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A PARTICIPAÇÃO DO BRASIL NA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO

Matheus Nascimento Moraes1

Compreender a dinâmica que o Brasil movimenta dentro da OMC exige encarar a


realidade de seu contexto internacional. Em um mundo que as nações são qualificadas com
base em seu grau de desenvolvimento econômico, um país denominado “em
desenvolvimento”, tal como o Brasil, tem seus esforços políticos nacionais e internacionais
determinados por essa condição (CERVO, 2015). Assim sendo, o papel do Brasil dentro da
OMC consiste, em linhas gerais, no empenho para tornar as relações comerciais entre os
países desenvolvidos e os países em desenvolvimento menos desequilibradas. O que se traduz
em grande medida não somente pelos posicionamentos que as coalizões lideradas pelo Brasil
vêm adotando nas rodadas de negociação da OMC, mas também pela forma como participa
de seu sistema de resolução de controvérsias.
A Organização Mundial do Comércio é resultado de um processo histórico de
integração comercial internacional que se iniciou em 1948. Naquele ano, entrou em vigor o
Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, um tratado internacional celebrado por 23 países que
tinha o objetivo de reduzir as tarifas comerciais. Desse modo, com a ausência de uma
organização para coordenar a cooperação comercial, o GATT assumiu esse papel, ainda que
de forma menos institucionalizada (HERZ; HOFFMAN, 2004). No entanto, após algumas
décadas de negociações bem sucedidas, a globalização foi o vetor de inúmeras novas
questões nas negociações de cooperação comercial, tais como direitos de propriedade
intelectual e a proliferação do uso de barreiras não-tarifárias, o que minou a eficiência dos
acordos, já que não tratavam desses aspectos. Portanto, estava clara a urgência de uma ampla
reforma que fornecesse instrumentos para lidar com a incorporação desses novos temas.
Então, em 1995, os signatários do GATT criaram a OMC (HERZ; HOFFMAN, 2004).
A OMC é a instituição multilateral responsável pela regulamentação do comércio
internacional. Seus diversos órgãos se reúnem para monitorar a implementação de acordos e a
execução da política comercial dos países membros, bem como negociar o acesso de novos
participantes e acompanhar os processos de solução de controvérsias (GOVERNO
FEDERAL, 2018). O Brasil é membro fundador do GATT e, portanto, da OMC. Dentro dela,
vem desempenhando um notável papel no balanceamento das relações comerciais
internacionais. O que se traduz no modo como se posiciona nos processos de consulta e

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Discente de Relações Internacionais da Universidade Católica de Brasília.

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negociação, assim como nas atividades de solução de controvérsias. Nesse sentido, a
eliminação das assimetrias comerciais e a construção de um ambiente favorável ao
desenvolvimento se configuram como os principais objetivos do Brasil na organização.
Ilustrativo de tal fato, a consistente postura brasileira ao longo da última rodada da
OMC (Doha) demonstra o comprometimento em alcançar esses objetivos. A Rodada Doha
ficou marcada por ter dado ênfase às necessidades dos países em desenvolvimento. Nesse
sentido, o Brasil e outros países entenderam que o ponto central das negociações deveria ser a
agricultura —já que a economia desses países se concentra nesse setor—, defendendo a
redução de subsídios aos agricultores dos países desenvolvidos e a ampliação de acesso a
esses mercados através da redução de tarifas (MRE, 2014). Ademais, cabe ressaltar que o
Brasil exerceu papel de liderança na coordenação das posições da coalizão de países em
desenvolvimento da América Latina, Ásia e África durante as negociações agrícolas na
OMC. Assim, sinalizando a oposição do Brasil aos países desenvolvidos que esperavam dar
continuidade às políticas que afastavam os países em desenvolvimento de seus mercados,
algo que rendeu avanços significativos em termos de equilíbrio nas relações comerciais.
Outra forma de compreender a participação do Brasil na OMC é observar o trabalho
realizado no Mecanismo de Solução de Controvérsias. Nesse sentido, houve dois grandes
casos em que o Brasil esteve envolvido, o contencioso Brasil-Canadá (Embraer/Bombardier)
e o contencioso Brasil-EUA (Caso do Algodão). No primeiro, o Canadá acusou o Brasil de
conceder subsídios proibidos a Embraer e, em contrapartida, o Brasil alegou que não se
tratava simplesmente de subsídios, mas sim de uma operação que nivelava as condições de
concorrência; no segundo, o Brasil denunciou os EUA por concederem subsídios proibidos à
exportação e à produção de algodão. Ambos contenciosos, enfim, terminaram de modo
favorável ao Brasil (ANDRADE, 2013), algo que, se posto em perspectiva, assinala que a
própria OMC reconhece que os desenvolvidos desfrutam de vantagens competitivas.
Em síntese, o ponto é que em meio a uma lógica em que os países desenvolvidos
buscam manter suas vantagens competitivas em detrimento dos demais, o Brasil concentra
esforços em construir um ambiente mais favorável aos países em desenvolvimento, de modo
que as discrepâncias nas relações mundiais de comércio sejam minimizadas. Por extensão, a
política externa brasileira identifica as rodadas de negociação e o Mecanismo de Solução de
Controvérsias da OMC como importantes instrumentos para concretização de seus objetivos.
Assim, o Brasil ascendeu a uma posição mais favorável no plano internacional e se tornou um
dos atores de maior relevância para a elaboração de acordos no âmbito da OMC, uma vez que
a estratégia de assumir a liderança dos países em desenvolvimento vem rendendo frutos.

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REFERÊNCIAS

ANDRADE, Luciano Mazza de. O contencioso do algodão: o desafio da implementação. In:


BENJAMIN, Daniela Arruda (org.). O Sistema de Solução de Controvérsias da OMC:
uma perspectiva brasileira. Brasília: FUNAG, 2013.

CERVO, A. L.: ; BUENO, Clodoaldo. História da Política Exterior do Brasil. 5° Edição


rev. e amp. Brasília: UnB, 2015.

GOVERNO FEDERAL. Sobre a OMC. Disponível em:


https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/relacoes-internacionais/negociacoes-comerciais
/omc-organizacao-mundial-do-comercio/sobre-a-omc. Acesso em: 18 de março de 2021.

HERZ, Mônica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro. Organizações Internacionais: história e


práticas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. Rodada de Doha da Organização


Mundial do Comércio. Acesso em:
http://antigo.itamaraty.gov.br/pt-BR/politica-externa/diplomacia-economica-comercial-e-fina
nceira/694-a-rodada-de-doha-da-omc. Acesso em: 18 de março de 2021.

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