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Hoje. porém, quando a crítica serena da História tem margem de imperar,
vão aos poucos aparecendo, no meio dos lugares-comuns e das frases incon-
dicionais de louvor, alusivas à religião do Estado, os torneios de sua argu-
mentação e as filigranas de sua dialética filosófica.
Pena foi que algumas de suas obras, como por exemplo os Princípios sociais
e políticos de Santo Agostinho e os Princípios sociais e políticos de Santo
Tomás de A quina, editados em Recife em 1866, estejam praticamente perdi-
das. Não só no Rio de Janeiro como em outras grandes capitais brasileiras,
inclusive Recife, não conseguimos encontrá-las em nossas andanças culturais.
A própria e veneranda Faculdade de Direito de Recife poucas obras de José
Soriano de Souza guarda em sua biblioteca, como tivemos ocasião de veri-
ficar pessoalmente em outubro de 1980.
No opúsculo A Religião do Estado e a liberdade dos cultos, Soriano co-
meça por fixar o conceito de liberdade, aceitando-a como a faculdade de
fazer o bem e o mal ou de escolher entre os contrários.
Enquanto a nação brasileira mantiver a fé católica, dizia ele, esta será natu-
ralmente a religião do Estado.
Aliás, embora a liberdade de pensar seja limitada à ordem subjetiva e
psicológica, os livres pensadores pretendem-na "transferir à ordem objetiva
e real, concluindo do poder de pensar o direito de manifestar todos os pen-
samentos" .
Mas, se do pensamento de roubar alguém pretende passar ao ato, "a liber-
dade natural de pensar encontra limitação no direito natural que protege a
propriedade" .
Razão tinham as encíclicas Quanto cura e Mirari ao condenar a propo-
sição "que todo homem tem liberdade absoluta, omnimodam libertatem, de
manifestar suas opiniões pela palavra, imprensa ou por qualquer outro modo".
Dando ao homem liberdade de pensar, Deus vedou-lhe, contudo, pensar
no mal nos 69 , 79 , 99 e 109 mandamentos do Decálogo.
De outro lado, o direito limita a liberdade. Se temos liberdade para roubar
e matar, não temos direito de ser ladrões ou assassinos.
A possibilidade de fazer o mal não é da essência da liberdade mas um
verdadeiro abuso desta, já que Deus e os anjos são impecáveis. O erro, ade-
mais, acrescenta, não é da essência da razão mas uma lamentável possibili-
dade sua.
Daqui passa Soriano do conceito de liberdade moral para a questão da
liberdade de cultos. Existe a liberdade de optar por um culto falso, mas não
o direito. De outro lado, a razão natural não prescreve a forma do culto.
Mas, com a Revelação, a forma tomou-se única.
Tal verificação depende, entretanto, da fé. Com outra fé, impõe-se outro
culto, dirão os inimigos.
Mas, para exercer falsas religiões, diz Soriano, não há invocar-se o direito
mas, quando muito, a tolerância.
Na obra Considerações sobre a Igreja e o Estado, versa problema do pa-
droado e afinal, na filosofia do direito e no seu último livro de Direito
constitucional, reconhece as dificuldades ocorrentes, mesmo em uma sociedade
cristã, em que deve haver união sem confusão e distinção sem separação.
No seu último livro, louva mesmo, como vimos, a separação da Igreja e do
Estado. Do mesmo modo vai pronunciar-se Dom Antonio Macedo Costa na
Pastoral coletiva do episcopado sobre a República.