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História da Fotografia

© Profa. Dra. Silvana Louzada


História da Fotografia
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CAPÍTULO 1: Os pioneiros. Os primeiros processos, os principais inventores da fotografia e a


evolução tecnológica:

 A fotografia é oficialmente apresentada na academia francesa em 1839, mas a descoberta é


um fenômeno simultâneo em várias partes do mundo.
 É a primeira imagem técnica – linhagem de imagens que abarca desde o cinema até as imagens
digitais. Sua invenção representou uma transformação na subjetividade humana. Sua invenção
é o coroamento do acúmulo de conhecimento em diversas áreas, como a física ótica, a química
e também as artes.
 A câmera obscura é o marco mais importante para seu desenvolvimento – todas as câmeras
inventadas, inclusive as mais avançadas, aplicam o princípio da câmera obscura: referências no
século V a.C. na China e também na Grécia com Aristóteles (384-322 a.C.), que teria desenhado
os primeiros esquemas. O sábio árabe Al Haytham, o Alhazem, (965-1038) deu um passo
fundamental para a compreensão dos processos óticos e há registros de que tenha utilizado a
câmara escura no início do século XI.
 A câmera obscura era utilizada para observação de eclipses solares na Europa no século XII.
Incorporada no Renascimento foi utilizada por Leonardo da Vinci que criou o método pictórico
“perspectiva artificialis” – perspectiva hierarquizada e proporcional – representa cena
tridimensional em superfície bidimensional.
 O objeto externo projeta sua imagem, através de um orifício, invertida e de cabeça para baixo,
sobre superfície oposta em um quarto fechado, por isso era utilizada como guia para
desenhistas.
 Desenhistas observaram que quanto menor o orifício a definição era maior (menores os cones
de luz ou “círculos de confusão”), porém as imagens ficavam mais escuras. Maior orifício
significava menor definição.
 Século XVI passa-se a utilizar uma lente no orifício para convergir os raios de luz,
transformando os círculos de confusão em pontos e, portanto, obtendo uma imagem com mais
definição.
 Com esse problema ótico solucionado persistia a impossibilidade de imprimir a imagem
formada dentro da câmera escura.
 Por volta de 1725 o alemão Johann Heinrich Schulze (1687 –1744), fez experiências sobre as
propriedades químicas dos sais de prata e sua reação à exposição à luz. Em 1802 o inglês
Thomas Wedgwood (1771-1805) experimentou gravar imagens utilizando papel com nitrato de
prata e expondo ao sol.
 Em 1826 o litógrafo francês Josef Nicéphore Niepce desenvolveu a heliografia1 ou
heliogravura: para reproduzir suas imagens utilizava uma placa de metal coberta com betume-
da-judéia, que endurecia ao ser atingido por raios solares. A primeira imagem obtida por ele
que se conservou, da janela de sua casa, precisou de oito horas de exposição. Um passo muito

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Hélio em grego significa Sol. Heliografia, portanto, é a escrita com o sol.

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importante para o processo fotográfico. Mas Niépce não foi o único. Há um grande número de
relatos de experiências similares e simultâneas em diversos países.
 Em Paris, Louis-Jacques-Mandé Daguerre (1787 - 1851) se torna conhecido com sua invenção,
o “diorama” - painéis translúcidos, pintados por intermédio da câmera escura, que produziam
efeitos visuais (fusão, tridimensionalidade) mediante iluminação controlada por trás deles.
 Quando tomam conhecimento um do outro Niépce e Daguerre passam a manter
correspondência sobre seus trabalhos. Em 1829 firmam acordo para compartilhar seus
conhecimentos secretos e aperfeiçoar a heliografia, mas a sociedade não funciona.
 Após a morte de Niépce, Daguerre descobre que uma imagem latente (quase invisível), que
podia ser revelada com o vapor de mercúrio, reduzindo o tempo de exposição para 10 a 20
minutos.
 Em 19 de agosto de 1839, Daguerre apresenta na Academia de Ciências e Belas Artes de Paris
seu processo, chamado de daguerreotipia. O governo francês compra o processo e o doa ao
mundo, com restrição de uso na Inglaterra. Marca oficialmente o início do processo
fotográfico, porém não é o primeiro nem o único.
 Em 1932 o francês Hércules Florence, radicado no Brasil, já imprimia diplomas maçônicos e
rótulos de farmácia expondo-os ao sol em contato com papéis sensibilizados com cloreto de
ouro, processo que batizou de Photographie.
 Na Inglaterra, Willian Henry Fox-Talbot usava a câmera escura para desenhos em viagens. Com
o daguerreótipo proibido em seu país busca impressionar quimicamente o papel. Obtém uma
imagem negativa, fixada em sal de cozinha e submetida a contato com outro papel sensível.
Assim a cópia apresentava-se positiva sem inversão lateral.
 As imagens de Talbot eram pequenas (2,50cm²) e sem detalhes se comparadas com a
heliografia de Niépce (25x55cm), obtida nove anos antes. A lentidão, o pequeno tamanho e a
falta de detalhes não atraem o público que prefere o daguerreótipo. Mas sua invenção é de
grande importância, por inaugurar o processo negativo/positivo, que permite a realização de
cópias idênticas, impossíveis no daguerreótipo.
 A falta de detalhes deve-se à falta de transparência do papel, utilizado porque não era ainda
possível “grudar” a substância fotossensível a uma superfície com mais transparência, o vidro.
 Em 1847 Abel Niépce da Saint-Victor (primo de Nicéphore Niépce), descobre que a clara de
ovo, ou albumina, era adequada para fazer o material fotossensível aderir ao vidro. O método
proporciona grande precisão de detalhes, mas com exposição de cerca de 15 minutos. As
placas podiam ser guardadas durante 15 dias.Em 1848 o inglês Frederick Scott Archer (1813-
1857) inventa o processo de colódio úmido, difundido a partir de 1851. O colódio (éter e álcool
numa solução de nitrato de celulose) é a substância ligante que faz o nitrato de prata
fotossensível aderir à chapa de vidro, gerando a base de um negativo. A exposição deve ser
realizada com o negativo ainda úmido que é revelado imediatamente. O processo dominou a
segunda metade do século XIX, produzindo negativos bem mais nítidos e com maior gradação
tonal do que os negativos de papel.
 Em 1871 surgem as placas secas criadas por Richard Leach Maddox (1816-1902), de manuseio
muito mais fácil. A partir da década de 1880 as placas secas substituem definitivamente o

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colódio úmido. O novo processo permite que o fotógrafo compre as placas prontas e impõe a
necessidade do obturador, já que a velocidade da emulsão deste processo permite exposições
curtas, de 1/25 seg.
 Assim, chega ao fim o processo artesanal e a fotografia entra na era industrial, que será
definitiva a partir da invenção da câmera Kodak, que veremos.

Foto feita por Nicéphore Niépce em 1826, da janela de sua casa.

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CAPÍTULO 2: O progresso tecnológico e as transformações da linguagem

 Como foi visto, a pobreza de detalhes das fotografias de Talbot devia-se à falta de
transparência do papel, utilizado porque não era ainda possível “grudar” a substância
fotossensível a uma superfície com mais transparência, o vidro.
 Em 1847 Abel Niépce de Saint-Victor (primo de Nicéphore Niépce), descobriu que a clara de
ovo, ou albumina, era adequada para fazer o material fotossensível aderir ao vidro. O método
proporcionava grande precisão de detalhes, mas com exposição de cerca de 15 minutos. As
placas podiam ser guardadas durante 15 dias.
 Em 1848 o inglês Frederick Scott Archer (1813-1857) inventou o processo de colódio úmido,
difundido a partir de 1851. O colódio (éter e álcool numa solução de nitrato de celulose) é a
substância ligante que faz o nitrato de prata fotossensível aderir à chapa de vidro, gerando a
base de um negativo. A exposição deve ser realizada com o negativo ainda úmido que é
revelado imediatamente. O processo dominou a segunda metade do século XIX, produzindo
negativos bem mais nítidos e com maior gradação tonal do que os negativos de papel.
 Em 1871 surgiram as placas secas criadas por Richard Leach Maddox (1816-1902), de manuseio
muito mais fácil. A partir da década de 1880 as placas secas substituíram definitivamente o
colódio úmido. O novo processo permitia que o fotógrafo comprasse as placas prontas e impôs
a necessidade do obturador, já que a velocidade da emulsão deste processo permitia
exposições curtas, de 1/25 seg.
 A fotografia entrava na era industrial.
 Em 1877, o americano George Eastman lançou no mercado a película emulsionada em rolo,
fina e transparente, feita com nitrato de celulose, com capacidade para 100 fotografias.
 Em 1888, fundou a empresa Kodak e lançou também uma câmera portátil, a Kodak nº 1. Ao
terminar o filme ele era mandado para a fábrica onde era revelado e copiado. O cliente recebia
de volta a câmera carregada com um novo filme e as 100 fotografias montadas em papel-
cartão.
 A fotografia, que era exclusividade dos profissionais, foi popularizada. A invenção de Eastmam
mudou totalmente a forma de se praticar fotografia, o público que dela fazia uso e a
desfrutava.
 Com a Kodak número 1 surgiu também a fotografia amadora. As famílias podiam fazer seus
próprios retratos, o fluxo de imagens e a sua circulação se transformou. O cidadão comum
podia criar sua própria narrativa visual do mundo. A prática da fotografia amadora no âmbito
familiar possibilitou transformações no regime de visualidade.
 No campo profissional também aconteceram importantes transformações na década de 1880.
Em 1882 Georg Meisenbach patenteou a autotipia, processo em que a figura é reproduzida
através de uma retícula ou malha de vidro, fragmentada em pontos de vários tamanhos, de
acordo com as diversas tonalidades da imagem. Grava-se então o clichê, composto de pontos
em alto relevo, correspondentes às áreas escuras da imagem. A técnica permite a publicação

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na mesma página de texto e fotografia, ou seja, a montagem dos clichês juntamente com os
blocos de texto, provocando uma verdadeira revolução na imprensa.
 Antes a foto tinha que ser publicada separada do texto ou reproduzida por meio de gravura em
pedra (litogravura) ou em madeira (xilogravura). O gravador podia interferir modificando a
foto.
 O processo é conhecido como meio-tom ou halftone.
 Como na fotografia, diversos foram os prováveis inventores do processo. Alguns dos nomes
relacionados ao invento são Carl Carleman e Frederic Eugene Ives. Mais importante do que
saber quem inventou a técnica é perceber a década de 1880 como momento singular de
esforços no sentido de transpor a fotografia para a página impressa juntamente com o texto.
Quatro décadas depois do anúncio da invenção da fotografia foi finalmente possível reproduzi-
la de forma direta na imprensa.
 Para parte dos historiadores da fotografia a primeira foto publicada por autotipia que se tem
notícia é “Shantytown, o bairro de lata”, em 4 de março de 1880 no Daily Graphic de Nova
Iorque. Outros situam a publicação inaugural nove anos antes, em junho de 1871, no jornal
sueco Nordisk Boktryckeri-Tidning.
 Esse pode ser considerado o início do fotojornalismo, onde a publicação conjunta de foto e
texto dá mais credibilidade e dinâmica aos periódicos.
 A fotografia experimentou nas últimas décadas do século XIX mudanças significativas
tecnológicas e na sua veiculação, além de atingir um público que até então não tinha pleno
acesso ao consumo e produção da imagem.

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CAPÍTULO 3: A conquista do invisível: o instantâneo

 No capítulo anterior tratamos das inovações tecnológicas no suporte fotográfico (filmes) e na


forma de difundir a fotografia e do surgimento da Kodak nº 1 e o consequente surgimento da
fotografia amadora e de um novo regime de visualidade e de transformações importantes na
construção da memória visual que aconteceram no final do século XIX.
 A evolução tecnológica avançou provocando mudanças na produção e circulação de imagens.
As primeiras décadas do século XX foram fundamentais para o surgimento de uma cultura
visual baseada na imagem técnica.
 A evolução das câmeras foi significativa: em 1924 surgiu na Alemanha a Ermanox
(primeiramente chamada de Ernox), uma câmera pequena e com uma lente anastagmática
muito clara ( f 1.8) e que trabalhava com negativos de vidro de placas secas pancromáticas de
6×4.5cm. Com essa câmera era possível fotografar em condições de luz muito adversas e, por
seu tamanho reduzido, sem que o fotógrafo fosse percebido.
 Os mais famosos adeptos da Ermanox foram Erich Salomon e Felix Man
 Salomon nasceu em uma rica família de banqueiros alemães. Entre a I e a II Guerra
enfrentaram dificuldades financeiras. Erich havia estudado direito mas foi trabalhar em uma
editora, fiscalizando a colocação de cartazes de propaganda em edifícios. Usava a fotografia
para registrar o não cumprimento do contrato. A partir de um acidente passou ele mesmo a
fotografar e se dedicou à imprensa.
 Por ser de uma classe social mais elevada do que os fotógrafos em geral teve acesso aos altos
círculos políticos e intelectuais.
 Suas fotos tinham uma naturalidade inédita e costumava fotografar sem ser percebido, usando
toda forma de artifícios.
 Com a ascensão do nazismo foi perseguido e morreu em Auschwitz.
 É considerado o “pai” do fotojornalismo moderno.
 A outra câmera fundamental para a transformação da linguagem fotográfica utilizando
negativo 35 mm é também de origem alemã.
 A primeira câmera 35 mm foi a Leica Ur, inventada por Oskar Barnack em 1914, apresentada
ao público em 1925 na Feira Internacional de Leipzig, Alemanha. Batizada de Leica I tinha lente
fixa com plano focal de 50 mm e abertura f/3.5. Em 1930 a fábrica alemã produziu a primeira
câmera 35 mm com lente recambiável, mas foi em 1954, quando surgiu a Leica M3 que
ocorreu a grande transformação no conceito de câmeras fotográficas. A M3 aceitava, além da
lente 50 mm as lentes 90 e 135 mm (teleobjetivas).
 A Leica contava ainda com o visor telemétrico. Diferente do sistema reflex utilizado
atualmente, o visor telemétrico trabalha com outro conceito, onde o fotógrafo jamais perde o
contato com o objeto fotografado, mas por outro lado não vê no visor exatamente o que
fotografa (efeito paralaxe).
 O visor telemétrico (rangefinder) está diretamente ligado ao conceito de “momento decisivo”
formulado por Henri Cartier-Bresson: como nessa câmera o fotógrafo vê a cena por um visor
independente da objetiva, nunca perde o contato com o objeto fotografado, como acontece
nas câmeras reflex.

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 Como não tinha espelho, a Leica M podia ser utilizada em baixa velocidade, de até 1/15s, sem
perigo de tremer a foto. Também não havia o barulho que este componente faz ao se deslocar.
 Com essas novas câmeras o fotógrafo se livrava do equipamento pesado, podendo se colocar
em qualquer lugar carregando apenas o compacto equipamento.
 A liberdade não se restringia aos inéditos pontos de vista conquistados.
 Com o filme de 36 poses, a claridade e variedade das lentes recambiáveis, era possível realizar
mais fotografias e captar situações antes impossíveis, invisíveis para o olho humano.
 A partir do momento em que foi possível captar um instantâneo a capacidade visual foi
ampliada. O que a câmera vê vai além do que o olho humano enxerga e o ponto de vista do
fotógrafo muitas vezes é inédito.
 O instantâneo fotográfico é uma aquisição tecnológica, uma fração de tempo não perceptível
para o olhar humano. A visão humana tem uma capacidade relativamente baixa de “separação
temporal” já que para a mente é impossível distinguir o encadeamento de imagens que se
movem numa velocidade superior a 1/10 segundos
 Para congelar a imagem é preciso aumentar a velocidade do obturador de uma forma
proporcional ao movimento do objeto.
 Por isso o instantâneo captado pela câmera fotográfica é invisível para o olho humano. Ao
tornar o invisível visível, a fotografia engendra uma nova visualidade.
 O instantâneo fotográfico inseriu a fotografia na modernidade, possibilitou o rompimento com
a tradição imagética anterior e influenciou a visualidade comunicacional e artística.
 As diversas expressões fotográficas do século XX que veremos nos próximos capítulos são
tributárias da liberdade proporcionada pelas câmeras compactas e rápidas.

Câmera Leica

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CAPÍTULO 4: A descoberta fotográfica do mundo, o exotismo e a fotografia de guerra:

 Guerras sempre despertaram o interesse da humanidade.


 A partir do século XIX os conflitos se tornaram massivos e passaram a ser acompanhados pelo
público em fotografias publicadas na imprensa e por outros meios de circulação, como os
cartões fotográficos. Foi estabelecido um fluxo de fotografias sensacionais.
 A guerra Mexicano-Americana (1846) foi a primeira em que os jornais enviaram
correspondentes. Um fotógrafo anônimo realizou uma série de daguerreótipos de soldados e
oficiais.
 Fotografia se tornou um elemento formal na organização militar: em 1856 foi formada uma
seção fotográfica na Telegraphic School da Royal Engeneers na Inglaterra. A partir de 1861
cada brigada francesa treinava um oficial para ser fotógrafo. Na década de 1870 a câmera
começou a ser usada também para copiar mapas, treinar recrutas e registrar experimentos
bélicos.
 A Guerra da Criméia (1853 a 1856) inaugurou definitivamente o registro fotográfico dos
conflitos.
O jornal britânico The Times publicou uma série de artigos relatando a situação precária dos
soldados ingleses na Criméia. A opinião pública ficou contra a guerra e o governo lançou uma
campanha de propaganda para defendê-la.
 Roger Fenton foi contratado pelo governo inglês para fotografar a guerra e realizou cerca de
360 fotografias que mostravam uma visão limpa do conflito, com toques de romantismo e
aventura, cenas bem ordenadas, sem cadáveres e com fartos mantimentos. Transformou uma
carroça em laboratório e revelava em pleno campo de batalha. O trabalho de Fenton na
Criméia inaugurou a utilização da fotografia na propaganda de estado apresentando a versão
oficial dos conflitos. A fotografia passou a ser usada como prova, testemunho a serviço de
quem contratava o fotógrafo.
 A técnica fotográfica disponível não permitia o registro da ação, mas não impossibilitava o
registro dos horrores da guerra, evitados por Fenton.
 Outros fotógrafos estiveram na Guerra da Criméia e realizaram um registro mais livre: James
Robertson, o primeiro a fotografar mortos em combate, e Felice Beato (1830-1906). Além
deles o romeno Karl Baptist von Szatmari e o francês Jean-Charles Langlois. A partir daí
praticamente todas as guerras foram fotografadas.
 A fotografia de guerra levava ao público uma série de sensações novas, também despertadas
pelas imagens de lugares distantes que inúmeros fotógrafos viajantes europeus realizaram.
 Beato era um deles e depois da Guerra da Criméia (1855) fotografou a Rebelião Indu (1858) e a
Expedição Militar Anglo-Francesa na China. Em 1863 viajou através do Japão fotografando e
vendendo as imagens. Produziu dois álbuns: "Native Types" e "Views of Japan", com cem
fotografias cada um. Em "Native Types" as fotografias são pintadas à mão, característica da
fotografia japonesa do século XIX.
 Trabalhou também em estúdio e tinha fotografias avançadas, como "Girl in Heavy Storm" (cuja
autoria é discutida entre Beato, Stillfried e Kusakabe Kimbei). A foto é referência para a história
da fotografia. Passa a sensação de vento forte suspendendo as pontas do quimono com fios

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invisíveis. O negativo de vidro foi riscado para criar a impressão de chuva. A concepção desta
foto é avançada para a época.
 Beato documentou o cotidiano e realizou imagens impressionantes como o de um homem
crucificado e a encenação de uma decapitação.
 A limitação tecnológica não impossibilitava mostrar o horror da guerra. O fotógrafo veiculava
as imagens através de gravuras e vendia álbuns e fotografias soltas.
 O quarto conflito documentado por uma câmera foi a Guerra de Secessão Norte-americana,
outro importante marco no registro sensacional dos conflitos.
 Fotógrafos dos dois lados viram no conflito a oportunidade de ampliar seu mercado.
 As primeiras imagens são de George S. Cook (1819-1902), mas apenas um fotógrafo, Andrew J.
Russel (1830-1902) foi pago pelo governo dos EUA.
 Alguns dos mais importantes fotógrafos foram Mathew Brady (1823-1896), Alexander Gardner
(1821-1882), Timothy O`Sullivan (1840- 1882) e George N. Barnard (1814-1902).
 As imagens da guerra que circulavam em cartões e eram reproduzidas por gravuras em vários
periódicos criando uma crônica visual do conflito.
 Fotografias de líderes como Abraham Lincoln e outros eram populares. As famílias
encomendavam fotos dos soldados que também levavam as fotografias de seus parentes para
o campo de batalha. Mais de 1400 fotógrafos fizeram imagens de soldados individualmente,
das tropas, instalações militares e campos de batalha. Os negativos eram revelados no campo
e depois enviados para os estúdios para serem feitas as impressões. Estúdios fotográficos eram
montados no campo de batalha.
 Mathew Brady é o mais conhecido fotógrafo da Guerra de Secessão. Fotografou soldados
individualmente ou em grupos. Tinha tradição de retratista: Em 1850 publicou The Gallery of
Illustrious Americans, com fotografias de políticos que militavam em lados opostos, o que lhe
deu fama.
Antes do início da Guerra Civil já tinha mais de 10 mil fotografias de celebridades, inclusive
presidentes como a do presidente norte-americano Abraham Lincoln, tirada em 1860. Vendeu
cópia das fotos de Lincoln para vários periódicos. A maior parte das pessoas jamais vira Lincoln,
e durante a campanha presidencial corriam boatos de uma suposta doença. A foto disfarça a
aparência debilitada do futuro presidente. Posteriormente foi usada em moedas e na nota de 5
dólares.
George N. Barnard, que trabalhou com Brady, publicou Photographic Views with Sherman’s
Campaign (1866) mostrando a destruição metódica das ferrovias sulistas pelas tropas do norte.
 Neste momento começa a colocar-se a questão do reconhecimento autoral: Timothy
O’Sullivan (1840-1882) deixou o estúdio de Brady em 1862 para trabalhar com Alexander
Gardner (1831-1882) porque ali tinha crédito em suas fotos. O’Sullivan assinou The Harvest of
Death no album Photographic Sketchbook of the Civil War, de Gardner.
 A fotografia transformou profundamente a percepção da guerra, que cada vez mais será
retratada em todo seu horror, estabelecendo um fluxo de imagens sensacionais que marca
profundamente as gerações posteriores.

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Alexander Gardner, Home of a Rebel Sharpshooter (5 de julho de 1863)

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CAPÍTULO 5: Usos variados da fotografia no século XIX:

 A expansão global européia e norte-americana ajudou a disseminar a prática fotográfica e,


apesar das dificuldades inerentes ao equipamento e limitações técnicas, a fotografia se tornou
uma importante ferramenta de informação.
 Em 1839 John Herschel queria incluir equipamento fotográfico na expedição britânica à
Antártica, mas não conseguiu. Em 1842 Edward Anthony acompanhou uma missão norte-
americana às fronteiras nortes dos EUA e Canadá – não resta nenhum desses daguerreótipos.
 A câmera se transformou em importante símbolo da era da exploração.
 Ainda em 1839 François Arago usou a fotografia para copiar hieróglifos em antigas construções
no Egito
 O Egito foi um dos primeiros atrativos para os daguerreotipistas que correspondiam à
demanda novecentista pelo pitoresco, mantendo uma estética semelhante à pintura.
 As regiões do Oriente Médio atraíam pelos monumentos antigos e locais bíblicos.
 Pierre-Gustave Joly de Lotbinière (1798-1865) foi o primeiro a fotografar a Acrópolis, em 1839.
Fez uma série de daguerreótipos na Grécia, Egito e Terra Santa. Seu trabalho se tornou base
para as águas-fortes publicadas pelo arquiteto e egiptologista Hector Horeau no Panorama do
Egito e Núbia (1841)
 Nöel Marie Paymal Lerebours (1807-1873) também se baseou em daguerreótipos de anônimos
e adquiridos de fotógrafos contratados para publicar Excursions Daguerriennes representant
les vues et les monuments les plus remaquables du globe (1840-44) com o total de 114 vistas
da Europa, África e América. Dentre os mais importantes estavam a vista de Propylaea e o
portão da Acrópolis ateniense tomada por Lotbiniére.
 A autoria nem sempre era creditada a quem executava o clique – o arranjo da cena e
iluminação eram mais importantes. Exemplo: o escocês David Octavius Hill organizava a cena e
Robert Adamson executava a fotografia.
 A Terra Santa foi outro destino escolhido pelos primeiros fotógrafos e uma das primeiras
tentativas de usar a fotografia como meio de persuasão: Alexander Keith encomendou ao seu
filho o médico escocês George Skene Keith (1819-1910) uma série de daguerreótipos que
comprovariam a veracidade da Bíblia. A primeira edição tinha desenhos e a segunda, de 1844,
trazia cerca de 30 daguerreótipos tirados por George Keith acompanhados de citações bíblicas.
 Mas nem todos os fotógrafos ocidentais se centraram em paisagens bíblicas: francês Joseph-
Philibert Girault de Prangey (1804-1892) enfocou a arquitetura islâmica.
 Máxime Du Camp (1822-1894) também era estudioso da cultura islâmica e viajou com o
escritor Gustave Flaubert pelo Egito, Núbia e Terra Santa, financiados pelo governo francês. Du
Camp fez mais de 200 negativos de papel. Publicou um volume com 125 imagens realizadas na
viagem de três anos (1849-1851). Ao contrário dos álbuns ilustrados com gravuras ou águas-
fortes baseadas em fotografias, o de Du Camp continha cópias fotográficas.
 Outro fotógrafo viajante, John B. Greene (1832-1856), foi um dos primeiros arqueólogos a usar
a fotografia no seu trabalho. Parte do seu trabalho foi publicada em Le Nil: paysage,
explorations photographiques (1854).

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 Os álbuns passaram a ser organizados criando uma narrativa em forma de sequências


fotográficas. As séries fotográficas trabalhavam com a noção da fotografia como escrita de
uma determinada narrativa através da inter-relação das imagens, o que seria desenvolvido no
século seguinte com o ensaio fotográfico.
 Aos poucos a fotografia passa a ser percebida como um trabalho intelectual e a cria-se uma
diferenciação entre profissionais e amadores avançados de um lado e praticantes itinerantes
de outro.
 Os EUA promovem também o reconhecimento de seu próprio terreno e vários fotógrafos que
atuaram na Guerra Civil registram o interior do país. As fotografias do oeste americano eram
ao mesmo tempo científicas, comerciais, políticas e de entretenimento.
 Alguns nomes: Gardner, O’Sullivan, Carleton E. Watkins, Willian Henry Jackson, e Eadweard
Muybridge.
 Muybridge fez sua primeira viagem a Yosemite em 1867. Acrescentava nuvens e brilho da lua
em laboratório. Diminuía a exposição do céu para poder registrar as nuvens, dando mais
dramaticidade.
 A fotografia também foi usada para conhecer coisas fora da Terra assim como para conhecer
melhor seus habitantes.
 Ainda como consequência da guerra Civil Norte-americana vários fotógrafos registraram os
povos indígenas, inclusive os que eram tomados prisioneiros ao guerrear contra o invasor
branco.
 Louis Heller (1839-1928) fotografou prisioneiros da tribo Modoc na Califórnia (Modoc War),
Muybridge também fotografava as tropas e enviava para Washington para mostrar as
dificuldades das tropas. Alexander Gardner fotografou encontros entre chefes e autoridades
norte-americanas. W. h. Illingworth (1842-1893) acompanhou o trem que levou o futuro
general Custer para o oeste distante.
 A proximidade da guerra com as cidades expôs as necessidades dos soldados e os mutilados. A
venda de fotografias de paisagens e indivíduos famosos ajudava o governo a levantar fundos
para a Comissão Sanitária.
 A fotografia também foi usada para registrar os ferimentos de guerra para fins de estudo
médico. O Medical Museum de Wahington colecionou mais de 1000 gravuras baseadas em
fotografias de mutilados.
 A microfotografia e a fotografia espacial para fins científicos também se desenvolveu. Em 1873
o cientista francês Jules-Bernard Luys (1828-1897) publicou L’iconographie photographique dês
centres nerveux.
 A fotografia telescópica teve um desenvolvimento menos acelerado. Lewis M Rutherfurd
(1816-1892) realizou uma fotografia da lua em 1865. Juntamente com um engenheiro e um
astrônomo publicou em 1874 The Moon, Considered as a Planet, a World, and a Salellite,
gravuras baseadas em fotografias de modelos feitos a partir de observações telescópicas. Em
1874 cientistas alemães, britânicos e franceses competiam para fotografar Vênus.
 Em 1872 Muybridge conseguiu captar o movimento de um cavalo operando máquinas
fotográficas. Financiado por um empresário construiu um dispositivo com 24 câmeras consegui

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fotografar o cavalo com as quatro patas no ar, o que era motivo de controvérsia, uma vez que
o olho humano não tem capacidade de perceber movimentos tão rápidos.
 O fisiologista francês Étienne-Jules Marey (1830-1904) estudava o movimento dos corpos e, ao
tomar conhecimento dos experimentos de Muybridge, passou a utilizar a fotografia nas suas
pesquisas. Utilizava uma única câmera e inventou o fuzil fotográfico em 1882 –
aperfeiçoamento do revólver fotográfico criado em 1876 pelo astrônomo Janssen. Era capaz
de captar 12 quadros por segundo em uma mesma película.
 Desenvolveu a cronofotografia de placa fixa, passando a utilizar placas móveis, e depois rolos
de película Kodak. Registrava 60 imagens por segundo.
 A fotografia percorreu no século XIX caminhos que foram do distante oriente até os astros,
passando pelo registro da subjetividade humana e figurando imagens que são não apenas
distantes, mas até impossíveis de serem vistas pelo ser humano.

Eadweard Muybridge – 1872

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CAPÍTULO 6: A fotografia nas ciências, o encontro do outro e a auto-representação:

 Fotografia foi usada no século XIX para fins topográficos, científicos (geologia, biologia
astronomia, química) e nas ciências sociais. Contribuiu para o ambiente positivista.
 Também foi utilizada para fins policiais, tanto para identificação como para evidências
criminais. A partir de 1870 serviu para a polícia identificar os membros da Comuna de Paris.
Tinha o estatuto de prova, o senso de autenticidade não apenas na guerra, nas ciências e
terras exóticas, mas também nos retratos do dia a dia.
 Eventos e personalidades passam a ser figurados para o público.
 As pessoas comuns também podem ser figuradas: retrato, antes exclusividade dos nobres, se
torna acessível à burguesia. Os principiais retratistas atendiam aos endinheirados e também
são das classes mais favorecidas, como Félix Nadar, Étienne Carjat, Gustave Le Gray, David
Octavius Hill, Robert Adamson e Julia Margaret Cameron. Um retrato de Nadar custava 100
francos.
 Em 1854 o fotógrafo André-Adolphe Disdéri (1819-1889) começou a fazer retratos no formato
cartão de visita, conhecidos como carte-de-visite. Inventou uma câmera com quatro objetivas
que produziam oito fotografias que depois eram recortadas e montadas sobre um cartão. Os
carte-de-visite eram vendidos a cinco francos, muito menos do que era cobrado por qualquer
outro fotógrafo.
 O carte-de-visite colocava a fotografia ao alcance de camadas mais baixas. A fotografia se
transformou em produto industrial, barato e popular. Surgiu uma indústria de cartões de
pessoas famosas, vendidos a preços populares.
 Ao contrário dos retratos que se concentravam no rosto, Disdéri fotografava o corpo inteiro
em cenários que definiam status, longe do cotidiano do indivíduo e perto da máscara social,
numa paródia da auto-representação em que se fundiam o realismo essencial da fotografia e a
idealização intelectual do modelo.
 A partir de 1855 Disdéri começou a retocar as fotografias, eliminando imperfeições. Foi um dos
primeiros a fazer fotografias de nus eróticos e teve êxito comercial. A fotografia atingiu um
novo patamar, popularizada e acessível.
 Na segunda metade do século XIX houve um aumento de demanda de fotos de lugares e
culturas exóticas juntamente com a busca de tornar as cenas mais reais, através de efeitos
visuais. A estereografia se popularizou, assim como as panorâmicas de até 360º.
 Aimé Civiale (1821-1893) fez panorâmicas da Itália, França, Áustria e Alpes suíços.
 Também o rosto humano era objeto dos fotógrafos. Com a popularização da fotografia e o
avanço tecnológico foi possível registrar expressões e se acreditava que poderiam revelar o
interior do ser humano.
 Guillaume Benjamin Duchenne de Boulogne (1806-1875) foi um médico francês que tratava
epilépticos, pessoas com problemas neurológicos e mentais. Publicou em 1862 Mecanisme de
la physionomie humaine acompanhado de 84 fotos de rostos estimulados por choques
elétricos. Comparava as fotografias com retratos e esculturas artísticas, como os trabalhos dos
artistas plásticos Gustave Courbet e Jean-Auguste-Dominique Ingres.

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 Charles Darwin publicou em 1872 The Expression of the Emotion in Man and Animal onde
defendia que as expressões de emoção eram inerentes a todos os humanos. Vendeu nove mil
cópias em quatro meses. Fotografava bebês por acreditar que exibiam pureza.
 Jean-Marie Charcot trabalhava com mulheres histéricas, as apresentava em público e
fotografava.
 No século XIX a fotografia era utilizada por várias ciências: geologia, biologia, botânica,
medicina, astronomia e química e pelas Ciências Sociais.
 Louis Agassiz, contrário à miscigenação racial, fotografou na Amazônia. Carl Dammann
publicou em 1875 um álbum com 600 imagens intitulado Ethnological Photographic Gallery of
the Various Races of Man. Em 1867 a Mostra Etnográfica de Moscou exibiu maquetes em
tamanho real de interiores de habitações regionais com pessoas posando ao vivo com as
roupas típicas. O governador geral britânico na Índia publicou oito volumes entre 1868 e 1875
com texto e fotografias das diversas castas.
 A exploração do exótico incluía fotografias de mulheres do Oriente Médio e Ásia em poses
sensuais.
 O orientalismo mostrava não-europeus e norte-americanos passivos, infantilizados,
afeminados e distantes do progresso histórico “ocidental”.
 Circulavam fotos sensuais com marcas de identidade étnica oriental e cartes-de-visite, postais
e albumens de atos sexuais entre homens “ocidentais” e mulheres orientais. Bruno
Braquehais, que fotografou a Comuna de Paris, fez algumas dessas imagens.
 Em 1847 C. A. Woolley (1834-1922) fotografou os últimos 46 remanescentes dos aborígines
australianos.
 John K. Hillers (1843-1925) realizou mais de 3 mil imagens do Grand Canyon e 20 mil negativos
de nativos norte-americanos.
 William Carrick (1827-1878) fotografou os vendedores de rua de São Petersburgo. No final do
século cartes-de-visite de trabalhadores maltrapilhos foram realizados em estúdios, o que
consistia na exploração imagética da pobreza. Henry Mayhew (1812-1887) publicou em 1851 o
álbum de gravuras London Labour and London Poor e teve boa vendagem.
 Fotografias de greves eram raras porque os jornais não publicavam e os pobres não
compravam.
 Thomas Annan (1829-1887) fotografou as favelas ao redor das fábricas de Glasgow antes de
serem demolidas a pedido do governo escocês.
 Charles Marville (1816-1879) fotografou Paris antes das reformas do Barão Haussmann.
 John Thomson também registrou os pobres de Londres com o ativista Adolphe Smith, o que
resultou na publicação do livro Street Life in London.
 Thomas Barnardo (1845-1905) administrava casas de acolhimento de crianças e as fotografava
“antes e depois”, exagerando na pobreza do antes.

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Carte-de -visite

Câmera para realizar Carte-de-visite.

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CAPÍTULO 7: Do pictorialismo à Straight Photography:

 A fotografia inaugurou a aura da veracidade e o seu surgimento contribuiu para que


segmentos artísticos, literários e intelectuais passassem por uma profunda reflexão,
evidenciando a concepção que o homem tinha de si próprio.
 O Renascimento já apresentava essa questão – a câmara escura apresentava uma nova
concepção do mundo, através da perspectiva central, o que provocou uma transformação na
subjetividade e no posicionamento do sujeito na tridimensionalidade percebida e na
bidimensionalidade dos suportes. A fotografia dava continuidade à sintaxe visual
renascentista, mas evidenciava a importância da luz e da sombra na representação visual.
 A fotografia foi utilizada por pintores como base do seu trabalho, mas menosprezada como
suporte artístico: Ingres usava daguerreótipos de Nadar e os considerava um produto
industrial.
 Os impressionistas franceses valorizam o efeito da luz, destacando-se Renoir (1841 — 1919). A
fotografia leva pintura a procurar outras formas de interpretação, produzir imagens que as
limitações técnicas da câmera não permitiam: baixas luzes, movimento, escala de cinzas, etc.
Manet e Toulouse Lautrec tem preferência por cenas de interiores e de movimento.
 A fotografia nasceu com caráter pictórico: os primeiros fotógrafos eram quase todos pintores.
Esta era a estética predominante na época, de fácil compreensão, com códigos estabelecidos.
A partir de meados do século XIX as tendências fotográficas procuraram dar à fotografia o
estatuto de arte. A década de 1850 marcou a entrada da fotografia na industrialização e os
fotógrafos reagiram à massificação.
 Pictorialismo: surgiu na França, Inglaterra e EUA a partir da década de 1890. Buscava dar à
fotografia o estatuto de arte. Contrapõe-se ao realismo, movimento predominante, que
buscava a verossimilhança. O pictorialis esteve em vigor até cerca de 1920.
 O pictorialismo desenvolveu técnicas baseadas em variados recursos, principalmente
químicos. O negativo podia ser manipulado com o pincel, espátula e borracha, alterando
valores tonais, suprimindo ou acrescentando pormenores, intensificando claros e escuros.
Alguns procuram suavizar o foco.
 Os resultados aproximavam mais ainda a fotografia da pintura. Movimento foi acusado de
desvirtuar a fotografia tradicional como meio de registro da realidade.
 Podemos apontar três correntes principais no pictorialismo:
 1ª) (c. 1950) – Com destaque para Oscar Rejlander – praticavam uma fotografia de caráter
alegórico, usando técnicas de fotomontagem. Faziam a combinação de vários negativos
(impressão composta) utilizada para resolver o problema do foco em diferentes planos e que
depois foi incorporada como recurso artístico. The two ways of life (1857), de Rejlander,
combina 30 negativos para produzir um tema alegórico com personagens míticos. Seguia a
estética da pintura acadêmica e reproduzia poses de figuras reco-romanas.
 2ª) destaque Henry P. Robinson – também usava fotomontagem, mas procurava ser mais
realista. Fading Away (1858) combina 5 negativos para criar imagem que simula morte de
jovem.
 3ª) fotografia de foco suave, influenciada pelo impressionismo. Destaque Peter Henry Emerson
que em 1886 lança o livro Naturalistic Photography com imagens construídas a partir das
teorias sobre a imagem fotográfica e a visão humana desenvolvidas por Henry Peach
Robinson. A fotografia deveria ser tão natural como a visão da natureza e reproduzir o olhar
humano, que tem foco seletivo, portanto com as áreas adjacentes desfocadas.

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 A expansão do pictorialismo como movimento internacional durante a primeira década do


século XX coincidiu com o período em que Alfred Stieglitz (1864 – 1946) liderava a Photo-
Secession (1902) e atuava como curador de mostras de fotógrafos americanos e europeus
dentro e fora dos Estados Unidos.
 A Photo-Secession também visava o reconhecimento da fotografia como meio de expressão
artística. Além de Stieglitz, foram fundadores Edward Steichen (1879 – 1973), John G. Bullock
(1854 – 1939), Frank Eugene (1865 – 1936), Gertrude Käsebier (1852 – 1934), Dallet Fuguet
(1868 – 1933), Joseph Keiley (1869 – 1914) e Clarence White (1871 – 1925).
 Em 1905 fundaram no número 291 da Quinta Avenida, em Nova York, a Galeria 291. Stieglitz
não expunha apenas fotografias, mas desenhos, pinturas, esculturas e objetos de artistas
como August Rodin (1840 – 1917), Henry Matisse (1869 – 1954), Marcel Duchamp (1887 –
1968), Francis Picabia (1879 – 1953) e, pela primeira vez nos Estados Unidos, Pablo Picasso
(1881 – 1973). A Galeria 291 se tornou referência para a Arte Moderna e fotografia perdeu
terreno. Entre 1910 e 1913 de 47 mostras apenas três foram fotográficas.
 De 1903 a 1917, Stieglitz edita Camera Work, revista luxuosa dedicada à publicação de
imagens e monografias de integrantes da Photo-Secession e de pictorialistas europeus como
Robert Demachy (1859 – 1938) e de fotógrafos do século XIX. A partir de 1910 a revista passou
a divulgar outras categorias de arte moderna.
 Em 1908, a Photo-Secession dominou o tradicional salão pictorialista inglês Photographic Salon
of the Linked Ring com mais da metade dos trabalhos expostos. Os pictorialistas tradicionais se
ressentiram da hegemonia norte-americana e do afastamento dos padrões estéticos e
temáticos do pictorialismo. As imagens do mundo contemporâneo destoavam das cenas
idílicas e atemporais da estética pictorialista. Outras fotos apresentavam um forte sentido
geométrico e pouca profundidade, remetendo à pintura abstrata de vanguarda, que surgia
nessa época.
 A Photo-Secession deu visibilidade internacional ao pictorialismo norte-americano e também a
representou a decadência do movimento. Na década de 1910 críticos norte-americanos
começaram a empregar o conceito de straight photography (fotografia direta) para imagens
obtidas diretamente da câmera sem intervenções posteriores. A realização de imagens de
caráter artístico explorando apenas os recursos fotográficos passa a ser valorizada.
 A partir de 1907 Stieglitz se voltou para a fotografia direta. Em 1917, dedicou o último número
de Camera Work à obra de Paul Strand, um dos principais representantes da straight
photography. O conceito passou a identificar a produção fotográfica moderna norte-americana
a partir do pós-guerra.
 Ansel Adams e Edward Weston exploraram ao máximo a condição de “pureza” da straight
photography desenvolvendo técnicas particulares de controle de tons no negativo.
 Em 1932 fundaram com Willard Van Dyke o Grupo f/64 que defendia a fotografia como arte
pura. Imagens nítidas, máxima profundidade de campo, papéis fotográficos com baixo brilho,
concentrando-se unicamente no processo fotográfico.
 f/64 é o diafragma mais fechado das objetivas que permite uma grande profundidade de
campo.
 Adam sistematizou um controle total de tonalidades de cinzas, baseado em princípios
sensitométricos, que chamou de zone system, e é considerado outro expoente máximo da
straight photography.
 Em 1913, ainda na Photo-Secession, Alvin Langdon Coburn experimentou processos artesanais
de produção. Numa exposição em Londres apresentou uma série de fotografias sob o título
New York from its pinnacles, feitas com câmaras pinhole. Ligado ao Grupo Vorticista de

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pintores abstratos, inventou uma forma de fotografar baseada no princípio do caleidoscópio.


Antecipou as imagens fotográficas sem o uso da câmara das colagens de Christian Schad
(grupo Zurich Dada), dos rayographs de Man Ray (grupo surrealista), dos photograms de
Molohy-Nagy (Bauhaus), e a angulação e composição de Alexandre Rodtchenko que serão
vistos a seguir.
 Apesar de se tratar de um período de das rupturas aparentes, o processo de conhecimento e
de desenvolvimento da linguagem fotográfica foi e ainda é feito também de continuidades.

The two ways of life (1857), de Rejlander

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CAPÍTULO 8: As Vanguardas

 Para entender a fotografia abstrata é preciso lembrar que a representação imagética no século
XIX era a continuação do olhar renascentista. O pictorialismo é o maior exemplo da ligação da
fotografia com a pintura, como foi visto no capítulo anterior.
 Uma das tentativas de fugir da representação fiel da realidade foi o construtivismo, que surgiu
na Rússia no início do século XX, momento em que também nascia a pintura abstrata.
 A revolução de 1917 teve profundo impacto nos artistas, especialmente na vanguarda. El
Lissitzky (1890-1941) arquiteto que trabalhava com várias manifestações artísticas, inclusive
fotografia, foi um dos artistas mais comprometidos. Renunciou à auto-expressão na arte e
acreditava que o papel do artista estaria ligado à indústria e ao redesenho do cotidiano. The
Constructor (1924) mostra o artista em sua nova função. Trabalhava a geometria austera da
vanguarda russa em contraposição à perspectiva renascentista.
 Alexander Rodchenko era artista plástico, escultor, fotógrafo e designer gráfico. Um dos
fundadores do construtivismo e design moderno russo, inovou nos campos da pintura,
escultura, colagem, fotografia e design. Usou o termo não-figurativismo e fez desenhos
utilizando exclusivamente compasso e régua. Trabalhou características construtivistas também
em suas fotografias.
Influenciado pela fotomontagem dos dadaístas alemães, começou suas próprias experiências
em 1923. A primeira ilustrava o poema de Vladimir Mayakovsky “About this”. Entre 1923 e
1928, Rodchenko colaborou com o poeta Mayakovsky e concebeu layouts e capas para revistas
de vanguarda Kino-fot (1922), Lef (1923-5) e Novy Lef (1927-8), criou cartazes de cinema e
imagens de propaganda geralmente com fotomontagens combinadas com tipografia
expressiva e elementos geométricos e abstratos.
Rodchenko fotografou a construção do Canal do Mar Branco (1931-33) e essas são suas fotos
menos inventivas. Fez cerca de 3 mil fotografias, algumas publicadas na edição especial de
“URSS em Construção” de 1933. Ignorou os trabalhos forçados e as centenas de mortes de
trabalhadores na construção do Canal.
 A fotografia se adequava perfeitamente às preocupações construtivistas com a tecnologia e
era a ponte ideal para a preferência do Partido Comunista Soviético por conta de suas imagens
realistas, legíveis e acessíveis às massas. A partir de 1930 as vanguardas perderam a sansão
oficial e o Partido Comunista Soviético promoveu o Realismo Socialista.
 A perseguição stalinista levou muitos artistas de vanguarda a deixar a URSS, o que ajudou a
disseminar suas idéias e influenciou movimentos como o De Stijl e a Bauhaus.
 László Moholy-Nagy (1895 – 1946), pintor, escritor e fotógrafo. Como o grupo Dadá,
privilegiava o uso de materiais e conceitos industriais e abraçou a noção soviética de faktura –
criação de uma nova visualidade quando a fotografia fosse praticada por suas qualidades
inerentes e não como imitação da pintura. Acreditava que a produção cultural massiva,
especialmente a grande circulação de imagens, mudaria a percepção das massas e engendraria
o desejo de transformação social. Propunha a aplicação do rigor geométrico. Foi professor na
Bauhaus em Weimar (1923).
Fugindo do nazismo (1935) Moholy-Nagy foi para Londres e depois para os EUA (1937), onde
fundou em Chicago a Nova Bauhaus. Suas pinturas a óleo sobre superfícies transparentes ou
polidas para produzirem efeitos luminosos móveis foram precursoras da arte cinética.
Defendia que a principal característica da fotografia é a luz e que os artistas deveriam
experimentar padrões de luz e sombra.

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 Alexander Rodchenko e László Moholy-Nagy ampliaram as possibilidades da fotografia


enriquecendo o imaginário fotográfico e foram precursores da fotografia abstrata.
 Durante a I Guerra Mundial surgiu o movimento Dadá, originalmente na Suíça composto por
artistas e intelectuais que fugiam da convocação para combater e eram contra a guerra e o
materialismo da época. Propunham uma nova arte que expressasse o desespero e quebrasse
convenções.
 Christian Schad (1894-1982) é um exemplo. Tristan Tzara (diretor da revista Dadá) adquiriu
trabalhos de Schad e os batizou de schadographs que soa como shadowgraphs nome dos
trabalhos pioneiros de Talbot (fotogramas). Outro grupo Dadá surgiu em Berlin, mais político e
que usava basicamente a fotomontagem com meio-chave. Um dos líderes foi Richard
Hülsenbeck (1892-1974).
 Man Ray foi uma figura emblemática no dadaísmo e surrealismo. Assessorou Marcel Duchamp
em alguns trabalhos, propôs novos elementos estéticos na fotografia, fugiu do figurativo e
defendeu um universo fotográfico descompromissado com a representação da realidade.
Desenvolveu uma obra fotográfica que conjugou de forma criativa grande capacidade plástica
e enorme rigor técnico. Suas fotografias apresentavam várias linhas de força e jogo de luz-
sombra.
Trabalhou com fotogramas (retomada da técnica de Henry Fox Talbot) que chamou de
Rayographs ou Rayograms. Colocava o objeto diretamente sobre o papel fotográfico que era
exposto à luz, pesquisando composições abstratas em gradações de cinzas, luzes e sombras. O
fotograma não requer câmera fotográfica e cada fotograma é único, impresso diretamente em
papel fotográfico, sem negativo. Desenvolveu técnicas como a solarização/efeito Sabatier, a
exposição múltipla e outras técnicas de sensibilização e impressão fotográficas.
Após fundar o movimento Dadaísta em Nova Iorque, com Marcel Duchamp e Francis Picabia,
mudou-se para Paris onde conheceu André Breton, Louis Aragon e Paul Éluard. A partir de
1925, participou das exposições surrealistas e colaborou com a revista La Révolution
Surréaliste.
 Dali Atômico é a foto mais famosa do pintor Salvador Dali, realizada por Phillipe Halsman, fruto
de uma colaboração entre os artistas, iniciada em meados da década de 1940, auge do
Surrealismo. Man Ray e Dora Maar (1909-1997) também trabalharam em colaboração com
artistas. A foto de Halsman só usou encenação (sem montagens). Os dois realizam também In
Voluptas Mors e Midsummer Night's Mare.

Dali Atômico

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CAPÍTULO 9: Fotodocumentarismo social

 Paralelamente desenvolvia-se outro viés fotográfico, menos preocupado com o estatuto


artístico e mais engajado na transformação da sociedade.
 Jacob Riis (1849-1914), dinamarquês, migrou para os EUA em 1870 em 1873 conseguiu um
emprego em uma agência de notícias. Quatro anos depois se tornou repórter policial do New
York Tribune. Documentou favelas e guetos da cidade de forma sistemática durante cerca de
dez anos. Suas fotos ajudaram a mobilizar a opinião pública e em 1884 foi formada a
Tenement House Commission para tratar dos problemas de habitação.
 Escrevia textos engajados e os ilustrava com suas fotos. Também promovia encontros em que
projetava suas fotos. Em 1888 foi para o Evening Sun e em 1890 publicou o livro How the Other
Half Lives, com 15 imagens em meio-tom e 43 desenhos baseados em fotografias. Apesar de
usar a fotografia apenas como uma ferramenta de transformação, foi pioneiro em técnicas
como o flash de magnésio para condições adversas de luz.
 Suas fotos ganharam credibilidade graças à espontaneidade do instantâneo, embora muitas
sejam posadas, como as de crianças fingindo dormir nas ruas. Causou polêmica a exposição de
1947 (póstuma) no Museu da Cidade de Nova Iorque que tinha cópias com cortes que
aumentavam o impacto. Além disso, por ser uma mostra artística, ocultava os defeitos
técnicos e o caráter espontâneo das fotos de Riis.
 Como Riis, Lewis Hine (1874-1940) não tinha formação em fotografia. Dava aulas na New York
Ethical Culture School, uma instituição progressista. Aprendeu fotografia e passou a trabalhar
exclusivamente com o meio. Fotografou imigrantes desembarcando na ilha Ellis e seu
cotidiano em bairros pobres. Fazia free-lancers para o National Child Labor Committee (NCLC),
entidade privada que pretendia reformar as leis trabalhistas.
 Hine viajou pelos EUA entre 1907 e 1918 e fez cerca de 5 mil fotos de trabalho infantil, várias
vezes assumindo identidade falsa para fotografar as crianças trabalhando em fábricas, minas,
moinhos. Criou o que chamou de “photo story”, uma narrativa composta de imagens e
palavras para ser publicada em jornais e revistas. Exigia o crédito para suas fotografias numa
época em que isso não existia.
 Entre 1909-14 trabalhou no projeto The Pittsburgh Survey, um estudo da vida dos
trabalhadores imigrantes e profissionais estabelecidos e seus conflitos trabalhistas. Hine
(imagens e texto) se alinhava com a orientação objetiva da reportagem econômica e da
emergente profissão de sociólogo, em contraste como a abordagem pessoal de Riis.
Fotografou também o trabalho da Cruz Vermelha na Europa depois da I Guerra e publicou Men
at Work: photographic study of Men and Machines (1932) que registrava a construção do
Empire State Building.
 Depois do NCLC deixou de mostrar abusos para retratar a dignidade da classe trabalhadora.
Suas últimas fotografias, especialmente as que ele chamava de “retratos do trabalho” colocava
os trabalhadores no centro do quadro celebrando seu talento e perseverança. Também
publicou muitas fotos em jornais dirigidos a profissionais e voluntários de trabalhos sociais. Em
pronunciamento em 1909 sugeriu que os trabalhadores fotografassem sua própria situação.

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 A idéia de uma fotografia do trabalho se desenvolve na Europa entre as guerras.


 Apesar do crescente movimento trabalhista da virada do século, a fotografia não foi
empregada sistematicamente como propaganda ou documento pelos trabalhadores, enquanto
as indústrias e corporações a usavam para melhorar sua imagem junto aos trabalhadores e à
sociedade.
 O Estado Norte Americano foi responsável por uma das mais importantes experiências de
documentação social. Em 1935 Franklin Roosevelt criou a Resettlement Administration (RA)
entre os esforços para combater a depressão. A Agência supervisionava créditos, controle de
enchentes, campos de migrantes e educação agrícola. Seu maior objetivo era o re-
assentamento de fazendeiros falidos, inclusive na indústria.
 Em 1937 a RA passou a se chamar Farm Security Administration (FSA) e suas atividades
fotográficas continuaram supervisionadas por Roy Stryker (1893-1976) na Historical Section –
Photographic. O objetivo era documentar evidências dos bons trabalhos da agência e divulga-
los na imprensa.
 É possível traçar paralelos entre a orquestração da opinião pública através da imprensa de
massa pela FSA e outros programas do New Deal com as atividades dos fotógrafos
experimentais no começo da União Soviética. Tanto a URSS quanto os USA acreditavam que a
expansão industrial era crucial para a prosperidade futura.
 Os fotógrafos da FSA/RA são precursores de um tipo de fotografia documental que deve ser
emocionalmente persuasiva e trazer uma representação estilizada de imagens altamente
simbólicas.
 Stryker idealizou um sistema em que os fotógrafos documentavam exaustivamente os
trabalhos da agência em todo o país e as imagens eram distribuídas para toda a imprensa.
Apesar das restrições financeiras, Stryker programou matérias, planejou roteiros e decidia que
foto iria ser distribuída para órgãos que iam desde o Time Magazine até periódicos escolares.
Em 1940 distribuía 1400 imagens por mês.
 Munidos de extensa pesquisa os fotógrafos eram orientados a focar o cotidiano das pequenas
cidades e acompanhar todos seus afazeres.
 Aproximadamente 20 fotógrafos trabalharam na agência até 1942, quando a FSA passou a ser
submetida ao Escritório de Informação de Guerra. Todos os esforços passaram a ser
canalizados para a Guerra.
 Um dos primeiros colaboradores foi Walker Evans (1903-1975). Evans foi influenciado pelo
trabalho de Eugène Atget, pela simplicidade das fotos de construções e ruas históricas e
detalhes arquitetônicos. Não seguia as pautas minuciosas de Stryker nem respeitava prazos,
fazendo fotos de anúncios e interiores domésticos com tratamento de folk art, e foi demitido
em 1937. Suas fotos transformam a pobreza e os efeitos da Depressão em registros universais
e atemporais. Em 1937 expôs no Museu de Arte Moderna e seu livro influenciou toda uma
geração de fotógrafos, como Robert Frank. Depois da FSA continuou seu trabalho documental
em séries como das fotos do Metrô tiradas com câmera escondida.
 Dorothea Lange ingressou na FSA em 1935, quando já realizava fotos que denunciavam
injustiças. No começo da Depressão fotografou manifestações trabalhistas e filas de pão em

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São Francisco. Trabalhando com o ativista-economista Paul Taylor, focou sua atenção nos
problemas dos trabalhadores do campo. Para a FSA produziu a foto que se transformou no
ícone da Depressão: Mãe Migrante, uma da série de cinco fotografias de uma mulher de 32
anos e seus filhos num campo de plantação de ervilhas na Califórnia. Apesar do poder da
imagem, uma das mais publicadas do mundo, esta não é uma típica foto de Lange.
 Publicou com texto de Taylor American Exodus: a Record of Human Erosion (1939), nome que
é referência aos estragos causados pela mecanização do campo e a consequente migração,
com fotos acompanhadas de legendas.
 Ao sair da FSA continuou fazendo fotos engajadas. Militou contra os Campos de Recolocação
(American Relocation Authoritdy) onde americanos de origem japonesa eram internados à
força na II Guerra, fotografou o Manzanar Relocation Center na Califórnia e os últimos dias de
comunidades agrícolas no Vale Berrysea em São Francisco.
 Outro pioneiro da RA foi Arthur Rothstein (1915-1985) que fez as fotos do fenômeno climático
Dust Bowl, mas suas fotos mais famosas foram as da série dos desolados campos Badlands de
Dakota do Sul no verão de 1936. Foi acusado de armar uma cena movendo uma caveira de boi.
A agência temia perder credibilidade e, consequentemente, verbas, se as fotos fossem
manipuladas.
 Outros fotógrafos da FSA: Gordon Parks, Esther Bubley, Russell Lee, Gordon Parks, Jack Delano,
Behn Shan, Jack Delano, John Vachon, Marion Post Wolcott,
 Recentemente foram descobertas cerca de 1600 fotografias em Kodachrome arquivadas na
Biblioteca do Congresso. Em 2004, foi editado o livro Bound for Glory, America in Color 1939-
1943. Transforma-se assim a irraigada percepção da ligação compulsória da fotografia de
documentação social com o preto e branco

Dorothea Lange, Mãe Migrante.

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CAPÍTULO 10: A guerra e o novo estatuto do fotógrafo

 A fotografia foi usada como libelo contra a guerra. Em 1924 Ernest Friedrich publicou Guerra
contra Guerra, livro com 180 fotografias chocantes e legendas sarcásticas. Eram imagens de
mortos nos campos de batalhas, construções destruídas, civis famintos, execuções, cemitérios
e closes de soldados desfigurados.
 O embate ideológico que teve lugar na Europa após a I Guerra logo se transformaria em um
conflito de fato. A Guerra Civil Espanhola atraiu e despertou a solidariedade de artistas e
intelectuais em todo o mundo. Refletia as tensões ideológicas que deram origem à II Guerra e
foi também o balão de ensaio para as tecnologias bélicas, além de ter inaugurado o
bombardeio aéreo a cidades européias. A cobertura fotográfica também foi inovadora, graças
ao avanço tecnológico, especialmente a câmera Leica 35 mm.
 Muitos fotógrafos registraram a guerra entre eles dois dos futuros fundadores da agência
Magnum, David Seymour (Chim) (1911-1956) e Robert Capa (1913-1954), além de sua
companheira Gerda Taro (1910 - 1937), morta no conflito. Também se destacaram Agustí
Centelles i Osso (1909-1985), Juan Guzmán Hans Namuth (1915 –1990), Georg Reisner (1911-
1940), Walter Reuter (1906 – 2005) e os Irmãos Mayo, coletivo mexicano composto por 5
fotógrafos.
 A foto de Chim: “Assembléia para distribuição de terras, Extremadura, Espanha, 1936” mostra
uma mulher amamentando e olhando para o alto, e ficou associada aos bombardeios aéreos.
No entanto foi feita quatro meses antes do início da guerra.
 É de Robert Capa a mais marcante foto da guerra, Morte de um Miliciano, publicada pela
primeira vez em setembro de 1936 na Vu e em julho de 1937 na Life. Mostra o exato momento
da queda de um soldado republicano, morto com um tiro na cabeça. Alguns consideravam a
fotografia forjada até que em janeiro de 2008 foram descobertos no México 127 rolos de
negativos de Capa, Taro e Chim, dados como perdidos. Entre eles está a sequencia da morte
do miliciano.
 A guerra civil espanhola foi fotografada por equipamentos leves, como a Leica, e filmada com
equipamentos cinematográficos mais flexíveis como a Éclair. Foram produzidas mais de cem
películas de longa e curta-metragem do lado republicano. Outro fundador da Magnum, Henri
Cartier-Bresson, realizou dois filmes para os republicanos.
 A fotografia passou a ser vista como uma ameaça ao poder instituído e em 1933 Hitler mandou
registrar todos os fotógrafos alemães, um baque para o ativo movimento de fotografia
trabalhista alemã. A revista AIZ – Revista Ilustrada Trabalhista, criada em 1921 e dedicada a
causas liberais e humanitárias se transferiu para Praga.
 Neste ano Alfred Eisenstaedt (1898-1995), trabalhando para a Associated Press fotografou
Joseph Goebbels, chefe da propaganda nazista na Assembléia da Liga das Nações em Genebra.
A expressão do nazista na fotografia é premonitória do comportamento futuro do mais íntimo
e influente colaborador de Hitler.
 A chegada de Hitler ao poder foi orquestrada pela imprensa ilustrada alemã, controlada pelo
Ministro da Propaganda. As fotografias eram cuidadosamente arranjadas para mostrar uma

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História da Fotografia
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imagem favorável e poderosa do Fuher. Seu fotógrafo favorito Heinrich Hoffmann (1885-1957)
o fotografou não apenas como uma figura política, mas também como um simples homem do
povo, lendo o jornal e conversando com fazendeiros
 Quando estourou a II Guerra vários fotógrafos estavam envolvidos na cobertura de guerra.
Alguns dos mais importantes foram Robert Capa, W. Eugene Smith, Alfred Eisenstaedt,
Margareth Bourke-White, Peter Stackpole, David Douglas Duncan, David Seymour – Chim,
George Rodger – (primeiro fotógrafo a entrar no campo de concentração Bergen-Belsen),
George Silk (primeiro a fotografar Nagasaki depois do lançamento da bomba atômica), Carl
Mydans, Bob Landry, entre outros.
 Toda a crônica visual da guerra e o trabalho dessa constelação de fotógrafos foi publicada na
mais importante revista ilustrada do século XX, a Life que chegou a vender 13,5 milhões de
cópias semanais. É importante destacar que a Life era uma revista dedicada a temas gerais,
para toda a família. Não era voltada para a guerra, mas sua enorme circulação e a utilização
massiva de fotografias de qualidade a transformaram num importante instrumento de
divulgação das imagens de conflitos
 A primeira capa de Life trazia uma foto de Margaret Bourke-White do Fort Peck Dam. Seu
formato tornou-se clássico: cerca de 50 páginas cobertas de fotografias e com textos curtos.
De uma tiragem inicial de 380 mil cópias passou a 1 milhão por semana em 4 meses.
 A fotografia mais conhecida publicada por Life foi da vitória dos EUA sobre o Japão em 1945
(V-J Day) de Alfred Eisenstaedt em que um marinheiro beija uma enfermeira.
 As mais memoráveis fotografias de guerra foram publicadas na Life, como as do desembarque
das tropas aliadas na Normandia. Sob fogo cerrado Robert Capa desembarcou com os soldados
norte-americanos em Omaha Beach, fotografando sob o mesmo ponto-de-vista das tropas. Fez
72 imagens, mas apenas 11 não foram destruídas pelo super-aquecimento da secadora de
filmes no laboratório londrino. As que sobreviveram ficaram granuladas e tremidas. Estas fotos
exemplificam a filosofia de Capa: “Se suas fotos não são boas o suficiente, você não está perto
o suficiente”. Capa se tornou o mais celebrado fotógrafo de guerra. Fotografou a Guerra Civil
Espanhola (1936-39), a invasão japonesa na China (1938), a Segunda Guerra Mundial (1939-45)
e a guerra da independência de Israel (1948), e em 1954 cobriu para a Life a Guerra da
Indochina. Em 25 de maio acompanhava uma escolta francesa numa missão no delta do Rio
Vermelho, no Vietnã, quando morreu ao pisar numa mina.
 Uma importante consequência da guerra para a fotografia foi a transformação do estatuto do
fotógrafo, que assumiu a condução do seu trabalho com um viés engajado. Em 1947 os
fotógrafos Robert Capa, George Rodger, David Seymour (Chim), Bill Vandivert e Henri Cartier-
Bresson (1908-2004) fundaram a agência Magnum que visava representar fotógrafos
autônomos junto às revistas que os contratavam.
 O mais famoso fundador da Magnum foi Henri Cartier-Bresson que ingressou na Unidade de
Filme e Foto do exército francês quando a II Guerra estourou e foi capturado pelos nazistas.
Ficou 35 meses preso submetido a trabalhos forçados, tendo tentado 2 fugas e conseguindo na
terceira. Atuou na Resistência e fotografou secretamente. No fim da guerra circularam
rumores nos EUA de HCB havia morrido e foi organizada uma retrospectiva “póstuma” de sua

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obra no MoMA. A exposição foi inaugurada em 1947 juntamente com a publicação de seu
primeiro livro The Photographs of Henri Cartier-Bresson.
 Cartier-Bresson inspirou várias gerações de fotógrafos com seu estilo intimista. Usava uma
Leica, não fazia fotos arranjadas registrando sua imagem de uma forma rápida e precisa. Seu
conceito de fotografia baseava-se no momento decisivo. Fotografou a morte de Gandhi, a
China nos últimos meses do Kuomitang, o início da República Popular da China e a luta pela
independência na Indonésia. Foi o primeiro fotógrafo europeu a fotografar a Rússia comunista
após a morte de Stalin. Fotografou o 10º aniversário da Revolução Popular Chinesa. Tornou-se
conhecido mundialmente por trabalhos publicados nas revistas Life e Paris-Match. Apesar de
seu trabalho como fotojornalista consolidou sua reputação como fotógrafo do cotidiano.
 A Guerra Civil Espanhola e a II Guerra contribuíram para forjar o novo fotógrafo que chegaria
amadurecido na Guerra do Vietnã onde a fotografia teve papel decisivo. Life mostrava pessoas
comuns atingidas pelo conflito, uma visão que W. Eugene Smith inaugurara na II Guerra. Em 27
de junho de 1969 Life publicou The Faces of the American Dead in Vietnam diagramado como
um anuário estudantil com o rosto dos mortos. A idéia era mostrar os soldados como
indivíduos. Em 16 de abril de 1965 a revista publicou 22 fotos p&b do fotógrafo britânico Larry
Burrows (1926 - 1971) que acompanhava as experiências de um soldado de 22 anos. Burrows
montou a câmera na metralhadora aérea que o soldado usou durante uma batalha para captar
suas expressões faciais. Mas foi a força de seu trabalho colorido que transformou o retrato do
campo de batalha. Burrows morreu em abril de 1971 na queda de um helicóptero no Laos
onde também estava o fotógrafo Henri Huet.
 O Vietnã foi também coberto em vídeo, mas as fotografias estáticas ficaram na história. Foi a
guerra da fotografia por excelência, especialmente da colorida. Entretanto as três fotos mais
importantes relacionadas ao conflito, responsáveis por colocar a opinião pública contra a
guerra foram feitas em p&b.
 Em 1968 Eddie Adams fotografou o coronel Nguyen Ngoc Loam, chefe da Polícia Nacional da
República do Vietnam executando na rua um oficial vietcong com um tiro na cabeça. O câmera
da NBC, Vo Suu, filmou a sequência que passou inúmeras vezes nas televisões e chocou os
EUA. Quando a foto de Adams foi publicada na primeira página dos jornais americanos, mudou
a forma como o povo americano encarava a guerra.
 A imagem sempre ligada aos horrores dessa guerra foi feita por Nick Ut. A menina de 9 anos
Kim Phuc, nua, fugindo de seu povoado que estava sofrendo um bombardeio de napalm.
 A foto que selou definitivamente o fim da guerra não foi tomada por um profissional nem feita
em solo asiático. Em 4 de Maio de 1970 John Filo, estudante de fotografia, fotografa Jeffrey
Miller, 20 anos, também estudante, morto pela Guarda Nacional durante um protesto não-
autorizado contra a decisão de Nixon de enviar tropas para o Cambodja que deixou três
estudantes mortos e nove feridos. O ângulo da foto não mostra o rosto desfigurado de Miller,
atingido na boca. Mas a expressão de Mary Ann Vecchio horrorizada com o que vê completa a
foto. Depois se sabe que a menina não é estudante na Universidade, tem apenas 14 anos e
fugiu de casa dos pais em Miami. Depois de publicada a foto o Governador da Florida, Claude
Kirk, afirmou que Mary Ann era uma “dissidente comunista”.

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Fotografia de Nick Ut.

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CAPÍTULO 11: A fotografia documental:

 Uma das escolas de fotografia, se alinha ao trabalho de Henri Cartier-Bresson e sua teoria do
“momento decisivo”, como foi visto no capítulo anterior. A fotografia de acontecimentos,
sejam conflitos armados, sejam outras situações fugidias, estão mais de acordo com a filosofia
fotográfica do grande fotógrafo francês.
 August Sander (1876-1963) pode ser considerado precursor de um outro tipo de registro, em
que o fotógrafo se dedica a um tema e o aprofunda, às vezes por toda a vida. Durante toda a
sua carreira trabalhou no projeto Man in the Twentieth Century, fotografando o povo alemão,
sem distinção de classes. Diversas vezes teve seu material perdido, apreendido e destruído,
mas em 1951 exibiu seu trabalho na primeira edição da exposição Photokina e em 1955
integrou a exposição de Edward Steichen, The Family of Man.
 Por outro lado, Walker Evans, que foi considerado o bad boy da FSA, inspirou diversos
fotógrafos que buscavam a liberdade para fotografar, sem as limitações de agências ou
revistas.
 São abordagens que preconizam um mergulho no assunto.
W. Eugene Smith cobriu a II Guerra, foi ferido, e passou dois anos em tratamento. Sua primeira
foto depois da hospitalização A Walk to Paradise Garden é uma de suas imagens memoráveis e
foi escolhida para fechar a exposição Family of Man organizada por Edward Steichen em 1955.
Entre 1947 e 1954 produziu ensaios fotográficos que redefiniram a fotografia documental:
Country Doctor, Hard Times on Broadway, Spanish Village, Southern Midwife, and Man of
Mercy sobre o Dr. Albert Schweitzer na Africa. A edição que Life deu a esse ensaio fez com que
Smith se demitisse, pois a considerou superficial. Assumiu a responsabilidade ética de
fotógrafo, defendia o controle de todas as fases da reportagem. Estudava profundamente o
tema antes de ir a campo e geralmente levava um mínimo de 3 meses para realizar uma
documentação, produzindo documentários densos e aprofundados.
No final dos anos 1950 dedicou-se ao monumental ensaio sobre a cidade de Pittsburgh, o mais
complexo e ambicioso feito por um único fotógrafo. Para o trabalho recebeu duas vezes a
bolsa Guggenheim Fellowship (1956-57 e 1958-59).
Seu projeto documental mais importante foi na pequena vila de pescadores japoneses
Minamata, uma pequena baía no Japão contaminada por mercúrio e que provocou um
enorme desastre ambiental. Smith fotografou os efeitos da contaminação por mercúrio nas
pessoas, as crianças deformadas e a luta da população local por justiça. No total, mais de 900
pessoas morreram com dores terríveis devido ao envenenamento. Oficialmente foi
reconhecido que 2.955 pessoas sofreram da doença de Minamata. A exemplo de seus
antecessores Riis e Hine, Smith usava a fotografia para mobilização e prova nos tribunais. Suas
fotos têm um acurado senso estético e são trabalhadas em laboratório, usava lentes olho de
peixe imprimindo uma visão destorcida e angustiante da realidade, numa direta relação entre
recursos técnicos e estéticos.
 O japonês Shisei Kuwabara (1936) também fotografou os trágicos resultados e publicou o livro
Minamata.

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História da Fotografia
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 O norte-americano Robert Frank (1924) tinha uma abordagem documental diferente. Iniciou
sua carreira fazendo fotografia de moda para o Harper’s Bazaar e produziu editoriais na rua
durante um ano, quando passou a viajar por vários países, trabalhando como free lancer.
Odiava as histórias da Life com começo, meio e fim. Produziu Black, White and Things um livro
diferente dos foto-ensaios da Life e dos livros fotográficos da época. Sem narrativa sem ordem
cronológica como em A night in London de Bill Brandt (1938) e Day of Paris de André Kertész
(1945), sem tema social como The English at Home, de Brandt (1936). Frank representa a
Fotografia Contemporânea Crítica. Também participou da exposição de Steichen, Family of
Man. Frank não procurava nenhuma justificativa moral, não havia princípio meio e fim nos
seus ensaios e não compactuava com a idéia de que a fotografia é uma linguagem universal.
Não pretendia registrar fatos importantes. Numa viagem pelos EUA Frank fez cerca de 20 mil
fotos das quais selecionou 83. Em 1958 publicou o trabalho Les Americanes na França que mais
tarde saiu nos EUA com o título The Americans e foi alvo de fortes controvérsias.
 Companheira de Frank no Family of Man Diane Arbus (1923-1971) também se dedicou a um
“outro lado” da sociedade americana, os outsiders e freaks, marginais na sociedade. Ao
contrário dos seus contemporâneos adotou a câmera de médio formato Rolleiflex em
detrimento das já tão populares 35 mm. Fotografando de Rolleiflex não perdia jamais o
contato com o objeto fotografado, além de explorar o maior tamanho do negativo. Usava flash
com luz do dia.
 Assim como Frank, Arbus usava a câmera para denunciar a insatisfação com frivolidade da
sociedade, mas não visava mudanças sociais. Essa atitude cética influenciará as próximas
gerações de fotógrafos documentais.
 Outros destacados documentaristas influenciados por Frank e the Americans são Lee
Friedlander (1934) e Garry Winogrand (1928-1984), ambos participantes juntamente com
Diane Arbus e William Klein (1928) da exposição New Documents de 1967.
 As fotos de Friedlander são um retrato impiedoso da sociedade americana, mas menos
emocional que as de Frank. Seu trabalho era realizado em séries: ruas, flores, árvores, jardins,
paisagens, nus, retratos e auto retratos. Em meados dos anos 1960 inicia o seu trabalho sobre
monumentos americanos esquecidos American Monument – 1976 com forte influência Walker
Evans.
 Também influenciado por Evans e Frank, além de Cartier-Bresson, Garry Winogrand
fotografava com Leica e grande angular fazendo inúmeras fotos que mal conseguia revelar,
deixando cerca de 300 mil negativos. Seu primeiro livro The Animals foi feito no zoológico do
Bronx e no aquário de Coney Island. Em Public Relations, de 1977, fotografou eventos públicos,
vernissages, entrevistas de imprensa, esportes e manifestações políticas.
 De uma geração posterior o tcheco Josef Koudelka (1938) começou a carreira como fotógrafo
de teatro. A partir de 1967 se dedicou exclusivamente à fotografia, começando a registrar os
ciganos europeus. Em agosto de 1968, depois de fotografar ciganos na Romênia, voltava para
Praga, capital da então Tchecoslováquia, quando ocorreu a invasão das tropas soviéticas. Suas
fotografias da invasão que massacrou a Primavera de Praga e pôs fim às reformas Tchecas
saíram clandestinamente do país e chegaram à agência Magnum, tendo sido publicadas com a

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assinatura P. P. (Prague Photographer) para evitar perseguições ao fotógrafo e sua família. As


imagens se tornaram um símbolo da truculência soviética e o fotógrafo recebeu a medalha de
ouro Robert Capa pela coragem excepcional. As fotos foram proibidas nos países de influência
soviética.
 Em 1970 conseguiu sair da Tchecoslováquia e em 1971 passou a integrar os quadros da
Magnum, mas continuou vagando pela Europa, fotografando os ciganos, recebendo o apoio
pessoal de Cartier-Bresson. Publicou seu primeiro livro, Gypsies, em 1975 e Exiles em 1988.
Desde 1986 trabalha com câmeras panorâmicas, tendo publicado parte dessas fotos no livro
Chaos de 1999. Voltou pela primeira vez à Tchecoslováquia em 1991 e produziu Black Triangle,
sobre a natureza destruída do seu país.
 Koudelka jamais trabalhou com reportagem, mas suas fotografias são marcos documentais.
 A exemplo de Robert Frank e seus seguidores não pretende nenhuma mudança social a partir
de suas imagens, mas sua postura é menos crítica e desesperançada.

W. Eugene Smith – Tomoko Uemura no banho - Minamata, 1972

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CAPÍTULO 12: Pequena biografia de alguns fotógrafos contemporâneos:

 Robert Mapplethorpe (1946-1989)


Começa a fotografar na década de 70 com uma Polaroid.
Passa a realizar imagens clássicas e sofisticadas com uma Hasselblad médio formato,
fotografando retratos, flores, naturezas-mortas e crianças, sendo também requisitado por
designers e editoras.
A partir de 1980 inicia seu trabalho com nus e sadomasoquismo, gerando uma enorme
polêmica. Torna-se um dos principais representantes do homo-erotismo, fotografando nus
masculinos em p&b. Sua obra é marcada pelo rigor estético e técnico, a apropriação da
estética e composição clássica e a limpeza do quadro. Apesar de seu polêmico trabalho homo-
erótico ter se tornado indissociável de sua obra, seus retratos e a naturezas mortas também
devem ser destacados. Suas últimas fotografias são basicamente divididas em dois grupos:
corpo humano e flores, sendo que as fotografias de flores e arranjos florais fazem clara
referência à sexualidade. Alguns de seus trabalhos sobre homossexuais e práticas
sadomasoquistas foram proibidos nos EUA. Desde sua morte em 1989, vítima da AIDS, suas
fotografias foram varias vezes denunciadas no Senado Norte Americano por de obscenidade e
pornografia. Seu último livro foi cassado, proibido, retirado de bibliotecas e centros culturais
nos EUA.

 Cindy Sherman (EUA, 1954)


Desponta na cena artística nova-iorquina no final da década de 1970 como parte de uma
geração cujo trabalho questiona os códigos de representação em uma sociedade saturada pela
mídia, em meio a debates sobre autoria e originalidade, a condição da imagem fotográfica e
das transformações na arte. Seu trabalho se aproxima da crítica feminista contemporânea e
problematiza a articulação entre corpo e imagem.
Realiza Untitled Film Stills, uma série de 69 fotografias em preto e branco onde se retrata
como heroína de filmes B. Trabalha atrás e na frente das câmeras e realiza uma obra central
para arte contemporânea, representando o imaginário feminino, embora seja por vezes
acusada de feminista. Sua apropriação de ambos os lados do processo fotográfico desconstrói
a oposição entre fotógrafo e modelo, trabalhando com o conflito entre objetividade e
subjetividade, já que seu próprio corpo se torna sujeito da sua arte. As séries Centerfolds
(1981) e Fashion (1983–84) dão sequência a esse trabalho.
Rejeitando o rótulo de feminista para seu trabalho, gradualmente abandonou as
representações femininas embarcando em um imaginário mais fantástico e brilhante, como na
série Fairy Tales e Disasters em meados dos anos 1980. Faz sucesso comercial e realiza
representações mais viscerais, de vômito, partes do corpo e contos de fadas grotescos e
através das cores brilhantes. Discute a ficção que se esconde sob a ilusão.
Ao longo dos anos 1980 e 1990, fez campanhas publicitárias para designers de moda como
Jean Paul Gaultier e Rei Kawakubo da Comme des Garçons, o que tornou seu trabalho
conhecido internacionalmente.

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Apropriou-se de numerosos gêneros visuais, inclusive o filme still, centerfold, fotografia de


moda, retrato histórico, filmes softcore.

 Nan Goldin (EUA, 1953)


Suas primeiras temáticas são amor, gênero, intimidade doméstica e sexualidade. Seu primeiro
trabalho, de 1968, retrata comunidades gay e transexuais. São mulheres refletidas em
espelhos, nos banheiros e bares, drag queens, atos sexuais e a cultura da obsessão e
dependência química. Trabalha inicialmente em Cibacrome.
Segue documentando o movimento pós-punk e a sub-cultura gay pós movimento de direito
dos homossexuais e o mundo das drogas pesadas, trabalho que intitulou The Ballad of Sexual
Dependency, mostrando decadência pelo uso de drogas, violência, agressão familiar e
momentos autobiográficos. A maior parte dos figurantes de suas fotos morreu de overdose ou
AIDS.
Realiza I'll Be Your Mirror, inspirado em canções do The Velvet Underground. A maior parte de
seus trabalhos é projetada em slides e alguns foram exibidos em festivais de cinema. Num
deles projeta 800 fotos em 45 minutos.
Fotografa com luz natural.
Desde 1995 voltou-se para outros temas como o céu de Nova Iorque, paisagens bizarras
(especialmente de pessoas na água), sua companheira Siobhan, bebês e vida familiar.
Na mostra Chasing a Ghost em Nova Iorque em 2006 incluiu imagens em movimento, como a
apresentação em slide e vídeo em três telas sobre o suicídio da irmã, Sisters, Saints, & Sybils.

 Anna Gaskell (EUA, 1969) e


Entrou mais recentemente no cenário artístico. A primeira mostra, foi a série Wonder em
1996-97. Na seguinte, "by proxy", de 1999, evoca Alice no País das Maravilhas trabalhando
com meninas e cenas de forte apelo psicológico, remetendo a imagens de terror e
perversidade.
Seu trabalho é ao mesmo tempo sedutor e alienador, único e imitador e seu objetivo é analisar
o desejo voyerístico enquanto o revela. Usa superfícies frias e lustrosas, e cores saturadas, uso
de cortes e close-up, cenários naturais hiper-realistas, garotas de longos cabelos sedosos.
Não busca o início ou desfecho da história, mas quer questionar o interior da narrativa,
quando os personagens começam a perceber que as coisas provavelmente vão dar errado.

 Andrés Serrano (EUA 1950)


Sua arte busca o choque sensacionalista e a quebra dos limites. Tornou-se conhecido por suas
controversas fotos de cadáveres e pelo trabalho Piss Christ (1987), um crucifixo de plástico
submerso na urina do próprio artista. De família católica, filho de mãe cubana de descendência
africana e de pai hondurenho pouco presente, o artista ataca o catolicismo.
Em geral expõe cópias de grande formato (50x75 cm) realizadas com técnicas fotográficas
convencionais, sem manipulação digital.

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História da Fotografia
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Sua temática pode incluir desde retratos de integrantes da Ku Klux Klan, fotos de cadáveres e
vítimas de queimaduras.
Fotografou os sem teto nos subterrâneos de Nova Iorque com equipamento de estúdio, como
se fossem obras de arte e casais abraçados.
Muitos de seus trabalhos envolvem fluídos corporais como sangue (inclusive menstrual),
sêmen (Blood and Semen II - 1990) e mesmo leite materno.
Piss Christ foi vendido em Londres em 1999por US$ 162 mil, muito acima do estimado, que
era entre US$ 20 e 30 mil. Blood and Semem III foi capa do álbum Load e Piss and Blood da
ReLoad da Metallica.
Recentemente tem trabalhado com fezes.

 Duane Michals (EUA, 1932)


Tem um trabalho desconcertante em que utiliza utilizando frequentemente jogos de espelhos
ou sequências de imagens e articula as possibilidades inerentes do dispositivo fotográfico.
Com uma câmera 35 mm simples, luz natural, e utilizando os amigos como modelos e seus
ambientes cotidianos, cria narrativas ficcionais abordando mitos. Seu trabalho joga com a
ilusão e fantasia, não se importando com o registro do real, mas construindo narrativas únicas
e centradas no referente fotográfico.
Duane Michals influenciou grande parte dos fotógrafos pós década de 1960.
É um artista eclético que transita entre a moda e o portrait, muitas vezes intervindo na cópia
fotográfica.

 Pedro Meyer (Espanha, 1935)


Radicado no México, o fotógrafo é um pioneiro na imagem digital. Seu trabalho questiona os
limites entre a verdade, a ficção e a realidade.
Foi fundador e presidente do Consejo Mexicano de Fotografía e administra o site fotográfico
ZoneZero que organiza o trabalho de mais de mil fotógrafos de todo o mundo, e é visitado por
mais de 500.000 pessoas a cada mês. Mais de 55 milhões de pessoas visitaram ZoneZero em
um ano fazendo dele um dos mais visitados sites de conteúdo na internet.

 David Hockney (Reino Unido, 1937)


Britânico. Um dos fundadores da Pop Art britânica junto a Kitaj, Peter Phillips, Boshier, Richard
Smith, Allen Jones, com quem estudou.
Seu interesse pela fotografia surge ao mudar-se para Los Angeles e seus trabalhos ficam mais
naturalistas. A partir de 1966 desenha cenários e figurinos. Seu trabalho fotográfico consiste
geralmente em criar imagens compostas a partir da montagem de várias fotografias.

 Ralph Gibson (EUA - 1939)


Teve como professores Dorothea Lange e Robert Frank e deles herdou o rigor técnico e
estético. Publicou mais de 30 livros, o de maior fôlego Libris ex, uma pesquisa e documentação
fotográfica do aspecto visual da escrita em suas várias formas. Seu estilo tem influências das

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tendências surrealista e minimalista, fugindo do documentarismo norte-americano tradicional.


Fotografa em p&b.

 Edward Burtynsky (Canadá, 1955)


Suas fotos coloridas em grande formato documentam as muitas facetas da natureza
transformadas pela ação humana. Suas imagens tem um refinado nível de detalhamento e
transitam entre o documental e o artístico. Suas séries como de demolição de navios, minas
urbanas, escavações e refinarias industriais refletem o dilema entre o desejo humano de
prosperidade e seus reflexos no meio-ambiente.

 David Goldblatt (África do Sul, 1930)


Registrou para a imprensa momentos-chave da história sul-africana. Começa a documentar a
multiplicidade sulafricana em 1952. Sua fotografia é engajada e pretende mobilizar.
Internacionalmente reconhecidas, suas fotografias estão profundamente radicadas na
realidade da África do Sul. Até o final do regime do apartheid, em 1994, o artista trabalhou
exclusivamente com preto e branco, mostrando as condições de vida da classe branca e do
restante população, fortemente discriminada. Depois o fim do apartheid trabalha com cor e
paisagens de grande escala.
Atualmente documenta a delinquência nos subúrbios de Joanesburgo, projeto que lhe deu o
Prêmio HCB 2009.

 Shomei Tomatsu (1930)


Começa a fotografar depois do final da Guerra. Fotografa o cotidiano de uma cidade cheia de
soldados americanos e crianças mestiças, simbolizando a derrota e ocupação americana, algo
inédito no Japão. As cenas do dia-a-dia se sobrepunham à história do Japão pós-guerra,
criando uma imagem dupla de um cenário que não era mais comum.
Seus trabalhos produzidos em Nagasaki, Okinawa e Tóquio, desde os anos cinqüenta até o
início da década de setenta, refletem o esforço existencial do fotógrafo para desafiar a
violência visual que a história política moderna do Japão induziu em sua imaginação comum.
Um de seus primeiros trabalhos chamou-se "Goma de mascar e chocolate", onde a maior
parte das pessoas eram soldados negros americanos perto das bases norte-americanas num
cenário que podia facilmente ser tomado por um país estrangeiro. Apresenta uma atmosfera
niilista desconectada do mundo cotidiano, fragmentada e sem coerência, numa crítica à versão
oficial da história do Japão do pós-guerra, que apresentava uma democracia pacífica
convivendo com a ocupação americana.
A partir dos anos 1960 começou a fotografar Nagasaki, inicialmente a pedido do governo
japonês. Encampou pessoalmente a documentação da cidade, trabalho que mantém até hoje.
Documenta também Okinawa, o último território ocupado pelos Estados Unidos onde haviam
acontecido numerosas atividades contra o colonialismo dos Estados Unidos e do governo
central do Japão, refletindo o clima político e social do Japão do pós-guerra.

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História da Fotografia
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Todos somos palomas – Pedro Meyer

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