios gerais de direito”.

5.3 Aplicação

A aplicação é a subsunção de um fato à lei. É a aplicação da norma


jurídica ao caso concreto, ao fato sub judice.
A jurisdição é o poder, o dever, a função, a atividade do Estado de,
imparcialmente, substituindo a vontade das partes, aplicar o direito objetivo
ao caso concreto para resolver a lide, que é o conflito de interesses
qualificado por uma pretensão resistida. O Estado-juiz diz o direito objetivo
ao caso concreto por intermédio de um processo, que é o instrumento da
jurisdição.
Aplicar o direito significa submeter o caso concreto a uma norma jurídica,
baseando-se nos meios de interpretação supramencionados, nas técnicas de
integração e na eficácia da norma no tempo e no espaço.

5.4 Eficácia da norma processual trabalhista no tempo e no espaço

5.4.1 Eficácia no tempo

Neste momento da exposição, tomaremos por base o conceito de


eficácia jurídica ou técnica, que significa a aptidão da norma para a
produção de efeitos jurídicos.
Segundo os brilhantes ensinamentos do eminente jurista Pontes de
Miranda, os atos jurídicos devem ser estudados em três planos distintos
(“Escada Ponteana”):
• Plano da existência: é a verificação se o ato jurídico existe ou não
no mundo jurídico. Para que tenha existência no mundo jurídico, o ato
jurídico deve apresentar elementos mínimos ou essenciais, quais sejam:
vontade; partes (agentes); objeto; e forma.
• Plano da validade: é a verificação se o ato jurídico é válido ou não,
à luz do ordenamento jurídico vigente. São elementos de validade:
vontade livre, sem vícios; partes ou agentes capazes; objeto lícito,
possível, determinado ou determinável; e forma prescrita ou não defesa
em lei (art. 104 do CC). A Teoria das Nulidades ou Invalidade é
estudada nesse plano.
• Plano da eficácia: é a verificação da aptidão do ato jurídico na
produção de efeitos jurídicos. Nesse plano, são estudados os
elementos acidentais: condição, termo e encargo.
Dessa forma, no estudo da eficácia da lei processual trabalhista no
tempo, dois princípios deverão ser analisados:
1º) Princípio da irretroatividade das normas processuais: a norma
processual trabalhista não poderá retroagir prejudicando o direito adquirido,
o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Corroboram esse princípio os
seguintes dispositivos legais:
CF
“Art. 5º (…)
XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito
e a coisa julgada; (...)”.
LINDB
“Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato
jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”.
CLT
“Art. 912. Os dispositivos de caráter imperativo terão aplicação
imediata às relações iniciadas, mas não consumadas, antes da vigência
desta Consolidação”.
“Art. 915. Não serão prejudicados os recursos interpostos com apoio
em dispositivos alterados ou cujo prazo para interposição esteja em
curso à data da vigência desta Consolidação”.
CPC/2015
“Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável
imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais
praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma
revogada”.
“Art. 1.046. Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se
aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei n.
5.869, de 11 de janeiro de 1973”.
Com efeito, adota-se o sistema do isolamento dos atos processuais.
O processo é o instrumento da jurisdição, representando o conjunto de atos
processuais coordenados que se sucedem no tempo, objetivando a entrega
da prestação jurisdicional.
Assim, a lei processual trabalhista nova apenas será aplicada aos atos
processuais a serem praticados. De outra sorte, os atos processuais já
praticados sob a égide da lei anterior são válidos e produzem os efeitos
jurídicos previstos na antiga norma.
O mencionado sistema do isolamento dos atos processuais observa o
princípio das preclusões, ou seja, os atos processuais já praticados
deverão ser respeitados, na medida em que configuram atos jurídicos
perfeitos. Observa-se, nessa hipótese, a preclusão consumativa, que é
a perda da faculdade de praticar um ato processual pela consumação de ato
processual anterior.
Com o advento da Reforma do Judiciário (EC n. 45/2004), houve
ampliação significativa da competência material da Justiça do Trabalho,
prevista no art. 114 da CF.
Nesse contexto, surgiram as seguintes indagações:
1) Os processos que tramitavam na Justiça Comum (Federal ou Estadual),
versando sobre matérias atinentes a essa nova competência, deveriam ser
remetidos automaticamente à Justiça do Trabalho com a Reforma do
Judiciário?
2) Qual norma processual de competência deve prevalecer: a antiga ou a
nova?
Surgiram cinco linhas de entendimento, a seguir explanadas:
1ª corrente: o processo deve ser considerado como um todo
indivisível. Dessa forma, deve continuar tramitando na Justiça Comum se
a ação foi ajuizada antes do advento da nova lei.
2ª corrente: defende o sistema do isolamento dos atos
processuais, de modo que a lei processual trabalhista nova não atinge os
atos processuais já praticados, sendo aplicável aos atos processuais a
serem praticados, pouco importando a fase processual na qual os atos
estejam situados.
3ª corrente: o processo deve ser dividido em fases processuais
autônomas (postulatória, instrutória, decisória e recursal). Assim, a lei
nova somente será aplicada sobre a fase processual ainda não iniciada.
4ª corrente: todos os processos que ventilem matéria relacionada à
nova competência material da Justiça do Trabalho devem ser
imediatamente remetidos da Justiça Comum à Justiça Laboral,
independentemente da fase processual em que se encontram ou dos atos
processuais já praticados, com exceção dos processos que já possuem
sentença transitada em julgado. Para essa linha de entendimento, os
processos que tramitavam na Justiça Comum, à época do advento da EC n.
45/2004 com coisa julgada, deveriam permanecer lá tramitando sem a
remessa, com fulcro no art. 516, II, do CPC/2015.
5ª corrente: todos os processos que ventilem matéria relacionada à
nova competência material da Justiça do Trabalho devem ser
imediatamente remetidos da Justiça Comum à Justiça Laboral,
independentemente da fase processual em que se encontram ou dos atos
processuais já praticados, com exceção dos processos que já possuem
sentença prolatada, seja de mérito ou não. Para essa linha de
entendimento, os processos que tramitavam na Justiça Comum, à época do
advento da EC n. 45/2004 com sentença terminativa ou definitiva
prolatada, deveriam lá permanecer tramitando sem a remessa.
Sobre o tema, convém mencionar os recentes entendimentos
consolidados dos Tribunais Superiores:
STJ
“Súmula 367. A competência estabelecida pela EC n. 45/2004 não
alcança os processos já sentenciados”.
STF
“Súmula Vinculante 22. A Justiça do Trabalho é competente para
processar e julgar as ações de indenização por danos morais e
patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho propostas por
empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não
possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação
da Emenda Constitucional n. 45/2004”.
Dessa forma, tanto o STF quanto o STJ adotaram a 5ª corrente
suprarreferida.

Entendemos que essa questão deverá ser analisada sob dois


enfoques: o jurídico e o político.
N o âmbito jurídico, o entendimento adotado está processualmente
incorreto, pois a ampliação da competência material da Justiça do
Trabalho, fruto da EC n. 45/2004, envolve competência absoluta, sendo
uma das exceções do princípio da perpetuatio jurisdictionis, previsto
no art. 43 do CPC/2015.
Explicando melhor, o aludido dispositivo legal estabelece que a
competência é determinada no momento em que a ação é proposta,
sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito
ocorridas posteriormente. Como dissemos, trata-se do princípio da
perpetuatio jurisdictionis, ou seja, da perpetuação da competência,
uma vez que se privilegia a estabilidade das relações jurídicas e
sociais. Todavia, tal regra não é absoluta, comportando duas exceções:
1ª) supressão do órgão do Poder Judiciário;
2ª) alteração da competência em razão da matéria ou da hierarquia
(competência absoluta).
Assim, a alteração superveniente da competência absoluta acarreta o
deslocamento automático dos autos à Justiça competente, pouco
importando a fase processual em que se encontram os autos, ainda
que já tenha trânsito em julgado. No mesmo sentido, encontramos a
Súmula 10 do STJ, ao aduzir que, instalada a Vara do Trabalho, cessa
automaticamente a competência do juiz de direito em matéria
trabalhista, ainda que o processo esteja em fase de execução.
De outra sorte, por razões de política judiciária, evitando-se
verdadeiros colapsos na Justiça do Trabalho com a remessa de
milhares de processos da Justiça Comum, e por questões de adaptação
a significativa alteração de competência, os processos que tramitavam
na Justiça Comum à época da entrada em vigor da Reforma do
Judiciário com sentença prolatada (de mérito ou não), lá continuavam
sendo processados. Em sentido contrário, os processos sem sentença
definitiva ou terminativa foram remetidos à Justiça do Trabalho. Assim,
adotou-se o entendimento de que a alteração superveniente de
competência, mesmo que determinada por regra constitucional, não
atinge a validade de sentença anteriormente proferida.
Conclusão: a posição adotada é processualmente incorreta, mas
politicamente correta.
2º) Princípio do efeito imediato ou da eficácia imediata: como a
própria expressão nos sugere, a nova norma processual trabalhista, dotada
de caráter cogente, tem aplicação e efeitos imediatos sobre os processos
em curso, respeitando-se o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa
julgada. No entanto, frisamos que os atos processuais praticados antes da
lei nova consubstanciam atos jurídicos perfeitos e deverão ser
respeitados, uma vez que a nova lei será aplicada somente aos atos
supervenientes, ou seja, àqueles que ainda serão praticados.
Sobre essa temática, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Instrução
Normativa 41 (Resolução 221, de 21 de junho de 2018), que dispõe sobre
as normas da CLT, com as alterações da Lei n. 13.467/2017 e sua aplicação
ao Processo do Trabalho.
Com efeito, foram consignadas regras de direito intertemporal de
aplicação das normas processuais da Reforma Trabalhista.
Nessa obra, encontrará o anexo da aludida Instrução Normativa.

5.4.2 Eficácia no espaço

O estudo da eficácia da norma processual trabalhista no espaço tem por


fundamento o princípio da territorialidade.
Assim, a lei processual trabalhista produz efeitos em todo o território
nacional, e é aplicável a todos os brasileiros (natos ou naturalizados), aos
estrangeiros residentes e não residentes em território nacional, às pessoas
jurídicas e aos apátridas, segundo atual roupagem conferida ao art. 5º,
caput, da CF, pelo Supremo Tribunal Federal.
Nesse sentido, estabelecem os arts. 14, 16 e 1.046 do CPC/2015:
“Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável
imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais
praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma
revogada”.
“Art. 16. A jurisdição civil é exercida pelos juízes e pelos tribunais em
todo o território nacional, conforme as disposições deste Código”.
“Art. 1.046. Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se
aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei n.
5.869, de 11 de janeiro de 1973”.
Por fim, vale ressaltar que uma sentença estrangeira somente
produzirá efeitos na República Federativa do Brasil depois de homologada
pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, i, da CF – EC n. 45/2004 –
juízo de delibação). Depois de homologada pelo STJ, consubstancia título
executivo judicial (art. 515, VIII, do CPC/2015), devendo ser executada na
Justiça Comum Federal (art. 109, X, da CF).

6 Fontes
O assunto é um dos mais importantes no estudo da Ciência Jurídica. Por
exemplo, no âmbito processual trabalhista conseguimos compreender a
sistemática processual da disciplina e por que esse ramo é autônomo e
complexo.
Recorremos ao eminente Ministro do TST, Mauricio Godinho Delgado19, a
fim de aprofundarmos o estudo:
“(...)
A palavra fontes, como se sabe, comporta relativa variedade
conceitual. Além da acepção estrita de nascente, o verbete é utilizado no
sentido metafórico traduzindo a ideia de início, princípio, origem, causa.
Nesta acepção metafórica, fonte seria ‘a causa donde provêm efeitos,
tanto físicos como morais’.
A teoria jurídica captou a expressão em seu sentido metafórico. Assim:
no plano dessa teoria, fontes do Direito consubstancia a expressão
metafórica para designar a origem das normas jurídicas”.
Diante do exposto, iniciaremos a abordagem das fontes do Direito,
partindo da premissa de que fonte traduz a ideia de origem, princípio, início,
causa, nascedouro. Fontes do Direito podem ser conceituadas como a
origem das normas jurídicas.
A seguir, a classificação das fontes.

6.1 Fontes materiais

A s fontes materiais representam o momento pré-jurídico, o


momento anterior da norma propriamente dita. São, na verdade, os fatores
que fundamentam e inspiram o legislador na elaboração da norma. São os
fatores que conduzem à emergência e construção da regra de Direito, que
influenciam a formação e transformação das normas jurídicas. São as fontes
potenciais do Direito Processual do Trabalho e emergem do próprio direito
material do trabalho. Lembremos que os objetivos do Processo do Trabalho
são: a promoção da legislação trabalhista e social e o acesso do trabalhador
à Justiça do Trabalho.
Exemplos: fatores econômicos, sociais, políticos, filosóficos, culturais,
éticos, morais etc. A greve é um grande exemplo de fonte material, pois
representa a pressão exercida pelos trabalhadores em face do empregador
e do Estado. Outros exemplos são os Tratados e Convenções Internacionais
não ratificados pela República Federativa do Brasil.
É oportuno consignar que a doutrina moderna sustenta a ideia de
socialização do direito processual. Se o processo é o instrumento da
jurisdição (caráter instrumental do processo) e, portanto, não é um fim em
si mesmo, deverá atuar com o escopo da realização dos valores sociais
contemporâneos, consubstanciando um sentimento universal em benefício
da verdadeira justiça.
As fontes formais, por sua vez, representam o momento eminente e
tipicamente jurídico, uma vez que a norma já foi construída e
materializada. Trata-se de mecanismos exteriores e estilizados pelos quais
essas regras se revelam para o mundo exterior, ou seja, ingressam,
instauram-se e cristalizam-se na ordem jurídica. Temos duas grandes
teorias sobre as fontes formais:
1ª) Teoria Monista – sustenta que as fontes formais do Direito
derivam de um único centro de positivação, o Estado, caracterizado
como o único com poderes de coerção/sanção.
2ª) Teoria Dualista – parte da premissa de que o Estado é o principal
centro de positivação das fontes do Direito, mas não o único. Existem
outros centros de positivação ao longo da sociedade civil. Exemplos:
costumes e instrumentos jurídicos de negociação coletiva (convenções
coletivas de trabalho e acordos coletivos de trabalho).
Como a Teoria Dualista é a majoritária, as fontes formais
classificam-se em heterônomas e autônomas. Vejamos:
I) Fontes formais heterônomas: são as normas jurídicas oriundas do
Estado, sem a participação imediata dos destinatários principais das regras
jurídicas. Exemplos: CF; espécies normativas do art. 59 da CF (emendas
constitucionais, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas,
medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções); sentenças
normativas; súmulas vinculantes do STF; Tratados e Convenções
Internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil, como as
Convenções da OIT etc.
II) Fontes formais autônomas: são as normas jurídicas oriundas da
participação imediata dos destinatários principais das regras jurídicas
(segmentos ou organizações da sociedade civil), sem a interveniência do
Estado. Exemplos: costumes, convenções coletivas e acordos coletivos de
trabalho.
Outra classificação das fontes formais do Direito Processual do Trabalho,
segundo os ensinamentos do eminente jurista Carlos Henrique Bezerra
Leite, é a seguinte:
a ) fontes formais diretas: abrangem a lei em sentido genérico (atos
normativos e administrativos editados pelo Poder Público) e o costume;
b ) fontes formais indiretas: são aquelas extraídas da doutrina e da
jurisprudência;
c ) fontes formais de explicitação (fontes integrativas): têm por
objetivo a integração do Direito Processual do Trabalho, por suprirem as
lacunas existentes no sistema processual trabalhista e atuarem no sentido
da completude do ordenamento jurídico. Exemplos: analogia, princípios
gerais de direito e equidade.
São fontes formais do Direito Processual do Trabalho:
• Constituição Federal de 1988 (Constituição Cidadã);
• Decreto-Lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943 – Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT);
• Lei n. 5.584/70 – normas procedimentais aplicadas ao Processo do
Trabalho;
• Lei n. 13.105/2015 – Código de Processo Civil – aplicado supletiva e
subsidiariamente ao Processo do Trabalho, desde que haja lacuna na
CLT e compatibilidade de princípios e regras (art. 769 da CLT e art. 15
do CPC/2015);
• Lei n. 6.830/80 – Lei de Execução Fiscal – aplicada subsidiariamente à
execução trabalhista, desde que haja lacuna na CLT e compatibilidade
de princípios e regras;
• Lei n. 7.701/98 – dispõe sobre a organização e especialização dos
tribunais em processos coletivos e individuais;
• Lei Complementar n. 75/93 – Estatuto do Ministério Público da União
(Lei Orgânica do Ministério Público da União – LOMPU);
• Lei n. 7.347/85 – Lei da Ação Civil Pública;
• Lei n. 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor;
• Lei n. 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA;
• Lei n. 7.853/89 – Lei de Proteção à Pessoa Portadora de Deficiência;
• Decreto-Lei n. 779/69 – Prerrogativas Processuais da Fazenda Pública;
• Decreto-Lei n. 75/66 – Correção Monetária;
• Espécies Normativas do art. 59 da CF/88, que tratam da matéria
processual trabalhista (emendas constitucionais, leis complementares,
leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos
e resoluções);
• Regimentos Internos dos Tribunais Trabalhistas;
• Convenção da OIT;
• Tratados Internacionais;
• Convenções Coletivas e Acordos Coletivos de Trabalho;
• Súmulas Vinculantes do STF;
• Súmulas do STF (matéria trabalhista);
• Súmulas do STJ (matéria trabalhista);
• Súmulas, Orientações Jurisprudenciais e Precedentes Normativos do
TST;
• Doutrina;
• Jurisprudência;
• Analogia;
• Costumes;
• Princípios Gerais de Direito.
Por fim, a respeito de as Convenções da OIT serem consideradas fontes
formais do Direito Processual do Trabalho, temos o Enunciado n. 3 da 1ª
Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho:
“I – FONTES DO DIREITO DO TRABALHO. DIREITO COMPARADO.
CONVENÇÕES DA OIT NÃO RATIFICADAS PELO BRASIL. O Direito
Comparado, segundo o art. 8º da Consolidação das Leis do Trabalho, é
fonte subsidiária do Direito do Trabalho. Assim, as Convenções da
Organização Internacional do Trabalho, não ratificadas pelo Brasil,
podem ser aplicadas como fontes do direito do trabalho, caso não haja
norma de direito interno pátrio regulando a matéria.
II – FONTES DO DIREITO DO TRABALHO. DIREITO COMPARADO.
CONVENÇÕES E RECOMENDAÇÕES DA OIT. O uso das normas
internacionais, emanadas da Organização Internacional do Trabalho,
constitui-se em importante ferramenta de efetivação do Direito Social e
não se restringe à aplicação direta das Convenções ratificadas pelo país.
As demais normas da OIT, como as Convenções não ratificadas e as
Recomendações, assim como os relatórios dos seus peritos, devem servir
como fonte de interpretação da lei nacional e como referência a reforçar
decisões judiciais baseadas na legislação doméstica”.

QUESTÕES DE CONCURSOS PÚBLICOS

1. (TRT – 6R – Técnico Judiciário Área Administrativa – FCC –


2018) O advogado Hermes pretende utilizar uma medida
processual que não está prevista na Consolidação das Leis do
Trabalho para defender os interesses da empresa reclamada em
uma reclamação trabalhista. Nessa situação,
a) não poderá utilizar desta medida porque a Consolidação das Leis do
Trabalho apresenta todas as regras do processo do trabalho.
b) somente poderia se valer de medida processual estranha à Consolidação
das Leis do Trabalho se estivesse na defesa dos interesses do
empregado, em face do princípio da proteção ao trabalhador.
c) poderia utilizar de medida processual prevista no Código de Processo
Civil apenas na fase de execução da sentença, porque na fase de
conhecimento deve se valer apenas das regras contidas na lei
processual trabalhista.
d) nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do
direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível
com as normas do processo judiciário do trabalho.
e) poderá utilizar de qualquer regra do direito processual comum, porque
este tem preferência em sua aplicação sobre as normas processuais
trabalhistas, por serem normas de maior amplitude.
III

PRINCÍPIOS DO DIREITO
PROCESSUAL DO TRABALHO

1 Introdução
No Direito, os princípios são regramentos básicos que fundamentam
todo o ordenamento jurídico, determinado ramo ou área do conhecimento
ou um instituto de direito material ou processual do trabalho.
Sempre menciono nas minhas aulas que o estudo dos princípios, para
qualquer ramo ou instituto jurídico, representa a parte mais importante da
matéria, servindo de base para a compreensão do conteúdo. Representa a
parte nuclear da ciência jurídica.
O eminente jurista Celso Antônio Bandeira de Mello20 assim define
princípio:
“É, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro
alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes
normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata
compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a
racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá
sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a
intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há
por nome sistema jurídico positivo.
Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma
qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um
específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos.
É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o
escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo
o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia
irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra”.

2 Princípios peculiares do direito processual do


trabalho
O Direito Processual do Trabalho é regido por Princípios
Constitucionais do Processo, bem como por Princípios do Direito
Processual Civil.
Além disso, é inegável que o Processo Laboral possui princípios
peculiares, típicos, caracterizando a sua autonomia.
Vamos estudar os princípios peculiares do Direito Processual do
Trabalho:
1. princípio da simplicidade;
2. princípio da informalidade;
3. princípio do jus postulandi;
4. princípio da oralidade;
5. princípio da subsidiariedade;
6. princípio da celeridade.

2.1 Princípio da simplicidade

Comparando-se o Processo Civil com o Processo do Trabalho, é inegável


afirmar que o último é mais simples e menos burocrático do que o
primeiro. Na verdade, a CLT preocupou-se com o jus postulandi, que é a
possibilidade de empregado e empregador postularem pessoalmente
perante a Justiça do Trabalho e acompanharem as suas reclamações até o
final, sem advogado (art. 791 da CLT), sendo uma exceção do ordenamento
jurídico vigente da capacidade postulatória privativa de advogado.
Dessa forma, privilegiou-se a facilitação do acesso do trabalhador ao
Judiciário Trabalhista, bem como ao trâmite processual simplificado,
entregando-se ao jurisdicionado as verbas trabalhistas, de natureza
alimentar.
Como observamos, sempre que possível, os excessos do formalismo e da
burocracia devem ser eliminados, na medida em que a busca da efetiva
prestação jurisdicional e do acesso à ordem jurídica justa devem ser uma
constante.

2.2 Princípio da informalidade

Processo é o instrumento da jurisdição. É o conjunto de atos processuais


coordenados que se sucedem no tempo, objetivando a entrega do bem da
vida ao jurisdicionado com a aplicação do direito objetivo ao caso concreto.
Já o procedimento é a forma pela qual o processo se desenvolve, de
modo mais singelo ou mais complexo.
O Processo do Trabalho apresenta quatro procedimentos:
I) procedimento comum (ordinário): para as demandas cujo valor da
causa seja superior a 40 salários mínimos;
II) procedimento sumário (dissídio de alçada): previsto no art. 2º,
§§ 3º e 4º, da Lei n. 5.584/70, para os litígios cujo valor da causa não
supere dois salários mínimos;
I I I ) procedimento sumaríssimo: fruto do advento da Lei n.
9.957/2000, que incluiu na CLT os arts. 852-A a 852-I, abrange os dissídios
individuais cujo valor da causa seja superior a dois salários mínimos e
limitado até 40 salários mínimos;
IV) procedimento especial: abrange todas as ações que apresentam
regras especiais, como o inquérito judicial para apuração de falta grave, o
dissídio coletivo, a ação de cumprimento, a ação rescisória, o mandado de
segurança, a ação de consignação em pagamento, as ações possessórias, o
habeas corpus, o habeas data, a ação de prestação de contas etc. Assim,
além dos procedimentos especiais tipicamente trabalhistas, temos os ritos
especiais constitucionais e cíveis admitidos na Justiça do Trabalho.
Assim, o Processo do Trabalho apresenta basicamente um procedimento
mais complexo e completo, que é o comum (ordinário), e dois
procedimentos céleres (sumário e sumaríssimo). Em todos eles,
percebemos a preocupação com a informalidade, se comparamos com os
procedimentos do Processo Civil.
Todavia, vale ressaltar que essa informalidade não é absoluta, e sim
relativa, uma vez que dependerá da documentação do procedimento. O
procedimento escrito é fundamental para a observância do princípio
constitucional do devido processo legal (art. 5º, LIV, da CF), trazendo aos
operadores do Direito e ao jurisdicionado maior segurança e estabilidade
nas relações jurídicas e sociais.
Na verdade, a mencionada informalidade refere-se ao fato de que o
procedimento judicial na Justiça do Trabalho não é tão solene e rígido
quanto aos demais, justamente para garantir o pleno atendimento à justiça,
mas sempre conforme os limites da lei.

2.3 Princípio do jus postulandi

O jus postulandi é uma das principais características do Processo do


Trabalho, uma vez que traduz a possibilidade de as partes (empregado e
empregador) postularem pessoalmente na Justiça do Trabalho e
acompanharem as suas reclamações até o final, sem necessidade de
advogado (art. 791 da CLT).
Consubstancia uma exceção da capacidade postulatória privativa de
advogado.
O jus postulandi é um dos grandes fundamentos dos princípios da
simplicidade e informalidade supramencionados.
É oportuno consignar que, em decisão do Pleno do TST (13-10-2009), o
jus postulandi não é mais admitido no âmbito do TST, havendo a
necessidade da figura do advogado. Esse novo entendimento é justificado
pelo fato de que os recursos trabalhistas de natureza extraordinária
(recurso de revista e embargos no TST), por não admitirem a rediscussão
de fatos e provas (Súmula 126 do TST), exigem conhecimento técnico-
jurídico de um advogado.
Com efeito, à luz da Súmula 425 do Tribunal Superior do Trabalho, o jus
postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas
do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação
rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de
competência do Tribunal Superior do Trabalho.

2.4 Princípio da oralidade

Trata-se de um princípio não exclusivo do Processo do Trabalho, também


servindo de fundamento para o Direito Processual Comum. Entretanto, no
Processo do Trabalho, ele é observado de forma mais acentuada, tendo
em vista os princípios da simplicidade, da informalidade e do jus postulandi.
São características do princípio da oralidade do Processo do Trabalho:
a) primazia da palavra:
• arts. 791 e 839, a, da CLT – apresentação de reclamação trabalhista
diretamente pelo interessado;
• art. 840 da CLT – possibilidade de apresentação de reclamação
trabalhista oral;
• arts. 843 e 845 da CLT – as partes deverão comparecer pessoalmente
na audiência trabalhista, independentemente do comparecimento de
seus representantes legais;
• art. 847 da CLT – apresentação de defesa oral em audiência;
• art. 848 da CLT – interrogatório e depoimento pessoal das partes em
audiência;
• art. 850 da CLT – razões finais orais em audiência;
• art. 850, parágrafo único, da CLT – sentença após o término da
instrução;
b) imediatidade (arts. 843, 845 e 848 da CLT);
c) concentração dos atos processuais em audiência (arts. 843 a 852
da CLT);
d) identidade física do juiz (vale ressaltar que, embora a identidade
física do juiz seja uma das grandes características do princípio da oralidade
e presente na CLT, fruto da concentração dos atos processuais em
audiência, o TST, em sua Súmula 136, entendia que essa identidade não é
aplicável às Varas do Trabalho. Vale ressaltar também que essa Súmula foi
cancelada pela Resolução 185, de 14 de setembro de 2012, do TST);
e ) irrecorribilidade imediata/direta/em separado/autônoma das
decisões interlocutórias (art. 893, § 1º, da CLT);
f) maiores poderes instrutórios ao juiz (arts. 765, 766, 827 e 848);
g) maior interatividade entre o magistrado e as partes, traduzindo o
princípio da cooperação, que defende um maior diálogo entre o juiz e o
jurisdicionado em prol de um acesso à ordem jurídica justa (arts. 764, §§ 2º
e 3º, 846 e 850 da CLT);
h) possibilidade de solução conciliada.
Com efeito, muitas das lacunas do Processo do Trabalho apresentadas
pela doutrina e pela jurisprudência são intencionais e decorrem do próprio
princípio da oralidade, não sendo essencialmente lacunas.
Por derradeiro, somos adeptos do entendimento que, com o advento da
EC n. 24/99 e a respectiva extinção da representação classista da Justiça do
Trabalho em todos os graus de jurisdição, o princípio da identidade
física do juiz, que estava previsto no art. 132 do CPC/1973, deve ser
aplicado ao Processo do Trabalho. São inegáveis as vantagens da adoção
do princípio da identidade física no Processo Laboral, uma vez que
possibilita julgamentos mais justos, representados por decisões prolatadas
pelos próprios juízes que conduzirem o processo e, especialmente, as
audiências.
2.5 Princípio da subsidiariedade

A CLT e a legislação trabalhista esparsa apresentam lacunas naturais,


não conseguindo regular todas as situações jurídicas e sociais.
Assim, na fase de conhecimento, o art. 769 da CLT aduz que o
Direito Processual Comum será fonte subsidiária do Direito Processual do
Trabalho, contanto que preencha dois requisitos cumulativos:
1º) omissão (lacuna, anomia) da CLT;
2º) compatibilidade de princípios e regras.
Da mesma forma, na fase de execução trabalhista, o art. 889 da
CLT estabelece que a Lei de Execução Fiscal (Lei n. 6.830/80) será fonte
subsidiária do Processo do Trabalho, isto se preencher, a exemplo da fase
de conhecimento, dois requisitos cumulativos:
1º) omissão (lacuna, anomia) da CLT;
2º) compatibilidade de princípios e regras.

2.5.1 As lacunas da CLT e a aplicação subsidiária do Direito Processual Civil ao


Direito Processual do Trabalho

Este tema é um dos mais importantes, que merece atenção especial em


sua abordagem.
O art. 769 da CLT (talvez o mais importante do Diploma Consolidado)
trata da matéria:
“Art. 769. Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte
subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for
incompatível com as normas deste Título”.
Com fulcro no mencionado dispositivo legal, a aplicação subsidiária do
Processo Civil ao Processo do Trabalho depende do preenchimento de dois
requisitos cumulativos:
1º) omissão (lacuna, anomia) da CLT: há omissão tanto no Diploma
Consolidado quanto na legislação processual trabalhista esparsa (Lei n.
5.584/70, n. 7.701/88 etc.);
2º) compatibilidade principiológica: compatibilidade entre os
princípios e regras do Direito Processual Civil com os princípios e regras do
Direito Processual do Trabalho.
As lacunas da legislação processual são classificadas em:
a ) lacunas normativas: são aquelas representadas pela ausência de
norma reguladora do caso concreto, ou seja, não há regulamentação em
lei sobre determinada situação processual. As lacunas normativas
aproximam-se das lacunas primárias (tradicionais);
b) lacunas ontológicas: partem da premissa da existência de norma
reguladora do caso concreto. Todavia, a norma existente está
desatualizada, não apresentando mais compatibilidade com os fatos
sociais e com o progresso técnico. É o que a doutrina chama de
“ancilosamento da norma positiva”, isto é, o envelhecimento da norma;
c) lacunas axiológicas: também partem da premissa da existência da
norma reguladora do caso concreto; entretanto, a aplicação da norma
existente produzirá uma solução injusta ou insatisfatória, ou seja, não
observará os valores de justiça e equidade, que são indispensáveis para a
eficácia da norma processual.
Cumpre frisar que o assunto em debate (incompletude do sistema
processual em decorrência das lacunas existentes no ordenamento
processual justrabalhista) gera grandes discussões doutrinárias e
jurisprudenciais. Assim, há duas correntes sobre a interpretação do art.
769 da CLT:
1ª corrente – Teoria Tradicional, Clássica ou Restritiva: a aplicação
subsidiária das regras do Direito Processual Civil somente é possível na
hipótese de lacuna na legislação processual trabalhista. Assim, a existência
de omissão é condição indispensável para a aplicação subsidiária. Portanto,
somente a lacuna normativa, que é a ausência de norma reguladora do
caso concreto, autoriza a aplicação subsidiária. Fundamentos:
• respeito ao princípio constitucional do devido processo legal (art. 5º,
LIV, da CF), evitando-se surpresas ao jurisdicionado com a aplicação de
outras regras processuais que não sejam as previstas na legislação
processual trabalhista;
• princípio da segurança jurídica, assegurando-se estabilidade nas
relações jurídicas e sociais não somente aos jurisdicionados, mas
também aos operadores do Direito.
São adeptos dessa corrente grandes juristas, como Pedro Paulo Teixeira
Manus e Manoel Antonio Teixeira Filho21:
“O art. 769 da CLT dispõe que ‘nos casos omissos o direito processual comum será fonte
subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas
deste Título’. Referida regra tem aplicação somente na fase de conhecimento ao colocar o CPC
como fonte subsidiária primeira do processo do trabalho. Já na fase de execução no processo do
trabalho, a regra de aplicação da lei subsidiária é aquela prescrita no art. 889 da CLT que afirma que
‘aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não
contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a
cobrança judicial da dívida da Fazenda Pública Federal’. Desse modo, como sabemos, a lei
estabelece a regra específica a se aplicar tanto na fase de conhecimento quanto na de execução. E
há em comum na aplicação de ambas as leis o requisito da omissão pela CLT, o que desde logo
exclui aplicação de norma subsidiária quando aquela disciplinar a matéria. A regra estabelecida em
ambos os artigos acima transcritos configura princípio típico do processo do trabalho, que garante o
respeito ao devido processo legal, na medida em que o jurisdicionado tem a segurança de que não
será surpreendido pela aplicação de norma diversa sempre que houver a solução do texto
consolidado. É sob esta ótica que devemos examinar, a nosso ver, as modificações que se
processam no Código de Processo Civil e a possibilidade de sua aplicação ao processo do trabalho”.

Para Manoel Antonio Teixeira Filho22,


“o art. 769, da CLT, permite a adoção supletiva de normas do processo
civil desde que: a) a CLT seja omissa quanto à matéria; b) a norma do
CPC não apresente incompatibilidade com a letra ou com o espírito do
processo do trabalho.
Não foi por obra do acaso que o legislador trabalhista inseriu o
‘requisito da omissão, antes da compatibilidade: foi, isto sim, em
decorrência de um proposital critério lógico-axiológico. Desta forma, para
que se possa cogitar da compatibilidade, ou não, de norma do processo
civil com a do trabalho é absolutamente necessário, ex vi legis, que,
antes disso, se verifique, se a CLT se revela omissa a respeito da
matéria. Inexistindo omissão, nenhum intérprete estará autorizado a
perquirir sobre a mencionada compatibilidade. Aquela constitui,
portanto, pressuposto fundamental desta”.
2ª corrente – Teoria Moderna, Evolutiva, Ampliativa ou
Sistemática: a aplicação subsidiária do Direito Processual Civil ao Direito
Processual do Trabalho é possível não somente nos casos de lacunas
normativas, mas também nas hipóteses de lacunas ontológicas e
axiológicas. Para essa linha de entendimento, ainda que a CLT ou
legislação processual trabalhista extravagante preveja norma específica
reguladora do caso concreto, é cabível a aplicação subsidiária da norma do
Processo Civil se a norma processual trabalhista estiver desatualizada ou se
a respectiva aplicação mostrar-se injusta ou insatisfatória. Fundamentos:
• princípio da efetividade processual;
• princípio da celeridade processual (razoável duração do processo);
• princípio do acesso à ordem jurídica justa;
• caráter instrumental do processo;
• melhoria da prestação jurisdicional trabalhista;
• dignidade da pessoa do trabalhador;
• melhoria da condição social do trabalhador.
Assim, o trabalhador teria real e efetivo acesso à Justiça do Trabalho. São
adeptos dessa corrente grandes juristas, como Mauro Schiavi, Carlos
Henrique Bezerra Leite e Jorge Luiz Souto Maior:
Mauro Schiavi23: “Sob outro enfoque, o juiz, como condutor do
Processo do Trabalho, encarregado de zelar pela dignidade do processo
e pela efetividade da jurisdição trabalhista, conforme já nos
posicionamos, deve ter em mente que o processo deve tramitar em
prazo compatível com a efetividade do direito de quem postula, uma vez
que a duração razoável do processo foi erigida a mandamento
constitucional, e buscar novos caminhos e interpretação da lei no sentido
de materializar este mandamento constitucional.
(...) a moderna doutrina vem defendendo um diálogo maior entre o
Processo do Trabalho e o Processo Civil, a fim de buscar, por meio de
interpretação sistemática e teleológica, os benefícios obtidos na
legislação processual civil e aplicá-los ao Processo do Trabalho. Não
pode o juiz do Trabalho fechar os olhos para normas de Direito
Processual Civil mais efetivas que a CLT, e se omitir sob o argumento de
que a legislação processual do trabalho não é omissa, pois estão em
jogo interesses muito maiores que a aplicação da legislação processual
trabalhista e sim a importância do Direito Processual do Trabalho, como
sendo um instrumento célere, efetivo, confiável, que garanta, acima de
tudo, a efetividade da legislação processual trabalhista e a dignidade da
pessoa humana”.
Jorge Luiz Souto Maior24: “(...) quando há alguma alteração no
processo civil o seu reflexo na esfera trabalhista só pode ser benéfico,
tanto no prisma do processo do trabalho quanto do direito do trabalho,
dado o caráter instrumental da ciência processual.
Dito em outras palavras, mais claras e diretas: quando alguém diz que
foram formuladas mudanças no Código de Processo Civil, o
processualista trabalhista deve indagar: – alguma das inovações traz
benefício à efetividade do processo do trabalho, para fins de melhor
fazer valer os direitos trabalhistas? Se a resposta for negativa ou, até o
contrário, que representa a criação de uma formalidade capaz de gerar
algum óbice a este propósito, deve-se concluir sem medo de se estar
errado: – então, não é preciso nem dizer quais foram as tais
alterações!”.
Nessa linha de raciocínio, aduz o Enunciado n. 66, da 1ª Jornada de
Direito Material e Processual do Trabalho na Justiça do Trabalho:
“Enunciado 66. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DE NORMAS DO PROCESSO
COMUM AO PROCESSO TRABALHISTA. OMISSÕES ONTOLÓGICA E
AXIOLÓGICA. ADMISSIBILIDADE.
Diante do atual estágio de desenvolvimento do processo comum e da
necessidade de se conferir aplicabilidade à garantia constitucional da
duração razoável do processo, os artigos 769 e 889 da CLT comportam
interpretação conforme a Constituição Federal, permitindo a aplicação
das normas processuais mais adequadas à efetivação do direito.
Aplicação dos princípios da instrumentalidade, efetividade e não
retrocesso social”.

Com o devido respeito aos entendimentos em sentido contrário,


achamos salutar a aplicação subsidiária das regras do Direito Processual
Civil ao Direito Processual do Trabalho ainda que haja norma
processual trabalhista específica reguladora do caso concreto.
Assim, devemos adotar a tríplice classificação das lacunas, considerando
não apenas as lacunas normativas, mas também as ontológicas e
axiológicas.
A efetividade do processo é assunto da ordem do dia, e deve-se buscar
o acesso real e efetivo do trabalhador à Justiça do Trabalho com
primazia, trazendo o rápido recebimento de seu crédito alimentar.
De outra sorte, a crítica construtiva que faço à Teoria Ampliativa é a
aplicação subsidiária desmedida, trazendo grande insegurança jurídica
aos jurisdicionados e aos operadores do Direito, afrontando
inexoravelmente o consagrado princípio constitucional do devido
processo legal, princípio dos princípios da Ciência Processual. A
segurança e a estabilidade das relações jurídicas e sociais devem ser
respeitadas, com base no princípio da segurança jurídica.
Concluindo, devemos adotar a aplicação subsidiária do Processo Civil
ao Processo do Trabalho ( diálogo das fontes), com base na efetividade
do processo, melhoria do Processo Laboral e acesso real e efetivo do
trabalhador à Justiça Obreira, sem esquecimento dos princípios do
devido processo legal e da segurança jurídica.
Os princípios da ponderação de interesses, da razoabilidade, da
proporcionalidade e da equidade deverão pautar a atuação do juiz do
trabalho na aplicação subsidiária das normas do Processo Civil ao
Processo do Trabalho.
Também, os princípios constitucionais do processo e os valores de
direitos humanos fundamentais deverão ser observados, em uma
interpretação sistemática e teleológica dos sistemas processuais.
A nosso ver, o ideal é a reforma da própria CLT, ou melhor, a edição
de um Código de Processo do Trabalho, trazendo a regulamentação
mais completa possível das situações processuais trabalhistas e
evitando-se ao máximo aplicações subsidiárias.

2.5.2 A polêmica do art. 15 do Código de Processo Civil de 2015 – aplicação


supletiva e subsidiária ao Processo do Trabalho

Conforme anteriormente consignado, os estudiosos da ciência processual


laboral possuem um grande desafio hodierno, qual seja, compatibilizar os
famigerados arts. 769 e 889 da Consolidação das Leis do Trabalho com o
art. 15 do Código de Processo Civil de 2015.
Segundo o Professor Carlos Henrique Bezerra Leite25
“os princípios do Novo CPC exercerão grande influência no Processo do
Trabalho, seja pela nova dimensão e papel que exercem como fontes
normativas primárias do ordenamento jurídico, seja pela necessidade de
reconhecer o envelhecimento e a inadequação de diversos preceitos
normativos de direito processual contidos na CLT, o que exigirá do
juslaboralista formação continuada e uma nova postura hermenêutica,
de modo a admitir que o Processo do Trabalho nada mais é do que o
próprio direito constitucional aplicado à realidade social, política, cultural
e econômica.
Com efeito, o art. 15 do Novo CPC prevê que:
‘Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas
ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas
supletiva e subsidiariamente’.
Lexicamente, o adjetivo ‘supletivo’ significa ‘que completa ou serve de
complemento’, ‘encher de novo, suprir’, enquanto o adjetivo ‘subsidiário’
quer dizer ‘que auxilia’, ‘que ajuda’, ‘que socorre’, ‘que contribui’.
Poderíamos inferir, então, que o Novo CPC não apenas subsidiará a
legislação processual trabalhista como também a complementará, o que
abre espaço, a nosso ver, para o reconhecimento das lacunas
ontológicas e axiológicas do processo trabalhista, máxime se levarmos
em conta a necessidade de adequação do Texto Consolidado, concebido
em um Estado Social, porém ditatorial, ao passo que o novel CPC foi
editado no paradigma do Estado Democrático de Direito.
O art. 15 do Novo CPC, evidentemente, deve ser interpretado
sistematicamente com o art. 769 da CLT, que dispõe: ‘Nos casos
omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito
processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as
normas deste Título’, mas ambos os dispositivos – art. 769 da CLT e art.
15 do Novo CPC – devem estar em harmonia com os princípios e valores
que fundamentam o Estado Democrático de Direito.
(...)
De uma perfunctória análise do Novo CPC, podemos inferir que, por
força da interpretação sistemática dos arts. 769 da CLT e 15 do Novo
CPC, algumas normas do Processo Civil poderão ser aplicadas supletiva e
subsidiariamente, desde que:
a) haja lacuna (normativa, ontológica e axiológica) da legislação
processual trabalhista;
b) a norma a ser migrada seja compatível com a principiologia que
informa o processo laboral.
Presentes, portanto, esses dois requisitos (lacuna e compatibilidade
principiológica), poderemos destacar, pontualmente, que no Processo do
Trabalho as normas do Novo CPC serão:
a) aplicadas supletiva e subsidiariamente sem restrição;
b) de aplicação supletiva e subsidiariamente duvidosa;
c) absolutamente inaplicáveis.
Entendemos por aplicação duvidosa a norma do Novo CPC que, diante
da lacuna (normativa, ontológica ou axiológica) do texto consolidado,
apresenta dificuldade de compatibilização com os princípios do processo
laboral.
Também serão de aplicabilidade duvidosa no Processo do Trabalho as
normas do Novo CPC em relação às ações oriundas da relação de
trabalho diversas da relação de emprego. É dizer, as ações que
passaram a ser processadas e julgadas pela Justiça do Trabalho (CF, art.
114, com redação dada pela EC n. 45/2004).
No afã de prevenir eventuais conflitos de interpretações dos
magistrados trabalhistas acerca da aplicação do Novo CPC e,
consequentemente, reduzir o número de recursos de revista, o TST
editou a Instrução Normativa n. 39/2016, dispondo sobre dispositivos do
Novo CPC aplicáveis e inaplicáveis no processo do trabalho.
É importante ressaltar, porém, que a Associação Nacional dos
Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) ajuizou no STF Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5.516), de relatoria da ministra
Carmen Lúcia, que tem por objeto impugnar a Instrução Normativa n.
39/2016 do TST. A entidade sustenta vício formal e material de
inconstitucionalidade na norma, que trata da aplicação de dispositivos do
Novo CPC ao processo do trabalho.
Concordamos plenamente com o conteúdo da referida ADI, pois, com
todas as vênias, a inconstitucionalidade da IN TST n. 39 é flagrante,
porque:
a) viola o princípio da independência dos órgãos judiciais e separação
dos poderes (CF, art. 2º);
b) usurpa a competência privativa da União para legislar sobre direito
processual (CF, art. 22, I);
c) viola a regra de competência do juiz natural (CF, art. 5º, LIII);
d) viola o princípio da reserva legal, pois somente lei pode estabelecer
a competência do TST (CF, art. 111-A).
A citada Instrução Normativa é também ilegal porque, no sistema dos
precedentes adotado pelo Novo CPC, é preciso existir divergência
interpretativa de normas em casos concretos para que o TST possa, se
provocado, uniformizar a jurisprudência.
(...)
Não defendemos a aplicação desmedida e automática das normas
(princípios e regras) do Novo CPC nos sítios do Processo do Trabalho,
especialmente nas ações oriundas da relação de emprego, e sim a
promoção de um diálogo franco e virtuoso entre estes dois importantes
setores do edifício jurídico. Diálogo que passe, necessariamente, pela
função precípua de ambos (Processo Civil e Processo Trabalhista):
realizar os direitos fundamentais e a justiça social em nosso País, de
forma adequada, tempestiva e efetiva”.
Sobre a temática, insta consignar os ensinamentos do jurista Mauro
Schiavi26:
“Trata-se de inovação do novo Código, pois o atual não disciplina tal
hipótese. Doravante, o CPC será aplicado ao processo do trabalho, nas
lacunas deste, nas seguintes modalidades:
a) supletivamente: significa aplicar o CPC quando, apesar da lei
processual trabalhista disciplinar o instituto processual, não for completa.
Nesta situação, o Código de Processo Civil será aplicado de forma
complementar, aperfeiçoando e propiciando maior efetividade e justiça
ao processo do trabalho. Como exemplos: hipóteses de impedimento e
suspeição do Juiz que são mais completas no CPC, mesmo estando
disciplinadas na CLT (art. 802 da CLT); ônus da prova previsto no CPC,
pois o art. 818 da CLT é muito enxuto e não resolve questões cruciais
como as hipóteses de ausência de prova e prova dividida; o depoimento
pessoal previsto no CPC, pois a CLT disciplina apenas o interrogatório
(art. 848 da CLT), sendo os institutos afins e propiciam implementação
do contraditório substancial no processo trabalhista etc.;
b) subsidiariamente: significa aplicar o CPC quando a CLT e as leis
processuais trabalhistas extravagantes não disciplinarem determinado
instituto processual. Exemplos: tutelas de urgência, ação rescisória,
ordem preferencial de penhora, hipóteses legais de impenhorabilidade
etc.
Pode-se se argumentar que houve revogação dos arts. 769 e 889 da
CLT, uma vez que o Código de Processo Civil, cronologicamente, é mais
recente que a CLT. Também pode-se argumentar que, diante do referido
dispositivo legal, o processo do trabalho perdeu sua autonomia científica,
ficando, doravante, mais dependente do processo civil. (...)
Embora o art. 15 e as disposições do novo CPC exerçam influência no
processo do trabalho e, certamente, impulsionarão uma nova doutrina e
jurisprudência processual trabalhista, não revogou a CLT, uma vez que
os arts. 769 e 889 da CLT são normas específicas do Processo do
Trabalho, e o CPC apenas uma norma geral. Pelo princípio da
especialidade, as normas gerais não derrogam as especiais.
De outro lado, o art. 769 da CLT, que é o vetor principal do princípio da
subsidiariedade do processo do trabalho, fala em processo comum, não,
necessariamente, em processo civil para preencher as lacunas da
legislação processual civil.
Além disso, pela sistemática da legislação processual trabalhista, as
regras do Código de Processo Civil somente podem ser aplicadas ao
processo do trabalho, se fossem compatíveis com a principiologia e
singularidades do processo trabalhista. Assim, mesmo havendo lacuna
da legislação processual trabalhista, se a regra do CPC for incompatível
com a principiologia e singularidades do processo do trabalho, ela não
será aplicada.
O art. 15 do novel CPC não contraria os arts. 769 e 889 da CLT. Ao
contrário, com eles se harmoniza.
Desse modo, conjugando-se o art. 15 do CPC com os arts. 769 e 889 da
CLT, temos que o Código de Processo Civil se aplica ao processo do
trabalho da seguinte forma: supletiva e subsidiariamente, nas
omissões da legislação processual trabalhista, desde que
compatível com os princípios e singularidades do processo do
trabalho”.
Com o devido respeito aos entendimentos em sentido contrário, a
aplicação supletiva aduzida no art. 15 do Código de Processo Civil de 2015
deverá ser compatibilizada com os arts. 769 e 889 da Consolidação das Leis
do Trabalho.
Por consectário, a aplicação supletiva não pode prejudicar a consagrada
aplicação subsidiária, que parte da existência de dois requisitos
cumulativos: lacuna e compatibilidade de princípios e regras.
Concluindo, a aplicação supletiva do Código de Processo Civil de 2015 não
poderá desrespeitar a própria existência da Consolidação das Leis do
Trabalho.
Assim, o aplicador da ciência processual laboral deverá empregar o
máximo esforço na utilização dos benefícios do Código de Processo Civil de
2015, sem olvidar os tradicionais institutos da Consolidação das Leis do
Trabalho.
Dessa forma, a autonomia do Direito Processual do Trabalho será
indubitavelmente prestigiada. A compatibilização dos diplomas normativos
poderá contribuir veementemente na própria evolução da ciência processual
laboral.
No mesmo sentido, é o que vaticina o art. 1º, caput, da Instrução
Normativa n. 39 do Tribunal Superior do Trabalho, de 15 de março de 2016:
“Aplica-se o Código de Processo Civil, subsidiária e supletivamente, ao
Processo do Trabalho, em caso de omissão e desde que haja
compatibilidade com as normas e princípios do Direito Processual do
Trabalho, na forma dos arts. 769 e 889 da CLT e do art. 15 da Lei n. 13.105,
de 17.03.2015”.

2.6 Princípio da celeridade

Este princípio está na pauta do dia, tendo em vista o novo inciso LVIII do
art. 5º da CF, pautado no Pacto de São José da Costa Rica (Convenção
Americana sobre Direitos Humanos). Trata-se do princípio da
celeridade processual ou da razoável duração do processo.
Corrobora a efetividade processual e o acesso à ordem jurídica justa.
A busca da celeridade processual, de modo que o processo apresente
uma razoável duração, é escopo de todos os ramos do Direito. A demora na
entrega da prestação jurisdicional é um vício extremamente grave para a
sociedade, e deve ser combatida com veemência.
O jurisdicionado deve ter a sensação de que o Poder Judiciário é uma
instituição preocupada com a solução dos conflitos de interesses e a
entrega do bem da vida, de forma célere, rápida e efetiva.
No Processo do Trabalho, o princípio da celeridade deve ser observado
com primazia, tendo em vista o trabalhador ser a parte mais fraca na
relação jurídica (hipossuficiente), e a natureza alimentar dos créditos
trabalhistas.

2.7 Princípio da conciliação

Existem três formas de solução de conflitos de interesses:


1ª) Autotutela (autodefesa): significa fazer justiça com as próprias
mãos, prevalecendo a lei do mais forte e subjugo do mais fraco (força
física, econômica, social, política etc.). É a forma mais rudimentar de
solução de conflitos, devendo ser apenas excepcionalmente admitida.
Exemplo: legítima defesa.
2ª) Autocomposição: inegavelmente, é a melhor forma de solução
dos conflitos e mundialmente privilegiada. Traduz a solução dos conflitos de
forma amigável entre as partes envolvidas, sem o emprego da força.
Exemplos: Comissão de Conciliação Prévia e mediação.
3ª) Heterocomposição: é a forma tradicional e mais comum de
solução dos conflitos, apresentando duas características básicas:
• a presença de um terceiro;
• esse terceiro tem poder de decisão sobre as partes.
São exemplos a jurisdição e a arbitragem.
Com efeito, deve-se priorizar a autocomposição, representada com
primazia pela conciliação.
Conforme brilhantes ensinamentos de Francesco Carnelutti, a
conciliação é uma sentença dada pelas partes e a sentença, uma
conciliação imposta pelo juiz.
Nessa linha de raciocínio, aduz o art. 764 da CLT:
“Art. 764. Os dissídios individuais ou coletivos submetidos à apreciação
da Justiça do Trabalho serão sempre sujeitos à conciliação.
§ 1º Para os efeitos deste artigo, os juízes e Tribunais do Trabalho
empregarão sempre os seus bons ofícios e persuasão no sentido de uma
solução conciliatória dos conflitos.
§ 2º Não havendo acordo, o juízo conciliatório converter-se-á
obrigatoriamente em arbitral, proferindo decisão na forma prescrita
neste Título.
§ 3º É lícito às partes celebrar acordo que ponha termo ao processo,
ainda mesmo depois de encerrado o juízo conciliatório”.
No mesmo sentido, preconiza o art. 3º, caput, do CPC/2015: “O Estado
promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos”.
A Justiça do Trabalho sempre preconizou a conciliação dos conflitos de
interesses, desde as suas origens históricas.
Assim, todos os dissídios individuais e coletivos submetidos à apreciação
da Justiça do Trabalho serão sujeitos a conciliação, visto que os juízes do
trabalho empregarão os seus bons ofícios e persuasão nesse sentido.
Ademais, é lícita a celebração de acordo pelas partes que ponha fim ao
processo, mesmo depois de encerrado o juízo conciliatório.
Vale ressaltar que a EC n. 45/2004 (Reforma do Judiciário) ampliou
significativamente a competência material da Justiça do Trabalho ao
substituir, no caput do art. 114 da CF, o termo conciliar por processar. A
reforma em nada alterou a grande função da Justiça do Trabalho, que é a
conciliação das lides trabalhistas. Justifica-se a modificação pelas novas
ações de competência material da Justiça do Trabalho, que naturalmente
não são suscetíveis de conciliação, como o mandado de segurança e as
ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores
pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho.
Bons exemplos que ressaltam a importância da conciliação no Processo
do Trabalho são as duas tentativas obrigatórias de conciliação no
procedimento comum (ordinário):
1ª) após a abertura da audiência / antes da apresentação da defesa –
art. 846 da CLT;
2ª) após as razões finais / antes da sentença – art. 850 da CLT.

2.7.1 Majoração dos poderes do juiz do trabalho na direção do processo

O juiz do trabalho tem amplos poderes na condução do processo, sendo


considerado seu diretor.
Assim, os Juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na direção
do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo
determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas (art. 765
da CLT).
De acordo com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), a execução será
promovida pelas partes, permitida a execução de ofício pelo juiz ou pelo
Presidente do Tribunal apenas nos casos em que as partes não estiverem
representadas por advogado (jus postulandi – arts. 791 e 839, a, da CLT e
Súmula 425 do TST). Portanto, houve mitigação do princípio do impulso
oficial na execução trabalhista.
A doutrina moderna estabelece que o magistrado não pode se contentar
com a verdade formal, que é a aquela que está nos autos, mas deve buscar
a verdade real, ou seja, procurar verificar o que realmente ocorreu no
mundo dos fatos para a prolação de uma sentença mais justa e equânime.
Assim, exige-se postura mais ativa do juiz (princípio inquisitivo ou
inquisitório), uma vez que detém ampla liberdade na condução do
processo para a determinação de qualquer diligência que seja necessária
para o esclarecimento do conflito de interesses.
O sistema processual vigente adota o princípio do convencimento
motivado ou da persuasão racional do juiz, na medida em que o
magistrado apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e
circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes;
mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o
convencimento (art. 371 do CPC/2015).

2.7.2 Protecionismo temperado (mitigado ou relativizado) ao


trabalhador/princípio do protecionismo processual

O Princípio da Proteção (tutelar, tuitivo ou protetivo) é o Princípio-


Mãe do Direito do Trabalho. Como dizem, é o princípio dos princípios. Aliás,
todos os demais princípios que fundamentam o Direito do Trabalho partem
dos ideários do Princípio da Proteção.
Objetivamente, nele se encontra a premissa de uma clara desigualdade
econômica entre o empregado e o empregador no plano dos fatos. O
trabalhador é considerado hipossuficiente, representando a parte mais fraca
na relação jurídica. Assim, o escopo do Direito do Trabalho é assegurar uma
superioridade jurídica ao empregado, traduzindo aplicação do princípio da
igualdade (isonomia ou paridade de armas).
A igualdade é traduzida pelo tratamento desigual conferido aos desiguais,
na medida de suas desigualdades. Uma desigualdade somente é
solucionada criando-se outra desigualdade.
Nas palavras do saudoso jurista uruguaio Américo Plá Rodriguez27, temos
o seguinte:
“O princípio da proteção se refere ao critério fundamental que orienta o
Direito do Trabalho, pois este, ao invés de inspirar-se num propósito de
igualdade, responde ao objetivo de estabelecer um amparo preferencial
a uma das partes: o trabalhador.
Enquanto no direito comum uma constante preocupação parece
assegurar a igualdade jurídica entre os contratantes, no Direito do
Trabalho a preocupação central parece ser a de proteger uma das partes
com o objetivo de, mediante essa proteção, alcançar-se uma igualdade
substancial e verdadeira entre as partes”.
O eminente jurista e Ministro do TST Mauricio Godinho Delgado28 assim
preleciona:
“Informa este princípio que o Direito do Trabalho estrutura em seu
interior, com suas regras, institutos, princípios e presunções próprias,
uma teia de proteção à parte hipossuficiente na relação empregatícia – o
obreiro –, visando retificar (ou atenuar), no plano jurídico, o desequilíbrio
inerente ao plano fático do contrato de trabalho.
(...)
Parte importante da doutrina aponta este princípio como o cardeal do
Direito do Trabalho, por influir em toda a estrutura e características
próprias desse ramo jurídico especializado. Esta, a propósito, a
compreensão do grande jurista uruguaio Américo Plá Rodriguez, que
considera manifestar-se o princípio protetivo em três dimensões
distintas: o princípio in dubio pro operario, o princípio da norma mais
favorável e o princípio da condição mais benéfica.
(...) Como excluir essa noção do princípio da imperatividade das
normas trabalhistas? Ou do princípio da indisponibilidade dos direitos
trabalhistas? Ou do princípio da inalterabilidade contratual lesiva? Ou da
proposição relativa à continuidade da relação de emprego? Ou da noção
genérica de despersonalização da figura do empregador (e suas
inúmeras consequências protetivas ao obreiro)? Ou do princípio da
irretroação das nulidades? E assim sucessivamente. Todos esses outros
princípios especiais também criam, no âmbito de sua abrangência, uma
proteção especial aos interesses contratuais obreiros, buscando retificar,
juridicamente, uma diferença prática de poder e de influência econômica
e social apreendida entre os sujeitos da relação empregatícia.
Desse modo, o princípio tutelar não se desdobraria em apenas três
outros, mas seria inspirador amplo de todo o complexo de regras,
princípios e institutos que compõem esse ramo jurídico especializado”.
Diante da grande importância do princípio da proteção para o Direito do
Trabalho, surge a seguinte indagação: o princípio tuitivo é aplicável ao
Processo do Trabalho?
A doutrina justrabalhista moderna vem sustentando a aplicação do
protecionismo temperado, mitigado ou relativizado ao trabalhador
(princípio da proteção temperada, mitigada ou relativizada – princípio do
protecionismo processual).
Assim, no âmbito processual o princípio em análise não é visto com a
mesma intensidade no Direito do Trabalho, mas deve ser respeitado de
forma temperada para facilitar o acesso do trabalhador à Justiça do
Trabalho. Isso significa que o obreiro contará com algumas prerrogativas
processuais que objetivam compensar eventuais dificuldades ao procurar a
Justiça do Trabalho. Além de, sob o ponto de vista econômico, ser
hipossuficiente, o trabalhador possui grandes dificuldades de provar suas
alegações, pois os documentos que comprovam a relação de emprego, em
sua maioria, ficam na posse do empregador.
Nesse diapasão, ensina Emília Simeão Albino Sako29 sobre a inversão
do ônus da prova e o princípio da aptidão da prova:
“O estado de miserabilidade, de fraqueza e de vulnerabilidade, em
sentido econômico, seja do trabalhador ou do consumidor, dificulta a
produção da prova e, consequentemente, pode obstar ou dificultar as
vias de acesso à justiça. A desigualdade na produção da prova no
processo do trabalho é imensa, pois os empregadores geralmente
contam com departamentos jurídicos organizados e de bom nível
técnico, o que facilita a produção de qualquer tipo de prova. Além disso,
podem pagar a emissão de pareceres e certidões, honorários para que
profissionais acompanhem as perícias de insalubridade, periculosidade,
médicas, com emissão de laudos etc., facilidades que, em regra, não
tem o trabalhador quando em litígio com seu empregador.
A distribuição do ônus da prova leva em conta as possibilidades de
cada litigante em demonstrar os fatos alegados, conjugados com o que
se extrai da experiência e a observação do que ordinariamente acontece.
A inversão do ônus da prova é cabível quando a posição processual de
uma das partes for apenas defensiva em relação à outra, porque
encontra dificuldades de agir em razão de alguma carência. Alegando o
réu que a afirmação do autor não é verdadeira ou que carece de
correção, atrairá para si o ônus de provar tais alegações. O juiz
verificará, em cada caso, a qual das partes incumbia o ônus da prova,
decidindo contra aquela sobre a qual recaía esse ônus (ônus objetivo) e
dele não se desvencilhou. Pelo princípio da aptidão da prova, a parte
dotada de maiores condições de produzir em juízo a prova exigida deve
fazê-lo.
No processo vigora o princípio segundo o qual aquele que tiver
melhores condições e/ou facilidades de produzir a prova deverá fazê-lo
(princípio da aptidão da prova). (...)
A parte dotada de melhores condições de produzir a prova deverá fazê-
lo, independente de ser o autor ou o réu. Em se tratando de documentos
relativos ao contrato de trabalho ou da relação de trabalho, o
empregador ou tomador tem o dever legal de mantê-los em seus
arquivos pelo prazo que a lei determina; o empregado e o prestador de
serviços, não. Assim, quando demandado, é o empregador ou tomador
quem deve trazê-los ao processo sempre que forem exigidos, pois tem
melhores condições e facilidades para assim agir. Sonegando a prova
com o intuito de prejudicar a parte adversa, ou não a produzindo a
contento, o juiz poderá declarar provados os fatos cuja prova foi obstada
ou dificultada pelo réu (CPC [/73], arts. 355 e seguintes [art. 396,
CPC/2015]; Súmula n. 338 do TST). Esse princípio funda-se no estado de
hipossuficiência do trabalhador e do consumidor, e orienta o juiz a
direcionar o ônus da prova a quem tem melhor condição de produzi-la
(CDC, art. 6º), que, em regra, é o empregador ou o tomador”.
São manifestações do protecionismo temperado ao trabalhador no
Processo do Trabalho:
• possibilidade de inversão do ônus da prova, a fim de facilitar o acesso
real e efetivo à Justiça da parte vulnerável da relação jurídica (art. 6º,
VIII, da Lei n. 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor);
• ausência do reclamante na audiência trabalhista gera o arquivamento
da reclamação trabalhista, possibilitando a repropositura da ação; de
outra sorte, a ausência do reclamado em audiência gera revelia, além
da confissão quanto à matéria de fato (art. 844 da CLT). As
consequências processuais são mais graves no caso de ausência do
reclamado;
• jus postulandi, que é a possibilidade do trabalhador de postular
pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas
reclamações até o final, sem a necessidade de advogado (art. 791 da
CLT);
• possibilidade de reclamação trabalhista verbal (art. 840 da CLT);
• possibilidade de a execução trabalhista ser promovida ex officio pelo
juiz do trabalho, apenas nos casos em que as partes não estiverem
representadas por advogado (art. 878 da CLT);
• exigência de depósito recursal somente ao empregador no caso de
interposição de recurso (art. 899 da CLT). O depósito recursal tem
natureza jurídica híbrida ou mista, pois, além de ser um pressuposto
recursal objetivo ou extrínseco, serve para a garantia do juízo em
relação à futura execução trabalhista a ser promovida pelo empregado-
reclamante, bloqueando recursos meramente protelatórios, que
dificultam o célere recebimento dos créditos trabalhistas de natureza
alimentar pelo trabalhador.
Vale ressaltar que a observância do princípio da proteção temperada no
Processo do Trabalho, como o próprio nome sugere, não afasta o respeito
a o princípio da paridade de armas do Processo do Trabalho,
assegurando-se a ambas as partes as mesmas oportunidades processuais.

2.7.3 Função social do processo do trabalho

De acordo com a doutrina de vanguarda, todos os institutos de Direito


Material ou Processual devem ser estudados à luz de sua função social, ou
seja, com a preocupação da supremacia do interesse público em detrimento
do interesse de classe ou particular, bem como os adequando à sociedade
atual, ao contexto social vigente e adotando-se a primazia da dignidade da
pessoa humana.
Sobre a função social dos contratos comenta o Professor Flávio
Tartuce:
“(...) a função social dos contratos é princípio que interessa a toda a
coletividade, constituindo tanto o art. 421 quanto o art. 2.035, parágrafo
único, do Código Civil normas de ordem pública, inafastáveis por
convenções ou disposição contratual.
Conceituamos o princípio da função social dos contratos como um
regramento contratual, de ordem pública (art. 2.035, parágrafo único, do
CC), pelo qual o contrato deve ser, necessariamente, analisado e
interpretado de acordo com o contexto da sociedade.
Assim, para este autor, a ideia de função está relacionada com o
conceito de finalidade ou utilidade. No caso, deve-se imaginar que o
contrato tem uma finalidade em relação ao meio que o cerca e,
portanto, com ele deve ser analisado. Se um contrato for ruim para as
partes, também o será, de forma indireta, ruim para a sociedade, pois
não atende à sua finalidade social. De forma inversa, um contrato que é
ruim para a sociedade também o é para as partes contratantes, em
regra. Isso porque os elementos parte-sociedade não podem ser
concebidos isoladamente, mas analisados como um todo. Por isso é que
este autor enxerga na função social dos contratos a sua dupla eficácia.
Não se pode afastar o fundamento constitucional desse princípio, como
vem reconhecendo a doutrina, quase que com unanimidade.
Inicialmente, a função social dos contratos está ligada à proteção dos
direitos inerentes à dignidade da pessoa humana, amparada no art. 1º,
III, da CF/1988. Ademais, tendo em vista ser um dos objetivos da
República a justiça social (art. 170, caput, do Texto Maior), bem como a
solidariedade social (art. 3º, III), nesses dispositivos também residiria a
função social dos pactos.
Por outro lado, para a valorização da liberdade, tão em crise na esfera
dos negócios jurídicos, procura-se encampar a igualdade ou isonomia
muitas vezes não percebida no momento de execução do contrato,
buscando-se tratar de maneira igual os iguais e de maneira desigual os
desiguais, nos termos do art. 5º, caput, da CF/1988.
Na busca da função social dos contratos, é crescente a valorização da
pessoa humana, seguindo a tendência de personalização do Direito Civil,
apresentada por vários autores do Direito Privado. Na conceituação do
princípio, há uma fusão de preceitos patrimoniais e existenciais,
assegurando-se ao sujeito de direito o mínimo para que viva com
dignidade”30.
A moderna doutrina processual justrabalhista vem sustentando a
existência do princípio da função social do processo do trabalho.
Fundamentos doutrinários:
• relevante interesse social presente na entrega do crédito trabalhista ao
empregado;
• caráter publicista do Direito Processual do Trabalho.
São características da função social do Processo do Trabalho:
• supremacia do interesse público sobre o interesse de classe ou
particular;
• dignidade da pessoa do reclamante e do reclamado;
• eficácia vertical e horizontal dos direitos humanos fundamentais
(dimensões objetiva e subjetiva), ou seja, o respeito aos direitos
fundamentais nas relações Estado/particular e entre particulares;
• princípio da vedação ao retrocesso social, isto é, o Processo do
Trabalho deve estar em constante atualização à realidade social, às
transformações da sociedade, tendo por base a evolução dos direitos
fundamentais;
• princípio da igualdade processual (isonomia ou paridade de armas),
garantindo-se igualdade de oportunidades às partes litigantes;
• princípio da igualdade real ou substancial, dando a cada um o que é
seu por direito;
• efetividade processual;
• celeridade processual (razoável duração do processo);
• acesso à ordem jurídica justa;
• prestação jurisdicional confiável;
• decisões judiciais pautadas na realidade;
• facilitação do acesso do trabalhador à Justiça do Trabalho;
• princípio da melhoria da condição social do trabalhador;
• princípios do devido processo legal e da segurança jurídica, de modo
que os atos processuais sejam praticados de forma razoável e previsível,
sem surpresas ao jurisdicionado.
Assim, a legislação, a doutrina e a jurisprudência processual trabalhista
devem ter a preocupação constante com a modernização do Direito
Processual do Trabalho, adaptando-o às transformações da sociedade,
antenados na evolução dos direitos fundamentais, tendo como focos a
dignidade das partes, a melhoria da condição social do trabalhador e a
efetividade do processo.
São fundamentos legais do princípio em comento:
CF
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se
em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(...)
III – a dignidade da pessoa humana;
(...).
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do
Brasil:
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;
(...).
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos
desta Constituição;
(...)
XXIII – a propriedade atenderá a sua função social;
(...).
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros
que visem à melhoria de sua condição social:
(...).
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho
humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios:
(...)
III – função social da propriedade;
(...)”.
CLT
“Art. 8º As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta
de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela
jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas
gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de
acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de
maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o
interesse público”.
LINDB
“Art. 5º Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se
dirige e às exigências do bem comum”.
CC
“Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites
da função social do contrato”.
O Professor Carlos Henrique Bezerra Leite31 comenta o princípio da
seguinte forma:
“A diferença básica entre o princípio da proteção, acima referido, e o
princípio da finalidade social é que, no primeiro, a própria lei confere a
desigualdade no plano processual; no segundo, permite-se que o juiz
tenha uma atuação mais ativa, na medida em que auxilia o trabalhador,
em busca de uma solução justa, até chegar o momento de proferir a
sentença.
Parece-nos, contudo, que os dois princípios – proteção e finalidade
social – se harmonizam e, pelo menos em nosso ordenamento jurídico,
permitem que o juiz, na aplicação da lei, possa corrigir uma injustiça da
própria lei”.

2.8 Princípio da busca da verdade real

O princípio da busca da verdade real encontra fundamento no


princípio da primazia da realidade, que rege o Direito Material do
Trabalho.
O princípio da primazia da realidade sobre a forma estabelece que
no confronto entre a verdade real e a verdade formal deve prevalecer a
verdade real. Assim, a realidade dos fatos deverá prevalecer em relação a
algum documento não correspondente a essa realidade.
Com base nesse princípio, o contrato de trabalho é conhecido como
contrato-realidade.
A doutrina e a jurisprudência moderna exigem uma postura mais ativa do
magistrado (princípio inquisitivo ou inquisitório), isto é, que ele não se
contente apenas com a verdade formal, aquela contida nos autos. Dessa
forma, o juiz da atualidade deve pautar a sua decisão nos valores da justiça
e equidade, necessitando investigar mais profundamente os limites
objetivos e subjetivos da lide por meio da análise mais apurada da
realidade dos fatos (busca da verdade real).
É inegável que a verdade real, na essência, é muito difícil de ser apurada;
no entanto, o magistrado, na formação do seu livre convencimento
motivado, deve buscar a verificação do que realmente aconteceu no conflito
de interesses, até porque “o papel aceita tudo”, evitando, assim, a distorção
da realidade.
Corroborando o que foi dito acima, os Juízos e Tribunais do Trabalho
terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento
rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência necessária ao
seu esclarecimento (art. 765 da CLT).
Ademais, caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar
as provas necessárias à instrução do processo, bem como indeferir as
diligências inúteis ou meramente protelatórias (art. 370 do CPC/2015). O
juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias
constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes, mas deverá
indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento (art.
371 do CPC/2015).
Por fim, cumpre frisar entendimento consolidado do TST sobre o tema:
“Súmula 338. (...).
III. Os cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída
uniformes são inválidos como meio de prova, invertendo-se o ônus da
prova, relativo às horas extras, que passa a ser do empregador,
prevalecendo a jornada da inicial se dele não se desincumbir”.

2.9 Princípio da indisponibilidade

Este encontra fundamento no princípio da indisponibilidade,


irrenunciabilidade ou inderrogabilidade dos direitos trabalhistas,
estabelecendo que os direitos trabalhistas sejam indisponíveis, em regra,
não podendo ser objeto de renúncia ou de transação.
O Estado, para assegurar uma superioridade jurídica ao empregado
hipossuficiente, atua na relação jurídica empregatícia assegurando direitos
trabalhistas mínimos (patamar civilizatório mínimo), sendo conhecida
essa intervenção como intervencionismo básico do Estado ou
dirigismo estatal básico.
Logo, os direitos trabalhistas estão assegurados ao trabalhador mediante
normas estatais imperativas, cogentes ou de ordem pública, que são de
observância obrigatória pelas partes. Esse respeito obrigatório às normas
trabalhistas acaba produzindo reflexos no Direito Processual do Trabalho.
Em especial, na entrega da prestação jurisdicional.
Enfim, o Processo do Trabalho tem uma função finalística, qual seja, a
prestação jurisdicional pautada no efetivo cumprimento dos direitos
indisponíveis dos trabalhadores.

2.10 Princípio da normatização coletiva

O princípio da normatização coletiva encontra fundamento


constitucional no art. 114, § 2º, da CF:
“Art. 114. (...).
§ 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à
arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio
coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o
conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao
trabalho, bem como as convencionadas anteriormente”.
O comentado princípio é relacionado com o Poder Normativo da
Justiça do Trabalho, que é a competência constitucionalmente
assegurada aos tribunais trabalhistas de criar normas e condições gerais e
abstratas, sendo uma atividade atípica do Poder Judiciário e típica do Poder
Legislativo, conhecida como Poder Legiferante da Justiça do Trabalho.
Com efeito, os dissídios coletivos (de natureza econômica ou jurídica) são
de competência originária dos tribunais trabalhistas, cujos julgamentos são
consubstanciados pelas sentenças normativas, com eficácia ultra partes,
produzindo efeitos jurídicos nos contratos individuais de trabalho dos
trabalhadores da categoria profissional envolvida.
O eminente Professor Amauri Mascaro Nascimento32 comenta o Poder
Normativo da Justiça do Trabalho:
“Dá-se o nome de poder normativo à competência constitucional dos tribunais do trabalho para
proferir decisões nos processos de dissídios coletivos econômicos, criando condições e normas de
trabalho com força obrigatória. Desenvolveu-se uma doutrina de suporte ao sistema instituído a
partir de 1939, por meio de conceituadas opiniões, como as de Geraldo Bezerra de Menezes, para
quem não se justificaria uma jurisdição especial sem o poder de criar normas nos conflitos coletivos;
Rezende Puech, que recomendava o poder normativo, tendo em vista a fragilidade do sindicalismo;
Cotrim Neto, defensor da necessidade de contratos coletivos impostos; Cesarino Júnior, que viu no
poder normativo a preservação da igualdade e da justiça social”.

Para finalizar, destacamos que o mencionado princípio da normatização


coletiva não é absoluto, e sim relativo. O Poder Normativo da Justiça do
Trabalho atua no vazio da lei, no vácuo da lei, encontrando limites na
própria Constituição Federal, na legislação trabalhista cogente de proteção
ao trabalhador e nas condições mínimas de trabalho definidas nos
instrumentos de negociação coletiva (convenções coletivas de trabalho e
acordos coletivos de trabalho).

2.11 Princípios do Código de Processo Civil de 2015

Os arts. 1º a 15 do novel estuário processual civil trazem à baila


princípios que consubstanciam verdadeiros mandamentos de otimização que
orientam o operador do Direito Processual na visão pós-positivista, a saber:
1º) Princípio da interpretação do Processo Civil em conformidade
com os valores e as normas fundamentais constitucionais (art. 1º):
o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os
valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da
República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.
2º) Princípio da iniciativa da parte/princípio do impulso oficial
(art. 2º): o processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por
impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei.
3º) Princípio da inafastabilidade da jurisdição ou do amplo
acesso ao Poder Judiciário/princípio da conciliação/princípio da
estimulação das formas alternativas de solução dos conflitos (art.
3º): não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. É
permitida a arbitragem, na forma da lei. O Estado promoverá, sempre que
possível, a solução consensual dos conflitos. A conciliação, a mediação e
outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados
por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público,
inclusive no curso do processo judicial.
4º) Princípio da celeridade processual e da razoável duração do
processo/princípio da primazia do julgamento do mérito/princípio
do máximo aproveitamento processual (art. 4º): as partes têm o
direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a
atividade satisfativa.
5º) Princípio da lealdade e da boa-fé processual (art. 5º): aquele
que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo
com a boa-fé.
6º) Princípio da cooperação ou da colaboração (art. 6º): todos os
sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em
tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.
7º) Princípio da paridade de tratamento processual (art. 7º): é
assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de
direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos
deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo
efetivo contraditório.
8º) Princípio da dignidade processual da pessoa humana (art.
8º): ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às
exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da
pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a
legalidade, a publicidade e a eficiência.
9º) Princípio do contraditório e da ampla defesa (arts. 9º e 10):
não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja
previamente ouvida. A aludida regra comporta exceções:
I – à tutela provisória de urgência;
II – às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, II e III;
III – à decisão prevista no art. 701.
Vale ressaltar que o princípio em estudo também deverá ser observado
na seara das matérias de ordem pública (objeções processuais). Com efeito,
o juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em
fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade
de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir
de ofício. Trata-se do princípio da primazia do contraditório e
mitigação da matéria de ordem pública.
10º) Princípio da necessidade de fundamentação das decisões
judiciais (art. 11): todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário
serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade.
Nos casos de segredo de justiça, pode ser autorizada a presença somente
das partes, de seus advogados, de defensores públicos ou do Ministério
Público.
11º) Princípio da observância da ordem cronológica de conclusão
na prolação da sentença ou acórdão (art. 12): os juízes e os tribunais
atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para
proferir sentença ou acórdão (redação determinada pela Lei n. 13.256, de
4-2-2016). A lista de processos aptos a julgamento deverá estar
permanentemente à disposição para consulta pública em cartório e na rede
mundial de computadores.
Estão excluídos da regra:
I – as sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou
de improcedência liminar do pedido;
II – o julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica
firmada em julgamento de casos repetitivos;
III – o julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de
demandas repetitivas;
IV – as decisões proferidas com base nos arts. 485 e 932;
V – o julgamento de embargos de declaração;
VI – o julgamento de agravo interno;
VII – as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho
Nacional de Justiça;
VIII – os processos criminais, nos órgãos jurisdicionais que tenham
competência penal;
IX – a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por
decisão fundamentada.
Ademais, após elaboração de lista própria, respeitar-se-á a ordem
cronológica das conclusões entre as preferências legais.
Incluído o processo na referida lista, o requerimento formulado pela parte
não altera a ordem cronológica para a decisão, exceto quando implicar a
reabertura da instrução ou a conversão do julgamento em diligência.
Decidido o aludido requerimento, o processo retornará à mesma posição
em que anteriormente se encontrava na lista.
Por derradeiro, ocupará o primeiro lugar na ventilada lista o processo
que:
I – tiver sua sentença ou acórdão anulado, salvo quando houver
necessidade de realização de diligência ou de complementação da
instrução;
II – se enquadrar na hipótese do art. 1.040, II.
12º) Princípio da territorialidade (art. 13): a jurisdição civil será
regida pelas normas processuais brasileiras, ressalvadas as disposições
específicas previstas em tratados, convenções ou acordos internacionais de
que o Brasil seja parte.
13º) Princípio da irretroatividade da lei processual/princípio da
imediatidade ou da imediaticidade/princípio do isolamento dos
atos processuais (art. 14): a norma processual não retroagirá e será
aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos
processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência
da norma revogada.
14º) Princípio da aplicação supletiva e subsidiária do Código de
Processo Civil aos processos trabalhistas, administrativos ou
eleitorais (art. 15): na ausência de normas que regulem processos
eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes
serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.
Com efeito, sobre a Unidade do Novo Código de Processo Civil, insta
consignar os ensinamentos dos juristas de nomeada:
“Daí se enxergar em boa perspectiva as premissas interpretativas da
primazia do julgamento do mérito e do máximo aproveitamento
processual, encampada desde o art. 4º do Novo CPC que perpassam
toda a redação da nova legislação no sentido de se fundar o aludido
novo formalismo (democrático) que abandone a antiquíssima premissa
ritual.
Os exemplos no Novo CPC da aplicação deste formalismo constitucional
democrático são incontáveis, mas, desde já, podemos apontar:
a) Sanabilidade dos atos processuais defeituosos em conformidade com
a instrumentalidade técnica.
b) Superação do enunciado da Súmula 418 do STJ após sua entrada em
vigor.
c) Nos moldes do art. 930, impossibilidade de o relator dos recursos
inadmitir um recurso antes de viabilizar a correção dos vícios, como, por
exemplo, de ausência de documentação ou de representação.
d) Ampla aplicação do princípio da fungibilidade recursal.
e) Dispensabilidade de preliminar ou tópico específico para
demonstração de repercussão geral no Recurso Extraordinário.
f) Aproveitamento dos efeitos da decisão proferida por juízo
incompetente, absoluta ou relativamente.
g) Necessidade de fundamentação específica à luz de circunstâncias
concretas (art. 486) para fins de invalidação de ato subsequente ao
defeituoso.
h) Desnecessidade de ratificação, complementação ou alteração do
recurso interposto ainda que o julgamento dos embargos de declaração
opostos pela parte contrária modifique ou complemente decisão
recorrida (art. 1.037, §§ 3º e 4º).
i) Imposição ao Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de
Justiça desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar
sua correção, desde que não o repute grave (art. 1.026, § 3º).
j) Insubsistência de entendimentos jurisprudenciais que inviabilizam o
conhecimento do mérito recursal”33.
Por derradeiro, apresentamos a Estrutura do Código de Processo Civil de
2015, consubstanciando um rompimento do Código de Processo Civil de
1973 (Alfredo Buzaid) e semelhante ao Código de Processo Civil de 1939 –
Parte Geral (composta de 6 Livros) e uma Parte Especial (com 3 Livros),
encerrando com um Livro Complementar:

PARTE GERAL
LIVRO I – DAS NORMAS PROCESSUAIS CIVIS
LIVRO II – DA FUNÇÃO JURISDICIONAL
LIVRO III – DOS SUJEITOS DO PROCESSO
LIVRO IV – DOS ATOS PROCESSUAIS
LIVRO V – DA TUTELA PROVISÓRIA
LIVRO VI – DA FORMAÇÃO, DA SUSPENSÃO E DA EXTINÇÃO DO
PROCESSO

PARTE ESPECIAL
LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE
SENTENÇA
LIVRO II – DO PROCESSO DE EXECUÇÃO
LIVRO III – DOS PROCESSOS NOS TRIBUNAIS E DOS MEIOS DE
IMPUGNAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS

LIVRO COMPLEMENTAR – DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS

2.12 Reflexos da Reforma Trabalhista

Com o advento da Lei n. 13.467/2017, parcela da doutrina advoga a tese


de que o Processo do Trabalho ganhou maior formalismo, exigindo mais
conhecimento técnico e responsabilidade dos operadores do direito na seara
justrabalhista.
Em outras palavras, o Direito Processual do Trabalho ficou mais técnico,
exigindo habilidade técnica mais apurada daqueles que militam na Justiça
do Trabalho.

QUESTÕES DE CONCURSOS PÚBLICOS

1. (CFR-CE – Advogado – INAZ do Pará – 2018) Situação


Hipotética: Maurício ajuizou reclamação trabalhista contra a
empresa Panos e Pratos Ltda, pleiteando o pagamento de horas
extras e dano moral. Foi expedida citação para a empresa
reclamada, pelo correio, porém a entrega foi em endereço errado
e distinto da sede da Panos e Pratos Ltda. Contudo, a reclamada,
em audiência, apresentou defesa e juntou documentos. Após
regular instrução do processo, o magistrado condenou a empresa
a pagar todos os pedidos contidos na Petição Inicial.
Acerca do caso, pode-se considerar:
a) Pelo princípio da instrumentalidade das formas, a citação no processo
acima é nula e, portanto, a sentença também.
b) Pelo princípio da instrumentalidade das formas a citação no processo
acima não é nula e, portanto, a sentença é válida.
c) Pelo princípio do devido processo legal, a citação no processo acima
contém uma nulidade de natureza absoluta e, portanto, deveria ser
declarada ex-officio pelo Juiz.
d) Pelo princípio do contraditório, a falha na citação da reclamada torna
nula a sentença.
e) Pelo princípio do contraditório, a falha na citação é sanada pelo
comparecimento espontâneo da reclamada.
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........... .
........... .
751
751
DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO
........... .. 751
............ . 752
........... . 753
754
Sumário: 1.1. Direito Processual do Trabalho- Evolução no Brasil - 1.2. Direito Processual do
Trabalho - Conceito e Autonomia - 1.3. Eficácia da Lei Processual Trabalhista no Tempo e no
Espaço: 1.3.1. Eficácia da lei processual trabalhista no tempo; 1.3.2. Eficácia da lei processual
trabalhista no espaço- 1.4. Princípios Constitucionais Aplicáveis ao Processo do Trabalho: 1.4.1.
Princípio do devido processo legal; 1.4.2. Princfpio da dignidade da pessoa humana; 1.4.3.
Princípio do contraditório; 1.4.4. Princfpio da.ampla defesa; 1.4.5. Princípio da duração razoável
........... .. 771 do processo; 1.4.6. Princípio da primazia da decisão de mérito; 1.4.7. Prindpio da igualdade;
771 1.4.8. Princípio da boa-fé processual; 1.4.9. Prindpio da cooperação; 1.4.1 O. Princípio do respeito
ao autorregramento da vontade das partes; 1.4.11. Prindpio do juiz natural; 1.4.12. Princfpio
772
da motivação das decisões; 1.4.13. Princípio do duplo grau de jurisdição; 1.4.14. Princípio da
777 inafastabilidade de jurisdição - 1.5. Princípios Comuns ao Direito Processual Civil e ao Direito
779 Processual do Trabalho que não Consubstanciam Normas Fundamentais;: 1.5.1. Princípio da
780 aplicação subsidiária da legislação processual comum ao processo do trabalho; 1.5.3. Princf-
782 pio da oralidade; 1.5.4. Princípio da identidade fisica do juiz; 1.5.5. Princípio da imediatidade
ou imediação; 1.5.6. Princípio da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias; 1.5.7.
782
Princípio da imparcialidade do juiz; 1.5.8. Prindpio da conciliação; 1.5.9. Princípio do jus pos-
785 tulandi da parte; 1.5.10. Princípio da lealdade processual; 1.5.11. Princípio da eventualidade;
785 1.5.12. Princípio da preclusão e da perempção; 1.5.13. Princípio da impugnação especificada;
785 1.5.14. Princípio da proteção; 1.5.15. Princípio·da· busca da verdade real; 1.5.16. Princfpio da
785 normatização coletiva; 1.5.17. Princípio da extrapetição; 1.5.18. Princípio da non reformatio in
pejus; 1.5.19. Princípio da instrumentalidáde ou da .finalidade; 1.5.20. Principio da perpetuatio
786
jurisdictionis; 1.5.21. Princípio da estabilidade da lide; 1.6. Regras; 1.6.1. Instauração do pro-
786 cesso por iniciativa da parte; 1.6.2. Desenvolvimento do processo por impulso oficial; 1.6.3.
787 Obediência à ordem cronológica de conclusão- 1.7. Fontes Formais do Direito Processual do
788 Trabalho - 1.8. Resumo da Matéria.
788
789
790
792 1.1. DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO - EVOLUÇÃO NO BRASIL

......... .. 797 Os primeiros órgãos criados no Brasil objetivando solucionar os conflitos tra-
balhistas foram os Conselhos Permanentes de· Conciliação e Arbitragem, os quais,
.......... . 801 embora não efetivamente implantados, foram instituídos pela Lei 1.637, de05.l:M9,11;
L"' LUK>U Ut UIKtll U PROCESSUAL DO TRABALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

cujo art. 8. o dispunha que "os sindicatos que se constituírem com o espírito de As Jun
harmonia entre patrões e operários, como os ligados por conselhos permanentes de função de d
conciliação e arbitragem, destinados a dirimir as divergências e contestações entre sindicalizad
o capital e o trabalho, serão considerados como representantes legais da classe in- de julgame
tegral dos homens do trabalho e, como tais, poderão ser consultados em todos os execução ju
assuntos da profissãô'. avocar qual
Posteriormente, a Lei 1.869, de 10.10.1922, criou, em São Paulo, os denomina- de flagrante
dos Tribunais Rurais, de composição paritária (composto por um juiz de direito da eram comp
comarca, um representante dos trabalhadores e outro, dos fazendeiros), com função representan
de dirimir conflitos até o valor de "quinhentos mil réis", decorrentes da interpretação Wilson
e execução dos contratos de serviços agrícolas. Todavia, os Tribunais Rurais não
167, a respe
produziram resultados satisfatórios.
esclarece qu
Em verdade, esses primeiros órgãos criados praticamente não exerceram suas
funções, pois, como esclarece José Augusto Rodrigues Pinto, Processo trabalhiSta
de conhecimento, p. 35, "sendo caixas de ressonâncias dos conflitos que cuidavam
e inexistindo, à sua época, ambiente propício à sua formação, atrofiaram-se por de
co
esvaziamento natural de funções e finalidade':
de
Dois fatores contribuíram, de forma decisiva, na institucionalização da Justiça am
do Trabalho no Brasil, quais sejam: o surgimento das convenções coletivas de traba- fal
lho e a influência da doutrina da Itália, visto que nosso sistema acabou por copiar, de
em vários aspectos, o sistema italiano da Carta dei Lavoro, de 1927, de Mussolini co
(regime corporativista).
Já na era Vargas, em 1932, foram criadas as Juntas de Conciliação e Julgamento Após
e as Comissões Mistas de Conciliação, que atuavam como órgãos administrativos, dotadas ta
julgando, respectivamente, os dissídios individuais e coletivos do trabalho. funcionava
Amauri Mascaro Nascimento, Curso de direito processual do trabalho, p. 28, do Trabalh
sobre o tema, leciona que: A Jus
quando en
"A convenção coletiva do trabalho 'entrou definitivamente no elenco mento apr
das instituições jurídicas brasileiras, à margem da organização judiciária, e,
com funções especfficas, se erigiram as Comissões Mistas de Conciliação'
Apesa
(Waldemar Ferreira). Essas comissões nasceram subsequentemente e como do Trabalh
consequência direta da introdução das convenções coletivas (1932) e para decisões. A
atender à necessidade de um órgão para decidir e interpretar as questões a saber: Ju
delas oriundas. Assim, nos municípios ou localidades onde existissem sindicatos desprovida
ou associações profissionais de empregadores ou empregados, foram criadas
as Comissões Mistas de Conciliação (1932), com a função, segundo Waldemar
pelo Presid
Ferreira, "especificamente jurisdicional, lançando as linhas de um autêntico gadores; C
tribunal trabalhista, em cuja formação se encontrem representantes, em igual Regionais
número, de empregadores e empregados, decidindo, sob a presidência de para decid
pessoa estranha aos interesses profissionais, de preferência membros da Or- tivos nos l
dem dos Advogados do Brasil, magistrados e funcionários federais, estaduais
ou municipais, escolhidos aqueles por sorteio de nomes constantes de listas
atualmente
apresentadas pelos sindicatos ou associações profissionais". duas Câm
Em 1
Todavia, as Comissões Mistas de Conciliação, que tinham como função primeira dois título
julgar os dissídios coletivos, funcionaram de forma precária e esporádica, visto que, IX - Do M
à época, eram raros os conflitos coletivos. trabalho (
Cap. 1 • PRINC[PIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 25

espírito de As Juntas de Conciliação de Julgamento, também criadas em 1932, tinham a


manentes de função de dirimir os dissídios individuais de trabalho, onde somente os empregados
ações entre sindicalizados possuíam o direito de ação. Estas se constituíam em instância única
a classe in- de julgamento e suas decisões valiam como título de dívi~a ~íquida e, ce~ta p~a
m todos os execução judicial. No entanto, o Ministro do Trabalho, Industna e Comercio podia
avocar qualquer processo, no prazo de seis meses, a pedido do interessado, nos casos
denomina- de flagrante parcialidade dos julgadores ou violação do direito. Na ép~ca, as !untas
e direito da eram compostas de um presidente, em geral membro da OAB, e de dois vogrus, um
com função representante dos empregados e outro dos empregadores.
terpretação Wilson de Souza Campos Batalha, Tratado de direito judiciário do trabalho, p.
Rurais não
167, a respeito do funcionamento das juntas de Conciliação e Julgamento à época,
esclarece que:
ceram suas
trabalhiSta
e cuidavam "(...)o funcionamento desses órgãos, entretanto, era precaríssimo. As Juntas
ram-se por de Conciliação e Julgamento não eram autônomas, nem em face da Justiça
comum, nem em face do titular da Pasta do Trabalho. Este podia revogar as
decisões das Juntas mediante 'avocatórias', espécie de recurso com finalidades
o da Justiça amplas e larguíssimo prazo de interposição. As Juntas eram órgãos amputados;
as de traba- faltava-lhes o poder de executar suas próprias decisões e estas eram passíveis
por copiar, de anulação na fase executória que se processava perante a magistratura
e Mussolini comum. Outorgava-lhes a lei notio limitada; negava-lhes, porém, o imperium".

Julgamento Após 1932, surgiram outras organizações não pertencentes ao Poder Judiciário,
nistrativos, dotadas também de poder de decisão, dentre as quais podemos citar: Juntas que
ho. funcionavam perante a Delegacia de Trabalho Marítimo (1933), o Conselho Nacional
alho, p. 28, do Trabalho (1934) e uma jurisdição administrativa para férias (1933).
A Justiça do Trabalho somente surgiu como órgão autônomo em 01.05.1941,
quando entrou em vigor o Decreto-lei 1.237, de 02.05.1939, e o respectivo regula-
nco mento aprovado pelo Decreto 6.596, de 12.12.1940.
e,
ão'
Apesar de ainda não pertencer ao Poder Judiciário, a partir de 1941, a Just~ça
mo do Trabalho passou a exercer função jurisdicional, com poder de executar as própnas
ara decisões. A nova organização implementada dotou a Justiça Laboral de três órgãos,
ões a saber: Juntas de Conciliação e Julgamento ou Juízes de Direito (nas localidades
tos desprovidas de Juntas), compostas de um presidente bacharel em direito, nomeado
das
mar
pelo Presidente da República e dois vogais, representantes dos empregados e ~mpr:­
ico gadores; Conselhos Regionais do Trabalho, equivalentes, atualmente aos Tnbunais
ual Regionais do Trabalho, sediados em diferentes regiões do País, e com competência
de para decidir os recursos das decisões das Juntas, e, originariamente, os dissídios cole-
Or- tivos nos limites da sua jurisdição; Conselho Nacional do Trabalho, correspondente,
ais
tas
atualmente, ao Tribunal Superior do Trabalho, órgão de cúpula que funcionava com
duas Câmaras, a Câmara da Justiça do Trabalho e a Câmara de Previdência Social.
Em 1943 entrou em vigor a Consolidação das Leis do Trabalho, a qual dedicou
ão primeira dois títulos à organização judiciária (Título VIII - Da Justiça do Trabalho - e Título
a, visto que, IX - Do Mínistério Público do Trabalho) e um terceiro, dedicado ao processo do
trabalho (Título X- Do Processo Judiciário do Trabalho).
26 CURSO DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

Com o Decreto-lei 9.797, de 09.09.1946, foram conferidos aos juízes do trabalho n


d
nomeados pelo Presidente da República as garantias semelhantes às de magistratu- in
ra ordinária, organizando-se a carreira, com ingresso mediante concurso público
de provas e títulos, sendo as promoções realizadas de acordo com os critérios de n
antiguidade e merecimento. a
Finalmente, a Constituição de 1946, concluindo a evolução da Justiça Laboral, té
integrou, definitivamente, a Justiça do Trabalho como órgão do Poder Judiciário, o
t
constituída de Juntas de Conciliação e Julgamento, Tribunais Regionais do Trabalho r
(substituindo os Conselhos Regionais do Trabalho) e o Tribunal Superior do Trabalho l
(antigo Conselho Nacional do Trabalho).
Após a promulgação da Carta de 1946, várias leis relacionadas com o processo Em
do trabalho foram editadas, destacando-se: processua
O Decreto-lei 779/1969, que dispõe sobre a aplicação de normas processuais trabalhistas a monista
à União, Estados, Distrito Federal, Municípios, Autarquias e Fundações Públicas; A te
A Lei 5.584/1970, que, além de unificar os prazos recursais no âmbito laboral, também formado
tratou de vários aspectos processuais trabalhistas, bem como disciplinou a concessão e visão e au
prestação da assistência judiciária na Justiça do Trabalho;
do direito
A Lei 7.701/1988, que versou sobre a competência dos processos no Tribunal Superior
do Trabalho e a especialização dos tribunais trabalhistas em processos coletivos; Nest
A EC 24/1999, que extinguiu a representação classista em todas as instâncias, transfor- por leis e
mando as Juntas de Conciliação e Julgamento em Varas do Trabalho; cesso civi
A Lei 9.957/2000, que instituiu o procedimento sumaríssimo no processo do trabalho, do direito
para as causas cujo valor não ultrapassem a 40 salários mínimos; A te
A Lei 9.958/2000, que criou as denominadas Comissões de Conciliação Prévia, de com- processua
posição paritária, objetivando tentar conciliar os dissídios individuais do trabalho.
instrumen
Trabalhp,
1.2. DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO - CONCEITO E AUTONOMIA substanci
lidado qu
em caso
Direito Processual do Trabalho é o ramo da ciência jurídica, dotado de normas e
princípios próprios para a atuação do direito do trabalho e que disciplina a atividade José
das partes, juízes e seus auxiliares, no processo individual e coletivo do trabalho. autonomi
Carlos Henrique Bezerra Leite, Curso de direito processual do trabalho, p. 77,
em feliz conceito, leciona que:
f
"Conceituamos o direito processual do trabalho como ramo da ciência jurí-
dica, constituído por um sistema de princípios, normas e imtituições próprias,
que tem por objeto promover a pacificação justa dos conflitos decorrentes
das relações jurídicas tuteladas pelo direito material do trabalho e regular o
funcionamento dos órgãos que compõem ã Justiça do Trabalho".

Coqueijo Costa, Direito processual do trabalho, p. 12-13, também cita o conceito


de direito processual do trabalho de vários doutrinadores. Vejamos:

"E assim surgiu o Direito Processual do Trabalho consagrado em 1930,


quando Carnelutti proclamou-o diverso do Direito Processual Comum e que,
ni
Cap. 1 • PRINCIPIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 27

es do trabalho na síntese feliz de Nicola Jaeger, é 'o complexo sistemático de normas que
disciplinam a atividade das partes, do juiz e de seus auxiliares, no processo
e magistratu- individual, coletivo e intersindical não coletivo do trabalho'.
curso público
Ou, nas palavras de Luigi de Litala, 'é o ramo da ciência jurídica que dita as
s critérios de normas instrumentais para a atuação do Direito do Trabalho e que disciplina
a atividade do juiz e das partes, em todo o procedimento concernente à ma-
stiça Laboral, téria de trabalho'. Ou ainda, mais simplificadamente, 'aquele setor do direito
er Judiciário, objetivo que regula o processo do trabalho, entendendo-se por processo do
trabalho aquele que tem como objeto ou matéria um litígio fundado numa
s do Trabalho relação de trabalho' (José A. Arfas, Caracteres generales dei regimen procesal
r do Trabalho laboral de la Ley n. 14.188, Nuevo proceso laboral uruguayo, p. 17)".

m o processo Em relação à autonomia do direito processual do trabalho perante o direito


processual comum, ainda existem divergências na doutrina, nascendo duas teorias,
uais trabalhistas a monista e a dualista.
Públicas; A teoria monista, minoritária, preconiza que o direito processual é unitário,
aboral, também formado por normas que não diferem substancialmente a ponto de justificar a di-
u a concessão e visão e autonomia do direito processual do trabalho, do direito processual civil e
do direito processual penal.
ribunal Superior
coletivos; Neste contexto, para a teoria monista, o processo do trabalho não seria regido
âncias, transfor- por leis e estruturas próprias que justificassem a sua autonomia em relação ao pro-
cesso civil, constituindo-se o direito instrumental laboral em simples desdobramento
so do trabalho, do direito processual civil.
A teoria dualista, significativamente majoritária, sustenta a autonomia do direito
Prévia, de com- processual do trabalho perante o direito processual comum, uma vez que o direito
trabalho.
instrumental laboral possui regulamentação própria na Consolidação das Leis do
Trabalhp, sendo inclusive dotados de princípios e peculiaridades que o diferenciam,
TONOMIA substancialmente, do processo civil. Frise-se, também, que é o próprio texto conso-
lidado que determina a aplicação, apenas subsidiária, das regras de processo civil,
em caso de lacuna da norma instrumental trabalhista (art. 769 da CLT).
o de normas e
na a atividade José Augusto Rodrigues Pinto, em obra já citada neste capítulo, defendendo a
do trabalho. autonomia do processo laboral, leciona que:
abalho, p. 77,
"Os caminhos para a autonomia do Direito Processual do Trabalho, em
face do processo comum, não poderiam ser diversos dos seguidos por todos
a jurí- os ramos que obtiveram sua identidade própria, dentro da unidade científica
prias, do Direito. Foram por ele observados os estágios clássicos da formação de
entes princípios e doutrina peculiares, legislação típica e aplicação didática regular.
ular o Todos esses estágios estão cumpridos, no Brasil, sucessivamente, pelo
Direito Processual do Trabalho. Acha-se ele sustentado por princípios pe-
culiares, ainda que harmonizados com os gerais do processo, por ampla
construção doutrinária, que se retrata em consistente referência biblio-
ita o conceito gráfica, e por um sistema legal característico, incluindo-se, além do mais,
nos currículos de graduação em Direito, na condição de disciplina nuclear.
Aduza-se, ainda, a observação de Coqueijo Costa sobre ter 'juiz próprio', ou
1930, seja, jurisdição especial, o que nem chega a ocorrer em todos os países do·
que, mundo ocidental industrializado". ··
"-VI\..>V IJL; l-111"\CIIV t'"T\VI...C.).:IUt'\L. l.JV 1 nnuru... 1 '"-" · ,,,_,, .. ,.., _.,..., .. , .... ._, "~-· .. · - ,.

. E~ última análise, embora seja verdade que a legislação instrumental trabalhista território b
amda e modesta, carecendo de um Código de Processo do Trabalho, definindo mais aos process
detalhadamente os contornos do processo laboral, não há dúvida que o Direito Pro- Nesta
cess~~l do !rabalho é autônomo em relação ao processo civil, uma vez que possui entrar em
matena legtslativa específica regulamentada na Consolidação das Leis do Trabalho, pendentes,
s:nd? d~ta,d? de institutos, princípios e peculiaridades próprios, além de indepen- Por fi
dencta dtdahca e jurisdicional. sos interpo
esteja em c
1.3. EFICACIA DA LEI PROCESSUAL TRABALHISTA NO TEMPO E NO Em o
ESPAÇO direito adq
recurso se
1.3.1. Eficácia da lei processual trabalhista no tempo decisão de
Frise-
" Est~bele~e- o art. 1. da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro que,
0

:alvo d~spostçao contrária, a lei começa a vigorar em todo o país 45 (quarenta e continuarã
cmco) d1as depois de oficialmente publicadà:
. Em regra, as disposições do direito processual do trabalho entram em vigor a 1.3.2. E
partir da data de publicação da lei, com eficácia imediata, alcançando os processos
em andamento. A efi
aplicado o
O processo, de maneira ampla, compreende uma série de atos processuais que
No B
~e. c?ord~nam e se sucedem no curso do procedimento, iniciando-se com a petição
trabalhista
Imctal ate o trânsito em julgado da sentença.
aos estran
Neste diapasão, o direito processual pátrio adota o sistema denominado "iso-
Dest
lamento dos atos processuais", o qual estabelece que, estando em desenvolvimento
de homol
um _rrocesso, ,a lei processual nova regulará apenas os atos processuais que serão
CF/1988,
pratl~ados apos sua vigência, não alcançando os atos já realizados sob a égide da lei
ante~lOr, os quais serão considerados válidos, produzindo todos os regulares efeitos
"juízo de
prevtstos pela lei velha.
. ~e~te sentido, podemos destacar o art. 912 da CLT, o qual estabelece que "os 1.4. PR
d~sposttlvos de caráter imperativo terão aplicação imediata às relações iniciadas, mas TR
nao consumadas, antes da vigência desta Consolidação".
Logo, os atos processuais já praticados antes da entrada em vigor da lei pro- As n
cessu~l nova estarão resguardados, por constituírem ato jurídico perfeito e acabado, Leis do T
ou ~eJ.a, os atos processuais praticados sob vigência da lei revogada mantêm plena capítulo
eficacta depois de promulgada a lei nova, mesmo que esta estabeleça preceitos de Alg
conteúdos diferentes. também
Nesta ~steira, os atos processuais não são atingidos pelo novo dispositivo legal, disposto
tend~ em Vtsta o princípio da irretroatividade da norma processual. Todavia, no caso (art. 5°, X
de let p;oc~ssual, nova, cujo conteúdo envolva disposições atinentes à jurisdição e observân
competenc~a, tera a mesma aplicação imediata, regendo o processo e julgamento de Prin
fatos antenores à sua promulgação. o legislad
. Este sistema também era adotado pelo Código de Processo Civil de 1973, que Os
dispunha em seu art. 1.211 que: "Este Código regerá o processo civil em todo o omissões
al trabalhista território brasileiro. Ao entrar em vigor, suas disposições aplicar-se-ão desde logo
finindo mais aos processos pendentes".
Direito Pro- Nesta perspectiva, o Código de Processo Civil dispõe em seu art. 1.046: "Ao
z que possui entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos
do Trabalho, pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973".
de indepen- Por fim, o art. 915 consolidado estabelece que não serão prejudicados os recur-
sos interpostos com apoio em dispositivos alterados ou cujo prazo para interposição
esteja em curso à data da vigência da Consolidação das Leis do Trabalho.
E NO Em outras palavras, ao propor uma ação trabalhista, a parte ainda não possui
direito adquirido ao recurso, mas, sim, mera expectativa de direito. O direito ao
recurso será exercido de acordo com a lei vigente no momento da publicação da
decisão de que se pretende recorrer.
Frise-se, outrossim, que os prazos iniciados na vigência da lei anterior por ela
rasileiro que,
(quarenta e continuarão a ser regulados, correndo até o seu termo final.

m em vigor a 1.3.2. Eficácia da lei processual trabalhista no espaço


os processos
A eficácia da lei processual no espaço diz respeito ao território em que vai ser
aplicado o dispositivo legal.
ocessuais que
No Brasil, prevalece o princípio da territorialidade, vigorando a lei processual
om a petição
trabalhista em todo o território nacional, sendo aplicada tanto aos brasileiros quanto
aos estrangeiros residentes no Brasil.
minado "iso-
Destaque-se, todavia, que a execução da sentença estrangeira no Brasil depende
envolvimento
de homologação do Superior Tribunal de Justiça, nos termos do art. 105, I, i, da
is que serão
CF/1988, com redação dada pela EC 45/2004, conhecida esta homologação como
a égide da lei
ulares efeitos "juízo de delibação".

elece que "os 1.4. PRINC(PIOS CONSTITUCIONAIS APLICAVEIS AO PROCESSO DO


niciadas, mas TRABALHO

r da lei pro- As normas fundamentais estão previstas na Constituição, na Consolidação das


to e acabado, Leis do Trabalho e também no Código de Processo Civil, que, aliás, destinou um
antêm plena capítulo inteiro, compostos pelos seus 12 primeiros artigos, para delas tratarem.
preceitos de Algumas normas fundamentais, previstas no Código de Processo Civil, são
também aplicadas na Constituição, como o princípio da inafastabilidade da jurisdição
ositivo legal, disposto no art. 3° do CPC, que consiste na mera repetição do texto constitucional
avia, no caso (art. 5°, XXXV, CF). Outras, no próprio Código de Processo Civil, como o dever de
jurisdição e observância dos precedentes judiciais, e ainda na Consolidação das Leis do Trabalho.
ulgamento de Princípios são proposições genéricas, abstratas, que fundamentam e inspiram
o legislador na elaboração da norma.
de 1973, que Os princípios também atuam como fonte integradora da norma, suprindo as
l em todo o omissões e lacunas do ordenamento jurídico.
30 CURSO DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

Exercem ainda os princípios importante função, atuando como instrumento meios elet
orientador na interpretação de determinada norma pelo operador do direito. no process
(art. 459, §
Os princípios, portanto, desempenham uma tríplice função: informativa, nor-
II); impenh
mativa e interpretativa.
novidade l
Passemos a destacar os princípios aplicáveis ao Processo do Trabalho e suas tadoras de
peculiaridades: CPC, com
extensivam
1.4.1. Princípio do devido processo legal da pessoa
Por f
O princípio do devido processo legal (due process oflaw) é, sem dúvida, um dos
pessoas na
mais importantes princípios constitucionais, encontrandose previsto, expressamente,
aos órgãos
no art. 5. LIV, da CF/1988, dispondo que ninguém será privado da liberdade ou
0
,

de seus bens sem o devido processo legal.


Alguns princípios encontram sua base legal no próprio princípio do devido 1.4.3. Pr
processo legal. Dentre eles, podemos citar: o princípio do juiz e do promotor na- A CF
tural, a proibição de tribunais de exceção, o duplo grau de jurisdição, a motivação administra
das decisões, a só admissibilidade de provas lícitas no processo, o contraditório, a ditório e a
ampla defesa, a publicidade do processo etc.
O Có
viés da Co
1.4.2. Princípio da dignidade da pessoa humana
"A
O princípio da dignidade da pessoa humana está previsto no art. 8° do CPC ou
e impõe ao julgador o dever de resguardar e promover a dignidade da pessoa hu- Pa
mana. Observe: I-
1.1
"Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do 1
bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando 111
a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência." "A
e
Resguardar significa aplicar adequadamente a norma jurídica e não violar a sa
dignidade. Já promover, que o julgado deverá agir para assegurar a dignidade da "A
pessoa humana, como, por exemplo, determinar a tramitação preferencial do feito a
em processo em que seja parte pessoa "portadora de doença grave" que não esteja q
no rol do art. 1.048, I, do CPC. A no
Na visão de Fredie Didier Junior\ o princípio da dignidade da pessoa hu- apenas no
mana pode revelar-se de duas maneiras: a) na construção de normas jurídicas a eles.
processuais, que visem mais diretamente à proteção da dignidade da pessoa. O O co
CPC preocupou-se com isso claramente em diversos dispositivos, quase todos eles senvolvim
novidades no direito processual civil brasileiro. Eis alguns bons exemplos: direito do de condiç
portador de deficiência auditiva, a comunicar-se em audiência por meio da Língua
às partes
Brasileira de Sinais (art. 162, III, CPC); consagração da atipicidade da negociação
mesmo q
processual (art. 190, CPC); direito das pessoas com deficiência à acessibilidade aos
Assi
1
se pronun
DIDIER JUNIOR., Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil. parte geral e processo
de conhecimento. 17. ed. Salvador: Juspodvm. v. l,p. 77-78.
forma, o
Cap. 1 • PRINCfPIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 31
ni

instrumento meios eletrônicos de comunicação processual (art. 199, CPC); direito ao silêncio
direito. no processo civil (art. 388, CPC); proibição de pergunta vexatória à testemunha
(art. 459, § 2°, CPC); humanização do processo de interdição (art. 751, § 3°, 755,
rmativa, nor-
II); impenhorabilidade de certos bens (art. 833, CPC): neste rol, a única que não é
novidade legislativa; tramitação prioritária de processos de pessoas idosas ou por-
abalho e suas tadoras de doença grave. (... ) b) na reconstrução do sentido de alguns artigos do
CPC, como as disposições sobre impenhorabilidade, que podem ser interpretadas
extensivamente para abranger outros bens cuja penhora comprometa a dignidade
da pessoa humana: próteses, jazigos, cão-guia de um cego etc.
Por fim, o princípio da dignidade da pessoa humana aplica-se não apenas às
úvida, um dos
pessoas naturais, mas também às pessoas jurídicas, aos condomínios, aos nascituros,
xpressamente,
aos órgãos públicos etc.
liberdade ou

pio do devido 1.4.3. Princípio do contraditório


promotor na- A CF/1988, em seu art. 5. LV, assegura aos litigantes, em processo judicial ou
0
,
, a motivação administrativo (inclusive no âmbito trabalhista), e aos acusados, em geral, o contra-
ontraditório, a ditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a eles inerentes.
O Código de Processo Civil assegura o princípio do contraditório com o mesmo
viés da Constituição, em seus arts. 9°, 7° e 10°. Perceba:
"Art. 9° Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente
rt. 8° do CPC ouvida.
da pessoa hu- Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica:
I - à tutela provisória de urgência;
1.1 - às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos 11 e 111;
às exigências do 1
na e observando 111 - à decisão prevista no art. 701."
iciência." "Art. 7° É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos
e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de
e não violar a sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório."
dignidade da "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento
encial do feito a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda
que não esteja que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício."

A nova noção de contraditório distancia-se da visão simplista de que consiste


da pessoa hu- apenas no direito das partes à ciência dos atos processuais e de manifestação quanto
mas jurídicas a eles.
da pessoa. O O contraditório passa a ser a garantia de efetiva participação das. partes no de-
ase todos eles senvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de influírem, em igualdade
los: direito do de condições, no convencimento do magistrado. O contraditório, portanto, garante
eio da Língua
às partes o direito de se manifestarem sobre qualquer questão relevante do processo,
da negociação
mesmo que o juiz possa conhecer de ofício.
ssibilidade aos
Assim, por exemplo, se o juiz entender que as partes são ilegítimas, antes de
se pronunciar a respeito, cumpre-lhe intimá-las para que se manifestem. Da'mesma
rte geral e processo
forma, o juiz pode pronunciar a incompetência absoluta de ofício, mas não·.antes1d~
.... vn.Jv ul: uml:ll u rnu\..t:.:>.:>UI\L uu llil-\tH\LHU • nenaro :,araJva e Aryanna Mantredini

oportunizar a manifestação das partes. Consoante a nova noção de contraditório, aplicação do


ainda que caiba ao magistrado conhecer de ofício da matéria, deve permitir que as tes, estabelec
partes colaborem com a formação do seu convencimento. Pretende-se que profira observar o c
uma decisão legítima, aprimorada e justa, resultado de uma atividade conjunta, Ressalte
em que há participação efetiva dos sujeitos do processo. Não se admitirá mais a contra algué
chamada decisão surpresa. quando a de
A IN 39/2016 o TST, que versa sobre as normas do Código de Processo Civil pedido (art.
de 2015 aplicáveis e inaplicáveis no Processo do Trabalho deixa claro o princípio oitiva da par
do contraditório, em especial os art. 9° E 10°, que vedam a decisão surpresa, são seu parágraf
compatíveis com a seara trabalhista. no art. 311,
A mesma instrução normativa, em seu art. 4°, define o que se considera por
decisão surpresa: 1.4.4. Prin
"Art. 4• Aplicam-se ao Processo do Trabalho as normas do CPC que regulam o princípio O cont
do contraditório, em especial os artigos 9° e 10, no que vedam a decisão surpresa.
Citando
§ 1• Entende-se por "decisão surpresa" a que, no julgamento final do mérito da causa,
em qualquer grau de jurisdição, aplicar fundamento jurídico ou embasar-se em fato não
entre o contr
submetido à audiência prévia de uma ou de ambas as partes. qualifica o c
§ 2• Não se considera "decisão surpresa" a que,à luz do ordenamento jurídico nacional e que não há d
dos princípios que informam o Direito Processual do Trabalho, as partes tinham obrigação do direito de
de prever, concernente às condições da ação, aos pressupostos de admissibilidade de
recurso e aos pressupostos processuais, salvo disposição legal expressa em contrário."
1.4.5. Prin
O disposto no art. 10 do CPC foi repetido por este Código nos arts. 493, pa-
rágrafo único, 933 e 927, § 1°: O princ
processo leg
"Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou A prim
extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em conside- de Direitos
ração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão.
Parágrafo único. Se constatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes sobre ele
antes de decidir."
de u
Art. 933. Se o relator constatar a ocorrência de fato superveniente à decisão recorrida imp
ou a existência de questão apreciável de offcio ainda não examinada que devam ser pen
considerados no julgamento do recurso, intimará as partes para que se manifestem no obri
prazo de 5 (cinco) dias."
"Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
' "Art. 332. Nas
I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucio- narmente imp
nalidade;
1 - enunciado
11 - os enunciados de súmula vinculante; 11- acórdão p
111-·os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivos;
repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; 111 - entendim
IV - enunciad
IV- os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional § 1• O juiz ta
e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; decadência o
V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados. § 2• Não inte

§ 1° Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1°, quando § 3• Interpos
decidirem com fundamento neste artigo." § 4• Se houve
retratação, de
lO R
Observe que o art. 933 do CPC reforça o dever de consulta no âmbito dos 3 MENDONÇA
tribunais, sendo que a sua inobservância poderá acarretar a nulidade da decisão lheiros. 2001.
por violação ao contraditório. Por sua vez, o art. 927, § 1°, do CPC determina a • Op. cit., p. 85
Cap. 1 • PRINCIPIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 33

ontraditório, aplicação do disposto no art. 10 do CPC no momento da formação dos preceden-


mitir que as tes, estabelecendo que todos os fundamentos relevantes para a sua formação devem
que profira observar o contraditório.
de conjunta, Ressalte-se, por fim, que o art. 9° do CPC institui que não se proferirá decisão
itirá mais a contra alguém sem que ela seja ouvida, o que significa que é possível que isso ocorra
quando a decisão for a seu favor, como na hipótese de improcedência liminar do
ocesso Civil pedido (art. 332 do CPC 2l. O art. 9° também deixa claro que não se faz necessária a
o princípio oitiva da parte quando a decisão é provisória, por exemplo, nas hipóteses citadas em
urpresa, são seu parágrafo único: tutela provisória e de urgência e tutela de evidência previstas
no art. 311, incisos II e III, e quanto a decisão estabelecida no art. 701 do CPC.
nsidera por
1.4.4. Princípio da ampla defesa
m o princípio O contraditório e a ampla defesa se completam (art. 5°, LV, CF).
surpresa.
Citando Delosmar Mendonça Junior, 3 Fredie Didier4 bem explica essa conexão
rito da causa,
e em fato não
entre o contraditório e a ampla defesa: "São figuras conexas, sendo que ampla defesa
qualifica o contraditório. Não há contraditório sem defesa. Igualmente é lícito dizer
ico nacional e que não há defesa sem contraditório (... ) O contraditório é o instrumento de atuação
am obrigação do direito de defesa, ou seja, esta se realiza através do contraditório.
ssibilidade de
m contrário."
1.4.5. Princípio da duração razoável do processo
ts. 493, pa-
O princípio da duração razoável do processo é corolário do princípio do devido
processo legal. Processo devido é processo com duração razoável.
odificativo ou A primeira a prever a duração razoável do processo foi a Convenção Americana
o em conside- de Direitos Humanos, no Pacto de São José da Costa Rica, em seu art. 8, 1:
ecisão.
tes sobre ele "Toda pessoa tem direito a ser ouvida com as devidas garantias e dentro
de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e
são recorrida imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação
ue devam ser penal formulada contra ela, ou para que se determinem ou seus direitos e
anifestem no obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza."

' "Art. 332. Nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do réu, julgará limi-
e constitucio- narmente improcedente o pedido que contrariar: ·
1 - enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça;
11- acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos
de demandas repetitivos;
vos; 111 - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
IV - enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito local.
constitucional § 1• O juiz também poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência de
decadência ou de prescrição.
nculados. § 2• Não interposta a apelação, o réu será intimado do trânsito em julgado da sentença, nos termos do art. 241.

§ 1°, quando § 3• Interposta a apelação, o juiz poderá retratar-se em 5 (cinco) dias.


§ 4• Se houver retratação, o juiz determinará o prosseguimento do processo, com a citação do réu, e, se não houver
retratação, determinará a citação do réu para apresentar contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias."
lO R
âmbito dos 3 MENDONÇA JUN., Delosmar. Principias da ampla defesa e da efetividade no processo civil brasileiro. São Paulo: Ma-
da decisão lheiros. 2001. p. 55.
etermina a • Op. cit., p. 85.
34 CURSO DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

O Congresso Nacional editou o Decreto 27, de 26 de maio de 1992 apro- 1.4.6. Pr


vando o texto do Pacto, e em 25 de setembro do mesmo ano o Governo Federal
depositou a carta de adesão ao referido Pacto. O Có
assegurand
A Constituição de 1988 confere hierarquia de norma constitucional aos direitos
ao juízo, e
enunciados em tratados internacionais de que o Brasil é parte.
Tal pr
A EC 45/2004 assegurou expressamente o direito à duração razoável do pro- grado no a
cesso em seu art. 5°, LXXVIII:
Art
"A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do inc
processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".
O pri
O CPC refirmou este princípio em seu art. 4°, ressaltando sua aplicação inclusive do mesmo
na fase executiva e, também, em seu art. 139, 11: § 7°, 488, 9

"Art. 4° As partes têm direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, "Ar
incluída a atividade satisfativa." oj

"Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: § 1
I-
(... )
11 -
11 - velar pela duração razoável do processo."
111
em
Para definir se o processo tem ou não duração razoável, a Corte Europeia dos
"Ar
Direitos Humanos fincou três critérios: a complexidade do assunto; b) o comporta-
IX
mento dos litigantes e de seus procuradores ou da acusação e da defesa no processo; víc
e c) a atuação do órgão jurisdicional. No Brasil, pode ser acrescentado um quarto
"Ar
critério: a análise da estrutura do órgão judiciário. 5 as
Fredie Didier Junior6 cita como exemplo algumas medidas para o combate da § 2
violação ao princípio da duração razoável do processo: "a) representação por excesso da
de prazo, com possível perda da competência do juízo em razão da demora (art. "Ar
235, CPC); b) mandado de segurança contra a omissão judicial caracterizada pela pa
não prolação da decisão por tempo não razoável, cujo pedido será a cominação de "Ar
e3
ordem para que se profira a decisão; c) se a demora injusta causar prejuízo, ação mé
de responsabilidade civil contra o Estado, com possibilidade de ação regressiva ind
contra o juiz': A EC 45/2004 também acrescentou a alínea e ao inciso li do art. 93 Pa
da CF/88, estabelecendo que não será promovido o juiz que, injustamente, retiver "Ar
os autos em seu poder, além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório (... )
sem o devido despacho ou decisão. O parágrafo único do art. 7o da Lei 4. 717/1965 § 7
(Lei da Ação Popular) também possui regra que serve a esse direito fundamental: oj
"O proferimento da sentença além do prazo estabelecido privará o juiz da inclu- "Ar
são em lista de merecimento para promoção, durante 2 (dois) anos, e acarretará a ráv
"Ar
perda, para efeito de promoção por antiguidade, de tantos dias quantos forem o de
retardamento, salvo motivo justo declinado nos autos e comprovado perante o órgão Pa
pra
disciplinar competente:'
do
"Ar
' Idem, op. cit., p. 95. tui
' Op. cit., p. 85. rec
ini Cap. 1 • PRINC[PIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 35

de 1992 apro- 1.4.6. Princípio da primazia da decisão de mérito


verno Federal
O Código de Processo civil inova ao prestigiar a primazia da decisão de mérito,
assegurando às partes o direito á solução integral do mérito e, assim, determinando
al aos direitos
ao juízo, em qualquer fase do processo, que priorize a decisão de mérito.
Tal princípio é aplicável ao processo do trabalho e está expressamente consa-
oável do pro- grado no art. 4° do CPC:

Art. 4° As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito,
ável duração do incluída a atividade satisfativa.

O princípio da primazia da decisão de mérito foi repetido em outros artigos


cação inclusive do mesmo Código, mormente nos arts. 76, § 1°, 139, IX, 282, § 2°, 317, 321, 485,
§ 7°, 488, 932, parágrafo único e 1.029, § 3°:

egral do mérito, "Art. 76. Verificada a incapacidade processual ou a irregularidade da representação da parte,
o juiz suspenderá o processo e designará prazo razoável para que seja sanado o vício.

incumbindo-lhe: § 1° Descumprida a determinação, caso o processo esteja na instância originária:


I - o processo será extinto, se a providência couber ao autor;
11 - o réu será considerado revel, se a providência lhe couber;
111 - o terceiro será considerado revel ou excluído do processo, dependendo do polo
em que se encontre."
Europeia dos
"Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
) o comporta-
IX - determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros
a no processo; vícios processuais;"
do um quarto
"Art. 282. Ao pronunciar a nulidade, o juiz declarará que atos são atingidos e ordenará
as providências necessárias a fim de que sejam repetidos ou retificados.
o combate da § 2° Quando puder decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação
ão por excesso da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta."
demora (art. "Art. 317. Antes de proferir decisão sem resolução de mérito, o juiz deverá conceder à
cterizada pela parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício."
cominação de "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319
e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de
prejuízo, ação mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete,
ção regressiva indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado.
o li do art. 93 Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial."
mente, retiver "Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:
os ao cartório (... )
Lei 4. 717/1965 § 7° Interposta a apelação em qualquer dos casos de que tratam os incisos deste artigo,
fundamental: o juiz terá 5 (cinco) dias para retratar-se."
juiz da inclu- "Art. 488. Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favo-
e acarretará a rável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485."
"Art. 932. Incumbe ao relator:
os forem o de
erante o órgão Parágrafo único. Antes de considerar inadmissível o recurso, o relator concederá o
prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a
documentação exigível."
"Art. 1.029. O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na Consti-
tuição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal
recorrido, em petições distintas que conterão:
36 CURSO DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO • Renata Saraiva e Aryanna Manfredini

§ 3° O Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça poderá desconside- também, par
rar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde que não o do empregad
repute grave."

1.4.8. Prin
1.4.7. Princípio da igualdade
O princ
O princípio da igualdade extrai-se do art. 5°, caput, da CF, segundo o qual todos Civil, em seu
são iguais perante a lei, assegurando às partes na relação processual a paridade de
"Art.
armas, 7 ou seja, que tenham as mesmas oportunidades no processo.
acord
A igualdade não significa tratar todas as pessoas da mesma forma, mas tratar
os iguais na medida das suas igualdades e os desiguais na exata medida das suas A boa-f
desigualdades 8 • pelo agir de
O Código de Processo Civil prevê expressamente a igualdade em seu art. 7°: não a sua in
licitamer.te.
dívida já pa
"É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e
faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de
viola-se a bo
sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório." A boa-f
não se invest
Na concepção de Fredie Didier Junior, 9 a igualdade processual deve observar O princípio
quatro aspectos: O princ
a caracteriza
"a) imparcialidade do juiz (equidistância em relação às partes); com base no
b) igualdade no acesso à justiça, sem discriminação (gênero, orientação sexual, rol de condu
raça, nacionalidade etc.); com a prátic
c) redução das desigualdades que dificultem o acesso à justiça, como a finan- A doutr
ceira (ex.: concessão do benefício da gratuidade da justiça, arts. 98-102, CPC), processo: a)
a geográfica (ex.: possibilidade de sustentação oral por videoconferência, art. ilícito, como
937, § 4°, CPC), a de comunicação (ex.: garantir a comunicação por meio da do (art. 841,
Língua Brasileira de Sinais, nos casos de partes e testemunhas com dificuldade CPC); b) pr
auditiva, art. 162, 111, CPC) etc.; contrária à p
d) igualdade no acesso às informações necessárias ao exercício do contra- expectativa d
ditório." por exemplo
impenhorabi
No Processo do Trabalho, podemos mencionar alguns exemplos de aplicação ato ilícito, c
do princípio da igualdade: a) obrigatoriedade de intimação do Ministério Público de suceder a
do Trabalho nos casos que envolvam interesses de incapazes (art. 178, II, CPC); entretanto, n
prazo em dobro para os entes públicos manifestarem-se nos autos (art. 183, do contrário
CPC); isenção de custas processuais para os beneficiários da justiça gratuita (art. por não tê-lo
790-A, CLT); isenção de caução para os trabalhadores; isenção de pagamento dos o exerceria,
honorários periciais paras os beneficiários da justiça gratuita (art. 790-B, CLT); após 10 ano
tramitação prioritária do feito que envolva idoso, portadores de doença grave e, nas partes a
Todas a
pondo às pa
' "Paridade de armas" é uma expressão de Ada Pellegrini Grinover.
' NERY JÚNIOR Nelson. Código de processo civil comentado. 10. ed. São Paulo: RT, 2007. p. 384.
' Op. cit., p. 97. " Idem, op. cit.,
Cap. 1 • PRINC[PIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 37

á desconside- também, para as causas que versem apenas sobre salários e originárias da falência
de que não o do empregador (arts. 1.048, CPC e 652, parágrafo único, CLT).

1.4.8. Princípio da boa-fé processual

O princípio da boa-fé está expressamente previsto no atual Código de Processo


o qual todos Civil, em seu art. 5°, o que não ocorria no Código de 1973:
paridade de
"Art. 5° Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comporta-se de
acordo com a boa-fé."
a, mas tratar
ida das suas A boa-fé subdivide-se em objetiva e subjetiva. A boa-fé objetiva caracteriza-se
pelo agir de acordo com a ética e moral, ou seja, analisam-se as suas ações, mas
seu art. 7°: não a sua intenção. Já a boa-fé subjetiva é a crença do sujeito de que está agindo
licitamer.te. Muitas vezes, o sujeito age contrário à moral, por exemplo, cobrando
dívida já paga, mas porque acreditava que ainda não havia sido quitada, isto é,
o de direitos e
à aplicação de
viola-se a boa-fé objetiva, mas não a subjetiva.
" A boa-fé referida no art. so do CPC é a objetiva, quer dizer, para sua verificação
não se investiga a intenção do sujeito, mas a sua conduta objetivamente considerada.
eve observar O princípio é o da boa-fé objetiva. Não há princípio da boa-fé subjetiva.
O princípio da boa-fé é uma cláusula geral processual, ou seja, as hipóteses que
a caracterizam são indeterminadas, cabendo aos tribunais definir os comportamentos
com base no princípio da boa-fé. Nota-se que o legislador acertou ao não limitar o
xual, rol de condutas que contrariam a boa-fé, já que inúmeras situações podem surgir
com a prática, no dia a dia.
nan- A doutrina alemã elencou quatro casos de aplicação do princípio da boa-fé no
PC), processo: a) proibição de comportamento doloso, uma vez que este caracteriza ato
art. ilícito, como, por exemplo: requerer dolosamente a citação por edital do reclama-
o da do (art. 841, § 1°, da CLT), incorrer nas condutas de litigância de má-fé (art. 80,
ade CPC); b) proibição da venire contra factum proprium, isto é, veda-se a conduta
contrária à praticada anteriormente, assim se a prática de um ato gera no outro a
tra- expectativa de coerência de atuação e ele é frustrado, ele é contrário à boa-fé, como,
por exemplo, quando o executado oferece um bem à penhora e depois alega a sua
impenhorabilidade; c) proibição do abuso de direito. Abuso de direito é considerado
de aplicação ato ilícito, como, por exemplo: o terceiro que adquire coisa litigiosa tem o direito
ério Público de suceder ao réu no processo, desde que mediante a concordância do autor. Este,
8, II, CPC); entretanto, não pode discordar por mero capricho, sem nenhuma justificativa, pois
s (art. 183, do contrário viola a boa-fé; d) supressio processual, ou seja, perda de um direito
ratuita (art. por não tê-lo exercido em tempo, tal que gerou no outro a expectativa de que não
amento dos o exerceria, como, por exemplo: a extinção do processo sem resolução do mérito
90-B, CLT); após 10 anos de tramitação regular do feito viola o princípio da boa-fé, pois gerou
nça grave e, nas partes a expectativa de que estava regular. 10
Todas as decisões e postulações devem pautar-se no princípio da boa-fé, im-
pondo às partes deveres de cooperação.

" Idem, op. cit., p. 111-112.


38 CURSO DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

1.4.9. Princípio da cooperação Por s


de proferir
O princípio da cooperação está expressamente previsto no art. 6° do CPC: às partes q
"Art. 6° Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, Por ú
em tempo razoável, decisão de 'mérito justa e efetiva'." a parte do
No di
O princípio em questão destina-se a todos os sujeitos do processo e visa torná-lo
pedido par
cooperativo, ou seja, em equilíbrio, criando um ambiente em que as partes atuem brasileiro n
com lealdade. defensor. N
Trata-se de um modelo que fica entre dois extremos: a) o modelo publicista, de um doc
em que o juiz é preponderante no processo, mostrando-se distante das partes e em É nes
posição de superioridade durante todo o processo; e b) modelo adversarial, em que
a proeminência é das partes, a quem se confere a condução do processo, enquanto
ao juiz cabe decidir. O modelo cooperativa propõe um diálogo entre as partes e o ju
juiz, devendo a tramitação do processo ser conduzida por ambos com lealdade. Este de
é um sistema pautado no princípio da boa-fé. ou
pr
São quatro os deveres decorrentes do princípio da cooperação, e estes se apli-
es
cam a todos os sujeitos do processo: a) dever de consulta; b) dever de prevenção; p
c) dever de esclarecimento e d) dever de auxílio. ca
Em relação ao órgão jurisdicional, os referidos deveres podem ser compreen-
didos da seguinte forma:
ce
O dever de consulta está previsto no art. 10 do CPC, segundo o qual "o _juiz ad
não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito re
do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se ao
trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício': sí

O dever de prevenção caracteriza-se por impor ao juiz convidar as partes ao


aperfeiçoamento de suas petições ou alegações sempre que o uso inadequado do
processo possa frustrar as suas pretensões, como exemplo: a) o juiz deve perguntar 1.4.1 O. Pr
à parte se esqueceu de ouvir uma das testemunhas ou se de fato desistiu da mc,ma; O po
e b) não deve indeferir a prova e depois julgar o pedido improcedente por falta de pode ficar
prova: em que as
a sucumbê
Art. 77, § l 0 , CPC: § 1° Nas hipóteses dos incisos IV e VI, o juiz advertirá qualquer cl.1s
pessoas mencionadas no caput de que sua conduta poderá ser punida como ato aten-
regrament
tatório à dignidade da justiça. Muito
Art. 321, CPC: O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos tratam das
arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julga- do respeit
mento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou podem se
a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado.
processual
Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial. juiz poder
Art. 772, 11, CPC. Impõe ao juiz que, em qualquer momento da fase executiva, advirta para mani
o executado que o seu procedimento constitui ato atentatório à dignidade da justiça, não haver
o que acarreta multa de até 20% do valor da causa, de acordo com a gravidade da
conduta. Antes de punir o executado, o juiz deve adverti-lo quanto ao comportamento Outr
aparentemente temerário, para que a parte possa explicar-se. vontade é
dini Cap. 1 • PRINCIPIO$ E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 39

Por sua vez, o dever de esclarecimento por um lado impõe ao juízo o dever
de proferir uma decisão clara e, por outro, determina ao mesmo esclarecer-se junto
6° do CPC: às partes quando não compreender suas postulações.
que se obtenha, Por último, o dever de auxílio institui ao juiz afastar os obstáculos que impeçam
a parte do exercício de um direito ou faculdade.
No direito português, o dever de auxílio permite ao juiz sugerir a alteração do
e visa torná-lo
pedido para torná-lo mats de acordo com o entendimento jurisprudencial. No direito
s partes atuem brasileiro não chegamos a tanto, essa tarefa é do representante judicial: advogado ou
defensor. No Brasil significa que o juiz deve afastar os obstáculos para a obtenção
delo publicista, de um documento.
as partes e em É nesse sentido a opinião de Fredie Didier:
rsarial, em que
esso, enquanto
"No Direito Português, a doutrina identifica a existência de um dever de o
e as partes e o juiz auxiliar as partes: 'o tribunal tem o dever de auxiliar as partes na superação
m lealdade. Este de eventuais dificuldades que impeçam o exercício de direitos e faculdades
ou o cumprimento do ônus ou deveres processuais"'. Cabe ao órgão julgador
providenciar, sempre que possível, a remoção do obstáculo. Para cumprir
e estes se apli-
esse dever poderia o órgão julgador, por exemplo, sugerir a alteração do
de prevenção; pedido, para torná-lo mais conforme o entendimento jurisprudencial para
casos como aquele.
ser compreen- (... )
Não nos parece possível defender a existência deste dever no direito pro-
cessual brasileiro. A tarefa de auxiliar as partes é do sei representante judicial:
o qual "o _juiz advogado ou defensor público. Não só não é possível como também não é
ento a respeito recomendável. É simplesmente imprevisível o que pode acontecer se se disser
, ainda que se ao órgão julgador que ele tem um dever atípico de auxílio das partes. É pos-
sível, porém, que haja deveres típicos de auxílio, por expressa previsão legal."

ar as partes ao
nadequado do
deve perguntar 1.4.1 O. Princípio do respeito ao autorregramento da vontade das partes
stiu da mc,ma; O poder de se autorregrar decorre do próprio princípio da liberdade e ele não
te por falta de pode ficar afastado do processo. O melhor desfecho para um feito certamente é aquele
em que as partes participam da solução e não aquele em que a uma delas se impõe
a sucumbência ou a ambas a sucumbência recíproca. Isso não significa que o autor-
irá qualquer cl.1s
a como ato aten-
regramento não tem limites, ele tem sim, como ocorre em qualquer ramo do direito.
Muito embora não estejam referidos nos 12 primeiros artigos do CPC, que
os requisitos dos tratam das normas fundamentais, o Código de Processo Civil prestigia o princípio
dificultar o julga- do respeito ao autorregramento da vontade em diversos artigos e, muitos deles,
as, a emende ou podem ser aplicáveis ao Processo do Trabalho, como, por exemplo: a) o calendário
pletado.
processual, previsto no art. 191 do CPC, ou seja, de comum acordo, as partes e o
a petição inicial. juiz poderão fixar a data para a prática dos atos processuais, como audiências, prazo
executiva, advirta para manifestações, prazo para a entrega de laudo pericial. Em relação a tais atos
idade da justiça, não haverá intimação; b) escolha consensual do perito (art. 471, CPC) e etc.
a gravidade da
comportamento Outro exemplo de aplicação do princípio do respeito ao autorregra111ento da
vontade é a cláusula geral de negociação processual, prevista no art. 19.0,CPC, o qual
40 CURSO DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

estabelece que "versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é dete
lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo nos
às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e o int
deveres processuais, antes ou durante o processo': Isso significa que as partes poderão
Portant
estabelecer mudanças de rito, como, por exemplo, ampliar o número de testemunhas
motivadas.
do procedimento sumaríssimo de 2 para 3 e, também, determinar que as custas
processuais sejam pagas pelo reclamado ou que sejam sempre rateadas; ampliar ou Nesta e
reduzir os prazos; convencionar que os depoimentos das testemunhas poderão ser serão públic
por escrito, realizados perante um tabelião; instituir que não haverá recurso, ou seja, Adema
que as partes aceitarão a decisão do juiz; firmar que o recurso ordinário terá efeito das partes, o
suspensivo ou que a execução será apenas a definitiva. Não há consenso na doutrina da decisão e
quanto à possibilidade de aplicação da cláusula geral de negociação processual no
Processo do Trabalho, muito embora, em nossa opinião, seja cabível.
1.4.13. Prin
Outro exemplo de aplicação do princípio em questão é a solução do conflito
por mediação e conciliação. O CPC destina um capítulo inteiro para regulamentá-la O princ
(arts. 165 a 175), mas não há uniformidade da doutrina quanto à sua aplicação no uma deman
Processo do Trabalho. Ressalte-se a nossa opinião a favor de sua aplicabilidade em posição de r
nossa seara processual. Em ou
toriedade, p
1.4.11. Princípio do juiz natural caso), bem
apreciada à
O princípio do juiz natural, aplicável ao processo do trabalho, está previsto em O STF
dois diferentes incisos do art. 5. da CF, quais sejam:
0
é uma garan
Art. 5.0 ( ••• )
constitucion
"XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção;
instância de
(. ..) Baseia-
Llll - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente";
originária à
o President
O princípio em destaque impede que seja conferida competência não prevista própria Car
na C~rta Maior a qua~squer órgãos julgadores, ou mesmo que seja estabelecido juízo de recurso.
ou tnbunal de exceçao, devendo ser respeitadas as regras objetivas de determina- Todavi
ção de competência, prestigiando-se, assim, a independência e a imparcialidade da do duplo gr
autoridade julgadora. garanta o re
No art. s.o, LIII, da CF/1988 também encontramos o fundamento do princípio gislador ord
do promotor natural, ao estabelecer que ninguém será processado senão pela auto- judiciais ou
ridade competente, impedindo, assim, designações arbitrárias efetuadas pela chefia No pro
da Instituição designando a figura do promotor de exceção. comento.
Trata-s
1.4.12. Princípio da motivação das decisões do Trabalho
3. e 4. da
0 0
,
O art. 93, IX, da CF/1988, com redação dada pela EC 45/2004, afirma que:
Os diss
"Art. 93 (... ) lho, não sen
IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamen- Além d
tadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em obrigatório
i Cap. 1 • PRINCIPIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 41

omposição, é determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos
para ajustá-lo nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique
faculdades e o interesse público à informação;"
rtes poderão
Portanto, sob pena de nulidade, as decisões judiciais devem ser fundamentadas,
testemunhas
motivadas.
ue as custas
; ampliar ou Nesta esteira, o art. 770, também consolidado, menciona que os atos processuais
poderão ser serão públicos, salvo quando o contrário determinar o interesse social.
urso, ou seja, Ademais, o art. 832 da CLT esclarece que da decisão deverão constar o nome
io terá efeito das partes, o resumo do pedido e da defesa, a apreciação das provas, os fundamentos
na doutrina da decisão e a respectiva conclusão.
rocessual no
1.4.13. Princípio do duplo grau de jurisdição
o do conflito
gulamentá-la O princípio do duplo grau de jurisdição implica a possibilidade do reexame de
aplicação no uma demanda (administrativa ou judicial) pela instância superior, mediante inter-
abilidade em posição de recurso em face da decisão do órgão de instância inferior.
Em outras palavras, o princípio do duplo grau de jurisdição impõe a obriga-
toriedade, pelo menos, de duas instâncias (judicial ou administrativa, conforme o
caso), bem como o atinente recurso que garanta às partes a devolução da matéria
apreciada à instância superior.
previsto em O STF firmou entendimento de que o princípio do duplo grau de jurisdição não
é uma garantia constitucional na atual Constituição Federal, não havendo vedação
constitucional à existência de processos administrativos ou judiciais com uma única
instância de julgamento.
Baseia-se o STF no art. 102, I, b, da CF/1988, que outorga competência
competente";
originária à Suprema Corte, para processar e julgar altas autoridades, dentre elas
o Presidente da República, deputados, ministros etc., restando cristalino que a
não prevista própria Carta Maior admitiu a existência de instância única, sem possibilidade
elecido juízo de recurso.
determina- Todavia, nada impede que as leis infraconstitucionais prevejam a possibilidade
cialidade da do duplo grau de jurisdição, disponibilizando ao interessado o atinente recurso que
garanta o reexame da decisão pela instância superior, ou seja, nada obsta que o le-
do princípio gislador ordinário, por opção, normatize o duplo grau de jurisdição em demandas
o pela auto- judiciais ou administrativas.
pela chefia No processo trabalhista há um exemplo da não aplicação do princípio em
comento.
Trata-se dos denominados dissídios de alçada (demandas submetidas à Justiça
do Trabalho que não ultrapassam a dois salários mínimos), previstos no art. 2. §§ 0
,

3. e 4. da Lei 5.584/1970.
0 0
,
irma que:
Os dissídios de alçada serão julgados em instância única pelas Varas do Traba-
lho, não sendo admitido qualquer recurso, salvo se envolver matéria constitucional.
e fundamen- Além disso, frise-se que o art. 496 do CPC estabelece o duplo grau de jurisdição
presença, em obrigatório (chamado de reexame necessário) nos casos de sentença proferida em face
42 CURSO DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

de pessoas jurídicas de direito público (União, Estados, Distrito Federal, Municípios, reexame n
Autarquias e Fundações Públicas), bem como a sentença que julgar procedente, no no art. 3°,
todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública.
"S
No entanto, não haverá o reexame necessário quando a condenação ou o direito
Or
controvertido for de valor certo não excedente: a) 1.000 salários mínimos para a
I-
União e respectivas autarquias e fundações de direito público; b) 500 salários mí- da
nimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de a)
direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados; c) 100 salários m
mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações de b)
direito público (art. 496, § 3. 0 , I, 11 e III, do CPC). Fe
Também não se aplica o disposto no art. 496, § 3°, do CPC quando a senten- 11
ça estiver fundada em: "a) súmula de tribunal superior; b) acórdão proferido pelo du
Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de hi

recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de deman- 111


pr
das repetitivas ou de assunção de competência; d) entendimento coincidente com
co
orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público; im
consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa" (art. 496, § 4°, I, m
11, III e IV).
Observe redação do art. 496 referido:
1.4.14. P
"Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois
de confirmada pelo tribunal, a sentença: O pri
I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respec- da tutela j
tivas autarquias e fundações de direito público; art. 5. XX
0
,

11 - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal. lesão ou a


(... ) Neste
§ 3.0 Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econô- ameaça de
mico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a: do indivíd
I - 1.000 (mil) salários mínimos para União e as respectivas autarquias e fundações de
direito público;
11 - 500 (quinhentos) salários mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas LS. PR
autarquias e fundações de direito público, e os Municípios que constituam capitais dos DIR
Estados; NO
111- 100 (cem) salários mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias
e fundações de direito público.
1.5.1. P
§ 4.0 Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:
a
I - súmula de tribunal superior;
li- acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça A CL
em julgamento de recursos repetitivos; processua
111 - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de
assunção de competência; "A
IV- entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo re
do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa." d
"A
A Súmula 303 do TST ainda está em consonância com o Código de Processo e
Civil de 1973 e deverá ser revisada para adequar-se aos novos limites de dispensa do e
dini Cap. 1 • PRINCIPIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 43

al, Municípios, reexame necessário, sendo este, inclusive, o posicionamento do TST, consubstanciado
procedente, no no art. 3°, X, da IN 39/2016:
da Pública.
"Súm. 303/TST. FAZENDA PÚBLICA - DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO (incorporadas as
ão ou o direito
Orientações Jurisprudenciais 9, 71, 72 e 73 da SOI-I) - Res. 129/2005 - DJ 20.04.2005.
mínimos para a
I - Em dissídio individual, está sujeita ao duplo grau de jurisdição, mesmo na vigência
00 salários mí- da CF/1988, decisão contrária à Fazenda Pública, salvo:
e fundações de a) quando a condenação não ultrapassar o valor correspondente a 60 (sessenta) salários
c) 100 salários mínimos;
e fundações de b) quando a decisão estiver em consonância com decisão plenária do Supremo Tribunal
Federal ou com Súmula ou Orientação Jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho;
ando a senten- 11 - Em ação rescisória, a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau está sujeita ao
proferido pelo duplo grau de jurisdição obrigatório quando desfavorável ao ente público, exceto nas
julgamento de hipóteses das alíneas a e b do inciso anterior.

ção de deman- 111 - Em mandado de segurança, somente cabe remessa ex officio se, na relação
processual, figurar pessoa jurídica de direito público como parte prejudicada pela
oincidente com
concessão da ordem. Tal situação não ocorre na hipótese de figurar no feito como
o ente público; impetrante e terceiro interessado pessoa de direito privado, ressalvada a hipótese de
rt. 496, § 4°, I, matéria administrativa."

1.4.14. Princípio da inafastabilidade de jurisdição


eito senão depois
O princípio da inafastabilidade de jurisdição, também conhecido como princípio
os e suas respec- da tutela jurisdicional ou sistema de jurisdição única, está previsto na CF/1988, no
art. 5. XXXV, que institui que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
0
,

cução fiscal. lesão ou ameaça a direito.


Neste contexto, cabe ao Poder Judiciário, com força definitiva, apreciar lesão ou
o proveito econô- ameaça de direito, não podendo o legislador infraconstitucional restringir o acesso
do indivíduo ao Poder Judiciário.
s e fundações de

ral, as respectivas LS. PRINCÍPIOS COMUNS AO DIREITO PROCESSUAL CIVIL E AO


uam capitais dos DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO QUE NÃO CONSUBSTANCIAM
NORMAS FUNDAMENTAIS
ectivas autarquias

1.5.1. Princípio da aplicação subsidiária da legislação processual comum


stiver fundada em:
ao processo do trabalho
Tribunal de Justiça A CLT tem dois artigos que versam sobre a aplicação subsidiária da legislação
processual comum ao processo do trabalho: arts. 769 e 889:
repetitivas ou de
"Art. 769. Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária dç di-
bito administrativo reito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas
a administrativa." deste Título."
"Art. 889. Aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, iia~Üilo
go de Processo em que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem Ó'próêi~s'so'déis
de dispensa do executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Búblic"JEederpl!1
Lun.;,v ur. u1nt.11 u I"'KULt:::.:::.uAL uu 1KAHALHU • Henato Saraiva e Aryanna Manfredini

Na fase de conhecimento aplica-se o art. 769 da CLT, segundo o qual para 1.5.2. Prin
a aplicação da legislação processual comum ao Processo do Trabalho devem ser
preenchidos dois requisitos: a omissão da CLT e a compatibilidade entre a norma a Em ver
ser aplicada e os princípios gerais do direito processual do trabalho. tutela jurisd
Saliente-se que não se trata apenas da aplicação do CPC de forma subsidiária, processuais
mas da legislação processual comum como um todo, isto é, CPC, CDC, Lei de Ação Dispõe
Civil Pública, Lei do Mandado de Segurança etc. via, se não f
Consoante o art. 889 da CLT, também na fase de execução devem ser preenchi- para o seu p
dos os mesmos requisitos (omissão e compatibilidade) para a aplicação primeiro da Em ve
Lei dos Executivos Fiscais e depois, se persistir a omissão, da legislação processual comum, de
comum ao processo do trabalho. de instrução
Ocorre que o Código de Processo Civil, em seu art. 15, também versa sobre a o feito envo
aplicação subsidiaria do CPC no Processo do Trabalho, suscitando discussões acerca fatos depen
da amplitude de sua aplicação. Verifique: da peça ves
Não ob
Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou realizam ses
administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e sub-
sidiariamente. · Em rel
mandas suje
O referido artigo determina apenas que, havendo omissão da CLT quanto às consagrando
normas processuais trabalhistas, aplique-se o CPC de forma subsidiária e supletiva. A con
Muitos questionam se o requisito da compatibilidade não precisa mais ser prestigiar o
preenchido. Em nossa opinião, permanece exigível, uma vez que a CLT é norma Constituição
especial, e o CPC, norma geral, e esta não revoga lei especial. 45/2004, ass
. Discute-se, também, se o CPC passou a ter uma incidência mais abrangente, do processo
vtsto que o art. 15 refere-se à sua aplicação de forma subsidiária (quando houver
omissão) e supletiva (para complementar uma norma já existente). A nosso ver, 1.5.3. Pri
nada mudou em relação ao que já era aplicável. O CPC sempre teve aplicação no
Processo do Trabalho de forma supletiva, como, por exemplo, quanto à multa por O prin
embargo_s de declaração protelatório. A CLT sempre versou sobre os embargos de pelas partes
declaraçao em seu art. 897-A, o qual não trata da multa. Apesar disso, nunca se No pro
questionou a aplicação supletiva do CPC neste particular (art. 1.026, §§ 2o e 3o,
mencionar
CPC)., ~ambém podemos citar como exemplo a arrematação. A CLT regulamenta
a matena no art. 888, § 1°, determinando que a arrematação ocorrerá pelo melhor a) leitu
lan~e. ~pesar disso, sempre se aplicou o art. 891 do CPC, segundo o qual "não se b) defe
aceitara lance que ofereça preço vil':
c) 1.• e
Por todo o exposto, constatamos que o CPC permanece aplicável no Processo d) inte
do Tr~b~lho de forma subsidiária e supletiva, observando os seguintes requisitos: e) oitiv
a) o~russao da CLT e compatibilidade entre a norma a ser aplicável e os princípios
f) razõ
gerais do Processo do Trabalho. O art. 15 do CPC não contraria os arts. 769 e 889
da CLT~ Ao contrário, eles se harmonizam. g) prot

Quanto à omissão, porém, devemos frisar que ela pode ser normativa (inexiste O prin
a norma), ontológica (há norma, mas não é mais compatível com os fatos sociais concentraçã
quer dizer, está desatualizada) e axiológica (as normas existentes levam a uma so~ -se, também
lução injusta ou insatisfatória, incompatíveis com os valores de justiça e equidade. repetido pe
ni Cap. 1 • PRINCIPIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 45

o qual para 1.5.2. Princípio da concentração dos atos processuais


o devem ser
re a norma a Em verdade, o princípio da concentração dos atos processuais objetiva que a
tutela jurisdicional seja prestada no menor tempo possível, concentrando os atos
a subsidiária, processuais em uma única audiência.
Lei de Ação Dispõe o art. 849 da CLT que a audiência de julgamento será contínua. Toda-
via, se não for possível concluí-la no mesmo dia, caberá ao juiz designar nova data
ser preenchi- para o seu prosseguimento.
primeiro da Em verdade, os juízes do trabalho vêm adotando a praxe, no procedimento
o processual comum, de dividir a audiência em três sessões (audiência de conciliação, audiência
de instrução e audiência de julgamento), somente realizando audiência única quando
versa sobre a o feito envolver matéria exclusivamente de direito, ou quando a comprovação dos
ussões acerca fatos depender apenas de prova documental, esta já esgotada com a apresentação
da peça vestibular e defesa.
Não obstante, ainda existem alguns juízes que, mesmo no procedimento comum,
rabalhistas ou realizam sessão única, concentrando todos os atos processuais em um só momento.
pletiva e sub-
· Em relação ao procedimento sumaríssimo, o art. 852-C determina que as de-
mandas sujeitas a rito sumaríssimo serão instruídas e julgadas em audiência única,
T quanto às consagrando o princípio da concentração dos atos processuais em audiência.
a e supletiva. A concentração dos atos processuais em audiência, sem dúvida, objetiva
isa mais ser prestigiar o princípio da celeridade processual, agora mais ainda evidenciada pela
LT é norma Constituição Federal de 1988, que, no art. 5. 0 , LXXVIII, com redação dada pela EC
45/2004, assegura a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração
abrangente, do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
ando houver
A nosso ver, 1.5.3. Princípio da oralidade
aplicação no
à multa por O princípio da oralidade consubstancia-se na realização de atos processuais
embargos de pelas partes e pelo próprio magistrado na própria audiência, de forma verbal, oral.
o, nunca se No processo do trabalho, o princípio da oralidade é muito aplicado, podemos
§§ 2o e 3o,
mencionar os seguintes exemplos:
regulamenta
pelo melhor a) leitura da reclamação - art. 847 da CLT;
qual "não se b) defesa oral em 20 minutos - art. 847 da CLT;
c) 1.• e 2.• tentativas de conciliação - arts. 846 e 850 da CLT;
no Processo d) interrogatório das partes - art. 848 da CLT;
s requisitos: e) oitiva das testemunhas - art. 848, § 2.0, da CLT;
s princípios
f) razões finais em 10 minutos - art. 850 da CLT;
s. 769 e 889
g) protesto em audiência - art. 795 da CLT.

va (inexiste O princípio da oralidade relaciona-se com os princtptos da imediatidade,


atos sociais concentração e irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias. Relacionava-
m a uma so~ -se, também, com o princípio da identidade física do juiz, entretanto, este não foi
e equidade. repetido pelo atual Código de Processo Civil.
46 CURSO DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

1.5.4. Princípio da identidade física do juiz "


c
O princípio da identidade física do juiz determinava que o juiz que colhia a r
o
prova (depoimento pessoal das partes, oitiva das testemunhas, esclarecimentos verbais
do perito etc.) era quem devia proferir a sentença. Salie
O art. 132 do CPC de 1973 prestigiava o princípio da identidade física do juiz do trabal
ao afirmar que: legislação
ria é regi
"Art. 132. O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se inquirida
estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, prornovido ou aposentado,
casos em que passará os autos ao seu sucessor". Com
a hipótes
Este princípio era aplicado na seara trabalhista, desde o cancelamento da Súmula que havia
136 do TST em 2012, a qual previa a sua inaplicabilidade no processo do trabalho. o vínculo
Entretanto, cumpre ressaltar que o princípio da identidade física do juiz não interior d
tem aplicação desde que o atual Código de Processo Civil entrou em vigor, já que a das aos a
redação do art. 132 do antigo CPC não foi repetida neste diploma processual, logo o magist
deixou de ser também aplicável no processo do trabalho. as partes
reclaman
ro não ti
1.5.5. Princípio da imediatidade ou imediação consegui
pois, de
O princípio da imediação ou da imediatidade permite um contato direto do
juiz com as partes, testemunhas, peritos, terceiros e com a própria coisa litigiosa,
objetivando firmar o seu convencimento, mediante a busca da verdade real. 1.5.6. P
O Código de Processo Civil aplica esse princípio em alguns casos, conforme Con
demonstram os seus arts. 139 e 481 do CPC: ciamento
não se en
"Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: sentenç~
(... ) especiais
VIII -determinar, a qualquer tempo, o comparecimento pessoal das partes, para inquiri- nos. arts.
-las sobre os fatos da causa, hipótese em que não incidirá a pena de confesso"; extingue
"Art. 481. O juiz, de ofício ou a requerimento da parte, pode, em qualquer fase do pro- O p
cesso, inspecionar pessoas ou coisas, a fim de se esclarecer sobre fato que interesse à no art. 8
decisão da causa".
imediato
O processo do trabalho aplica amplamente o princípio da imediação, principal- decisão d
mente tendo em vista que a prova oral é a mais utilizada na esfera laboral. OT
de imedi
O art. 820 da CLT identifica o princípio da imediação, ao afirmar que as
partes e testemunhas serão inquiridas pelo juiz ou presidente, podendo ser re- "
inquiridas, por seu intermédio, a requerimento das partes, seus representantes d
ou advogados. Não se aplica ao Processo do Trabalho a norma do art. 459 do
CPC no que permite a inquiriçãoinquirição direta das testemunhas pela parte
(CLT, art. 820) (art. 11, IN 39/2016, TST).
O artigo supramencionado estava em consonância com o Código de Processo
Civil de 1973, não ocorrendo o mesmo com o novo diploma processual. Segundo T
este, as perguntas serão formuladas diretamente à testemunha. Observe:
edini Cap. 1 • PRINCIPIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 47

"Art. 459. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha,


começando pela que a arrolou, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a
iz que colhia a resposta, não tiverem relação com as questões de fato objeto da atividade probatória
ou importarem repetição de outra já respondida".
imentos verbais
Saliente-se, entretanto, que o novo dispositivo legal não se aplicará ao processo
de física do juiz do trabalho, uma vez que, nos termos do art. 769 da CLT e art. 15 do novo CPC, a
legislação processual civil aplica-se apenas de forma supletiva, e neste caso a maté-
ria é regida pelo art. 820 da CLT, segundo o qual as partes e as testemunhas serão
rá a lide, salvo se inquiridas por intermédio do juiz.
o ou aposentado,
Como exemplo de aplicação do princípio da imediatidade, podemos mencionar
a hipótese de uma audiência trabalhista em que o autor da ação insistia na tese de
ento da Súmula que havia mantido relação empregatícia com a empresa reclamada, a qual negava
so do trabalho. o vínculo afirmando que o obreiro reclamante jamais havia sequer ingressado no
ca do juiz não interior da empresa. Tendo em vista o impasse e considerando que as provas trazi-
vigor, já que a das aos autos até o momento eram insuficientes para firmar o seu convencimento,
processual, logo o magistrado converteu a audiência em diligência, comparecendo imediatamente
as partes e o juiz à empresa. Ao chegarem à empresa, o magistrado ordenou que o
reclamante indicasse o banheiro masculino, ocasião em que percebeu que o obrei-
ro não tinha conhecimento de onde era localizado o sanitário da empresa. Assim,
conseguiu o magistrado identificar que o reclamante, em verdade, estava mentindo,
pois, de fato, sequer conhecia as dependências da empresa.
ntato direto do
coisa litigiosa,
ade real. 1.5.6. Princípio da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias
asos, conforme Consoante previsto no art. 203, § 2. 0 : "Decisão interlocutória é todo pronun-
ciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no § Lo': ou seja, que
não se encaixe no conceito de sentença. Por sua vez, o § 1.0 do mesmo artigo define
, incumbindo-lhe: sentenç~ da seguinte maneira: "Ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos
especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento
rtes, para inquiri- nos. arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como
confesso"; extingue a execução':
quer fase do pro- O processo do trabalho traz em seu bojo uma peculiaridade ao informar,
o que interesse à no art. 893, § 1. 0 , da CLT, que as decisões interlocutórias não são recorríveis de
imediato, somente permitindo-se a apreciação do seu merecimento em recurso da
ação, principal- decisão definitiva.
laboral. O Tribunal Superior do Trabalho entende que em alguns casos é cabível recurso
de imediato das decisões interlocutórias, conforme se extrai da Súmula 214 do TST:
afirmar que as
odendo ser re- "S. 214/TST- Decisão interlocutória. lrrecorribilidade. Na Justiça do Trabalho, nos termos
representantes do art. 893, § 1.0 , da CLT, as decisões interlocutórias não ensejam recurso de imediato,
do art. 459 do salvo nas hipóteses de decisão:
has pela parte a) de Tribunal Regional do Trabalho contrária à Súmula ou Orientação Jurisprudencial
do Tribunal Superior do Trabalho;
b) suscetível de impugnação mediante recurso para o mesmo Tribunal; ., , . .
go de Processo
c) que acolhe exceção de incompetência territorial, com a remessa dos.·.a~{~.~ pàià
ssual. Segundo Tribunal Regional distinto daquele a que se vincula o juízo excepcionado, consoante o
rve: disposto no art. 799, § 2.0 , da CLT". " : 'L!~ii'J~IU
'l!l LUH:>U UI: UIKI:IIU PKULt::,!:IUAL UU 1KAtsALHO ·Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

1.5.7. Princípio da imparcialidade do juiz 1.5.9. P


O princípio da imparcialidade do juiz está intimamente ligado ao princípio do Op
contraditório e da ampla defesa, pois a imparcialidade do magistrado na direção e o qual es
condução do processo certamente assegurará a igualdade de tratamento das partes mente pe
e, principalmente, a garantia de justiça.
Nes
É o próprio art. 10 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, lhista po
que estabelece que "Toda pessoa tem direito, em condições de plena igualdade, de por seus
ser ouvida publicamente e com justiça por um tribunal independente e imparcial,
para a determinação de seus direitos e obrigações ou para o exame de qualquer Log
acusação contra ela em matéria penal': a presenç
A atuaçã
Evidentemente, para o exercício livre, independente e imparcial de suas fun-
ções jurisdicionais, o art. 95 da CF/1988 assegurou aos magistrados as garantias de Um
vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídio. função d
justiça, o
com o te
1.5.8. Princípio da conciliação
Essa
O art. 764 da CLT contempla, de forma explícita, o princípio da conciliação, ao OAB) qu
dispor que os dissídios individuais ou coletivos submetidos à apreciação da Justiça lação a q
do Trabalho serão sempre sujeitos à conciliação. Os t
Neste contexto, os juízes e tribunais do trabalho empregarão sempre os seus sentido d
bons ofícios e persuasão no sentido de uma solução conciliatória dos conflitos (art. parte na
764, § Lo, da CLT). de 1988.
Frise-se que, mesmo após encerrado o juízo conciliatório, é lícito às partes Tal
celebrar acordo que ponha termo ao processo (art. 764, § 3. 0 , da CLT). pela Ass
No procedimento comum (ordinário), em dois momentos a proposta conci- Federal d
liatória é obrigatória: após a abertura da audiência (art. 846 da CLT) e após razões Lei 8.906
finais (art. 850 da CLT). a parte p
Já no procedimento sumaríssimo, estabelece o art. 852-E da CLT que "aberta Rec
a ses.são, o j~iz esclarecerá as partes presentes sobre as vantagens da conciliação e
usara os mews adequados de persuasão para a solução conciliatória do litígio, em "
qualquer fase da audiência': b
c
Por outro lado, impende destacar que cabe ao juiz do trabalho, ao celebrar
o acordo, verificar a observância das normas de proteção ao trabalhador (normas Por
imperativas, de ordem pública), bem como atestar se as bases acordadas não são de revist
prejudiciais ao obreiro, podendo o magistrado recusar a homologação do acordo outro re
quando o mesmo representar, em verdade, renúncia de direitos pelo empregado doravant
(Súmula 418, TST).
Em
Aceita a conciliação proposta, será lavrado o respectivo termo de conciliação ou mesm
(considerado um título executivo judicial- art. 876 da CLT), valendo como decisão por exem
irrecorrível para as partes, salvo para a Previdência Social, quanto às contribuições sob pena
que lhe forem devidas.
Por
Estabelece, outrossim, a Súmula 259 do TST que somente por ação resCisória é da Justiç
impugnável o termo de conciliação previsto no parágrafo único do art. 831 da CLT. trabalho
redini
Cap. 1 • PRINCIPIO~ I: t-UN li:~ t'UKMAI:) UU UIHtll U PKULt::>:>UAL UU I KJ\t:SALHU 49

1.5.9. Princípio do jus postulandi da parte


ao princípio do O princípio do jus postulandi da parte está consubstanciado no art. 791 da CLT,
do na direção e o qual estabelece que os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoal-
mento das partes mente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações.
Nessa esteira, o art. 839, a, da CLT também salienta que a reclamação traba-
omem, de 1948, lhista poderá ser apresentada pelos empregados e empregadores, pessoalmente, ou
na igualdade, de por seus representantes, e pelos sindicatos de classe.
nte e imparcial,
me de qualquer Logo, em função do jus postulandi, reclamante e reclamado poderão atuar sem
a presença de advogados, perante os juízos de primeiro grau e Tribunais Regionais.
A atuação perante o TST, como se verá abaixo, não segue esta regra.
al de suas fun-
as garantias de Uma corrente minoritária defendia que, após a Constituição Federal de 1988, em
função de o art. 133 estabelecer que o advogado é indispensável à administração da
justiça, o art. 791 da CLT não mais estaria em vigor, em face da incompatibilidade
com o texto constitucional mencionado.
Essa corrente ganhou mais força com a edição da Lei 8.906/1994 (Estatuto da
conciliação, ao OAB) que, em seu art. 1. I, considerava atividade privativa da advocacia "a postu-
0
,

ação da Justiça lação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais" (grifo nosso).
Os tribunais trabalhistas, contudo, em sua maioria, firmaram jurisprudência no
sempre os seus sentido de que o art. 791 da CLT está em vigor, permanecendo o jus postulandi da
s conflitos (art. parte na Justiça do Trabalho, mesmo após a promulgação da Constituição Federal
de 1988.
lícito às partes Tal jurisprudência restou confirmada com o julgamento da ADI 1.127, proposta
LT). pela Associação dos Magistrados do Brasil - AMB, na qual o Supremo Tribunal
roposta conci- Federal declarou inconstitucional a expressão "qualquer", constante do art. l.o, I, da
) e após razões Lei 8.906/1994 (Estatuto da OAB), prevalecendo o entendimento de que é possível
a parte postular sem a presença do advogado, em algumas hipóteses.
LT que "aberta Recentemente foi publicada a Súmula 425 do TST, que dispõe:
a conciliação e
do litígio, em "O jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Tra-
balho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação
cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência".
o, ao celebrar
hador (normas Portanto, o jus postulandi não prevalece no TST. Logo, em caso de recurso
dadas não são de revista interposto, ele deverá ser subscrito por advogado, assim como qualquer
ção do acordo outro recurso que venha a tramitar no TST. Em outras palavras, o jus postulandi
elo empregado doravante somente prevalecerá nas instâncias ordinárias.
Em caso de eventual recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal,
de conciliação ou mesmo recurso encaminhado ao Superior Tribunal de Justiça (para examinar,
como decisão por exemplo, conflito de competência), também deve ele ser subscrito por advogado,
contribuições sob pena de o apelo não ser conhecido.
Por último, frise-se que, após a EC 45/2004, que ampliou a competência material
ão resCisória é da Justiça do Trabalho para processar e julgar qualquer lide envolvendo relação de
t. 831 da CLT. trabalho (art. 114 da CF/1988), entendemos que o jus postulandi da parte é restrito
50 CURSO DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

às ações que envolvam relação de emprego, não se aplicando às demandas referentes Os at


à relação de trabalho distintas da relação empregatícia. mitação d
Logo, em caso de ação trabalhista ligada à relação de trabalho não subordinado, Logo
as partes deverão estar representadas por advogados, a elas não se aplicando o art. contido, re
791 da CLT, restrito a empregados e empregadores. a fase já u
A pr
1.5.1 O. Princípio da lealdade processual A pr
no prazo
O art. 5° do CPC expressa que todo aquele que de qualquer forma participa do
processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé, devendo agir com probidade. Já a
o já pratic
Neste contexto, o próprio Código de Processo Civil traz em seu bojo dispositivos
em contra
que objetivam inibir ou punir a parte que aja com má-fé ou com falta de lealdade
processual, conforme se verifica, exemplificativamente, nos arts. 79 a 81 (litigância Pode
de má-fé), art. 142 (prática de ato simulado pelas partes), art. 1.026, § 2°, CPC do, após a
(embargos declaratórios meramente protelatórios), art. 792 (fraude à execução) e julgado, e
art. 774 (ato atentatório à dignidade da justiça). do Trabal
O ato
1.5.11. Princípio da eventualidade judicial, a
preclusão
O princípio da eventualidade determina que as partes aduzam, de uma só vez, A pr
todas as matérias de ataque e defesa, objetivando resguardar seu próprio interesse, no prazo
sob pena de operar-se a denominada preclusão. consumad
Em outras palavras, o autor deverá alegar e requerer todo o seu direito na O ar
peça vestibular (petição inicial) e o réu deve esgotar, na peça de resistência, toda a à parte d
matéria de defesa. operou a
O art. 336 do CPC contempla o princípio da eventualidade ao dispor que No' â
compete ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões consagrad
de fato e de direito, com que impugna o pedido do autor e especificando as provas
que pretende produzir. "A
q
Neste contexto, deverá o reclamado, exemplificativamente, alegar na contes-
tação, simultaneamente, a matéria relacionada com as preliminares, como também "A
d
a matéria relativamente ao mérito, tendo em vista a eventualidade de não ser(em)
acolhida(s) a(s) preliminar(es) arguida{s) (art. 336, CPC). (..
§
Em face da omissão da Consolidação das Leis do Trabalho, é perfeitamente d
possível a aplicação do princípio da eventualidade ao processo do trabalho (art. 769, o
CLT), sendo prudente, porém, ao magistrado trabalhista que alerte às partes para §
que produzam suas razões de defesa no momento oportuno. o
p
1.5.12. Princípio da preclusão e da perempção A pe
Preclusão é a perda da possibilidade da prática de um ato processual seja pelo ato proce
seu não exercício no momento oportuno, seja pela total incompatibilidade entre o inércia, a
ato realizado e o posterior, ou mesmo seja pelo fato de o ato já ter sido validamente OC
praticado. cer, nos a
dini Cap. 1 • PRINCIPIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 51

ndas referentes Os atos processuais são ordenados por meio de fases que se sucedem na tra-
mitação do processo.
o subordinado, Logo, vencida uma fase processual, resta preclusa a prática de qualquer ato nela
plicando o art. contido, ressalvados os casos específicos em lei, em que o magistrado pode reabrir
a fase já ultrapassada.
A preclusão classifica-se em temporal, lógica e consumativa.
A preclusão temporal opera-se quando a parte não praticar o ato processual
no prazo estipulado pela lei.
ma participa do
om probidade. Já a preclusão lógica ocorre quando a parte pratica um ato incompatível com
o já praticado, ou seja, é a impossibilidade de praticar um ato, por estar o mesmo
ojo dispositivos
em contradição com atos praticados anteriormente.
lta de lealdade
a 81 (litigância Podemos mencionar como exemplo da preclusão lógica o fato de o reclama-
26, § 2°, CPC do, após a sentença de l. o grau que lhe foi desfavorável, requerer a liquidação do
à execução) e julgado, e posteriormente interpor recurso ordinário em face da decisão da Vara
do Trabalho.
O ato de requerer a liquidação da sentença constitui aceitação tácita do comando
judicial, ato este incompatível com a vontade de recorrer, operando-se, portanto, a
preclusão lógica.
de uma só vez, A preclusão consumativa dá-se em função da prática válida do ato processual
óprio interesse, no prazo estabelecido pela lei, não podendo a parte renovar o ato já praticado e
consumado.
seu direito na O art. 507 do CPC consagrou o princípio da preclusão ao dispor que é defeso
stência, toda a à parte discutir, no curso do processo, as questões já decididas, cujo respeito se
operou a preclusão.
ao dispor que No' âmbito do direito processual do trabalho, a preclusão encontra-se também
ondo as razões consagrada nos arts. 795 e 879, §§ 2. 0 e 3. 0 , ambos da CLT, que dispõem:
ando as provas
"Art. 795. As nulidades não serão declaradas senão mediante provocação das partes, as
quais deverão argui-las à primeira vez em que tiverem de falar em audiência ou nos autos".
gar na contes-
como também "Art. 879. Sendo ilíquida a sentença exequenda, ordenar-se-á, previamente, a sua liqui-
dação, que poderá ser feita por cálculo, por arbitramento ou por artigos.
e não ser(em)
...
( )
§ 2.0 Elaborada a conta e tornada líquida, o Juiz poderá abrir às partes prazo sucessivo
perfeitamente de 10 (dez) dias para impugnação fundamentada com a indicação dos itens e valores
balho (art. 769, objeto da discordância, sob pena de preclusão.
às partes para § 3.0 Elaborada a conta pela parte ou pelos órgãos auxiliares da Justiça do Trabalho,
o juiz procederá à intimação da União para manifestação, no prazo de dez dias, sob
pena de preclusão".

A perempção consiste na perda pela parte do direito de praticar determinado


ssual seja pelo ato processual ou mesmo de prosseguir com a demanda em função da sua própria
lidade entre o inércia, ao deixar expirar o prazo legal para o exercício do direito.
do validamente O Código de Processo Civil consagrou o instituto da perempção ao estabele-
cer, nos arts. 485, III e 486, § 3°, do CPC, que, se o autor der causa à extinção do
processo sem resolução do mérito por três vezes, em função de não ter promovido o qual é p
os atos e diligências que lhe competirem, abandonando a causa por mais de 30 parte hipos
dias, não poderá intentar nova ação contra o réu com o mesmo objeto, ficando-lhe
Porta
ressalvada, entretanto, a possibilidade de alegar em defesa o seu direito.
cessual, a
No campo do direito processual do trabalho, apenas encontramos a figura da proteger o
perempção provisória, prevista nos arts. 731 e 732 da CLT, que impedem, tempo- dispositivo
rariamente, a parte de ajuizar reclamação trabalhista em face do mesmo reclamado
e envolvendo o mesmo objeto, nas seguintes hipóteses: A g
ass
"Art. 731. Aquele que tendo apresentado ao distribuidor reclamação verbal, não se lha
apresentar, no prazo estabelecido no parágrafo único do art. 786, à Vara ou Juízo para Oi
fazê-lo tomar por termo, incorrerá na pena de perda, pelo prazo de seis meses, do po
direito de reclamar perante a Justiça do Trabalho". (tra
"Art. 732. Na mesma pena do artigo anterior incorrerá o reclamante que, por duas vezes A a
seguidas, der causa ao arquivamento de que trata o art. 844." ma
ao
A
1.5.13. Princípio da impugnação especificada ran
rec
Pelo princípio da impugnação especificada, o reclamado deve manifestarse, pre- O
cisa e especificamente, sobre os fatos narrados na petição inicial, não se admitindo ser
a defesa por negação geral. efe
fac
Logo, o reclamado, ao impugnar os pedidos elencados na peça inaugural pelo de
reclamante, deverá contestar cada parcela individualmente.
A defesa por mera negativa geral não produz qualquer efeito jurídico, equiva- Frise-
lendo à própria inexistência de contestação. ao trabalh
o magistra
O art. 341 do CPC, de aplicação subsidiária ao processo do trabalho, contempla
o princípio da impugnação especificada, in verbis: processual
possuficien
"Art. 341. Incumbe também ao réu manifestar-se precisamente sobre as alegações de fato Logo
constantes da petição inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas, salvo se: determina
I - não for admissível, a seu respeito, a confissão; processo d
privilégios
11 - a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento que a lei considerar da
substância do ato; O pri
111 - estiverem em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto. encontram
de suas de
Parágrafo único. O ônus da impugnação especificada dos fatos não se aplica ao defensor
público, ao advogado dativo e ao curador especial".
1.5.15. Pr

1.5.14. Princípio da proteção O pri


do trabalh
Esse princípio é defendido por autores consagrados como Wagner Giglio, Carlos
A Co
Henrique Bezerra Leite e Sérgio Pinto Martins.
dispor que
Pelo princípio da proteção, o caráter tutelar, protecionista, tão evidenciado no processo e
direito material do trabalho, também é aplicável no âmbito do processo do trabalho, diligência

1
'-"P· , • '"""-'"'v, t rvN r t> r uH MAl~ DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 53

ter promovido o qual é permeado de normas, que, em verdade, objetivam proteger o trabalhador,
or mais de 30 parte hipossuficiente da relação jurídica laboral.
o, ficando-lhe
Portanto, considerando a hipossuficiência do obreiro também no plano pro-
reito.
cessual, a própria legislação processual trabalhista contém normas que objetivem
os a figura da proteger o contratante mais fraco (empregado), cabendo destacar os seguintes
edem, tempo- dispositivos:
mo reclamado
A gratuidade da justiça (isenção de pagamento de custas e despesas processuais) e a
assistência judiciária na Justiça do Trabalho são destinadas, exclusivamente, aos traba-
verbal, não se lhadores e não aos empregadores;
ra ou Juízo para O impulso oficial nas execuções trabalhistas (art. 878 da CLT), em que o juiz do trabalho
seis meses, do pode, de ofício, impulsionar a execução, favorece, evidentemente, ao credor trabalhista
(trabalhador exequente);
, por duas vezes A ausência do reclamante à audiência importa tão somente no arquivamento da recla-
mação trabalhista (art. 844 da CLT), evitando a apresentação da defesa e possibilitando
ao obreiro ajuizar nova ação trabalhista;
A obrigatoriedade do depósito recursal em caso de eventual recurso objetivando ga-
rantir futura execução (art. 899, § 1.0 , da CLT). é comando destinado exclusivamente ao
reclamado;
nifestarse, pre- O dispositivo previsto no art. 651 da CLT determina que a reclamação trabalhista deve
se admitindo ser proposta na localidade em que o empregado (seja ele reclamante ou reclamado)
efetivamente prestou os seus serviços, também protegendo o obreiro, principalmente
facilitando a produção de provas pelo trabalhador, como também diminuindo as suas
naugural pelo despesas.

ídico, equiva- Frise-se que não se trata de o juiz do trabalho instituir privilégios processuais
ao trabalhador, conferindo tratamento não isonômico entre as partes, mas sim de
o magistrado respeitar o ordenamento jurídico vigente, uma vez que a própria lei
ho, contempla
processual trabalhista é permeada de dispositivos que visam proteger o obreiro hi-
possuficiente, conforme acima exemplificado.
egações de fato Logo, o princípio da igualdade ou isonomia, previsto no art. 5. da CF/1988, 0

adas, salvo se: determinando que todos são iguais perante a lei, é perfeitamente respeitado pelo
processo do trabalho, pois é a própria lei instrumental trabalhista que cria alguns
privilégios ao obreiro, para lhe garantir a isonomia em relação ao empregador.
ei considerar da
O princípio da igualdade, pois, consiste em tratar de maneira igual os que se
nto. encontram em situação equivalente e de maneira desigual os desiguais, na medida
de suas desigualdades.
ica ao defensor

1.5.15. Princípio da busca da verdade real

O princípio da busca da verdade real é derivado do princípio do direito material


do trabalho, denominado princípio da primazia da realidade.
Giglio, Carlos
A Consolidação das Leis do Trabalho consagrou tal princípio no art. 765, ao
dispor que os juízos e tribunais do trabalho terão ampla liberdade na direção do
idenciado no processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer
do trabalho, diligência necessária ao esclarecimento delas.

1
54 CURSO DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

1.5.16. Princípio da normatização coletiva de


qu
A redação original do art. 114 da CF/1988 concedeu à Justiça do Trabalho o Ar
poder normativo, ou seja, a competência de fixar, por meio da sentença normativa so
(prolatada no bojo do processo denominado dissídio coletivo), novas condições de lh
trabalho de aplicação obrigatória às categorias econômicas (patronal) e profissionais ve
(trabalhadores) envolvidas. Ar
co
Todavia, a EC 45/2004, ao alterar o § 2. 0 do art. 114 da Carta Maior, limitou, ap
consideravelmente, o poder normativo da Justiça do Trabalho, visto que, doravante, a
o dissídio coletivo de natureza econômica somente poderá ser proposto se houver ta
mútuo acordo, ou seja, se houver a concordância de ambos os entes sindicais. A
Vejamos a nova redação do art. 114, § 2. da CF/1988: 0
,
in

"Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: 1.5.18. P


(...)
§ 2.0 Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado Pelo
às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo um recurs
a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de
A se
proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente".
devolvend
Logo, verifica-se que a Justiça do Trabalho transformou-se numa espécie de CPC - ta
juízo arbitral, somente podendo atuar e exercer o denominado poder normativo Porta
se ambos os entes sindicais concordarem com o ajuizamento do dissídio coletivo, pelo tribu
havendo sensível redução do poder normativo da Justiça do Trabalho. pena de v
Ademais, impende destacar que, mesmo instaurado dissídio coletivo de natureza Por o
econômica (agora com a necessária concordância dos entes interessados), não terá a trabalho,
Justiça do Trabalho poderes ilimitados, esclarecendo a parte final do § 2. 0 do art. 114 impugnad
da CF/1988 que a instância laboral deverá respeitar as disposições mínimas legais Logo
de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.
sendo irr
Em função da importância do tema, este assunto voltará a ser abordado ainda outra part
nesta obra, em capítulo específico. ao princíp
Evid
1.5.17. Princípio da extra petição como o re
O princípio da extrapetição permite que o juiz, nos casos expressamente pre- Salie
vistos em lei, condene o réu em pedidos não contidos na petição inicial, ou seja, 45, firmou
autoriza o julgador a conceder mais do que o pleiteado, ou mesmo vantagem diversa agravar a
da que foi requerida. Por
O art. 322, § 1. 0 , do CPC, por exemplo, permite que o juiz determine que sobre respeito d
a condenação da parcela principal incida juros e correção monetária, mesmo que do CPC),
no rol de pedidos não conste tal requerimento. no recurs
No âmbito do processo do trabalho também podemos mencionar alguns exem-
plos àa aplicação do princípio da extrapetição. Verifique: 1.5.19. P

Art. 137, § 2.0 , da CLT - caso o empregado ajuíze reclamação trabalhista requerendo O pr
que o juiz fixe a data de gozo de suas férias, a sentença cominará, independentemente arts. 188
dini Cap. 1 • PRINCIPIOS E FONTES FORMAIS DO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 55

de pedido autoral, pena diária de 5% do salário mínimo, devida ao empregado até


que seja cumprida;
do Trabalho o Art. 467 da CLT - em caso de rescisão de contrato de trabalho, havendo controvérsia
nça normativa sobre o montante das verbas rescisórias, o empregador é obrigado a pagar ao traba-
condições de lhador, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas
e profissionais verbas, sob pena de pagá-las acrescidas de 50%, independentemente de pedido autoral;
Art. 496 da CLT- o prindpio da extrapetição também está presente na autorização legal
conferida ao juiz para determinar o pagamento de indenização, apesar de postulada
Maior, limitou, apenas a reintegração de empregado alcançado pela estabilidade no emprego, quando
ue, doravante, a reintegração do obreiro for desaconselhável, dado o grau de incompatibilidade resul-
osto se houver tante do dissídio, especialmente quando for o empregador pessoa física;
sindicais. A Súmula 211 do TST também determina que os juros de mora e a correção monetária
incluem-se na liquidação, ainda que omisso o pedido inicial ou a condenação.

1.5.18. Princípio da non reformatio in pejus

gem, é facultado Pelo princípio da non reformatio in pejus, é vedado ao tribunal, no julgamento de
ômica, podendo um recurso, proferir decisão mais desfavorável ao recorrente, do que aquela recorrida.
ínimas legais de
A sentença pode ser impugnada total ou parcialmente (art. 1.002 do CPC),
devolvendo o recurso ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada (art. 1.013,
ma espécie de CPC - tantwn devolutum quantum appellatum).
der normativo Portanto, se a sentença for objeto de recurso por uma das partes, o julgamento
ssídio coletivo, pelo tribunal não pode agravar a condenação que não foi objeto de recurso, sob
o. pena de violação ao princípio em comento.
vo de natureza Por outro lado, o art. 1.008 do CPC, aplicado subsidiariamente ao processo do
os), não terá a trabalho, esclarece que o julgamento proferido pelo tribunal substituirá a decisão
2. 0 do art. 114 impugnada no que tiver sido objeto de recurso.
mínimas legais Logo, a parte da sentença que não foi objeto de recurso transitou em julgado,
e.
sendo irreformável pelo tribunal, não podendo ser atingida pelo julgamento de
bordado ainda outra parte, que foi devolvida, no recurso, à instância superior, sob pena de ofensa
ao princípio da non reformatio in peius.
Evidencia-se, por conseguinte, que tal princípio protege tanto o recorrente
como o recorrido.
essamente pre- Saliente-se, outrossim, que o Superior Tribunal de Justiça, por meio da Súmula
nicial, ou seja, 45, firmou entendimento de que, no caso de reexame necessário, é defeso ao Tribunal
ntagem diversa agravar a condenação imposta à Fazenda Pública.
Por último, vale mencionar que, em relação às questões de ordem pública, a
mine que sobre respeito das quais não se opera a preclusão (ex.: arts. 485, § 3.0 , e 337, § 5. 0 , ambos
a, mesmo que do CPC), o juiz ou Tribunal poderá decidi-las de ofício, ainda que não abordadas
no recurso ou contrarrazões, consistindo no chamado efeito translativo do recurso.
r alguns exem-
1.5.19. Princípio da instrumentalidade ou da finalidade

ista requerendo O princípio da instrumentalidade ou da finalidade está consubstanciado nos


pendentemente arts. 188 e 277, ambos do CPC que informam:
LUK~U Ut UIKtll U PHULt~~UAL UU I HA~ALHO • Renato Saraiva e Aryanna Manfredini

•Art. 188. Os atos e os termos processuais independem de forma determinada, salvo Todavia
quando a lei expressamente a exigir, considerando-se válidos os que, realizados de outro
causa de ped
modo, lhe preencham a finalidade essencial•.
possibilidad
"Art. 277. Quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se,
realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade".
o requerime
Transp
O princípio em comento, de aplicação subsidiária ao processo do trabalho (art. das as suas
769 da CLT), determina que serão válidos os atos que, embora realizados de outra é apresentad
forma, alcançarem a sua finalidade, desde que a lei não preveja a sua nulidade, pois própria audi
o processo não é um fim em si mesmo, mas tão somente um instrumento para que ou modifiqu
o Estado preste a jurisdição. traditório e
Eviden
1.5.20. Princípio da perpetuatio jurisdictionis possível ao
O princípio da perpetuatio jurisdictionis está consagrado no art. 43 do CPC ao
estabelecer que a competência é fixada no momento do registro ou da distribuição 1.6. REGR
da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito
ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem As nor
1
a competência absoluta. ros artigos
A hipótese de supressão de órgão judiciário equivale a de criação de uma vara iniciativa da
do trabalho.
Isso significa que, embora a regra seja a de que o juízo competente para pro- 1.6.1. Ins
cessar e julgar a reclamação trabalhista seja aquele competente no momento da
propositura da ação, quando houver supressão de órgão jurisdicional, criação de O art.
vara do trabalho, alteração da competência em razão da matéria e da hierarquia desenvolve
todas as reclamações trabalhistas devem ser remetidas ao novo juízo competente. Em ou
Há, porém, uma exceção, quando houver alteração da competência em razão ex officio o
da matéria, muito embora a regra seja a de que todas as ações devem ser remetidas Todavi
para o novo juízo competente, quando a nova competência, da Justiça do Trabalho, no âmbito l
foi definida em razão da EC 45/2004, somente as ações que não possuíam sentença Trata-s
de mérito serão encaminhadas para esta justiça especializada. Regional do
Neste sentido, atente-se para a Súmula 367 do STJ e a Súmula Vinculante 22 do STF: art. 856 da
As ban
·súmula 367. A competência estabelecida pela EC n. 45/2004 não alcança os processos
já sentenciados." tendimento
instaurar, d
"Súmula Vinculante 22. A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar
as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de empregados
trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não No ent
possufam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da Emenda pode suscita
Constitucional n° 45/04."
pelos obreir
em função
1.5.21. Princípio da estabilidade da lide apenas aos
de Greve (L
O princípio da estabilidade da lide possibilita que o autor, até a citação, possa ao Ministér
aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, inàependentemente de consentimento Outra
do réu (art. 329, I, do CPC). princípio d
ni Cap. 1 • PRINCIPIO~ t ~UNI t~ ~UHMAI~ UU UIKtll U PROCESSUAL DO TRABALHO 57

erminada, salvo Todavia, até o saneamento, é defeso ao autor aditar ou alterar o pedido e a
izados de outro
causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a
possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado
válido o ato se,
o requerimento de prova suplementar (art. 329, 11, CPC).
Transportando o princípio em comento para o processo do trabalho, respeita-
trabalho (art. das as suas peculiaridades, e considerando que a defesa pelo demandado somente
ados de outra é apresentada em audiência (art. 847 da CLT), nada obsta que o reclamante, na
nulidade, pois própria audiência, antes da apresentação da peça de resistência pelo reclamado, adite
nto para que ou modifique sua peça vestibular, desde que sejam respeitados os princípios do con-
traditório e ampla defesa, tendo o réu prazo para manifestar-se sobre o aditamento.
Evidentemente, após a apresentação da defesa pelo reclamado, já não mais será
possível ao autor modificar ou aditar o pedido.
3 do CPC ao
a distribuição 1.6. REGRAS
ou de direito
ou alterarem As normas fundamentais do processo civil estão dispostas nos doze primei-
1
ros artigos e dividem-se em princípios e três regras: instauração do processo por
de uma vara iniciativa da parte, impulso oficial e obediência à ordem cronológica de conclusão.

nte para pro- 1.6.1. Instauração do processo por iniciativa da parte


momento da
l, criação de O art. 2. 0 do CPC informa que o processo começa por iniciativa da parte e se
da hierarquia desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei.
competente. Em outras palavras, o princípio dispositivo impede que o magistrado instaure
cia em razão ex officio o processo trabalhista.
ser remetidas Todavia, a Consolidação das Leis do Trabalho apresenta uma exceção discutível
do Trabalho, no âmbito laboral.
am sentença Trata-se do dissídio coletivo suscitado ex officio pelo presidente do Tribunal
Regional do Trabalho, em caso de suspensão do trabalho, conforme previsão no
nte 22 do STF: art. 856 da CLT.
As bancas examinadoras de concurso público têm considerado correto o en-
a os processos
tendimento de que o presidente do tribunal, nos termos do art. 856 da CLT, pode
instaurar, de ofício, dissídio coletivo em caso de paralisação dos trabalhos pelos
cessar e julgar
de acidente de empregados.
que ainda não No entanto, entendemos que o presidente do Tribunal Regional do Trabalho não
ão da Emenda pode suscitar, de ofício, dissídio coletivo de greve em caso de paralisação do trabalho
pelos obreiros, seja em função do princípio dispositivo (inércia da jurisdição), seja
em função da Constituição Federal de 1988 (arts. 8. 0 , III e 114, § 2. 0 ) que legitimou
apenas aos sindicatos a propositura de ações coletivas, seja em decorrência da Lei
de Greve (Lei 7.783/1989, art. 8. 0 ), a qual somente possibilitou às próprias partes e
itação, possa ao Ministério Público propor ação em caso de paralisação dos trabalhos.
nsentimento Outra exceção prevista na Consolidação das Leis do Trabalho em relação ao
princípio dispositivo está materializada no art. 39, que permite que a Delegacia

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