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[IGOR ANGÉLICO]

UMA CONCISA CRÍTICA À ÉTICA DE HANS-HERMANN HOPPE


Hans-Hermann Hoppe, através de sua ética argumentativa, estabelece condições supostamente
transcendentais para a argumentação, a fim de utilizar a contradição performática, tão estimada por
Karl-Otto Apel e Jürgen Habermas, para denunciar uma inconsistência àqueles que argumentem
contra tais condições. A principal destas condições é a que diz que devemos respeitar a autonomia
dos indivíduos interlocutores na argumentação, sob pena de, ao não respeitar, não estarmos mais
argumentando.
Antes de descrever tal como condição transcendental, Hoppe postula um elemento chave para sua
tese: a única forma de se justificar a validade de uma proposição é através da atividade
argumentativa:

"However, argumentation itself reveals the possibility that argumentation presupposes action
because validity claims can only be explicitly verified in the course of an argumentation if the
individuals doing so already know what it means to act and have knowledge implied in action." [1]

Ou seja, isso implica numa bicondicional, pois uma justificação só o é SE E SOMENTE SE se dá


numa argumentação, ou seja (Jx ⇔Ax). Para que tal proposição se mostre falsa, precisamos provar
que

∃x (¬((Jx → Ax) ∧(Ax → Jx)))

E isso é bem simples, mas antes de provar tal, precisamos entender o que é a argumentação. Hoppe
diz:

"First, it must be noted that the question of what is just or unjust— or for that matter the even more
general question of what is a valid proposition and what is not—only arises insofar as I am, and
others are, capable of propositional exchanges, i.e., of argumentation" [2]

Ou seja, ele identifica através de 'id est' uma troca proposicional com uma atividade
argumentativa. Portanto, precisamos provar que existe ao menos uma justificação que se dê fora do
escopo de uma troca proposicional.
Hoppe não define exatamente e definitivamente o que ele se refere por justificação, em sua única
tentativa, ele estabelece tal de forma problemática"Justifying means justifying (sic) without having
to rely on coercion" [3], onde ele utiliza o termo 'justificação' para explanar o significado de
'justificar', incorrendo no mesmo problema. No entanto, embora ele não defina exatamente o que ele
quer dizer por 'justificar', ele nos dá indícios do que tal termo pode significar, ao dizer
"However, argumentation itself reveals the possibility that argumentation presupposes action
because validity claims can only be explicitly verified in the course of an argumentation[...]" no
mesmo trecho supracitado e referenciado em [1]. Podemos, portanto, a partir disso, conjecturar que
com 'justificar' ele quis dizer 'verificar explicitamente a validade de requisições'. No entanto, isso
pode ocorrer fora dum curso argumentativo, pois tal validade pode ser verificada de maneira onde
apenas um emite proposições e outro apenas as recepta e sintetiza. Bertrand Russell, no Principia
Mathematica, nos justifica, isto é, explicitamente verifica a validade da requisição '1+1=2', isso fora
de um curso argumentativo, pois não há troca de proposições [4]. Vejamos:
Neste caso, Russell justifica a alguém, o que, no caso, pressupõe intersubjetividade, mas este
alguém representa mera função passiva de recepção informacional, isto é, não há emissão
proposicional por parte do receptor, o que implica em não haver uma troca de proposições. Uma
outra forma de explicitar de maneira mais intuitiva, é a partir do próprio Hoppe. Quando ele
explicita tais proposições acerca de sua tese em seu livro, ele se encontra num monólogo, não em
um diálogo, pois as proposições emitidas são unilaterais e, mesmo assim, ele justifica (mesmo de
forma não cogente) sua tese. Caso tal não fosse possível, não poderíamos concluir nada acerca do
valor-verdade de suas proposições em seu livro, e não existiriam sequer adeptos de tal tese, ou
melhor, não haveriam kantianos, tomistas ou platônicos, pois, como os expoentes de tais teses não
estão mais aqui, não poderiam justificá-las, já que isso só seria possível no curso de uma
argumentação (sic).
Tal crítica, mesmo aqui no Brasil, já fora feita anteriormente por Rian Lobato, em seu texto
denominado “Sobre a Ética Argumentativa Hoppeana”. Tal crítica, como o próprio autor expõe, é
vazia pois:

"[...] não estou falando que a argumentação não é uma defesa que seja considerada um ato
racional, mas sim que nem todo ato de defesa racional se simplifica na forma da argumentação, o
que é a premissa de Hoppe. Explicarei melhor adiante, em outro trecho, mas antes prosseguirei
com alguns pormenores e adendos.

O próprio conceito de “justificação”, em epistemologia contemporânea na realidade, não é


sequer ligado necessariamente à argumentação. Em miúdos, é possível defender racionalmente
uma posição (ética ou não) sem apelo à argumentação, como, por exemplo, por afirmações
panfletárias: neste caso, não haveria argumentação estrita, mas haveria defesa, e não vejo por que
não se poderia chamá-la de racional." [5]

A conclusão final, evidentemente, é a contingencialidade da atividade argumentativa como forma


de justificar proposições, pois mesmo que, em princípio, aceitemos as condições transcendentais
determinadas por Hoppe (o que não aceito de forma alguma [6]) poderíamos justificar proposições
em atividades comunicativas conflituosas, pois apenas a argumentação, supostamente, prescreveria
tal condição de respeito mútuo sobre a autonomia dos interlocutores diante de seus corpos.

Agradecimentos:

Erick
Tomás

Referências
[1] HOPPE Hans-Hermann, Economics and Ethics of Private Property, pp. 280, cap. 9 "On
Praxeology and the Praxeological Foundation of Epistemology"
[2] HOPPE Hans-Hermann, Enonomics and Ethics of Private Property, pp. 341, cap. 13 "On the
Ultimate Justification of the Ethics of Private Property"
[3] HOPPE Hans-Hermann, A Theory of Socialism and Capitalism, pp. 159, cap. 7 "The Ethical
Justification of Capitalism and Why Socialism Is Morally Indefensible"
[4] RUSSELL Bertrand, WHITEHEAD Alfred North, Principia Mathematica, pp. 378. Part. II,
Section A, cap. 59 "The Ordinal Number 2".
[5] LOBATO Rian, Sobre a Ética Argumentativa Hoppeana.
[6] ANGÉLICO Igor, Contra a Ética Argumentativa Hoppeana

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