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Psicologia
Belo Horizonte
2021
Análise Crítica: O Alienista
São algumas das muitas questões que o conto ‘’O Alienista’’ levanta. A obra
escrita há quarenta anos propõe diversas reflexões psicossociais
extremamente relevantes até os dias atuais. Isto se deve pelo fato de que para
um ser humano ‘’existir’’ em sociedade deve inserir-se dentro de um padrão
pré-estabelecido dominante, já que, quando isto não ocorre, o mesmo
representa determinada anormalidade. Esta necessidade social de padronizar
pode ser vista em todos os âmbitos sociais, como vestimentas, estilos
musicais, sexualidade, dentre outras - sendo todos estes reflexos de
comportamentos. Assim, quando o comportamento de um indivíduo não condiz
com aquilo que é esperado do grupo social-histórico pertencente, ele
normalmente é considerado louco – no sentido literal ou simbólico da palavra.
Mas o que consiste em considerar um indivíduo louco no sentido literal da
palavra? E no sentido simbólico? E o constitui verdadeiramente a loucura? É o
questionamento que perdura por todo o enredo da obra.
Como não esperado, houve uma revolta contra o Doutor, pelo fato da
indignação de alguns habitantes da cidade com determinadas atitudes que
Simão teria tomado – como, por exemplo, aprisionar radicalmente indivíduos
que não demonstravam ser loucos para a população. Assim, Simão observou
que havia algo de errado com a sua teoria, soltando todos aqueles que
estavam ali em tratamento e que foram diagnosticados pelo mesmo como
loucos. Continuando seus estudos, Simão constitui uma nova visão sobre a
loucura: já que o louco era aquele quem possuía um comportamento fora do
padrão, agora, ele afirmava que louco era quem não possuía determinado
desvio de caráter - ou seja, necessitava tratamento psicológico quem antes era
considerado normal. Assim, o alienista fica sem mais pacientes, já que
conseguiu tratar de todos, e vê que, não há mais loucos na sua cidade, exceto
ele mesmo. Deste modo, ele tranca-se sozinho na Casa Verde para estudar
sua própria loucura, já que se considera o único anormal uma vez que apenas
ele possuía uma personalidade perfeita, sem desvios de caráter e defeitos. Ele
morre no local, demonstrando que não obteve sucesso em curar-se através do
seu método terapêutico.
Assim, ele observa que se esta percepção sobre a loucura fosse correta, mais
de ¾ da população da sua região necessitaria de internação, o que de certa
forma era incoerente. Se o padrão pré-estabelecido era baseado na maioria,
ele observou que esta maioria que apresentava comportamentos considerados
pelo mesmo como inadequados. Assim, reformulando a sua teoria, ele
inverteu-a, afirmando que a loucura faz-se presente naqueles indivíduos que
possuem comportamentos totalmente condizentes com o esperado
socialmente, ou seja, não possuem o que ele denominou de desvio de caráter.
Através desta teoria, ele observou que todos então estariam curados, já que,
por meio da sua percepção, todos os indivíduos possuíam comportamentos
considerados inadequados – exceto ele mesmo. Simão demonstra, portanto,
uma atitude usual do ser humano: só se considera certo e normal aquilo que se
associa às suas percepções e valores, e portanto, ao próprio comportamento.
Assim, dentro da visão do próprio individuo ele quem age certo, como o
esperado e adequado, sendo o reflexo disto, portanto, a sociedade, ou mais
precisamente, os grupos sociais. Assim, indivíduos que compartilham desta
mesma percepção, constituem grupos sociais visando – conscientemente ou
não – formas de dominação e poder sobre os demais, apesar de, mesmo não
percebendo, possuírem suas particularidades. Explicita-se isto na questão de
que quanto maior o progresso civilizatório, maior a ‘’força’’ que o grupo possui,
e assim, maior a necessidade de inserir indivíduos no padrão dominante e,
consequentemente, aumenta a população considerada ‘’inadequada’’ ou
‘’insana’’.