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Módulo
Presidente
Diogo Godinho Ramos Costa
Equipe
Alden Caribé (Conteudista, 2021).
Ana Beatrice Neubauer (Revisora, 2021)
Erley Ramos Rocha (Coordenador Web e Implementador Articulate, 2021).
João Paulo Albuquerque Cavalcante (Diagramação e produção gráfica, 2021).
Juliano Pimentel (Conteudista, 2021).
Lavínia Cavalcanti (Coordenadora de desenvolvimento, 2021).
Rodrigo Mady da Silva (Implementador Moodle, 2021)
Enap, 2021
Olá!
Sugerimos que você leia o conteúdo e responda as questões na ordem em que estão dispostos.
Mas você é livre para fazer isso quando e na ordem em que achar melhor - dentro do período de
duração do curso. Só não deixe de garantir que fez tudo, para não ter problemas com a obtenção
do certificado ao final do curso!
Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer o que é um programa de compliance
concorrencial e qual o papel do Cade na promoção da cultura da concorrência.
Não é difícil perceber a prática de cartel, certo? O cartel ocorre quando concorrentes atuam para
combinar preços, quantidades ou dividir o mercado. Nesse caso, as empresas combinaram o
reajuste uniforme dos preços do aço a partir de uma certa data.
Saiba mais
Conforme a Lei 8.137/90, artigo 4°:
Mas então, sendo crime, por que os executivos das maiores siderúrgicas do Brasil iriam até Brasília
se reunir com um dos órgãos que investigavam essas infrações para informar que reajustariam
E, não! Eles não estavam lá para confessar a infração e propor um acordo de leniência com o
governo. À época, sequer existia a possibilidade desse tipo de acordo.
Saiba mais
O acordo de leniência é uma convenção por meio da qual empresas e/ou pessoas
físicas envolvidas em um cartel, ou em outra prática anticoncorrencial coletiva,
obtêm benefícios na esfera administrativa e criminal, comprometendo-se a
cessar a conduta ilegal, denunciar e confessar sua participação no ilícito, bem
como a cooperar com as investigações apresentando informações e documentos
relevantes.
De 1996 para cá, muita coisa mudou. O caso descrito ficou conhecido como o Cartel de Aço e
resultou na primeira condenação por cartel proferida pelo Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade). Centenas de condenações por cartel ocorreram desde então. A prática de
cartel é reconhecidamente ilegal e é difícil imaginar que, atualmente, empresários sigam para
Brasília para comunicar ao governo uma combinação de preços. Entretanto, a revelação da
Operação Lava Jato de dezenas sobre cartéis em licitações públicas nos últimos anos mostra que
a formação de cartel talvez ainda seja uma prática no ambiente de negócios brasileiro. É cultural?
Mas criar uma cultura de integridade não é algo simples. Não se muda a cultura com um simples
e-mail da chefia ou com um treinamento aos funcionários. Requer tempo, mudança nos processos
de trabalho, esforço e reforço em todos os níveis da organização.
A expressão compliance vem do inglês, to comply, que significa exatamente cumprir ou estar
O elemento ético do programa de compliance concorrencial pode ser entendido como uma
cultura de negócios positiva, de concorrência livre e justa, que ultrapassa a ideia de apenas
cumprir a lei para evitar sanções. Isso implica a construção de uma cultura de negócios que
promove o consenso em torno da necessidade de fazer o certo.
Esse conceito é importante e vale a pena analisarmos cada um de seus cinco elementos.
Conjunto de medidas
Desse modo, não se trata de uma ação isolada, mas sim de uma reunião de ações coordenadas
que, em conjunto, buscam auxiliar uma organização a estabelecer e manter um determinado
padrão de conduta.
Internas
Essas medidas possuem um caráter interno à organização. Portanto, em essência, não se trata de
uma medida regulatória pela qual uma autoridade externa exerce um poder sobre a organização.
São medidas de autocontrole e autorregulação adotadas por uma organização que entende estar
exposta a riscos de violação a um padrão de conduta considerado adequado.
Por outro lado, o caráter interno do compliance não impede que políticas públicas incentivem
ou exijam a adoção do programa de compliance; ou que uma organização possa ser afetada pelo
programa de compliance de outra organização, como clientes e fornecedores.
O ideal é que o programa de compliance consiga prevenir ilícitos e que infrações sequer venham a
ocorrer. Entretanto, por melhor que seja o programa, não é possível assegurar que uma violação
nunca venha a ocorrer. A prevenção é a diretriz fundamental, mas pode não ser suficiente.
Portanto, o compliance deve ser capaz também de identificar a ocorrência de infrações e atuar
para corrigir os seus efeitos.
É importante destacar que não existe uma abordagem de compliance adequada a toda e
qualquer organização. Cada programa deve ser formulado para enfrentar os riscos concorrenciais
específicos de uma organização.
Uma organização pode ser responsabilizada ou sofrer as consequências de uma violação das
leis, mas quem pratica a infração é sempre um ser humano, seja ele sócio, administrador ou
colaborador dessa organização. Logo, as ações de compliance estão voltadas para orientar a ação
dos indivíduos na organização.
Procedimentos e sistemas não são capazes de gerenciar riscos sozinhos. Em última instância, as
pessoas são responsáveis pela gestão dos riscos. Os colaboradores podem apresentar diferentes
motivações e níveis de tolerância a riscos, cabendo ao programa de compliance estabelecer
valores, objetivos e procedimentos que assegurem o compromisso das pessoas para que suas
ações estejam adequadas aos padrões de comportamento aceitos pela organização e admitidos
pela legislação.
Desse modo, estes são os dois objetivos centrais de todo e qualquer programa
de compliance concorrencial: prevenir e detectar violações à ordem econômica.
Muito embora o Cade venha aumentando a sua capacidade de detectar e investigar infrações à
ordem econômica, com a aplicação de multas cada vez mais severas, a abordagem punitiva de
forma isolada não é suficiente.
BRASIL. Banco Central do Brasil. Resolução nº 4.595, de 28 de agosto de 2017. Dispõe sobre a política
de conformidade (compliance) das instituições financeiras e demais instituições autorizadas
a funcionar pelo Banco Central do Brasil. Banco Central do Brasil, Brasília, 2017b. Disponível
em: https://www.bcb.gov.br/pre/normativos/busca/downloadNormativo.asp?arquivo=/Lists/
Normativos/Attachments/50427/Res_4595_v1_O.pdf. Acesso em: 17 dez. 2020.
BRASIL. Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária,
econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Presidência da República,
Brasília, 1990.
BRASIL. Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016. Dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa
FEBRABAN. Federação Brasileira de Bancos. Guia Boas Práticas de Compliance. Infi, 2018.
Disponível em: https://portal.febraban.org.br/pagina/3228/52/pt-br/guia-compliance. Acesso
em: 04 fev. 2021.
FRAZÃO, A.; Medeiros, A. Desafios para a efetividade dos programas de compliance. In: Cueva, R.;
Frazão, A. Compliance: perspectivas e desafios dos programas de conformidade. Belo Horizonte:
Fórum, 2019.
MURPHY, J. E. A Compliance & Ethics Program on a Dollar Day: how small companies can have
effective programs. Minneapolis: Society of Corporate Compliance and Ethics, 2010. Disponível
em: https://assets.corporatecompliance.org/Portals/1/PDF/Resources/CEProgramDollarADay-
Murphy.pdf. Acesso em: 04 fev. 2021.
Ao final desta unidade, você será capaz de identificar os fatores que levam uma organização a
adotar um programa de compliance concorrencial, os benefícios e custos dessa adoção, além
dos riscos dos programas de fachada.
Fatores externos
Uma força externa, como uma investigação antitruste, pode levar uma organização a adotar
um programa de compliance como medida de urgência, para auxiliar a esclarecer os eventos e
reduzir a exposição da organização, enquanto lida com os procedimentos de investigação.
Fatores internos
Por exemplo, uma liderança interna que, consciente da necessidade de gerenciar adequadamente
os riscos da organização, patrocina uma estratégia para desenvolver capacidades e ações de
compliance.
Possivelmente, a razão para que sua organização adote um programa de compliance deve se
encontrar em um meio termo entre esses dois extremos.
Já no setor bancário, a Resolução CMN nº 4.595/17 e a Circular Bacen nº 3.865/17 exigem que
instituições financeiras, administradoras de consórcio e instituições de pagamento implementem
política de compliance (conformidade). A Federação Brasileira de Bancos possui também
um Guia de Boas Práticas de compliance.
Concluindo, podemos dizer que a decisão de uma organização por implantar um programa de
compliance deve ocorrer mediante a uma análise de riscos concorrenciais.
Todas as organizações, mesmo pequenas, que estejam submetidas a riscos concorrenciais devem
considerar a implantação de medidas para prevenir e mitigar esses riscos.
Prevenção de riscos
Além dos prejuízos de reputação, financeiros e às atividades das pessoas jurídicas infratoras, há
também o impacto negativo sobre as pessoas físicas envolvidas, que podem ser responsabilizadas
criminalmente e impedidas de exercer função de direção em outras empresas.
O guia também ressalta e é sempre bom ficar atento: a mera existência de um programa de
compliance não é suficiente para afastar a possibilidade de imposição pelo Cade das penalidades
administrativas, que incluem, como já citado, multas potencialmente vultosas.
Da mesma forma, quando uma empresa negocia um acordo com o Cade, é possível que o
compliance seja considerado no cálculo da multa esperada para definir o valor da contribuição
pecuniária a ser paga em eventual acordo com o Cade (Termo de Compromisso de Cessação).
Nesse caso, deve-se demonstrar que o programa de compliance tem relação direta com a decisão
de propor a celebração com acordo com o Cade.
Saiba mais
O Termo de Compromisso de Cessação (TCC) consiste em uma modalidade de
acordo celebrado entre o Cade e as organizações e/ou pessoas físicas investigadas
por infrações à ordem econômica, pelo qual o Cade concorda em suspender
o prosseguimento das investigações enquanto estiverem sendo cumpridos os
termos do compromisso. Para celebrar o TCC, a organização reconhece a sua
participação na conduta, colabora com as investigações e concorda em recolher
uma contribuição pecuniária calculada a partir de um desconto aplicado sobre
a multa esperada. Para saber mais sobre esses acordos, acesse ao Guia de TCCs
do Cade.
Ainda assim, é importante lembrar que a possibilidade de o Cade considerar, diante das
circunstâncias de cada situação, a existência de um programa robusto de compliance concorrencial
como evidência de boa-fé, a adoção do programa, por si só, não é garantia de redução de
eventuais penalidades.
Benefício reputacional
Uma organização reconhecida por sua cultura de integridade e ética melhora a sua reputação,
o que pode trazer benefícios como recrutamento e retenção de talentos. Essas ações tendem
a aumentar a satisfação e o comprometimento no trabalho e o senso de pertencimento e
identificação com o grupo.
O compliance também pode abrir portas junto a outros parceiros. O comprometimento com a
observância das leis também inspira confiança em investidores, parceiros comerciais, clientes e
consumidores que valorizam organizações que operam de forma ética.
Um programa de compliance efetivo não apenas reduz os riscos de uma organização violar a
legislação concorrencial, mas também ajuda a prevenir que ela se torne vítima de condutas de
outras organizações.
A relação com terceiros que violam a legislação pode ser muito prejudicial para um agente
econômico. Por exemplo, uma empresa pode ser prejudicada pelo abuso de posição dominante
de um concorrente ou de um fornecedor, ou uma associação do setor em que atua pode promover
práticas uniformes entre concorrentes que violam a legislação.
Um programa de compliance pode evitar que as empresas e seus funcionários tenham custos
e contingências com investigações, advogados, multas, publicidade negativa, interrupção das
atividades, inexequibilidade dos contratos ou cláusulas ilegais, indenizações, entre outras.
De acordo com o estudo de Mario Shapiro e Sarah Marinho, publicado em 2019, se um programa
de compliance for muito custoso, sua sustentabilidade ao longo do tempo pode ser prejudicada.
Por outro lado, se um programa for ineficaz, a ausência de efeitos poderá ser sentida quando os
riscos concorrenciais forem concretizados.
Uma organização de grande porte terá, certamente, que alocar recursos de forma apropriada.
Uma empresa com muitos funcionários provavelmente gastará mais com seu programa de
compliance do que uma empresa pequena, como poderá precisar da consultoria de um
profissional especializado, especialmente se a empresa possui alta participação nos mercados
em que atua.
Vale a pena uma última reflexão: em um estudo sobre os desafios para a efetividade dos
programas de compliance, publicado em 2018, Ana Frazão ressalta que os custos podem ser
minorados por um mapeamento de riscos bem-feito, que permita a alocação adequada dos
recursos de modo que os valores destinados ao compliance sejam investidos, prioritariamente,
nas áreas mais sensíveis.
Algumas organizações podem decidir adotar um programa de compliance apenas por obrigação
ou pela aparência de integridade, sem comprometimento ou reais intenções de prevenir a
ocorrência de práticas anticoncorrenciais.
Esses programas meramente formais são conhecidos como programas de fachada (em inglês,
shamprograms). São pouco eficazes em prevenir e mitigar riscos concorrenciais e podem representar
custos para as organizações, sem os benefícios correspondentes aos de um programa efetivo.
BRASIL. Banco Central do Brasil. Resolução nº 4.595, de 28 de agosto de 2017. Dispõe sobre a política
de conformidade (compliance) das instituições financeiras e demais instituições autorizadas
a funcionar pelo Banco Central do Brasil. Banco Central do Brasil, Brasília, 2017b. Disponível
em: https://www.bcb.gov.br/pre/normativos/busca/downloadNormativo.asp?arquivo=/Lists/
Normativos/Attachments/50427/Res_4595_v1_O.pdf. Acesso em: 17 dez. 2020.
BRASIL. Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária,
econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Presidência da República,
Brasília, 1990.
BRASIL. Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016. Dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa
FEBRABAN. Federação Brasileira de Bancos. Guia Boas Práticas de Compliance. Infi, 2018.
Disponível em: https://portal.febraban.org.br/pagina/3228/52/pt-br/guia-compliance. Acesso
em: 04 fev. 2021.
FRAZÃO, A.; Medeiros, A. Desafios para a efetividade dos programas de compliance. In: Cueva, R.;
Frazão, A. Compliance: perspectivas e desafios dos programas de conformidade. Belo Horizonte:
Fórum, 2019.
MURPHY, J. E. A Compliance & Ethics Program on a Dollar Day: how small companies can have
effective programs. Minneapolis: Society of Corporate Compliance and Ethics, 2010. Disponível
em: https://assets.corporatecompliance.org/Portals/1/PDF/Resources/CEProgramDollarADay-
Murphy.pdf. Acesso em: 04 fev. 2021.