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Pontes

Agosto 2008 Vol.4 No.4


ISSN: 1813-4378

ENTRE O COMÉRCIO E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

1 Rodada Doha: chegamos


muito perto, mas não
Rodada Doha: chegamos muito perto,
chegamos lá...
3 TRIPS: daqui para onde?
mas não chegamos lá...
5 Serviços educacionais no Pela terceira vez consecutiva, uma reunião ministerial da Rodada Doha da OMC, que
GATS: desafios para o Brasil tinha como objetivo alcançar um acordo sobre modalidades de agricultura e acesso
Umberto Celli Junior a mercado de bens não-agrícolas (NAMA, sigla em inglês), terminou em fracasso.
7 Bens e Serviços Ambientais Após o colapso de 29 de julho, é virtualmente dos impasses sobre modalidades, que incluem
no Brasil impossível que os ministros concluam um acordo fórmulas e números para os futuros limites
Cecília Häsner e de Doha em um futuro próximo. O futuro das tarifários e de subsídios. Chegou-se a um acordo
Shigeo Shiki novas negociações comerciais multilaterais é para dezoito dos vinte temas relacionados a
9 Liberalização Comercial, bastante incerto, principalmente devido às agricultura e NAMA. Divergências relativas a
Emprego e Redução da eleições que ocorrem nos Estados Unidos da medidas de salvaguarda especial (SSM, sigla
Pobreza: resultados América (EUA), em novembro próximo, e na Índia, em inglês), entretanto, persistiram, e o tema
indiretos e questionados em 2009. Outro fator que agrega incerteza é a “algodão” não foi abordado – para infelicidade
Viviane Ventura-Dias falta de clareza quanto aos interesses políticos dos africanos, que sofrem com os efeitos dos
dos EUA de dar ou não continuidade aos acordos subsídios ao algodão estadunidense.
11 Políticas públicas da OMC, seja por parte do Congresso seja da
para a exportação de O grupo de potências comerciais G-7 (Austrália,
nova administração presidencial.
investimentos nos BRICs Brasil, China, UE, Índia, Japão e EUA) também
Alcançar um acordo neste ano deveria ter sido não foi capaz de acordar um nível mínimo
12 Novos atores para mais fácil que nos dois anos anteriores, pois os para o qual o SSM entraria em vigor. Os EUA
o desenvolvimento progressos alcançados pelos negociadores desde mantiveram-se firmes em sua posição de
sustentável: as instituições setembro passado deram aos Membros da OMC uma 40% de aumento do volume de importações,
financeiras idéia mais clara dos ganhos a serem alcançados afirmando que esse era o valor mais baixo que
com as complexas negociações agrícolas. poderiam aceitar para SSM que excedesse os
14 Biocombustíveis e
sustentabilidade: a Um retrospecto da mini-ministerial mostra que níveis tarifários consolidados. China e Índia,
certificação é a resposta? é possível que o elemento de maior surpresa de outro lado, insistiram que o limite de 40%
não tenha sido o colapso, mas sim o quão era muito alto para assegurar que agricultores
17 A “apreciação” das perto os ministros chegaram de um acordo. não fossem prejudicados pelo aumento de
exportações agrícolas Segundo Pascal Lamy, Diretor Geral da OMC, importações agrícolas subsidiadas provenientes
brasileiras: novo impulso à os negociadores solucionaram, durante nove de países desenvolvidos (PDs) e pediram que
Rodada do Desenvolvimento dias de duras negociações, por volta de 85% as salvaguardas mais altas fossem utilizadas a
Thalis Ryan de Andrade

Você sabia?
Que entre 1947 e 1998 foram concluídos 12 acordos multilaterais de comércio, ao passo que entre
1999 e 2008 não houve nenhum? A OMC, entretanto, não esteve parada durante esses últimos anos...
Fatos básicos da OMC desde 2008:
• Número de disputas: 378 (245 só na última década)
• Ascensão de novos Membros: 21
• Desde 2007, os 12 novos Membros representam cerca de US$ 1,4 trilhões em importações
(um décimo das importações mundiais), tendo tais países triplicado o volume de suas
importações em 2000.
Os três primeiros anos da OMC foram de intensivas negociações:
• Conclusão do Acordo sobre Tecnologia da Informação em 1996: eliminação de tarifas para
computadores e semicondutores
• Conclusão dos Acordos sobre Serviços Financeiros e Telecomunicações Básicas em 1997:
primeiras investigações sobre o comércio de serviços; e
• Compromisso de “ciberespaço” livre de tarifas em 1998: emails e transferência de dados.
Desde então não houve mais acordos multilaterais...
Fonte: Progressive Policy Institute

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Espa ço ab e r t o Pontes Agosto 2008 Vol.4 No.4

Editorial partir de um volume de importação de 10% ou 15%. Diversos países em desenvolvimento


(PEDs), inclusive os membros do G-33, apresentaram propostas similares.
Estimado(a) leitor(a),
Susan Schwab, Representante Comercial dos EUA, afirmou, por sua vez, que um limite
A Equipe Pontes tem o prazer de muito baixo poderia significar um retrocesso em relação a décadas de liberalização
apresentar-lhes o novo formato da comercial. Oficiais indianos rebateram a afirmação dizendo que a possibilidade de mal
publicação Pontes entre o Comércio uso de SSM é muita baixa. Os PEDs dificilmente imporiam medidas de salvaguarda sobre
e o Desenvolvimento Sustentável. alimentos cujos preços estão em alta.
Além de mudanças visuais, a nova
configuração da revista apresenta
uma seção que traz publicações Posições e opiniões sobre o insucesso da Rodada
recentes sobre comércio e As primeiras reações dos governos ao colapso da mini-ministerial não foram caracterizadas
desenvolvimento sustentável de pelas acusações que marcaram colapsos similares no passado. EUA e Índia restringiram suas
relevância para a região.
acusações mútuas apenas à questão da intransigência em relação a SSM. A UE indicou ter
A edição de agosto de 2008 apresenta tentado balancear cortes a seus subsídios agrícolas com acesso aos mercados industriais e
uma análise sobre o fracasso das de serviços de PEDs, apesar de não tocar em acesso a seus mercados agrícolas (conforme
negociações da Rodada Doha da pretendiam os EUA). Apesar dessas disputas menores, todos concordaram com o fato de
OMC em julho passado, assim como que um acordo esteve muito próximo de concretizar-se.
um quadro dedicado à Medida de
Salvaguarda Especial – tema que Somente o futuro dirá se os Membros conseguirão dar seqüência às negociações, partindo
levou a mini-ministerial ao fracasso do ponto de onde estavam antes do colapso. Apesar de diversos pedidos para que se retenha
em julho. A seção intitulada “OMC em o que foi colocado na mesa de negociações em Genebra, é verdade que os governos não
foco” traz, ainda, um editorial sobre estão obrigados a cumprir os compromissos apresentados durante a ministerial.
a situação atual das negociações O risco é, portanto, que, apesar do não questionamento enfático pelos Membros, a Rodada
sobre TRIPs na OMC. Além disso, o
presente número conta com dois perca força nos próximos meses. Não se deve perder de vista que diversos PEDs nunca
artigos sobre serviços no Brasil: estiveram convencidos da necessidade de uma nova rodada de negociações comerciais e
um dedicado à análise de serviços somente concordaram com o lançamento da Rodada Doha após os ataques terroristas de
educacionais, assinado por Umberto 11 de setembro de 2001, quando ajustou-se que uma “rodada para o desenvolvimento”
Celli; e outro sobre serviços e bens ajudaria a balancear certas regras comerciais multilaterais. Outro ponto sensível é
ambientais, de autoria de Cecília que interesses da própria UE na Rodada Doha diminuíram, na medida em que temas
Hanser e Shigeo Shiki. como regras para investimentos externos e políticas de concorrência saíram da mesa de
negociação devido a objeções de PEDs.
Há três artigos que compõem a
seção seguinte, intitulada “Outros As opiniões dos especialistas tocam em questões um tanto sistêmicas sobre os compromissos
temas multilaterais”: o primeiro e o gerenciamento do comércio internacional. Patrick Messerlin, professor de Economia
versa sobre a relação entre comércio do Institut d’Etudes Politiques de Paris, por exemplo, afirma que, sem os compromissos
internacional e pobreza, artigo de objetivados para essa Rodada, PEDs como Brasil e Índia podem dobrar ou até triplicar
autoria de Viviane Ventura-Dias. suas tarifas industriais sem sofrer penalidades. Por isso, acredita que consolidar as tarifas
O segundo faz uma análise sobre nos atuais níveis aplicados (que são baixos) asseguraria que não sejam elevadas, por
investimentos externos diretos
com origem nos países BRICs; e o exemplo, de 12 a 30% nos PEDs. Messerlin ressaltou que o maior valor da Rodada Doha
terceiro avalia os novos atores para seria, assim, o de prevenir um retrocesso comercial, especialmente no caso de uma séria
o desenvolvimento sustentável: as crise econômica global.
instituições financeiras.
Próximos passos: qual o futuro do comércio internacional
O sexto artigo que compõe a multilateral?
série sobre biocombustíveis trata
dos entraves e oportunidades A atual mudança no equilíbrio há até pouco tempo existente entre as principais potências
relacionados à certificação dessa econômicas globais alterou o processo de desenvolvimento das regras comerciais. Segundo
fonte energética. Por fim, Thalis Sandra Polaski, do Carnegie Endowment for International Peace, o fato das negociações
Ryan de Andrade traça uma análise terem fracassado por conta de uma disputa em SSM confirma que os sete anos de negociação
sobre as oportunidades que se abrem coincidiram com o rápido crescimento de China, Índia e demais economias emergentes
ao Brasil no contexto de alta no
como importantes exportadores, mercados de importação e negociadores de peso. Tais
preço dos alimentos.
países passaram a exigir que temas que afetem seu desenvolvimento sejam levados em
Esperamos que o conteúdo e a consideração. Qualquer acordo alcançado será substancialmente diferente do regime
configuração desta edição da comercial atual, o que conseqüentemente significará um melhor negócio para os PEDs, na
publicação Pontes entre o Comércio opinião de Sandra Polaski.
e o Desenvolvimento Sustentável
lhes agradem. Colocamo-nos à É importante ressaltar, entretanto, que os PEDs possuem interesses comercias distintos,
disposição para eventuais sugestões evidenciados durante a mini-ministerial em julho passado. O Brasil, por exemplo, concordou
e comentários. com os limites de SSM propostos por Pascal Lamy, ao passo que os demais países do G-20,
como China e Índia, não compartilharam desse posicionamento. Ao serem questionados
Encorajamos nossos leitores a sobre uma possível separação do G-20 por essa e outras divergências, o Ministro das
consultar também nossa publicação Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, e o Ministro de Comércio da Índia, Kamal
quinzenal (Pontes Quinzenal) e Nath, ressaltaram que o G-20 – formado em 2003 como um grupo de PEDs formalmente
a visitar o novo site do ICTSD: opostos à proposta conjunta sobre agricultura de EUA e UE – nunca teve uma posição
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comum relativa a parâmetros para SSM. O que esses líderes celebram é o fato de as regras
Atenciosamente, comerciais não serem mais elaboradas somente pelos países ricos; as posições de PEDs
passam a ter cada vez mais influência no processo negocial .
Equipe Pontes
Tradução e adaptação de artigo originalmente publicado em Bridges Weekly Trade News Digest vol. 12, n. 27,
07 ago. 2008.

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