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Universidade Evangélica de Goiás

Programa de Pós-Graduação em Sociedade, Tecnologia e Meio


Ambiente - PPGSTMA
Disciplina: História Natural dos Chapadões Centrais do Brasil
Resenha crítica das Crônicas do Cerrado: Altair Sales Barbosa
Discente: Marianna Carrilho Silva

1. Dados bibliográficos do autor


Altair Sales Barbosa é graduado em Antropologia pela Universidade Católica de Chile
(1970), Doutor em Arqueologia Pré-Histórica pela Smithsonian Institution - National
Museum of Natural History de Washington DC (1991). Participou de vários trabalhos em
frentes de atração com indígenas brasileiros, juntamente com alguns sertanistas. Possui
experiência na área da Antropologia, com ênfase em Arqueologia, atuando principalmente
nos seguintes temas: Arqueologia, Cerrado, Antropologia, Meio Ambiente e Cultura;
2. Resumo da obra
A obra é do gênero literário crônica, o qual registra eventos marcados pelo tempo. As
crônicas do Cerrado relatam de forma narrativa ‘‘O Cerrado antes de Cristo, Maomé,
Colombo, Cabral e tantos outros sobrenomes de pompas’’, ‘‘Semana do Índio’’, e ‘‘Os rios
do cerrado e as consequências do desaparecimento’’.
A primeira crônica relata o ‘‘Êmico, e o ético de uma história ambiental’’,
demonstrando o papel fundamental que o Cerrado teve para os indígenas, e como a chegada
de colonizadores afetaram essa sociedade. Os indígenas, denominados Andarilhos da
Claridade, ou Peregrinos do Alvorecer, ocupavam o cerrado a cerca de doze mil anos, antes
dos tempos atuais, a ciência demonstra que a Terra estava no final da glaciação
Pleistocênica, consolidando alguns locais e mudando completamente outros. O cenário que
recepcionou nossos primórdios foi de uma fauna variada, desde mamíferos até pequenos
polinizadores, e também de uma flora com vastos campos, cerrados e cerradões, tendo
assim disponíveis proteínas animais, vitaminas diversas, oriundas de frutos e açucares
resultantes da coleta do mel silvestre. Nossos ancestrais se distribuíram em pequenas
sociedades próximos a paredões de arenitos, encontrando abrigos naturais, também
construíram ocas, e ali permaneceram por séculos. Entretanto a crônica nos mostra essa
mudança de cenário quando alguns homens estranhos que eram valorizados pelos seus
sobrenomes chegam, a princípio foram bem recebidos, mas com o passar do tempo esses
homens se viraram violentamente contra nosso povo, violentando mulheres, trazendo
doenças desconhecidas, levando os índios para lugares desconhecidos, etc. Após todos
esses acontecimentos, nossos ancestrais vivem atualmente em reservas, ou peregrinam sem
rumo.
Na crônica ‘‘Uma dívida com a história e um buraco na consciência’’, o professor Dr.
Altair Sales relata a importância do conhecimento da história indígena na região do
Cerrado, visto que essa cultura contribui de forma determinante para a identidade brasileira,
sendo assim a compreensão desses fatos nos leva a busca de uma sociedade mais justa. Os
grupos indígenas inicialmente eram grupos nômades, caçadores, coletores, que com o
passar do tempo se transformaram em agricultores. A região oferece solos ricos para o
cultivo, devido as três grandes bacias brasileiras (Amazonas, Paraná e São Francisco) que
recortam o planalto, acompanhando as matas de galeria. Entretanto não se sabe
precisamente quando e como começaram as práticas de cultivo no Cerrado, possivelmente
os sistemas agrícolas desenvolvidos por nossos ancestrais indígenas, são fruto de um
processo de experimentação, coleta, cultivo e domesticação, desenvolvimento e
empréstimo de técnicas de um ajustamento da sociedade.
Em resumo Altair Sales descreve as diferentes tradições de horticultores que
exploravam diversos ambientes e cultivos, como Una, Aratu/Sapucaí, Uru e Tupiguarani.
A tradição Una colonizou vales pouco férteis, e tiveram sua economia associada a cultivo
de milho, com a caça e a coleta, a população de distribuiu em pequenas sociedades, e
utilizavam como moradia abrigos e grutas naturais. A tradição Aratu/Sapucaí dominaram
as terras do centro sul e leste de Goiás, principalmente as áreas mais férteis e mais
florestadas. Sua economia era dependente do cultivo, mas não isentando a exploração de
frutos, caça e pesca; sua técnica de cultivo baseada em tubérculos e provavelmente no
milho, resistiram os avanços dos grupos mandioqueiros da tradição Uru e Tupiguarani.
Com uma população numerosa impediu a infiltração de outros grupos em seus territórios.
A Tradição Uru ocupa terrenos baixos no centro oeste do estado, sendo para eles de grande
valia devido a facilidade de locomoção e os recursos disponíveis para a pesca, que
provavelmente era de pouca serventia para os aldeões da tradição Aratu. Sendo assim uma
fronteira bem definida foi criada entre esses dois grupos. A tradição Tupiguarani aparenta
ser a mais recente população aldeã do Cerrado, dominando o vale da Paranaíba, e
construindo aldeias no Alto Araguaia, devido as suas dispersões e falta de autonomia,
dividiram o convívio na maioria das vezes com grupo horticultores de outras Tradições.
Uma observação relevante citada por Sales é que essas dispersões contribuíram para que
esses aldeões tivessem a necessidade de enfrentar os colonizadores brancos.
E assim viveram nossos ancestrais até a chegada de homens diferentes e armados, não
motivados pela disputa de fronteiras a fim de utilização da terra para plantio, colheita, caça,
ou habitação, mas sim para a exploração, principalmente de pedras preciosas, como
brilhante e ouro. Com isso a guerra foi instalada entre os povos indígenas e os
colonizadores, tendo como consequência a derrota, ao processo de união de índios de
aldeias próximas as povoações coloniais, forçando um contato com esses colonizadores,
etc. Por fim o autor termina a crônica nos encorajando para a busca de um novo despertar,
em relação as relações sociais que herdamos, e que infelizmente moldam nossa sociedade
atual.
Na terceira e última crônica: ‘‘Rios do Cerrado e as consequências do
desaparecimento’’, o professor Dr. Altair Sales retrata a interdependência dos elementos
no Cerrado, como água, solo, animais, amplitude térmica diária, geomorfologia, entre
outros. Sendo a junção de todos esses elementos um dos fatores responsáveis pela
distribuição geográfica dos seres vivos, incluindo nossos ancestrais, podendo
considerarmos assim o Cerrado como um sistema biogeográfico. Entretanto como já citado
nas crônicas anteriores, as conquistas de território para essa distribuição geográfica, foram
marcadas por atos violentos e desrespeito aos componentes do sistema. Colocando assim o
Cerrado como uma grande fronteira de expansão agrícola, e econômica, atingindo
dimensões nunca vistas anteriormente. Isto ocorre devido as políticas públicas, que não
levam em consideração a dinâmica do cerrado.
Se esta situação persistir poderemos presenciar um desastre ecológico, sendo assim o
autor trás como exemplo as diversas maneiras que as águas subterrâneas se acumulam, e
como a natureza do solo e as formas vegetacionais podem influenciar nesse processo de
descolamento. Sales também salienta as etapas do processo de desequilíbrio quando ocorre
a retirada da cobertura vegetal nativa, primeiramente os lençóis freáticos tendem a secar,
ocorrendo em uma variação de tempo que é dependente dos subsistemas do Cerrado. Em
seguida as águas pluviais já não conseguem mais penetrar o solo, secando as reservas dos
aquíferos, iniciando assim a diminuição da perenidade dos rios. Com isso as atividades
agrícolas são afetadas, devido a insuficiência de água nos lençóis freáticos, fincando restrita
a época da estação chuvosa. Consequentemente a pastagem que era utilizada para a
pecuária é afetada, provocando uma redução no rebanho. Toda essa situação no campo
afetará as cidades, que devido a diminuição da vazão dos rios, acarretará em racionamento
de água, energia, ocorrendo também um aumento nos níveis de desemprego.
3. Avaliação Crítica
De modo geral o autor relata de forma clara e concisa a ocupação do Bioma Cerrado
pelos nossos ancestrais (povos indígenas), e como se deu o uso dos recursos disponíveis
neste Bioma, relatando com ênfase sua exploração após a chegada dos colonizadores. Essa
exploração ambiental é bem relatada na crônica ‘Os rios do Cerrado e as consequências do
desaparecimento’, onde é demonstrado que a história da ocupação humana (a qual foi
caracterizada por grande violência e desrespeito aos elementos do sistema), ainda exerce
grandes influências nas políticas públicas atuais.
Com sólidos conhecimentos a cerca do tema, o autor empenha-se em apresentar de
forma clara e detalhada todos os aspectos relacionados ao tema, sendo assim o leitor não
necessita de conhecimento prévio para sua leitura, visto que o texto não possui conceitos
e termos de difícil compreensão.
A leitura das crônicas nos auxilia como estudantes da área de conhecimento das
ciências ambientais, nos levando a análise e confronto de nossa percepção enquanto
pesquisadores, percebendo a necessidade de uma mudança na cultura humana, em relação
a planejamentos ambientais, que devem estar diretamente associados a questões sociais.
Um exemplo disso é o relato na crônica ‘Os rios do Cerrado e as consequências do
desaparecimento’, demonstrando que os desastres sociais como morte, doença, fome, etc.
são consequências do mau uso dos recursos hídricos, acarretando o desaparecimento dos
rios.
De modo diferente, os povos indígenas respeitavam todas as formas manejo do meio
ambiente, como se pode perceber na crônica ‘Semana do índio’, onde é citado as diferentes
tradições, como Una, Aratu/Sapucaí, Uru, e Tupiguarani, que cuidavam dos recursos que
a terra oferecida. Entretanto depois da colonização esses povos se viram ameaçados e
marginalizados, como retratado na crônica ‘O Êmico e o Ético de uma História
Ambiental’. Com isso ambas as crônicas nos possibilitam um amadurecimento de
pensamentos a respeito do meio ambiente, e sua utilização, bem como as mudanças
necessárias para sua preservação.
4. Referência
BARBOSA, Altair Sales. Crônicas do Cerrado. Rio de janeiro. vol 25, n. 1, fev,
2015.

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