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UM RECORTE DE ARTAUD, O SEU CONTEXTO HISTÓRICO,

SEUS PRINCÍPIOS DE TRABALHO, SUA ATUAÇÃO EM VÁRIOS


CAMPOS, A TRANSMISSÃO DE SUA OBRA NO SÉCULO XX E
A IMPORTÂNCIA DO SEU PENSAMENTO– QUE AJUDOU A
CONSTRUIR UMA POÉTICA CÊNICA CONTEMPORÂNEA.
QUESTÕES INICIAIS -
HIPÓTESES

Artaud fala dos limites da palavra - e de algo


que não passa pelo dito – mas que atravessa
o corpo.

Ele testemunha a possibilidade de


transmissão via palavra – com a força do seu
verbo (mas também da sua história).

Por que o definem como surrealista se


parece estar muito mais próximo ao
expressionismo?
Direção Jean-Christophe Averty 1965
1896 – estreia de UBU REI de Alfred
Jarry. Uma peça fantasmagórica –
que atacava as convenções sociais.
A palavra cirando um clima onírico
e delirante. Outra forma de atuação
– entonação da voz e figurinos (que
sepultaram a arcaica tradição
realista no teatro) (GLUSBERG: 12)

Alfred Jarry e seus colegas


decidiram parodiar o aspecto
grotesco e boçal de seu professor
de física. Jarry (que alguns anos
mais tarde decidiu reescrever a
peça) valeu-se do personagem
Ubu para representar a terrível
imagem da natureza animal do
homem, expondo sua crueldade
e desumanidade.

ARTAUD: Funda o Teatro Alfred


Jarry (Manifesto em 1926:
Nouvelle Revue Française)
A peça estreou no Teatro do Louvre,
em Paris com a intenção de
confrontar a plateia burguesa com o
horror de sua própria maldade.

Um cenário de ingenuidade infantil, as


vestimentas do elenco altamente
estilizado assemelhavam-se a madeira,
em uma clara alusão ao universo de
marionete.

O público ficou completamente


atônito assim que Firmin Gémier
(ator que representava Ubu) disse a
primeira palavra: Merdre. Foi
necessário um bom tempo para que
o silêncio do público fosse
restabelecido, com manifestações
contra e a favor durante toda a
noite.
Ubu, personagem monstruoso,
corrupto, covarde, estúpido e cruel,
assassina o rei Venceslau e usurpa o
trono da Polônia.

BAAL – Brecht.
O texto nonsense de Alfred
Jarry em Ubu Roi é recheado de
referências à Patafísica (termo
que refere-se a "ciência das
soluções imaginárias e das leis
que regulam as exceções") e,
através da exploração do
campo das ideias, revela o
homem e seu absurdo
existencial.

Caído no esquecimento, Jarry


foi 'redescoberto' por
Apollinaire, por volta de 1916, e
por André Breton
(SURREALISMO – ARTAUD)

VERSÕES:
Carnaval – festa – grotesco –
sátira – paródia – crítica.

JOSÉ CELSO MARTINEZ CORREIA


(Living Theater – Artaud)
1910: Primeiras Noites Futuristas (Seratas),
onze meses após a publicação do Minifesto de
Marinetti: “cantar o amor ao perigo, o hábito
pela energia e pelo destemor, e exaltar a ação
agressiva, a insônia febril, o passo dos
corredores, o salto mortal e a potência de
uma bofetada” (GLUSBERG: 12).

No dia 20 de fevereiro de 1909 o poeta


italiano Emilio Marinetti publicou no "Le
Figaro" primeiro de 11 artigos anunciando
uma nova orientação nas artes.
1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia e da temeridade.

2. A coragem, a audácia, a rebelião serão elementos essenciais de nossa poesia.

3. A literatura exaltou até hoje a imobilidade pensativa, o êxtase, o sono. Nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insônia febril, o
passo de corrida, o salto mortal, o bofetão e o soco.

4. Nós afirmamos que a magnificência do mundo enriqueceu-se de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um automóvel de corrida com
seu cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de hálito explosivo... um automóvel rugidor, que correr sobre a metralha, é
mais bonito que a Vitória de Samotrácia.

5. Nós queremos entoar hinos ao homem que segura o volante, cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada também numa corrida sobre o
circuito da sua órbita.

6. É preciso que o poeta prodigalize com ardor, fausto e munificiência, para aumentar o entusiástico fervor dos elementos primordiais.

7. Não há mais beleza, a não ser na luta. Nenhuma obra que não tenha um caráter agressivo pode ser uma obra-prima. A poesia deve ser
concebida como um violento assalto contra as forças desconhecidas, para obrigá-las a prostrar-se diante do homem.

8. Nós estamos no promontório extremo dos séculos!... Por que haveríamos de olhar para trás, se queremos arrombar as misteriosas portas
do Impossível? O Tempo e o Espaço morreram ontem. Nós já estamos vivendo no absoluto, pois já criamos a eterna velocidade onipresente.

9. Nós queremos glorificar a guerra - única higiene do mundo - o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos libertários, as belas ideias
pelas quais se morre e o desprezo pela mulher.

10. Nós queremos destruir os museus, as bibliotecas, as academia de toda natureza, e combater o moralismo, o feminismo e toda vileza
oportunista e utilitária.

11. Nós cantaremos as grandes multidões agitadas pelo trabalho, pelo prazer ou pela sublevação; cantaremos as marés multicores e
polifônicas das revoluções nas capitais modernas; cantaremos o vibrante fervor noturno dos arsenais e dos estaleiros incendiados por
violentas luas elétricas; as estações esganadas, devoradoras de serpentes que fumam; as oficinas penduradas às nuvens pelos fios
contorcidos de suas fumaças; as pontes, semelhantes a ginastas gigantes que cavalgam os rios, faiscantes ao sol com um luzir de facas; os
piróscafos aventurosos que farejam o horizonte, as locomotivas de largo peito, que pateiam sobre os trilhos, como enormes cavalos de aço
enleados de carros; e o voo rasante dos aviões, cuja hélice freme ao vento, como uma bandeira, e parece aplaudir como uma multidão
entusiasta.
Nas artes plásticas, o FUTURISMO
foi o ponto de partida de várias
orientações, como o cubismo,
surrealismo e o construtivismo.

As poesias futuristas jogavam com


as palavras, de maneira que as
grafias não compõe um sentido
único e fechado.

Essa técnica seria reproduzida


mais tarde no DADAÍSMO.

São palavras espatifadas.


Kré É preciso que tudo puc te
Kre esteja arrumado puk te
pek por um fio li le
kre numa ordem pek ti le
e fulminante kruk
pte

(ARTAUD)
Eu a queria resplendente
de flores, com pequenos
vulcões enganchados nas
axilas, e especialmente
esta lava em amêndoa
amarga e que estava no
centro de seu corpo
erguido.

(ARTAUD)
Quem sou eu?
De onde venho?
Sou Antonin Artaud
E basta que eu o diga
como só eu o sei dizer
e imediatamente
hão de ver meu corpo
atual,
voar em pedaços
e se juntar
sob dez mil aspectos diversos.
Um novo corpo
no qual nunca mais
poderão
esquecer.
Eu Antonin
Artaud, sou
meu filho, meu
pai, minha
mãe, e eu
mesmo.
Eu represento Antonin Artaud!
Estou sempre morto. Mas um vivo morto,
Um morto vivo.
Sou um morto
Sempre vivo.
A tragédia em cena já não me basta.
Quero transportá-la para minha vida.
Eu represento totalmente a minha vida.
Onde as pessoas procuram criar obras de arte,
Eu pretendo mostrar o meu espírito.
Não concebo uma obra de arte
dissociada da vida.
Este Artaud, mas por falta do que fazer...
Eu, o senhor
Antonin
Artaud,
Nascido em
Marseille no
dia 4 de
setembro de
1896,
Eu sou Satã
E eu sou Deus,
e pouco me importa a Virgem Maria.
Os FUTURISTAS (1909-1930) postulavam a
participação do público envolvendo-os nos
espetáculos (bem antes dos happenings da
década de 60 ).

Em 1914, Marinetti apresentou “Zang Tumb


Tuung”- descreve a vida manifestada no animal,
vegetal e mineral.

Peças sem atores, apenas luzes e objetos. “Fogos


de Artifício” (Giacommo Balla): quarenta e nove
sequências de luz; várias cores contracenando
com tecidos transparentes iluminados por
dentro.

Drama de objetos: “Vengono”. Cadeiras e mesas


como símbolos.

Ou a atuação se reduz a partes. “As Bases” de


Marinetti. Sugestão da figura humana
representada apenas pelas pernas - as únicas
partes visíveis. “As Mãos”: atuação é realizada
pelas mãos aparecendo por trás de uma fina
cortina.
No teatro o EXPRESSIONISMO
rejeita o NATURALISMO. Afirma a
supremacia da alma.
EXPRESSIONISMO

Ideia de possessão. Força que emana do mais profundo do ser e desencadeia uma série de comoções.
Não se trata de desenhar o papel (se disfarçar em personagem), mas viver a aventura da peça.
Em vez de desenvolver a complexidade da personagem, isola um traço , sublinha-o.

Usa a voz e o gesto para agir sobre o espectador


Procede por descargas sonoras visuais

O ator deve ser teatral, não temer o exagero e a deformação, a caricatura, o grotesco.

A palavra é ritmicamente articulada.


Às vezes surgem diálogos inseridos sem nenhuma ordem lógica ou cronológica.
Mas além do silêncio, da pausa, pode usar a poesia e a prosa.

Rompendo com os gestos cotidianos, o ator seleciona gestos isolados, que sucedem sem transição,
muito marcados, beirando a caricatura, entrecortados, como as vezes é a dicção.
Ou ainda são apenas sugeridos, estando incompletos, inacabados.
Os gestos são estilizados e se aproximam da dança.

O ator deve ter um corpo flexível, desarticulado. Pratica a alternância tensão-descontração. O corpo
parece estar dividido em zonas de tensão que se revelam progressivamente. As mãos são crispadas ou
projetadas no ar. Os gestos cortam o espaço.

O coro comenta a peça plasticamente, numa coreografia reduzida a batidas de pés no lugar, tremores,
crispações, projeções de cabeça ou de braços.
ARTAUD NO CINEMA
EXPRESSIONISTA
Fait divers, Claude Autant-Lara, 1924
Surcouf, le roi des corsaire, de Luitz-Morat, 1925
Graziella, Marcel Vandal, 1926.
Le Juif Errant, Luitz-Morat, 1926, personagem Gringalet
Napoléon, Abel Gance, 1927, personagem Marat
La Passion de Jeanne d'Arc, Carl Theodor Dreyer, 1927, personagem Massieu
Verdun, visions d'histoire, Léon Poirier, 1927
La Coquille et le clergyman, Germaine Dulac, 1928, com Génica Athanasiou
L'Argent, Marcel L'Herbier, 1928, personagem Mazaud
Tarakanova, Raymond Bernard, 1929, personagem um jovem boêmio
La Femme d'une nuit, Marcel L'Herbier, 1930,personagem Jaroslav .
L'Opéra de quat'sous, Georg Wilhelm Pabst, 1930, versão francesa, personagem
um mendigo aprendiz
Faubourg Montmartre, Raymond Bernard, 1931, personagem Follestat
Les Croix de bois, Raymond Bernard, 1931, personagem Vieublé
Coup de feu à l'aube, Serge de Poligny, 1932, personagem um chefe de bandidos
Mater Dolorosa, Abel Gance, versão falada, 1932
Liliom , Fritz Lang, 1933.
Lucrèce Borgia, Abel Gance, 1935, personagem Savonarole
Koenigsmark, Maurice Tourneur, 1935.
ARTAUD NO CINEMA
ARTAUD NO CINEMA
“O DIBUK” (VANKHTANGOV)
Referência de Teatro Expressionista
VANKHTANGOV

Atores judeus, que falavam hebraico e ignorando


esta língua os fez desenvolverem a expressão
corporal, a dança, esses atores eram treinados
para passarem facilmente do riso às lágrimas,
tinham traços extremamente móveis e mãos
falantes.

Espetáculo “O Dibuk”

Gritos guturais, guinchos, salmodiar doloroso,


musicalidade e uma interpretação gestual com
balanço de cabeça e pernas, torso lançado para
trás e/ou com as costas arqueadas, gestos largos
e intensificados. Havia uma dança dos mendigos
que chamou a atenção por sua força
encantatória, um balé grotesco, macabro, com
braços que se agitavam como morcego.

ME LEMBROU ESTA IMAGEM DE CENA DE IMAGEM DE


ESPETÁCULO DE GROTOWSKI. ESPETÁCULO
DE GROTOWSKI
“PARA ACABAR DE VEZ COM
O JUÍZO DE DEUS” (PEÇA RADIOFÔNICA
DE ARTAUD – GRAVADA EM 1948)
TRECHO DE “PARA ACABAR DE VEZ COM O JUÍZO DE DEUS” (PEÇA RADIOFÔNICA):

“Onde cheirar a merda


Cheira a ser.
O homem poderia muito bem deixar de cagar,
Deixar de abrir a bolsa anal,
Mas preferiu cagar
Como poderia ter preferido viver
Em vez de consentir em viver morto.

É que para não fazer cocô


Teria que aceder
a não ser,
Mas ele é que não foi capaz de se resolver a perder o ser,
Isto é a morrer vivo.”
“Para Acabar de uma Vez com o Juízo de Deus” –
gravação em 1948.

“Gritava como um cachorro ou como um galo.


Tudo isso deveria fazer rir a plateia. Estavam
paralisados. Num canto da sala uma mulher
chorava” (depoimento de alguém que estava
presente)

Foi proibido de ir ao ar.


PALAVRAS FINAIS DE ARTAUD (25 de fevereiro de 1948): “Última Carta Sobre o Teatro” (faleceu de câncer em março)

Paule, estou muito triste e desesperado


Meu corpo dói de todos os lados
Mas sobretudo tenho a impressão de que todos se decepcionaram
Com a minha emissão radiofônica.
Lá onde está a máquina
É sempre o abismo e o nada
Há uma interposição técnica que deforma e aniquila aquilo que se faz.
As críticas de M. e A. são injustas mas devem ter tido sua base em um defeito de
Transmissão
É por isso que eu jamais voltarei ao Rádio
E consagrarei doravante exclusivamente ao teatro
Como o concebo
Um teatro de sangue
Um teatro que a cada representação proporcionará
Corporalmente
Alguma coisa a quem representa
Como a quem vem assistir a representação
Aliás,
Não se representa,
Age-se
O teatro é na realidade a gênese da criação.
Isto se fará.
Tive uma visão hoje à tarde
Vi aqueles que me seguirão e aqueles que ainda não tem um corpo
Porque os porcos como aqueles dos restaurante de ontem a noite comem demais
Existe quem come demais
E outros como eu que não podem mais comer sem escarrar
Em vocês.
PROJETO PARA O ATOR (A RESPIRAÇÃO COMO FOCO)

Respiração – sistematização (construção) – com tipos de respiração: feminino, masculino e


neutro

A FEMININA é uma respiração prolongada, interiorizada, baseada no diafragma, que tem


várias características como o abandono, a angústia, apelo, invocação, súplica.

A MASCULINA (DE TEMPO MASCULINO) é uma respiração pesada, rápida, torácica, onde o
homem joga a força multiplicada de seus braços. Tem características como: culpa, depressão,
humor, impaciência, indecisão, isolamento, obsessão, paranóia, solidão, vitimização e
heroísmo.

USO DE PALAVRAS PARA A SISTEMATIZAÇÃO DE UM PROCEDIMENTO (IMPLICAÇÃO DA


PALAVRA NO CORPO).

“OS CENCI” : Espetáculo de 1935 onde tentou aplicar suas teorias. Logo após viagem ao
México. Culto do peyote – índios Tarahumaras. “Viagem ao País do Tarahumaras” (1945). 1937
IRLANDA. Cultura celta. Vive pregando nas ruas com o cajado de São Patrick. Acusado de
agitador é preso e extraditado para a França. Internação. Ocupação alemã em maio de 1940.
Os amigos e parentes perdem o contato com Artaud. Não sabem mais onde ele está. Ele
percorre vários azilos até chegar em Rodez em 1943. Libertado três anos depois. Cartas a seu
médico datadas deste período. Prática vocal com cantos, giros, gritos, variações de altura,
intensidade e duração (gestos que pareciam insanos para os médicos).
1947: Conferencia no Teatro Vieux-Colombier – um público de artistas
parisienses, intelectuais e curiosos (Sartre, Picasso, Camus, Adamov, Gide) para
reintroduzi-lo no universo das letras francesas.

Texto da conferência: “A História Vivida de Artaud-Momo” (experiências com


peyote e nos sanatórios, ideias metafísicas).

Mas não acabou. Os papéis caíram e ele não quis reorganiza-los partindo para
um aparente improviso recheado de silêncios, ofensas e gritos.

“Nós ainda não nascemos.


Ainda não estamos no mundo.
Ainda não existe mundo.
As coisas ainda não se fizeram.
A razão de ser não foi achada.”

Depois, carta a Breton:

“Eu já tinha reparado que já bastava de palavras e até mesmo de rugidos, e o


necessário eram bombas; ora, eu não as tinha nas mãos nem nos bolsos”.
“Klee organiza visões interessantes. Eu gosto muito de
seus pesadelos, suas sínteses mentais concebidas como
arquiteturas, e sínteses cósmicas onde a objetividade
secreta das coisas se torna sensível, mais do que as
sínteses de Grosz que criva o mundo e o reduz à sua
visão. Em Klee as coisas do mundo se organizam – e ele
tem a aparência de escrever sob inspiração delas.
Organização de visões, de formas, e também fixação,
estabilização de pensamentos, induções e deduções de
imagens, com a conclusão que daí decorre, e também
organização de imagens, busca do sentido subjacente
de imagens, clarificações de visões do espírito. A secura,
a nitidez de Grosz, explodem diante destas visões
organizadas, que mantêm seu aspecto de visões, seu
caráter de coisa mental” (ARTAUD).

“Um olho vê, o outro sente” (Paul Klee)

ARTAUD CRÍTICO DE ARTE


O SURREALISMO NAS ARTES PLÁSTICAS:
UMA POÉTICA CONSOLIDADA
O TEATRO NO SURREALISMO

O ator sem um texto dialogado a ser dito, em meio a projeções cinematográficas, canto,
acrobacia, destinados a comunicar aos espectadores uma vida intensa e inebriante, que vai ao
encontro do que acontece no mundo, as descobertas científicas, o avanço da tecnologia e da
comunicação imediata entre os povos, a diluição das fronteiras.

O coro é representado por vários atores encerrados em uma única veste, com uma manga em
cada extremidade e com tantas aberturas quantas cabeças.

O ator perde sua silhueta, é deformado pelo figurino.

Os atores do teatro de variedades e do circo devem saber sustentar a cena sozinhos, sendo
preciso, ter senso de improvisação, de réplica, saber segurar o imprevisto, saber contracenar com
o público, ter senso de ritmo, do efeito que utiliza e sentido do cômico, saber mudar
rapidamente de roupa e de maquiagem e de personalidade, saber cantar, dançar, tocar
instrumentos.
A “FURA DEL BAUS” PODE SER
UMA REFERÊNCIA VISUAL?
O CINEMA NO SURREALISMO:
“O CÃO ANDALUZ” (BUÑUEL)
1924: MANIFESTO SURREALISTA (BRETON).

Poesia – ensaios – esculturas – cinema – notas e manifestos.


Conceito: abandono do “raciocínio lógico” (inteireza, causalidade)
Livre-associação: saltos (uma outra lógica).
Escrita automática.
Técnica: automatismo psíquico (“veio – ficou”): associações múltiplas e
muito rápidas;

Balé “Relâche” (1924) – elementos dadaístas. Duchamp (cenário) /


Satie (música) / Entr’acte: filme de René Clair.
Entr’acte:
filme de René Clair
ARTAUD ROTEIRISTA DE CINEMA
SURREALISMO NO CINEMA: UMA POÉTICA CONSOLIDADA

Noção de aleatório. Alteração das dimensões espaciais. Montagem (de coisas


que não se articulam). Visualidade de um sem sentido. Ideia de quebrar com a
racionalidade. Não tem muito sentido mostrar a bailarina de baixo, mas mostra
um plano que não é normalmente visto. Ideia de revelação. O cinema pode
trabalhar com o close no detalhe, o que implica alteração da visualidade
comum, fragmentação e montagem. Montagem muitas vezes aleatória mas
que pode ter um sentido escondido, uma verdade camuflada que deve ser
revelada (ou provocada). A montagem põe enigma. Relação com o sonho, o
delírio e o inconsciente de Freud. Como as coisas se juntam: deveria ter um
sentido mas não tem (desafia a interpretação), exige a quebra de uma
racionalidade (onde tudo caberia, todo o sentido).

O pulo é aleatório, é um excesso e gera comicidade. A comicidade vem do que


não tem lugar no contexto, do que sobra mas ao mesmo tempo “toca” em um
sentido (poderia ter sentido). E lembra algo, outra coisa, que não está ali.
Repetição e substituição sem sentido dos elementos. Volta e meia aquilo
insiste, reaparece, “como se” quisesse dizer algo, “como se” tivesse uma
mensagem (que a gente não entende). São metáforas opacas (diferente de
quando Eisenstein monta um pavão com o presidente russo).
NECESSIDADE DE ARTAUD DE CONSOLIDAR
UMA POÉTICA CÊNICA AUTÔNOMA (NÃO É
LITERATURA, NÃO É ARTES PLÁSTICAS) – O
QUE É O TEATRO?

“Para mim a questão que se impõe é de se PERMITIR AO TEATRO


REENCONTRAR SUA LINGUAGEM: espacial, linguagem de
gestos, de atitudes, de expressões e de mímicas, linguagem de
gritos e onomatopéias, linguagem sonora, mas que terá a mesma
importância intelectual e significação sensível que a linguagem
das palavras. As palavras serão apenas empregadas em
momentos determinados e discursivos da vida como uma luz
mais preciosa e objetiva aparecendo na extremidade de uma
ideia”.

(Linguagem e Vida, 2004: 80 – “O Teatro que Vou Fundar”, 1932)


Artaud fala a partir da crise do teatro, que o teatro não deve ser um jogo,
mas sim um acontecimento. Pergunta-se por quais meios.

“As ideias de teatro não têm mais para nós o brilho, a mordacidade, este
caráter de coisa única, inusitada, inteira que ainda conservam certas ideias escritas
ou pintadas” (ARTAUD, 2008: 29) – perdeu-se.

Ele coloca o teatro como coisa perdida. Coisa que a pintura e a escrita têm e
que o teatro perdeu.

Ele fala em teatro puro e na necessidade do público “tomar partido conosco”


– parte integrante da experiência.

A singularidade do teatro parece estar aí – nesta relação com o “público”


como pessoa vida – e não na plasticidade do espetáculo (ordem da pintura,
escultura, desenho, artes visuais).

Ele coloca a salvação do teatro na ordem do impossível: “O teatro é a


coisa mais impossível de salvar no mundo” (ARTAUD, 2008: 30).
A sua teoria não deixa de ser
ambígua. Ora defendendo um
corpo que funcione como as
palavras; ora esbravejando contra
a palavra, que pretenderia uma
“comunicação clara”. A
plasticidade da cena também é
atacada como plasticidade morta.
Ora defendendo “o evento” (e o
improviso) que não se repete, ora
defendendo a partiturização
precisa e impessoal.

Trata-se para ele de fazer


RESSUSSITAR O TEATRO, SALVÁ-LO,
RECUPERAR “A VIDA” NO TEATRO.

E para esta vida ele elege um


primeiro protótipo, em 1924.
MANIFESTO (1924 – 1930)

O que é “grave” para ele: “a irrupção inédita


de um mundo” através da “interrupção da
realidade”. Um mundo “tangente ao real”:

“O teatro deve dar este mundo efêmero, mas


verdadeiro, este mundo tangente ao real”
(ARTAUD, 2008: 30).

Ele acusa o teatro de não poder evocar uma


ilusão e, sendo assim, ele deverá “ser” este
mundo tangente ao real “ou será dispensado”:

“As palavras têm ou não seu poder de ilusão.


Elas têm seu valor próprio. Mas cenários,
figurinos, gestos e gritos falsos não substituirão
jamais a realidade que esperamos” (ARTAUD,
2008: 30).
Uma blitz serve como referência do que seria o seu “teatro ideal”.

O que há de mais abjeto e ao mesmo tempo de mais sinistramente terrível do


que o espetáculo de um aparato de polícia? (...) Quando a polícia prepara uma
blitz, dir-se-ia ver evoluções de um balé. Os agentes vão e vêm Apitos lúgubres
dilaceram o ar. Uma espécie de solenidade dolorosa se desprende de todos os
movimentos. Pouco a pouco o círculo se fecha. Estes movimentos, que
pareciam à primeira vista gratuitos, pouco a pouco seu alvo se desenha,
aparece – e também este ponto do espaço que lhes serviu até agora de pivô. É
uma casa de qualquer aparência cujas portas de repente se abrem, e do interior
desta casa eis que sai um rebanho de mulheres, em cortejo, e que n=vão como
para o matadouro. A questão toma corpo, a puxada de rede era destinada não a
uma certa população contrabandista, mas apenas a um amontoado de
mulheres. Nossa emoção e nosso espanto encontram-se no auge. Jamais
encenação mais bela foi seguida de semelhante desenlace. Culpados, é certo,
nós o somos tanto quanto estas mulheres, e tão cruéis quanto estes policiais.
Esta angústia, estes sentimento de culpabilidade, esta vitória, esta saciedade,
dão o tom e o sentido do estado mental no qual o espectador deverá sair de
nosso teatro. Ele será sacudido e ficará arrepiado com o dinamismo interior do
espetáculo e este dinamismo estará em relação direta com as angústias e as
preocupações de toda a sua vida (ARTAUD, 2008: 30)
Artaud postula a VIDA.

No texto “A Evolução do Cenário” (1924),


critica tanto o texto quanto a mise-en-scene,
advogando a favor da visualidade de “um
interior”: da alma do herói, por exemplo. Mas
que esta esteja prenhe de vida e movimento –
é este o ponto.

“É preciso ignorar a mise-en-scene no teatro.


Todos os grandes dramaturgos, os
dramaturgos-modelo, pensaram fora do teatro.
Vejam Ésquilo, Sófocles, Shakespeare. Vejam,
em outra ordem de ideias, Racine, Corneille,
Moliére. Eles suprimem ou quase suprimem a
mise-en-scene exterior, mas exploram ao
infinito os deslocamentos interiores, esta
espécie de perpétuo vaivém das almas de seus
heróis. A escravização ao autor, a submissão ao
texto, que barco fúnebre” (ARTAUD: 2008 25)
Utiliza-se de noções (como desenlace) que articulam o pensamento de
Aristóteles. E nos oferece como paradigma algo como uma curva
dramática que chega ao seu ápice.

A identificação também está presente quando diz que “somos tão


culpados quanto às mulheres e tão cruéis quanto os policiais”.

Para ele esta cena está endereçada a “toda a existência do espectador” e


implica “uma parcela de nossa vida profunda engajada ali dentro”.

O teatro implica uma espécie de SACRIFÍCIO: “uma operação verdadeira”.

É a carne está em jogo – diz ele – e não só os sentidos. O espectador


deverá ir ao teatro “como vai ao cirurgião e ao dentista”. Não morrerá,
mas também não sairá intacto. Trata-se de atingi-lo “o mais gravemente
possível”.

“Ele deve estar bem persuadido de que somos capazes de fazê-lo gritar”
(ARTAUD, 2008: 31) – “O Teatro Alfred Jarry”
Como é aparentemente contraditório: em
meio ao elogio a Ésquilo, Sófocles e
Shakespeare (os chamados “dramaturgos
modelos”), designa a escravização ao autor e
submissão ao texto como “BARCO FÚNEBRE”.

Assim como a mise-en-scene.

Artaud advoga a “exploração de infinitos


DESLOCAMENTOS INTERIORES” (que estariam
presentes nestes dramaturgos).

O antídoto para o “barco fúnebre”, o que seria


vivo para ele, se dá em termos de
“deslocamento” (algo que se desloca e
constitui a visualidade de um interior).

Não a apologia à plasticidade do espetáculo,


não o texto, mas esta vida interior em
deslocamento (que é evocada pelos
“dramaturgos-modelos”).
“Reteatralizar o teatro. Tal é o novo grito monstruoso. Mas o teatro
precisa ser relançado na vida” (ARTAUD: 2008: 26).

A teatralidade está. Mas, se esta não implicar deslocamentos internos


(estes movimentos de vida), de nada adianta.

“O que se faz necessário é REENCONTRAR A VIDA NO TEATRO, em toda a


sua liberdade” (ARTAUD: 2008: 26).

Tal vida ele encontra “no texto dos grandes trágicos, quando o ouvimos
com sua cor, quando o vemos com suas dimensões e seu nível, seu
volume, suas perspectivas, sua densidade particular” (ARTAUD: 2008: 26)

Se o texto é um amontoado de palavras, estas são, ainda, capazes de


evocar: cor, densidade, volume.
Contra a “cotidianidade” (ele quer a TRAGÉDIA) - esta sim
alvo de crítica, ausência de vida; secura.

“Tudo é lícito no teatro, salvo a secura e a cotidianidade”


(ARTAUD: 2008: 26).

A VIDA que advoga, em certos momentos parece estar


articulada a certa IMPESSOALIDADE.

Ele se encanta por um teatro balinês milimetricamente


coreografado:

“Tudo nos atores é impessoal” – talvez por se diferenciar


radicalmente do naturalismo e sua construção pessoal. Os
gestos “respondem a uma espécie de matemática (...) nessa
despersonalização sistemática, nessas expressões
puramente musculares que são como máscaras sobre o
rosto, tudo tem o seu significado, tudo produz o máximo
efeito” (Artaud apud Miralles: 45-46).
Ele diz que se vai ao teatro para reencontrar algo “peneirado” e raro.
Algo que se contrapõe a secura, a esta falta de vida do cotidiano.

Mas não só. Ele diz que jovens pintores descobriram o sentido da
pintura e pintam agora “jogadores de xadrez e de cartas semelhantes a
deuses”. Cita a atração dos music hall que é como a fantasia – desde
que não seja “esta reteatralização do teatro que é a última moda do
ideal contemporâneo”.

E reclama de “tradições novas vindas da Rússia” (ARTAUD: 2008: 26). A


crítica é, portanto, a uma plasticidade estéril, que não consegue evocar
nada além dela mesma.

Ele tampouco descarta o discurso intelectual: “Eu diria antes que é


preciso intelectualizar o teatro, pôr os sentimentos e os gestos das
personagens no plano onde elas têm seu sentido, mais raro e mais
essencial” (ARTAUD: 2008: 26).

Ao mesmo tempo, o exemplo de “tornar mais sutil a atmosfera do


teatro” é o circo. Com isto demonstra que não se trata de “metafísica
muito elevada”.
Artaud fala do “sentido dos valores do espírito”.

O conceito de “espirito” está circunscrito, tradicionalmente, como


um par complementar de “corpo”.

Por enquanto, ele não fala do corpo e sim do espírito, da vida e da


alma dos personagens.

Ele reclama que Ibsen se perde em debates sobre filosofia e moral


que não “empenham o suficiente a alma de seus heróis”.

Ele fala de um engajamento da alma. E propõe “reaprender a ser


místico”.

Como “fixar imagens que aparecem em nós, nuas (...) e ir até o


extremo destas imagens” (ARTAUD: 2008: 27).

Mas cumpre para isto reaprender a ser místico, ao menos de uma


certa maneira; e dedicando-nos a um texto, esquecendo a nós
mesmos, esquecendo o teatro, esperar e fixar as imagens que
nascerão em nós nuas, naturais, excessivas e ir até o extremo
destas imagens (ARTAUD, 2008: 27)
Há um nonsense articulado ao que ele está chamando de vida em oposição à
cotidianidade, verossimilhança e lógica.

“Desembaraçar-se não somente de toda a realidade, de toda verossimilhança,


nas até mesmo de toda lógica, ‘se’ (é interessante observar o condicional) ao
lado do ILOGICISMO percebemos ainda a vida” (ARTAUD, 2008: 27).

Só há algo de místico no ilógico que quer Artaud na medida em que este


implique “a vida”.

Quando acusa o que é “falso” no teatro, não está se referindo à necessidade da


verossimilhança. O “falso” em Artaud está em oposição ao “vivo”, este falso
está no lugar do sem vida (do morto).

Quando diz “em cena nada além do real” (um real que é diferente “de toda
realidade”, “de toda verossimilhança”) dá o exemplo do palhaço que “constrói
a cena com a direção de um olhar”.

Artaud postula modificações espaço não apenas para valorizar a direção do


olhar com a qual o palhaço constrói a cena, mas a relação do espectador com
esta cena que o olhar do palhaço constrói.
ESPAÇO

“Não se suportará que atores a três dimensões


se movam em superfícies planas e com
máscaras pintadas. A ilusão não existe para a
primeira fila da plateia. É preciso ou distanciar
a cena ou suprimir todo o lado visual do
espetáculo (...). Seria preciso mudar a
conformação da sala e que o palco fosse
deslocavel segundo as necessidades da ação.
Seria preciso igualmente que o lado
estritamente espetáculo do espetáculo fosse
suprimido. Ir-se-ia lá não tanto para ver, mas
para participar. O público deve ter a sensação
de que poderia (...) fazer o que os atores
fazem” (ARTAUD, 2008: 27)
1924 “A Evolução do Cenário”

Aparece o objetivo de reatralização, mas de maneira que o público


participe – mas no sentido de EXPERIMENTAR A ANGÚSTIA.

Neste ponto as propostas de Artaud se articulam com dadaístas e


futuristas:

“O espectador haverá de experimentar a angústia metafísica que as


cenas representadas provocarão” (Artaud apud Miralles: 41).

“A violência como antídoto de tradições e preconceitos” (Miralles: 42).

Cinco anos depois escrevendo “O Teatro de Alfred Jarry” – em 1929 –


ele precisa do que seria esta relação com o espectador: “ser capaz de
fazê-lo gritar”.

IDEIA DE CHOQUE
1962. Um grupo de frequentadores do Café de la Paix em Paris denominou suas
atividades de Pânico: uma mistura entre “confusão, humor, terror, azar e euforia”.

A primeira publicação pânica foi na revista de André Breton.

“Se misturam vida privada e artística. Existencialismo. Romantismo lúdico. Arte,


jogo, festa.” (Miralles: 49).

Resenha de um espetáculo pânico em Paris (1965):

“Em cena os ‘namorados’ eram banhados em litros e litros de azeite e vinagre; ao


‘pai’ extraíam, uma a uma, todas as suas vísceras (sexo e testículos incluídos) que logo
alguém fritava numa frigideira oferecia ao público como bisteca; a ‘sádica’ açoitava,
realmente, o ‘masoquista’ até converter suas costas em puras chagas; todo o teatro foi se
enchendo de pintinhos recém-nascidos, cobras, tartarugas, passarinhos, pombas, gansos,
carne de boi... O touro seduziu a princesa, enquanto a umedecia com a espuma que
emergia de um de seus cornos friccionado pela mão da donzela. Uma banda de rock
tocava altíssimo e em algumas ocasiões, parava para dar lugar a mais melancólica
melodia: os cantos de uma boda judia. Um cachorro se suicidou, seis bailarinas se
banharam em cena nuas; um autêntico poeta cortou os pelos do púbis de sua esposa (...)
Jamais se ouviu em Paris uma ovação como daquela noite” (Miralles: 51-52).
Edição americana do texto de Artaud: 1958.

Causou uma transformação em todo o novo teatro norte-


americano. Esse “cultivo da crueldade como uma catarse” (Salvat apud
Miralles: 47) foi recebido pelo intelectual norte-americano “como uma
salvação”.

Em Londres influenciou Brook – que fazia um teatro experimental


montando três espetáculos “artaudianos”. O terceiro seria Marat Sade.

Sobre Tito Andrônico Miralles diz que Brook “utiliza a Crueldade,


mas rechaça a técnica de Artaud como ultrapassada”.

“Aceita a vontade do mistério, a magia das ações e das palavras


como um conjunto orgânico” (Miralles: 48).

“Ao contrário dos alemães, que aceitam a Crueldade como técnica,


mas rechaçam sua intenção para incidir criticamente na realidade”.
PETER BROOK
“O ato de representar é um ato de
sacrifício, o de sacrificar o que a
maioría dos homens prefere ocular:
este sacrificio é o seu presente ao
espectador” (Peter Brook)
LIVING LIVING
THEATERTHEATER
1947 1947 -
GROTOWSKI
1933-1999
EUGÊNIO
BARBA
TEATRO OFICINA
TEATRO
DA VERTIGEM
MARTA
MINUJIN
HERMANN 1943 -
NISTCH
1938-

MARINA
ABRAMOVIC
1946

HWARZKOGLER BEUYS
1921-1986 KAPROW
0-1969
1927-2006
Ele esbraveja contra a plástica gratuita da cena: “toda esta
trabalha detestável e atravancadora que faz de uma peça escrita um
espetáculo” - ele quer associação e abstração - “em lugar de
permanecer NOS LIMITES da palavra, das imagens e das abstrações”
(ARTAUD, 2008: 35).

Não é contra a palavra que Artaud se coloca. “Esta ostentação


visual que queremos reduzir a seu mínimo possível e recobrir sob o
aspecto de gravidade e o caráter de inquietude da ação” (ARTAUD,
2008: 35).

É interessante ele falar de “ação” – porque esta está posta em


algum teórico do começo do XX na Rússia – em oposição ao
virtuosismo Meyerholdiano e também ao mimetismo de
Stanislavski. Seria uma terceira coisa.

Esta terceira coisa ele procurou formalizar ao longo de sua


vida em uma série de manifestos – publicados em revistas ou
brochuras.
OUTROS TEXTOS DE ARTAUD

“Por um Teatro Abortado” (Cahiers Du Sud, 1927).

“O Sonho de Strindberg” (creio que de 1928) foi


incluído no programa por ocasião das apresentações de
“Sonho ou Jogo de Sonhos” pela primeira vez em Paris com
mise-en-scene de Artaud.

“O Teatro Alfred Jarry” em 1930: nova bruchura.

“Projeto de Encenação para A Sonata dos Espectros


de Strindberg” (segundo o editor texto provavelmente de
1930).

“Conferência Apócrifa” (1931).

Vários outros textos curtos e cartas datadas de 1930 a


1936.
Desenvolvo interesse especial pelos textos:

“Na Poesia”, “O Umbigo dos Limbos”, “O Pesa-Nervos”, “Quem, no seio...”, “A Vidraça do


Amor”, “Excursão Psíquica”, “Um Pintor Mental”, “Está na Mesa”.

No começo dos anos 30, uma série de ensaios transforma-se em “O teatro e seu duplo”.

“Sobre o teatro balinês” é de 1931: os atores tornavam-se hieróglifos animados.

“Correspondência a Jacques Riviere” (1924): as palavras não conseguem capturar a vida.


Há “um secreto impulso físico que é a Fala anterior à palavra”

E vários outros textos:

“A encenação e a metafísica”, de 1931

“Teatro oriental e ocidental”, de 1935, onde postula uma linguagem encantatória.

“Dois manifestos do teatro da crueldade” – de 1932 e 1933

O ensaio “O teatro alquímico”, de 1932

“Chega de obras-primas”, de 1933.


Pode-se dizer que a TRANSMISSÃO DE ARTAUD foi circunscrita pelo termo
“crueldade”.

No entanto, concordo com Marvin Carlson quando diz: “Derramamentos de sangue e


carnes martirizadas constituem um aspecto insignificante da questão. A crueldade é um
rigor cósmico, uma intenção e decisão implacáveis, uma determinação irreversível e
absoluta que subjugam tanto o torturador quanto o torturado” (Carlson: 381).

NÃO SE TRATA DA REPRESENTAÇÃO DA VIOLÊNCIA MAS DE UMA CONDIÇÃO.

Embora o signo da violência esteja em cena, não é ele, o signo, que sustenta a
crueldade Artaudiana – e sim uma corporificação, um atravessamento do corpo por este
algo que está para além da linguagem e que ele postula como “vida”.

Porque ele articula esta “vida” ao “mal” seria uma questão bem interessante para se
investigar:“a forma turbulenta do poder criador, um impulso irracional cuja lei permanente
é o mal”.

Segundo Carlson, Artaud sugere a Vontade cruel e sombria de Schopenhauer ou o


espírito dionisíaco de Nietzche. Mas não havendo a libertação mística sugerida por
Schopenhaauer, nem Artaud postulando uma contraposição apolínea, a única tarefa do
teatro seria “revelar o âmago da treva da própria vida” (Carlson: 381).
Em “O teatro e a peste”, de 1933, o teatro é associado a
uma praga libertadora (Carlson: 381) – que exige um
“mergulho no abismo da crueldade” e que “desencadeia
poderes e possibilidades sombrias” (Carlson: 381).

Em 1936 o teatro como duplo “da vida”, da metafísica,


da praga, da crueldade. Em “O Teatro Alquímico” (1932) –
ele diz ser a finalidade da alquimia e outras ciências ocultas.
Em “Um atletismo afetivo”, de1936, o corpo aparece como
o duplo de um espectro plástico inacabado.
A obra de Artaud implica inúmeros deslocamentos,
onde a teoria se rearranja com novas proposições –
sempre atrás de algo que não se pega, que não se
encontra no texto, que está mais além do que ele
pode teorizar.

O paradoxo é que do seu fracasso se fez sucesso


quando tornou-se um ícone do teatro
contemporâneo – e a sua teoria, mesmo cheia de
deslocamentos, uma espécie de ressonância. “Pelo
hieróglifo de um hausto posso encontrar outra vez
a ideia de um teatro sagrado” (Carlson: 382).
Em um poema de 1947 (“O
teatro e a ciência”): O teatro
“não é um desfile cênico onde
se desenvolve o mito, mas um
cadinho incendiado” onde “pelo
esmagar de ossos, membros e
sílabas, os corpos se
reconstituem” (Carlson: 382).
DESENHOS DE ARTAUD
BIBLIOGRAFIA

ARTAUD, A. Linguagem e Vida. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2011.


ARTAUD, A. O Teatro e seu Duplo. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 2006.
ARTAUD, A. Eu, Antonin Artaud. São Paulo: Assírio Alvim, 2007.
ARTAUD, A. Van Gogh, O Suicidado da Sociedade. Lisboa, Assírio Alvim, 2004.
CARLSON, M. Teorias do Teatro. São Paulo: UNESP, 1997.
MIRALLES, A Novos rumos de teatro. Rio de Janeiro: Salvat Editora, 1979.
ROUBINE, J. Introdução às grandes teorias do teatro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.
QUESTÕES DESENVOLVER

-RELAÇÃO DE ARTAUD COM NITZCHE E SHOPENHAUER.

- PORQUE A AFRONTA CONSTANTE NESTES MOVIMENTOS TODOS À SOCIEDADE BRUGUESA E SEUS


VALORES? QUE CONTEXTO HISTÓRICO É ESTE? QUE SOCIEDADE É ESTA QUE SE ESTÁ ATACANDO DESDE
1896?

- A QUESTÃO DA INTERNAÇÃO E DIAGNÓSTICO DO ARTUAD É REALMENTE IMPORTANTE? POR QUE? POR


QUE INDEPENDENTE DE QUALQUER DIAGNÓSTICO NÃO RECONHECER ARTAUD COMO UM HOMEM (NO
SENTIDO FILOSÓFICO DO TERMO) QUE VIVEU NA CARNE AS SUAS PALAVRAS – E COM ISTO CONSEGUIU
TRANSMITIR ALGO DA ORDEM DO CÊNICO E SUA ESPECIFICIDAE?

- A QUESTÃO DA VISUALDADE DA PERFORMANCE E TEATRO PÓS-DRAMÁTICO, ELA DÁ CONTA DO PROJETO


ARTAUDIANO? SERIA A SUA CONCRETIZAÇÃO?

- QUANDO ARTAUD CRITICA “A MODA RUSSA” É O ABSTRACIONISMO MEYERHOLDIANO QUE ESTÁ


CRITICANDO?

- QUANDO ELE JUNTA CIRCO E METAFÍSICA, QUE POÉTICA CÊNICA ESTÁ ELABORANDO?

- O FATO DO TERMO “TEATRO DA CRUELDADE” NÃO ESTAR SE REFERINDO À UMA REPRESENTAÇÃO DA


VIOLÊNCIA EM CENA IMPLICA O QUÊ? QUAL É A IDEIA DE CRUELDADE EM ARTAUD?

- HÁ UMA POSSÍVEL ARTICULAÇÃO ENTRE ARTAUD E STANISLAVSKI NO QUE SE REFERE AO CONCEITO DE


“ESPÍRITO” ou “ALMA” DO ARTAUD – E AS DIFERENTES PROPOSTAS DE TREINAMENTO PARA A CONSTRUÇÃO
DE UM “ESTADO CÊNICO”?

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