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Agradecimento

À Daniela de Andrade Bernardo e ao Renato Nunes, sócios do escritório


Machado Nunes Advogados, assim como aos membros de sua equipe, pelos
conselhos que têm me proporcionado sobre Direito Empresarial e, em
particular, pelas contribuições para complementar esta obra nos aspectos
referentes às responsabilidades do gestor e à judicialização trabalhista.
À Elizabeth Cerqueira Leonetti, minha ex-colega como diretora corporativa
de Gestão de Pessoas da Associação Congregação de Santa Catarina, sócia
da Adesione Gestão em Capital Humano e professora em cursos de pós-
graduação, por contribuir com os seus conhecimentos sobre gestão de gente
e por sua colaboração nesta terceira edição.
Sumário
Introdução
Capitulo 1 - Cultura empresarial como desafio para o líder
1.1 O que é cultura organizacional?
1.2 A essência de diferentes culturas empresariais: fatores
motivadores
1.3 O gestor e a missão da organização
1.4 Como preservar ou mudar uma cultura
Capitulo 2 - O fator gente
Capitulo 3 - Motor e vida dos negócios
3.1 O perfil das gerações
3.2 Os talentos e a interação de gerações
Capitulo 4 - Obstáculos na gestão de pessoas
4.1 Atitude do ceo em relação ao capital humano da empresa
4.2 Preparo inadequado dos executivos para gerir seu
pessoal
4.3 Posicionamento não estratégico e falta de valorização das
áreas de Recursos Humanos
4.4 Ausência de abordagem desse tema nas universidades
Capitulo 5 - O papel do CEO e dos gestores
5.1 O papel do CEO
5.2 O papel dos gestores
5.3 O papel do conselho de administração
Capitulo 6 - O papel do RH
6.1 Função básica da área de RH
6.2 Posicionamento na hierarquia da empresa
6.3 Atuação como parceira de negócios
6.4 Cultura empresarial
6.5 Habilidades e competências
6.6 Origem dos gestores das áreas de RH
6.7 Oportunidades de carreira
6.8 Recompensas
6.9 Resistência e paradigmas da área de RH
6.10 Posicionamento inadequado dos gestores das áreas de
RH
6.11 Um olhar ágil para gestão de pessoas
Capitulo 7 - As responsabilidades do gestor e a judicialização
trabalhista
7.1 Responsabilidade legal do gestor
7.2 Motivadores mais frequentes de processos trabalhistas
7.3 Mecanismos de prevenção e de proteção
Capitulo 8 - O plano estratégico de recursos humanos
8.1 Plano estratégico da empresa como fundamento para o
plano estratégico de RH
8.2 As preocupações do CEO com relação ao planejamento
de recursos humanos
8.3 Interação do rh com as áreas de negócios na formulação
das estratégias empresarial e de recursos humanos
8.4 Estratégia de recursos humanos e planejamento da área
de RH
8.5 Componentes essenciais de um plano estratégico de RH
Capitulo 9 - Da atração à retenção
9.1 Atração
9.2 Seleção
9.3 Integração
9.4 Avaliação
9.5 Promoção e sucessão
9.6 Remuneração
Capitulo 10 - Desenvolvimento de pessoas
10.1 Fatores críticos de sucesso
10.2 Elos do processo
10.3 Conteúdos
10.4 Diferentes gerações
10.5 Plano de carreira
10.6 Desenvolvimento de sucessores
10.7 Desenvolvimento de talentos versus não talentos
Capitulo 11 - Demissão é função do gestor, não do RH
11.1 Demissão de uma pessoa em um processo “amistoso”
11.2 Demissão de uma pessoa em um processo não amistoso
ou por justa causa
11.3 Demissão de um grupo de pessoas
11.4 O papel do rh nos processos de demissão
Capitulo 12 - Tratando gente como gente
12.1 O papel do gestor e do RH
12.2 Lidar com emoções
12.3 Estratégia e comunicação
12.4 Ambiente e ferramentas de trabalho
12.5 Lidar com situações específicas como crises e fusões
12.6 Gestão de conflitos
12.7 Reconhecimento de empenho (versus desempenho)
Capitulo 13 - Gestão de pessoas pós-Covid-19
13.1 Os novos líderes
13.2 O papel evolutivo do RH
13.3 O novo papel dos conselhos
Conclusão
Bibliografia
Introdução
A primeira edição de Gestão de pessoas não é com o RH foi lançada em
2011; seis anos depois, foi publicada a segunda edição, revisada e
enriquecida com novos temas. No projeto da segunda edição, convidei
minha lha, Luana Bernardi Bichuetti, hoje vice-presidente da Creditas
Soluções Financeiras, e então diretora global da NAB-LAB (divisão de
produtos com pouco álcool e sem álcool) da AB InBev, da qual faz parte a
Ambev no Brasil, para reescrever a obra comigo. Luana trouxe a visão das
novas gerações para a arte de gestão de pessoas por meio da valiosa
experiência como executiva e como consultora empresarial. Na presente
edição, revisamos e atualizamos temas relacionados com as novas gerações,
o papel do líder, o papel do departamento de Recursos Humanos (RH) e a
legislação trabalhista.
Contamos novamente com a colaboração da Elizabeth Cerqueira Leonetti,
minha ex-colega como diretora corporativa de Gestão de Pessoas da
Associação Congregação de Santa Catarina. E com a valiosa contribuição da
equipe do escritório Machado Nunes Advogados, cuja assistência em temas
relacionados com Direito Empresarial e Trabalhista têm sido de grande
valia para mim.
Liderei empresas de diferentes culturas e portes, que me proporcionaram
diferentes desa os. Em minha primeira experiência como líder empresarial,
assumi a Sodexo, uma empresa de serviços de alimentação, com apenas 150
colaboradores e atuei posteriormente em empresas com milhares de
colaboradores; mais recentemente com uma empresa de 40 colaboradores,
em que atuei com os seus sócios, conseguindo quase dobrar de tamanho
em três anos. Ao longo da minha trajetória interagi com empresas de
diferentes portes, negócios, origens, culturas e geogra as, como líder ou
como consultor.
Luana também possui experiências diversi cadas, tendo atuado com
empresas emergentes no Instituto Empreender Endeavor e na Leste
Venture Capital, em consultoria empresarial com a A. T. Kearney e Booz &
Co., e, atualmente, na Creditas Soluções Financeiras, a maior ntech de
crédito com garantia do Brasil.
Capital humano é o motor que dá vida às organizações. Esse tem sido nosso
principal aprendizado, vivenciando ou presenciando formas diversas de
gerir pessoas; de práticas exemplares a situações desastrosas. O sucesso
alcançado nas empresas que trabalhamos foi porque sempre tratamos gente
como ativo e porque aprendemos desde cedo que deveríamos nos cercar de
colaboradores mais competentes do que nós em suas respectivas
especialidades. Diz um provérbio chinês: “Conte-me e eu tomarei
conhecimento. Mostre-me e eu acreditarei. Envolva-me e eu me
comprometerei”. E foi seguindo esse provérbio que estruturamos equipes
comprometidas e vencedoras.
Apesar da relevância do capital humano nas organizações, com pesar vemos
que muitas empresas não estão preparadas para uma gestão e caz de
pessoas, in uenciadas por preparo inadequado dos executivos para gerir
seu pessoal; perda de hierarquia e de in uência estratégica da área de
Recursos Humanos; falta de cultura organizacional para atrair, desenvolver
e delizar gente com a atitude e o comprometimento necessários.
Adicionalmente (ou inicialmente), a grande maioria das escolas de
Administração formam pro ssionais como se um dia eles não fossem ser
líderes. E quanto abordar aspectos culturais como fator fundamental para o
sucesso de um líder? Nem pensar!
O enfoque deste livro é em aspectos comportamentais, que constituem o
componente mais importante para a gestão de Recursos Humanos. Devido
à objetividade e à praticidade, os temas aqui abordados serão de muita
utilidade para todos os leitores que se preocupam em melhorar seu
desempenho como líderes.
Este livro destina-se a executivos que têm ou terão a tarefa de gerir pessoas
e aos pro ssionais de Recursos Humanos, responsáveis por suprir suas
empresas e seus colegas com as orientações e as ferramentas necessárias
para a gestão desses recursos. Dedica-se também aos estudantes, aos quais
poderão um dia ser responsáveis pela supervisão de pessoas. E,
seguramente, aos CEOs (Chief Executive O cer) – presidente, diretor
geral, diretor superintendente, gerente geral, en m, o líder de uma
organização –, que necessitam se aprimorar no tratamento de seus
colaboradores.
Os temas aqui abordados são aplicáveis a empresas de qualquer porte ou
natureza, devidamente adaptados às suas características e disponibilidade
de recursos.
José Luiz Bichuetti
Capítulo 1

Cultura empresarial como desafio


para o líder
A primeira edição deste livro abordou de forma difusa os aspectos culturais
nas organizações. Decidi incluir nesta terceira edição uma parte dedicada a
esse tema devido à crescente relevância que ele assume em um mundo
empresarial cada vez mais diversi cado e complexo. Escolhi iniciar esta
edição com o capítulo “Cultura empresarial como desa o para o líder”,
porque saber estruturar equipes, engajá-las e motivá-las em situações
culturais distintas é fator preponderante para que o líder desempenhe com
e cácia suas responsabilidades e obtenha os resultados que a empresa
espera dele.
Cada empresa tem suas peculiaridades, sua própria cultura. Em cada uma o
líder tem a necessidade de se adaptar a diferentes arquiteturas de gestão.
Mesmo sendo o principal executivo, com possibilidade de manter, fazer
evoluir ou mesmo criar nova cultura na empresa, há sempre uma diretriz
maior a ser seguida: o modelo estabelecido pela matriz de uma
multinacional ou o estilo estabelecido pelo dono ou fundador de uma
empresa familiar. Portanto, engajar-se na compreensão da cultura é pré-
requisito para uma gestão e caz.
Um líder, mesmo quando se preocupa com o lado humano, com o bem-
estar de seus colaboradores e com a satisfação de clientes e outros
stakeholders (partes interessadas na organização), e empolga-se com o
desa o de conduzir um processo de gestão de mudança tem, por via de
regra, o objetivo de trazer retorno ao acionista e, portanto, gerar resultados
nanceiros. E ele só faz isso por meio de pessoas – competentes em cada
uma de suas posições, envolvidas, engajadas, motivadas e gostando do que
fazem.
No entanto, há organizações – não governamentais, sem ns lucrativos,
lantrópicas, entidades de classe e assemelhadas – em que o resultado
nanceiro não é o objetivo principal, mas sim prestar serviços à
comunidade, categorias pro ssionais, grupos com interesses convergentes
de natureza cultural, social, ambiental, assistencial. Nessas, a preocupação
com o resultado existe, sem dúvida e tem, sim, o lado nanceiro, seja ele
por geração própria de recursos ou contribuições. Contudo, prevalece a
missão da entidade, razão principal de sua existência, que pode ser recém-
criada ou secular; e, nessas entidades, missão e gestão estão juntas em
direção a um propósito, que não é nanceiro. Essas organizações só
conseguem sucesso, e com muito mais ênfase, por meio de pessoas que
aderem à causa da entidade.
No desa o de conduzir uma organização, o líder tem de constituir,
desenvolver, motivar e reter equipes formadas por pessoas que acreditam
nele e no propósito da organização. Ele tem de assumir um papel de
modelo para seus subordinados, como trataremos adiante neste livro.
Antes disso, porém, o líder tem de entender, absorver e incorporar a
cultura, o DNA, e os valores da organização, fazendo-os permearem e
serem incorporados por todos os colaboradores. Se assim não o zer, a
dedicação, o empenho na formação de equipes, o desenvolvimento do
trabalho e toda a experiência acumulada ao longo da carreira, que
poderiam servir para alavancar a evolução da organização que ele lidera,
caem por terra. Resumo, a seguir, quatro aspectos que o líder precisa
entender e praticar:

O que é cultura organizacional?


A essência de diferentes culturas.
O gestor e a missão da organização.
Como preservar ou mudar uma cultura?

1.1 O que é cultura organizacional?


Imaginem duas fábricas de bicicletas de passeio, concorrentes entre si,
situadas na mesma rua, uma defronte à outra. Fundadas e pertencentes a
empresários de diferentes origens: um árabe e o outro judeu. Os produtos,
as linhas de produção e as quali cações técnicas dos empregados serão
semelhantes, com pequenas diferenças. O modo como essas empresas são
dirigidas, o per l pessoal dos gestores, as práticas gerenciais e a forma de
abordar o mercado serão seguramente diferentes. Essas empresas possuem
culturas organizacionais diferentes!
É difícil de nir algo abstrato, mas vamos tentar traduzi-lo de forma prática.
Edgar Schein é um PhD em Psicologia social pela Universidade de Harvard
e contribuiu de forma expressiva para a ciência do desenvolvimento
organizacional. Em seu livro Cultura Organizacional e Liderança ele de ne
três níveis de cultura:

Artefatos: são entendidos como estruturas e processos


organizacionais visíveis. Em uma empresa, esses podem ser
representados por estilos de nidos de: vestimentas, arquitetura
do escritório, móveis, decoração.
Crenças, normas e valores: são os princípios compartilhados por
um grupo e as normas declaradas dentro da organização, as quais
são criadas pelos empregadores ou dirigentes ou entre esses e
seus subordinados. São regras, escritas ou não, que permitem com
que os membros saibam o que é esperado deles em sua trajetória
na organização.
Pressupostos: são os sentimentos que alguém assume como se
fossem verdadeiros, ou seja, comportamentos e crenças
enraizados na mente e na programação dos indivíduos, muitas
vezes, de forma inconsciente. Constituem a essência da cultura e,
geralmente, são tão absorvidos na organização que chegam a ser
difíceis de ser identi cados. Para muitos, é necessário “viver” a
organização por muito tempo para chegar a entendê-los e
incorporá-los.
Em seu livro, Schein também defende que, na prática, cultura
organizacional é um conjunto de crenças, valores e práticas disseminados
pela organização, adotados e praticados por seus participantes, e que
caracterizam os comportamentos dos indivíduos no dia a dia, no contato
com colegas, clientes, fornecedores e outras partes interessadas. Pode ser
representada na gura a seguir.

Figura 1.1 – Cultura visível e invisível

Fonte: Schein (2009).

Também destaco estes trechos de Schein, extraídos de seu livro:

“Cultura representa para grupos e organizações o mesmo que caráter para indivíduos.”

“Cultura é a aprendizagem acumulada e compartilhada por determinado grupo, cobrindo


os elementos comportamentais, emocionais e cognitivos do funcionamento psicológico
de seus membros.”
Muitas empresas procuram expressar suas características culturais por meio
de missão e valores bem elaborados. Entretanto, grande maioria os têm
somente pendurados nas paredes ou nos manuais internos de orientação a
colaboradores. Aquelas empresas que possuem forte cultura e prezam por
ela, podem ter missão e valores também nas paredes, mas as pessoas os
carregam no coração; faz parte do comportamento diário das pessoas, que
vivenciam, praticam e empenham-se em disseminar o que está escrito.
Na Ambev, braço brasileiro da AB InBev, líder mundial na produção de
cervejas, a cultura é ressaltada em dez princípios, que são disseminados
pela companhia e orientam como todos os colaboradores, independente do
nível ou função, devem atuar. A Bridgewater é um dos mais expressivos
hedge funds mundiais (empresa dedicada à gestão de investimentos) e seu
fundador, Ray Dalio, escreveu um manual intitulado “Princípios”, que
explica e comunica como a organização deve se comportar.
A cultura organizacional orienta também o tipo de talento que as
companhias buscam, visando criar uma comunidade de pessoas que não
apenas se comportam da maneira como a organização espera, mas que
também dividem entre si esses valores para assegurar que o ambiente
criado seja saudável e que elas estão “vivendo” a cultura porque acreditam
nela e não apenas porque a organização determina. Isso assegura a
longevidade da organização, de modo que ela passa a viver além dos
fundadores. Na Ambev, por exemplo, o enquadramento cultural é
extremamente importante – a organização olha para isso e não apenas para
conhecimento ou potencial funcional.
Quando o gestor forma suas equipes com pessoas que se identi cam com a
cultura da organização e a incorporam ao seu comportamento, a e cácia do
trabalho em equipe e os resultados obtidos serão seguramente
diferenciados. Os colaboradores estarão mais confortáveis em seus
ambientes de trabalho, mais motivados, engajados e colaborativos.
As características culturais de uma empresa devem ser observadas quando
tratamos de gestão no seu sentido mais amplo, e não só de pessoas. A não
observância aos artefatos, aos valores e às crenças na de nição de planos,
políticas, práticas e modelos de comunicação podem trazer respostas que
não traduzam o que podemos chamar de DNA da instituição. Na Biologia,
DNA é a marca genética única de cada indivíduo e nas organizações é
representado por sua cultura. Esse DNA, na maioria das organizações, tem
origem em sua fundação e habitualmente é passado de geração a geração.
Portanto, quando você estiver no papel de gestor, invista tempo na “leitura”
da realidade organizacional e de seus elementos culturais, como ela de ne
sua missão e os valores que a suportam. Não subestime essa leitura; ela é
complexa e laboriosa, mas fundamental para uma liderança mobilizadora.
Exige dedicação, tempo, exercício sensorial e paciência.

1.2 A essência de diferentes culturas


empresariais: fatores motivadores
A leitura de uma cultura organizacional e de seus valores pode ser
amparada pela Tipologia Cultural, proposta por Kim Cameron e Robert
Quinn, estudiosos da gestão empresarial e do comportamento
organizacional e, professores da Universidade de Michigan e de outras
instituições de ensino americanas, que propõe quatro tipos de cultura:

Clã: orientada para os relacionamentos e gestão participativa. É


comum nas empresas familiares ou com forte in uência do
fundador, ou organizações criadas e desenvolvidas por entidades
confessionais (criadas por organizações de origem religiosa).
Mercado: típica de empresas que competem em diferentes
segmentos da economia, orientadas preponderantemente pelos
resultados. Por exemplo: empresas nanceiras (Banco Itaú, XP
Investimentos), alimentos (Carrefour, Pão de Açúcar), bebidas
(Ambev, Coca-Cola), e tantas outras em diferentes setores.
Inovativa ou Adhocrática: dirigida para mudança, inovação,
criatividade. Aqui temos empresas fortemente ligadas à
tecnologia, como Facebook, Google, Apple. Encaixam-se aqui
também as empresas de consultoria, nas quais, apesar de voltadas
para o mercado, a natureza do trabalho é fortemente criativa; os
consultores, porém, necessitam saber navegar entre elementos de
diferentes culturas, pois seus clientes possuem diferentes origens.
Hierárquica: orientada para processos, segurança e ordem.
Ambientes extremamente formais, como órgãos governamentais,
organizações militares, empresas altamente técnicas (NASA).

Existem outras de nições quanto aos tipos de cultura, porém, essas quatro
podem apoiar os líderes na de nição de estratégias de gestão e
principalmente de engajamento de pessoas. Uma organização pode ter dois
tipos de cultura, das quais uma é dominante.
O que leva uma pessoa a escolher uma ou outra dessas organizações para
trabalhar?
A resposta mais simples deve responder a outra questão: qual é o seu
motivador de carreira?
Carreiras são motivadas por uma causa ou propósito de vida, por
recompensa nanceira, status, por qualidade de vida, desa os e outros
fatores. Esse motivador deve ser considerado em qualquer tipo de cultura,
mas nem todas podem oferecer o resultado esperado para sua gestão e caz.
Tendo como base duas organizações que possuem culturas bem
divergentes, como Clã e Mercado, podemos identi car claras diferenças,
como veremos a seguir.

Na cultura Clã:

As relações de con ança de nem o grau de amplitude na atuação


pro ssional.
Mudanças são incrementais, precisam de tempo para debate e
absorção, e pedem práticas muito participativas.
Em muitas organizações tipicamente familiares o retorno para o
acionista é perseguido, mas há outros fatores que os dirigentes,
membros da família, levam em consideração, como equilíbrio
familiar, geração de oportunidades de emprego em sua região,
manutenção de um clima familiar dentro da empresa. Nesta
cultura, há uma tendência ao “paternalismo”, quando muitos
pro ssionais com mau desempenho são mantidos na organização
porque fazem parte da “família” e têm a con ança pessoal dos
donos ou dirigentes superiores.
Remuneração é importante, mas talvez não seja o principal
motivador.
As pessoas podem optar por trabalhar em uma organização com
cultura Clã porque gostam desse ambiente mais familiar e
sentem-se mais contributivas e menos pressionadas.
Há alguns anos, auxiliei um CEO de uma multinacional em um
processo de coaching, que não se sentia muito satisfeito com o seu
emprego. Era um executivo com uma carreira de sucesso, movido
a desa os e resultados, que já havia passado por quatro outras
empresas, sendo duas nacionais, de origem familiar, e duas
multinacionais. Durante o processo, descobrimos que em todas
elas havia o desa o de atingir resultados, mas nas multinacionais
a pressão era muito maior e, para ele, até sufocante. Ele já estava
conversando com consultorias de seleção de executivos,
pensando em mudar de cadeira, quando, à luz do que
descobrimos, ele mudou de foco e foi buscar uma oportunidade
em empresas nacionais de origem familiar. E foi em uma dessas
que ele encontrou um novo caminho, muita realização e alegria
pessoal; era uma empresa que tinha resultados como objetivo,
mas um ambiente cultural mais leve.

Na cultura de Mercado:

A capacidade de entrega de resultados e a postura competitiva e


agressiva de nem o grau de amplitude na atuação pro ssional.
As mudanças são rápidas e, às vezes, radicais e pedem práticas
menos participativas.
O objetivo do acionista, que se transfere para os dirigentes, é a
maximização do resultado, do retorno ao investimento.
Nesta cultura, além da realização pessoal de poder fazer algo que
gosta, o pro ssional é motivado pelo desa o de ultrapassar
barreiras e de superar os resultados que lhe são colocados como
objetivo.
Nestas organizações existe claramente o conceito de “premiação”
e de “punição”. São premiados aqueles que obtiveram melhor
desempenho, com boni cações e incrementos de remuneração,
incentivos, participação em eventos exclusivos, promoções; são
punidos aqueles que tiveram pior desempenho, com crescimento
mais vagaroso, menores incrementos salariais e até o
desligamento.
Na Compass, empresa na qual trabalhei como vice-presidente de
Desenvolvimento de Negócios para a América Latina, havia, a
nível das Américas, uma prática válida para as equipes de vendas:
os 25% melhores vendedores eram premiados com um nal de
semana em um local paradisíaco, com acompanhante, em um
evento anual, despesas pagas e verba extra para gastos locais. Ser
convidado a participar desse evento tornou-se uma questão de
honra e a disputa para estar nesse grupo privilegiado era ferrenha
durante o ano para se conseguir os melhores contratos. Os 15%
que apresentassem pior desempenho eram convidados a se retirar
da empresa, exceto se houvessem justi cativas aceitáveis para
seus maus resultados.
Na Ambev, um sistema de metas individuais e compartilhadas
cria incentivos de desempenho individuais e para sua participação
em projetos que envolvem diferentes áreas; sem colaborações
intra e entre funções, o sucesso não é atingido. O colaborador é
reconhecido e recompensado por seu desempenho individual e
pelo desempenho da organização como um todo.
Passar de uma cultura de Mercado para uma cultura Clã não é fácil, requer
uma mudança de modelo mental e o estresse pelo qual o pro ssional passa
não é pequeno. Mesmo convicto de que quer ingressar em uma organização
que possui uma cultura diferente daquela nas quais trabalhou e desejando
dedicar-se a uma causa diametralmente oposta, o processo de adaptação
requer muita paciência, abnegação, ponderação sobre o quê e como fazer as
coisas.
Passei por essa experiência quando assumi a direção geral da Coel,
ocupando a sala do fundador e sentando na cadeira dele enquanto ele se
mudava para uma sala na área de Engenharia industrial, dizendo que a
partir daquele momento ele apenas se dedicaria à concepção de novos
produtos (depois de 40 anos na direção da empresa!). Experiência
semelhante, em outras dimensões, também vivenciei quando assumi como
superintendente e CEO da Associação Congregação de Santa Catarina,
reportando-me à presidente do Conselho de Administração, uma das Irmãs
de Santa Catarina, que havia conduzido com mão rme e com muito
sucesso os rumos da associação por mais de 20 anos.
Em qualquer uma dessas culturas, porém, é necessário amar o que se faz.
Seja lutar pela causa, seja lutar por mais vendas ou por um bônus mais
robusto. Nas duas é necessário haver um lado humano e o estímulo para
inovar, para empreender.

1.3 O gestor e a missão da organização


As empresas em geral possuem uma missão, quer seja ela explícita ou não.
Mesmo quando explícita, ela pode não representar o desejo de seus
acionistas, que podem ter objetivos diferentes. Em qualquer uma dessas
situações é fundamental que o gestor se dedique a entender a cultura e a
missão da organização para a qual trabalha. Sem esse entendimento ele não
conseguirá mobilizar as pessoas a ele subordinadas na busca de resultados –
seja o resultado uma causa, seja o retorno nanceiro.
A missão re ete muito dedignamente a cultura. A missão é a razão de ser
da empresa, o seu negócio; de ne quem ela é ou o que quer ser e orienta
para onde deve ser dirigido o empenho dos dirigentes e colaboradores. A
missão é complementada pelos valores da organização e inspira as pessoas a
lutar por um objetivo comum, pois proporcionam um horizonte a ser
alcançado. A missão de ne a razão de ser e os valores guiam os
comportamentos dos indivíduos para o cumprimento da missão.
Nesse cenário, qual é a entrega esperada pelo gestor? A sua principal
responsabilidade é proporcionar que os acionistas ou mantenedores
consigam realizar seus objetivos, sejam eles aliados a uma causa ou a um
retorno ao investimento. Para cumprir com essa responsabilidade ele
precisa de gente; e para ter as pessoas certas, no lugar certo, no momento
certo, trabalhando motivadas, empenhadas e de forma colaborativa, ele
necessita entender e incorporar a missão e os valores da organização. Com
isso, o líder terá maior probabilidade de sucesso na formação de suas
equipes e na distribuição das responsabilidades, assim como na seleção e
contratação de novos colaboradores alinhados aos valores preconizados. Ele
também conseguirá aliados na empresa, pois estarão todos lutando por um
só objetivo.
Para estar de acordo com os valores da organização, o gestor terá também
de saber comunicar-se com sua equipe e com seus pares, assim como
deverá dispor de tempo para planejar suas atividades e de seus liderados,
observar comportamentos e orientar correções de rumos, seja das
atividades, seja dos comportamentos. Quando existe alinhamento e
transparência na conduta dos gestores com a missão e os valores da
empresa, as equipes trabalham de forma mais coesa e colaborativa,
superando com maior facilidade os obstáculos que se apresentam interna e
externamente; senão a tendência é a dispersão de esforços e maior
di culdade em obter resultados e cumprir com os objetivos estabelecidos.

1.4 Como preservar ou mudar uma cultura


O sucesso duradouro de uma organização está intimamente ligado à
perpetuidade de sua cultura, que, por sua vez, depende do cumprimento
de sua missão e de seus valores. São alguns condicionantes para isso:

Determinação dos acionistas ou mantenedores e dirigentes


superiores para manter vivo o DNA da organização,
empenhando-se cotidianamente para que a missão e os valores
sejam observados, impregnados nas pessoas e perseguidos
incansavelmente. Certi car-se de que esses não estão somente
nas paredes e nos manuais, mas permeados por toda a
organização.
Prática incessante desses valores pelos líderes, servindo como
exemplo para seus liderados e para todas as pessoas que com eles
se relacionam.
Atração, seleção e retenção de colaboradores que trazem esses
valores no seu íntimo; valorização daqueles que se destacam e
passam também a servir de exemplo para os demais.
Desenvolvimento organizacional por meio de práticas de gestão
de clima, desenvolvimento de pessoas e gestão participativa em
projetos estratégicos e de mudança.
Comunicação estruturada e sistemática da razão de ser e dos
valores da instituição, desde o ingresso dos novos colaboradores
até a reciclagem continuada dos veteranos.
Um departamento de Recursos Humanos ativo e proativo no
apoio aos gestores para a seleção adequada de pessoas, processo
de integração, capacitação e tomada de decisão para
reconhecimento, promoção ou dispensa de colaboradores com
base nos valores.

Uma organização pode, ao longo de sua história, sentir a necessidade de


mudar sua cultura. Seja porque o meio ambiente mudou e exige essa
evolução, seja porque ela passa a sofrer a in uência de outra organização
que a ela se associou ou a incorporou. Neste caso, todos os acionistas ou
mantenedores e dirigentes envolvidos devem entender seus papéis na
manutenção ou na mudança da cultura.

Uma cultura pode ser mudada, mas com cuidado.


O processo de mudança tem de ser gradual e muito bem
planejado. Nesse planejamento deve ser destacado o que será
feito e o que não deverá ser feito.
O processo de comunicação sobre os objetivos e os passos dessa
evolução devem ser transparente e contínuo, mantendo todos os
colaboradores informados para tê-los sempre engajados.
Um processo de mudança muito rápido pode ser desastroso, pois
violenta a cultura e as consequências serão penosas.
Uma cultura também necessita de investimento para que se
mantenha viva e deve ser revitalizada na prática de ritos e de
atividades de desenvolvimento organizacional.
E, como diz o ditado popular: cautela e canja de galinha não
fazem mal a ninguém!

Para nalizar o tema cultura, reproduzo aqui uma regra seguida por Jack
Welch, um ícone na história empresarial do século 20. Ele foi presidente da
General Electric (GE) por 20 anos e levou a empresa da beira da falência
para o status de uma das empresas mais lucrativas e admiradas do mundo.
Foi na GE, sob sua liderança, onde surgiu também o conceito moderno de
planejamento estratégico e de gestão de portfólio de negócios. Sobre a
aderência de pro ssionais aos valores da GE e sobre quando demitir ou
desenvolver, Jack Welch dizia que há quatro tipos de gestores para os quais
ele aplicava um princípio muito claro:

Traz resultados, adere aos valores da empresa e tem um


comportamento convergente com eles: mantenha-o e use-o como
exemplo para os demais.
Não produz resultados e não adere aos valores: desligue-o.
Não traz resultados, mas tem o comportamento e os valores
desejados: dê-lhe uma chance, porque você quer gente que tenha
seus valores, tão importantes para seu sucesso. Mude-o de
ambiente, avalie-o para ver se pode ser produtivo em outra área.
Dê-lhe mais uma chance.
Traz resultados, mas não tem o comportamento ou os valores. Em
uma avaliação você lhe diz: “Ou muda rapidamente ou vai
embora”. Você pode até pensar: seria uma pena perder essa
pessoa, pois está indo tão bem e trazendo resultados; vou dar-lhe
mais três meses. Enquanto isso, seus colaboradores podem
pensar: “Espere aí, nosso chefe está dizendo tudo isso sobre
valores, mas esse colega não tem nenhum deles e a conduta dele
na empresa é inconveniente”. Demita-o e informe à organização
de forma clara que ele está saindo porque não tinha os valores ou
seu comportamento era indesejado. Poderia ser íntegro e trazer
resultados, mas não queria jogar com as regras da empresa, as
regras comportamentais que fazem de nossa empresa um sucesso.
Capítulo 2

O fator gente
Basta um rápido olhar pela história para constatar a importância atribuída
às ferramentas, ao maquinário, à localização, à planta, ao investimento
necessário à abertura e à expansão das empresas, entre outros itens dos
quais proprietários e administradores costumam se ocupar desde sempre.
Pouca atenção, porém, geralmente era concedida ao fator principal do êxito
ou do fracasso de um negócio: os funcionários.
Atualmente, o panorama mudou muito. Diferentemente do que acontecia
com os artesãos do mundo antigo, com as corporações de ofício, com as
indústrias nascidas durante a Revolução Industrial e depois dela, não
lidamos apenas com mercados locais nem com uma internacionalização
demorada, dependente de contatos e de meios de transporte lentos.
A Tecnologia da Informação avançou exponencialmente e coloca sobre as
organizações uma pressão constante para sua atualização; e essa pressão
recai sobre os gestores, demandando que eles estejam no estado da arte de
seu conhecimento, sob o risco de serem passados para trás se não o zerem.
A rede internacional on-line oferece as facilidades das encomendas em
tempo real e exige entrega pontual, sob o risco da perda de clientes e de
negócios.
A concorrência aumentou muito, os recursos tecnológicos e operacionais
espalharam-se por várias partes do mundo e hoje há grande número de
companhias capazes de atender às expectativas de um mercado cada vez
mais exigente. Qualidade de produtos e serviços, excelência no
atendimento, cumprimento de prazos, facilidade nas trocas são fatores que
podem alçar uma empresa ao ápice – ou destruí-la.
À frente de cada um desses (e de outros) fatores fundamentais para o
sucesso dos negócios estão as pessoas. São elas que operam máquinas, que
saem a campo para tarefas como manutenção e vendas, que leem e
respondem mensagens eletrônicas, que atendem telefonemas de
fornecedores e clientes, que estão em contato diário com toda a rede de
interesses de uma companhia. Elas podem dar conta dos afazeres de
maneira burocrática, apenas cumprindo o horário de trabalho, ou podem
fazer esse horário render, vivenciando um entusiasmo capaz de melhorar
continuamente produtos, serviços, atendimentos, métodos de trabalho.
Somos indivíduos criativos, mas para que nossa criatividade venha à tona, é
preciso estimulá-la. Funcionários cansados, desmotivados, injustiçados,
submetidos a gestores mal-humorados, sem expectativa de crescimento
dentro da empresa, que sofrem assédio moral e/ou sexual e, muitas vezes,
com direitos trabalhistas desrespeitados, não criam – simplesmente
cumprem o ritual diário, consultando o relógio com frequência e esperando
que os minutos passem mais rapidamente. Cada ação, cada movimento é
encarado como um sacrifício, necessário apenas porque por meio dele virá o
dinheiro que pagará as contas do mês.
Imagine-se em um cenário assim. Você despenderia energia além do
necessário por essa empresa que o obriga a passar a maior parte da vida
nessa situação? Uma empresa que, em vez de ajudar a desenvolver o
potencial criativo de cada funcionário, permite ou encoraja sua
subordinação a che as autoritárias ou incapazes e os encara apenas como
um item na folha de despesas mensais?
Claro que você não gostaria de ser submetido a um clima pro ssional assim.
Ninguém gostaria. Por isso, nos últimos tempos várias empresas têm
procurado oferecer aos funcionários um ambiente saudável, agradável,
estimulante. Facilitam a aquisição de conhecimento, encorajando a
retomada aos estudos e a formação continuada. Proporcionam benefícios
que vão muito além do vale-transporte e do vale-alimentação. Estabelecem
planos de carreira, promoções por mérito. E, mês a mês, colhem os frutos
dessa política. O segredo é muito simples: basta tratar as pessoas como...
pessoas, com sentimentos, desejos, necessidades, projetos, sensibilidade,
criatividade, talento.
Infelizmente, porém, ainda existem muitas empresas que não sabem quem
são os reais responsáveis pela gestão de seu capital humano, além de tratá-
lo como custo e não como ativo. O sucesso dessas é parcial e efêmero
porque não sabem gerir esse ativo. No fundo, essas empresas, assim como
grande parte dos executivos, não estão preparadas para uma gestão e caz
de pessoas.
Os motivos são variados, e entre os principais estão a incapacidade que
certas lideranças têm de encarar seu capital humano como ativo; o preparo
inadequado dos executivos para gerir seu pessoal; a perda de hierarquia e
de in uência estratégica das áreas de Recursos Humanos e a falta de
cultura organizacional para atrair, desenvolver e delizar gente com a
atitude e o comprometimento necessários para os negócios.
Um dos pontos nevrálgicos está nos cursos de graduação. Os de
Administração, por exemplo, costumam abordar a gestão de recursos
humanos super cialmente, sem a ênfase e a praticidade que a área exige.
Formam-se líderes sem ensiná-los a gerir sua gente. Os de Psicologia, de
onde sai a maioria dos pro ssionais que trabalhará em Recursos Humanos,
não tratam o tema de maneira prática nem aprofundam o conhecimento do
processo e das responsabilidades pela gestão de pessoas. Em geral, limitam-
se a aspectos comportamentais e psicológicos. As demais escolas apresentam
problemas semelhantes.
É comum ouvir dos gestores e dos CEOs que faltam talentos no mercado de
trabalho. Talvez, mas é preciso admitir que faltam também competências,
dentro das organizações, para uma gestão de pessoas realmente e caz e
produtiva. Precisamos nos lembrar, sempre, de que quem move e dá vida às
organizações é o seu pessoal. É ele o propulsor dos negócios. Com essa
verdade em mente, torna-se mais fácil procurar métodos e procedimentos
capazes de valorizar as pessoas e calibrar de modo apropriado esse
propulsor.
Capítulo 3

Motor e vida dos negócios


CEOs, executivos, talentos, geração X, baby boomers, equipes de alto
desempenho, funcionários... todos eles, sem exceção, pertencem a uma
única categoria: GENTE. E, sabemos que é o fator que move as empresas.
Gente, no nosso caso, signi ca todo indivíduo que trabalha na organização
ou que é fornecedor dessa. Um telefonema mal atendido, uma
recepcionista de mau humor, uma acolhida indevida, um porteiro a quem
falta gentileza comprometem a imagem da empresa.
“Gente” são os recursos humanos que muitos chamam de talentos. São eles
o motor que impulsiona as empresas. Independentemente de condições
socioeconômicas, de níveis de quociente de inteligência, com pós-
doutorado ou sem diploma universitário, cada indivíduo tem suas
competências, adequadas ao desempenho de suas atividades e
responsabilidades.
Não podemos esquecer que “gente” são seres humanos, unitários,
individuais, e muitas vezes, individualistas. É necessário ter, em cada
posição – nas lideranças ou no chão de fábrica –, pessoas com per l
adequado a cada função. É preciso capacitá-las e motivá-las a exercer suas
atividades com comprometimento e alto desempenho, sozinhas ou em
equipe. E quem é o responsável por isso? O líder da organização!
Em uma empresa, assim como em uma orquestra, o maestro é quem dita o
ritmo. Para que a empresa seja bem-sucedida não basta a vontade dos
acionistas ou a disposição dos colaboradores, se não houver um líder
máximo com o per l apropriado ao momento pelo qual a organização
passa, com a competência necessária para liderar o processo de
desenvolvimento de sua estratégia e para guiá-la ao sucesso, todo esforço
por parte da equipe terá resultados reduzidos.
Quando terminei meu MBA nos Estados Unidos, nos anos 1970, retornei
ao Brasil e me candidatei a algumas posições. Uma delas foi em uma
empresa de telefonia, hoje não mais existente. Em uma primeira visita, para
a entrevista com o presidente, fui abandonado em pé por mais de meia
hora em um cubículo, sem comunicação nem água. Tive vontade de
desistir, mas, como recém-chegado ao país, resolvi esperar. Depois da
entrevista decidi dar continuidade ao processo. Desisti na segunda visita,
quando o porteiro tentou falar, pelo interfone – cuja marca era da própria
empresa –, com a secretária do presidente. Depois de frustradas tentativas,
jogou com raiva o fone no gancho e disse em voz alta, para quem quisesse
ouvir: “Porcaria de telecomunicações!”.

3.1 O perfil das gerações


Funções distintas podem requerer per s distintos. Indivíduos de diferentes
gerações podem necessitar de aspectos motivacionais diferentes. Por essa
razão surgiram estudos sobre as gerações (generation mix), que propõem a
classi cação das pessoas em cinco categorias: veteranos, baby boomers,
geração X, geração Y e geração Z. Cada geração recebeu uma in uência
marcante da época em que viveu ou em que vive. Cada um de nós está
enquadrado em uma delas. Vamos conhecer suas principais características.

Veteranos

Nascidos antes de 1946, hoje acima dos 60 anos de idade. Vários ainda
estão ativos, mas a geração como um todo se encontra em fase de extinção
como membro dos quadros pro ssionais das organizações. Caracterizam-se
pela lealdade à empresa, pelos hábitos arraigados, pelo autoritarismo.

Baby boomers

Pessoas nascidas entre 1946 e 1964. Geração ativa em grande parte das
empresas, com exceção talvez daquelas voltadas para tecnologia, nas quais
dominam as gerações mais novas. Os baby boomers caracterizam-se por sua
disposição ao trabalho, pela gestão democrática, pela busca de segurança no
trabalho, pela atividade em equipe e pela lealdade à empresa.

Geração X

Indivíduos nascidos entre 1965 e 1979. São autossu cientes, menos


apegados à empresa, sua ligação ao trabalho dá-se, sobretudo, por meio de
amizades. Gostam de trabalho exível e de autonomia. São pouco hábeis do
ponto de vista político.

Geração Y

Pessoas nascidas depois de 1979. Pouco estáveis, gostam de tarefas


desa adoras e não se sentem estimuladas pelas atividades rotineiras. Têm
baixa aderência a regras, são pouco leais à empresa e muito informadas no
uso de tecnologia com base na informática.

Geração Z ou Milênio

Já está ativa no mercado de trabalho. Essa geração nasceu cercada de


tecnologia e em um mundo em que a informação é mais difundida. É uma
geração mais tolerante à diversidade, mais cautelosa, mais consciente sobre
o meio ambiente, menos propensa a aceitar guras de autoridade e com
convicções maiores sobre seu próprio ideal como verdade absoluta.
Apresentam também as seguintes características: fazem menos reuniões
presenciais, há predominância de chamadas de vídeo; leem menos jornais e
passam mais tempo em jogos que simulam a realidade; tendem a ser um
pouco menos resilientes por terem sido educadas de modo mais protegido
do que gerações anteriores, as quais tiveram modelos educacionais mais
abertos a situações de adversidades.
Compare, no quadro a seguir, as principais características das quatro
principais gerações que atuam no mercado de trabalho.

Quadro 3.1 – Características das 4 gerações atuantes no mercado de trabalho


Gerações Tradicionais Baby boomers Geração X Geração Y
Nascimento (1922-1945) (1946-1964) (1965-1979) (1980-2000)

Respeito pela Não se deixa Respeito pela


Desafia a
autoridade e pelo impressionar pela autoridade que
autoridade
Relação sistema autoridade demonstrar
hierárquico Gosta de competência
com Competências e
sistema
autoridade Senioridade e habilidades são Ensina seus
horizontal e
cargos são mais respeitadas superiores a usar
democrático
respeitados que a idade tecnologia

Leal à
Leal à equipe
organização Leal ao gestor Leal aos colegas e
Vive para o não à organização
Cumpre seus Trabalha para viver
trabalho
Relação compromissos Carreira = uma Trabalha para
Carreira = mérito contribuir
com a Escala a parte de mim
próprio
organização hierarquia Espera que a Carreira =
corporativa Deseja oportunidade para
empresa faça algo
estabilidade do agregar valor
Carreira = por ele
trabalho
oportunidade

Relacionamento
Formal Colegas são
casual e social
Relação Em face de um Relacionamentos amigos
pessoais Gosta de debater e
com conflito, a Solução de
desafiar um ao outro
colegas autoridade é Evita conflitos conflitos por meio
para obter
determinante do diálogo
compromisso

Quebra as
regras Enfoque nos Foco nas soluções
Trabalha duro resultados
Trabalha em mais rápidas
Estilo de Foco no equipe Muda as regras usando tecnologia
trabalho processo e nas
Foco nas Trabalha com Estilo de trabalho
regras
pessoas e não autonomia fluído
nos números
Gerações Tradicionais Baby boomers Geração X Geração Y
Nascimento (1922-1945) (1946-1964) (1965-1979) (1980-2000)

Comanda e Justo, objetivo


Participativo
Estilo de controla Personalista
Decisão por Flexível
gestão Demanda Diz o que pensa
consenso Honesto
respeito

Fonte: The Generational Divide, Virginia Galt (2004).


3.2 Os talentos e a interação de gerações

Os negócios enfrentam hoje desa os permanentes, com mutações


constantes no ambiente e com grande diversidade dentro de um mesmo
segmento. A globalização e as demandas evolutivas dos clientes levam as
empresas a se reinventar com maior frequência do que ocorria há uma ou
duas décadas. Isso exige que suas equipes sejam compostas por pessoas com
capacidades diferentes – só assim é possível enfrentar essa diversidade.
Nesse aspecto, cada geração exerce um papel dentro da organização. E
compete aos gestores saber formar equipes harmoniosas, homogêneas ou
diversi cadas, segundo as exigências do negócio.
A mescla equilibrada de pessoal mais antigo com pessoal mais jovem é uma
necessidade. Os seniores possuem uma experiência acumulada que deve ser
transmitida aos mais novos; estes, por sua vez, possuem habilidades e
conhecimentos – como o domínio da tecnologia da informação – que
podem passar aos mais velhos. É um desa o juntar essas gerações com
estilos tão diferentes. É impossível criar convergência se um pro ssional
sênior não entender um jovem nem se dispuser a colaborar com ele. E vice-
versa. Os jovens, por exemplo, conseguem falar ao celular, enviar
mensagens, ouvir música, publicar fotos e textos e trabalhar em uma
planilha ao mesmo tempo. E com produtividade. Seriam talentos, todos
eles?
Mencionei no início deste capítulo que gente são os talentos que movem as
organizações. Segundo Arthur Schopenhauer, lósofo alemão do século 19,
“os talentos atingem metas que ninguém mais pode atingir. Os gênios
atingem metas que ninguém jamais conseguirá ver”. As empresas tendem a
interpretar equivocadamente o termo “talento”, descrevendo-o como uma
pessoa com capacidade intelectual diferenciada. O setor de pesquisa e
desenvolvimento, por exemplo, necessita de um líder que seja um talento
em tecnologia avançada para seu ramo de negócio. Uma empresa de
mudanças necessitará de trabalhadores com talento para transportar um
piano sem desa ná-lo. O primeiro, seguramente, terá um grau de educação
mais avançado que o segundo, mas um não terá competência para fazer o
trabalho do outro. Ambos são talentos necessários em seu negócio.
Talento é, portanto, a pessoa que fará a diferença para que sua empresa
ocupe uma posição destacada no mercado. Não é porque fez um MBA ou
porque domina diversos idiomas que pode ser considerada um talento. Só
merecerá esse título quando se agregar à equipe, quando acrescentar valor a
ela e apresentar soluções diferenciadas. Um talento pode ser criativo ou
executor. Pode ser um talento hoje, mas não ser amanhã, porque as
necessidades de suas atividades se modi caram ou porque não se cuidou
dele adequadamente, ou porque se desmotivou por algum motivo.
Gerir gente de modo e caz é estar atento a tudo isso. É necessário saber
de nir as necessidades de pessoal, saber atrair, contratar, reter, motivar,
avaliar desempenho, desenvolver, remunerar, reconhecer empenho
(diferente de desempenho) e até mesmo saber demitir. É reconhecer que
gente é o propulsor que move as empresas.
Capítulo 4

Obstáculos na gestão de pessoas


A constatação da importância das pessoas no desempenho, no sucesso das
empresas, às vezes, ocorre tardiamente, quando não há mais nada a fazer
para evitar, no mínimo, a fama de “lugar nada bom para se trabalhar” e, no
máximo, a perda de posição no mercado. No primeiro caso, será muito
difícil atrair pro ssionais talentosos e competentes. Especialmente hoje em
dia, com as gerações X e Y ocupando a maioria dos postos dentro das
diversas companhias e a geração Milênio chegando. Os mais jovens
preferem empresas exíveis, capazes de apostar na criatividade e na
responsabilidade de suas equipes e de lhes oferecer ambientes agradáveis e
éticos para o desenvolvimento do trabalho.
Como executivo e como consultor empresarial, tive a oportunidade de
interagir com dezenas de empresas nacionais e multinacionais. Algumas
contavam com lideranças proativas e encaravam os funcionários como seu
principal valor; muitas consideravam essencial o capital humano, embora
não lidassem com ele de modo que correspondesse a essa visão e, por isso,
não desfrutavam de todo o potencial dos colaboradores; outras tratavam as
pessoas simplesmente como custos. É neste último caso que mais
encontramos barreiras e más práticas capazes de dar origem aos diferentes
problemas existentes na gestão de pessoas e na direção da área de Recursos
Humanos.
Quando pensei em escrever um livro sobre este tema, complementando
minha experiência, participei de eventos voltados para a gestão de Recursos
Humanos e também troquei ideias com outros CEOs e executivos
responsáveis pela área de RH, debatendo os entraves na gestão de pessoas e
as alternativas para superá-los, e estudei pesquisas relacionadas ao assunto.
E continuo estudando-o.
Aprendi que os principais in uenciadores das lacunas existentes na gestão
de pessoas nas organizações eram e continuam sendo os seguintes:
Atitude do CEO, que não dá o valor devido à gestão do capital
humano da empresa, in uenciando na cultura organizacional e
na atitude de seus liderados;
Preparo inadequado dos executivos para gerir seu pessoal;
Posicionamento não estratégico e falta de valorização das áreas de
Recursos Humanos;
Ausência de abordagem desse tema, de modo abrangente, nas
universidades, como disciplina relevante nos cursos de graduação
ou de mestrado em Administração de empresas.

Analisaremos esses tópicos um a um.

4.1 Atitude do CEO em relação ao capital


humano da empresa
A cultura empresarial começa na cúpula. Se o CEO se isola em sua
pirâmide de cristal e olha as pessoas de cima, como se elas fossem meras
súditas, não ajuda a desenvolver uma cultura organizacional capaz de
atrair, reter e desenvolver esses colaboradores, a m de que tenham o per l
e o engajamento necessários para suportar um crescimento sustentável.
Muitos CEOs se concentram nos números de seus resultados, visualizando
sua materialização a curto prazo, porque a partir desses conseguirá o seu
bônus. O plano estratégico da empresa pode até apresentar projetos de ação
para Recursos Humanos, mas em geral eles são seguidos parcialmente ou
simplesmente não são seguidos. A consequência é a alta rotatividade de
pessoal, o que impede a consolidação de equipes de alto desempenho. Os
resultados de curto prazo podem até ser obtidos, mas o desempenho de
médio e longo prazos ca comprometido.
Se o CEO não reconhece também o papel estratégico da área de RH e não a
posiciona no mesmo nível que as demais áreas, não provê o status
necessário para que ela atue como parceira nos negócios, como veremos ao
longo deste livro. Seriam completamente cegos os CEOs que não
reconhecessem a importância de sua gente. Por que, então, não se
empenham em desenvolver e disseminar a cultura organizacional
necessária para a atração e a retenção de talentos?
Em um debate em que participei, um dos participantes sugeriu que, se o
CEO não oferece o apoio necessário, o movimento de desenvolvimento da
cultura deve começar por baixo. A sugestão é boa? Talvez. O esforço pode
realmente começar de baixo, mas grande parte da energia investida será
perdida porque não haverá eco na cúpula da empresa. E pode ser que não
se consiga nenhum resultado prático.
Quando falta a atenção do executivo principal na administração de recursos
humanos – e quando, portanto, seus subordinados não são devidamente
orientados sobre o papel que cada um deve desempenhar no
desenvolvimento da equipe –, costuma-se delegar à área de RH a gestão de
pessoas. Isso nos leva ao segundo obstáculo para essa gestão, como se verá a
seguir.

4.2 Preparo inadequado dos executivos para


gerir seu pessoal
A falta de preparo dos executivos para gerir pessoas a eles subordinadas
começa nos bancos das universidades, como abordarei mais adiante. Tal
despreparo prossegue dentro das empresas, devido a vários fatores. Os mais
relevantes são:

a) Pressão por resultados de curto prazo e perda de foco nas pessoas


O aumento da complexidade empresarial, da competitividade e da pressão
por resultados de curto prazo fazem com que os executivos se concentrem
no aspecto quantitativo, como se eles ocorressem sem intervenção humana.
Quantos de nós, principalmente ao trabalhar em empresas de capital
aberto, não passamos por situações nas quais foram feitos belíssimos
projetos estratégicos e respectivos planos de ação, inclusive de recursos
humanos? Quantos de nós já escutamos os superiores fazendo discursos
emocionantes no nal do ano, dizendo como os funcionários são
importantes e anunciando planos de desenvolvimento de pessoal que nos
deixaram com a impressão de que “agora é pra valer”? E quantos de nós,
cedendo à pressão por resultados de curto prazo – “temos de fechar o
trimestre” –, vimos grande parte dessas promessas ser esquecida?
Situações como essa, em vez de criar um clima de união, levam o executivo
a colocar a mão na massa e a atropelar a equipe, não raramente assumindo
suas tarefas. Ele não tem a paciência necessária para levá-la a se
desenvolver pro ssionalmente. Isso ocorre, em particular, quando o
executivo ainda não tem maturidade su ciente para se organizar, planejar
bem seu trabalho e o de sua equipe, entender que é preciso, sim, entregar
resultados, mas em conjunto com a equipe. Esse executivo se concentra nos
resultados operacionais de curto prazo e perde a oportunidade de
desenvolver uma visão mais abrangente.

b) Pressão pela contratação


Esse mesmo cenário conjuntural pode criar situações nas quais são
necessárias contratações urgentes, para substituir alguém ou para preencher
uma nova posição. Não raro presenciei contratações porque o candidato foi
indicado por um amigo ou alguém o conheceu em outras circunstâncias e
garantiu que “pode contratar que ele é bom!”.
Bom para o quê? Isso me lembra um professor que tive na Harvard
Business School, a quem perguntei, logo que o conheci: “Como vai?”. Ele
me respondeu: “Comparado com quem?”. Os executivos se esquecem de
que, em cada situação da vida da empresa, e para cada posição, deve haver
um per l especí co do pro ssional que a ocupará.
Quando assumi a direção geral da Sodexo do Brasil, a rotatividade de
pessoal era uma das mais altas do mercado de serviços de alimentação no
país. O principal motivo diagnosticado foi a falta de planejamento e de
políticas adequadas de recursos humanos, resultando na pressão pela
contratação a m de preencher quadros para as cozinhas industriais que
operávamos dentro das unidades de clientes. Assim, as contratações eram
feitas de modo subjetivo. Pouco tempo depois os funcionários iam embora,
por não terem aptidão para a atividade. Esse caso será tratado
detalhadamente no Capítulo 8.

c) Composição das equipes


Atualmente, a formação das equipes vem se tornando cada vez mais
criteriosa. Sabe-se que não basta selecionar pessoas com per s semelhantes
– ou diferentes, dependendo da situação – para que se tenha um grupo
sinérgico. Como em um time de futebol ou de outro esporte coletivo, há
talentos especí cos para cada posição. O supervisor da equipe deve ter
discernimento para recrutar as pessoas adequadas a cada posto e criar elos
entre elas, a m de obter bons desempenhos individual e coletivo.
Uma equipe pode ser composta por pro ssionais de diferentes gerações, e
eles devem interagir de tal maneira que suas habilidades e competências se
complementem. Não raro, porém, observam-se choques culturais entre
essas gerações: “Por que eu, que tenho tanta experiência prática e alguns
cabelos brancos, tenho de passar meus conhecimentos para um jovem que
acredita ser um grande talento somente por ter cursado uma universidade
importante?” ou: “Por que eu, que sou jovem, talentoso e brilhante, devo
ter paciência com esse senhor que não entende de tecnologia e ainda faz
contas em uma calculadora?”. É função do supervisor dessa equipe fazer
com que seus membros entendam que cada um possui um valor intrínseco
e que todos serão bene ciados pela troca de experiências.

d) Descuido no processo de treinamento e desenvolvimento de subordinados


O executivo deve estar atento a cada momento da vida de seus
subordinados, para identi car suas necessidades de desenvolvimento. É
comum observar executivos que negligenciam esse aspecto esperando que
seus funcionários lhe peçam orientação ou que a área de Recursos
Humanos tome a iniciativa de avaliar seu pessoal e de propor ações de
treinamento e desenvolvimento. Compete a cada executivo avaliar
continuamente seus subordinados e apresentar ações de desenvolvimento.
Para isso ele pode e deve contar com o apoio do RH, que lhe dará
orientações sobre como agir e que ferramentas aplicar. O coaching,
abordado mais adiante, é fundamental nesse processo.

e) Medo de desenvolver substitutos


Sempre acreditei que um executivo, para obter êxito, deve contar com
pro ssionais mais competentes que ele em suas respectivas funções. Longe
de mim querer comparar minha experiência com a do grande Jack Welch,
mas ele considerava estratégica sua equipe executiva e dizia que, em uma
companhia com negócios diversi cados, o conhecimento que o presidente
tem das atividades de suas unidades é bem menor que o do dirigente de
uma das empresas da GE. Welch se cercava de excelentes pro ssionais e de
verdadeiros especialistas para garantir o sucesso do grupo – e seu próprio
sucesso.
Apesar desse tipo de exemplo, o que se observa em grande escala é o medo
dos líderes de desenvolver novos líderes. Temem que a empresa possa
prescindir deles a qualquer momento, promovendo algum possível
substituto. Com isso, impedem o crescimento de seus subordinados – e, ao
agirem assim, bloqueando a formação de potenciais substitutos, limitam o
próprio crescimento na organização. São comuns as situações nas quais um
pro ssional tem a oportunidade de ser promovido, ou geogra camente
deslocado, e a perde ou a vê adiada porque não havia uma pessoa que
pudesse substituí-lo a curto prazo. Desenvolver os subordinados mais
competentes para que sejam seus futuros substitutos não é apenas um
dever do executivo, mas um modo de demonstrar competência e
autocon ança.

f) Inabilidade para agir como coach dos subordinados


O objetivo principal de um processo de coaching é prover apoio a
pro ssionais para a melhora de seu desempenho pessoal e pro ssional. Isso
resulta em melhor produtividade, tanto para os pro ssionais quanto para a
organização em que eles trabalham. Trata-se de um processo também
conhecido como one-to-one (um a um ou indivíduo para indivíduo), uma
das ferramentas de desenvolvimento mais poderosas e mais subutilizadas
por líderes.
A grande maioria dos executivos não sabe estruturar e conduzir processos
de coaching com seus subordinados. Conversa de corredor, reuniões para
tratar de assuntos especí cos, almoço para promover a sociabilização ou até
mesmo para tratar de negócios ou do próprio indivíduo não são coaching.
Essa lacuna já aparece na cúpula da empresa: o CEO não dedica tempo (ou
não sabe como fazer) para conduzir sessões estruturadas e atuar como
coach de seus subordinados diretos. Se o zesse, provocaria um efeito em
cascata da prática, de cima para baixo, na empresa inteira.

g) Equívoco na delegação de poder


A delegação de poder, ou empowerment, é feita muitas vezes de maneira
equivocada. Delegar a quem não tem habilidades ou competências para
assumir essa delegação é pôr em risco a tarefa e o desempenho do
subordinado ou a própria carreira do líder. Por outro lado, deixar de dar
maiores responsabilidades a pessoas que estão e se sentem capacitadas para
assumi-las é um caminho para o mau desempenho e, consequentemente,
para a desmotivação. Ambos os equívocos levam a resultados indesejados,
assim como a má formação de pessoal. Além disso, por mais competente
que seja um subordinado, delegar sem cobrá-lo nem acompanhá-lo é
abdicar dele, e leva ao risco da formação de desvios no desenvolvimento
pro ssional do indivíduo.

h) Ter como modelo um executivo mal preparado


Ainda como estagiário em um dos departamentos do Centro Técnico
Aeroespacial, tive um chefe duro e exigente, o saudoso Jerônimo Souza,
que me tratava como “gente” e que me conduzia pela mão. Anos depois,
tive novamente a oportunidade de interagir com ele, dessa vez como seu
vice-presidente em uma organização não governamental, e mais uma vez
aprendi lições novas e produtivas com ele. Na Booz & Co. havia um vice-
presidente com quem trabalhei em vários projetos, Lawrence Wilsey, que
foi para mim um modelo pro ssional e pessoal. Lições que nunca esqueci,
de dois verdadeiros coaches, com estilos bem diferentes, mas com um
aspecto comum: valorização das pessoas e respeito por elas.
Tive também, no início da minha vida pro ssional, alguns chefes com os
quais aprendi o que não se deve fazer. E esse é o perigo que ronda muitos
jovens no início da carreira. Nosso primeiro chefe é nosso primeiro modelo.
Se ele agir como um executivo que não sabe gerir seu pessoal de maneira
adequada, com muitos dos desvios já apontados neste livro, seus
subordinados aprenderão o que não se deve fazer. Com muita sorte terão
discernimento para distinguir essas lacunas e corrigi-las no futuro, mas
penarão muito até chegar lá.
Se você é um pro ssional recém-guindado à posição de chefe, pense que
aqueles que estão em posição hierarquicamente inferior o terão como
modelo. E você decerto vai querer ser lembrado como alguém que ensinou
a fazer as coisas da maneira correta, não como aquele com quem a equipe
aprendeu o que não deve ser feito.

4.3 Posicionamento não estratégico e falta de


valorização das áreas de Recursos Humanos
Com o devido respeito a muitos líderes de Recursos Humanos, o cenário de
sua postura e do posicionamento da área de RH na hierarquia das empresas
não evoluiu muito nos últimos anos. Ainda vemos:
a) juniorização das áreas de RH;
b) posicionamento hierárquico inadequado do RH;
c) delegação lateral de responsabilidades;
d) atitude processual do pro ssional de RH;
e) falta de foco em desenvolvimento de talentos de RH.
E, acrescento ainda um sexto fator, mais relevante que os fatores acima:
f ) falta de autocrítica por parte de muitos líderes de RH.
Analiso a seguir cada um desses fatores.

a) Juniorização das áreas de RH


Estamos falando da delegação da liderança de áreas de Recursos Humanos
a jovens pro ssionais. Embora contem com boa formação acadêmica,
tenham muito potencial e muita vontade, eles ainda não adquiriram a
vivência necessária para exercitar as características de conhecimento prático
e de liderança que uma área com tanta responsabilidade exige. Muitos
desses jovens pro ssionais adotam atitudes de rejeição ao diálogo com
pessoas mais experientes, com as quais eles poderiam ter melhor interação e
aprender bastante. E, não raro, assumem posturas prepotentes e
irreverentes, quando não desrespeitosas, com colegas ou fornecedores,
pensando que já são mestres no tema ou usando isso como escudo para
suas inexperiências.
Culpa deles? Não, culpa de seus CEOs, que por economia, comodidade
(preferem ditar as regras a seus líderes de RH em vez de discutir com
pro ssionais mais experientes), falta de visão ou protecionismo colocam em
posições-chave pro ssionais despreparados. Resultado: a curto prazo, a
empresa passa a receber apoio inadequado de sua área de RH e os líderes
dessa área cam com seu desenvolvimento pro ssional comprometido.

b) Posicionamento hierárquico inadequado do RH


Por que, em muitas organizações, encontramos vice-presidentes ou
diretores nanceiros de Operações, Vendas, Planejamento, entre outros, e,
geralmente, deparamo-nos com gerentes ou supervisores de Recursos
Humanos, de Administração de pessoal ou ainda de Relações industriais?
Por que, nessas organizações, os responsáveis pela área de RH não
participam das reuniões estratégicas de negócios? E por que não se
reportam ao CEO? A nal, não são eles os responsáveis por coordenar ações
para que a organização tenha os talentos adequados, no tempo adequado,
nas funções adequadas?
Esse posicionamento re ete também uma postura submissa e acomodada
de líderes de RH, que se contentam em servir como coadjuvantes quando
seu papel deveria ser de ator principal.
Percebo, entretanto, que isso vem evoluindo, embora lentamente. Na
Associação Congregação de Santa Catarina (ACSC), quando assumi como
superintendente, tínhamos uma gerência corporativa de Recursos
Humanos, que se ocupava basicamente de aspectos relacionados com a
administração de pessoal. Ela evoluiu para uma diretoria corporativa de
Gestão de Pessoas e Comunicação e, em todas as casas (empresas) da
entidade a área de Gestão de Pessoas passou a se reportar ao seu líder
enquanto eu era o superintendente.
Gente move empresas, mas a área de RH não é considerada estratégica em
uma grande quantidade de empresas.

c) Delegação lateral de responsabilidades


Parte desse fenômeno se deve ao fato de que muitos executivos, por não
entenderem seu verdadeiro papel de gestores de pessoal, tendem a passar a
tarefa para o RH. É por esse motivo que muitas vezes eles delegam a seus
dirigentes de Recursos Humanos o desligamento de funcionários. E os
dirigentes de RH costumam aceitar passivamente a situação, em geral
porque querem evitar o confronto com seus pares, porque não sabem lidar
com ela, ou porque acreditam que assim estão exercendo seu “poder”.
Conheci CEOs que delegaram a consultores externos ou a membros de seu
conselho de administração a tarefa de demitir executivos; pior ainda, estes a
aceitaram. Um desastre!
Faltam iniciativas, da parte dos responsáveis pelas áreas de Recursos
Humanos, para colocar o assunto na agenda dos executivos e fazê-los
entender seu verdadeiro papel. Estamos de novo, aqui, diante de uma falha
na liderança das empresas, que não orientam suas equipes acerca da função
de cada uma no desenvolvimento de pessoas. Trata-se, igualmente, do
re exo da juniorização e do posicionamento hierárquico inadequado do
RH.

d) Atitude processual do profissional de RH


Mesmo quando os fatores anteriores são superados, ainda se vê o próprio
pro ssional de RH (e a área) com postura processual, e não estratégica. Ele
tem, muitas vezes, receio de se posicionar, e dependendo de seu nível,
sente-se intimidado quando se relaciona com os líderes das áreas de
negócios.
Suponhamos uma reunião de avaliação de uma determinada área (por
exemplo, Marketing).
Imagine um grupo de líderes de Marketing discutindo desempenhos e
promoções, acompanhados por um pro ssional de RH. Agora imagine que
um determinado indivíduo, claramente muito júnior, porém com grande
carisma na área, é colocado como candidato para promoção e essa decisão é
apoiada pela liderança de Marketing. Nessa situação, o pro ssional de RH
deveria se pronunciar, contribuindo com a sua opinião e, caso o indivíduo
não esteja preparado para essa promoção, exprimir claramente que essa
decisão não é correta; mas, na realidade, na maioria das vezes ele ca
quieto e deixa as decisões serem tomadas sem atuar como consultor e
parceiro de negócio. Um ano depois, esse indivíduo não atingiu as
expectativas esperadas; o pro ssional de RH é tão responsável quanto os
líderes de Marketing pelo equívoco cometido – o único não responsável é o
indivíduo promovido inadequadamente, tendo falhado porque os
responsáveis não tomaram a melhor decisão para organização e para ele
próprio.

e) Falta de foco em desenvolvimento de profissionais de RH


Há uma grande lacuna no processo de desenvolvimento do pro ssional de
RH. Esse pro ssional começa a carreira em RH e raramente passa tempo
fora da área, não desenvolvendo, portanto, visão e entendimento do
negócio e de seus departamentos; sua capacidade analítica e de elaboração
de soluções muitas vezes se torna processual, teórica ou não prática. Passar
por experiências fora da área de RH, entender na prática como o negócio
funciona, auxilia o indivíduo a pensar em soluções inovadoras e que
contribuem para o desenvolvimento da organização. Adicionar na carreira
do pro ssional de RH algumas rotações fora da área pode agregar valor
para o indivíduo e para a função.
f) Falta de autocrítica por parte de muitos líderes de RH
Tenho conhecido pro ssionais de Recursos Humanos que são verdadeiros
mestres em seu ofício – preenchem o per l delineado no Capítulo 5 e
fazem com que sua área desempenhe de maneira adequada seu papel
estratégico e operacional. Mas também tenho encontrado alguns gestores
sem capacidade de liderança e que não deveriam estar à frente de uma área
tão importante como a de RH.
Vemos, com frequência, percepções divergentes sobre o que o RH acredita
estar fazendo e o que os gestores consideram que essa área faz. Áreas de
Recursos Humanos acreditam que têm competências e desenvolvem
estratégias adequadas de recursos humanos, ao passo que os gestores
consideram que o RH carece de capacitação para elaborar planos de
desenvolvimento de talentos convergentes com a estratégia corporativa e
com os objetivos da empresa. Pro ssionais de Recursos Humanos acreditam
participar ativamente na consolidação dos processos de gestão de talentos e
prover o apoio adequado aos gestores, enquanto estes avaliam que o RH
não provê o suporte adequado. As avaliações convergem quando se trata de
reconhecer que a área de Recursos Humanos dedica-se à administração e
não a parcerias de negócios.
Tive uma empresa de consultoria que realizava estudos de mercado.
Éramos contratados para realizar, por exemplo, pesquisas de satisfação de
clientes. Não raro, quando fazíamos apresentações nas quais se re etiam os
resultados de extensas pesquisas de campo que mostravam a má qualidade
de determinado serviço ou um enfoque de vendas inadequado, alguém
reagia dizendo: “O cliente está errado!” A miopia impedia que algumas
dessas organizações ouvissem seus clientes.
Um fenômeno semelhante ocorre com as áreas de Recursos Humanos.
Muitas olham apenas para si própria, incapazes de ouvir o que os “clientes”,
dentro de suas empresas, estão lhe comunicando.
4.4 Ausência de abordagem desse tema nas
universidades
Uma análise das grades curriculares de algumas das principais faculdades
de Administração de empresas do Brasil e dos Estados Unidos mostra
concentração de disciplinas como Matemática, Matemática nanceira,
Estatística, Suprimentos, Finanças, Contabilidade, Marketing, Vendas,
Informática e outras correlatas. Há pouco foco em liderança e gestão de
pessoas. Outros cursos – como Engenharia, Marketing, Direito, Medicina,
Arquitetura — pouco abordam o tema, se o abordam! É como se os alunos
formados nelas nunca fossem se tornar responsáveis pela liderança de
equipes.
Há vários cursos de pós-graduação ou de educação executiva com foco em
Recursos Humanos. Mas, geralmente, são voltados para pro ssionais que
atuam ou que atuarão como dirigentes de RH, porque um executivo de
outra área não vê valor em dedicar tempo a um programa de pós-
graduação para melhor gerir seus subordinados. Ele valoriza muito mais – e
seguramente seus chefes também – os cursos em Finanças, Marketing,
Estratégia.
Vou me deter um pouco na formação dos psicólogos e em sua interação
com o RH, pois são das escolas de Psicologia que sai grande parte dos
pro ssionais que trabalham em Recursos Humanos. Não z cursos de
Psicologia nem conheço muito sobre o tema do ponto de vista acadêmico
ou didático. Aprendi psicologia humana durante minha vida, observando e
estudando as atitudes das pessoas com as quais me relacionei. Considero a
interação do psicólogo com o RH um assunto relevante e realizei um estudo
sobre ele. Expresso minhas conclusões a seguir.
Seria de se esperar que os psicólogos entendessem muito bem seu papel (e o
papel dos executivos) na gestão de pessoal ao saírem da universidade. O
despreparo daqueles que ingressam nas empresas é, entretanto, notório. Há
um círculo vicioso: na universidade, o RH é abordado muitas vezes com
preconceito e de maneira super cial; o psicólogo tem como foco trabalhar
em uma clínica e descuida-se do aprendizado de ferramentas preciosas e
necessárias para exercer cargos de modo e ciente em uma organização,
como comportamento de grupos, motivação, comunicação. Sem mencionar
a ausência de treino para entender como funcionam as empresas e o
mercado.
No entanto, ao se graduar, os pro ssionais em geral têm, como primeira
alternativa de emprego, oportunidade de trabalho em RH. Costumam
aceitá-la, muitas vezes considerando-a provisória, válida apenas enquanto
busca colocações em clínicas ou em outras atividades ligadas à sua
formação.
Alguns se apaixonam por RH e passam a entender seu real papel e o dos
gestores dentro da organização. Conseguem se desenvolver como parceiros
de negócios, saem do casulo teórico e transformam-se em excelentes
pro ssionais. Hoje em dia, já há aqueles que escolhem Psicologia com foco
em RH. Esse contingente começa a crescer nas universidades, embora
necessite de uma formação acadêmica mais adequada ao ambiente ao qual
trabalhará. A escola não lhe propicia essa formação. Eles a aprendem a
duras penas, no caminho que escolheram trilhar.
Mas há também pro ssionais de Psicologia que se sentem insatisfeitos na
área, almejando um dia passarem a atender em uma sonhada clínica, mas
sem conseguir materializar o sonho. Acabam compondo um grupo com
baixa autoestima, malformados para o trabalho, que exercem mal suas
funções e cam frustrados. Com o tempo, perpetuam-se na empresa,
embora com preparo prévio incompleto ou distorcido para a função. E a
empresa não se dá conta disso.
O mestre José Carlos Zanelli, observa:
A formação pro ssional e o exercício das atividades de trabalho pelo psicólogo organizacional
têm sido restritos, precários e de cientes. Os limites no preparo para a atuação, em muitos
cursos de psicologia, não ultrapassam as linhas demarcadas pela seleção e orientação
pro ssional, o que revela uma obsolescência até no título conservado para a disciplina. Os
departamentos que devotam à formação na área um empenho um pouco maior não conseguem
avançar além do fornecimento de algumas técnicas tradicionais, em regra pela insu ciência no
tempo disponível para o conteúdo que se pretende transmitir [...] Conteúdos ensinados em
disciplinas básicas, por exemplo, raramente são associados aos conceitos ou à prática em
organizações [...] A formação do psicólogo para atuar em organizações tem sido sobremaneira
relegada [...] A situação con ui no encaminhamento de psicólogos despreparados para o
exercício das atividades em organizações. (ZANELLI, 2002)

Já observei que não há escassez de talentos, mas sim ambientes redutores


da capacidade de atração e de desenvolvimento desses talentos e da
dinâmica organizacional. Para que existam pro ssionais com o per l
adequado, motivados, produtivos e delizados, é necessária uma cultura
organizacional capaz de permear, por toda a organização, a mensagem de
que o ativo mais importante é sua gente.
Entramos, entretanto, em círculos viciosos em que os principais elos são a
atitude do CEO e a perda de hierarquia das áreas de Recursos Humanos. O
resto é consequência. Como quebrar o círculo? Em primeiro lugar, quando
o CEO não mudar de atitude, o dirigente de Recursos Humanos tem duas
alternativas: insistir em modi car o status quo de baixo para cima e
frustrar-se com o tempo, ou procurar outras oportunidades no mercado de
trabalho.
Se o CEO adotar uma atitude mais proativa com respeito à gestão de
pessoal, resta à área de RH ser a consciência crítica instalada dentro da
organização, com coragem e iniciativa para colocar o assunto na agenda dos
executivos.
Por m, ou em paralelo, ressalta-se a carência dos conteúdos educacionais
das universidades, tanto para a formação de futuros responsáveis pela
gestão de talentos a eles subordinados quanto para a formação de
pro ssionais de áreas de RH.
Capítulo 5

O papel do CEO e dos gestores


Andrew Carnegie construiu um império mundial e cou conhecido como
“o rei do aço”; ele tinha paixão por sua gente e reconhecia sempre seus
esforços. Dizia ele:
Retirem de mim minha gente, mas deixem minhas fábricas, e logo ervas daninhas crescerão no
piso. Retirem de mim minhas fábricas, mas deixem minha gente, e em breve teremos novas e
melhores fábricas.

Isso tem relação com a responsabilidade do CEO para com sua gente?
Akio Morita, o gênio que fez da Sony um império mundial, deixa claro o
papel dos executivos na gestão de seu pessoal:
O gerente de origem oriental sabe que sua missão mais importante é desenvolver uma relação
saudável com os funcionários, criando dentro da empresa um clima familiar – todos,
empregados e gerentes, estão no mesmo barco. As companhias de maior sucesso no Japão são
justamente aquelas que souberam criar uma espécie de destino comum entre todos os
empregados – o que os americanos chamam “mão de obra” e “gerência” – e os acionistas.

Carnegie e Morita foram empresários e CEOs em lados opostos do planeta e


em culturas empresariais e sociais muito diferentes. Mas ambos serviram
como modelos no tratamento concedido às suas equipes. A função do CEO
e dos gestores de Recursos Humanos de uma organização é o tema deste
capítulo, que também aborda o papel do conselho de administração,
quando existente.

5.1 O papel do CEO


O CEO é o maior responsável pelos resultados da empresa que lidera. Aliás,
ele não lidera a empresa, lidera gente! Suas principais responsabilidades
podem ser resumidas no quadro a seguir:
Quadro 5.1 – Principais responsabilidades do CEO

Satisfação das
Liderança e resultados Recursos Humanos
partes interessadas

Prover à liderança
executiva a organização Assegurar que haja gente certa, no Compatibilizar e prover
para que se obtenham lugar certo, no momento certo. equilíbrio às expectativas
os resultados almejados das principais partes
pelos acionistas, Selecionar e recomendar seus
interessadas.
mantenedores ou subordinados diretos para aprovação
pelos superiores, realizar sua Uma possui várias partes
guardiões.
avaliação periódica, propor interessadas, mas,
destituição quando necessário e geralmente, três são
atuar como coach de seus fundamentais:
“Fazer acontecer” a
missão e a visão da subordinados diretos.
organização, Assegurar que os recursos humanos
implementando a(s) sejam tratados como ativo e que a
estratégia(s) e empresa tenha as políticas de gestão
cumprindo com planos de pessoas adequadas para a
e orçamentos atração, o desenvolvimento e a O CEO também deve
determinados. retenção dos talentos necessários atender às expectativas
Fazer “chover na horta para seu sucesso. das demais partes.
do acionista”!

Fonte: Elaborado pelo autor.

O CEO é responsável pela criação de uma cultura empresarial, seja ele um


executivo contratado pelo conselho de uma empresa de capital aberto, seja
o diretor geral de uma multinacional, seja o pro ssional responsável pela
gestão dos negócios de uma empresa de cunho familiar, seja o dono da
empresa ou um de seus descendentes que acumula a função de primeiro
executivo. É para ele que todos os colaboradores olham; é o modelo mais
importante.
Em muitas empresas, esse modelo ainda é o do líder búfalo. Em uma
manada, os búfalos são totalmente leais ao seu líder. Fazem tudo que o
líder decide e vão aonde o líder determinar. Se o líder cair em um
precipício, a manada vai atrás.
Em outras empresas, o modelo de liderança é o do ganso: eles voam em V,
com diferentes gansos se revezando na liderança. Assim, cada qual ca
responsável por levar o bando a partes de seu destino, mudando papéis
quando necessário, alternando como líder, como seguidor ou como
escoteiro.
O búfalo não olha para trás; o ganso tem a chance de olhar seus
companheiros quando vai para trás. Em uma empresa, o líder búfalo não se
importa se um seguidor cai e é atingido pelos demais, ao passo que o líder
ganso se preocupa com todos os seguidores. Muitas empresas tiveram, e
ainda têm, sucesso com líderes búfalo, mas cada vez mais esse tipo de
liderança é questionado, em favor de uma liderança ganso, a dos líderes
que acreditam na valorização de suas equipes e põem em prática essa
crença.
Se gente move empresas, o CEO é o principal responsável pela gestão de
todo o pessoal em sua organização, do vice-presidente ao funcionário de
chão de fábrica. No que tange à gestão de pessoas, compete a ele:

a) Entender, absorver e incorporar a cultura, o DNA e os valores da


organização, fazendo-os permearem e serem incorporados por todos os
colaboradores
Cultura e valores não se escrevem e se imprimem para adornar paredes ou
mesas. Devem ser entendidos, incorporados e praticados.
Esse cuidado deve começar na seleção de pessoas. Contrate colaboradores
que já trazem do berço valores pessoais compatíveis com os da organização
e que tenham vocação para gostar de trabalhar dentro de uma determinada
cultura. Um pro ssional que trabalhou por anos em uma cultura diferente
poderá não se adaptar à nova cultura; mas haverá aqueles que terão a
capacidade de entender e apreciar uma cultura diferente. É necessário
saber identi car ambos.
Compete ao CEO se certi car que esse cuidado é tomado por seus gestores
e pela área de RH.

b) Difundir uma cultura em que os colaboradores sejam vistos como ativo e


não como custo
Os ativos não são somente compostos por equipamentos ou por colegas
que, pelo tempo de trabalho na empresa, já são considerados parte do ativo
xo. É importante que as empresas tenham o maquinário mais e ciente do
mercado, para que a produtividade seja melhor do que a dos concorrentes.
Essa noção deve ser estendida ao pessoal. Os funcionários mais e cientes
são aqueles reconhecidos pelo valor produtivo e não pelo custo.
Gente é um recurso estratégico e não pode ser considerada de outra
maneira. A empresa que agrega colaboradores de alto desempenho e que
sabe trabalhar em equipe tem maiores chances de sucesso. E reunir esses
colaboradores requer atenção a toda a cadeia de gestão de pessoas: atração,
seleção, desenvolvimento, motivação, remuneração, promoção e até
demissão.
Cabe ao CEO fazer com que a empresa, como um todo, entenda o pessoal
como recurso estratégico. Também compete a ele orientar para que se tenha
uma cadeia de gestão desenvolvida como uma verdadeira “cadeia de valor”,
do mesmo modo como se desenvolve a cadeia de valor para o negócio. Só
que a cadeia de valor de gente precede, em importância, todas as outras.
Antes de empreender a tarefa de difundir e consolidar essa mentalidade –
de gente como recurso estratégico –, o CEO deve re etir sobre até que
ponto realmente acredita nisso. Se ele não tiver esse princípio impregnado
em sua alma, é melhor não se aventurar a ser CEO.

c) Assegurar que a equipe de colaboradores diretos entenda seu papel na


gestão dos respectivos recursos humanos, também difundindo esse
entendimento em toda a empresa
Há despreparo em grande número de empresas e de executivos na gestão
de pessoas. Como con rmação desse fato, uma pesquisa realizada
pela International Business Machines Corporation (IBM) em conjunto com
o Human Capital Institute, que cobriu mil organizações em diferentes
países, identi cou que, enquanto 84% dos respondentes reconhecem que a
e ciência da força de trabalho é importante para a obtenção de resultados
de alto desempenho, apenas 42% declaram que seus executivos dedicam
tempo su ciente para a gestão de pessoas.
A gestão da cadeia de valor de recursos humanos é tão importante que não
pode car sob a responsabilidade isolada da área de RH. Deve ser
compartilhada pelos gestores de cada área; todos precisam ser demandantes
de gente com potencial de alto desempenho, não importa seu nível
hierárquico na organização. E essa demanda tem de ser continuada, quer se
necessite de talentos a curto prazo, quer não. O inventário de recursos
humanos deve ser constantemente atualizado com relação às competências
e habilidades, além de complementado ou substituído de acordo com as
necessidades. Gestores são líderes, educadores e coachs dos subordinados.
Cabe ao CEO fazer com que os gestores entendam esse papel, orientando
os colaboradores diretos a difundi-lo em toda a organização, além de
garantir que isso seja parte da espinha dorsal da gestão de pessoas na
empresa.

d) Colocar a área de Recursos Humanos em um plano estratégico da gestão


da organização e assegurar que seu líder tenha estatura para essa função
A área de Recursos Humanos deve se situar em um nível subordinado
diretamente ao CEO, com participação nas reuniões de diretoria, colegiado
de líderes, comitê executivo. É responsabilidade do CEO fazer com que isso
aconteça, para evitar que essa área exerça um papel meramente secundário,
de apoio operacional, na organização.
O CEO também deve assegurar que o líder dessa área possua competências
e maturidade necessárias para o desempenho do cargo, e que as políticas, as
práticas e as ferramentas de RH estejam alinhadas com a estratégia
empresarial e com as necessidades de recursos humanos da empresa.

e) Comprometer-se com o desenvolvimento e com a implementação da


estratégia de recursos humanos, alinhando-a à estratégia empresarial da
companhia
Abordaremos em capítulo posterior os aspectos relacionados ao plano
estratégico de recursos humanos. Por enquanto, podemos dizer que, seja ele
mais simples, seja mais elaborado, é fundamental que esteja alinhado à
estratégia corporativa. E é responsabilidade do CEO se assegurar disso,
envolver-se no seu desenvolvimento e acompanhar sua implementação,
provendo o apoio necessário à área de Recursos Humanos.

f) Certificar-se de que a empresa não seja constituída por feudos, mas sim
por vasos comunicantes, o que contribui para a formação de espírito de
equipe e para a otimização do uso dos recursos humanos
A criação de feudos em uma empresa é uma das principais causas de
inibição ou mesmo de destruição do espírito de equipe. Feudos não
possibilitam o desenvolvimento de sinergias entre diferentes áreas ou
mesmo entre unidades dentro de uma mesma área; criam um processo de
gestão centralizadora e individualista e geram também protecionismo e
“panelinhas”. Feudos não possibilitam a otimização do uso dos recursos
humanos da organização e contribuem fortemente para a criação de um
clima pouco motivador.
Cabe ao CEO certi car-se de que isso não aconteça, começando pelo
trabalho em equipe, de maneira colaborativa e transparente, com os
subordinados diretos. Isso faz com que eles atuem de maneira semelhante
em suas respectivas áreas, mostrando que há colaboração e integração com
as demais. Desse modo, o CEO estimula os subordinados a atuar de
maneira sinérgica com seus colegas diretos e com outras unidades da
empresa.
Nesse sentido, o CEO é o principal comunicador da organização, e deve
saber sê-lo de forma transparente e objetiva. Para isso, deve desenvolver a
autopercepção de que pode transmitir mensagens que causam impacto e
que às vezes podem ser con itantes com o que ele pensa estar
comunicando.

g) Atuar como coach dos subordinados diretos, estabelecendo um


padrão de comportamento educativo
Uma das responsabilidades principais do CEO é atuar como coach dos
subordinados diretos, estabelecendo, desse modo, um padrão de
comportamento que servirá de exemplo na cadeia hierárquica da
organização. O sistema de coach um a um, entretanto, não é utilizado com
a frequência e com o conteúdo necessários, e são poucos os executivos que
sabem usá-lo de maneira efetiva.
Coaching de subordinados não é realizar com eles reuniões periódicas ou
ad hoc para o debate de problemas de suas áreas ou da empresa, nem a
realização de almoços informais em que se conversa sobre vários temas de
maneira não estruturada. Coaching é um processo que deve ser encarado
de maneira formal e estruturada. Entre os procedimentos que o CEO deve
adotar para iniciar o processo de coaching a seus subordinados estão:

Agendamento de reuniões periódicas com cada subordinado


direto: com duração de cerca de uma hora, essa reunião precisa
ser especí ca para o diálogo um a um; não pode ser confundida
com reuniões de comitê executivo, reuniões para a solução de
problemas especí cos de negócios ou almoços de relacionamento.
A periodicidade pode ser mensal, bimestral ou trimestral,
dependendo do estágio de desenvolvimento, integração e
desempenho do subordinado.
Transformação desses encontros em um compromisso formal da
agenda: determine previamente o dia e a hora dessas reuniões.
Caso ocorra um imprevisto que a impeça, antecipe-a ou adie-a
por não mais de uma semana.
Estabelecimento de uma pauta básica para as reuniões: inclua
temas de interesse estratégico para a empresa e temas de interesse
para o desenvolvimento pro ssional e pessoal do coachee. Solicite
a ele que inclua assuntos do interesse dele. Não discuta temas ou
problemas operacionais de curto prazo para não dispersar a
atenção.
Atenção total ao coachee durante a reunião: marque o encontro
em seu escritório ou no dele e dedique-lhe toda a atenção.
Desliguem celulares, instruam as assistentes para não os
interromper com telefonemas. Nada externo é tão urgente que
não possa esperar alguns minutos para ser tratado. Ouça muito,
evite falar em demasia. Pergunte. Nessa conversa, a estrela é o
coachee, não o CEO.
Desenvolvimento de um plano de ação conjunto: estabeleçam as
ações que cada um deverá desenvolver após a reunião. Façam o
registro escrito. Revejam-no na próxima reunião. Realizem um
acompanhamento sistemático, reexaminem prioridades e ações
quando necessário.

h) Em decisões sobre o pessoal, agir com a cabeça fria e o coração quente


O líder sempre deve ter a cabeça fria e o coração quente, principalmente
quando se trata de decisões sobre recursos humanos. O que isso signi ca?
Cabeça fria – raciocine de forma lógica, livre de paixões. Mantenha os
relacionamentos pessoais de lado; por mais que as pessoas envolvidas sejam
próximas, pense nelas como você pensaria em qualquer outro colaborador.
Tome decisões de maneira racional, com base em fatos ou em observações
imparciais.
Coração quente – lembre-se de que você está tomando decisões sobre seres
humanos ou que re etem sobre eles. Pondere bastante. Se a decisão for
favorável ao indivíduo (como uma promoção ou uma premiação), talvez
haja outros que se julguem igualmente merecedores dessa decisão. Eles
precisam ser comunicados da maneira adequada e com transparência, a m
de que permaneçam motivados na equipe. Se a decisão for desfavorável
(como a negativa de uma bolsa de estudos ou mesmo uma demissão), faça
a comunicação de tal modo que a pessoa e seus colegas entendam o que foi
decidido.

i) Atuar como guardião da imagem da empresa, interna e externamente


As empresas que conseguem construir uma boa imagem, interna e externa,
têm maior capacidade de atração e de retenção de recursos humanos. Por
isso, é dever do CEO assegurar que essa boa imagem seja preservada e
promovida entre todos aqueles que estejam direta ou indiretamente
relacionados a ela.
Não basta que o CEO seja excelente líder e gestor competente; uma de suas
principais responsabilidades é zelar pela adoção de boas práticas de
governança corporativa. Para isso ele deve ter um conhecimento holístico e
defender a prática, em toda a organização, dos pilares de governança, como
apresenta a gura a seguir.

Figura 5.1 – O CEO e os pilares da governança

Fonte: IBGC (2015).

Uma vez adotados esses princípios, o CEO deve observar outros aspectos
relevantes para a boa imagem da empresa.
Imagem interna: dependerá fundamentalmente da criação de um clima
motivador de trabalho, que tenha como base uma política adequada de
gestão de recursos humanos, uma estratégia empresarial que promova
desa os pro ssionais excitantes e exequíveis, um processo de comunicação
uida na vertical e na horizontal, acessibilidade aos executivos por parte
dos colaboradores e desenvolvimento de um clima competitivo, porém
cordial, pro ssional.
Imagem externa: a base da boa imagem externa é a imagem interna, uma
vez que os principais promotores da organização no mercado são seus
próprios colaboradores. É fundamental que a empresa tenha uma política
de relacionamento com o ambiente externo, principalmente com a
imprensa, que conte com assessoria especializada de relações públicas ou
não. O CEO deve zelar para que as mensagens transmitidas à comunidade
por qualquer pessoa da empresa sejam compatíveis. Para isso são
recomendáveis regras bem estabelecidas, tanto perante a imprensa quanto
perante outros tipos de público. Recomenda-se também a existência de
procedimentos claros e bem conhecidos internamente sobre ações a adotar
no caso de situações emergenciais que envolvam a reputação da empresa ou
seus produtos e serviços.

j) Ser o modelo de executivo que os colaboradores queiram ser


Segundo os mestres da Harvard Business School, nove fatores conjugados
fazem um grande líder:

Integridade
Criatividade
Visão
Julgamento
Comunicação
Conhecimento
Honestidade e transparência
Paixão
Carisma

A mensagem aqui é muito simples e objetiva: CEO, seja um modelo de


pro ssional para toda a organização. Seja um líder educador!

5.2 O papel dos gestores


Gestor é todo pro ssional que tenha um ou mais subordinados e cujo título
pode ser dos mais variados: vice-presidente, diretor, gerente, supervisor,
coordenador, chefe, entre outros.
A principal responsabilidade do gestor é desempenhar as funções atribuídas
à sua área e alcançar os objetivos estratégicos e operacionais para ela
estabelecidos. Como realizar isso? Com gente! Mas quantos gestores se dão
realmente conta dessa realidade e conseguem desempenhar com e cácia
seu importante papel na formação de equipes e no desenvolvimento de
pessoas? Da mesma maneira como o CEO deve ser um modelo de
pro ssional para toda a organização, os gestores exercem o papel de modelo
para sua equipe.
Vimos no Capítulo 4 que diversos fatores in uenciam o desempenho dos
executivos na gestão de seu pessoal. Esses fatores podem formar um círculo
vicioso:

Figura 5.2 – Fatores que influenciam o gestor na gestão de pessoas

Fonte: Elaborada pelo autor.

O que um executivo deve fazer para romper esse círculo vicioso e ser, de
fato, o verdadeiro responsável pela gestão de seu pessoal? Algumas atitudes
e ações, como as descritas a seguir, serão um passo importante nesse
sentido.
Algumas das recomendações feitas para o CEO aplicam-se igualmente aos
gestores:

Entender, absorver e incorporar a cultura, o DNA, e os valores da


organização;
Adotar uma cultura na qual os colaboradores sejam vistos como
ativo e não como custo;
Atuar como coach dos subordinados diretos e ser um líder
educador;
Agir como guardião da imagem interna e externa da empresa;
Em decisões sobre pessoal, agir com a cabeça fria e o coração
quente;
Ser um modelo de executivo para seus subordinados.

Não abordarei aqui novamente esses aspectos, pois eles se aplicam


igualmente aos gestores, mas farei comentários adicionais sobre “ser um
modelo de executivo”. Adicionalmente a esses aspectos, portanto, é papel do
gestor:

a) Conscientizar-se de que ele é o principal responsável pela gestão de sua


equipe, da definição de necessidades à demissão
Gestão de gente não é com o RH. É com você, gestor. Cada executivo é o
responsável direto por gerir sua equipe e deve responder aos seus
superiores pela composição, equilíbrio, desenvolvimento, motivação,
alterações e por outras ações que envolvam seu pessoal, en m, por sua
e cácia. A área de RH deve prover o apoio necessário para que ele possa
desempenhar esse papel, como trataremos mais adiante.
Cada gestor deve, portanto, entender e praticar aspectos fundamentais que
são de sua responsabilidade, e não do RH: as organizações são movidas por
pessoas; equipes sem competência e sem motivação chegam a resultados
inexpressivos; sua formação precisa ser equilibrada com relação ao número
de membros e à diversidade de competências e quali cações; é necessário
apoiar aqueles que dão contribuições positivas, bem como identi car e
afastar os que criam um clima de trabalho ruim (depois de se certi car de
que continuam com essa atitude após terem recebido orientações para
mudá-la).
Há outros aspectos a considerar, como participação ativa em todo o
processo de contratação (de nição de per l, entrevistas, avaliações e
aprovação de contratação); o executivo, não o RH, é o responsável pela
decisão nal; avaliação criteriosa de cada pessoa, antecedida por uma
autoanálise de seu comportamento como chefe; compreensão de ser o
principal educador do pessoal; consciência de que, no aspecto
comportamental, o líder é o executivo; paciência para ouvir a equipe, pois a
ouvidoria não é a área de Recursos Humanos; assunção da responsabilidade
pelas demissões e comunicálas; repetir a si mesmo todos os dias: “eu sou
responsável por minha gente”.

b) Entender o processo de gestão de pessoas e conhecer o plano estratégico


de recursos humanos da empresa (se existente)
Gestão de gente é com o gestor; a área de RH deve prover-lhe ferramentas
e apoio para que possa desempenhar seu papel da maneira mais e caz.
O gestor deve ter isso claro na mente e buscar uma interação continuada
com a área de RH, aplicando suas políticas e sugerindo adequações quando
julgar pertinente. Deve solicitar o suporte do RH para a aplicação dessas
políticas, bem como das metodologias, processos e ferramentas de gestão de
recursos humanos adotados pela empresa ou pedidas por ele para a
melhora do desempenho de sua equipe.
A gestão de pessoas envolve aspectos de liderança e de práticas gerenciais
particulares a cada líder. Independentemente das características de cada
um, o gestor e ciente, alinhado aos princípios defendidos neste livro, deve
obter como resultado uma equipe e ciente, motivada e comprometida com
o alto desempenho de cada área, além de formar pro ssionais que
alcançarão as metas xadas pela empresa, no presente e no futuro.
Os líderes também devem conhecer o enfoque holístico dado ao processo
de gestão de pessoas, que é o modo como a organização administra seus
colaboradores, desde a identi cação de necessidades até a promoção ou
demissão dos indivíduos. A área de Recursos Humanos, assim que um
pro ssional assume sua primeira responsabilidade por uma ou mais pessoas
ou quando se introduz um gestor contratado externamente, deve
possibilitar-lhe um conhecimento profundo de cada etapa do processo de
gestão de pessoal: políticas, procedimentos, responsabilidades, aspectos
legais e outros aspectos relacionados.
Caso exista um plano estratégico de recursos humanos, é fundamental que
uma das primeiras providências seja fazer com que o gestor conheça esse
plano e entenda os fundamentos sobre os quais foi elaborado, assim como o
porquê das estratégias e das ações delineadas para a área pela qual ele se
tornou responsável. No desenvolvimento de futuros planos, o líder deve
participar e contribuir de maneira ativa.

c) Conhecer as competências e as habilidades de seu pessoal, suas


limitações e potencialidades
Ninguém forma uma equipe de alto desempenho se não conhecer muito
bem as competências e as habilidades de cada subordinado direto e, de
modo geral, as características das equipes a eles subordinadas.
Quando assume uma área, o gestor deve consultar o RH para saber se
existem avaliações prévias dos membros da equipe. Caso existam, ele deve
estudá-las. Caso não existam, o líder precisa fazer, em um curto espaço de
tempo, uma avaliação de seu pessoal, com o apoio da área de Recursos
Humanos. De início, deve ser de nido um per l ideal para cada posição
subordinada para, a seguir, proceder-se à avaliação da equipe, usando como
referência o per l ideal, para efeito de comparação. O resultado será um
entendimento claro do potencial de cada subordinado e da equipe como
um todo. Com base nisso, tomam-se decisões sobre ações de adequação e
desenvolvimento de indivíduos, ou até substituição de pro ssionais.
Caso essa avaliação não seja feita de maneira estruturada, o gestor deve
começar a observar atentamente a cada um de seus subordinados e
elaborar suas próprias conclusões sobre características e competências de
sua equipe, bem como planejar as ações necessárias.
d) Adotar boas práticas gerenciais de delegação de responsabilidades, de
trabalho em equipe, de condução de reuniões, de solução de conflitos, entre
outras
Os livros acadêmicos de Administração estão repletos de textos sobre
práticas gerenciais. Ressalto aqui algumas, fundamentais para que um
gestor estruture uma equipe motivada e e ciente.

Delegação: delegar e não cobrar é abdicar. Delegue, con e em


sua equipe, e cobre resultados; mas não o faça a toda hora,
respeitando os prazos estabelecidos. Não discuta problemas com
seus subordinados; discuta soluções. Nas empresas em que dirigi,
nos primeiros dias de minha gestão os executivos vinham à
minha sala porque tinham um problema para discutir comigo. E
eu lhes dizia: “Problemas eu não discuto. Quando você tiver
alternativas de soluções, volte aqui e nós as debateremos”. Se você
não con a em um subordinado para delegar-lhe
responsabilidades ou tarefas, veja se ele está no lugar certo ou se
necessita de orientação.
Tomada de decisões: meu estilo de decisão é democrático até
onde a democracia o permite. Decido sozinho quando há
resoluções que necessitam ser tomadas com brevidade ou quando
não podem ser compartilhadas com a equipe. Se você é o
responsável pela decisão, tome-a. Se um subordinado seu é o
responsável, deixe que ele a tome, mas assuma juntamente com
ele essa decisão. Se for correta, con ra-lhe o crédito. Se resultar
em algo indesejado, assuma com ele a responsabilidade. Não exija
que subordinados acertem sempre; não jogue sobre eles a “culpa”
de uma decisão incorreta. Tome ações corretivas quando alguma
decisão for tomada de maneira irresponsável.
Trabalho em equipe: as pessoas produzem individualmente e
realizam-se quando conseguem o desempenho desejado ou
superior. Mas há situações em que o trabalho colaborativo se faz
necessário, seja para completar uma tarefa pela qual uma pessoa é
responsável, seja porque essa pessoa faz parte de um grupo de
trabalho em alguma tarefa ou em algum projeto compartilhado.
Monte uma equipe e faça com que seus subordinados sejam parte
dela.
Condução de reuniões: as reuniões devem sempre ter um
objetivo, seja uma simples comunicação, seja a apresentação e o
debate de um projeto complexo. Elas precisam ser previamente
estruturadas para que todos saibam qual é a pauta, qual é o
horário de início e o de término. Os participantes devem ter a
oportunidade de se expressar e de emitir suas avaliações. Não
realize monólogos, esteja aberto para o diálogo. Desligue seu
celular e não permita que seus colaboradores utilizem o deles. E
seja o primeiro a chegar ao local do encontro.
Solução de con itos: você já viu colegas discutirem
acaloradamente na empresa, ou mesmo se atracarem sicamente?
O que fazer? A regra geral diz: use o bom senso. Mas bom senso é
relativo. Con itos devem ser analisados com cuidado pelo gestor,
que precisa ouvir as partes envolvidas e buscar soluções lógicas e
não emocionais.

e) Agir com imparcialidade em situações de julgamento e de avaliação de


seu pessoal
No tópico 5.1, abordamos a necessidade de o executivo manter a cabeça
fria e o coração quente quando precisar tomar decisões sobre pessoas. O
gestor deve ser imparcial nos julgamentos que envolvem gente, sejam seus
subordinados ou não. E a ação imparcial deve ser realizada de maneira
transparente, pois in ui diretamente no clima motivacional da equipe.
Favoritismos, protecionismos e interesses particulares não tardam a ser de
conhecimento geral. É difícil explicá-los porque não há explicação
verossímil. Um gestor pode, em um processo de promoção em que dois
candidatos possuem per s semelhantes e estejam igualmente capacitados
para a nova posição, optar por aquele por quem sente maior empatia. Isso é
natural, facilita o trabalho em equipe e não constitui protecionismo. Mas é
necessário que os critérios sejam muito bem entendidos pela equipe e pela
pessoa preterida.

f) Desenvolver um ambiente de trabalho estimulante e desafiador, ao qual os


subordinados sintam satisfação de pertencer; criar espírito de equipe, mesmo
em clima de competitividade interna
Anualmente, centenas de empresas participam do levantamento sobre as
melhores em que trabalhar. Isso se deve, talvez, a três motivos principais: a)
para que seus executivos demonstrem que são competentes na gestão da
empresa e de seu pessoal; b) para estimular os executivos a se dedicarem na
gestão de suas equipes dentro dos princípios defendidos neste livro; c) para
usar a classi cação da empresa no ranking a m de atrair novos
pro ssionais.
Os três motivos são válidos, mas não devem ser usados somente para gerar
estatísticas bonitas. Com ou sem ranking, o fundamental é que o gestor crie
um ambiente de trabalho em que exista espírito de equipe e no qual as
pessoas não apenas se sintam motivadas a vestir a camisa da equipe como
também a tê-la tatuada no corpo. A competitividade dentro da empresa, e
dentro de suas áreas, é sadia quando conduzida adequadamente. E até
mesmo em meio à competitividade é possível criar uma atmosfera em que
impere o espírito coletivo – desde que o gestor construa um ambiente que
estimule os subordinados a dar o melhor de si, satisfazendo as necessidades
da empresa e realizando seus anseios pessoais.

g) Formar sucessores
Vimos que um dos principais entraves à formação de sucessores é o medo
dos executivos em adotar ações nesse sentido. Um gestor que aja dessa
maneira pode ser classi cado como medíocre, não merecedor da posição
que ocupa. Nesse caso a falha é dele, de seus superiores e do RH: ninguém
percebe o fato ou, se percebe, fecha os olhos para isso. Aprendi ao longo de
minha carreira, por meio de exemplos de líderes de sucesso, que:
O melhor executivo é aquele que tem, sob sua liderança, profissionais mais competentes
do que ele em suas especialidades e que trabalha para desenvolver novas competências
e habilidades em todos, ou nos que se destacam e querem crescer mais.

Formar sucessores implica também dar oportunidade aos subordinados


para que ocupem posições em outras áreas da empresa. Desse modo, o
executivo pode encontrar dentro de casa os talentos de que necessita, sem
ter de buscá-los no mercado. Nesse caso, esconder pro ssionais com melhor
desempenho para não os perder é di cultar seu crescimento na
organização, o que resultará, mais cedo ou mais tarde, em sua perda para o
mercado.

h) Ser humilde para reconhecer as próprias deficiências e procurar ajuda


com os superiores ou na área de Recursos Humanos
Um gestor que não reconhece suas necessidades de melhora pro ssional e
pessoal é míope.
O pro ssional que mais cresce é aquele que sabe reconhecer suas limitações
e busca apoio para superá-las. O gestor deve se autoavaliar periodicamente
e assegurar-se de seus limites técnicos, operacionais ou posturais. Esses
limites podem ser pontuais, relacionados a um projeto ou a um evento, ou
recorrentes, resultantes de uma carência de melhor treinamento ou
orientação.
Sempre procurei, em minha vida pro ssional e pessoal, escutar o que
superiores, pares, subordinados ou outras pessoas me diziam a meu
respeito. Já mencionei, no início deste livro, que tive um grande mestre no
início de minha carreira, na Booz & Co., que me deu verdadeiras aulas de
postura pro ssional e de conduta pessoal. Eu o escutava com muita atenção
e o consultei várias vezes ao longo da minha vida pro ssional pós Booz &
Co.
Ao longo da minha carreira procurei maneiras de identi car minhas
limitações e de encontrar meios de superá-las. Quando assumi meu
primeiro papel de líder de uma empresa, a direção geral da Sodexo, eu me
senti isolado. Convidava um grupo de amigos, ex-colegas de Booz & Co.,
para almoçar periodicamente, e com eles trocava ideias. Fui também buscar
ideias com a concorrência, uma prática que sempre adotei nas empresas em
que dirigi. Na ocasião, já despontava como líder de mercado a GR, também
de origem francesa, que havia chegado ao Brasil alguns anos antes e já
impunha um novo padrão de qualidade ao mercado. Desenvolvi uma
relação de alto nível de ética pro ssional com seus dirigentes e obtive deles
diversas e proveitosas recomendações.
Quando assumi a presidência da Interclínicas, nunca havia dirigido ou
realizado trabalhos pro ssionais em empresas de saúde e tive di culdades
iniciais para me comunicar e relacionar-me com sócios e prestadores de
serviços, todos médicos. Procurei ajuda com um dos conselheiros, que me
orientou de uma maneira muito simbólica: “a diferença entre médico e
Deus é que Deus não pensa que é médico”. A partir daí consegui estruturar
meu processo de comunicação com meu principal público, para entendê-lo
e para me fazer entender.

i) Ser um modelo de executivo para os subordinados


A mensagem aqui é muito simples e objetiva: seja um modelo de
pro ssional para toda a organização. Seja um líder educador!
De acordo com Jack Welch, há cinco tipos de chefe que não servem como
modelo para ninguém: 1) o que sabe tudo e, portanto, não escuta; 2) o líder
distante, que se fecha em sua sala e não se mistura com a equipe; 3) aquele
que não respeita seus subordinados e chega até a ser abusivo com eles; 4) o
que é muito bonzinho e não sabe tomar decisões; 5) o que não sabe se
posicionar nem se diferenciar. Em todos eles há uma característica comum:
falta de autoconsciência. E nenhum serve como modelo. Ou melhor, não
posso dizer que não servem como modelo, porque podem sempre servir
como mau exemplo.
Um gestor, a m de ser modelo para seus subordinados tem de levar
seriamente em consideração todos os aspectos abordados nesta seção. Além
disso, deve ainda:
Ser exigente consigo mesmo e com o resultado dos trabalhos de
sua equipe. Mesmo que o trabalho seja estafante, nunca, repito,
nunca demonstre cansaço ou diga que está cansado. Você pode
estar exausto, pressionado, ansioso, mas não passe isso para a
equipe.
Manter um clima demandante e desa ante, que beire o
“desconforto”, mas de forma descontraída, para que as pessoas se
concentrem em suas obrigações e não em suas situações pessoais.
Incentivar aqueles que vestem a camisa. Afastar os que remam
contra a corrente, não aderem aos valores da empresa ou
contaminam negativamente a equipe. Incentive os que estão no
meio-termo e, se não vestirem a camisa, afaste-os.
Delegar responsabilidades e fazer com que seus subordinados se
sintam importantes. Exponha-os a superiores ou em ocasiões em
que possam participar de eventos ou fazer apresentações a outras
áreas da empresa.
Manter uma comunicação aberta e transparente com a equipe.
Desenvolver uma relação empática, mas não paternalista com a
equipe.

5.3 O papel do conselho de administração


O conselho de administração tem assumido um papel mais ativo no
desenvolvimento do capital humano da empresa, começando pela diretoria
executiva e por planos de sucessão, além de procurar entender as políticas
de recursos humanos e o papel da área de RH a m de assegurar a
existência de uma cultura e de ferramentas para atrair, desenvolver e reter
talentos. Em várias situações se instala um comitê de recursos humanos
subordinado ao conselho, do qual faz parte um ou mais conselheiros,
membros da equipe de RH, pro ssionais de outras áreas da empresa e até
consultores externos.
O conselho deve se certi car de que existe uma política consistente de
recursos humanos, alinhada à estratégia e aos valores da empresa, e que
essa política seja uma das prioridades da agenda do CEO.
O conselheiro deve, frequentemente, fazer perguntas como:

Que relevância dá o CEO à área de RH?


A quem se reporta o líder de RH?
Ele tem per l, experiência e competência para prover ao RH a
liderança de que a empresa necessita?
Que papel tem a área de Recursos Humanos no processo de
desenvolvimento da estratégia empresarial? Está participando
ativamente desse processo?
Quais responsabilidades os executivos pensam ter com relação à
gestão do capital humano? Como desempenham essa função?
Como os aspectos de capital humano são tratados no plano
estratégico da empresa?
Temos a melhor equipe para nosso negócio?
Temos um plano de sucessão para os níveis executivos e de
especialistas-chave?

Como corolário dessas considerações sobre o papel do gestor, observamos


que, especialmente no contexto atual de rápidas mudanças sociais e
econômicas, evolução tecnológica e globalização, o líder deve estar muito
atento a esses fatores evolutivos, saber incorporá-los de forma disciplinada à
sua rotina de trabalho e trabalhar junto com as diferentes áreas da
organização, com apoio do RH, para garantir alinhamento estratégico e de
execução. Fatores como esses incluem:
Evolução organizacional: o gestor de uma start-up tem papel diferente de
um gestor de uma empresa já estabelecida. Além do papel do gestor, o
per l dos talentos também será distinto. Na primeira, o gestor personaliza a
organização, e as pessoas buscam, juntas, fazer parte do sonho de
crescimento (dispostos a tomar mais risco em busca de maior retorno). Na
segunda, o gestor representa interesses mais diversos (do passado da
empresa, dos acionistas, do mercado) e sua base de talentos tende a ser
mais diversa.

Per l local versus global: uma organização global exige


entendimento mais amplo de per s de talentos e per s culturais,
e demanda alinhamento estratégico para que todos possam
trabalhar juntos, de modo consistente, em busca do mesmo
objetivo (apesar das nuances culturais e de mercados locais).
Uma organização local tem uma complexidade menor com
relação a isso, mas deve estar atenta ao ambiente externo para
não ser surpreendida por organizações globais entrando no
mercado.
Mudanças nos cenários corporativos: empresas saudáveis hoje
podem estar em situações de estresse amanhã. O gestor deve
entender que nessas situações, a comunicação passa a ser ainda
mais importante, pois as pessoas, muitas vezes, não têm acesso ao
que realmente está acontecendo, e isso pode gerar desconfortos
que prejudicam o desempenho pessoal e o da empresa.
Evolução das gerações: o gestor deve acompanhar a evolução de
diferentes gerações. Os novos millenials, por exemplo, já
representam uma parcela expressiva da força de trabalho;
possuem valores distintos das gerações anteriores: buscam
propósito no trabalho além do salário ou resultado, esperam que
gestores entendam suas necessidades e preferências e adaptem-se
a essas, são menos leais e tolerantes a empresas e práticas não
alinhadas ao que buscam, e são mais adeptos a desa ar práticas
existentes. Os gestores, assim como o RH, devem trabalhar juntos
para adaptar o modelo de atração e retenção de talentos,
buscando sempre alinhamento aos valores das gerações em
questão, sem desalinhar-se da cultura da organização.
Evolução tecnológica: a evolução tecnológica, alinhada aos
valores das recentes gerações, faz com que as pessoas estejam
muito mais abertas a divulgar informações e opiniões que antes
eram tratadas de modo mais privado pela sociedade. Essa troca é
feita diária e instantaneamente e, portanto, o gestor deve
acompanhar e fazer parte dessas tendências para se manter
atualizado e estar pronto para responder questões demandadas
pela população, feitas de modo público e direto por meio das
mídias digitais. A tecnologia pode ainda afetar canais de atração
de pessoas, de comunicação, de treinamento etc. – e a
organização deve acompanhar essa evolução, e saber aplicá-la
rapidamente para manter-se à frente do mercado.

O tema “recursos humanos” deve estar, portanto, entre as prioridades do


CEO e dos gestores. Não se vai a lugar nenhum sem gente. E, sem os
recursos humanos – com as competências e as habilidades de que necessita
a organização para cumprir seus objetivos estratégicos e operacionais –, os
resultados carão sempre abaixo do esperado. Os recursos humanos dão
vida às organizações.
Insisto em um aspecto: os responsáveis pela gestão de RH são os gestores,
não a área de Recursos Humanos. Como abordarei no capítulo seguinte,
essa estratégia garante que a cultura e as ferramentas adequadas estejam
implantadas e disponíveis na empresa. O RH deve reportar-se ao CEO.
Capítulo 6

O papel do RH
As atribuições da área de Recursos Humanos têm evoluído nas últimas
décadas; anteriormente cuidando de procedimentos básicos e burocráticos,
como administrar processos de admissão, controle de registros e emissão de
folha de pagamento, atualmente, tem assumido um papel mais moderno, o
de gestão estratégica do capital humano da empresa. A denominação
também evoluiu: relações industriais, gestão de gente, área de recursos
humanos, gestão de pessoas, área de pessoal, gestão de capital humano. Eu
a denominarei aqui de área de RH ou simplesmente RH.
O que é, hoje, uma área de RH? É, sem dúvida, aquilo que o CEO quer que
seja!
E não adianta inventar. Se o CEO quiser que ela seja uma área estratégica,
ela será; caso contrário, terá papéis menos relevantes na vida da
organização. O RH precisa contar com o apoio da alta direção. Talentos são
recursos estratégicos, e por isso a área de Recursos Humanos deve ser
estratégica, ser parceira dos executivos na tarefa do desenvolvimento de
pessoas.
Abordarei neste capítulo alguns temas relevantes para entender o papel que
a área de RH e o líder devem ter dentro da organização. Não tenho a
pretensão de cobrir tudo, mas, com base em minha experiência como CEO,
os aspectos mais importantes se relacionam com:

Função básica da área de RH


Posicionamento na hierarquia da empresa
Atuação como parceira de negócios
Cultura empresarial
Habilidades e competências
Origem dos gestores das áreas de RH
Oportunidades de carreira
Recompensas
Resistência e paradigmas da área de RH
Posicionamento inadequado dos gestores das áreas de RH

6.1 Função básica da área de RH

“Se o RH não abre seu caminho para incorporar-se ao coração do planejamento


estratégico nas organizações, ele fatalmente estará num beco sem saída de funções
técnicas e transacionais.” (Helen Drinan, ex-presidente da Society for Human Resources
Management)

Da parte estratégica à operação, é função mais do que básica da área de RH


prover todo o apoio à cúpula da empresa e aos responsáveis pelas diversas
áreas funcionais. Desse modo, cada um saberá qual seu real papel na gestão
de gente, fará com que a organização tenha os talentos adequados no
horizonte de tempo necessário e agirá para que esses talentos se
desenvolvam, criando raízes fortes e sadias dentro do ambiente de trabalho.
Como parte de seu papel, compete à área de RH desenvolver ferramentas
de apoio para cada etapa do processo da gestão do capital humano da
empresa e colocá-las à disposição dos executivos, para que eles possam
complementar as atribuições de verdadeiros gestores de seu pessoal.
O mundo dos negócios muda rapidamente. Novos ambientes competitivos
requerem talentos com competências e habilidades adicionais àquelas que
até agora as empresas vinham buscando. Pro ssionais com qualidades
técnicas especí cas, porém exíveis; pessoas com maior nível de autonomia,
dispostas a assumir responsabilidades crescentes; com maior entendimento
holístico do negócio, independentemente de sua função dentro da empresa;
com grande resistência à pressão e mais dispostas a vestir a camisa da
equipe.
Se a função de RH for gerida da maneira tradicional, di cilmente
conseguirá oferecer suporte para que a empresa tenha os recursos humanos
de que necessita. A cadeia de valor de recursos humanos na organização,
da identi cação de necessidades até a demissão, deve ser gerida de maneira
diferenciada. Os CEOs e as áreas de RH que entenderem essa necessidade
e conseguirem prover o apoio exigido pelas novas realidades de mercado
serão, consequentemente, aliados estratégicos e não meros provedores de
apoio burocrático.
Em resumo, uma área moderna de Recursos Humanos deve pensar e atuar
de modo holístico, abrangendo múltiplas responsabilidades, começando
impreterivelmente pelos aspectos estratégicos da gestão de gente. E não
pode a essa área ser destinadas funções que não se sabem a qual
departamento atribuir ou que outras áreas não querem assumir, como
serviços gerais, segurança e outros.
As responsabilidades da área de RH podem ser divididas em estratégicas e
transacionais:

Estratégicas
Agrupam todas as frentes que atraem, retêm e desenvolvem pessoas:

Políticas de RH
Plano estratégico de recursos humanos
Compensação
Recrutamento e seleção
Plano de carreira
Planejamento sucessório
Gestão de talentos
Educação corporativa
Gestão da cultura e do clima organizacional
Gestão de indicadores
Relações com entidades de RH e setoriais

Transacionais
Agrupam todas as atividades operacionais que suportam ou viabilizam as estratégicas:

Folha de pagamento
Benefícios
Relações trabalhistas
Relações sindicais
Medicina ocupacional
Segurança do trabalho
Desenho de processos de gestão de RH

O departamento de Comunicação Interna é fundamental para o


desempenho das atividades da área de RH. Ele pode ou não estar sob a
responsabilidade do líder de RH. E, quando não estiver sob ele, deverá
manter interação direta com a área de RH.

6.2 Posicionamento na hierarquia da empresa


Jack Welch relata que, durante um seminário realizado na cidade do
México, perguntou aos cinco mil participantes: “Quantos de vocês
trabalham em empresas em que o CEO proporciona ao RH um assento na
mesa igual ao do diretor nanceiro?”. Depois de longo silêncio, 50 deles
(1% dos participantes) levantaram a mão. Coincidentemente, trabalhei
durante dois anos no México, e isso não me surpreende; mas vejo no Brasil
uma situação semelhante.
Por que os mexicanos, como relata Jack Welch, e não somente eles, não
levam os executivos responsáveis pelas áreas de RH para a mesa do comitê
executivo de suas empresas? Porque o CEO não as considera estratégicas!
Ou até entende que gente é recurso estratégico, mas não faz com que isso
se re ita na importância dada à área de recursos humanos.
Um amigo, consultor em seleção de executivos, visitou um potencial cliente
que lhe solicitou apoio no recrutamento de um gerente de Recursos
Humanos. Indagado sobre a estrutura da empresa, o CEO lhe apresentou
um organograma em que havia diretores de Administração e Finanças,
Produção, Vendas, Logística e uma gerência de Recursos Humanos
subordinada a um dos diretores. Questionado, o CEO disse que não tinha
tempo para cuidar pessoalmente de assuntos de pessoal. Meu colega disse
que se recusaria a aceitar o projeto se a área não fosse reconhecida como
estratégica e se reportasse diretamente ao CEO, se não zesse parte do
comitê executivo da empresa. Alguém deve ter conduzido o processo e, o
pior, algum pro ssional deve ter aceitado a posição.
O CEO tem de entender que a área de Recursos Humanos deve estar no
mesmo nível hierárquico das demais áreas funcionais da empresa,
subordinada diretamente a ele, fazer parte do comitê executivo e participar
ativamente das atividades de planejamento estratégico. Deve se certi car
também de que a área de RH desenvolve ferramentas e práticas de apoio
necessárias para a condução de programas de recursos humanos na
empresa.
Deve o CEO assegurar também que o pro ssional designado como líder
dessa área possua a vivência, as competências e, principalmente, a
maturidade e a estatura necessárias para se posicionar e debater de igual
para igual com seus colegas do comitê executivo, exercendo plenamente seu
papel estratégico dentro da organização.
O RH deve ter a capacidade de pensar e de agir estrategicamente, ao
mesmo tempo que precisa continuar a prover os serviços administrativos de
suporte comumente demandados às áreas de Recursos Humanos.

6.3 Atuação como parceira de negócios


Gestores de RH devem dedicar tempo para entender a natureza, as
características e as necessidades da empresa, assim como devem visitar as
demais áreas funcionais, conversar com seus colegas e aprender
diretamente com eles sobre suas operações e suas necessidades.
Os gestores de áreas de RH não podem ser vistos como meros prestadores
de serviço, eles precisam ser vistos e respeitados como parceiros de negócios
de seus colegas. Em um mundo empresarial em efervescência, será cada vez
mais comum o fato de os gestores solicitarem o apoio do RH na
alavancagem dos negócios. Aprender, portanto, a linguagem da
organização, entender o mercado em que ela faz parte, saber avaliar os
fatores de sucesso serão aspectos relevantes para que o RH conquiste seu
lugar como parceiro de negócios e sente-se à mesa de decisões estratégicas
da empresa. Somente assim a área de Recursos Humanos poderá aportar
valor signi cativo às suas funções e sair da sombra para um lugar ao sol.
O RH deve olhar para fora da organização – para o meio ambiente, para os
clientes, para os fornecedores – a m de entender como as competências da
empresa podem se diferenciar no mercado. Ao mesmo tempo, precisa olhar
para dentro, com o objetivo de identi car necessidades internas – de gente
e de práticas de gestão de gente – e usar esse conhecimento melhor para
desenvolver a estratégia e as políticas de recursos humanos de que a
empresa necessita.
Os pro ssionais de Recursos Humanos devem pôr a cabeça para fora da
empresa com frequência, participar de organizações externas de RH e de
entidades setoriais que lhes permitam se manter atualizados sobre a
evolução do ambiente de negócios.

6.4 Cultura empresarial


A área de RH tem uma função também estratégica na manutenção ou em
um processo de mudança da cultura empresarial.
Mais do que todos os demais líderes, o líder do RH tem a responsabilidade
de apoiar e até orientar o CEO e os gestores para que os colaboradores
absorvam e incorporem o DNA, a cultura e os valores da organização no
cotidiano. Ele deve cuidar disso desde as fases de recrutamento e seleção,
incorporando esse tema aos programas de integração, treinamento e
desenvolvimento dos colaboradores, de forma continuada.
E, no caso de evolução cultural, a área de RH é a principal guardiã do
processo, atuando junto com o CEO e os demais gestores, para evitar
rupturas culturais que poderão levar a empresa a uma queda de
desempenho ou mesmo a situações indesejadas.

6.5 Habilidades e competências


Seria possível discorrer sobre as várias habilidades e competências
fundamentais para que a área de RH e seus líderes desempenhem com
mestria suas funções. Um estudo desenvolvido pelo IBM Global Business
Services, intitulado “A new aproach, a new capability – the strategic side of
Human Resources” (em português, “Um novo enfoque, uma nova
capacitação – o lado estratégico do RH”), aborda esse tema, re etindo,
fundamentado em uma pesquisa, esse aspecto. Tal estudo identi cou cinco
habilidades e competências fundamentais para que a área de RH se
transforme em uma aliada estratégica dentro da empresa. Elas mudam a
visão do RH, do foco no provimento de apoio transacional para assistir
unidades de negócios e áreas funcionais da empresa no planejamento e na
colocação de pessoal, passa a fazer melhor uso do capital humano atual e
futuro.
Em síntese, habilidades e competências referem-se a:

a. Habilidades analíticas: capacidade de desenvolver e modelar cenários que suportem a


determinação de custos e do impacto ocasionado por mudanças nas políticas e nos
procedimentos de RH da empresa. O estudo identi cou que pro ssionais de recursos
humanos não costumam ter essas capacitações, que estão entre as mais problemáticas a
desenvolver em especialistas de recursos humanos típicos.
b. Capacidade de entender as estratégias do negócio e as operações da empresa: trata-se do
conhecimento da dinâmica da indústria e das características operacionais de cada unidade
funcional, assim como o entendimento sobre como os indivíduos são avaliados dentro de
cada unidade. Também é preciso conhecer as necessidades de clientes e parceiros para
compreender como as decisões sobre gente na empresa afetam as diferentes partes
interessadas além de suas fronteiras.

c. Competências de consultoria: habilidade no desenvolvimento de relações de con ança com


executivos seniores; capacidade de diagnosticar problemas e identi car suas causas;
desenvolvimento de recomendações e de planos de ação para debate com as áreas
envolvidas. E, para que isso seja aceito e respeitado pelos demais setores da organização, o
RH precisa ter força e iniciativa para levar suas mensagens aos colegas, mesmo que sejam
impopulares.

d. Capacidade de agir como catalisador de mudanças: uma vez identi cadas as necessidades de
alteração nas unidades da empresa, a área de RH deve ter estatura, liderança e proatividade
para obter o engajamento dos líderes dessas unidades nas ações de mudança, alinhando
também os sistemas de reconhecimento e de medição de desempenho para a obtenção de
melhores resultados e comunicando essas ações de maneira transparente para as partes
envolvidas.

e. Desenvolvimento e compartilhamento de conhecimento dentro da área de RH: as pessoas de


Recursos Humanos não podem estar em compartimentos estanques. Um processo de gestão
de conhecimento deve ser construído. Além dos conhecimentos desenvolvidos internamente,
deve haver interação com outras áreas de RH e da empresa, na busca de complementar o
conhecimento – que deve ser compartilhado internamente na própria área de Recursos
Humanos.

6.6 Origem dos gestores das áreas de RH


O pro ssional de Recursos Humanos precisa ter a vivência necessária para
poder assistir seus colegas na antecipação de demandas por per s
especí cos de pro ssionais que façam a diferença na empresa. Também
devem ter conhecimento das ferramentas necessárias para garantir um
processo e caz de gestão da cadeia de valor de recursos humanos.
Esse pro ssional, além de ter o conhecimento da disciplina de RH, precisa
ter competência para participar do desenvolvimento de soluções de
complexos temas estratégicos. Ao colocar um pro ssional júnior e
inexperiente nessa função, o CEO estará “dando um tiro em seu próprio pé”.
Para empresas que não possuem esse pro ssional, uma alternativa é levar,
para o RH, pro ssionais com experiência operacional e de negócios que
estejam em outras áreas da empresa, provendo-lhes treinamento adequado
ao entendimento da gestão da área de Recursos Humanos. Muitas empresas
estão descobrindo que o talento de que necessitam existe dentro da
organização, mas fora do RH. Conhecimento sobre os negócios, capacidade
analítica e experiência na gestão de pessoal operacional são qualidades
relevantes, desde que o indivíduo possua capacidade de adaptação a essa
nova função, além das competências básicas para gerir uma área de apoio
voltada para pessoas.
O pessoal de RH não pode ter somente formação em Psicologia ou em
Ciências Humanas. Precisa ter formação diversi cada e vir também das
áreas de negócios. Os responsáveis pelos recursos humanos devem agir
como verdadeiros líderes, e para tal necessitam da estatura e da
credibilidade que somente a maturidade, a senioridade e a experiência lhes
podem conferir. Jovens inexperientes, aos quais uma função tão relevante
confere uma atitude muitas vezes prepotente, não devem ocupar essa
posição.

6.6.1 Onde buscar os líderes de RH

Dentro da empresa, mas fora da área de RH: pro ssionais que conhecem
os negócios e possuem fortes competências estratégicas e analíticas são os
mais indicados. Eles devem ter a capacidade de rapidamente conhecer os
fundamentos da gestão de RH.
Dentro da empresa, na própria área de RH: pro ssionais com per l que
permita a capacitação para a função por meio de um treinamento formal ou
preferivelmente um processo de coaching são os mais adequados. As
características do per l descrito neste capítulo têm de ser preenchidas.
No mercado: esses pro ssionais devem ser procurados no mercado quando,
dentro da empresa, não se identi cam candidatos com o per l adequado
para a posição. Eles devem ter a capacidade de entender rapidamente os
negócios e possuir a experiência de um gestor de RH como de nido aqui,
ou potencial para aprender depressa.

6.7 Oportunidades de carreira


Dentro das perspectivas debatidas aqui, a função de líder de área de RH
torna-se cada vez mais atraente para pro ssionais que até pouco tempo
atrás somente consideravam como alternativa de carreira as áreas de
negócio ou operacionais em uma empresa.
Valho-me aqui novamente do recurso de reproduzir um artigo que re ete
dedignamente essa perspectiva, no qual dois pro ssionais egressos do
curso de mestrado em Administração de empresas (MBA) da Harvard
Business School fazem um relato impressionante sobre por que escolheram
a carreira de RH e o que encontraram no caminho. O artigo “Why did we
ever go into HR? ”, escrito por  Matthew D. Breitfelder e  Daisy Wademan
Dowling, foi publicado na Harvard Business Review, edição de julho/agosto
de 2008; o trecho reproduzido a seguir é parte desse artigo, traduzido para
o português e publicado na edição de julho de 2008 da Harvard Business
Review Brasil.

Porque fomos parar no RH


Por Matthew D. Breitfelder e Daisy Wademan

Embarcamos numa carreira que outros parecem não entender. Quando


falamos de nosso trabalho com nossos colegas da Harvard Business School,
seis anos após nossa graduação, eles sorriem jocosamente e quase sempre
repetem as mesmas perguntas: “Você está fazendo o quê?”. Nós dois
estamos no campo de gestão de capital humano, assistindo nossas
companhias na tarefa de selecionar, treinar, reter e aperfeiçoar suas equipes
de estrelas ascendentes. Traduzindo: trabalhamos em RH.
Uma carreira em recursos humanos não é o destino típico de quem faz um
MBA em Harvard. Em tese, deveríamos ir trabalhar em consultoria de
estratégia ou num banco de investimento – ou, no verdadeiro espírito do
curso, em gestão geral. Até já atuamos nessas áreas – mas não no momento,
e sabemos o que nossos colegas de turma estão pensando: “É para
equilibrar melhor a vida pessoal e pro ssional”. Ou “Eles não têm estômago
para mexer com negócios ‘de verdade’”. Ou, ainda, “Quem não sabe fazer,
ensina”. E, é claro, nossa favorita: “Se estão tão interessados em ajudar os
outros, por que não vão fazer trabalho social?”. Nossa resposta é simples – e
adoramos repeti-la.
O RH se encontra, hoje, no meio da batalha mais fascinante do mundo
empresarial, na qual empresas se digladiam pelo mais valioso dos recursos:
talentos.
Não ria. Partilhamos seu ceticismo, que é saudável. Também estamos
cansados de ouvir empresas proclamando a plenos pulmões que “o pessoal é
seu maior ativo” – quando a maioria mostra pouco empenho real em
desenvolver e alavancar a capacitação desse pessoal. Também estamos
cientes dos estereótipos nada lisonjeiros do pro ssional de RH – aquela
pessoa que cuida de detalhes burocráticos – e do fato de que muitos papéis
tradicionais da área, como a gestão de benefícios, são cada vez mais
terceirizados.
Só que o custo estratosférico de encontrar e contratar pro ssionais hoje em
dia – para não dizer os milhões de dólares em produtividade imaterializada
devido à falta de envolvimento do funcionário no trabalho – sublinha a
necessidade de se dedicar mais tempo e mais recursos ao cultivo e à gestão
do maior ativo da empresa. Isso ganha ainda mais importância à medida
que o setor de serviços, com seu uso intenso de capital humano, segue
crescendo; à medida que aumenta a mobilidade do trabalhador e que o
deslocamento lateral, para alguns, se torna mais atraente do que subir de
nível; à medida que a geração do pós-guerra deixa postos de comando,
reduzindo a oferta de gestores experientes; e à medida que a geração do
milênio traz novas expectativas para o local de trabalho. Em suma, a tese há
muito defendida de que o RH assumiria papel realmente estratégico
nalmente está se concretizando.
Não conseguíamos entender, portanto, por que não ouvíamos quase nada
sobre a gestão de talentos na prática, embora quase todo presidente de
sucesso que se apresentava perante nossa turma na faculdade dissesse que
era importante atrair e formar talentos – e que os 10% a 20% do total de
seu tempo dedicado a isso era a parte mais grati cante de seu trabalho. Mas
as coisas estão mudando.
Com a gestão de talentos assumindo papel mais fundamental na empresa, o
RH está deixando de se concentrar exclusivamente na gestão das alavancas
monetárias dos recursos humanos – remuneração, benefícios e outras
despesas – e se dedicando a aumentar o valor do capital humano, medido
por fatores intangíveis como o envolvimento do funcionário. Surge um
novo tipo de pro ssional de RH para tocar esse departamento repaginado,
alguém que entende a fundo não só de processos de gestão de talentos, mas
também a estratégia e o modelo de negócio da organização – alguém
responsável por contratar e treinar gerentes de marketing, digamos, mas
que saiba, também, como montar um bom plano de marketing.
[...] Na faculdade nos ensinaram a buscar oportunidades menosprezadas de
investimento e a gerar valor em lugares inesperados. Só que,
diferentemente dos colegas atrás de um bom negócio na área de private
equity ou em fundos de hedge, o ganho maior, a nosso ver, está na
complexa tarefa de identi car, atrair, desenvolver e empregar pro ssionais.
A nosso ver, o RH em si é um ativo subavaliado e subvalorizado – ativo a
ponto de viver considerável valorização. Assim como o investidor bom para
farejar pechinchas – que aprendemos a ser na faculdade –, quisemos chegar
cedo.

6.8 Recompensas
Gestores de RH precisam de objetivos desa adores, como qualquer outro
executivo, e de recompensas pelo cumprimento desses objetivos, assim
como ocorre com os gestores nanceiro, comercial, operacional e outros.
A nal, compete a eles dar todo o apoio para que a empresa tenha o quadro
de pessoal necessário para cumprir suas metas. Isso pode ser baseado, por
exemplo, em um balanced score card que contenha metas como:

Resultados nanceiros e operacionais da empresa (a nal, gente é


o que possibilita que a organização atinja seus objetivos);
Elaboração/atualização de um plano estratégico de recursos
humanos compartilhado com a equipe de executivos da empresa;
Comunicação efetiva da visão e dos valores da empresa a todos os
colaboradores, de forma direta e em cascata com os gestores;
Nível de satisfação de empregados (em %) e clima de trabalho;
Redução da rotatividade de pessoal (em %);
Índice de higiene e segurança;
Implementação de programas de segurança no trabalho;
Outros.

6.9 Resistência e paradigmas da área de RH


Tive a oportunidade de presenciar muitos gestores de RH adotarem
atitudes de conforto e passividade no provimento de serviços de curto
prazo às demais áreas da empresa. Da mesma maneira, observei que essas
áreas se davam por satisfeitas com a assistência que obtinham da área de
RH.
Executivos alheios às suas responsabilidades de gestores de sua gente, ou
menos conscientes disso, avaliam a área de RH pela e ciência na solução de
problemas processuais administrativos ou no provimento de apoio de base,
como cursos de treinamento, organização de eventos e outros. Nesse
ambiente, os pro ssionais de RH sentem que o fator fundamental para que
mantenham uma boa imagem perante seus colegas é satisfazer suas
demandas pontuais, mantendo um bom nível de serviços de administração
dos processos burocráticos.
Um líder moderno de RH não pode ter receio de promover as funções de
sua área dentro de um per l estratégico. Sei que é uma tarefa difícil. Se o
CEO não o vir assim, faça com que isso aconteça ou procure outro lugar
para trabalhar, superando a barreira do comodismo e da estabilidade que o
emprego lhe proporciona.

6.10 Posicionamento inadequado dos gestores


das áreas de RH
Mais do que a re exão da experiência vivida, exprimo aqui minha
reprovação à atitude inadequada que tive a oportunidade de observar em
alguns líderes de RH. Esses pro ssionais se travestiam de “reizinhos”,
manipulando indivíduos e suas carreiras de maneira furtiva e sem que os
executivos tomassem conhecimento dessa ação nefasta – provavelmente
porque não entendiam seu papel como verdadeiros gestores de pessoal e
porque não mantinham diálogo produtivo com seus subordinados. Vi
gestores de RH assumirem posição de poder de modo negativo, incitando
intrigas internamente e tornando-se com frequência a causa de elevado
turnover de talentos.
Esse tipo de pro ssional se pavoneia em um papel de iminência parda, sem
conhecimento do CEO – ou até com o conhecimento consensual dele –,
fazendo e desfazendo carreiras dentro da organização. Adora ser bajulado e
demonstrar um poder que transcende suas responsabilidades e sua
delidade com a empresa.
Os executivos podem, inadvertidamente, alimentar essa atitude quando
não entendem seu papel como gestor de pessoas, entregando à área de RH
o papel de confessor ou de orientador pro ssional e de carreira de sua
gente, contrariando tudo que abordamos no capítulo anterior.
Por outro lado, gestores de RH não podem se considerar especialistas em
tudo que concerne ao desenvolvimento organizacional, dizendo a seus
colegas de outras áreas o que devem ou não devem fazer. Isso não é
trabalhar como um aliado de negócios. Uma falha comum, que resulta
nessa distorção, é a delegação à área de RH a tarefa de analisar de maneira
contínua a estrutura organizacional da empresa e de desenvolver
recomendações para sua reestruturação ou para sua racionalização. Raros
pro ssionais conseguem fazer isso de modo não comprometido com a
posição de colegas na organização. E o pior é que são analistas com pouca
experiência, senão trainees, que conduzem esses estudos.
No outro extremo, os gestores de RH se comportam de maneira
estritamente burocrática, acreditam que seu papel é organizar ações de
sociabilização e monitorar minuciosamente a observância das regras e dos
regulamentos de administração de pessoal.

6.10.1 O RH no conselho de administração

Observei anteriormente que os conselhos de administração têm


incorporado o tema gestão de pessoas com mais intensidade nos últimos
anos. E, como consequência disso, tem crescido o interesse pela
incorporação de conselheiros com experiência em RH. Não são muitos, mas
alguns consultores em seleção de executivos reportam que há empresas que
começam a demandar esse per l de conselheiro.
Por que isso não ocorria antes? Muito simples: pela somatória de vários dos
fatores mencionados anteriormente neste capítulo, principalmente pela
carência de pro ssionais de RH em posições estratégicas nas empresas e,
portanto, não possuindo um per l de mais alto nível que é demandado a
líderes de primeira linha e a membros de conselhos de administração. E,
não se preparam para participar desse órgão de gestão; muitos estão
fazendo os cursos de formação de conselheiros, principalmente no Instituto
Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), mas isso não é su ciente.
Além de ter tido uma posição hierárquica que tivesse possibilitado ao
pro ssional de RH estar participando das decisões estratégicas da empresa,
o seu per l tem de incluir:
Visão estratégica do negócio e da indústria;
Visão de necessidades estratégicas de pessoas;
Domínio de toda a cadeia de gestão de pessoas;
Iniciativa e proatividade para assumir riscos;
Capacidade de raciocínio holístico para tomada de decisões;
Capacidade de análise econômico- nanceira;
Entendimento do funcionamento de conselhos e de aspectos
relacionados à governança corporativa.

6.11 Um olhar ágil para gestão de pessoas


Abordamos até aqui o papel do RH dentro do seu processo evolutivo do
mero administrador de pessoal para um participante da estratégia da
empresa e seu envolvimento como parceiro de negócios. Esse papel evolui
continuadamente e começa a assumir o chamado “RH Ágil”, já praticado
em empresas de diferentes segmentos e portes. E esse papel está
intrinsicamente relacionado à própria evolução do ambiente de trabalho em
um mundo que se transforma a cada dia.
O  Fórum Econômico Mundial é um dos fóruns anuais mais relevantes,
reunindo os principais líderes políticos e empresariais do mundo, para
debater realidades e tendências políticas, econômicas e socioambientais
globais. Realiza-se em Davos, Suíça. No evento de janeiro de 2020, o
Fórum destacou dez habilidades para o futuro do trabalho, assim
apresentadas:

1. Solução de problemas complexos


2. Pensamento crítico
3. Criatividade
4. Gestão de pessoas
5. Relacionamento interpessoal
6. Inteligência emocional
7. Julgamento e tomada de decisão
8. Orientação de serviço
9. Negociação
10. Flexibilidade cognitiva

Nos capítulos anteriores tratamos algumas dessas habilidades quando nos


referimos à gestão de pessoas, destacada no Fórum como a quarta
habilidade. E as demais, como devem impactar em nossos comportamentos
daqui para frente?
Entendemos que teremos de investir de forma ágil em nossa capacidade de
aprender, desaprender e reaprender, pois várias das habilidades apontadas
– criatividade, relacionamento interpessoal, inteligência emocional,
julgamento e tomada de decisão e exibilidade cognitiva – estão
intimamente ligadas ao quanto nos conhecemos, e também com a
tendência de um mundo envolvido pela VUCA (Volatilidade, Incerteza,
Complexidade e Ambiguidade), e serão fundamentais para conquistar
novos resultados com e para as pessoas.
Na carona disso tudo, a área de Gestão de Pessoas deve passar a contribuir
de forma mais criativa, ágil e necessariamente colaborativa para os negócios.
Um novo olhar se estabelece para isso e paradigmas devem ser quebrados.
A nal, aprender, desaprender e reaprender cabe aos pro ssionais dessa
área, assim como para todos os envolvidos na gestão de pessoas.
Mas como a área de Gestão de Pessoas deve se reposicionar diante desse
cenário? O que signi ca um RH Ágil?
Estamos evoluindo para um mundo que necessitará fortemente de um ser
humano com novas habilidades para responder às demandas da indústria
4.0, a era digital e ao mesmo tempo em que as organizações devem se
reestruturar para questões tecnológicas e comportamentais.
Novos papéis surgem para os pro ssionais da área de Gestão de Pessoas em
resposta a essas demandas advindas, em especial, dos avanços tecnológicos
e da necessidade de transformação do ser humano para tal. E, mesmo que
essas habilidades ainda sejam consideradas tendência, já se apresentam ao
menos como conceitos importantes na evolução do aprendizado sobre
gestão de pessoas, entre eles:

Design inking – moderniza o ambiente de trabalho ao trazer o


pensar coletivo com base em experiências vivenciadas na jornada
do colaborador.
Design organizacional – amplia competências organizacionais das
equipes para redesenhar planos, formatos de negócio,
investimentos e outros aspectos para a realização de uma
determinada estratégia.
Cocriação – dá voz na solução de problemas simples ou
complexos de forma criativa e colaborativa.
Ágil – e outras metodologias utilizadas pela área de Tecnologia da
Informação. Metodologia Ágil é um recurso utilizado no
desenvolvimento de so ware e dá ênfase à comunicação entre
equipes.
RH Ágil – voltado para o desenvolvimento de so ware, cujo valor
gerado é a maximização dos uxos de trabalho. Isso pode ser feito
adotando-se técnicas como a  Kanban, uma das práticas mais
comuns para se adotar o Ágil.

A perspectiva é, portanto, que haja uma evolução na atuação da área de


Gestão de Pessoas, que passa a se relacionar cada vez mais com
ferramentas, metodologias de treinamento, recrutamento e seleção, gestão
do desempenho e, consequentemente, soluções e fornecedores que
incorporam a transformação digital, inteligência arti cial e novos métodos
na obtenção de resultados. Isso traz oportunidades para que a área enfoque
questões relevantes para o momento, considerando que as pessoas estarão
no centro de todo o processo de evolução das atividades em um mundo em
frequente transformação. A diversidade deve estar em meio a essa leitura
de pessoas. As atividades burocráticas, as rotinas operacionais e excesso de
papel tendem a dar espaço a um caminho Ágil de respostas às demandas da
gestão no mundo VUCA.
Em 2018, um grupo de pro ssionais de Gestão de Pessoas de todo o
mundo, sendo um deles, Josh Bersin, fundador da Deloitte, criou um
Manifesto do RH Ágil, que endereça apropriadamente o novo momento
para a área.

Manifesto para o Desenvolvimento Ágil de RH

Estamos descobrindo melhores maneiras de desenvolver uma cultura de trabalho, fazendo


isso e ajudando outros a fazê-lo também. Por meio deste trabalho, passamos a valorizar:

Redes colaborativas, mais do que estruturas hierárquicas


Transparência, mais do que sigilo
Adaptabilidade, mais do que prescrição
Inspirar e comprometer-se mais do que gerenciar e reter
Motivação intrínseca mais do que recompensas extrínsecas
Ambição, mais do que obrigação

Ou seja, apesar de reconhecermos valor nos itens à direita de cada um


desses aspectos, valorizamos mais os itens à esquerda.
Bersin explica o que signi cado que dá para cada um desses componentes
do Desenvolvimento Ágil de RH:

Mais redes colaborativas menos hierarquia – o “nós” passa a ser


mais relevante do que o “eu”. Organizações ágeis possuem
estruturas leves, uidas e colaborativas.
Mais transparência menos sigilo  – comunicação e transparência
entre discurso e prática.  Quanto mais informações são
compartilhadas e disponíveis, melhor as pessoas podem se
informar e agir de acordo.
Mais adaptação menos prescrição –  estímulo à autonomia e à
criatividade.
A área de Gestão de Pessoas deve sair desse papel de dona do
conhecimento e única especialista em pessoas, para um papel de
catalisadora das transformações, parceira do negócio.
Mais inspiração e engajamento, menos gestão e retenção –
 engajamento com olhar de “experiência do empregado”. Avaliar a
experiência do empregado como a do cliente do negócio – eNPS
(employee Net promoter score).
Mais motivação intrínseca, menos recompensas extrínsecas –
cresce a necessidade de mudar os ambientes onde nos
relacionamos, e não somente pensar em recompensar o
indivíduo, o qual tende a encontrar ambientes com propósito,
autonomia e excelência (ver mais em Motivação 3.0 – A
surpreendente verdade sobre o que nos motiva de Daniel H.
Pink).
Mais ambição, menos obrigação –  organizações ágeis fazem o
necessário para agregar valor ao cliente.

O Manifesto busca inspirar não só a área de Gestão de Pessoas, mas todos


os gestores, pois valoriza um olhar humano na forma de construir uma
nova jornada para as pessoas nas organizações. Tem como objetivo construir
ambientes onde a colaboração resulta no crescimento e no bem comum.
Resumidamente, RH é aquilo que o presidente da empresa quer que seja.
Se o CEO não considerar estratégica a área de Recursos Humanos, se não a
supervisionar diretamente, o desenvolvimento de um plano consistente de
RH ca comprometido. CEOs necessitam elevar a gestão de RH ao mesmo
nível de pro ssionalismo, competência e integridade das demais áreas.
A área de Recursos Humanos não pode desempenhar o papel de um
simples provedor de serviços à organização e aos gestores. Ela deve assumir
atitudes proativas, seja no planejamento, seja na execução da estratégia de
recursos humanos, como a busca por ferramentas mais e cazes de gestão de
pessoal e na sua interação com os gestores. Ela deve se preocupar em
identi car, contratar, desenvolver e manter o pessoal da organização, assim
como apoiar os gestores na busca pelos melhores pro ssionais dentro e fora
da empresa.
O RH não pode assumir superpoderes, prejudiciais à organização. O CEO
deve monitorar esse tipo de comportamento. E, caso os gestores o
observem, devem levar o fato ao conhecimento superior. Tentar conversar
com o líder da área de RH será perda de tempo.
Se a área de RH não for diretamente subordinada ao CEO e se o líder dessa
área não tiver um per l de gestor estratégico, é hora de repensá-la. Caso o
CEO admita que a área é estratégica e que seu líder não responde à altura,
precisa substituí-lo. Isso não signi ca demiti-lo. É possível realocá-lo na
empresa.
Se o gestor de RH perceber que o CEO não dá o devido valor à área, e
como não pode substituir o CEO, o melhor é procurar outra empresa para
trabalhar.
“Uma vez que as pessoas são o fator mais relevante para o negócio, o que
poderia ser mais importante?” (Jack Welch).
Capítulo 7

As responsabilidades do gestor e
a judicialização trabalhista
O papel do gestor não se limita às suas responsabilidades de liderança de
equipes na busca por resultados para a empresa, mas envolve também
aspectos relacionados com a legislação e a judicialização trabalhista. O
gestor tem de estar cada vez mais atento aos fatores que originam essas
ações e trabalhar intensa e intimamente com a área de Gestão de Pessoas e
com o Jurídico da empresa para evitar que elas ocorram.
As questões de ordem trabalhista seguramente constituem uma das maiores
fontes de litígios para as empresas, sem falar no volume de obrigações que
devem ser observadas em tal área, o que é agravado pelas scalizações e
autuações das delegacias do trabalho. Soma-se ainda a atuação do
Ministério Público do Trabalho, que ajuíza ações civis públicas envolvendo
temas complexos e altos valores.
Ex-funcionários ou mesmo funcionários têm encontrado na Justiça do
Trabalho respaldo para suas reclamações trabalhistas, justi cadas ou não. E
encontram, primeiramente, advogados, alguns idôneos e outros meramente
oportunistas, que os auxiliam a estruturar os casos contra as empresas. E, na
sequência, juízes que podem julgar as causas de forma imparcial e justa, e
outros que, sem conhecimento adequado de causa ou simplesmente para
proteger o trabalhador, acabam dando ganho a este, em detrimento da
empresa, trazendo a esta prejuízos nanceiros e muitas vezes também de
imagem.
A gestão de pessoas deve, portanto, também observar uma série de cautelas
para que não sejam agravados os riscos das empresas relativamente a
contingências de ordem trabalhista, preocupação esta que deve ser tomada
considerando-se todo o corpo de colaboradores da empresa, e não somente
aqueles que integram a equipe do gestor da área em questão.
Abordaremos aqui três aspectos relacionados ao tema deste capítulo:

Responsabilidade legal do gestor


Motivadores mais frequentes de processos trabalhistas
Mecanismos de prevenção e de proteção

7.1 Responsabilidade legal do gestor


Contingências de valores elevados podem decorrer de omissão da área de
RH com relação às questões trabalhistas ou ao trato inadequado destas,
re etindo-se também nas atitudes de gestores mal orientados. Exemplo
disso é o número crescente de ações de reparação por dano moral,
normalmente por força de assédio das mais variadas espécies – como
excesso de punição, assédio sexual, assédio moral em particular ou expondo
o colaborador perante colegas etc.
Além dos prejuízos que a empresa pode sofrer em razão de problemas de
cunho trabalhista, de ordem nanceira e até de imagem, é sabido que nesta
área o processo de cobrança de valores devidos a colaboradores por força de
decisão condenatória é dos mais céleres e agressivos, conforme se veri ca
pelo uso crescente do expediente conhecido por “penhora on-line”, o qual
pode atingir o patrimônio de gestores, notadamente os de nível de alta
direção, chamados legalmente de administradores, e até de acionistas
controladores, caso a empresa não tenha fundos para fazer frente ao débito
em causa. Desde a reforma trabalhista de 2017, as pessoas têm sido mais
criteriosas ao mover processos, tendo em vista o risco de condenação ao
pagamento de honorários de sucumbência.
É assentado no âmbito da Justiça do Trabalho que o colaborador não deve
correr os riscos do negócio, diferentemente de sócios e administradores, de
tal modo que, na cobrança de valores devido àquele, estes últimos podem
ser chamados a responder com seu patrimônio, ainda que sequer tenham
tomado conhecimento do processo.
Por tudo isso, não somente é recomendável, mas mandatório que a área de
RH contemple em suas atividades a adoção de medidas para mitigar os
riscos trabalhistas, especialmente os relacionados ao exercício do poder
punitivo e às situações que possam provocar dano moral aos colaboradores.
Nesse aspecto, é obrigação da área de RH levar ao conhecimento dos
gestores o conteúdo dos principais aspectos da legislação trabalhista e os
riscos envolvidos para ele e para a empresa. E compete ao gestor estudá-los
e entendê-los, pois, de acordo com o artigo 3º da Lei de Introdução às
normas do Direito Brasileiro: “Ninguém se escusa de cumprir a lei,
alegando que não a conhece”.
A consolidação das leis do trabalho foi editada há mais de 70 anos, época
em que grande parte dos brasileiros vivia no campo e era composta por
analfabetos. Ao longo dessas décadas o Brasil mudou substancialmente. A
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) sofreu algumas modi cações
pontuais e uma profunda reforma em 2017, mas remanesce o
entendimento de que o trabalhador é o elo mais fraco da relação de
emprego e, mesmo que ocupe alto cargo, merece a guarida da Justiça do
Trabalho.
Embora possa parecer tratar o óbvio, não custa abordar (para alertar!), de
forma simpli cada, os aspectos gerais relacionados aos requisitos da relação
de emprego e sugerir algumas medidas preventivas que podem ser adotadas
por qualquer instituição que contrata mão de obra empregada.
Não é toda e qualquer pessoa que presta serviços a determinada empresa
que preenche os requisitos da relação de emprego; muitas delas podem
estar vinculadas a um prestador de serviços e não preencher todos os
requisitos necessários à con guração desta relação. Um gestor deve ter
plena ciência desses requisitos para reduzir os riscos de pleitos judiciais
requerendo o reconhecimento de vínculo empregatício ou, até mesmo, de
aplicação de multa por descumprimento da legislação trabalhista ou
con guração da preocupante terceirização ilícita. A relação de emprego
poderá ser caracterizada se, e somente se, preencher, concomitantemente,
os seguintes requisitos:
O serviço é prestado por pessoa física: o empregado que
desenvolve o trabalho deve ser pessoa natural;
A prestação é efetuada com pessoalidade pelo trabalhador: o
trabalhador não pode ser substituído por terceiro;
A prestação de serviços não pode ser esporádica: a atividade deve
ser desenvolvida de forma contínua/habitual e permanente;
O serviço deve ser prestado com onerosidade: o trabalhador deve
receber pela atividade;
O trabalhador deve efetuar sua atividade sob subordinação: deve
prestar serviços conforme direção/orientação do empregador.

A subordinação traz um aspecto de extrema relevância a qualquer


instituição: todo e qualquer gestor que é escolhido para prestar orientações
aos colaboradores representa, para todos os ns, a própria empresa. Assim,
as medidas implementadas pelos gestores, mesmo que eles não integrem o
quadro societário da instituição, são, em último caso, a concretização da
vontade da própria entidade empregadora, que assume a responsabilidade
por todas as orientações dadas aos seus empregados.
Além desses temas, a área de RH e o gestor devem levar em consideração
que há vários aspectos relacionados à legislação trabalhista os quais se não
forem observados e seguidos, trarão consequências igualmente danosas
para a organização. Notadamente:

Isonomia no trabalho
O respeito à jornada de trabalho
E outros aspectos prescritos por lei

7.2 Motivadores mais frequentes de processos


trabalhistas
Diante desse cenário, é importante que as empresas adotem medidas
preventivas para reduzir seus riscos trabalhistas, sendo que a mais
importante, sem sombra de dúvidas, é a manutenção de regras escritas e
acessíveis aos empregados. Regras que tratem da utilização de redes sociais,
uso de imagem, download de materiais da rede mundial de computadores,
discriminação e aplicação de penalidades são relevantes, trazem maior
segurança à relação de emprego e acabam reduzindo os questionamentos
dos empregados.
O fácil acesso à tecnologia digital aumentou a captação e utilização de
imagens, tanto pelos empregados quanto pelo empregador. O empregador
deve ter muita cautela ao utilizar imagens de seus empregados,
providenciando, em termo próprio, autorização expressa para sua utilização
para ns institucionais. Recomenda-se que a utilização de imagens para ns
comerciais seja precedida de autorização especí ca, com indicação da
destinação e forma de utilização da imagem. Em qualquer um dos casos, o
empregador deve evitar utilizar imagem que, de alguma forma, ofenda a
honra do colaborador.
Uso de imagem também se aplica ao colaborador. Ele não pode divulgar
imagens da empresa sem sua autorização e o uso que ele possa fazer de
imagens que deponham contra seu empregador pode levá-lo a sofrer sérias
sanções.
A captação de imagens por colaboradores também deve ser objeto de
ponderação de todo empregador, especialmente os que prestam serviços a
terceiros, como os consumidores. É muito comum que colaboradores,
mesmo imbuídos de boa-fé, captem imagem de terceiros ou de outros
colaboradores e compartilhem em redes sociais. Passado algum tempo, as
empresas podem ser surpreendidas com ações requerendo o ressarcimento
por danos morais ou materiais. Portanto, o colaborador deve ter cuidado
com a divulgação de fotos ou outras imagens em suas redes sociais. Não é
por mero acaso que Warren Bu et, uma das maiores fortunas do mundo e
notório investidor em diferentes empresas, enfatiza: “Perca dinheiro da
empresa e eu serei compreensivo. Perca uma migalha da reputação e eu
serei impiedoso”.
No que tange às redes sociais e utilização de celulares, a instituição deve
avaliar quais regras são adequadas à sua realidade. Dependendo da
atividade desenvolvida, o empregador não tem como proibir o acesso a
essas novas tecnologias, mas pode, de toda forma, restringir e orientar seu
uso.
Nos últimos anos, observamos um aumento substancial de reclamações
trabalhistas pleiteando condenação do empregador por omissão na adoção
de medidas para evitar que determinado empregado sofra discriminação no
ambiente de trabalho. Às vezes, uma brincadeira que parece inofensiva
pode sujeitar o empregador ao pagamento de indenização por danos
morais.
O gestor deve estar muito atento para identi car essas situações. Um dos
melhores termômetros é a conversa com o empregado que está se sentindo
lesado. Salvo raras exceções, ninguém levará ao conhecimento de qualquer
gestor situação que não esteja lhe causando um dano efetivo. Assim, por
mais inofensiva que possa parecer a situação, se o colaborador a levou ao
conhecimento do gestor, deve-se apurar os fatos e veri car quais medidas
podem ou devem ser adotadas. Vide também observações a esse respeito
no Capítulo 12, seção “Gestão de Con itos”.
Vale destacar as alterações trazidas nos últimos anos pela Lei n.
13.429/2017 e pela Lei n. 13.467/2017. Muito embora não tenham alterado
diretamente o disposto da CLT, que trata do reconhecimento de vínculo
empregatício pela presença dos elementos caracterizadores da relação de
emprego, essas leis trouxeram maior segurança jurídica em face de
jurisprudência equivocada do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
A Lei n. 13.429/2017, que alterou a Lei n. 6.019/1974, dispõe sobre o
trabalho temporário e, em seu artigo 2º, prevê expressamente a
terceirização de serviços determinados e especí cos, sem qualquer
referência à atividade- m ou atividade meio (expressões utilizadas pela
jurisprudência do TST). A citada lei determina que “não se con gura
vínculo empregatício entre os trabalhadores, ou sócios das empresas
prestadoras de serviços, qualquer que seja o seu ramo, e a empresa
contratante”, bem como que “a empresa prestadora de serviços contrata,
remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores, ou
subcontrata outras empresas para realização desses serviços”. 
A Lei n. 13.467/2017, denominada Reforma Trabalhista, quando trata da
terceirização de serviços, complementa o texto da Lei n. 13.429/2017,
quando deixa clara a possibilidade de contratação de prestação de serviços
por terceiros em qualquer atividade da tomadora de serviços, permitindo
expressamente a terceirização da atividade- m.
De todo modo, é sempre bom ter em mente que, presentes os requisitos
ensejadores da caracterização do vínculo de emprego (pessoalidade,
habitualidade, onerosidade e subordinação), a terceirização pode ser
questionada perante a Justiça do Trabalho.
Para con gurar terceirização lícita não é su ciente apenas alinhar os
documentos se, na prática, a forma de atuação indica a inexistência de
autonomia real por parte dos eventuais prestadores de serviços e a
existência de subordinação.

7.3 Mecanismos de prevenção e de proteção


É recomendado (para não soar imperativo) indicar quais serão os
procedimentos de apuração de infrações às regras da instituição e quais
serão as penalidades aplicáveis aos colaboradores, divulgando-os a toda a
organização. Ao empregador, contudo, não basta criar as normas de sua
instituição, é preciso estabelecer mecanismos que permitam a plena ciência
de seu teor aos empregados, além de procedimentos que comprovem a
adoção dessas medidas.
Assim, ao contratar um colaborador, deve-se rmar um termo de
compromisso, por meio do qual esse colaborador declare ter plena ciência
das regras da instituição. Como na Justiça do Trabalho vigora o “princípio
da supremacia da realidade” – quer dizer que o que vale é o que realmente
acontece, e não o que está escrito –, não basta que o empregador apenas
colha a assinatura de seus empregados, é preciso garantir que essas regras
sejam realmente incorporadas à cultura da organização e seguidas por
todos.
Os colaboradores que não aderirem e não cumprirem as regras da
organização podem ser punidos pelo empregador com advertência,
suspensão do contrato de trabalho ou demissão por justa causa. Contudo,
ao aplicar qualquer penalidade, o empregador deve avaliar, caso a caso, a
gravidade da infração, a boa-fé do empregado, a lesão sofrida e a
reincidência do infrator. Ao optar por aplicar qualquer penalidade, o
empregador deve adotar os procedimentos para aplicá-la assim que tiver
conhecimento da falta cometida pelo empregado.
A demora do empregador em aplicar a penalidade pode dar causa a sua
desconsideração na esfera judicial. Assim, a adoção de medidas imediatas é
fundamental para a segurança no exercício do poder punitivo do
empregador.
Resumidamente, o empregador pode aplicar três tipos de punições aos
empregados:

Advertência por escrito: a advertência deverá ser enviada ao


empregado por escrito, devendo ser colhida sua assinatura e
mantida uma via em seu prontuário.
Suspensão do contrato de trabalho: deverá ser realizada por
escrito, nos mesmos moldes da advertência. O prazo da
suspensão deverá variar de acordo com a gravidade da falta
cometida, não podendo ultrapassar 30 dias.
Demissão por justa causa: dependendo da gravidade da falta
praticada e das provas encontradas.

Aspecto relevante a ser levado em consideração é a gradação da punição a


ser aplicada. Por exemplo, não pode ser aplicada a demissão por justa causa
ao empregado que chegou atrasado pela primeira vez; deve-se aplicar
advertências escritas por, ao menos três oportunidades para, a partir daí,
dar ensejo à aplicação de demissão por justa causa. Contudo, se a infração
cometida pelo empregado for classi cada como grave, há margem para
aplicação desse tipo de demissão. O importante é que as demissões por justa
causa sejam avaliadas caso a caso e que o empregador colha todas as provas
necessárias à aplicação dessa medida. Observações a esse respeito serão
também feitas no Capítulo 11.
De acordo com a CLT, várias faltas são classi cadas como graves; entre elas:
atos de improbidade; negociação habitual por conta própria sem permissão
do empregador, e que possa causar prejuízos à empresa; condenação
criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido
suspensão da execução da pena; violação de segredo da empresa; ato de
indisciplina ou de insubordinação; abandono de emprego; e várias outras.
Constitui igualmente justa causa para dispensa de empregado a prática,
devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios
à segurança nacional.
Ainda no que se refere à demissão por justa causa, deve-se observar
aspectos que passaram recentemente a sofrer alterações na forma de julgá-
los. Por exemplo, recomenda-se que o empregado que sofra de alcoolismo
não seja demitido por justa causa, pois, recentemente, a justiça trabalhista
passou a considerar a embriaguez habitual como doença, garantindo ao
trabalhador o afastamento por auxílio-doença para tratamento.
Finalmente, diante do atual cenário envolvendo a terceirização,
recomenda-se que as empresas que contratarem terceiros para desenvolver
atividades em seus estabelecimentos mantenham condições que não
possibilitem a con guração da relação de emprego (pessoalidade,
habitualidade ou continuidade, onerosidade e subordinação). Outra
precaução que deve ser tomada é relacionada ao pagamento de verbas
trabalhistas: cabe ao contratante veri car o regular recolhimento de Fundo
de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e pagamento das demais verbas
trabalhistas, sob pena de responder subsidiariamente por estas obrigações.
O objetivo deste capítulo não é exaurir o tema das responsabilidades do
gestor e a judicialização trabalhista, mas sim trazer à tona diferentes
aspectos a ele relacionado, pois observam-se dois fatores que somados
podem trazer re exos negativos para a empresa e para o gestor:

1. A judicialização trabalhista, ainda que em queda após a reforma de


2017, continua com tendência protecionista ao empregado
demandante, o qual, na maioria das vezes ainda sai como vencedor,
envolvendo valores vultosos a serem pagos pelo empregador.
2. São raras as empresas que têm programas voltados para orientar os
gestores sobre suas responsabilidades legais e sobre os re exos
prejudiciais que podem advir para a empresa e para eles caso não
tratem de forma adequada seu pessoal, seja durante o período em que
estão trabalhando, seja no momento de um desligamento ou até
mesmo depois de saírem da empresa.
Capítulo 8

O plano estratégico de recursos humanos


De no como plano estratégico de recursos humanos um plano de ação que possibilite à organização manter, de
maneira continuada, o capital humano de que necessita, com o per l adequado, em todos os níveis; um plano
capaz de identi car as ações primordiais que, uma vez implementadas, permitam atração, desenvolvimento,
motivação e retenção das pessoas certas para os momentos certos na vida da empresa. Não é o plano da área de
RH, mas sim o plano de recursos humanos da organização.
Nos capítulos anteriores foi abordado qual deve ser o papel do CEO e dos gestores com relação à gestão de
gente e qual o papel estratégico do RH na empresa. Os princípios expostos nos tópicos anteriores são
fundamentais para o sucesso da gestão de pessoas em qualquer organização.

Quadro 8.1 – Papel do CEO, dos gestores e do RH na gestão de pessoas

Papel do CEO Papel dos gestores Papel do RH

Formar e consolidar a cultura em que gente é Atuar como verdadeiros gestores de sua Ser parceiro estratégico, entendendo os
ativo e não custo. Assegurar que a gestão de gente, desde a definição de negócios e as necessidades das áreas.
pessoas seja feita pelos gestores e que a área necessidades até a demissão. Criar Prover ferramentas e apoio para que os
de RH possua relevância estratégica na clima de trabalho estimulante e gestores tenham as pessoas adequadas
organização. desenvolver espírito de equipe. quando necessitarem delas.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Se esses princípios não forem seguidos, não se deve investir tempo em desenvolver um plano estratégico de
RH, pois ele permanecerá sem função e sem aplicação. Neste capítulo, abordarei os aspectos que considero
fundamentais no planejamento e na implementação das ações que levam à disponibilização das pessoas
necessárias para o sucesso de uma organização.

8.1 Plano estratégico da empresa como fundamento para o plano


estratégico de RH
Não existe vento favorável para o veleiro cujo timoneiro não conhece seu destino.
Se não soubermos para onde a empresa vai, qualquer plano de recursos humanos é inútil. Algumas partes de
seu conteúdo podem dar algum resultado, mas de maneira acidental. Da mesma forma, de nada adiantará
desenvolver uma consistente estratégia empresarial se não houver pessoas adequadas para conduzi-la – gente
com o per l apropriado e comprometida com os resultados a alcançar viabilizará a implementação do plano
estratégico de negócios.

Figura 8.1 – Interdependência entre as estratégias de negócios e de RH

Fonte: Elaborada pelo autor.


A seguir, faço um resumo de aspectos que considero relevantes sobre estratégia empresarial, pois esta é uma
ferramenta fundamental para o desenvolvimento do plano estratégico de RH.
A formulação da estratégia empresarial pode ter diferentes complexidades, demandar levantamentos e análises
com profundidades variadas, requerer maior ou menor dedicação de tempo dos pro ssionais. Mas deve ter,
sobretudo, um conteúdo objetivo, prático, realista e exequível, que envolva participação e comprometimento da
equipe gerencial e de outros colaboradores.
Há diversas de nições de estratégia. Particularmente, gosto de duas:

Estratégia segundo Michael Porter Estratégia segundo Prahalad e Hammel

Estratégia é o caminho para criar e sustentar posição Muitos defendem que estratégia é compatibilizar recursos com
competitiva vantajosa e exclusiva no mercado. oportunidades.

É exercer opções excludentes na competição: escolher o que Na realidade, estratégia é o estabelecimento de metas que forçam a
não fazer. empresa a buscar resultados além do que seus executivos imaginam
ser possível.

É criar compatibilidade entre as atividades da empresa. Ela


depende do desempenho diferenciado das atividades e da
integração entre elas.

Tenho minha própria de nição de estratégia, que capta a essência do ensinamento desses mestres de maneira
um pouco mais resumida: estratégia é desenvolver, implementar e sustentar vantagens competitivas em
mercados evolutivos.
Em uma organização, são as pessoas as responsáveis por desenvolver, implementar e sustentar vantagens
competitivas. Pessoas medianas elaborarão estratégias inexpressivas; uma equipe de ponta desenvolverá e
implementará uma estratégia vencedora. E não há inteligência arti cial (ao menos por enquanto) que consiga
inovar com constância, que reinvente periodicamente vantagens competitivas para a empresa.
Uma estratégia de negócios bem fundamentada possibilitará:

Tomar as melhores decisões, nos momentos certos;


Prover direcionamento, foco, motivação;
Otimizar relações e sinergias internas;
Alocar recursos de forma racional;
In uenciar mudanças no ambiente de negócios;
Possibilitar antecipação, monitoração e reação a acontecimentos.

A participação dos gestores no desenvolvimento do plano estratégico de negócios é fundamental para que sua
implementação seja exequível e para que se obtenham os resultados almejados. Essa participação permite um
alinhamento dos vetores estratégicos para o sucesso do negócio, em convergência com a missão, com a visão e
com os valores da organização.

Figura 8.2 – Alinhamento estratégico


Fonte: Elaborada pelo autor.

Ao participar intensamente da formulação do plano estratégico empresarial, os gestores se comprometem com


sua execução. Como diz o provérbio chinês: “Conte-me e eu tomarei conhecimento. Mostre-me e eu
acreditarei. Envolva-me e eu me comprometerei”.
Finalmente, estratégias nada valem se as empresas não souberem como implementá-las. E elas somente podem
ser colocadas em prática com sucesso com a participação intensa daqueles que a desenvolveram, os verdadeiros
responsáveis pela de nição, pela execução e pelo acompanhamento do plano de ação estratégico – as pessoas.
Por ser o fator humano tão relevante no sucesso da implementação da estratégia de negócios, essa estreita
simbiose entre o plano estratégico de recursos humanos com a estratégia da empresa faz com que a área de RH
tenha um papel tão ou mais estratégico que os demais setores da empresa.
Nesse cenário, o plano estratégico de recursos humanos entra como um componente fundamental durante o
processo de formulação do plano estratégico de negócios.
O plano estratégico de recursos humanos não espera a conclusão do plano estratégico da empresa para ser
elaborado. Começa a ser concebido no início da análise do ambiente externo, pois ali se identi cam fatores que
poderão in uenciar na captação, no desenvolvimento e na retenção de gente, aliados a fatores inerentes ao
ambiente interno da empresa, e culminando com seu alinhamento nal com a estratégia de negócios escolhida.

8.2 As preocupações do CEO com relação ao planejamento de


recursos humanos
Sempre me preocupei com a necessidade de suprimento de pessoas com competências e qualidades adequadas
para todos os níveis das empresas em que dirigi, fossem diretores, gerentes, auxiliares de cozinha, supervisores
regionais, enfermeiros, operadores de call center, montadores em linha de produção etc. Focar somente nos
níveis superiores é um equívoco que pode custar muito caro para a organização.

Figura 8.3 – O processo de desenvolvimento da estratégia


Fonte: Elaborada pelo autor, segundo modelo da General Electric.

O que deve preocupar um CEO e, por conseguinte, todos os gestores da organização e a própria área de RH,
no que diz respeito a formar e manter uma equipe de alto desempenho, pode ser resumido assim:

Figura 8.4 – As preocupações do CEO com relação ao planejamento de recursos humanos

Fonte: Elaborada pelo autor.

Cada “preocupação” é desdobrada a seguir.

Alinhamento com a estratégia da empresa

Alinhamento e convergência das ações de RH com a estratégia corporativa, que contemple as


necessidades prioritárias.
Estratégia de recursos humanos que permita à empresa diferenciar-se no mercado.
Políticas de RH realísticas e competitivas para atrair, motivar e reter pessoal.
Cultura e valores disseminados, entendidos e impregnados em todos os colaboradores.

Suprimento de necessidades
Equilíbrio entre as necessidades de demanda de pessoal e as atividades de suprimento.
Banco de dados de RH que identi que potenciais e emergentes.
Aproveitamento dos recursos internos.
Atratividade da empresa para recrutamento externo.
Formação de sucessores em cada área da empresa.
Administração do processo de envelhecimento e de aposentadoria da força de trabalho.
Compatibilidade da rotatividade de pessoal com as empresas de melhor desempenho e maneiras de
reduzi-la.

Formação de equipes com espírito de equipe

Formação de equipes cujos componentes complementem suas competências e seus conhecimentos,


convergente com a cultura da organização e praticando seus valores.
Clima de trabalho colaborativo e em equipe.
Clima organizacional e motivação do pessoal.

Avaliação

Sistema de avaliação impessoal, adequado às necessidades da empresa.


Avaliação entendida por todos – avaliadores e avaliados – e aplicada sistematicamente.
Indicadores de desempenho consistentes com os objetivos empresariais e pessoais esperados de cada
colaborador.
Reconhecimento de empenho (esforço individual, colaboração, espírito de equipe) e não somente de
desempenho.

Desenvolvimento

Programas de treinamento e desenvolvimento compatíveis com as necessidades de curto, médio e


longo prazos.
Visão clara, por parte dos colaboradores, sobre suas possibilidades de crescimento na organização,
para que saibam identi car suas próprias necessidades de desenvolvimento.
Necessidades de desenvolvimento identi cadas pelos gestores, em conjunto com a área de RH.
Programas especí cos para gestores de maior potencial e melhor desempenho e para pro ssionais-
chave.
Programas e ações para pessoal não enquadrado nessas categorias.
Programas de coaching de superior para subordinado.
Remuneração

Sistema de remuneração e de benefícios competitivo, e caz e muito bem entendido por toda a
organização.
Fluidez de processos de gestão de RH.
Processos de gestão de pessoal que primem pela racionalidade e pela funcionalidade.
Terceirização onde ela seja viável de modo funcional e econômico.

8.3 Interação do RH com as áreas de negócios na formulação das


estratégias empresarial e de recursos humanos
Há uma estreita interdependência entre o plano estratégico empresarial e o plano estratégico de recursos
humanos e uma forte subordinação deste para com aquele. Pode-se até ter uma estratégia empresarial sem um
plano estratégico de RH correspondente (sua execução poderá, entretanto, estar comprometida), mas não
existirá uma estratégia implementável de recursos humanos sem a formulação prévia de uma estratégia de
negócios.
Os líderes das áreas de Recursos Humanos precisam traduzir a estratégia de negócios em estratégias de
recursos humanos de sucesso. Estas podem até in uenciar a nalização do plano estratégico da empresa, pois
os negócios são movidos por pessoas.
É importante separar o plano estratégico de recursos humanos (gente) do planejamento da área de RH. A
primeira trata da estratégia de pessoas e de sua adequada disponibilização para todas as necessidades da
empresa, a segunda de ne as ações necessárias para que a área de Recursos Humanos cumpra seu papel. A
área de RH, assim como todas as demais áreas da empresa, deve ter seus próprios planos de ação.

8.4 Estratégia de recursos humanos e planejamento da área de RH


Figura 8.5 – Interação do plano estratégico do capital humano e planejamento da área de RH

Fonte: Elaborada pelo autor.

O líder de Recursos Humanos e as pessoas-chave de sua equipe devem participar ativamente de todas as etapas
da formulação do plano estratégico empresarial. Assim, podem desenvolver uma estratégia de pessoas
convergente com as necessidades da estratégia de negócios. Caso a empresa possua várias divisões de negócios,
as pessoas-chave da área de RH devem participar das respectivas equipes que desenvolverão as estratégias de
cada divisão.
Pode parecer óbvio, mas o plano estratégico de RH necessita ser apresentado, debatido e aprovado pelo CEO e
pela diretoria executiva da organização.
Os responsáveis por sua implementação são os gestores de área, não o RH. Este instrumentaliza, apoia, controla
e provê orientação às demais áreas, para que não haja desvios na execução do plano e, consequentemente,
re exos negativos no sucesso do plano estratégico empresarial.

8.5 Componentes essenciais de um plano estratégico de RH


Não inicie um plano estratégico de recursos humanos dissertando sobre o papel da área de RH na empresa:
missão, visão, valores. Assuma que esse é um dado de base e que o papel do RH é aquele que de nimos no
Capítulo 5 e resumimos no início deste capítulo. Não comece, tampouco, a dissertar sobre oportunidades e
ameaças para a área de RH, sobre fatores críticos de sucesso para essa área e sobre outros aspectos a esta
relacionados. Deixe isso para o nal do plano, cubra somente as ações estratégicas que a própria área de RH
deverá conduzir para poder cumprir seus objetivos.
O foco do plano estratégico de RH não é a área de RH, são as pessoas que trabalham na organização.
O plano estratégico de RH deve ser objetivo e simples, cobrir o que é essencial no planejamento e na execução
das ações referentes ao suprimento de recursos humanos para a organização. Cuidado com a palavra
“estratégico” – muitas vezes ela induz a elucubrações que transcendem o lado prático e racional de um plano
de ação, induzindo à elaboração de documentos com conteúdo muito mais extenso do que seria necessário
para um plano de ação.
Esse plano deve ter o nível de detalhamento que a empresa e seu momento exigem, compatíveis com a agenda
do CEO e com as suas preocupações. Identi co a seguir componentes que podem fazer parte do plano. Digo
que podem fazer parte do plano, porque, dependendo da maturidade da empresa com relação à formulação de
suas estratégias de negócio e de recursos humanos, uma parte dos itens a seguir pode já ter sido abordada em
planos anteriores e não necessita ser tratada novamente, pois se refere a estratégias que seguem vivas ou
precisam somente de ajustes.
O conteúdo pode incluir:

a. Resumo do plano estratégico da empresa


Identi cação dos principais componentes e orientações do plano estratégico da empresa e suas implicações com
os recursos humanos necessários para o sucesso dos negócios. Essa é a base para o planejamento estratégico de
recursos humanos.

b. Análise SWOT (dos termos em inglês strengths, weaknesses, opportunities, threats) de pessoal (e não da área
de RH)
Visualização das forças, debilidades, oportunidades e ameaças inerentes ao posicionamento da empresa com
relação ao seu capital humano atual e futuro. É uma análise relativa aos recursos humanos da empresa, e não
de sua área de Recursos Humanos.
Cada componente deve ser resumido em um máximo de oito pontos, que devem cobrir os itens mostrados no
esquema a seguir.

Quadro 8.2 – Análise SWOT de pessoal


Fonte: Modelo clássico de análise SWOT adaptado pelo autor.

c. Identificação das necessidades de recursos humanos por área da empresa


Com base nos planos de desenvolvimento de cada setor, a área de Recursos Humanos, juntamente com os
responsáveis por cada área funcional, identi ca os per s e a quantidade de pessoas necessárias para a
implementação do plano de ação estratégico da empresa e resume essas necessidades no plano de recursos
humanos.

d. Identificação de cargos e de posições-chave


Identi cação de cargos e de posições que merecem prioridade. Pode ocorrer que a posição de um pro ssional
que não tem responsabilidade de liderança sobre uma equipe seja chave; em uma empresa cuja atividade seja a
produção de papel-moeda, a posição de um perito em desenvolvimento de matrizes e ferramental será tão ou
mais importante que a de um líder de produção, pois são talentos raros no mercado.

e. Planejamento de sucessão e recrutamento externo


O plano deve relacionar as posições-chave para as quais será necessária sucessão ou recrutamento externo
(processos pré-identi cados para promoção, transferência ou outros fatores), assim como deve expor a
metodologia a ser usada para efetuar a sucessão. Não se descreve aqui o processo sucessório da empresa nem o
recrutamento externo, ou suas políticas correspondentes, mas sim as necessidades mais relevantes de sucessão
e recrutamento.

f. Identificação das necessidades de treinamento interno ou externo


Com base nas necessidades de pessoal, na identi cação de cargos e de posições-chave e no planejamento de
sucessão, de nem-se os recursos que serão supridos internamente e aqueles que a empresa terá de buscar no
mercado.
Há empresas que celebram convênios com universidades para estruturar e ministrar cursos de especialização
para atividades, geralmente técnicas, das quais ela necessita frequentemente e para as quais haja escassez de
pro ssionais graduados e/ou com experiência no mercado. A empresa conduz o processo de recrutamento dos
pro ssionais que serão escolhidos e farão o curso como bolsista. Terminado o curso, a empresa contrata aqueles
pro ssionais que se destacarem nesse processo educativo.

g. Necessidade de revisão de políticas de RH e aprimoramento de processos de gestão de pessoal


Se as políticas e os processos de RH já existem e funcionam normalmente, não é necessário repetir nenhum
tipo de re exão sobre eles. Basta mantê-los e monitorá-los. Neste ponto, re ro-me a banco de dados de
pessoal, recrutamento, seleção, remuneração, plano de carreira, avaliação, rotatividade, indicadores de
desempenho, terceirizações e outros.
As necessidades evolutivas da empresa podem demandar, porém, adaptações nas políticas e nos processos.
Nesse caso, devem ser feitas apenas intervenções nos tópicos que requerem mudança estratégica. O plano deve
identi car essas necessidades e de nir prioridades. Se uma empresa entra, por exemplo, em um negócio que
guarda pouca correlação com suas atividades tradicionais, demandando, portanto, um modo diferenciado de
gestão dos recursos humanos, poderá exigir políticas e processos de RH especí cos. Nesse caso, as necessidades
são identi cadas no plano estratégico de recursos humanos e os detalhes operacionais farão parte de um plano
de ação especí co da área de Recursos Humanos.

h. Ações necessárias junto com os gestores das áreas


A área de Recursos Humanos deve avaliar como estão os gestores e focar suas responsabilidades com relação à
gestão de seu pessoal, conforme expusemos no Capítulo 5.
O RH deve prever quais ações devem ser realizadas para que os gestores sejam realmente “empossados” nessas
responsabilidades.

i. Definição e priorização de projetos específicos


As diferentes necessidades gerarão atividades consolidadas em projetos especí cos. O plano deve de nir e
priorizar esses projetos sem, entretanto, entrar em detalhes sobre cada um deles, o que deve ser feito em
descritivos separados.

j. Indicadores de desempenho
A monitoração e a medição dos resultados da implementação do plano estratégico de RH devem ser feitas
durante todo o processo de execução. Para isso, precisam ser estabelecidos indicadores de desempenho
estratégicos para cada conjunto de ações. O Balanced Score Card (BSC), que possibilita o estabelecimento de
indicadores quantitativos e qualitativos, é uma das ferramentas mais utilizadas para isso.

k. Orçamento e plano de ação


O plano estratégico de recursos humanos deve ter seu próprio orçamento e um plano de ação para
implementação. O plano de ação deve ter indicações claras das ações, de seus responsáveis e do prazo para
execução.

l. Plano de ação da área de RH


Agora, sim, o plano deve enfocar a área de RH e suas necessidades de adequação, de maneira objetiva e
concisa. Tendo em vista todas as atividades de nidas, deve-se analisar a estrutura e os métodos de trabalho da
área de Recursos Humanos, identi cando os ajustes necessários para que se tenham condições de cumprir
objetivos, de acordo com o que foi apresentado no Capítulo 5. No plano estratégico de RH devem estar
re etidas as ações estratégicas relativas à própria área de Recursos Humanos, e não projetos e ações
operacionais, os quais devem compor um plano de ação operacional da área de RH.
O plano estratégico de recursos humanos deve, portanto, ser abrangente, cobrir todos os aspectos-chave da
disponibilidade de pessoal, para possibilitar que a estratégia corporativa seja implementada com sucesso. Deve
ser prático, simples, objetivo. Seu foco são os recursos humanos da organização e não a área de Recursos
Humanos. Seu foco é a atração, o desenvolvimento e a retenção de pessoal.
Ele guarda estreitas interdependência e subordinação com o plano estratégico da empresa. O plano dos
negócios orientará a formulação do plano de pessoal. E o plano estratégico de recursos humanos, com sua
formulação e sua execução, será fundamental para o sucesso do plano de negócios. Sem pessoal com per l
adequado, no tempo adequado, os negócios correm risco de não se concretizar.
A área de Recursos Humanos, como parceira de negócios dos diversos setores da empresa, deve participar
ativamente do desenvolvimento do plano estratégico empresarial ou multidivisional. Começa aqui o papel
estratégico da área de Recursos Humanos.
Quem implementa o plano estratégico de recursos humanos são os gestores, verdadeiros responsáveis pela
gestão de gente na organização. A área de RH provê as ferramentas, o know-how e o apoio para que os gestores
desempenhem com e cácia seu papel.
Capítulo 9

Da atração à retenção
A arte de atrair consiste em convencer o candidato de que o per l dele
converge sinergicamente com a necessidade da posição, que ele se realizará
nela e que a empresa é um excelente lugar para se trabalhar.
A arte de reter inclui um conjunto de políticas e práticas que envolvem o
comportamento dos gestores e a atuação da área de RH.
Embora muitas empresas cuidem desses aspectos de maneira estruturada,
com necessidades e per s bem de nidos e conduzindo o recrutamento de
modo metodológico, ainda há situações em que pessoas são contratadas
apenas com base em sua experiência, sem que se leve em consideração suas
características pessoais ou a adaptabilidade ao cargo, ou simplesmente
porque alguém a conhece: “Pode contratar que ela é boa!”.
Boa para quê? Muitas decisões sobre contratações ainda são tomadas com
base na rede de relacionamentos dos indivíduos, sem avaliar que valor
agregado eles podem levar para a empresa. Com frequência, as organizações
se esquecem de olhar para seu próprio capital humano antes de ir buscar
gente no mercado.
Da mesma maneira, políticas estruturadas e gestores adequadamente
capacitados podem garantir boa parte do sucesso da retenção de pessoal. Ter
boas políticas não basta, se os gestores não souberem como motivar e
trabalhar na retenção de suas equipes, as pessoas permanecerão na empresa
até encontrar uma alternativa fora dela. O inverso também é válido.
Contratações equivocadas ou processos de desenvolvimento e de promoção
inadequados levam a consequências como tempo anormal dedicado por
superiores para orientação ao subordinado, atividades com resultados abaixo
do esperado, investimento em treinamento em pessoas que não se
aproveitarão dele, questionamentos por parte dos demais membros da
equipe e, principalmente, desgaste do executivo que contratou esse
pro ssional e que se depara com uma situação delicada sobre como se
desfazer dele.
Alguns cuidados devem ser tomados desde a atração até a retenção de gente
em uma organização. Esse processo pode ser assim esquematizado:

Figura 9.1 – Cadeia de valor de gestão de pessoas

Fonte: Elaborada pelo autor.

Neste capítulo, abordaremos as etapas: atração, seleção, integração, avaliação,


promoção e sucessão, manutenção e remuneração. Devido às suas
peculiaridades, e por não serem tão sistematizadas, são abordadas em
capítulos especí cos as etapas desenvolvimento, demissão e motivação (ou
como tratar gente como gente).

9.1 Atração
A atração começa pela de nição criteriosa das necessidades da posição e do
per l necessário para o preenchimento do cargo, para que se contrate uma
pessoa que venha a ter alto desempenho. Isso vale para qualquer nível
hierárquico, do CEO ao responsável pela limpeza.
No começo da minha gestão como CEO da Sodexo do Brasil, tive a
oportunidade de contratar um pro ssional de Recursos Humanos, Jair
Arruda, com quem trabalhei em perfeita sintonia e com quem também
muito aprendi sobre a arte de gerir pessoas. Na ocasião, tínhamos altíssimo
índice de rotatividade de pessoal, um dos mais altos do setor, e baixíssima
produtividade (medida em número de refeições por dia servidas por cada
um de nossos funcionários), além de custos elevados como resultado de
desperdícios.
Jair se incorporou às equipes de cozinha, trabalhando efetivamente em
nossas operações dentro de clientes, conhecendo a fundo as operações e as
pessoas que nelas trabalhavam, buscando também identi car as causas
desses problemas. Duas foram as causas identi cadas. A principal delas: um
processo de seleção inadequado, sem critérios. Quando se necessitava, por
exemplo, de um auxiliar de cozinha, simplesmente se colocava um anúncio
na porta do cliente ou em jornais do bairro. A entrevista com os candidatos
era feita pelo próprio gerente da unidade, que não havia sido treinado para
isso e sequer possuía um guia de orientação para avaliação e escolha de
pessoal.
Sua decisão, em geral, recaía sobre aqueles que tinham disponibilidade
imediata de trabalho e moravam perto da unidade.
Com a necessidade de ganhar algum dinheiro, qualquer desempregado se
apresentava e acabava sendo contratado. Um pedreiro, por exemplo, cuja
vocação natural não era trabalhar em uma cozinha industrial, era contratado
como auxiliar de cozinha, para lavar panelas. Na primeira oportunidade que
ele encontrava para trabalhar em uma construção, ia embora. E casos como
esses eram frequentes.
Como consequência disso, e de uma inadequada capacitação dos gerentes de
unidades para exercer o papel de gestor, os processos internos às cozinhas
sofriam rotineiras descontinuidades. Eventuais treinamentos realizados eram
desperdiçados pela rotatividade de pessoal; o gerente da unidade e seus
colaboradores mais estáveis tinham de sair de suas funções para cobrir
lacunas e não sobrava tempo para gerenciar o processo de produção.
Após essa avaliação, o primeiro passo conduzido por Jair foi elaborar um
plano estratégico de pessoal. Isso porque, a problemática já existente
agravar-se-ia de modo substancial como resultado de planos muito
agressivos de expansão, que se concretizavam rapidamente. Duas ações
prioritárias foram desenvolvidas em paralelo: um programa de capacitação
de gerentes de unidade e um processo estruturado de recrutamento e
seleção.
Para o processo de seleção, Jair liderou um grupo de trabalho que de niu o
per l ideal para cada posição. Com base nesse per l, foram criados critérios
de pré-eliminação de candidatos, procedimentos de entrevistas e aplicação
de testes vocacionais. A equipe da área de Recursos Humanos trabalhava em
estreita colaboração com os gerentes de unidade, orientando-os sobre como
proceder e aplicando as ferramentas de avaliação desenvolvidas. Depois de
alguns meses, chegamos a um dos mais baixos índices de rotatividade do
setor e a uma alta produtividade por funcionário.
O programa de capacitação dos gerentes que foi elaborado em paralelo é
abordado mais adiante, quando tratamos sobre o desenvolvimento de
pessoas.
Atrair e selecionar pessoal adequado começa, portanto, por uma de nição
criteriosa das necessidades do cargo e do per l dos pro ssionais a contratar.
Essa de nição deve ser feita pela área de Recursos Humanos juntamente
com o responsável pela área requerente.

9.1.1 Necessidades do cargo

Faça uma descrição simples, que contenha a essência das atividades e


responsabilidades do cargo, além de aspectos relacionais com outras áreas.
Enfatize o que é mais importante e não entre em detalhes relativos a
aspectos menos relevantes, pois isso leva a uma distração na hora de avaliar
candidatos.
Coloque como parte da descrição os desa os e os objetivos da área
requerente.

9.1.2 Perfil profissional e pessoal

Estabeleça o per l com as principais características exigidas: experiência


geral, experiência especí ca, conhecimentos, competências pessoais, grau de
escolaridade, particularidades especí cas.
Enfatize as competências desejadas (tema detalhado na próxima seção),
lembrando que essa é uma das partes mais importantes da avaliação.
Aspectos comportamentais mostram como a pessoa se adequará à cultura da
organização e seu potencial de realização sob a óptica de missão, visão,
valores e estratégia da empresa.
Muitas vezes, quando traçamos o per l de alguém para uma posição,
pensamos em características como “jovem, agressivo, com potencial para
crescer”. Pense bem. Se você é dono de uma pequena empresa e necessita de
um gerente de controladoria, talvez seja melhor buscar uma pessoa com
mais idade, com uma carreira mais sólida. Você até pode contratar um
jovem, mas ele não permanecerá por muito tempo. Olhará para cima e verá
que não tem como subir.

9.1.3 Enquadramento salarial e fontes de candidatos

De na em que nível salarial o pro ssional se encaixará e os benefícios que


ele receberá e determine claramente a remuneração variável e seus
parâmetros, se existir.
Uma vez de nidos o descritivo do cargo, o per l do pro ssional desejado e
seu enquadramento salarial, o próximo passo é a identi cação das fontes de
candidatos (interna ou externa) e sua atração.
A fonte interna é o primeiro lugar em que se deve buscar o candidato. A
área de RH, com seus bancos de dados de recursos humanos e os
conhecimentos internos, é o principal meio de identi cação de candidatos.
Fontes externas diferem de acordo com o nível e o per l dos pro ssionais
desejados. Caso se busquem executivos de nível mais alto ou de média
gerência, por exemplo, as fontes são empresas de seleção de executivos,
referências pessoais, redes de relacionamento, empresas de outplacement,
entidades setoriais e temáticas e alguns sites especí cos. Se a procura recair
em pro ssionais mais jovens, as fontes podem ser empresas de recrutamento
especializadas nesse nível de pessoal, universidades, sites de oferta de
currículos, feiras de emprego, referências pessoais e redes de relacionamento.
E, cada vez mais, as redes sociais ocupam espaço importante na divulgação
de vagas e na identi cação de candidatos.
Para atrair candidatos que tenham o per l desejado, a mensagem deve ser
objetiva, clara e atraente. A atratividade da mensagem se torna ainda mais
importante quando a empresa não tem uma marca de renome, mas necessita
atrair candidatos com per s diferenciados. Destaca-se também que cresce o
número de empresas que oferecem programas estruturados para trainees e
para estagiários como forma de atrair candidatos de maior potencial; e esse
tipo de oferta agrada muito aos jovens.
Deixe muito claro, também, os valores da empresa para que os candidatos
possam avaliar se eles fazem parte de seus valores pessoais e se ele quererá
trabalhar nessa empresa.

9.2 Seleção
“Cada cabeça, uma sentença”, diz um ditado popular. E isso é verdade
quando se trata da tomada de decisão com base em informações subjetivas.
É assim, de maneira subjetiva, que muitos gestores ainda se comportam para
escolher candidatos a vagas em suas áreas.
No outro extremo, situam-se testes variados em qualidade e em
profundidade. E são tantos que já nos perdemos entre testes de
personalidade, psicológicos, psicométricos. Defendo a aplicação, mas não o
exagero de muitos pro ssionais de Recursos Humanos.
Antes de abordar aspectos que considero relevantes em um processo de
seleção, tratarei do tema “competências”, tão antigo, tão falado, tão usado e
ainda mal-entendido e praticado erroneamente por muitos gestores.
Assim como se escolhem árvores em um jardim pela beleza de seus galhos,
folhas e ores, tradicionalmente se avaliavam, e ainda se avaliam,
pro ssionais por suas habilidades e seus conhecimentos, ou seja, a parte
mais visível do ser humano. Entretanto, para que se obtenha um
posicionamento adequado dos indivíduos nas organizações, e melhor
produtividade e e cácia de cada um, é necessário avaliá-los por um conjunto
de competências pessoais, intrínsecas a cada pessoa.
Competências são um conjunto de valores, atitudes, habilidades e
conhecimentos que levam as pessoas a obter alto desempenho. Portanto, são
uma referência para a formação de equipes e para o desenvolvimento do
capital humano da organização. Trata-se de características pessoais que vão
de aspectos íntimos até conhecimentos e habilidades adquiridos e
modi cáveis.
Ingressei na Arthur D. Little logo depois de a empresa adquirir a Innovation
Associates, fundada por Peter Senge, que assessorava seus clientes em
processos de gestão de mudanças e no desenvolvimento de processos de
gestão de recursos humanos por competências. Nessa ocasião, conheci um
interessante comparativo entre uma árvore e uma pessoa, com foco nos
fatores intrínsecos de cada um, em suas competências.
A comparação é reproduzida a seguir.

Figura 9.2 – Árvore das competências


Fonte: Helbert Kellner.

Quando se estabelecem competências gerais para uma posição, deve ser


de nido um número máximo delas. Também podemos dividi-las em
aspectos especí cos do per l de um pro ssional. Assim, por exemplo, para
um executivo podemos estabelecer três níveis de competência: de negócios,
de liderança e pessoais. No total, devem ser de nidas entre seis e oito
competências, o que é bastante. A seguir, um exemplo de competências para
cada nível:

Quadro 9.1 – Exemplos de competências

Negócios Liderança Pessoais

Visão estratégica empresarial Gestão de planos estratégicos Proatividade e iniciativa


Visão estratégica comercial Gestão de mudança Perseverança
Empreendedorismo Formação de equipes Criatividade e inovação
Orientação a resultados Formação de sucessores Organização e disciplina
Definição de prioridades Tomada de decisões Relacionamento interpessoal
Negociação Gestão de diversidade Bom humor
Delegação e supervisão
Comunicação

Fonte: Elaborado pelo autor.

Não menciono ética, integridade e con abilidade porque as considero


competências obrigatórias.
O conjunto de competências deve ser de nido pelo pessoal de Recursos
Humanos e pelo futuro gestor do entrevistado.
Em um processo de seleção, os principais componentes são:

Figura 9.3 – Etapas de um processo de seleção de candidatos

Fonte: Elaborada pelo autor.

Não vou entrar no mérito das metodologias usadas nesse processo, pois são
muitas, ensinadas por inúmeros acadêmicos em variadas publicações, e
praticadas por diferentes empresas de uma ou outra maneira. Abordo a
seguir apenas alguns aspectos para os quais chamo a atenção nas diferentes
etapas desse processo.

9.2.1 Triagem de currículos

Não discriminar os currículos pela sua apresentação. Há pro ssionais,


principalmente de áreas técnicas, com conhecimentos profundos de assuntos
que podem nos interessar, mas que não tiveram orientação de pessoas que
assessoram a elaboração de currículos.
Por outro lado, se o candidato se apresenta para trabalhar em Marketing,
Vendas, Comunicação ou gestão em áreas que requeiram boa comunicação,
um currículo mal escrito pode eliminálo.
Atenção a candidatos que migram rapidamente de um emprego a outro; esse
fato já pode ser eliminatório se ele vem repetindo esse tipo de
comportamento em vários anos de carreira. Esse fator pode ser minimizado
no caso de jovens pro ssionais, que decerto ainda não encontraram seu
lugar. Ao dar-lhes uma chance, deve-se acompanhá-los com cuidado nas
etapas seguintes, para identi car se existe uma lacuna de personalidade ou
se eles apenas buscam um caminho. Caso um deles venha a ser selecionado,
a empresa talvez possa ajudá-lo a construir uma carreira sólida.
Quando a apresentação de candidatos é feita por meio de cadastros on-line,
deve-se elaborar o formulário de tal maneira que possam ser informados
aspectos que destaquem características relevantes para as posições a ser
preenchidas. Formulários muito padronizados impossibilitam a escolha
e ciente de jovens pro ssionais.
Hoje já existem programas com base em Inteligência Arti cial que assistem
na seleção de currículos, na triagem e na identi cação preliminar de
candidatos que preenchem os requisitos da posição.

9.2.2 Testes de eliminação, entrevistas de pré-seleção e dinâmica de grupo

Nessa parte do processo há várias ferramentas que podem ser utilizadas. Elas
são disponibilizadas por empresas especializadas, que as desenvolveram ou
que as representam no Brasil. Gosto particularmente do MBTI (Myers-
Briggs  Type Indicator) e do DISC (Dominance, In uence, Steadiness,
Conscientiousness), embora haja outras igualmente e cientes.

MBTI: identi ca o tipo psicológico, destacando aspectos da personalidade e


preferências pessoais. Propicia autoconhecimento e destaca pontos fortes e
áreas de potencial desenvolvimento pessoal e pro ssional.

DISC: permite a visualização das características comportamentais do


indivíduo e avalia essas características com relação ao per l ideal para o
cargo. Identi ca também problemas de desmotivação e frustração no
ambiente de trabalho e fora dele.
Fuja dos testes muito subjetivos. Com o devido respeito por Herman
Rorschach, psiquiatra suíço que inventou o teste de mesmo nome no início
do século passado – aquele dos famosos borrões de tinta cuja interpretação
promete identi car as características da personalidade do indivíduo –, a
análise dos resultados varia de avaliador para avaliador. Isso pode
comprometer o resultado do processo de seleção, deixando passar indivíduos
com per l inadequado ou eliminando aqueles com o per l desejado.
Testes podem ser muito e cientes, mas nada substitui a avaliação pessoal.
Assim, sempre que possível, o melhor é realizá-la. Quando fui diretor geral
da Arthur D. Little, eu participava ativamente das entrevistas de pré-seleção
e de seleção de candidatos a analista, o estágio de entrada de jovens
pro ssionais na consultoria.
Observe o nível de ansiedade e nervosismo dos candidatos, situação normal
para quem anseia uma nova colocação e sonha com a empresa ou com a
posição, em particular se estiver desempregado. Ansiedade não é
necessariamente um aspecto negativo: saiba avaliá-la.
Nesta etapa, pesquise, por meio dos testes aplicados e das entrevistas
pessoais, se o candidato tem um per l que se adaptará à cultura da empresa
e se tem incorporados à sua personalidade os valores da organização. Se não
forem convergentes, não contrate!

9.2.3 Entrevistas finais

Certa vez, ao longo de um processo de seleção em que eu buscava um


diretor de Vendas para a empresa que eu dirigia, um dos candidatos passou
pelas etapas de triagem e nalmente se apresentou para a entrevista comigo.
Ele tinha um bom currículo e nele informava que era uente na língua
japonesa. Não sou uente em japonês, mas falo alguma coisa. Eu o recebi
falando nessa língua, ao que ele me respondeu que não a falava, mas que
pretendia estudar. Coisas da vida, azar de candidato; ele nem chegou a
entrar em minha sala, foi dispensado de imediato.
Fuja dos aspectos corriqueiros cobertos por entrevistadores. Inove, saia da
rotina. Leia atentamente o currículo do candidato e observe comentários já
realizados sobre ele. Elabore uma lista de perguntas especí cas para cada
situação. Se você está buscando um diretor nanceiro e o candidato já tem
experiência comprovada nessa área, para que fazer perguntas técnicas sobre
Finanças ou Contabilidade? Procure conhecer o âmago do indivíduo. Use
sua intuição.
Para cargos em Vendas, por exemplo, simulo situações em que o candidato
precisa mostrar suas habilidades de executivo de vendas ou de vendedor.
Experimente dar sua caneta Montblanc para o candidato e peça que ele a
venda a você. Verá que tudo pode acontecer, desde argumentações lógicas
até uma pressão insuportável.
Pergunte o que o entrevistado achou do site da empresa e o que faria para
melhorá-lo. Por incrível que pareça, ainda hoje muitos candidatos não
navegam pelo site da empresa antes da entrevista.
Costumo inverter papéis com o entrevistado. Depois da saudação inicial, falo
sobre a empresa, sobre a posição a ser ocupada e as características do
pro ssional procurado. Em seguida, peço ao entrevistado que se sente em
minha cadeira e que faça o meu papel, entrevistando-me como candidato à
posição. Entrego-lhe um currículo meu especi camente preparado para a
ocasião, em que coloco aspectos reais de minha carreira e outros, elaborados
especialmente para avaliar a percepção do candidato. Dou-lhe alguns
minutos para se preparar, deixo-o a sós na sala, e, em seguida, ele conduz a
entrevista.
Se você nunca inverteu papéis, experimente fazê-lo, mas prepare-se
adequadamente.
Seja polido e comece, sempre, apresentando a empresa e a posição. Como
alternativa, para veri car quanto a pessoa pesquisou sobre a empresa, peça-
lhe que fale sobre ela e seus produtos e pergunte coisas que estão no site ou
que saíram na mídia.
Durante a entrevista, ou no nal, dê oportunidade ao candidato para fazer
as perguntas que desejar. Isso vai revelar muitos aspectos de suas
competências pro ssionais e pessoais. Se você gostou dele, torça para que lhe
faça muitas perguntas inteligentes. Se ele for candidato a posição de
liderança e não zer nenhuma pergunta de cunho estratégico, acenda a luz
amarela.
Faça perguntas e dê tempo para o candidato pensar e responder. Não
interrompa seu processo de pensamento ou de comunicação.
Intuição é importante. Use seu sexto sentido. Com experiência acumulada
em entrevistas de avaliação, você perceberá que muitas vezes o candidato lhe
desperta sentimentos inexplicáveis. Analise esses sentimentos, procure a raiz
deles e descobrirá que têm fundamento.

9.2.4 Seleção do profissional, oferta e contratação

No nal da seleção, encontra-se a fase de busca de referências sobre os


candidatos. Essa fase não é tão trivial, pois o que geralmente temos é a lista
de pessoas fornecida pelo candidato. Se elas forem contatadas, darão
respostas óbvias; portanto, procure identi car particularidades do candidato
e observar as reações do contato. Perceba situações inusitadas que o
candidato possa ter vivido e como se saiu nelas.
Durante as entrevistas, procuro identi car, com o próprio candidato, pessoas
não referenciadas por ele com quem teve relacionamento con itivo ou com
quem vivenciou situações difíceis. Procure abordar essas pessoas. Se o
candidato está empregado, a con dencialidade deve ser respeitada. Procure
informações sem apresentar o motivo. Nas entrevistas com as pessoas
referenciadas, pode-se conseguir informações sobre o relacionamento da
pessoa com outros colegas de trabalho.
Feita a escolha, uma oferta formal deve ser feita por meio de uma carta-
proposta, via e-mail, com prazo de validade. Ela deve destacar a posição, a
quem o escolhido se reportará, o pacote de remuneração e benefícios e
algum outro aspecto pertinente à contratação. Evite acordos verbais.

9.3 Integração
Todo novo pro ssional deve ter uma fase de integração à empresa e de
conhecimento sobre as características e funcionamento desta, e,
principalmente, cultura e valores, qualquer que seja a posição ou o nível para
o qual foi contratado.
A Sodexo é uma empresa de mão de obra intensiva, com uma sede central e
várias operações descentralizadas. Quando assumi a direção geral, o pessoal
da sede sabia que administrávamos os serviços de alimentação nos clientes,
mas não fazia ideia da complexidade do trabalho; reclamava cotidianamente
da falta de compromisso com os processos por parte do pessoal de campo.
Por sua vez, estes funcionários se referiam à sede como “lá na Sodexo”, sem
se sentir parte da empresa e sem entender por que o pessoal da sede
reclamava tanto.
Desenvolvemos um programa de integração pelo qual, inicialmente, todo
novo colaborador, independentemente de sua área ou posição hierárquica,
participava de reuniões iniciais nas quais lhe era apresentada a empresa.
Começávamos com uma apresentação geral e, em seguida, os gestores
responsáveis pelas áreas funcionais falavam sobre seu setor. Os processos
administrativos e operacionais também eram explicados. Eu procurava estar
sempre presente às apresentações sobre a empresa, para dar as boas-vindas
aos novatos.
O principal, porém, era um programa de integração sede-operações, em que
todo novo colaborador fazia um estágio no campo alheio. Isso signi cava que
os colaboradores contratados para a sede tinham de passar algum tempo
dentro de uma cozinha industrial, vivendo o dia a dia e interagindo com o
pessoal de campo. Chegavam no mesmo horário que eles, no início do dia, e
desempenhavam alguma tarefa (tomando-se cuidado com a segurança e sem
interferência na operação). Um funcionário administrativo, como um
assistente de Contabilidade ou uma secretária, passava uma semana
“trabalhando” na cozinha do cliente. Um gerente podia passar até um mês
ali.
Eu mesmo z um estágio em cozinhas, com a “mão na massa”, pois eu não
conhecia o negócio e seus aspectos operacionais. Cheguei a me acidentar,
com um corte no dedo que evoluiu para um doloroso processo in amatório;
e isso me despertou para os aspectos de segurança no trabalho.
O novo pessoal das cozinhas também fazia um estágio na sede, para
conhecer as pessoas e os processos. Um gerente de unidade passava um mês,
e um chefe de cozinha, uma semana.
Além disso, durante o ano, cada líder de área tinha a responsabilidade de
visitar certo número de restaurantes e de interagir com o pessoal da cozinha
e com o cliente. Periodicamente, os gerentes de unidades e seu chefe de
cozinha iam à sede para reuniões com temas especí cos, mantendo ativa
essa integração.
Desse modo, cada um passou a entender o trabalho de todos, suas
características, necessidades e di culdades. O pessoal de campo começou a
se sentir parte da Sodexo, a entender os processos e a fazer a gestão
administrativa adequadamente, e o pessoal de sede parou de reclamar do
pessoal de operações e passou a colaborar com ele.
Um programa de integração precisa ser bem estruturado e contar com um
cronograma. As pessoas que farão apresentações sobre a empresa devem
estar muito bem preparadas para falar sobre ela, para dar continuidade, na
prática, às maravilhas que foram ditas durante a seleção. A área de Recursos
Humanos é a dona desse processo e deve veri car se cada uma das áreas está
dando atenção aos novatos e cumprindo a sua parte na integração. O CEO
deve veri car periodicamente como estão sendo conduzidos os programas
de integração.

9.4 Avaliação
Existem muitos modelos de avaliação de desempenho. Há inúmeros livros
sobre o assunto, e empresas de consultoria se especializaram em estruturá-
los, além de dar assistência continuada aos seus clientes. A seguir, destaco
alguns aspectos que não podem ser esquecidos.
O objetivo de um processo de avaliação é estabelecer um direcionamento
para a melhoria de desempenho das pessoas e, por conseguinte, de sua área
e da organização. Esse processo deve possibilitar ao avaliado um conjunto de
informações sobre seu desempenho anterior, de nir prioridades e objetivos
de desempenho futuro, identi car lacunas pro ssionais e de comportamento
pessoal a ser preenchidas e estabelecer um plano de ação individualizado
para melhoria continuada.
A cultura de avaliação precisa estar impregnada na empresa. O CEO é
responsável por isso, com o apoio da área de RH. O processo tem de ser
encarado seriamente por todos os gestores, que devem transmitir essa
seriedade aos seus subordinados. Isso implica um processo estruturado,
difundido e bem entendido por toda a organização. O resultado deve ser
construtivo: quem avalia precisa adotar atitude de imparcialidade e
honestidade nas avaliações que faz sobre outras pessoas, e quem é avaliado
tem de estar aberto a atitudes receptivas e não defensivas. A avaliação não
pode ser feita simplesmente para cumprir a rotina.
O processo deve ser simples. Adotar formulários complexos acompanhados
de manuais de procedimento elaborados é contraproducente e faz com que
as pessoas o encarem como mais uma burocracia da empresa. A avaliação
deve destacar o que se quer ou o que se necessita avaliar sobre cada pessoa.
Em uma das organizações em que passei, deparei-me com um processo de
avaliação cujo manual tinha mais de 20 páginas, além de instruções
paralelas. O formulário de avaliação era um complexo de planilhas Excel
interligadas. Poucos o levavam a sério, e no nal, as avaliações eram
praticamente feitas pelo próprio avaliado; o chefe simplesmente as
referendava.
A avaliação não deve ser genérica, abordando somente temas
comportamentais ou de aderência a valores corporativos. Deve incluir
aspectos relacionados a esses temas e ao desempenho técnico. A avaliação de
gestores deve abordar as características de liderança e de práticas gerenciais
(delegação e controle, tomada de decisões, solução de con itos, trabalho em
equipe). O desempenho também deve ser medido comparativamente a
indicadores estabelecidos para cada pessoa, os quais devem ser quantitativos
e qualitativos.
Para gestores e pro ssionais cujas funções requerem contato continuado
com outras áreas é fundamental uma avaliação de 360 graus, pela qual o
indivíduo é avaliado por superiores, pares e subordinados. A mesma
avaliação pode ser feita com relação àqueles que mantêm contato externo.
Hoje existem várias ferramentas de avaliação on-line, rápidas e e cientes,
sem exposição dos avaliadores.
A avaliação de nada vale se não for complementada por um plano de ação
para cada indivíduo. E sua implementação caberá ao próprio indivíduo,
juntamente com seu superior imediato, com o apoio da área de RH. Caberá
ao superior imediato atuar como coach de seus subordinados nesse processo,
como já vimos no Capítulo 4.
Empresas que ainda não desenvolveram uma cultura de avaliação de
colaboradores e deseja fazê-la, devem observar alguns fatores importantes:

Buscar apoio de um pro ssional externo, com experiência em


processos de avaliação e experiência anterior em empresas com
cultura evolutiva, mas que não tinham ainda adotado a avaliação
como processo de gestão;
Começar com um processo simples, envolvendo apenas o líder e
seu subordinado;
Adotar ferramenta ou aplicativo de apoio também bastante
simples e amigável;
Orientar, exaustivamente, tanto o líder quanto os subordinados
para a condução de um processo isento de personalismos e
protecionismos, e muito transparente;
Prover feedback ao avaliado e concluir o processo com um plano
de desenvolvimento individual que possa ser acompanhado e
monitorado pelo líder;
Não tentar começar com a avaliação de 360 graus, pois as pessoas
não saberão contribuir de forma isenta de relacionamentos
pessoais.

Naquelas organizações identi cadas como cultura Clã, conforme exposto no


Capítulo 1, e que ainda não tenham desenvolvido práticas estruturadas de
avaliação de desempenho, alguns aspectos peculiares devem ser observados:

Nessas organizações é muito comum confundir “avalição


pro ssional” com “opiniões pessoais”. Uma observação feita com
critério técnico sobre uma pessoa pode ser tomada como uma
crítica ou preferência pessoal;
Antes de iniciar um programa de avaliação de desempenho, venda
a ideia muito bem aos superiores e aos demais gestores. Inclua os
controladores ou mantenedores;
Estruture bem o programa; exponha as necessidades existentes
para avaliar adequadamente as pessoas e mostre a diferença entre
uma avaliação pro ssional objetiva e opiniões pessoais subjetivas;
Envolva os líderes e, se necessário, também os controladores e
mantenedores, para que entendam e apoiem o processo;
Comece devagar, de cima para baixo e vá expandindo o programa;
Monitore-o cuidadosamente.

Vale observar que empresas muito “maduras” na sua cultura e processos de


gestão de pessoas passam a eliminar os processos formais de avaliação de
desempenho. Elas estimulam os gestores a periodicamente prover
informações a seus subordinados sobre seus comportamentos e resultados,
com base nas expectativas acordadas entre as partes. Não tente fazer isso em
sua empresa se essa cultura estiver ainda “verde”.

9.5 Promoção e sucessão


Há vários anos li um livro chamado O princípio de Peter, cuja ideia foi
concebida por um educador canadense, doutor Laurence Peter. Nesse, Peter
defendia que, em um sistema hierárquico, todo colaborador tende a ser
promovido a seu nível de incompetência (o limite de Peter) – ou seja, as
posições superiores seriam ocupadas por pessoas incompetentes e, por
conseguinte, o trabalho seria desenvolvido por aqueles que ainda não
chegaram àquele nível de incompetência.
Esse princípio está intimamente ligado àquilo que chamamos de talento.
Uma pessoa se destaca por seu talento até ser promovida ou designada para
conduzir projetos desa adores. Uma vez que isso é concretizado, o que era
talento passa a ser lugar-comum e é necessário que a pessoa demonstre
possuir um novo conjunto de qualidades diferenciadas até atingir seu limite
de competência.
Quantas vezes, em nossa vida pro ssional, olhamos para os principais postos
da organização e perguntamos como certos pro ssionais chegaram lá?
Constatamos como as hierarquias se acomodam com pro ssionais que
outrora mostraram competências e trouxeram resultados valiosos e que
notadamente atingiram o limite abordado por Peter, mas são mantidos em
novas posições, servindo como mau exemplo para os subordinados e
contribuindo negativamente para a evolução da empresa.
Promoção e sucessão são temas que devem ser encarados de maneira muito
séria. Poucas organizações, incluindo as maiores, estruturam-se de modo
adequado para conduzir esses processos. Aqui vão alguns lembretes:

As políticas para promoção devem ser bem de nidas, estruturadas


e difundidas na empresa;
Os critérios devem ter exibilidade, observando a estrutura de
cargos, atribuições e responsabilidades, tendo como prioridade o
desempenho dos indivíduos, suas competências, habilidades e
potencial;
Qualquer que seja o tamanho da empresa, é preciso descrever as
funções de cada cargo e os requisitos de seu ocupante, por mais
simples que sejam.
Os candidatos à promoção devem ser avaliados segundo esses
requisitos;
O tempo de casa, por si só, não é critério para a promoção;
Não se deve promover alguém simplesmente porque possui
excelente desempenho em sua função atual;
Um indivíduo pode ser promovido sem ter demonstrado
competências em todos os requisitos. Se tem competências e
habilidades que preenchem a maioria desses requisitos, e potencial
para evolução, a curto prazo, a m de preencher as demais, pode-
se promovê-lo. Mas a decisão deve vir acompanhada de um
programa individual de desenvolvimento que inclua o coaching;
Na escolha de pessoas a promover, deve-se evitar as decisões
emocionais.
É evidente, porém, que se houver mais de um candidato com
características semelhantes para uma posição, o superior elegerá
aquele com quem tiver mais a nidade. Não há nada de errado
nisso, desde que tenha havido uma lógica coerente na seleção;
Cuidado para não promover pro ssionais que trazem excelentes
resultados nas posições em que se encontram e que não têm
aptidão para cargos de supervisão. Um excelente vendedor não
será, necessariamente, um bom gerente de Vendas;
As pessoas precisam querer a promoção;
As promoções podem ser verticais ou horizontais. O excelente
vendedor que não possui características de gestor pode ter
responsabilidades novas ou complementares dentro da área de
Vendas;
As pessoas que ocupam altos cargos devem ter um per l mais
alinhado com as estratégias e competências da organização quanto
mais sobem na hierarquia;
Se for observado que houve um equívoco na promoção de uma
pessoa, aja rapidamente para corrigi-lo. Não ponha a culpa na
pessoa; remova-a do cargo buscando uma solução conciliadora
que mantenha a con ança da equipe nos superiores;
O promovido deve estar consciente de suas novas atribuições
técnicas e de gestor (ver o Capítulo 5);
A pessoa promovida deve ter habilidades para administrar
possíveis con itos decorrentes de sua promoção. Outros colegas
podiam aspirar à mesma posição e podem, consciente ou
inconscientemente, colocá-la em xeque;
O pro ssional promovido deve fazer uma autoanálise dos
requisitos da nova posição, pois seguramente terá
responsabilidades para as quais não teve exposição no passado.
Também deve ter humildade su ciente para reconhecer possíveis
limitações iniciais e procurar suporte para superá-las;
No processo de promoção, quando se trata de sucessão,
novamente encontramos organizações completamente
despreparadas para substituir gestores.
O ideal é ter sempre alguém preparado para o cargo, como parte
de um programa de sucessão. As mesmas observações que zemos
para os processos de promoção são válidas para a sucessão,
destacando-se o estilo de tomada de decisão e os aspectos
comportamentais do sucessor.

9.6 Remuneração
Remuneração mereceria um capítulo especial, mas existem vários livros
didáticos ou técnicos sobre o assunto. Destaco aqui alguns fatores que
considero fundamentais, do ponto de vista do CEO, para estruturação de
programas de remuneração.

9.6.1 A essência da remuneração

Remuneração é um tema sempre colocado sob a lupa na cadeia de valor de


gestão de pessoas. Há pesquisas que indicam que o salário não é o principal
fator de retenção e concordo com isso; mas não pode ser deixado para em
segundo plano. Para quem está nas bases da organização, salário é fator de
sobrevivência; ele supre (e nem sempre) as necessidades básicas do
colaborador. Para quem está nas esferas de liderança, ele passa a ser fator
para manutenção do status social. Basta ver as escalas de Maslow e
Herzberg.

Figura 9.4 – Hierarquia de necessidades e motivação


Fonte: Elaborada pelo autor com base nas teorias de Maslow e Herzberg.

A remuneração deve ser tratada quase como uma ciência. Seus fundamentos
estão correlacionados ao plano estratégico de longo prazo, aos valores
corporativos e aos objetivos de curto, médio e longo prazos. Remuneração
xa e variável, e como a estruturar está na pauta dos líderes e do RH, pois,
dependendo da cultura e da causa (vide Capítulo 1), pode ser um forte fator
in uenciador na contratação e na retenção de pro ssionais.

9.6.2 Remuneração nas empresas de mercado

Para grande parte das organizações, talvez a maioria, a remuneração tem


somente o componente xo, atrelado ao plano de cargos e salários (quando
existentes); nesse plano, determinam-se a atividade a executar e as
competências e habilidades necessárias para desempenhar a função. Existem
modelos variados para esse m. Para ser atrativo, o salário deve ser
competitivo no mercado e região onde a empresa atua.
A remuneração variável mais comum a praticamente todas as empresas que
vendem produtos ou serviços, é a da equipe de Vendas. Não há dúvida que
um dos fatores mais motivadores, senão o principal, para um vendedor é a
comissão que ele recebe por seu desempenho.
Em uma das empresas que dirigi, encontrei na área de Vendas um sistema
de pagamento de comissões decrescente, ou seja, quanto mais se vendia,
menor era o percentual da comissão pago ao vendedor. Tratava-se de um
conceito equivocado de limitação dos ganhos da equipe, para que não
ultrapassassem o salário de outros pro ssionais da empresa. Um dos
objetivos de curto prazo era acelerar o crescimento sadio do faturamento, e o
sistema existente foi substituído por outro, que pagava percentuais
crescentes, à medida que o vendedor ultrapassasse um objetivo
preestabelecido. Os vendedores mudaram completamente seu
comportamento e as vendas cresceram 40% em um ano. Em paralelo, foi
instituído um programa de pagamento de comissões a qualquer colaborador
que indicasse um prospecto que viesse a se transformar em cliente. Até o
contador ganhou bônus.
Esse comissionamento somente para vendedores não raramente causa
polêmicas: por que só eles ganham prêmios? Os demais colaboradores não
são também fundamentais para esse sucesso?
Ao estabelecer remuneração variável para executivos é necessário tomar
cuidado para que ela não se torne um prêmio para o curto prazo, em
detrimento do longo prazo e da sustentabilidade da empresa, como: critérios
que privilegiam o crescimento e a rentabilidade no curto prazo em
detrimento da criação de valor para o acionista; distorções de gestão para
incrementar preços de ações ou melhorar os demonstrativos de resultados,
privilegiando o retorno pela valorização dentro do ano scal, sem uma
consolidação para os anos seguintes. Em muitas empresas, principalmente
familiares de pequeno ou médio porte, o dono estabelece boni cações
discricionárias para alguns colaboradores, líderes ou não. Não há nada de
errado nisso; mas o bom senso aplicado deve cuidar para não desmerecer
outras pessoas e, assim, desmotivá-las.
Como complementação salarial existe a Participação nos Lucros e Resultados
(PLR), compulsório. Mas essa não pode ser considerada um programa de
incentivo, pois não relaciona o indivíduo com seu desempenho.
Grande número de empresas adota o modelo de remuneração variável, a
qual inclui, entre outros benefícios, boni cação por resultados e stock options
(direito de compra subsidiada de ações). Isso “transforma” um grupo de
gestores em sócios dos negócios, e a remuneração faz diferença no
patrimônio desses indivíduos. O fundamento do modelo é um misto de
remuneração xa e variável, e a parte variável é agressiva e baseada na
obtenção de metas bastante desa adoras, compondo um pacote total
bastante atrativo. Os participantes desse modelo podem até não ter outros
tipos de remuneração ou benefícios. Quando um programa desses é bem
estabelecido, cria-se uma meritocracia racional em que todos saem
ganhando, não apenas a empresa.
O debate de remuneração variável já sobe hoje até o nível dos conselheiros
(nas organizações que possuem conselho de administração): devem eles ter
compensação somente xa ou nela deve ter um componente variável?

9.6.3 Remuneração nas organizações movidas por uma causa

Nas organizações em que a causa é o fator motivador preponderante, o


salário tem de ser compensador para o indivíduo, possibilitando que ele
cubra suas necessidades básicas e seus desejos sociais. Tem de ser
competitivo com o mercado em funções operacionais e média gerência.
Como nesses casos, nos escalões superiores de liderança não existe
geralmente a parte variável – os prêmios por desempenho – a remuneração
será di cilmente competitiva, mas deverá ser pelo menos atrativa para
possibilitar trazer gente de mercado e manter os quadros diretivos, os quais
estarão fortemente motivados pela causa. Isso é muito comum em pequenas
empresas familiares e em organizações lantrópicas ou sem ns lucrativos.
Destaco a seguir alguns aspectos que considero importantes na formulação
de modelos de remuneração:

Observações gerais

Considerar remuneração como uma ferramenta estratégica complementar aos


programas de atração e retenção de pessoal. Apesar de ser convencionalmente
classi cada como custo, a remuneração é investimento estratégico;
Usar o modelo de remuneração como incentivo para a busca de resultados a longo
prazo e para a criação de valor para o acionista;

Remunerar de forma competitiva com o mercado. Remunerar acima do mercado as


posições estratégicas ou particularmente relevantes para a empresa;

Estabelecer, criteriosamente, um plano de cargos e salários, mesmo que ele seja uma
simples planilha de posições e valores;

Tornar o modelo de remuneração bem conhecido e entendido por toda a


organização.

Observações sobre remuneração variável

Condicionar remuneração variável a indicadores de desempenho; um ou mais


indicadores devem ser relacionados com o desempenho total da área do executivo e
da empresa, para estimular o trabalho em equipe;

Condicionar parte dos bônus à permanência na empresa por determinado período


futuro;

Estruturar cuidadosamente planos de opções de ações, evitando manipulações de


resultados;

Premiar desempenhos excepcionais (superbônus);


Incluir colaboradores juniores em programas de incentivos variáveis;

Benefícios são mais importantes para os pro ssionais juniores com base em
resultados à medida que o indivíduo sobe na hierarquia da empresa.

São mais bem-sucedidas as empresas que conseguem estabelecer um


processo integrado, que vai da atração à retenção de gente, primando por
estabelecer suas necessidades, contratar as pessoas mais adequadas para cada
posição operacional ou gerencial, desenvolvê-las e mantê-las. Todo esse
processo tem participação intensa dos gestores e da área de RH, que
trabalham necessariamente em conjunto não só para contratar e desenvolver
as pessoas, mas também para aprimorar de maneira contínua esse processo.
Por mais que os dirigentes de uma empresa considerem seu processo
adequado, estimulo-os a procurar no mercado, por meio de contatos com
outras empresas ou da participação em seminários especí cos, aspectos
inovadores que possam contribuir mais ainda para o aperfeiçoamento
continuado de sua política de atração e retenção de pessoal.
Capítulo 10

Desenvolvimento de pessoas
Certa vez, perguntaram ao artista Michelangelo di Lodovico Buonarroti
Simoni (1475-1564) como ele havia idealizado e esculpido Davi. “Ele já
estava dentro do bloco de mármore”, respondeu Michelangelo, “Eu apenas
removi o que não era Davi”.
Convivi com vários “Davis”, mas um dos que mais me marcaram foi Durval,
que conheci quando era diretor geral da Coel, empresa brasileira de
componentes para automação industrial. Durval ingressara lá como
mensageiro e chegara a comprador; não zera curso superior. Percebi nele
um talento diferenciado – raciocínio rápido, habilidade de relacionamento
interpessoal, lógica de raciocínio, domínio dos processos de negócios da
empresa e profundo conhecimento dos nossos produtos. Comecei a
designar-lhe atividades adicionais. Quando saí da Coel, Durval me disse:
“Eu pensava ter atingido meus limites. Mas você me deu a oportunidade de
descobrir outra pessoa dentro de mim”. Durval alcançou o cargo de diretor
industrial.
A General Electric possui uma “fábrica de executivos”, um centro de
treinamento que é referência mundial na formação de líderes, a ponto de
ser chamado pela revista Fortune de “Harvard da América Corporativa”.
Instalada em Crotonville, estado de Nova York, Estados Unidos, tem como
princípios: imersão total, cursos para a vida real, só os melhores participam,
os líderes prestigiam, incentivo ao convívio social, investimento consistente.
Diversas empresas de grande porte possuem suas academias corporativas
dedicadas à capacitação.
Grandes empresas podem realizar investimentos dessa ordem de grandeza,
mas... e as outras? Bem, elas podem desenvolver programas de capacitação
que envolvam todas as pessoas da organização, de maneira sistematizada e
continuada, sem investir fortunas no processo. A academia se torna um
hábito, não um investimento. Disso trataremos aqui: o que fazem as
grandes organizações também podem fazer as pequenas, guardadas as
devidas proporções. Os tópicos abordados a seguir englobam:

Fatores críticos de sucesso;


Elos do processo;
Conteúdos;
Diferentes gerações;
Plano de carreira;
Desenvolvimento de sucessores;
Coaching e mentoring;
Desenvolvimento de talentos e de não talentos.

10.1 Fatores críticos de sucesso


Os fatores in uenciadores para o sucesso de programas de desenvolvimento
de pessoal começam na cúpula e terminam na base, com apoio da alta
administração, convergência do programa com a estratégia da empresa,
identi cação de necessidades, treinamento presencial, foco no que é
relevante, aplicação dos conceitos ensinados, acompanhamento de sua
aplicação, simplicidade e continuidade, vontade de aprender.

10.1.1 Apoio da alta administração

O CEO e a equipe que compõe a liderança de alto nível têm de acreditar


que o desenvolvimento continuado é crucial para a obtenção de alto
desempenho por parte de seus subordinados. Os colaboradores são a base
da criação e da consolidação de uma cultura de desenvolvimento sem a
qual os investimentos em tempo e em recursos nanceiros e materiais não
darão retorno para os negócios. O CEO e os líderes, além de acreditar,
devem se comprometer com o processo, concedendo suporte e
credibilidade às ações conduzidas pela área de Recursos Humanos e pelos
colaboradores da empresa.
De modo prático, os líderes devem trabalhar em parceria com o RH para (i)
identi car e desenvolver conteúdos relevantes para treinamento e (ii)
priorizar as atividades de treinamento quando essas estiverem em vigor –
comunicando às suas equipes que devem participar dos treinamentos e que,
quando presentes, não se distraíam com e-mails, reuniões e outras
atividades.

10.1.2 Convergência do programa com a estratégia da empresa

Qualquer programa de desenvolvimento de pessoal precisa,


obrigatoriamente, convergir com a estratégia de curto, médio e longo prazos
da organização. Dizem os marinheiros que não há vento favorável para o
navio que não conhece seu destino. Imaginem que a tripulação são os
funcionários, e o barco a própria empresa. Se esse barco não tiver um
destino preestabelecido, pode-se colocar nele a melhor tripulação do
mundo ou treinar indivíduos para que se tornem excelentes marinheiros, e
a embarcação nunca saberá para onde ir.

10.1.3 Identificação de necessidades

Em um call center, por exemplo, com certeza haverá um treinamento-


padrão para todos os funcionários, em diferentes etapas de sua vivência nas
respectivas funções. Mas, à medida que alguns se destacam e começam a
atuar como supervisores, precisarão também de treinamentos especí cos
para complementação de habilidades e competências. Torna-se necessário
compor, de maneira continuada, os diferentes grupos de pessoas dentro da
organização, com suas necessidades individuais de desenvolvimento. Isso
diz respeito não somente ao nível funcional ou hierárquico, mas também
geracional: indivíduos da geração Y terão necessidades diferentes do
pessoal da geração X. As gerações possuem percepções diferenciadas sobre
o ambiente de trabalho, sobre a contribuição que proporciona à empresa,
sobre a visão que têm com relação à hierarquia e sobre métodos de
trabalho.
Um bom primeiro passo é o desenvolvimento de matrizes de competência
para diferentes níveis e funções das organizações. Essas matrizes ajudam a
mapear as competências que cada colaborador deve possuir em diferences
funções e etapas de sua carreira – tanto funcionais quanto de liderança. A
matriz, quando utilizada na avaliação de competência, ajuda a área de RH a
identi car quais as fraquezas funcionais e de liderança para que possa,
então, priorizar atividades e conteúdo de desenvolvimento adequados para
a organização como um todo.

10.1.4 Treinamento presencial e ensino a distância

A Tecnologia da Informação e o mundo cibernético são partes integrantes


de nossa vida, independentemente de nossa geração. Proliferam escolas de
ensino a distância, cursos de e-learning e outros programas de aprendizado
virtual. Nada, infelizmente, substitui o treinamento presencial, em que o
aluno ca frente a frente com o treinador e compartilha a experiência de
outras pessoas. Até mesmo os mais jovens, adictos da comunicação
cibernética, reconhecem esse fato em diferentes pesquisas realizadas.
Treinamento presencial inclui também sessões de videoconferência, com
boas relações custo e benefício, mantendo-se o contato, se não físico, ao
menos visual entre treinando e treinador.
O ensino a distância (EAD) tem sido cada vez mais utilizado, com módulos
interativos entre instrutor e aluno. A maior incidência de seu uso está nas
empresas geogra camente dispersas ou em casos nos quais o indivíduo está
longe da “escola”. Muito comuns são os cursos de inglês oferecidos a
distância, com interação aluno-professor. O e-learning é muito útil também
na fase preparatória dos cursos presenciais, para nivelar conhecimentos
entre os participantes, adiantar temas de base e estudos de casos, assim,
posteriormente às aulas presenciais, complementar os cursos com as leituras
recomendadas.
Outro método crescentemente usado é a utilização de aplicativos de
treinamento, que permitem que os colaboradores alavanquem curtos
intervalos para fazer pequenos módulos de treinamento. Esses aplicativos
são também interativos e usam técnicas como gami cação (fazendo
analogia a jogos – de games, em inglês), criando competições e situações
especí cas que motivem o indivíduo a realizar o treinamento, exemplo:
coletas de pontos à medida que módulos são completados, fazendo com
que o colaborador ganhe prêmios ou visibilidade perante a liderança. Esse
método vem crescendo, mas ainda não substitui o treinamento presencial.
Vale lembrar que diferentes culturas são adeptas de forma diversa aos
vários métodos destacados. A cultura americana, por exemplo, é mais
adepta ao e-learning que a cultura brasileira. Também há distinções nas
diferentes gerações, a geração Y é mais aberta aos aplicativos, por exemplo.

10.1.5 Foco no que é relevante

Quantas vezes escutamos: “Nosso programa de treinamento para o próximo


exercício é de 5 mil horas!”? Treinamento não diz respeito à quantidade,
mas a qualidade. O desenvolvimento de pessoas deve ter como foco as
necessidades da empresa no momento e nos aspectos que a estratégia
empresarial identi ca como cruciais para o futuro. É nesse foco que a área
de Recursos Humanos, os executivos e os demais pro ssionais colocarão sua
energia voltada para a capacitação das pessoas.
Dar apoio ou conduzir outros programas faz parte do processo, como
complementação ou como motivação. Se a empresa se expandir pela
América Latina e puder proporcionar cursos de espanhol, por que não o
fazer? Se um pro ssional anseia ampliar seus conhecimentos acadêmicos ou
funcionais, e isso trará benefícios para a empresa, além de delizar um
jovem talento, por que não lhe dar apoio? Para as pessoas com potencial de
crescimento, cursos especí cos de educação executiva, mestrado executivo
ou pro ssionalizante podem ser um bom caminho.
Selecione criteriosamente os participantes e os programas. E cuidado com
treinamentos de “espírito de equipe”, como aqueles de sobrevivência na
selva. Encare-os, se quiser investir neles, como uma quebra da rotina, pois o
que ca como aprendizado é marginal.

10.1.6 Aplicação dos conceitos ensinados e acompanhamento de sua


aplicação

Se os conceitos ensinados não forem adequadamente aplicados pelo aluno,


nem acompanhados pelos supervisores, o investimento não terá o retorno
desejado. Mais um motivo para que o programa de treinamento seja
coerente com a estratégia e com as necessidades da empresa e conduzido
no momento adequado. O supervisor deve conhecer a fundo o tipo de
capacitação que seus subordinados receberam para poder monitorar a
aplicação e acompanhar sistematicamente a evolução do desempenho. Nas
tarefas rotineiras isso é muito mais fácil; nas mais especializadas ou de nível
gerencial/comportamental, exige maior observação. O próprio treinando
deve estabelecer como rotina a autoavaliação de como aplica o que
aprendeu. Caso seja necessário, deve recorrer a seu superior e, se possível,
ao treinador, para que auxiliem nesse processo. Treinamento ou capacitação
sem acompanhamento e monitoração da evolução do colaborador é
dinheiro jogado fora.
No curto prazo, a área de RH pode, por exemplo, acompanhar a absorção
de conteúdo em um treinamento aplicando uma prova antes e outra depois
do treinamento (que inclua os principais conceitos do programa). A ideia
não é avaliar individualmente cada colaborador, mas avaliar a média da
turma como um todo, para identi car a efetividade do programa. No longo
prazo, RH e liderança podem avaliar a melhoria de resultados corporativos,
a melhoria de e ciência das áreas e o aumento de velocidade na evolução
de carreira dos colaboradores.

10.1.7 Simplicidade e continuidade


Um programa de desenvolvimento deve ser simples e contínuo. A
simplicidade tem a ver com o foco naquilo que é relevante. Não complique
seu programa de desenvolvimento de pessoal; acrescente o estritamente
necessário e aplique programas que reconhecidamente deem resultados. Se
houver métodos não tradicionais, mas e cazes de aprendizado, aplique-os,
mas procure mantê-los também da forma mais simples possível. E dê
continuidade aos programas. Se forem colocados nos planos de ação e
divulgados pela empresa, mantenha-os. Pense nesses programas não
somente a curto prazo; coloque neles uma visão de médio e longo prazos,
para que a continuidade seja assegurada. Mude-os se as necessidades
conjunturais assim demandarem, sempre com a perspectiva da
continuidade.

10.1.8 Vontade de aprender

Simón Bolívar, “O Libertador” (1783-1830) – que liderou a luta pela


independência de países andinos e do norte da América do Sul contra a
Espanha –, declarou, em 1812, após um terremoto que abalou Caracas,
Venezuela: “Se a natureza se opõe a nós, lutaremos contra ela e faremos
com que ela nos obedeça”.
Até podemos obter algumas vitórias lutando contra a natureza, mas no
corpo a corpo perderemos a maioria das batalhas. As pessoas podem optar
por aprender ou por não evoluir em seus conhecimentos, mas não podem
optar por não mudar. Tudo muda em nosso entorno e in uencia nossa
vida, pro ssional ou pessoal. É melhor, então, adquirir de maneira contínua
novos conhecimentos, para enfrentar as mudanças conjunturais. Se sua
equipe ou se alguns membros dela não têm vontade de aprender, substitua-
os.

10.2 Elos do processo


Pense no processo de desenvolvimento de recursos humanos como uma
cadeia de valores ou como uma corrente com elos. Cuide de cada um dos
elos com o mesmo empenho e não negligencie nenhum deles. Lembre-se
de que não existe corrente forte diante de um elo fraco; se você descuidar
de uma das etapas do processo de desenvolvimento de pessoal, todo seu
programa pode ser comprometido.
Resumirei a cadeia de valores de um processo de desenvolvimento de
recursos humanos em seis elos: entendimento das necessidades estratégicas
da empresa; identi cação das necessidades de desenvolvimento; elaboração
de um plano de ação para treinamento; orçamento e otimização de
recursos; execução e acompanhamento do plano de ação; avaliação de
resultados e retroalimentação.

10.2.1 Entendimento das necessidades estratégicas da empresa

Tendo ou não participado ativamente do desenvolvimento da estratégia de


negócios da empresa, os responsáveis pela área de Recursos Humanos
precisam entender profundamente essa estratégia, pois dela derivarão as
necessidades especí cas das pessoas que a executarão. É preciso saber para
onde a empresa quer ir e como pretende chegar lá para poder compor um
programa de desenvolvimento de pessoas compatível com as necessidades
atuais e futuras. Esse aspecto foi tratado no Capítulo 8.

10.2.2 Identificação das necessidades de desenvolvimento

A responsabilidade principal pela identi cação dessas necessidades é dos


executivos de linha. São eles que melhor conhecem os desa os que têm
pela frente, as características de seu pessoal, seus pontos fortes e os aspectos
a desenvolver. Compete igualmente aos seus subordinados a identi cação
de suas necessidades especí cas. A área de Recursos Humanos deve prover
as ferramentas para que isso seja feito.
A avaliação periódica de desempenho é a melhor ferramenta para a
identi cação de necessidades individuais. Caso a empresa não tenha
implantado um processo sistemático de avaliação de desempenho, o
assessment (avaliação feita por terceiros) é uma das soluções mais
indicadas. Seu objetivo é prover um mapa para o desenvolvimento de cada
pro ssional.

Quadro 10.1 – Assessment: objetivos e metodologia

Objetivos do assessment Metodologia de condução

Avaliar competências, Avaliação do indivíduo


habilidades e realizações Entrevistas conduzidas no local de
Analisar aspirações de carreira e trabalho ou em ambientes neutros
coerência com as necessidades Autoavaliação versus avaliação 360
da empresa graus
Avaliar compatibilidade e lacunas Comparação com o mercado
– cargo versus indivíduo
Desenvolvimento de plano de ação, com
Recomendar ações para programas específicos de treinamento
desenvolvimento e melhoria de e/ou coaching
desempenho

Fonte: Elaborado pelo autor.

Assessment é uma ferramenta que pode ser utilizada por empresas de


qualquer porte, basta que o líder tenha visão crítica para isso. Cuidado ao
observar: as mesmas considerações feitas sobre programas de avaliação de
desempenho em organizações com cultura Clã são também válidas para
programas de assessment.
Na primeira edição deste livro eu relatava o caso da Antares, fabricante de
componentes para máquinas e equipamentos industriais, sediada na cidade
de Caxias do Sul (RS), cujo CEO e principal acionista visualizou grande
potencial para o crescimento de seus negócios e sentiu que sua equipe
necessitaria melhorar suas competências de gestão. Investiu em um
trabalho de assessment de sua equipe, realizado por pro ssionais externos.
O resultado levou à elaboração de um programa especí co de
desenvolvimento para cada um deles, com resultados excelentes. A
empresa se desenvolveu, consolidando fortemente sua imagem de marca
em seu mercado. Posteriormente, o CEO relatou que o assessment permitiu
conhecer o potencial dos gestores, servindo para entender até que ponto se
poderia contar com cada um deles, quais os que valiam a pena ser apoiados
e treinados, quais eram seus pontos fortes e fracos. Isso resultou no
desligamento de comum acordo de um deles, em um plano intensivo de
desenvolvimento para outro e na certeza de que os outros poderiam
contribuir bem por muito mais tempo. A empresa iniciou um processo de
implementação da metodologia lean, e com o resultado do assessment foi
fácil saber qual a capacidade de cada um para trabalhar sob essa nova
cultura de gestão. Ele reconhece que, talvez, o assessment tenha servido
muito mais para ele, para desenvolver sua capacidade de lidar com seu
pessoal e liderar a empresa. Contribuiu também para que ele pudesse, com
frequência, lembrar-se de aspectos que necessita melhorar, especialmente
seu ânimo para energizar as pessoas.
A identi cação de necessidades pode ser feita diretamente com
supervisores das áreas funcionais. Os pro ssionais da área de Recursos
Humanos entrevistam de maneira estruturada esses supervisores,
estimulando-os a avaliar as características de suas equipes diante dos
desa os da área e a identi car necessidades especí cas de treinamento
coletivo e individual.
A aplicação de questionários especí cos, desenvolvidos pela área de
Recursos Humanos, pode ser usada, embora seja muito menos e ciente.
Deve, portanto, ser considerada um recurso adicional e não a única
ferramenta a ser aplicada para identi cação de necessidades.
A realização de workshops também pode ser um recurso adicional para
complementar levantamentos realizados com o uso das ferramentas
anteriormente apresentadas. Permite identi car e detalhar aspectos
internos de uma área ou aspectos comuns e complementares de diferentes
áreas.
Entrevistas de saída têm utilidades múltiplas. Uma delas é ajudar a
identi car lacunas ou debilidades especí cas nos processos de treinamento
da empresa, informação que pode contribuir para compor o quadro geral
de necessidades. Não são muitas as empresas que as realizam ou que as
conduzem de maneira e caz.

10.2.3 Elaboração de um plano de ação para treinamento

O plano de ação re ete a logística da condução dos programas de


treinamento. Deve ser elaborado pela área de Recursos Humanos e
submetido à consulta dos líderes das áreas funcionais envolvidas antes de
sua aprovação pela direção geral da empresa. Deve descrever, para cada
programa ou curso:

Conteúdo: objetivo a ser alcançado, o que será transmitido aos


participantes e seus módulos;
Quem participará: indivíduos ou grupos de pessoas;
Quem conduzirá: instrutores internos, consultores externos
especializados, professores de instituições educacionais;
Onde será conduzido: dentro da empresa ou fora dela (em
hotéis, centros de convenções, escolas);
Recursos de apoio: dentro do possível, identi car previamente
recursos, como equipamentos audiovisuais, livros ou manuais,
casos e materiais de trabalho em aula, entre outros;
Cronograma: tempo total, número de módulos ou sessões e sua
duração, datas. As datas exatas não precisam ser apresentadas em
um primeiro momento. Podem ser informadas oportunamente.

O plano de ação deve de nir, ainda, o responsável pela coordenação da


execução como um todo e de partes especí cas dele.

10.2.4 Orçamento e otimização de recursos


Nem tudo que se quer realizar cabe no orçamento. O custo para a
condução do plano de ação deve ser quanti cado e comparado com um
orçamento prede nido ou, caso este não exista, submetido à aprovação da
direção geral da empresa. Caso exceda o orçamento prede nido, ou não
seja aprovado pela direção geral, o plano de ação deve ter suas prioridades
revistas e ser reestruturado para caber nesse orçamento.
Uma solução para as organizações com menores recursos nanceiros para a
condução dos programas de desenvolvimento é a “multiplicação de
instrutores”, uma técnica pela qual os próprios líderes de áreas se tornam
instrutores de determinados programas. Esses líderes passam por
treinamento educacional e técnico, o que os capacita para conduzir
programas especí cos a grupos de pessoas. Podemos também identi car
talentos, dentro da organização, com conhecimentos e habilidades
especí cas, que podem conduzir com e cácia programas que de outra
maneira teriam de ser contratados externamente ou que não seriam
realizados.
Com relação a esse tema, um exemplo de outro Davi que encontrei: Eunice.
Quando assumi a presidência da Interclínicas, em um processo de
turnaround (recuperação), a empresa estava praticamente quebrada, sem
recursos para nada. Eunice é uma pro ssional médica que desenvolveu sua
carreira em áreas Administrativa e de Vendas e que estava na área
Comercial da Interclínicas havia alguns meses. Percebi que tinha
competências para assumir outras funções e a convidei para liderar a área
de Marketing, e, posteriormente, o setor de Atendimento a clientes. Ela
seria obrigada a treinar sua gente; não lhe dei recursos nanceiros para
contratar instrutores externos. Ela desenvolveu, com o apoio de sua equipe,
os programas de treinamento dos quais necessitava. Fui a uma de suas
aulas e quei impressionado com o que presenciei. Eunice me apoiou em
outros programas de desenvolvimento e, quando saiu da Interclínicas,
decidiu mudar completamente sua carreira. Passou a estudar e a
desenvolver o Davi que estava dentro de si, fundou a Fênix
Comportamental e hoje é uma pro ssional de sucesso; dedica-se a
programas de motivação dentro de seus clientes, coaching executivo e
desenvolvimento de carreira para jovens pro ssionais e a alguns programas
especí cos de desenvolvimento gerencial.

10.2.5 Execução e acompanhamento do plano de ação

Uma vez que as etapas anteriores tenham sido adequadamente conduzidas,


a implementação do plano de ação segue um caminho semelhante ao da
execução de qualquer projeto. Em programas mais abrangentes, há um líder
designado para atuar como coordenador geral, além de responsáveis por
programas especí cos. Em empresas menores ou planos mais restritos, basta
uma pessoa atuando como responsável pela implementação.
Nessa implementação, dois aspectos são fundamentais: o engajamento dos
gestores de cada área em que os participantes sairão treinados e a
competência dos instrutores. Os líderes motivam seus subordinados a
participar dos treinamentos, monitoram a aplicação do que aprenderam e
orientam sobre adequações a essa aplicação. O conhecimento e a habilidade
dos instrutores devem ser avaliados pelos responsáveis pelos programas. Se
esses ainda não os conhecem, devem buscar recomendações de quem já
usou seus préstimos e, preferivelmente, assistir a algum programa
conduzido por eles.

10.2.6 Avaliação de resultados e retroalimentação

Periodicamente, ou no mínimo durante a fase de levantamento de


necessidades para compor o programa de desenvolvimento seguinte, a área
de Recursos Humanos deve buscar informações sobre a e cácia dos
programas já implementados. Tanto os líderes de área quanto os
participantes dos programas devem ser consultados sobre a adequação do
conteúdo, o conhecimento e a didática dos instrutores, locais de realização,
duração, aproveitamento e aplicação prática do que foi ensinado.
Medir resultados de maneira tangível é algo que pode ser feito com relação
às áreas em que há tarefas repetitivas e nas quais a produtividade depende
diretamente da capacitação das pessoas que as executam. Trata-se de áreas
que contam com históricos estatísticos de desempenho coletivo e individual
em que podem ser comparados o antes e o depois dos treinamentos. Em
outras áreas ou para funções gerenciais, a medição tangível até pode ser
tentada, mas a informação decorrente, em geral, não tem credibilidade. Há
quem procure medir os resultados por meio do número de promoções com
relação aos contratados externamente, ou aos gastos com empresas de
seleção de executivos, e coloque essas informações em relatórios gerenciais,
mas só ca bonito, não tem e cácia.

10.3 Conteúdos
Os programas de capacitação podem abordar os temas mais diversos, de
acordo com a necessidade da empresa e dos participantes. Inicia-se pelo
mais básico, composto de sessões de introdução de um novo pro ssional na
empresa, e vai até o desenvolvimento de lideranças.
Quero chamar a atenção para os programas de integração de novos
pro ssionais na empresa. Diversas organizações grandes e consolidadas têm
programas muito bem estruturados e os conduzem de modo que não só
apresente toda a empresa e seu negócio aos novatos, como também que
sirva de motivador inicial. Entretanto, já presenciei empresas também de
grande porte e outras de menor porte negligenciando esses programas e
conduzindo-os de maneira mal estruturada e com instrutores inadequados.
O resultado deixa um ponto de interrogação na cabeça dos participantes
sobre a sua decisão de ingressar na empresa.
Estruture esse programa para que dê uma visão holística da organização,
porém com detalhes interessantes e importantes, e tenha instrutores que
conheçam a empresa, que possam responder a perguntas e que sejam
motivadores. Inclua gerentes funcionais nas apresentações e, quando
possível, convide o CEO para dar um “bom-dia”.
Nesse programa é fundamental que se abordem, de maneira bastante clara
e exaustiva, os aspectos culturais da organização e seus valores, conforme
mencionamos no Capítulo 1.
Os programas de desenvolvimento de pessoal podem ser mais generalistas
ou mais especí cos.

Programas mais generalistas: deles podem participar diferentes


pro ssionais em estágios semelhantes de desenvolvimento. Envolvem temas
de interesse de toda a organização ou de equipes especí cas, o
desenvolvimento de lideranças, por exemplo; divulgação de aspectos
relevantes, como visão, missão, estratégia e outras abordagens sobre a
realidade e as necessidades da empresa; trabalho em equipe;
desenvolvimento de coaches e mentores internos; aspectos conjunturais e
temas do momento, entre outros.

Programas especí cos: voltados para grupos que desempenham atividades


comuns, rotineiras ou não, como operação em equipamentos de chão de
fábrica; operação de call center; processos de compras; metodologias de
vendas; tecnologia da informação e grande número de outros temas
especí cos, de natureza técnica, operacional ou administrativa. Podem ser
voltados para níveis gerenciais ou técnicos muito especializados, com
necessidades particulares de aprendizado e de desenvolvimento
pro ssional. Esses programas podem se dar externamente, em escolas com
cursos de educação executiva ou técnica, pósgraduação e mestrado, em
consultorias especializadas ou coaching.

A rotação de pessoas entre cargos diferentes também é muito e caz,


principalmente em nível gerencial. Contribui para o desenvolvimento de
capacidades multifuncionais em indivíduos com potencial de ascensão a
escalões superiores na organização, ou para melhor aproveitamento
daqueles que possuem conhecimentos de outras áreas ou que podem
agregar valor a outras atividades por meio de experiência já adquirida em
sua atividade atual. Deve ser bem planejada, com a aquiescência de todos
os envolvidos: funcionário, chefe atual, chefe futuro e, quando pertinente,
até do CEO.
Outra forma de diferenciar os conteúdos é a abordagem de programas de
liderança versus programas funcionais. Os programas de liderança são
estruturados para diversos gestores de áreas diferentes e são mais focados
nas necessidades de cada etapa da carreira – desde que começam a
gerenciar uma equipe, até quando se tornam líderes de negócios. Nos de
liderança entram também os programas de mentorado, em que líderes se
tornam mentores formais dos colaboradores. Os programas funcionais são
mais técnicos, conforme já mencionado anteriormente.

10.4 Diferentes gerações


Gerações diferentes requerem processos de treinamento diferentes, seja
porque estão em estágios distintos da carreira, seja porque aspectos
culturais e de personalidade demandam maneiras diversas de
aprendizagem.
As gerações Y e Milênio, e alguns mais novos da geração X, buscam
soluções com maximização do emprego de tecnologias e uso de ferramentas
com base informática, e gostam de focar tarefa por tarefa ou projeto por
projeto. São mais diretos e menos políticos, menos comprometidos com
trabalho em equipe e mais individualistas. Tendem a escutar mais os não
muito seniores, porque os seniores lembram seus pais.
Os mais seniores têm um pouco menos de destreza para lidar com
ferramentas tecnológicas, exceto se estiverem em empresas de tecnologia e
a informática for marcante em sua vida pro ssional. São mais exíveis em
multitarefas e trabalham bem em equipe. Podem ter instrutores de
diferentes faixas etárias, porque respeitam mais as competências e as
habilidades do que a idade.
Portanto, quando se for estruturar os programas de desenvolvimento, é
necessário ponderar sobre a natureza do público que participará deles e
dosá-los de acordo com as características de cada um.
Mencionei anteriormente que programas de estágio, de jovens aprendizes e
de trainees têm sido cada vez mais utilizados em programas de seleção de
jovens pro ssionais. Os programas voltados para trainees, além de servir
como atrativo, têm o objetivo de integrar e aculturar os jovens na empresa e
fazer com que eles tenham um conhecimento aprofundado sobre seus
negócios e suas diferentes áreas; possibilitam ainda que se integrem à
comunidade e formem suas redes de relacionamento, facilitando seu
desenvolvimento pessoal e o trabalho em equipe. Os programas para
estagiários são dirigidos a estudantes de cursos universitários e os de jovens
aprendizes a jovens entre 14 e 24 anos, incluindo universitários, facilitando
sua transição para a vida pro ssional e servindo como base para a seleção
de futuros integrantes dos programas de trainees ou sua alocação a funções
especí cas.

10.5 Plano de carreira


Houve uma época, não muito distante, em que os funcionários ascendiam em hierarquias tão
elegantes e monumentais quanto templos astecas. Os degraus eram claros, o caminho parecia
óbvio; abstraia o fato de que quem chegava ao topo eram sacerdotes ou vítimas de sacrifícios
humanos. Hoje os trabalhadores, os gerentes, os executivos andam para lá e para cá em
empresas que se assemelham mais a placas de circuitos do que a pirâmides, onde as linhas de
energia e controle se esbarram pelo caminho; onde as rampas são muitas e as escadas poucas e
curtas; onde o princípio organizacional é a reorganização in nita e onde é difícil saber o que é
carreira e mais ainda como desenvolvê-la.
omas Stewart

A citação que inicia este tópico é de omas Stewart, em seu livro Capital
intelectual, em que re ete a diferença entre um passado não muito distante
e a realidade na qual vivemos.
O que é “carreira”? É aquele quadro que indica como podemos subir na
hierarquia da empresa ao longo dos anos e que é apresentado nos
programas de indução? Ou é o caminho pro ssional que alguém se propõe
a seguir como um desa o pessoal?
Quando terminei meu MBA nos Estados Unidos, com 28 anos de idade,
de ni como objetivo pessoal me tornar diretor geral de uma organização
aos 35. Para isso, cheguei à conclusão de que o melhor caminho seria
trabalhar em uma empresa de consultoria de ponta que me possibilitasse
vivenciar os mais diversos aspectos da gestão empresarial e da de nição de
uma estratégia ao desenho de processos.
Minha experiência na Booz, Allen & Hamilton, na ocasião uma das três
mais expressivas empresas mundiais de consultoria empresarial (depois
Booz & Co. que acabou sendo adquirida pela PwC), quase me fez esquecer
meu objetivo, até que um dia um cliente me disse: “Você me propõe a
racionalização deste processo porque nunca teve de demitir ninguém em
sua vida”. Voltei a pensar em meu objetivo, também motivado pelo fato de
que, se eu quisesse seguir como consultor, embora diferenciado, teria de me
sentar do outro lado da mesa por algum tempo. Fui atrás do meu objetivo e
assumi minha primeira direção geral, na Sodexo. A empresa crescia no
mercado mundial, mas ainda era inexpressiva no Brasil; em três anos ela
cresceu mais de dez vezes e entrou no mapa das principais empresas do
setor.
A empresa pode ter seu quadro de carreira, mas cada indivíduo é o
responsável maior pelo aproveitamento e pelo gerenciamento das
oportunidades que se apresentam. A empresa deve propiciar apoio, desde
que merecido. A pessoa deve ter seus objetivos, empenhar-se, mostrar sua
capacidade, brigar pelo que considera relevante para ela mesma e para a
empresa, e não esmorecer no meio do caminho.
Para grande parte das gerações Y e Milênio, o discurso de que eles têm uma
carreira pela frente e a apresentação do quadro evolutivo poderá não surtir
efeito. Eles são impacientes, querem resultados mais imediatos e não estão,
em geral, dispostos a esperar muito tempo por uma promoção; são mais
éis aos seus projetos do que à empresa. Promoção, para eles, pode ser
assumir projetos diferentes, com desa os crescentes, o que os mantém
motivados até acumular experiência e capacitar-se para assumir a
supervisão de outras pessoas ou de projetos simultâneos.
Quando falamos em desenvolvimento de carreira, pensamos
imediatamente em um crescimento vertical executivo na empresa, e isso, às
vezes, não motiva pro ssionais que não têm vocação para tal. Muitos
conhecem a história daquele excelente vendedor que foi guindado à
posição de gerente de Vendas, teve péssimos resultados e acabou sendo
demitido. Na realidade, tudo que ele queria era ser vendedor e ganhar bem
com as suas vendas, sem a responsabilidade de ter de supervisionar outros
vendedores.
A carreira ou a evolução pro ssional de um indivíduo em uma empresa
pode ser feita de diferentes maneiras.

Gerencial em linha: voltada para indivíduos que almejam ocupar


posições executivas na hierarquia da empresa e galgar posições
superiores.
Técnica: para aqueles que desejam seguir como especialistas em
algum setor ou tecnologia, crescendo em conhecimento, sem se
preocupar em dirigir equipes, e podendo liderar ocasionalmente
grupos de trabalho.
Gerencial ou técnica lateral: muda-se lateralmente de posição na
empresa ou passa-se a outra empresa do mesmo grupo. Em
posição gerencial, pode ser um caminho para adquirir novos
conhecimentos e ascender na organização em que já se trabalha
ou em alguma outra.
Expansão de responsabilidades: quando o pro ssional assume
responsabilidades complementares às suas, expandindo funções,
orçamento, equipe. Trata-se de um passo para evoluir na
empresa.

10.6 Desenvolvimento de sucessores


Identi camos, no Capítulo 4, que um dos entraves nos processos de gestão
de gente é o medo do executivo de desenvolver seus substitutos, por recear
que a organização prescinda dele a qualquer momento. Essa é uma parte
inerente à sua posição de líder.
A empresa deve incluir, como política de recursos humanos, o investimento
em programas de identi cação e desenvolvimento de sucessores para todas
as posições gerenciais e aquelas de cunho técnico mais especializado. A
saída de um desses pro ssionais, sem o respaldo necessário, pode parecer
não causar danos à empresa, mas seguramente atrasará algum projeto em
andamento, exigirá investimento na contratação de uma empresa de
seleção de pro ssionais, resultará na promoção de pessoal ainda não
preparado para assumir maiores responsabilidades, além de causar outros
problemas tangíveis ou intangíveis.
A identi cação de potenciais sucessores deve ser feita por meio dos
processos de avaliação continuados, caso existentes, ou de um projeto de
assessment conduzido por especialistas externos. O desenvolvimento deve
ser feito por meio dos programas de treinamento e de coaching implantados
na empresa ou especi camente desenhados para esse propósito. Do
processo de avaliação de executivos deve fazer parte a iniciativa de
identi car e desenvolver sucessores.

10.6.1 Coaching e mentoring

Aprendi a atividade de coaching de maneira quase empírica, com base em


minha experiência pro ssional, que me trouxe uma bagagem
multifuncional. Um curso de coaching pelo Lore International Institute, na
ocasião um dos líderes mundiais da área e posteriormente incorporado pela
Korn Ferry, foi fundamental para que eu obtivesse uma metodologia
estruturada para que aplicasse de maneira mais e ciente minha
experiência.
Coaching e mentoring viraram moda. Todo consultor diz que também é
coach. Os executivos a rmam ser mentores de seu pessoal. Há uma
quantidade enorme de cursos de coaching no mercado. A pro ssão cou
praticamente “comoditizada”. É necessário ter cuidado com isso, pois muitos
coaches, embora entendam a metodologia, não têm a experiência
pro ssional para tal.

Coaching é um processo pelo qual um pro ssional quali cado (coach)


ajuda um indivíduo (coachee) a melhorar seu desempenho ou a mudar seu
comportamento. O trabalho se inicia com uma avaliação em profundidade,
passa pelo desenvolvimento de um plano de ação e é seguido por um
acompanhamento sistemático.

Mentoring é um processo de aconselhamento individual, conduzido,


geralmente, por um supervisor não imediato, que acompanha a carreira do
indivíduo na empresa, e com quem esse indivíduo troca periodicamente
ideias sobre seu desenvolvimento, desempenho e comportamento dentro
da organização.

O coaching pode ser uma ferramenta muito e caz para o desenvolvimento


de executivos, desde que conduzido por um pro ssional sênior, experiente
e competente. Seus objetivos são: otimizar o desempenho de executivos e
empresas para alcançar níveis superiores de resultados; motivar executivos a
adotar planos de ação que contribuam para a melhoria de sua vida
pro ssional e pessoal; desenvolver qualidades de liderança e de
relacionamento, e capacidade de aprendizagem, que inspirem e motivem
executivos a exercer seu potencial de maneira otimizada; possibilitar que
in uam em mudanças na liderança e na cultura das empresas que resultem
em melhorias de desempenho; melhorar a autoestima e a autovalorização,
para possibilitar a abertura de novas portas para a busca da excelência em
aspectos de carreira e de vida. O coaching pode ser utilizado para diferentes
níveis e em diferentes situações. As mais frequentes são:

Executivos promovidos a posições de diretores gerais ou de


diretores de área sem total preparo para a nova função, mas com
rápido potencial de crescimento.
Pro ssionais de alta performance ou com grande potencial de
crescimento, que desejam atingir níveis ainda mais altos de
e cácia na organização.
Pro ssionais com bom desempenho, que estejam passando por
momento de baixa performance ou questionando sua carreira no
futuro, que a empresa tem interesse em manter e em recuperar.
Pro ssionais que necessitam de apoio para um reposicionamento
comportamental como modo de ganhar ou recuperar respeito
pessoal e na carreira por parte dos colegas.
Pro ssionais que estejam questionando sua carreira ou seu
posicionamento na empresa, e para os quais a empresa quer dar a
oportunidade de decidir sobre o seu futuro.

O processo tem início com a identi cação de pontos fortes e de


necessidades de desenvolvimento, derivados de uma avaliação sobre o
coachee realizada por meio de entrevistas com o coach, além de
autoavaliação e avaliação 360 graus. Com base nisso, elabora-se um plano
de ação, de comum acordo. Segue-se um processo de acompanhamento
desse plano, com reuniões periódicas realizadas pessoalmente e, às vezes, a
distância e avaliação de progresso.
O prazo para a condução desse processo varia de acordo com os objetivos,
com o tipo de coaching desejado e com as características e necessidades do
coachee. Quando realizado pelo supervisor imediato do pro ssional, o
processo é continuado – mesmo assim deve ter como base um plano de
ação. Quando conduzido por um consultor externo, deve ter prazo mínimo
de três meses, para situações em que se faz necessária apenas uma revisão
geral das condições do coachee, com orientações especí cas sobre melhoras
a considerar. Seis meses é um prazo mais usual. Talvez seja necessário um
acompanhamento de manutenção durante alguns meses, com menor
interação entre coach e coachee.
Mentoring é um processo mais simples, mas igualmente valioso para o
pro ssional e para a empresa. O mentor, em geral, é um executivo em
posição hierárquica igual ou superior à do chefe imediato do funcionário
que será ajudado. Este, então, conta com um conselheiro particular
permanente dentro da empresa, que atua também como con dente. As
conversas entre ambos permanecem entre eles; o mentor não elabora
relatórios para entregar à empresa nem reporta a superiores, pares ou à área
de RH o que é falado. O mentor não pode ser confundido com alguém que
possa exercer in uência na empresa para acelerar a carreira do indivíduo a
quem presta aconselhamento.
Um executivo tem de ser bem preparado para atuar como mentor; ele tem
de saber como se portar perante o colaborador e como o aconselhar, caso
contrário, poderá intervir indevidamente, se não nocivamente, no
comportamento e na evolução do colaborador na empresa.
O mentor pode ser indicado pela organização ou escolhido pelo
funcionário, dependendo da política da empresa. E pode estar em região
geográ ca diferente. Um mentor deve ter no máximo seis aconselhados. É
possível haver troca de mentor no meio do processo, caso um dos dois
envolvidos chegue à conclusão de que ele não está tendo e cácia.
O processo tem início com a aceitação mútua do relacionamento e com
uma conversa na qual ambos se conhecem com mais profundidade. O
mentor passa a saber quais os anseios e as preocupações do aconselhado e,
com base nisso, os dois desenvolvem conversas periódicas, com trocas de
ideias e desenvolvimento de sugestões que possam ser seguidas pelo
aconselhado.
O mentor não é o supervisor do pro ssional; é escolhido pelo aconselhado
em comum acordo com a área de Recursos Humanos e atua como consultor
neutro de carreira. Não pode ser seu promotor dentro da empresa; o que se
conversa entre eles permanece con dencial.
Infelizmente, uma ferramenta de desenvolvimento tão boa como mentoring
é muitas vezes adotada de forma equivocada nas empresas. O mentor passa
a se julgar “dono” ou chefe do pro ssional por ele orientado, deturpando o
processo. Nem todos os executivos, mesmo os bem-sucedidos, tem per l
para serem mentores; e não podem ser colocados nessa posição. Além disso,
mesmo os que possuem esse per l, devem ser treinados para exercer
adequadamente esse papel.

10.7 Desenvolvimento de talentos versus não


talentos
O que fazer com aqueles que não são considerados talentos ou não foram
incluídos em programas especiais de desenvolvimento? Ficarão
desmotivados e perderão produtividade? Não necessariamente. É preciso
ser transparente com eles, explicar-lhes porque não foram incluídos nesses
programas e possibilitar sua participação em outros, que propiciem o
desenvolvimento de outras competências.
É praticamente impossível desenvolver programas estruturados de
treinamento para todos os funcionários, mas é possível realizar programas
de capacitação técnica, operacional ou gerencial com recursos da própria
empresa, conduzidos pelos gerentes, transformados em multiplicadores de
treinamento, conforme já observamos neste capítulo. Ocasionalmente,
pode-se trazer um especialista externo para workshops ou palestras.
Quando os processos de avaliação de desempenho são adequadamente
implantados e seguidos, as pessoas passam a entender que possuem
qualidades ou limitações e que, portanto, nem todos podem subir na
hierarquia gerencial da empresa ou escalar novas posições em carreiras
técnicas.
Em 2003, ao assumir a vice-presidência de Desenvolvimento de Negócios
na América Latina do grupo inglês Compass PLC, uma das líderes
mundiais em serviços de alimentação, que no Brasil detém o controle da
GRSA, tive a oportunidade de pôr em prática em diferentes países,
simultaneamente, critérios e metodologias de seleção e treinamento em
uma força de vendas, cujos resultados em cinco anos foram: incremento no
volume anual de vendas, por vendedor, em sete vezes; aumento da taxa de
conversão de propostas em contratos, em cinco vezes, com o mesmo
número de vendedores em toda a região.
Após um diagnóstico das estruturas e processos de venda, estabelecemos
um modelo baseado (a) no per l desejado para diretores e gerentes de
negócio; (b) nos métodos de treinamento; e (c) nos processos de venda.
Com base no DISC, conforme mencionado anteriormente, de nimos per s
de competências especí cos para os diretores de novos negócios de cada
país e para os gerentes de negócio de cada segmento de atuação.
As equipes de Vendas foram avaliadas com base em seu desempenho e nos
per s desejados. Em seguida, foram substituídos vários diretores e
membros de suas equipes, recrutados com base nesses per s, e os demais,
juntamente com os novos, treinados de forma sistemática. Adotamos um
programa de treinamento já consagrado pela divisão americana, que tinha
como base uma plataforma única de treinamento (funil de vendas) e uma
forte disciplina na condução e no acompanhamento da aplicação em
campo. Isso, combinado com uma revisão do processo de vendas, resultou
no impressionante incremente de desempenho acima mencionado.
Depois de cada treinamento eu visitava os países e saía a campo com os
vendedores, observando o comportamento deles e a aplicação das técnicas
aprendidas, para, após cada reunião, dar-lhe um feedback sobre o
desempenho observado e como poderia melhorá-lo. O apoio irrestrito do
CEO para a América Latina e dos CEOs de cada país foi fundamental para
o sucesso alcançado.
Desenvolvimento de pessoal não é, portanto, a condução de programas de
treinamento medidos em quantidade de horas/aula. É a garantia da
sustentabilidade da empresa por meio da gestão do conhecimento e da
transferência de experiências, cuja origem pode ser interna ou externa à
organização. As pessoas precisam querer aprender; devem ser humildes
para reconhecer suas limitações e buscar os ensinamentos necessários para
completar seus conhecimentos, suas habilidades e suas competências, além
de reconhecer que podem transmitir o que sabem a outros, sem se sentirem
ameaçadas de perder espaço na empresa. Ao contrário, isso cria condições
para melhor desempenho individual e coletivo.
Capítulo 11

Demissão é função do gestor, não


do RH
O jovem chefe estava nervoso. Teria de demitir um funcionário, o que
nunca zera em sua carreira. Tampouco recebera treinamento para essa
situação na vida pro ssional ou em bancos universitários. Passou a noite em
claro, teve problemas estomacais, foi trabalhar com olheiras. Chamou seu
subordinado e teve com ele o seguinte diálogo:

— Sinto informar que a partir de hoje não serei mais seu chefe.
— Mas o que houve, chefe? Que aconteceu? Por quê? Para onde você vai?
— Bem, não sou eu quem vai... é você!

Essa piada (ou drama?) re ete bem o despreparo dos gestores em situações
de demissão de subordinados.
Quantas vezes as áreas de RH são acionadas para demitir funcionários, em
processos equivocados, dos quais o gestor se esquiva e o pessoal de recursos
humanos lamentavelmente assume? O RH tem um papel importante nesse
processo, como veremos mais adiante, mas não demite pessoal de outras
áreas.
Demitir não é função do RH. Demitir é responsabilidade de cada gestor, no
que diz respeito a seus subordinados. Assuma isso gestor; se não sabe como
fazer, busque apoio com o RH, mas não delegue a ele. Não se acovarde
empurrando para outros o que é sua responsabilidade. Isso é também uma
forma de demonstrar para sua equipe que você é um líder que se preocupa
com sua gente.
Gestores passam por uma variedade enorme de conteúdos de treinamento
técnico e de práticas gerenciais, mas raras empresas adotam um programa
de treinamento que aborde aspectos relacionados a processos de demissão.
Destaco o tema neste capítulo especí co por sua relevância, pois o
desligamento de funcionários se re ete diretamente no estado de ânimo do
pessoal, dependendo de como são conduzidos.
Dividirei minhas recomendações em três situações que envolvem
demissões:

Uma pessoa em um processo “amistoso”;


Uma pessoa em um processo não amistoso ou por justa causa;
Um grupo de pessoas.

11.1 Demissão de uma pessoa em um processo


“amistoso”
Classi co um processo de demissão como “amistoso” quando o indivíduo é
desligado por baixo desempenho, por necessidades de ajuste no quadro de
funcionários ou até por incompatibilidade em seu enquadramento pessoal
na cultura da empresa ou no modus operandi da área em que atua. Minhas
recomendações são as seguintes:

Analise bem a situação antes de tomar a decisão. Avalie se os


motivos pelos quais você considera dar um cartão vermelho ao
seu subordinado são fundamentados; coloque-os por escrito e
pondere. Eles servirão também para a conversa que você terá com
o funcionário. Troque ideias com seu chefe, se necessário, ou se a
política da empresa assim determinar. Evite conversar sobre o
assunto com outras pessoas, pois con dencialidade é algo muito
relativo.
Veri que se seu subordinado merece a demissão por
particularidades de sua área ou da área dele, e veja se o
funcionário pode ser útil em outro setor; faça isso com o apoio do
RH. Recomende-o a outra área somente se tiver convicção de que
ele poderá se integrar a essa e se for contributivo; nunca
recomende alguém simplesmente para se livrar dessa pessoa ou se
não estiver convencido de que ela poderá ser útil a outra área; se
você o zer, sua imagem estará em jogo.
Tomada a decisão, converse com o RH sobre os procedimentos a
seguir, para que sigam as políticas da empresa e para que essa
área possa se preparar para receber o funcionário depois que você
lhe comunicar a demissão.
Evite surpresas, ou seja, a notícia deve ser o corolário de um
processo no qual você já alertara o subordinado sobre fatores que
nalmente o levaram a tomar a decisão de desligá-lo da empresa.
Explique os motivos da demissão; faça um resumo de sua
avaliação sobre o desempenho pro ssional e comportamental do
subordinado e deixe claro
o porquê de sua decisão; tenha um cuidado especial com as
pessoas com mais anos de empresa.
Não jogue a responsabilidade pela demissão em ninguém. Não se
acovarde escondendo-se atrás de outras pessoas.
Explique resumidamente como serão os próximos passos, os
direitos que o demitido tem, eventuais benesses que receberá, e
deixe os detalhes do processo com a área de RH; mas acompanhe
o seu desenrolar até o desligamento de nitivo.
Trate o demitido com respeito e proponha-se a dar-lhe apoio
depois que ele sair da empresa, ou a servir-lhe de referência.
Di cilmente ele buscará apoio, mas poderá dar seu nome como
referência.
Seja transparente com o resto da equipe sobre o porquê da
demissão, sem entrar em particularidades que possam ferir a
imagem do colega que se vai.
Alguns lembretes complementares:

Apesar de a legislação propiciar que o demitido trabalhe durante


um mês, no período de aviso prévio, evite isso. Mesmo que o
processo seja “amistoso”, manter uma pessoa demitida na equipe
não é salutar, nem para ela nem para a equipe. Dê-lhe um tempo
adequado para limpar a sala, passar eventuais tarefas pendentes e
despedir-se dos colegas. Dependendo, porém, da reação que ele
tiver ao receber a notícia, poderá ser necessário que esse tempo
seja reduzido a algumas horas. Ele também não vai querer car
na empresa por muito tempo, pois terá de cuidar de seu futuro.
Torna-se cada vez mais comum que as organizações adotem a
política de bloquear o acesso do colaborador, qualquer que seja
seu nível hierárquico, ao seu computador após ser desligado.
Enquanto ele recebe a comunicação, seu acesso a e-mail e rede
corporativa é bloqueado. Ele tem, porém, acesso ao seu
computador para retirar arquivos pessoais (que não deveriam
estar ali), acompanhado de um pro ssional do RH ou de TI.
Ao comunicar o desligamento, não peça que o funcionário
mantenha isso em sigilo até passar para você, ou para alguém
mais, as tarefas que desempenhava. A organização logo se dará
conta da demissão, pois a informação vazará. E são raríssimos os
pro ssionais que conseguem continuar trabalhando na empresa
seguindo o ritmo anterior depois de informados sobre seu
desligamento.
Não “cozinhe” o funcionário. Se você quer demitir alguém, não
comece a restringir suas atividades, a excluí-lo de reuniões, a
parar de delegar-lhe tarefas. Lamentavelmente, isso é muito
comum e somente contribui para que a equipe questione sua
competência como gestor e como alguém com coragem para
tomar decisões duras, além de também in uir no ânimo da
equipe. Aja com consciência, de maneira rápida e respeitosa.
Se você percebeu ter cometido um erro ao contratar alguém,
corrija-se o mais depressa possível: desligue essa pessoa ou
veri que se há outra área na empresa em que ela possa se
encaixar. É uma decisão difícil, em especial se o funcionário já
estivesse empregado antes de ser contratado. Trate-a com muito
respeito e ofereça benefícios compensatórios de saída, nesse caso
até com outplacement. Outplacement é uma assessoria pessoal
que auxilia um pro ssional a de nir objetivos, planejar e
organizar um processo de transição e recolocação pro ssional, ou
orientação para iniciar um negócio ou orientar um estilo de vida.
Serviço geralmente oferecido por empresas para pro ssionais
demitidos, mas podendo ser contratado pelo próprio indivíduo.
Não delegue a um consultor ou a um conselheiro a tarefa de
demitir alguém. Já vi isso acontecer, em uma iniciativa deplorável
por parte dos dirigentes da organização e talvez mais deplorável
ainda por parte do consultor ou do conselheiro que aceita esse
papel.
Não padronize seus procedimentos de informação de demissões
aos subordinados. Tive um chefe, de quem todos na empresa
gostávamos, que primava sobretudo pelo respeito humano, mas
que tinha um padrão de procedimento para demissões: sempre o
fazia em um almoço, em uma sexta-feira, preferivelmente véspera
de feriado. Nem sempre isso acontecia, mas vocês podem
imaginar as reações quando ele convidava alguém para um
almoço na sexta-feira!

11.2 Demissão de uma pessoa em um processo


não amistoso ou por justa causa
Processo não amistoso é aquele em que o funcionário cometeu alguma falta
grave, prejudicial à equipe ou à empresa e que compromete sua
permanência em função de aspectos éticos, pro ssionais ou
comportamentais. Os casos de justa causa são aqueles em que o indivíduo
deliberadamente lesa a empresa, em seu benefício ou de terceiros.
Em ambos os casos, são recomendadas as seguintes ações:

Analise com cuidado a situação. Con rmada sua decisão, leve o


caso ao conhecimento de seu superior hierárquico e envolva a
área de RH.
Conduza o procedimento de demissão o mais depressa possível.
Você é responsável por comunicar o desligamento; em seguida
envolva o RH. Dependendo da gravidade do caso, você pode
solicitar que alguém da área de Recursos Humanos o acompanhe
na reunião com seu subordinado.
Se a situação for de justa causa, assegure-se de que o RH e o
Jurídico estejam envolvidos e de que todos os elementos
necessários foram documentados. Também aqui você é o
responsável por comunicar o desligamento, acompanhado de
alguém da área de Recursos Humanos e do Jurídico da empresa,
que se encarregará de dar sequência ao processo.
Nesses casos, ao contrário da situação “amistosa”, o elemento
surpresa é fundamental, para evitar que o colaborador tome
medidas vingativas contra a empresa. Assegure-se de que ele não
tenha acesso a seu posto de trabalho ou ao computador sozinho,
depois de receber a notícia. Tire-o imediatamente da rede da
empresa. Em uma das organizações em que trabalhei, tivemos de
demitir a assistente de inteligência de mercado por
incompetência e, por que não, por mau-caratismo. Ela mantinha
em seu computador todo o banco de dados da área Comercial da
empresa. Convoquei as áreas de Recursos Humanos e de
Tecnologia da Informação e dei instruções especí cas sobre como
proceder – quando essa pessoa fosse chamada para ser
comunicada da demissão, eles deveriam estar de plantão para
acompanhá-la ao local de trabalho e assegurar-se de que ela
apenas retirasse seus bens pessoais, sem acesso ao computador.
Acontece que uma dessas pessoas era amiga da funcionária e não
levou a sério as instruções. A demitida cou durante uma hora
sozinha em seu posto de trabalho e nesse tempo copiou todo o
arquivo de dados, limpando o disco rígido. Tivemos de negociar
com ela a restituição dos dados roubados, sob pena de perdê-los,
porque, para minha surpresa, a área de Tecnologia da Informação
não fazia o backup sistemático, como deveria fazer;
Reações negativas, agressivas ou de retaliação, podem vir até de
pessoas que mantêm relacionamento próximo com seus chefes.

Alguns lembretes complementares:

Mesmo que o colaborador tenha sido demitido por motivo não


amistoso, o gestor não deve fazer comentários pejorativos sobre
ele. Deve informar o motivo da demissão dentro dos limites
pro ssionais.
A demissão não deve ser feita pelo RH ou delegada a um
consultor ou a um conselheiro da organização.

11.3 Demissão de um grupo de pessoas


A demissão de um grupo de pessoas ocorre, em geral, em situações como
redução de custos, automatização de processos, mudança de local de
trabalho (de escritórios, de fábricas), mudança de políticas e procedimentos
de trabalho (como a terceirização de funções). Faço uma ressalva no caso
de demissões por diminuição de custos: redução linear do tipo 10% do
pessoal de todas as áreas são decisões pouco inteligentes. Analise bem cada
área, faça um processo seletivo que envolva os gestores e reduza o
necessário, porém, de maneira diferenciada, de acordo com as atividades e
as necessidades de cada setor. Em situações como essa, talvez algumas áreas
não possam dispor de pessoal, além de precisar de funcionários adicionais.
Alguns dos prováveis demitidos em outras áreas podem ser úteis aqui.
Quando fui CEO da Interclínicas, nossa situação crítica tornava necessária a
redução de custos em todas as áreas e atividades da empresa. Enquanto
cuidávamos dos custos operacionais, de nimos também fazer uma redução
de 30% no overhead (custos xos). Reuni todos os gestores e comuniquei
esse objetivo, informando que a última coisa que eu gostaria de fazer era
demitir. Pedi que reunissem suas equipes e em uma semana voltassem com
todas as alternativas possíveis de redução de custos, sem diminuir o
número de pessoas. Eles levaram soluções que atingiam 50% dos objetivos.
Não havia alternativa; tínhamos de reduzir pessoal. Dei instruções para que
voltassem às suas áreas e em uma semana recomendassem os cortes. A
maioria reuniu suas equipes, explicou os motivos dos cortes e fez uma
seleção participativa. O resultado foi triste, mas não traumático, e atingimos
nossos objetivos.
Em uma outra situação, decidimos terceirizar toda a força de vendas, 100 e
poucos vendedores. Manteríamos uma pequena equipe com pessoal mais
sênior para cuidar diretamente de grandes contas, e o restante seria
terceirizado com corretoras. Este, sim, foi um processo sigiloso. Tomada a
decisão, solicitei à gerente de RH que convocasse todo esse pessoal para
uma reunião comigo e com ela na manhã seguinte. Eu comunicaria a todos,
pessoalmente, a decisão. Tentaram me demover desse procedimento,
recomendando que fosse enviada uma carta a cada pro ssional. Prossegui
com meu plano, pois todos eram idôneos, gente que dedicara seu talento e
seu suor à empresa, muitos por vários anos; portanto, mereciam tratamento
respeitoso. Na reunião, expliquei o porquê da decisão, de fundo estratégico
e necessária para a sobrevivência da organização. Reforcei que nenhum
deles deixaria a empresa por falta de competência ou por mau desempenho,
portanto, mereciam nosso respeito. Informei também que infelizmente a
empresa não tinha condições de pagar outplacement, mas que
colaboraríamos para que eles encontrassem novas posições e eu,
pessoalmente, colocava-me à disposição como referência. Nos dias que se
seguiram vários deles me procuraram para agradecer o modo como haviam
sido tratados.
As recomendações no caso de demissões de grupos são:
Salvo em uma situação como a que descrevi, em que a
con dencialidade da decisão estratégica era necessária, conduza
o processo de maneira transparente, ou seja, informe
antecipadamente aos seus funcionários do que acontecerá com a
empresa e como eles serão tratados no processo.
Mantenha essa informação con dencial enquanto estiver sob
análise por um grupo restrito, mas, a partir do momento em que
ela puder suscitar questionamentos, evite que a “rádio peão”
tome conta. Antecipe-se e informe seu pessoal sobre o que será
feito.
Esteja aberto para receber todo colaborador que tenha dúvidas
sobre o que acontecerá, explicando-lhe o que puder ser
informado.
Realize reuniões periódicas com seus gestores e instrua-os a fazer
o mesmo com suas equipes, informando sobre o andamento do
processo.
No caso de transferência de locais de trabalho, convide os
pro ssionais estratégicos para as operações, oferecendo condições
adequadas para a mudança. Abra oportunidades para outros que
desejarem se transferir quando a organização julgar que haverá
posições adequadas para ambos os lados.
No caso de terceirização, negocie com a empresa que assumirá as
atividades a contratação do pessoal da sua equipe que possa ser
aproveitado e que queira continuar trabalhando na atividade, na
companhia terceirizada.

Alguns lembretes complementares:

A de nição prévia sobre o que acontecerá e uma comunicação


transparente até o limite do possível são fundamentais para
garantir a continuidade das operações. A falta de transparência e
a prevalência dos comunicados por meio da “rádio peão” podem
levar à perda de pessoal estratégico, que começará a procurar
novas oportunidades no mercado com receio do que ocorrerá no
futuro.
Se a situação for semelhante àquela que vivi na Interclínicas, ou
seja, mudança de estratégia que impacte o quadro de pessoal, as
ações devem ser realizadas o mais rápido possível.
Evite passar falsos comunicados aos colaboradores, como “os
rumores são infundados e nada vai acontecer”, quando o
inevitável já está sendo preparado. Isso não acalmará o pessoal;
ao contrário, fará aumentar o nível de insegurança, reforçado
pela descon ança na direção da organização.

11.4 O papel do RH nos processos de demissão


O primeiro papel do RH em processos de demissão é estabelecer as políticas
e os procedimentos que deverão ser seguidos pelos gestores. Seu papel
principal, porém, é não aceitar atuar como feitor, acatando solicitações de
gestores, qualquer que seja o nível, para comunicar o desligamento aos
funcionários. Gestor que sabe ser gestor não foge de sua responsabilidade
no ato da demissão. Gestor de RH que se preze não aceita essa delegação e
orienta o gestor sobre sua responsabilidade na decisão e na comunicação do
desligamento.
Em um congresso de recursos humanos, em um painel sobre
desenvolvimento de gestores, levantei o aspecto da falta de preparo dos
executivos para conduzir demissões e a falta de módulos de treinamento
correlatos em programas de desenvolvimento de liderança nas empresas.
Nesse painel havia dirigentes de recursos humanos de organizações de
grande porte, com reconhecida competência gerencial. Perguntei se alguma
dessas empresas contava com módulos de treinamento para demissão e a
resposta foi “não”. Um dos dirigentes comentou que essa era realmente uma
falha e que incluiria um módulo desses nos programas de treinamento de
desenvolvimento de lideranças da empresa.
Qual é então o papel do RH nos processos de demissão?

Estabelecer políticas e procedimentos a ser seguidos pelos


gestores.
Incluir, nos programas de treinamento e desenvolvimento de
gestores, módulos sobre esses procedimentos e comportamentos
nos processos de demissão.
Recusar-se a atuar como “agentes da demissão” em nome dos
gestores, fazendo com que estes assumam esse papel.
Assegurar-se de que os processos de demissão estejam de acordo
com as políticas e os procedimentos corretos e garantir que as
pessoas (em processos “amistosos”) sejam tratadas com a mesma
dignidade e respeito de quando foram contratadas.
Assegurar que os processos indenizatórios sejam seguidos de
acordo com a legislação.
Atuar como consultor dos gestores, principalmente dos mais
novos, orientando-os sobre como proceder.
Estar à disposição dos demitidos para oferecer-lhes assistência,
dentro do possível.
Nos casos de demissão não amistosa, prestar assistência ao gestor
antes da tomada de decisão e prover-lhe todo apoio necessário,
inclusive participando da reunião de desligamento, caso
solicitado.
Nos casos de justa causa, assegurar-se, juntamente com o
departamento Jurídico, de que todos os procedimentos legais
sejam observados e acompanhar o gestor na reunião de demissão.
Realizar entrevistas de saída, nas quais é possível identi car
também como o funcionário foi tratado pelo gestor. Prover
retroalimentação ao gestor, com recomendações de mudança de
postura nos procedimentos de futuras demissões, caso necessário.

Demitir é tarefa do gestor. Quanto a esse princípio, não há mais o que dizer.
O processo deve ser pro ssional, tão humano quanto possível. E cabe à área
de Recursos Humanos prover orientação e treinamento aos gestores para
que isso seja viabilizado.
Capítulo 12

Tratando gente como gente


Certa vez, eu voava de Belo Horizonte para São Paulo quando meu vizinho
de poltrona me perguntou se eu era o Bichuetti. Respondi que sim e me
desculpei por não reconhecê-lo. Ele então disse: “Você não vai se lembrar
de mim, mas eu nunca me esquecerei de você. Quando você foi diretor
geral da Sodexo, você me entrevistou para a posição de diretor comercial.
Não fui o escolhido e você me telefonou para me informar de sua decisão,
dizendo os motivos pelos quais eu não havia sido selecionado. Sou-lhe grato
por isso, primeiro pela atenção pessoal que me deu, e, segundo, pela
informação, que me foi muito útil a partir daquele momento”.
Existem inúmeros estudos, artigos, livros e prêmios cujo tema é a motivação
das pessoas no local de trabalho, fator preponderante para sua retenção. No
fundo, o que temos de fazer é tratar gente como gente. Os veteranos e os
baby boomers aprenderam isso com seus pais e ensinaram aos seus lhos.
Não recebi nenhum treinamento sobre como tratar pessoas nos bancos
universitários ou por parte de empresas em que trabalhei antes de assumir
minha primeira gerência geral. Se eu acertei desde o início nesse tratamento
foi devido à formação que recebi de meus pais, à convivência com uma
família carinhosa, à vivência que tive com mestres que se preocupavam com
seus alunos, com amigos e com as pessoas atenciosas com quem convivi,
com estudos de casos de sucesso empresarial e com os ensinamentos que
recebi do Larry, o coach excepcional que tive no começo de minha carreira
na Booz.
Lee Iacocca, muito antes de Jack Welch ser famoso, foi um dos mitos da
gestão empresarial nos Estados Unidos. Nos anos 1980, quando a Chrysler
enfrentou uma crise e quase chegou à falência, Iacocca liderou sua famosa
recuperação. Dizia ele: “Management is motivating people” (em português,
Gestão é motivar pessoas). Verdade incontestável: um líder somente
consegue resultados duradouros e a empresa somente consegue se
perenizar e aumentar de valor para seus acionistas se dispuser de uma força
de trabalho, do CEO ao porteiro, motivada e engajada. O cerne da questão
é, portanto, como manter as pessoas motivadas.
Observamos fórmulas variadas de motivação de pessoas que, muitas vezes,
valorizam um conjunto de procedimentos adotado pela empresa para
estimular os colaboradores. Investir em cursos para funcionários, ter um
espaço para descanso e entretenimento na empresa, proporcionar benefícios
extras como jantares de confraternização, contratar personal trainer para
aulas de ginástica no trabalho e outros, são válidos e ajudam no processo de
desenvolvimento de um clima organizacional favorável a altos graus de
motivação. Porém, nunca irão funcionar se a cultura de tratar gente como
gente não estiver impregnada na organização.
Essa cultura, quando existe, re ete-se em políticas e práticas de relações
entre empresa e colaboradores, chefes e subordinados, baseados em
respeito e con ança mútuos. Quando esse princípio existe, torna-se mais
fácil a sintonia e a sinergia geral na consecução das estratégias e objetivos
empresariais. Parte fundamental dessa cultura é colocar em funções
executivas, ou de liderança de grupos de trabalho, líderes que sabem lidar
com pessoas e que gostam disso.
A empresa pode contratar pro ssionais ou assessorias, voltados para
estudos de Psicologia, Neurociência e outros tantos campos correlacionados
para entender seus funcionários e desenvolver programas de motivação.
Com frequência as organizações se dedicam a conhecer competências e
habilidades do empregado a m de alocá-lo em uma função que requer
alguém com seu per l. Em seguida, designam os colaboradores para essa
função, sem levar em conta se eles se interessam por ela. Esquecem-se de
que as pessoas se sentem realizadas quando estão desenvolvendo atividades
que lhes interessam, que lhes apaixonam.
Não se desenvolve nem se implementa um programa de motivação. Ela é o
corolário de um conjunto de fatores que começam nos valores e na cultura
empresarial orientada para a valorização das pessoas. Tem início com os
donos, com o CEO, e multiplica-se por todos os funcionários. Tudo de que
falamos até agora são fatores que levam à formação de climas
organizacionais altamente positivos e motivadores do engajamento e da
dedicação dos colaboradores.
Abordarei a seguir alguns aspectos que considero importantes no
tratamento de gente como gente, além dos já citados.

12.1 O papel do gestor e do RH


Assim como não passei por treinamentos pro ssionais orientados a
entender a psicologia das pessoas ou suas características comportamentais e
emocionais, a esmagadora maioria dos gerentes também não teve esse
treinamento. Portanto, o que fazemos como gestores é intuitivo, ou é
porque depreendemos alguma coisa a partir de leituras de livros e artigos
ou observando o que fazem outros líderes – nossos chefes ou outros
pro ssionais.
Já cobrimos nos Capítulos 5 e 6 o papel dos gestores e do RH. Em síntese,
sua responsabilidade para com a criação e a manutenção de climas
motivadores está re etida nesses capítulos. Trago aqui algumas observações
complementares.
O principal desa o de um gestor é saber fazer com que cada subordinado
utilize, da maneira mais produtiva possível, suas competências e
habilidades. Ele tem de saber fazer com que as pessoas se envolvam e se
comprometam com o que fazem, com entusiasmo; tem de criar um clima
em que haja sentimento de companheirismo entre os membros da equipe,
deixando claro o que cada um tem de produzir individualmente e o que
tem de colaborar com o grupo.
Isso é possível quando o gestor desenvolve um ambiente de con ança
mútua entre ele e seus subordinados e entre eles próprios. Para isso, a
comunicação deve ser aberta e o tratamento deve ser igualitário, sem
favoritismos ou paternalismos. Deve prover realimentação continuada a
cada um dos membros de sua equipe, informando se estão no caminho
certo ou se necessitam de correção de rumo. Deve lhes dar autonomia de
trabalho, con ando em seu desempenho, delegando e supervisionando. Ele
deve circular por sua área, contatando as pessoas em seus postos de
trabalho, não as convocando à sua sala. Se um plano de ação for
desenvolvido, assegure-se de que ele será cumprido; é muito
desestimulante para um colaborador iniciar uma tarefa que não termina.
É também responsabilidade do gestor buscar formas para ir ao encontro dos
anseios de seus colaboradores. Um exemplo que gosto de citar se refere a
quando exerci a função de diretor geral da Arthur D. Little, na Argentina.
Encontrei uma excelente equipe, que foi complementada com jovens e
promissores pro ssionais. O desejo de aprendizagem e de crescimento deles
era enorme, porém limitado aos projetos locais. Comecei a buscar
oportunidades para que eles participassem de projetos em outros países e
passei a exportar, temporariamente, membros da equipe. Isso os mantinha
altamente motivados e comprometidos com a empresa.
Uma observação importante, lembrando que “gente é gente”: o gestor tem
como responsabilidade auxiliar seu colaborador para que ele seja o melhor
de si no contexto da organização. Isso não signi ca moldar todos os
colaboradores de acordo com o mesmo molde. Cada indivíduo possui suas
características intrínsecas e o gestor tem de entender esse fato e aprender a
respeitá-lo. Não cabe a ele fazer com que o colaborador se torne outra
pessoa, cabe a ele desenvolver o colaborador para que ele seja e melhor
versão de si próprio no contexto da corporação
Um líder nunca está cansado; pode estar intimamente exaurido, mas sua
equipe não deve perceber, tampouco ele deve mencionar seu estado físico
ou emocional. Tem de manter o bom humor, mesmo em situações adversas.
Mostrar preocupação é válido, mesmo porque você não quer receber a
pecha de cuca-fresca, mas transmitir ansiedade, nunca; se você o zer,
contaminará o ambiente de trabalho, com re exos diretos na motivação de
seu pessoal. Eu procuro manter esse princípio e o repito continuadamente
aos meus gestores; e, quando percebo que eles “pisam na bola”, alerto-os e
busco estimulá-los a manter elevado seu estímulo e seu humor.
Quanto ao RH, deve cumprir seu papel de apoio aos gestores. Pode, e deve
desenvolver sugestões que levem a melhorar o clima organizacional, assim
como alertar seus superiores sobre aspectos que estejam levando esse clima
a se deteriorar, juntamente com recomendações sobre o que fazer para
recuperá-lo. Além da realização de pesquisas de clima periódicas, deve
manter suas antenas ligadas para identi car situações que possam
comprometer o clima organizacional e acionar os meios adequados para
equacionálas e solucionálas, juntamente com os respectivos gestores.

12.2 Lidar com emoções


Quando éramos crianças e nossos pais chegavam a casa, íamos correndo
para lhes contar ou mostrar alguma coisa que zemos na escola. Quando
eles não podiam nos dar atenção imediata, cávamos frustrados. No
trabalho, principalmente quando o pro ssional é jovem, ocorre a mesma
coisa; é uma reação natural do ser humano.
O superior deve dar atenção aos subordinados, tanto quanto possível; se
um colaborador quer lhe mostrar alguma coisa porque está contente com o
que fez, dê-lhe pelo menos um pouco de atenção no ato ou, se não puder,
não responda simplesmente “agora não posso”; encontre uma forma
educada e motivadora para responder, abrindo espaço para escutálo assim
que possível, e não se esqueça de o fazer.
Lidar com emoções é uma das artes mais complexas para qualquer pessoa
em qualquer lugar; imagine no campo de trabalho. As pessoas gostam
(voluntária ou involuntariamente) de se sentir queridas, cuidadas,
importantes na comunidade onde vivem.
Ter atenção e ser valorizado é uma das maiores recompensas intangíveis
que podemos receber. Falar “por favor”, “obrigado”, dar parabéns por
pequenas coisas realizadas, prover avaliações honestas fazem parte do
processo. Se tiver de chamar a atenção de alguém, faça-o em um encontro
privativo; se for elogiar, faça-o em público. Se perceber con itos entre
pessoas, administre-os sem constranger ninguém.
Reconheça empenho. É muito diferente de realizar uma avaliação de
desempenho. Empenho é qualquer esforço que um colaborador faz para
cumprir uma tarefa própria ou ajudar o superior ou um colega. Reconheça
o empenho.
Na avaliação de desempenho, seja imparcial e estimule todos os que dela
participam – por exemplo, nas avaliações 360 graus – a ser transparentes e
imparciais. Se há descon ança de que ela favorece pessoas mais chegadas
ao chefe, o re exo direto é o abalo de con ança e a desmotivação.
Procure entender os con itos que possam existir no equilíbrio entre a vida
pro ssional e a pessoal de pessoas mais próximas a você; não seja
indiferente a necessidades pessoais do indivíduo, e se puder apoiá-lo para
solucioná-las, dê-lhe seu suporte. Mas não seja paternalista. Seu objetivo é
alcançar as metas de seu departamento e implementar sua parte no plano
estratégico, não administrar a vida pessoal de outros.

12.3 Estratégia e comunicação


Comunicação deve ser entendida como a forma de manter aberto um
diálogo franco e transparente entre a empresa e seus colaboradores, e vice-
versa. Começa pela divulgação clara a todos os níveis da organização dos
objetivos empresariais, as respectivas estratégias que levarão a atingir esses
objetivos, desenvolvidas, preferencialmente, com participação dos gestores.
Os planos de ação que as viabilizarão devem ser, obrigatoriamente,
desenvolvidos em conjunto com os gestores e comunicados a todas as
equipes.
O engajamento das pessoas está intimamente ligado ao conhecimento que
elas possam ter sobre as metas da empresa, para que possam entender como
seus esforços contribuirão para alcançá-las, fazendo delas também as metas
desses colaboradores.
A administração da empresa deve desenvolver canais que permitam o
acesso a informações emanadas da cúpula a todos os níveis da empresa.
Quanto mais disponíveis e transparentes forem esses processos de
comunicação, menor será o grau de geração de notícias paralelas na
organização – a famosa “rádio peão”. Principalmente em situações de crise
ou incerteza. Quando assumi a liderança do processo de turnaround da
Interclínicas, havia enorme grau de insegurança na empresa, e a “rádio
peão” transmitia as mais diversas notícias. Para neutralizá-la e fazer com
que minha comunicação chegasse até a base, instituí o café da manhã com
o presidente, para o qual convidávamos um grupo diversi cado de
funcionários, realizado duas vezes por mês, e um almoço semanal com
grupos de gestores (subordinados de meus diretores). Com isso eu consegui
fazer a “rádio peão” trabalhar a meu favor.
Por outro lado, é necessário que os gestores estejam abertos a ouvir seus
colaboradores. Se eles têm algo a dizer, a reclamar, a recomendar, a elogiar,
que o façam com seus superiores. Nos últimos anos, tem se tornado mais
frequente que os funcionários tenham acesso a dialogar com o presidente
das organizações. Somente escutar não basta; se eles trazem situações que
mereçam maior análise ou sugestões, é necessário transformá-las em ações
e dar-lhes seguimento.
Comunicação entre os colaboradores é cada vez mais uma realidade dentro
das empresas. Use ferramentas de comunicação e de relacionamento social
que possibilitem a troca de informações e o desenvolvimento de um espírito
de comunidade. Os mais antigos vão demorar um pouco para se acostumar,
mas os mais jovens vão mergulhar de cabeça!
E lembre-se: comunicação não é o que você fala e sim o que o outro
entende!

12.4 Ambiente e ferramentas de trabalho


Pode parecer bobagem, mas prover à equipe ferramentas básicas de
trabalho faz parte da criação de um clima organizacional favorável e de
desenvolvimento da vontade de fazer as coisas. Em uma organização à qual
prestei assessoria, havia um sentimento forte de aderência das pessoas pela
instituição, mas elas se sentiam desvalorizadas porque não possuíam
instrumentos básicos de trabalho (como grampeadores, por exemplo!) e um
mínimo de conforto em seu microambiente.
Podemos não ter muito espaço disponível, mas qualquer que seja ele no
ambiente de trabalho, deve ser claro, com luminosidade e temperatura
adequadas, continuamente limpo e organizado. Promova, por exemplo,
duas vezes por ano, o dia da limpeza, no qual todos vêm muito
informalmente vestidos e passem o dia limpando mesas, gavetas, armários.
Quanta coisa é guardada sem necessidade.
12.5 Lidar com situações específicas como
crises e fusões
O que fazer em uma situação de crise? A primeira reação de grande parte
de empresários e executivos é pisar no freio e cortar gorduras onde quer
que elas se encontrem.
O perigo reside em cortar não somente a gordura, mas também a carne à
qual ela pode estar agregando valor. Você já fez churrasco de picanha
tirando a gordura antes de assá-la? Se já o fez, imagino a cara dos
convidados!
A história nos mostra vários exemplos de ações intempestivas de cortes de
gastos, como quando se reduzem os benefícios em empresas que dependem
intensamente de mão de obra, na crença de que isso será uma solução para
o problema. Assumir uma postura de austeridade é uma decisão sábia, e
não somente em situações de crise econômica, mas abusar disso, sem
critérios, é uma ação de risco.
No que diz respeito aos recursos humanos da empresa, cuidar deles
signi ca criar e manter um clima motivacional nestes tempos de incerteza.
Adotar atitudes como “cortar 10% do quadro” sem uma análise mais
criteriosa é um disparate e uma ameaça à estabilidade da empresa, e
resultará, inevitavelmente, na redução de pessoal onde isso não pode
ocorrer. Adote atitudes que levem, ao mesmo tempo, ao cumprimento das
necessidades de redução de custos e a um clima de trabalho positivo nessas
circunstâncias:

Mantenha comunicação aberta e transparente com sua equipe.


Mostre a ela que as metas de longo prazo ainda são válidas e que
talvez precisem de alguns ajustes a curto e médio prazos para ser
retomadas no momento oportuno. Alinhe o conteúdo da
informação entre todos os gestores da empresa, para que falem a
mesma linguagem com suas equipes;
Informe os funcionários sobre as origens da crise, sua evolução,
seu impacto na economia de forma geral e no segmento da
empresa em particular;
Mantenha as portas abertas para dialogar e dirimir dúvidas;
Se as condições de mercado assim exigirem, tenha um plano B
elaborado e torne-o conhecido pela empresa; ou melhor, elabore-
o com a ajuda de seus colaboradores;
Envolva as pessoas na busca de soluções. Comprometa-as;
Não tenha receio de informar que pode haver demissões. Se esse
for o caso, faça-as de maneira criteriosa e não simplesmente um
corte linear de x% na folha de pagamento. Delegue às áreas o
estudo de cortes e analise-os com cuidado. Não é o RH quem
deve recomendar os cortes, mas sim cada gestor, no que se refere
a seus subordinados. Algumas áreas podem necessitar de reforço
e não de cortes de pessoal; faça rearranjos internos. Traga
sindicatos para o seu lado, mantenha um canal aberto e procure
obter o apoio deles;
Trate as pessoas com humanidade e dignidade, converse com elas
e explique o porquê das demissões. Na Interclínicas, quando eu
fazia os cafés da manhã com o presidente, usava um comparativo
que eles entendiam muito bem, pois vários vinham dos hospitais
que operávamos: “Quando chega um paciente ao pronto-socorro,
sangrando, mas dizendo que está com fome, o que vocês fazem
primeiro: dão-lhe um sanduíche ou buscam estancar a
hemorragia?”;
Ofereça todo o apoio que a empresa puder oferecer aos que estão
sendo demitidos, do moral ao pecuniário. Auxilie-os tanto quanto
possível em uma recolocação;
Cuide bem dos que caram, pois eles terão suas cargas de
trabalho incrementadas. Faça disso um motivador, uma vez que
as pessoas de melhor desempenho se sentem desa adas quando
lhes é atribuída maior responsabilidade. Dê-lhes também a
respectiva autoridade;
Averigue necessidades imediatas de treinamentos especí cos e
implemente-os. Não corte programas de treinamento em
andamento simplesmente para eliminar despesas;
Não corte benefícios, a menos que eles já estejam muito acima do
que é oferecido pelo mercado. Mas os faça de maneira seletiva;
Mantenha um inventário das lideranças formais e informais
dentro da empresa e aproximese delas. Cultive e capitalize sobre
suas forças e obtenha sua con ança;
Evite dizer que não mais ocorrerão demissões; não se sabe o que
ainda poderá acontecer. Se isso ocorrer, a direção da empresa
perderá credibilidade perante o pessoal e a insegurança voltará a
reinar, com re exos na motivação e na produtividade;
No caso de uma fusão entre empresas, algumas pessoas serão
desligadas. Elabore um plano de fusão que possa ser
implementado o mais rápido possível. Faça uma análise dos
recursos humanos disponíveis em ambas as companhias e
mantenha aqueles que mais bem preenchem as necessidades da
nova organização, sem protecionismos. De na e comunique o
que vai acontecer com aqueles que não permanecerão na nova
empresa; dê apoio aos que serão demitidos.

A Antares, mencionada no Capítulo 9, vivenciou uma redução do volume


de faturamento e seu CEO superou a situação atuando em três frentes:
buscando recursos nanceiros em bancos, reduzindo despesas e,
principalmente, mantendo alto o moral interno da equipe. Reduziu gastos
onde era possível, sem in uir no ânimo do pessoal. Teve de reduzir seu
quadro de funcionários, o que foi realizado de maneira criteriosa, e
eliminou despesas onde podia, sem excluir o cafezinho. Realizou workshops
de planejamento estratégico com interação da equipe; contratou um coach
para os gerentes; inovou na estratégia de vendas, em um esforço
coordenado pelo gestor da área e com intensa participação das equipes
interna e externa; e mantinha seus colaboradores informados da situação
do mercado e da empresa. O CEO participava ativamente de cada um
desses eventos, além de sair em campo para visitas a clientes e a
distribuidores. A motivação da equipe sempre se manteve alta e em
nenhum momento se observava desânimo na empresa.
Mais recentemente fui convidado a assumir como diretor de
Desenvolvimento de Negócios da Antares. A empresa possuía um produto
que se destacava no mercado pelo diferencial de qualidade, mas estava
estagnada em vendas. Com apoio total do CEO e dono da empresa,
reestruturamos a área de Vendas, fortalecemos a engenharia e envolvemos
todos os colaboradores no processo de de nição da estratégia
mercadológica. Fui a campo com nossos engenheiros de aplicação para
revitalizar o relacionamento com distribuidores e convencer empresas
usuárias a usar nossos produtos.
Foi implantado um CRM (Customer Relationship Management) –
aplicativo para gestão de relacionamento com clientes –, e estabelecido um
esquema de reuniões diárias com os vendedores internos e uma semanal
conjuntamente com os externos, via videoconferência. De 2016 a 2019,
ainda no contexto da morosidade econômica que o país viveu, a Antares
cresceu 70% em vendas. O trabalho feito no passado serviu de base para
enfrentar a complexidade da atualidade.

12.6 Gestão de conflitos


Em uma das empresas que eu dirigi, dois jovens e promissores pro ssionais
discutiam acaloradamente e quase partiam para a agressão física dentro do
ambiente de trabalho. O motivo: ciúme de uma colega de trabalho, ex-
namorada de um e agora namorada do outro. Diante dessa situação, o que
você faz? Estas são as opções: a) demite sumariamente os três; b) demite os
dois rapazes; c) demite a garota; d) nenhuma das anteriores.
O que eu z foi chamar os três, inicialmente em conversas individuais e
depois em uma conversa conjunta, orientando-os sobre o comportamento
que um pro ssional deve ter dentro da empresa, e que problemas pessoais
se resolvem fora do ambiente de trabalho. Atuei como coach para os três e
mantive-os na empresa. Agiram de maneira inadequada, mas eram jovens
com boa formação pessoal, bem-educados, dedicados ao trabalho, e que em
um dado momento tiveram suas reações emocionais exacerbadas em um
ambiente inapropriado para isso. Depois desse acontecimento, eles se
tornaram mais dedicados e produtivos. Pouco tempo depois reataram as
relações e reintegraram-se normalmente ao ambiente de trabalho.
Gestão de situações de con ito é outro tema não incluído nos currículos
escolares ou em programas de treinamento. Os gestores se deparam com
essas situações frequentemente, e o modo como as administram pode
in uenciar positiva ou negativamente o ambiente de trabalho e a motivação
da equipe.
O que muitos fazem é ngir que não veem ou deixar como está, sem tomar
nenhuma atitude. Outros tiram conclusões precipitadas, com base em
observações super ciais ou no relato daqueles que lhes são mais próximos.
Quando isso ocorre, o gestor corre o risco de perder o respeito de seus
subordinados e a con ança de superiores.
A recomendação seria usar o bom senso. Mas o que é bom senso? Pode ser
diferentes coisas, na cabeça de diferentes pessoas. Mas algumas regrinhas
básicas podem servir de orientação.
Se o con ito envolver diretamente o gestor:

Não assuma posição defensiva, tampouco ofensiva. Se você


assumir posições de defesa ou de ataque, mostrará uma falha de
personalidade e uma insegurança muito forte. O importante não
é ganhar ou perder, mas achar uma solução que seja mutuamente
bené ca;
Se o outro lado for um subordinado, não use sua posição de
che a para impor uma solução. Você poderá ter a sensação de
que resolveu o problema, mas para seu subordinado e sua equipe
você foi incompetente;
Entenda bem o con ito e o que o originou. Analise causas e
consequências de maneira criteriosa;
Esteja aberto para ouvir o que os outros têm para lhe dizer.
Procure dialogar e compreender o que aconteceu, buscando uma
solução conjunta com a outra parte. Caso isso não seja possível,
aconselhese com seu superior;
Se o equívoco foi seu, reconheça o erro e peça desculpas.

Caso o con ito envolva dois ou mais subordinados seus:

Não tire conclusões precipitadas, tampouco baseadas no


depoimento de somente uma das partes;
Ouça todos os envolvidos, procurando entender o que ocasionou
o con ito;
Muitas vezes, con itos no ambiente de trabalho são causados por
problemas que o indivíduo tem em sua vida particular. Procure
entender o que está acontecendo com ele, mas não assuma seus
problemas pessoais;
Não procure culpados. Procure as causas e atue nelas, tentando
conciliar as partes e estimulando que elas mesmas encontrem a
solução. Evite que uma parte saia com a sensação de que ganhou
e a outra com o sentimento de que perdeu;
Uma vez identi cadas as causas, mesmo tendo sido encontrada
uma solução, conduza reuniões privativas de orientação com cada
uma das pessoas envolvidas, atuando como coach e orientando
sobre aspectos comportamentais;
Se o con ito causou mal-estar no ambiente de trabalho, procure
maneiras de minimizá-lo, restaurando o espírito de equipe;
Caso haja reincidência do problema, gerado pela mesma pessoa, e
você não conseguir uma solução por intransigência dela, in
extremis não lhe restará alternativa senão desligála da equipe.
Esteja atento para os “sinais de fumaça” e evite que o fogo se espalhe. Em
uma certa empresa, uma funcionária começou a ser alvo de chacotas por
parte de um colega, que criou um blog no qual a hostilizava. Ela procurou
seu superior e pediu-lhe que intercedesse, e este lhe disse não poder fazer
nada. Sem respaldo do chefe, ela procurou um advogado, o caso foi parar
na Justiça e retornou contra a empresa, pois o blog fora criado nos
computadores da organização. Se o supervisor tivesse agido de maneira
proativa, a m de buscar uma solução para o problema, o caso teria sido
solucionado sem ruídos e sem extrapolar as fronteiras da empresa.

12.7 Reconhecimento de empenho (versus


desempenho)
A formalidade de um processo de avaliação de desempenho é importante,
pois possibilita que se avaliem os colaboradores de forma periódica e
disciplinada, provendo-lhe uma informação relevante sobre seus pontos
fortes e necessidades de melhora, base para um plano de ação de
desenvolvimento pro ssional e pessoal.
Igualmente, ou talvez até mais importante, é o reconhecimento do
empenho do colaborador. Esteja atento às tarefas que seus subordinados
executam e com que dedicação (ou paixão) eles as executam. Reconheça
esse empenho continuadamente – um cumprimento, um agradecimento,
um elogio em particular ou em público, uma menção desse fato a
superiores, um convite para um almoço e outras atitudes semelhantes
funcionam como injeção de ânimo e motivação.
Os autores Nitin Nohria, Boris Groysberg e LindaEling Lee, em “Employee
motivation, a powerful new model” (em português, “Motivação dos
empregados: um modelo novo e poderoso”), artigo publicado em Harvard
Business Review (jul./ago. de 2008), fazem um resumo de uma pesquisa
realizada para entender os aspectos que levam as pessoas a se motivar, com
base em um livro escrito em 2002 por Paul R. Lawrence e Nitin Nohria,
Motivação: como a natureza humana modela nossas escolhas. Lawrence e
Nohria destacam que as pessoas são guiadas por quatro forças emocionais
básicas, interligadas em nosso cérebro. Isso faz com que a satisfação de cada
uma delas afete diretamente nossas emoções e, por conseguinte, nosso
comportamento.

Aquisição: signi ca a obtenção de bens preciosos que possam


satisfazer nossa necessidade de bem-estar, incluindo os
intangíveis, como status social. Sentimos prazer quando um
desejo é satisfeito, e descontentamento quando não conseguimos
satisfazê-lo.
União: formação de laços com outros indivíduos e grupos, os
quais, quando materializados, criam emoções bastante positivas,
como amor e carinho; quando não o são, trazem sentimentos
negativos, como isolamento e falta de integração à sociedade.
Compreensão: conhecimento e domínio do mundo ao nosso
redor. No trabalho, isso implica entender o ambiente e fazer uma
contribuição signi cativa, motivados por desa os que nos façam
crescer e aprender.
Defesa: proteção contra ameaças externas e promoção da justiça.
Indivíduos se sentem motivados em ambientes que promovem a
justiça, com pessoas transparentes em suas intenções e objetivos e
que lhes permitam expressar suas ideias e opiniões.

Apesar de interligadas em nosso cérebro, cada força é independente; elas


não podem ser hierarquizadas. Você pode remunerar muito bem um
empregado e esperar entusiasmo no trabalho, mas isso não ocorrerá se ele
não sentir que há união, ou que não está contribuindo efetivamente com a
instituição ou com a sua equipe. Se essas quatro forças não forem satisfeitas
simultaneamente, a empresa pode conseguir pessoas para realizar os
trabalhos porque necessitam do dinheiro ou não têm nada mais em vista a
curto prazo, mas não se conseguirá o melhor desempenho por parte delas,
além do risco de perdê-las quando uma melhor oportunidade lhes for
oferecida.
A Revista Saúde, em sua edição “Great Places to Work 2015”, traz o caso do
Laboratório Sabin, do segmento de medicina diagnóstica, com sede em
Brasília:

Reunião de planejamento estratégico em empresas envolve geralmente algumas lideranças para


debater o futuro da companhia. São diferentes pontos de vista, cada qual analisando uma área e
com a difícil missão de avaliar todos os lados e, ao mesmo tempo, escolher o melhor para a
instituição. O que já pode parecer um desa o de conciliação em empresas convencionais, no
Laboratório Sabin é encarado também como política de gestão de pessoas quando, além de
líderes, 60 funcionários participam da reunião e das decisões do planejamento de forma
voluntária.
Com a iniciativa, a organização propõe o engajamento das pessoas e faz com que elas se sintam
importantes, donos das métricas e que mostrem mais alinhamento no dia a dia da companhia.
“Trabalhamos com uma gestão muito participativa e proativa. Quando desenhamos nossa
estratégia e indicadores, tudo é comunicado e detalhado para todas as áreas. O funcionário
engajado se sente dono do indicador”, diz a CEO do laboratório.
O trabalho para que os funcionários se desenvolvam e cresçam pro ssionalmente re ete em
baixo turnover e na criação de líderes nas bases da empresa. Há uma Universidade Corporativa
(Unisabin) como um “guarda-chuvas” de todos os processos de capacitação da empresa e
projetos como o MBA para o desenvolvimento pro ssional. “Quase não perdemos funcionários
para outras empresas do setor. Quando acontece, é para concurso público, por uma questão
cultural da cidade (Brasília)”, segundo a CEO.

Em uma entrevista que dei à revista Administrador Pro ssional, do


Conselho Regional de Administração do Estado de São Paulo, eu observava
alguns aspectos que considero fundamentais na composição e motivação de
equipes multidisciplinares, que reproduzo aqui:

Em um contexto onde a velocidade e a facilidade no acesso a serviços e informações exigem alto


nível de prontidão das organizações para dar respostas e soluções, o caráter multidisciplinar de
uma gestão pode ser um diferencial. Novos cenários pedem novos olhares e, nessa perspectiva, o
know-how das equipes se mostra valioso para resolver velhos e novos problemas de forma mais
ágil, criativa e e caz.
A sociedade está mais exigente. O cliente tem pressa, com qualidade. Os colaboradores precisam
de motivos que os motivem a agir e os façam estar e sentir-se engajados para enfrentar seus
desa os. Não basta prometer, é preciso entregar. A excelência desa a as empresas a
ultrapassarem barreiras, saírem do óbvio e percorrerem caminhos até então não imaginados.
Uma equipe multidisciplinar pode agregar esse diferencial competitivo.
Um dos grandes desa os de se liderar uma equipe multidisciplinar consiste na criação de um
ambiente de con ança e respeito não qual as pessoas se sintam plenamente confortáveis para,
com mente e coração abertos, cooperar e participar ativamente. Este resultado é alcançado
quando o líder consegue criar uma visão compartilhada do propósito e, especialmente, quando
consegue dar visibilidade às habilidades complementares que estão disponíveis no grupo. Com
essa estratégia em mente e mantendo a disciplina em fazer uir a comunicação de forma clara e
transparente, o líder conseguirá mobilizar a equipe para atuar com autonomia responsável na
forma de executar o trabalho, independente da hierarquia, e atingir os resultados com
consistência.

Motivação e retenção de pessoas em uma organização signi cam tratar


gente como gente. Começa na atitude do CEO e no desenvolvimento de
uma cultura pautada por valores éticos e pelo espírito de coletividade que
permeiam a organização.
Um funcionário se sente comprometido com a empresa e veste sua camisa
(ou a leva tatuada no corpo) quando possui respeito e admiração por seus
líderes, entende para onde a empresa vai – visão, objetivos, estratégia –,
está alocado em funções que lhe agradam e onde suas competências e
conhecimentos podem ser amplamente aplicados, visualiza oportunidades
de crescimento e consegue materializálas, sente-se parte integrante da
comunidade em que trabalha, é agradecido por seu empenho, é
reconhecido por seu desempenho com incentivos tangíveis e intangíveis,
recebe informações de maneira uida e transparente de seus superiores,
tem canais abertos para falar com eles, sente que as práticas de gestão de
pessoas são justas.
Ambientes de trabalho nos quais os colaboradores se desenvolvem e
crescem pro ssionalmente, e são tratados como gente, resultam em baixos
turnovers de pessoal e resultam em produtividade e desempenho superiores
a outras organizações que assim não agem.
Capítulo 13

Gestão de pessoas pós-Covid-19


O mundo vinha passando por uma revolução tecnológica somada à
emergência de novas gerações com suas novas culturas e comportamentos,
quando apareceu a Covid-19,
que acelerou esse processo de mutação. Muitas empresas já buscavam
alternativas para se adaptar a essas revoluções e a crise de 2020 fez com que
elas tomassem maiores iniciativas na busca por alternativas para
sobrevivência e adequação a esse novo “admirável mundo novo”.
Aldous Huxley escreveu, em 1932, o livro Admirável Mundo Novo,
ambientado na Londres do ano 2540. Huxley trazia visões de tecnologia
reprodutiva, manipulação psicológica, hipnopédia e o chamado
condicionamento clássico (estudado particularmente pelo siólogo russo
Ivan Pavlov). Essa combinação de fatores provocava intensas mudanças na
sociedade, mas objetivava levar a felicidade a todos os membros daquele
futuro mundo, independentemente de seu status socioeconômico. Em
1932, Huxley tinha uma visão de futuro que se concretiza muito antes de
2540. E agora, qual a nossa visão de futuro? Em particular no que se refere
a gestão de pessoas?
Vivenciamos neste século duas grandes crises de natureza econômica: a de
2001, com o escândalo da Enron e outras empresas, que levou à falência a
Arthur Andersen, maior empresa de auditoria na ocasião, e a de 2008, com
prejuízos bilionários causados em muitos países pela quebra da Lehman
Brothers. Essas crises motivaram mudanças principalmente na adoção de
boas práticas de governança e na criação de leis a elas relacionadas.
A crise causada pela Covid-19 traz consequências diferentes. Sem dúvida o
seu impacto na economia é incontestável, mas ela traz um alerta a um
componente que, se já era fundamental para a vida das organizações, passa
a ser ainda mais relevante para que superem a crise e prossigam neste
admirável mundo novo com sucesso. Muitas empresas sobreviverão, mas
destacar-se-ão aquelas que souberem tratar muito bem esse componente: o
fator humano!
O colaborador não é mais somente um indivíduo engajado, motivado e
liderado para obter resultados para as empresas. Esta crise o colocou ao
lado da família, de outras pessoas e em situações de forma não vivenciada
anteriormente. Esse aspecto tem de ser melhor entendido pelo gestor para
que ele possa encontrar as melhores condições de motivação, produtividade
e satisfação para suas equipes.
Este capítulo foi escrito no auge da pandemia da Covid-19. Participamos de
webinários e mesas redondas, lemos matérias sobre tendências do mundo
empresarial pós-Covid-19, várias versando sobre os novos desa os que os
líderes já vinham enfrentando, e que se avolumavam como resultado da
recessão pandêmica pela qual passamos. Nos idos do século 18, dizia
Antoine-Laurent de Lavoisier, considerado o “pai da química moderna”:
“Na natureza nada se cria nada se perde, tudo se transforma”.
Transformamos isso que vivenciamos, escutamos e lemos numa síntese do
que consideramos que sejam as principais mudanças, ou evoluções, que
líderes já vinham experimentando e que merecerão maior destaque em
suas responsabilidades futuras, as quais envolvem, principalmente, gestão
de pessoas.

13.1 Os novos líderes


Por “líderes”, referimo-nos principalmente ao CEO, mas se aplica também
aos demais gestores. Evidentemente, o CEO continuará liderando suas
equipes para cumprir com suas responsabilidades de atingir ou superar os
objetivos traçados. Essa tarefa será sempre aquela para a qual os
controladores da organização terão seu foco, na expectativa de verem seus
planos realizados. Ele é o responsável pelo desempenho da organização.
Mas essa tarefa terá novos desa os, sendo prioritários: capital humano,
inovação, aprendizado, planejamento.

Capital humano
Insistiremos sempre em a rmar que no topo das prioridades do líder
deverá estar, como sempre deveria ter estado, o capital humano, pois sem
gente certa, no lugar certo, no momento certo, ele pode ter sucesso, mas
não será duradouro. O líder deve assegurar sempre que a empresa cuide de
sua gente como valor e não custo e atentar-se para que subsista uma cultura
motivadora para a atração e o engajamento de pessoas. As rápidas
mudanças que o mundo vivencia impactam os aspectos emocionais e
comportamentais das pessoas e passam também a merecer mais atenção por
parte do líder.
Ele tem de passar a conhecer muito mais a vida de seus colaboradores, não
somente na empresa, mas fora dela, principalmente em suas casas. Colocar
pessoas em home o ce foi imperativo durante a quarentena e motivou
várias empresas a pensar em adotá-lo permanentemente. Isso não é tão fácil
assim.
Muitas pessoas não possuem ambientes físicos e relacionais fora da empresa
que permitam realizar o home o ce de forma continuada e tranquila.
Mesmo indivíduos com um nível socioeconômico que lhes permita habitar
em casas ou apartamentos mais espaçosos, podem encontrar di culdades
pelo convívio com crianças, adultos carentes e outras pessoas. Imaginemos
aqueles em condições habitacionais menos favorecidas. O líder, portanto,
tem de dar um passo além e empatia passa a ser quesito essencial. Conhecer
a realidade do colaborador não é mais su ciente, ele precisa entendê-la.
O líder tem de conhecer as condições de cada liderado para poder separar
quem poderá ser mais produtivo no escritório ou em home o ce. E, não
basta “determinar” que o colaborador faça home o ce; é necessário saber se
ele consegue ali desempenhar suas funções com e cácia, sem estar sujeito a
um burnout causado pelo seu ambiente doméstico.
Para isso, o líder, com apoio do RH, deverá pesquisar as condições
habitacionais e de convivência familiar de cada colaborador, tendo cuidado
para não invadir sua privacidade e de sua família, para saber como
posicionar suas equipes nos diferentes ambientes de trabalho. Uma simples
pesquisa feita com a empresa toda pode ajudar nessa troca de
conhecimento e fazer com que o colaborador se sinta parte do processo.
Por outro lado, o RH terá de ser muito mais ativo e proativo para apoiar o
gestor nessa tarefa e para desenvolver critérios e ferramentas que
possibilitem avaliar o desempenho dos colaboradores em home o ce ou no
escritório. No ambiente da empresa isso se torna mais fácil, pois as pessoas
estão visíveis, convivendo sicamente com líderes e colegas. Como, porém,
avaliar o desempenho do trabalho remoto? Quando falamos de
desempenho, vamos além do cumprimento de tarefas que estão nas
atribuições do indivíduo; o líder terá também de olhar para o desempenho
da satisfação de seus colaboradores, para poder mantê-los motivados e fazê-
los evoluir na organização. Medir desempenho por meio de planilhas ou de
horas dedicadas pode ser adequado para um robô, mas não para pessoas.
Essa forma de encarar o capital humano, ou o lado humano do capital,
obrigará os verdadeiros líderes a estar mais próximos ao seu pessoal, mesmo
daqueles que estiverem em home o ce; neste novo mundo as pessoas têm
de sentir que existem, mesmo estando remotas.
Adicionalmente, os colaboradores deverão ter maior empoderamento que
lhes permita ter maior agilidade nas suas atividades e maior poder e
assertividade de decisões.
Mas não basta “dar” esse empoderamento a eles; será necessário identi car
de forma mais aprofundada suas competências, saber o que delegar, e
capacitá-las para que saibam usar adequadamente esse empoderamento.

Inovação
O líder deverá dedicar mais tempo no estímulo ao espírito de inovação
interno, e ao acompanhamento das inovações de mercado. O espírito de
inovação interno não se refere somente a produtos, mas também, e muitas
vezes mais relevante que produtos, a processos internos de trabalho e
aqueles que interagem com clientes e a comunidade. Vejam o que acontece,
por exemplo, com reuniões por videoconferência: antes da pandemia, eram
praticados por poucas empresas; durante a pandemia tornou-se a forma
imperativa e habitual de trabalho. As pessoas, mesmo aquelas das mais
tradicionais gerações, quebraram seus paradigmas e passaram a incorporar
essa prática ao seu dia a dia e a tendência é que isso permaneça.
No retorno à “normalidade” deste novo mundo, será necessário repensar as
formas tradicionais de trabalho e no engajamento das pessoas. Novas
formas de trabalho foram testadas não só nas rotinas de escritórios, mas em
muitas pro ssões. As inovações tecnológicas, da burocracia dos escritórios a
novos procedimentos na saúde e outros setores, obrigam o líder a se inovar
e a estimular seus liderados a entender e praticar novas formas de trabalho.
Inovar não signi ca necessariamente colocar uma barreira no passado e
mergulhar no que é novo. Não esqueçamos o quê e como fazíamos as
coisas, pois a forma de solucionar problemas no passado pode nos ensinar a
equacionar soluções futuras. Mas o foco na adversidade é essencial: com
essa nova realidade, as soluções para os mesmos problemas podem tomar
formas diferentes, portanto, é importante que o líder volte às raízes dos
problemas para que assim possa abrir seu leque de potenciais soluções.
Sobre o mercado, o líder deve estimular em seus gestores a consciência de
que eles não podem continuar trabalhando tradicionalmente como
trabalhavam, e incentivá-los a tomar iniciativas para acompanhar e
entender toda e qualquer inovação que possa trazer re exos para a
empresa. Estimulá-los não só a pensar fora da caixa, mas a chutar a caixa.
As novas gerações talvez tenham maior facilidade para acompanhar essas
inovações, pois já nasceram digitais. As gerações mais antigas necessitarão
de estímulo e de apoio para fazê-lo.

Aprendizado
Aqueles pro ssionais que quiserem fazer diferença na organização onde
trabalham e contribuir de forma mais produtiva na perseguição dos
objetivos sob sua responsabilidade e os da organização como um todo,
deverão buscar ampliar seus conhecimentos sobre temas que impactam
diretamente seus resultados e também sobre outros que impactam a
empresa.
Esses temas estão relacionados com processos de gestão, tecnologias,
mercado, meio ambiente, entre outros. O líder, normalmente, preocupa-se
com o aprendizado de sua gente, ou deveria. O mundo que passamos a
vivenciar com todo esse impacto evolutivo, fará com que esse líder dedique
mais tempo a ajudar suas equipes a identi car suas necessidades de
aprendizado e estimulá-las a buscar esse conhecimento.
As empresas geralmente se dedicam a promover treinamentos em grupo
e/ou padronizados a equipes de colaboradores, sejam eles focados em
temas de gestão/liderança, processos ou técnicas de trabalho. Esse tipo de
treinamento continuará a ter espaço, mas o aprendizado terá também de
ser individualizado. A tecnologia, tanto de treinamento quanto de
monitoramento de performance individual, permitirá que as organizações se
atentem mais às necessidades especí cas de cada colaborador e, com isso,
possibilitar que invistam no aprendizado individual, levando cada
colaborador a evoluir para atingir seu real potencial.
As mudanças estão ocorrendo muito rapidamente. Isso faz com que as
organizações e as pessoas que nestas trabalham encontrem maneiras de
entender e se adaptar de forma contínua e rápida a essas mudanças. As
realidades emergentes, dentro das organizações e em seus mercados,
sugerem que as pessoas possam ter maior aproveitamento e, portanto,
melhor desenvolvimento, com treinamentos especí cos às suas
necessidades. O e-learning passa a ter um papel contributivo relevante neste
processo.

Planejamento
Planejamento estratégico ou planejamento de atividades, já faz parte da
agenda de muitos líderes. Apesar das urgências em tomadas de decisões e
necessidades de rápidas adaptações provocadas pela Covid-19, esse
exercício terá de ser intensi cado para possibilitar que os gestores e suas
equipes saibam para onde ir e como ir até lá. Quem é velejador sabe que
“não existe vento favorável para o timoneiro que não conhece qual é seu
destino”. Capital humano, inovação e aprendizado, temas que possuem
relevância estratégica para o futuro sucesso do líder e da organização, terão
de ser cada vez mais incorporados ao seu planejamento.
A realização de pesquisas junto com os ambientes interno e externo das
empresas poderão ser de grande valia. Pensar, por exemplo, que podemos
reduzir o tamanho dos espaços físicos ocupados pelas empresas porque as
pessoas se acostumaram com home o ce não é tão elementar. Como
observamos anteriormente, neste caso é necessário identi car onde os
colaboradores encontram melhores condições de trabalho e isso pode ser
feito por meio de pesquisa.
Uma empresa do setor nanceiro nos relatou como procedeu para de nir
sua política de home o ce, partindo de uma pesquisa que conduziu sobre
as condições de trabalho remoto, para entender as condições e preferências
de cada colaborador. Como resultado, identi cou três grupos de
colaboradores: quem precisa trabalhar em um escritório porque as
condições em suas casas não favorecem o trabalho, quem prefere trabalhar
no escritório mesmo com condições adequadas em suas casas e quem
prefere trabalhar em casa. A empresa passou, então, a cruzar essas
informações com os dados de desempenho de cada colaborador. Com isso
ela identi cou, por exemplo, o nível de produtividade daqueles que
preferem trabalhar em casa, mapeando e balanceando a necessidade de
presença física no escritório e do trabalho remoto. Do mesmo modo, passou
a entender as condições de quem não conseguia trabalhar remoto para
saber se essas condições são impeditivas ou se é necessário melhorar a
infraestrutura, como uma internet e acomodações.
A crise levou muitas pessoas a pensar antecipadamente antes de realizar
uma atividade. Se isso já era praticado dentro das organizações, terá de ser
enfatizado. O líder terá de exercer seu papel educador com muito mais
intensidade, para motivar suas equipes a pensar antes de executar.

13.2 O papel evolutivo do RH


No Capítulo 6 abordamos o “Manifesto para o Desenvolvimento Ágil de
RH”, o qual teve como objetivo inspirar não só a área de Gestão de Pessoas,
mas todos os gestores, pois valoriza um olhar humano na forma de
construir uma nova jornada para pessoas nas organizações, para criar
ambientes onde a colaboração resulte no crescimento e no bem comum.
A área de RH, que em muitas organizações ainda se dedicava a tarefas
transacionais e a prestar apoio aos gestores em temas pontuais, passa a ter a
necessidade de se envolver de forma mais holística em temas que
anteriormente estavam no campo dos pro ssionais da linha de frente, e a
prestar-lhes assistência de forma mais integrada, reconhecendo porém que
a responsabilidade pela gestão das equipes é do gestor.
A gestão de gente não será da mesma forma; novos modelos de trabalho,
remuneração, capacitação, desenvolvimento, atração, gestão de talentos
devem ser parte de um novo desa o para o RH. Ferramentas tecnológicas,
de análise de dados para tomada de decisões e análises preditivas para
ações preventivas também devem ser incorporadas. A área de RH
efetivamente deve ser uma forte protagonista na mudança!
A transformação nos comportamentos e relacionamentos in uencia o
ambiente de trabalho. Comando e controle não cabem mais nas ações com
pessoas; surge um novo “humano” e a área de RH deve se colocar numa
posição de facilitação, envolvendo:

Facilitação para criar redes de relacionamento mais colaborativas,


con áveis e menos hierárquicas – revisitar o que de fato é
fundamental no desenho organizacional e não se prender a
estruturas frias e não funcionais;
Facilitação para transformação digital – os novos modelos de
trabalho devem ser agilizados, pois assim já se con guram, antes
mesmo que a lei os regulamente; vide o home o ce que entrou
em nossa vida tão de repente;
Facilitação para conectar o humano ao propósito de sua atividade
– engajá-lo, motivá-lo a pertencer a algo que o desenvolva, gere
crescimento pessoal e pro ssional e respeite sua individualidade;
Facilitação para acolher, escutar, dialogar, incluir e cuidar de
quem cuida do outro – trazendo ao ambiente de trabalho uma
atitude mais humana no trato com os colaboradores. Enfatizamos
aqui a empatia que o RH tem de demonstrar com colaboradores e
gestores.
13.3 O novo papel dos conselhos
Ao mencionar conselhos, referimo-nos a qualquer tipo de conselho: de
administração, consultivo, de sócios, de família; e se não houver um
conselho, re ro-me também aos próprios donos. Entre as atividades dos
conselhos, quatro temas passam a ser prioritários: o futuro, o conhecimento,
as pessoas, a gestão de riscos.

O futuro
Conselhos têm dedicado mais tempo com o passado e o presente, do que se
preocupando com novos caminhos a seguir, cenários que poderão ser
vivenciados, estratégias e planos que poderão ser adotados para enfrentá-
los. Esse hábito terá de ser quebrado; os impactos que a evolução pela qual
passamos pode trazer para as empresas, com maior ou menor intensidade
dependendo da natureza de seu negócio, mas sem dúvida impactando suas
operações, têm de ser tema constante nas agendas dos conselhos. O que se
aprendeu até agora é importante e não pode ser descartado, pois a história
nos ensina muito, mas não se pode car preso a ela.

O conhecimento
Para poder debater e decidir sobre os novos desa os da organização, será
fundamental que conselheiros acompanhem a evolução tecnológica e
cultural, atualizando constantemente seus conhecimentos. Terão de dedicar
tempo a escutar palestras, estudar publicações, participar de debates sobre
temas evolutivos e inovativos que possam vir a impactar sua organização.
Isso, sem dúvida, vai tirar uma grande quantidade de conselheiros de uma
certa zona de conforto.

O capital humano
Maior atenção deverá ser dada ao capital humano. As novas gerações são
uma realidade, nas atividades operacionais e, também, já atuando como
líderes. Novas gerações gerindo novas gerações. Suas expectativas,
comportamentos e fatores motivacionais são diferentes das gerações
anteriores; nem melhores, nem piores, apenas diferentes. E muito
diferentes. “Gente” tem também de estar presente nas agendas dos
conselhos, e os conselheiros devem procurar entender com maior
profundidade as características do pessoal que trabalha na empresa. E atuar
proativamente na otimização da cadeia de valores de gestão de pessoas.

Gestão de risco
Gestão de risco deverá ter maior atenção por parte do conselho. “Viver é
muito perigoso”, dizia o personagem Riobaldo na obra Grande sertão:
veredas, de João Guimarães Rosa, “pois ninguém sai vivo dessa experiência”.
Viver é, portanto, um risco. Uma empresa “vive” e, portanto, suas atividades
implicam riscos potenciais. Risco é inerente a qualquer atividade, e
impossível de eliminar; saber administrá-los – identi cá-los, quali cá-los,
estar preparados para enfrentá-los – passa a ser relevante para o sucesso das
organizações. E o conselho tem papel fundamental nisso, pois deve tornar
gestão de riscos uma responsabilidade relevante da administração.
O mundo não parou com a pandemia de 2020. No momento em que este
livro foi escrito, o mundo estava em câmara lenta. Muita atenção era
dedicada a sobreviver num ambiente recessivo e desa ador; era
fundamental superar e sobreviver à recessão.
Se não vencêssemos o “agora” daquele momento, não haveria o “depois”
que estaremos vivenciando quando o livro for publicado.
Para isso cada empresa adotou as medidas que mais lhe convinha. Líderes
que estavam cuidando daquele “agora”, precisam colocar suas mentes a
pensar e a planejar o que fazer neste “depois”. Há diferentes cenários a
considerar e eles devem ser ponderados no planejamento da vida futura da
organização. Para isso, quando houver um conselho, este deverá trabalhar
em maior sintonia com os líderes, cuidando, porém, para não invadir o
campo das operações.
As “novas” prioridades de conselhos e de líderes deverão persistir durante
muito tempo. Até que outras novidades ou uma nova crise surja, quando
elas terão de ser revistas e atualizadas. A empresa é um organismo vivo,
mutante. Seus responsáveis terão de mudar junto com ela.
Capítulo 14

Conclusão
Não existe inteligência arti cial que substitua o ser humano. Não temos
escassez de talentos, mas sim ambientes redutores da atratividade e do
desenvolvimento de gente. Manter pro ssionais com o per l adequado,
motivados e delizados depende de uma cultura empresarial na qual o
ativo mais importante são os funcionários.
A gestão de pessoas não é “lá com o RH”. É uma responsabilidade dos
gestores. O RH deve prover as ferramentas e o apoio necessários para que
eles desempenhem seu papel.
A cultura de gestão de pessoas começa com o CEO. Se para ele o capital
humano for um ativo, assim esse capital será tratado. Pessoas não são como
peças de uma máquina.
O CEO é o modelo das práticas que os gestores seguirão. Ele deve garantir
que as políticas de recursos humanos estejam alinhadas com a estratégia
empresarial, para que a empresa tenha os talentos necessários para seu
sucesso.
A cultura da organização e de que forma a faz ser entendida, disseminada,
incorporada e praticada pelos líderes e colaboradores é condição sine-qua-
non para o adequado engajamento e motivação das pessoas e, portanto,
para o sucesso de todos – pessoa e organização. Cada empresa tem suas
peculiaridades, sua própria cultura. Em cada uma, o líder tem a
necessidade de se adaptar a diferentes arquiteturas de gestão; engajar-se na
compreensão da cultura é pré-requisito para uma gestão e caz.
O líder tem de entender, absorver e incorporar a cultura, o DNA, e os
valores da organização, fazendo-os permearem e serem incorporados por
todos os colaboradores.
Se assim não o zer, sua dedicação, seu empenho na formação de equipes,
no desenvolvimento de seu trabalho, e toda a experiência acumulada ao
longo da carreira, que poderiam servir para alavancar a evolução da
organização que ele lidera, caem por terra. E o líder tem de entender e
praticar quatro aspectos relacionados à cultura: o que é cultura
organizacional, a essência de diferentes culturas, o gestor e a sua
responsabilidade ante a missão da organização e como preservar ou mudar
uma cultura.
Os gestores devem saber lidar com gente e gostar disso. A eles compete
irradiar a cultura de tratar gente como ativo e gerir suas equipes, da
de nição de necessidades à promoção ou à demissão. São responsáveis por
atingir os objetivos de suas áreas, e o farão por meio de suas equipes. Para
isso, terão de formá-las, mantê-las, desenvolvê-las, motivá-las e obter delas
um desempenho superior. Gestor tem de gostar de gente!
A área de RH deve ter um papel estratégico e ser parceira de negócios de
seus pares.
Ela deve contar com todo o apoio do CEO e ser respeitada pelos demais
executivos, e seu líder precisa ter um assento no comitê executivo da
empresa. Compete ao RH desenvolver e implementar políticas, práticas e
ferramentas de apoio à gestão dos recursos humanos da organização e
trabalhar em estreita colaboração com os gestores.
Motivar pessoas é saber lidar com seu lado emocional. A empresa pode ter
políticas e procedimentos de gestão de pessoas bem elaborados, mas é a
atitude do gestor e a maneira como trata seus subordinados, pares e
superiores, que impacta o desenvolvimento do espírito de equipe, a
motivação, a lealdade à companhia e o orgulho de fazer parte dela.
Gerir gente é, portanto, saber de nir as necessidades de pessoal, atrair,
contratar, reter, motivar, avaliar desempenho, desenvolver, remunerar,
reconhecer empenho (diferente de desempenho) e saber demitir.
É reconhecer que gente é o propulsor que move e dá vida às empresas.
Ao longo deste livro procuramos levantar os principais aspectos relativos à
gestão dos recursos humanos de uma organização, destacando que essa
responsabilidade compete às pessoas que ocupam os cargos de liderança e
aos superiores (os gestores) nas organizações, com a área de RH provendo
orientação e as ferramentas de apoio.
Cada capítulo apresentou um dos aspectos que vivenciamos para compor
equipes, motivá-las, possibilitar que realizem seus sonhos pro ssionais e
mantê-las com alto grau de desempenho. O que abordamos neste livro se
aplica a todos os tipos ou tamanhos de organização, pois seres humanos têm
objetivos, aspirações e motivações em qualquer lugar.
Alguns querem chegar ao topo da pirâmide, outros podem almejar se
tornar excelentes vendedores, atingir suas metas com e cácia e levar para
casa o dinheiro decorrente de suas comissões e bônus, sem ter a
responsabilidade de dirigir equipes. Temos de saber distinguir um do outro
e capitalizar sobre as competências de cada um.
Esperamos que nossa experiência e a de outras pessoas e organizações,
re etidas ao longo deste livro, possam ser úteis aos executivos que têm ou
terão a tarefa de gerir pessoas, aos pro ssionais de Recursos Humanos
responsáveis por suprir seus colegas com orientações e ferramentas
apropriadas, aos estudantes que um dia poderão ser responsáveis pela
supervisão de pessoas e aos pro ssionais de áreas de RH.
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