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HISTÓ RIA DO TEATRO BRASILEIRO –

Mó dulo II
UNIDADE 1 – As iniciativas estudantis e amadoras: formação de
um teatro erudito e elitizado no Brasil

1.Procópio Ferreira: cômico e empresário

Procópio Ferreira (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1898 - Rio de Janeiro,


Rio de Janeiro, 1979). Ator. Narigudo, baixinho e sem pescoço, o antigalã
interpreta não apenas os principais coadjuvantes cômicos, como, com seu
lugar de primeiro ator do teatro brasileiro de seu tempo, leva os autores a
escreverem inúmeras peças para um protagonista interpretado no melhor
estilo Procópio: o cômico inteligente que arma confusões, o feioso esperto
que termina com a moça bonita. Dono de uma riqueza vocal rara, que ele
usa nas mínimas nuances, o ator dá vida a cerca de 500 personagens.
Estuda na Escola Modelo Afonso Pena e em seguida ingressa na Faculdade
de Direito, que não chega a concluir; matriculando-se em segredo na
Escola Dramática Municipal, é expulso de casa pelo pai. Em 1916, ingressa
na companhia de Lucília Peres e estréia em Amigo, Mulher e Marido, de
Robert Flers e Gaston de Caillavet. No Politeama do Méier, atua em
operetas e revistas. No ano seguinte ingressa na Companhia Dramática
Nacional (CDN), de Itália Fausta (1879-1951). Em 1919, passa para a
Companhia de Operetas do Teatro São Pedro e, em 1920, para a companhia
de comédias de Alexandre Azevedo e Antônio Serra, com atores
portugueses.

Seu ingresso no Teatro Trianon se dá por meio do convite para integrar a


Companhia Brasileira de Comédia, organizada por Viriato Corrêa, o
empresário Nicolino Viggiani e Oduvaldo Vianna (1892-1972),
responsável pela direção artística. Atua em Onde Canta o Sabiá, de Gastão
Tojeiro (1880-1965), em 1921, entre outros, geralmente com direção de
Oduvaldo Vianna. Começa a ter êxito no papel de fogueteiro na comédia A
Juriti, de Viriato Corrêa (1884-1967), 1922, gênero que abraça a partir de
então. Com a dissolução da sociedade, um ano mais tarde, o ator decide
fundar sua própria empresa, aos 26 anos. A companhia estreia em São
Paulo, em 1924, com Dick, de Max Dearly, em espetáculo dirigido por
Christiano de Souza. Monta em seguida Meu Bebê, de Margaret Mayor, já
o primeiro sucesso financeiro do empreendimento. Ainda em 1924, estréia
no Rio de Janeiro com O Tio Solteiro, de Ricardo Hichen. Em 1932, com a
montagem do texto de Joracy Camargo (1898-1973), Deus lhe Pague,
interpreta um inventor frustrado, que enriquece pedindo esmola na porta de
uma igreja, gastando o dinheiro em champagne, caviar e amantes caras.
Esse é seu maior êxito, realizando várias temporadas ao longo da carreira,
num total de mais de 3.600 apresentações.

Depois de vê-lo representar, o diretor francês Louis Jouvet escreve-lhe uma


carta convidando-o para viver Sganarelo, em Don Juan, de Molière (1622-
1673), que ele sonha há muito tempo montar. Depois de ver Procópio em
cena, não pensa em outro ator que possa interpretar a personagem. O
convite não é aceito. Provavelmente porque Procópio não admite coadjuvar
- é o primeiro e absoluto ator de sua companhia, em um tempo em que o
carisma e a popularidade do primeiro ator garantem a fluência de público, o
principal objetivo do espetáculo. Segundo o crítico Macksen Luiz (1945),
ele "adaptava a seu estilo toda e qualquer peça, não tendo qualquer pudor
em ajustá-la às suas características, o que explicaria o repertório eclético da
companhia".

De Molière, interpreta O Avarento, 1940. Em Meus Oito Anos, de


Casimiro de Abreu (1839-1860), faz o público rir mostrando como ficaria o
poema se fosse recitado por uma garota de 8 anos, no dia de seu
aniversário. Em O Bobo do Rei, de Joracy Camargo, 1931, é contratado
pelo "rei do açúcar" para diverti-lo e arma muitas confusões.

Em 62 anos de carreira, Procópio atua em 461 peças. Publica quatro livros


sobre a interpretação, baseado em sua própria experiência de ator e
empresário. Os homens de seu tempo escrevem muito a seu respeito. Como
é o caso do autor Viriato Corrêa: "A natureza deu a Procópio a mais rica e a
mais bela flama de comicidade que um ator pode ter. E é realmente
inconcebível a extensão da riqueza dessa comicidade nas suas
surpreendentes variações de colorido, nas suas infinitas nuances
inflexivas".

Como o dramaturgo Raimundo Magalhães Júnior (1907-1981): "Nenhum


autor teatral destes últimos 50 anos deixou de dever alguma coisa a
Procópio. Mesmo os que nunca foram por ele representados, só de vê-lo no
palco se sentiam estimulados a escrever peças. Porque Procópio lhes
revelava uma vasta quantidade de efeitos teatrais, o valor de um gesto, de
uma pausa, de uma inflexão. Ninguém declamou tão bem quanto ele em
nosso teatro".

Procópio Ferreira mantém sua companhia em atividades até o final dos


anos 50, resistindo às mudanças que tomam conta da platéia e do palco.
Nos anos 1960, desfaz a companhia e trabalha como ator convidado em
espetáculos como Boa Noite Betina, musical sob a direção de Gianni Ratto
(1916-2005), 1962, e A Infidelidade ao Alcance de Todos, de Lauro César
Muniz (1938), dirigido por Walter Avancini (1935-2001), 1966. Remonta
O Avarento, de Molière, em 1969. Em 1973, monta seu texto O Vendedor
de Gargalhadas, que encena até 1978.

Símbolo de uma época em que o teatro era o maior divertimento popular e


gozava, ao mesmo tempo, de prestígio, Procópio Ferreira prezava a
liberdade total em cena, tendo sido criado, segundo ele conta, na regra do
círculo de giz: fazia-se um giz no meio do palco e, neste, só o primeiro ator
dava largas à sua inventividade, mantendo-se os coajuvantes
respeitosamente afastados. Para ele escreveram: Henrique Pongetti (1898-
1979), Joracy Camargo, Viriato Corrêa, Raimundo Magalhães Júnior, Dias
Gomes (1922-1999), Pedro Bloch (1914-2004), Guilherme Figueiredo
(1915-1997), entre os 27 autores brasileiros que o ator encena.

O crítico Décio de Almeida Prado (1917-2000) registra as diferenças de


idéias e princípios entre o grande ator e os modernistas que o procederam:
"Por quase três décadas ele reinara inconteste - o ator mais engraçado de
um teatro que se queria unicamente cômico. Recebera inclusive a mais alta
homenagem prestada aos seus grandes homens pela opinião pública
brasileira - perdera o sobrenome. Quando se falava em Procópio, ninguém
tinha dúvidas de que se tratava naturalmente de Procópio Ferreira. Pois eis
que de repente chegávamos nós, com outras idéias, outros métodos, outra
dicção cênica, outra concepção de teatro. No mesmo ano - 1948 - em que
ele fazia cinquenta, inaugurava-se, fruto de um decênio de esforço amador,
o TBC. [...] Tudo o afastava, no entanto, do teatro moderno, desde a
obrigação de decorar o papel, até a idéia ridícula de que o ator necessitava
de alguém - o encenador - para o guiar na criação do papel. Ele se fizera no
palco e ao contato com o público, os únicos mestres que reconhecia como
legítimos".

2. O Teatro de Brinquedo

Histórico - 1927 - Rio de Janeiro RJ

O Teatro de Brinquedo tem vida curta, mas representa uma transformação


completa na concepção do espetáculo, no processo de produção e criação e
nas relações com o público, revelando-se como manifestação precoce da
modernidade teatral no Brasil.

O grupo é fundado em 1927, por Alvaro Moreyra e Eugênia Moreyra,


freqüentadores dos salões onde circulam os modernistas, elite intelectual
carioca na época. Alvaro Moreyra, além de produtor da montagem, escreve
o texto, dirige e é também ator do espetáculo Adão, Eva e Outros Membros
da Família, que permanece pouco tempo em cartaz e não chega a
influenciar diretamente sua geração. Sua importância é manifestar no teatro
as idéias modernistas, embora com cinco anos de atraso em relação à
Semana de Arte Moderna.

Na dramaturgia, que escapa inteiramente à comédia de costumes que reina


solitária nos palcos da época; no modo de produção, expresso em um teatro
assumidamente amador; e nos pressupostos da interpretação, que conta
com modernistas das diversas áreas artísticas e nenhum ator profissional, o
Teatro de Brinquedo traz à cena um exemplar totalmente diferenciado que
na época se entende e se pratica como teatro. Também no que diz respeito à
fruição, a iniciativa representa uma ruptura, pois propõe como local de
apresentação a sala de um cassino, especialmente preparada para o evento e
com lotação máxima de 180 pessoas, numa época em que as platéias
normalmente comportam, no mínimo, 500 lugares.

Parte da concepção dos Moreyra consiste em levar para o palco o clima


descontraído e culto das reuniões dos modernistas nos salões da alta
sociedade: "Poetas dizendo seus poemas, músicos tocando suas músicas"
como eles mesmos explicam.
"É o teatro de elite para a elite, teatro para as criaturas que não iam ao
teatro. É uma brincadeira de pessoas cultas... Ele só serve aos que têm
curiosidade intelectual".

Com o título da iniciativa, os Moreyra pretendem se contrapor ao teatro


vigente, essencialmente comercial. Por isso, eles dizem que "a mise-en-
scène é de brinquedo, como tudo lá",3 e acabam com a marcação, o
principal campo dos ensaiadores, adotando a movimentação e a ação livres.
Recusando a idéia de agradar ao público, afirmam: "O público não tem
importância. O público não existe". O espetáculo seguinte, Espetáculo do
Arco da Velha, que estréia vinte dias depois, traz números isolados, em que
cada artista mostra o que sabe e gosta de fazer no campo do modernismo.

Desfeito o Teatro de Brinquedo, Alvaro Moreyra e Eugênia Moreyra


passam a realizar viagens, em geral às próprias custas, pelo interior e pela
periferia, mostrando aos que nunca vêem teatro os textos de Luigi
Pirandello, Henrik Ibsen e outros autores inovadores.

Rosyane Trotta comenta: "(...) Alvaro Moreyra foi mais moderno na teoria
que na prática (...) não tinha relação com o velho teatro, não trazia o ranço
'trianonino' e estava enfronhado no meio que discutia os novos conceitos
artísticos. Foi o que lhe permitiu, por exemplo, aproveitar, dentro do
possível, a influência de Copeau no seu contato direto com Vieux
Colombier. (...) em Alvaro ela [a modernidade] encontra uma abertura no
despojamento, no humor crítico, numa diretriz bem mais independente e
autêntica que não tenta agradar a gregos e troianos".

3. Renato Vianna e suas iniciativas

Renato Vianna (Rio de Janeiro RJ 1894 - 1953). Autor, diretor, ator.


Autor do ú nico espetá culo que, no ano em que nasce o Modernismo no
Brasil, procura criar uma estética nova, Renato Vianna tem em sua
carreira uma série de iniciativas voltadas para a transformaçã o da cena
e do processo de produçã o teatral. Inicia a carreira como dramaturgo,
escrevendo para a atriz Itá lia Fausta. Une-se aos modernistas Villa-
Lobos e Ronald Carvalho, com os quais funda a Sociedade dos
Companheiros da Quimera, com o objetivo de elevar o nível cultural e
intelectual do teatro, em 1922. No mesmo ano, escreve e dirige A
Ú ltima Encarnaçã o de Fausto, interpretando Mefistó feles, e anuncia a
estréia dizendo que se trata do primeiro teatro de encenaçã o do Brasil.
Pouco teatral e de reflexõ es verborrá gicas, o espetá culo, embora traga
um novo uso da luz, do som e da cenografia, é duramente criticado.

Em 1924, Renato Vianna anuncia a fundaçã o de Colméia, reuniã o de


diretores com o objetivo de mudar o teatro por meio da disciplina e da
orientaçã o técnica do ator. O teatro deveria ser uma obra de conjunto,
acima das vaidades individuais. A iniciativa nã o frutifica. Em 1932,
funda o Teatro de Arte e monta, de sua autoria, O Homem Silencioso
dos Olhos de Vidro. Em 1934, nova tentativa, desta vez com o Teatro
Escola, cujo projeto é formar novos atores e constituir um repertó rio
de 12 peças a serem apresentadas com ingressos reduzidos em todo o
país. Desse enorme projeto, o diretor monta cinco textos, apenas dois
inéditos e ambos de sua autoria, Sexo e Deus, usando atores
profissionais - entre eles Itá lia Fausta e Jaime Costa - e causando
indignaçã o entre a classe teatral.

Na década de 1940, o autor viaja para Porto Alegre, onde funda a


Escola Dramá tica do Rio Grande do Sul e o Teatro Anchieta, onde
realiza montagens de alunos. Em 1946, cria o Teatro do Povo, iniciativa
pioneira de fazer teatro com e para operá rios. Volta duas vezes ao Rio
de Janeiro para apresentar espetá culos. Em 1948, é convidado a dirigir
a Escola de Teatro Martins Pena, do município do Rio de Janeiro. Sem
se firmar no panorama do teatro brasileiro nem como autor nem como
diretor, Renato Vianna traz, dos espetá culos que assiste no exterior,
idéias que ele passa toda a sua vida procurando difundir e praticar por
meio de projetos pedagó gicos e de circulaçã o de espetá culos. Ainda
que nã o se materializem em suas montagens, essas idéias resumem os
princípios do teatro moderno, que entram na ordem do dia a partir do
trabalho de grupos amadores como o Teatro do Estudante do Brasil -
TEB e Os Comediantes.

4. O Teatro Duse
Criado por Paschoal Carlos Magno, o Teatro Duse abriga o Teatro do
Estudante do Brasil, que lidera o movimento em favor da formação de
profissionais e do teatro comprometido com a arte mais do que com o
lucro. Quando Paschoal Carlos Magno transforma o andar térreo de sua
residência em um teatro, o Teatro do Estudante do Brasil - TEB já conta
com mais de dez anos de atividade. Inaugurado em 1938, o TEB se dedica
a montagens de grandes autores nacionais e estrangeiros - William
Shakespeare, Gonçalves Dias, Sófocles, Henrik Ibsen, Martins Pena. Em
1948, o TEB apresenta uma histórica montagem de Hamlet, com uma
composição realista de Sergio Cardoso, a primeira de que se tem notícia no
teatro brasileiro. Em 1952, o TEB realiza uma turnê de dois meses e meio
pelo norte do país apresentando, gratuitamente, um repertório de sete
espetáculos. Na volta, o TEB inaugura o Teatro Duse, de cem lugares,
sobre o qual escreve seu idealizador: "Todos os elementos que o servem -
bilheteiro, porteiro, indicadores, intérpretes, cenógrafos, figurinistas,
maquinistas, publicistas, costureiras, aderecistas, secretários, diretores - são
estudantes. Não anima o Teatro Duse nenhum objetivo comercial. É o
núcleo de um teatro-escola, dirigido por moços e baseado no entusiasmo,
no desinteresse e no idealismo dos moços".

Durante seus quatro anos de existência, o Teatro Duse apresenta 21


espetáculos de autores brasileiros inéditos, entre eles Frankel, de Antônio
Callado; Lampião, de Rachel de Queiroz; João Sem Terra, de Hermilo
Borba Filho; e Lázaro, de Francisco Pereira da Silva. Além de realizar
montagens, o Teatro Duse se dedica ao ensino da profissão que, em cursos
de um ano de duração, inclui o estudo da prosódia, da história do teatro, da
caracterização, da mímica, do texto. Esther Leão é a professora encarregada
de ensinar ao alunos a arte de interpretar. Entre os demais professores,
figuram: Bibi Ferreira, Nina Ranewsky, Adacto Filho, José Jansen.
Participam do TEB, entre outros, Othon Bastos, B. de Paiva, Fernando
Pamplona, Oswaldo Loureiro, Maria Pompeu, Consuelo Leandro,
Pernambuco de Oliveira, Glauce Rocha, Miriam Pérsia e Joel Barcelos.

O Teatro Duse abre-se a outros grupos amadores, que se apresentam em


sua sala de espetáculos. Faz também produções conjuntas, em que reúne
profissionais convidados a alunos do TEB - nessas ocasiões dá preferência
a autores estrangeiros e a textos ainda inéditos no Brasil, como Espectros,
de Henrik Ibsen, e peças em um ato, de Anton Tchekhov.

Em 1956, o Teatro Duse encerra suas atividades. Em abril de 1958, com o


patrocínio da Sociedade Brasileira de Arte, reabre, com direção de
Paschoal e com Luís de Lima como professor e diretor de espetáculos, mas
volta a fechar depois de quatro meses, tendo produzido um espetáculo, que
se apresenta no Primeiro Festival Nacional de Teatro de Estudantes, em
Recife. O Teatro do Estudante e o Teatro Duse iniciam um movimento que
vincula o aprendizado do teatro à escola e, por meio da atuação de
amadores, renova o teatro brasileiro nas décadas de 1940 e 1950,
cultivando a idéia do estudo e da técnica em substituição ao improviso e ao
talento nato. São precursores de outras iniciativas como a Fundação
Brasileira de Teatro - FBT, da atriz Dulcina de Moraes; O Tablado, da
dramaturga e diretora Maria Clara Machado, e das escolas de teatro que
nessa década começam a surgir no país.

5. O Teatro do Estudante do Brasil: Paschoal Carlos Magno

Criado por Paschoal Carlos Magno, o Teatro do Estudante do Brasil tem


seu ponto alto com a montagem de Hamlet, de William Shakespeare, em
1948, que coroa a iniciativa em prol de um teatro feito com qualidade
artística. Inaugurado em 1938, o Teatro do Estudante do Brasil - TEB, se
dedica a montagens de grandes autores nacionais e estrangeiros - William
Shakespeare, Gonçalves Dias, Sófocles, Henrik Ibsen, Martins Pena. O
espetáculo de estréia, com direção de Itália Fausta, é Romeu e Julieta, que
conta com o corpo de baile do Theatro Municipal e sua orquestra de cordas.
Os críticos aplaudem desde o início a iniciativa de Paschoal Carlos Magno
que, a médio prazo, promete deixar para trás os tempos da chamada
Geração Trianon, formada exclusivamente pela prática, sem espírito de
equipe, sem conhecimento da modernidade cênica. Romeu e Julieta recebe
elogios tanto pela direção quanto pelos atores.

Em 1948, o TEB apresenta uma histórica montagem de Hamlet, dirigida


por Hoffmann Harnisch, com uma composição realista do ator Sergio
Cardoso, a primeira de que se tem notícia no teatro brasileiro. Em 1951,
realiza uma turnê de dois meses e meio pelo norte do país representando
gratuitamente, tanto em salas fechadas quanto em espaços abertos, um
repertório de sete espetáculos. Trata-se de um trabalho de formação de
atores e público, como também, da disseminação de uma dramaturgia
diferenciada, com montagens de Édipo Rei e Antígone, de Sófocles;
Hécuba, de Eurípides; Romeu e Julieta, de William Shakespeare; Os
Espectros, de Henrik Ibsen; Autos, de Gil Vicente, e O Noviço, de Martins
Pena. Esther Leão desempenha a função de ensaiadora durante a excursão.

Como grande incentivador da atividade teatral, Paschoal Carlos Magno cria


o Teatro Duse no porão de sua casa, no bairro de Santa Tereza, no Rio de
Janeiro. Pelo pequeno teatro de cem lugares, passa boa parte dos grupos de
estudantes e amadores da época.

A realização de maior vulto do TEB é a formação de elencos para a


apresentação de espetáculos em lugares públicos da cidade. Em 1953,
Paschoal Carlos Magno consegue 15 caminhões e os transforma em teatros
ambulantes, realizando 500 apresentações.

Paschoal Carlos Magno escreve sobre a criação do TEB: "Eu tinha chegado
da Europa e via aqui a situação melancólica do teatro brasileiro, um teatro
sem muita orientação técnica, representado por atores e atrizes sem a
menor preparação. Digo melancólico, porque havia uma crescente ausência
de público e um número cada vez maior de companhias que multiplicavam
seus frágeis esforços, suas energias, sem encontrar eco por parte da platéia
e da imprensa. (...) percebendo que nada se pode fazer nesse país sem o
apoio dos estudantes, apesar da má vontade de algumas autoridades de
ontem, de hoje e de sempre, percebendo que nada se pode fazer aqui sem a
participação dos moços, (...) reuni, na casa de minha mãe, dezenas de
jovens planejando criar o Teatro do Estudante do Brasil".

6. O Teatro do Estudante no Rio Grande do Sul

Fundado em 1941, com base em uma deliberação do 2º Congresso da


União Estadual dos Estudantes do Rio Grande do Sul, o Teatro do
Estudante é o embrião do processo de modernização do teatro em Porto
Alegre, que atinge o auge no final da década de 1950. Seu modelo é o
Teatro do Estudante do Brasil, criado no Rio de Janeiro, em 1938 por
Paschoal Carlos Magno.

O Teatro do Estudante do Rio Grande do Sul estreia em novembro de 1941,


no Theatro São Pedro, para uma plateia lotada, com a peça O Fazedor de
Reis, escrita pelos irmãos Silvio Bonow e Germano Bonow e H. Jorge
Bacellar, fundadores do grupo e líderes estudantis. O texto, uma sátira ao
nazismo numa época em que o Brasil ainda se mantém neutro em relação à
guerra, retrata o cotidiano de uma família proprietária de editora que tem o
poder de definir o que deve ou não ser lido pelas pessoas. Germano Bonow,
também diretor da montagem, reconhece a precariedade do texto. "Mesmo
assim, teve a virtude de apresentar o elemento feminino às platéias rio-
grandenses, tão ciosas da falsa moralidade". As atrizes são alunas do
Instituto de Educação e do Colégio Bom Conselho, e contracenam com
estudantes dos cursos de direito e medicina. "Várias artistas só iam aos
ensaios acompanhadas por mães ou tias", recorda a poeta Edith Hervê,
encarregada da divulgação. Após a estréia animadora, o Teatro do
Estudante perde-se numa discussão interna sobre a continuidade do
trabalho. A indefinição entre encenar Tartufo, de Molière, Cyrano de
Bergerac, de Edmond Rostand, e O Inimigo do Povo, de Henrik Ibsen,
paralisa o grupo durante o ano de 1942. Mas em junho de 1943 volta à
atividade, com O Maluco Número 4, de Armando Câmara, uma peça
considerada "fácil", que serve para amadurecer o elenco. A essa altura, o
grupo já conta com a simpatia da intelectualidade porto-alegrense que se
reúne na Livraria do Globo. Escritores, intelectuais e jornalistas como
Erico Verissimo, Athos Damasceno Ferreira, Moisés Vellinho, Darcy
Azambuja, Carlos Reverbel e Justino Martins frequentam os espetáculos. A
Revista do Globo registra: "O Teatro do Estudante está divorciado dos
problemas comuns dos teatros profissionais. Ele não foi criado para
simplesmente divertir. Tem finalidades culturais elevadas. É real,
consistente e conta com elementos compenetrados de que o teatro é uma
arte que deve refletir ao vivo as lutas íntimas da natureza humana".

Vários atores e atrizes de radionovelas aproximam-se do Teatro do


Estudante, enriquecendo seu elenco. O grupo consegue do governo do
Estado a cessão gratuita do Theatro São Pedro em algumas datas do ano,
mas dependem da bilheteria para bancar a produção. A nova fase começa
com É Proibido Suicidar-Se na Primavera, de Alencastro Casona,
espetáculo bem recebido pelo público, especialmente a dupla de
protagonistas. "Regina Maria e Olavo Hengel foram efetivamente as
figuras mais brilhantes do elenco", afirma o escritor Josué Guimarães.
"Hengel, em certos momentos, fez a plateia interromper o espetáculo com
aplausos. Revelou-se um ator dramático impressionante."

Os anos seguintes são de intensa atividade, com pelo menos duas


montagens por ano. Topaze, de Marcel Pagnol, marca a estreia como ator
de um dos mais ativos participantes do grupo, o estudante de economia e
tradutor da Livraria do Globo, José Lewgoy, que usa o pseudônimo
artístico de Samuel Legay. Além de protagonista, ele é responsável pela
tradução do texto e pelos cenários da peça. Sua atuação impressiona o
cônsul norte-americano, que o convida para estudar teatro na Universidade
de Yale. "Ainda hoje, considerado numa perspectiva histórica, foi uma das
manifestações de teatro mais importantes que o Brasil teve. Paralelamente,
éramos um grupo que selecionou as melhores literaturas dramáticas, antes
que o Teatro de Comédia o fizesse", ele relata, sobre sua experiência no
Teatro do Estudante do Rio Grande do Sul. Lewgoy atua ainda em O
Viajante sem Bagagem, de Jean Anouihl, antes de seguir para os Estados
Unidos e, posteriormente, na década de 1950, consagrar-se como ator de
cinema. Em Antígona, de Jean Anouilh, aparece no papel de Prólogo um
jovem de apenas 18 anos, Walmor Chagas, sob a direção do historiador
Guilhermino Cesar. Ele participa de mais quatro espetáculos pelo Teatro do
Estudante, antes de mudar-se para São Paulo.

Embora surgido no âmbito da União Estadual dos Estudantes - UEE, o


grupo aos poucos torna-se independente da entidade. "Era um verdadeiro
amor à arte", lembra a atriz Yetta Moreira. "Ninguém ganhava nada. Todo
o vestuário era feito por nós mesmos ou familiares. Na madrugada,
colávamos cartazes pela cidade e às 5 horas íamos tomar café no Mercado
Público. Todo o dinheiro ganho na bilheteria era guardado para a próxima
peça."5 No início dos anos 1950, são realizadas duas montagens de A
Verdade de Cada Um (Assim É, Se Lhe Parece), de Luigi Pirandello: a
primeira em 1951, com direção de Luiz Tito, e a segunda, dois anos depois,
dirigida pelo ator Lóris Melecchi. "Assisti a este espetáculo graças a um
providencial acidente de família", escreve Fernando Peixoto. "Uma tia
ganhou dois ingressos para uma sessão beneficente e a família me obrigou
a ir junto... Diante de A Verdade de Cada Um, descobri, graças ao Teatro
do Estudante e a Pirandello, a minha verdade. Saí do espetáculo com 16
anos, com uma decisão: fazer teatro".

Fernando Peixoto integra-se ao grupo, então com a direção de Paulo Villa.


O Teatro do Estudante sai em excursão pelo interior do Estado levando A
Corda, de Patrick Hamilton, e O Noviço, de Martins Pena, dirigidas por um
encenador contratado no Rio de Janeiro, Silva Ferreira, ex-seminarista que
estuda teatro em Paris, inclusive com Marcel Marceau. Um vagão de trem
cedido pela viação férrea é usado como dormitório pelos 16 estudantes. As
prefeituras e as entidades estudantis garantem comida e divulgação, mas os
cinemas, em cujos palcos se apresentam, em geral cobram 50% da
bilheteria. Na volta, o grupo mergulha numa crise financeira. Melecchi
está disposto a seguir carreira no Rio de Janeiro. Silva Ferreira deseja
permanecer em Porto Alegre, mas pensa em outro grupo, e o diretor Villa
planeja uma ambiciosa montagem de Édipo Rei, que não se realiza. A
Importância de Ser Severo, de Oscar Wilde, traz o diretor Carlos Murtinho,
do Rio de Janeiro, e é a última montagem regular do Teatro do Estudante.
Nos últimos meses de 1954, durante uma apresentação do Recital Fernando
Pessoa, o Teatro do Estudante perde a grande maioria de seus integrantes,
que criam três novos grupos: Comédia da Província, Teatro Universitário e
Clube de Teatro da Federação dos Estudantes Universitários do Rio Grande
do Sul.

7. Grupo de Teatro Experimental

Fundado por Carlos Kroeber, Jota Dangelo e João Marschner, o Teatro


Experimental exerce grande influência no panorama teatral de Belo
Horizonte, de 1959 até meados dos anos 1960, ao encenar textos de autores
da vanguarda europeia e norte-americana. A partir de 1966, assume posição
de resistência à ditadura militar e de valorização das tradições culturais e
políticas de Minas Gerais.

O Teatro Experimental (TE) realiza espetáculos para o público infantil, a


fim de obter recursos para produzir peças de caráter experimental,
particularmente de autores da vanguarda europeia, como Fim de Jogo, de
Samuel Beckett - primeira encenação desse texto no Brasil, com tradução
de João Marschner -; A Cantora Careca, de Eugène Ionesco; e Pic-Nic no
Front, de Fernando Arrabal.

Carlos Kroeber e Jota Dangelo revezam-se na direção e assistência de


direção, e João Marschner concentra-se na tradução de textos e na criação
de cenários e figurinos. Os três são atores em quase todos os espetáculos.
Do grupo também fazem parte, entre outros, os atores Donato Donati,
Ezequiel Neves, Heloisa Bernardes, José Aurélio Vieira, Mamélia
Dornelles, Neuza Rocha, Rodrigo Santiago, Sílvio Castanheira e Terezinha
Pereira.
Marco Antônio Menezes assume a direção do TE, entre 1961 e 1965, e
mantém a linha vanguardista do grupo. Monta, em 1962, A Voz da Chuva,
de Tennessee Williams, e Cena a Quatro, de Eugène Ionesco; em 1965, O
Escurial, de Michel de Ghelderode, A História do Zoológico, de Edward
Albee, e Atos sem Palavras I e II, de Samuel Beckett - primeira montagem
brasileira. Jota Dangelo volta à direção, em 1965, com o espetáculo para o
público infantil Bolota contra o Bruxo, de Jonas Bloch, ator formado no
Teatro Universitário e o principal parceiro de Dangelo, até 1969. Jonas
Bloch dirige sua primeira peça no TE, Halewin, de Ghelderode, em 1966.

Ainda em 1966, aderindo às inovações do teatro brasileiro, que se


anunciam desde o fim da década de 1950, cujo marco é a montagem pelo
Teatro de Arena de São Paulo de Eles Não Usam Black-Tie, em 1958, o TE
assume o clima de politização e abrasileiramento do palco nacional, que se
manifesta não só na dramaturgia, mas também na busca de uma forma
brasileira de encenar e atuar. O que se intensifica ainda mais depois do
golpe militar de 1964.

A montagem que marca essa transição é O Homem e Seu Grito, roteiro de


Bloch e Dangelo, que, juntos, atuam e assinam a direção do espetáculo,
concebido para comemorar os dez anos da morte de Bertolt Brecht. Essa
opção por si só demonstra o novo posicionamento do grupo. O primeiro ato
é uma coletânea de poemas e textos curtos de Brecht, acrescida de trechos
do depoimento desse autor na Comissão do Congresso dos Estados Unidos
que investiga atividades antiamericanas. O segundo ato é uma condensação
de A Alma Boa de Set-Suan, de Brecht.

Entretanto, a peça que marca definitivamente a mudança do TE é Oh! Oh!


Oh! Minas Gerais, de 1967, texto e direção de Bloch e Dangelo, que
também integram o elenco. É uma colagem de textos e cenas despojadas,
no formato que o Teatro de Arena implanta em Arena Conta Zumbi e
Arena Conta Tiradentes. Os cenários e figurinos são de Napoleão Moniz
Freire e a coreografia de Klauss Vianna. O espetáculo viaja por Brasília,
Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo e interior de Minas Gerais. Em
março de 1968, o crítico Décio de Almeida Prado escreve: "Oh!, Oh!, Oh!
Minas Gerais talvez represente para Belo Horizonte o que Vestido de
Noiva e os primeiros espetáculos do TBC significaram respectivamente
para Rio e São Paulo na década de 1940: o primeiro passo para a
maturidade profissional, o instante do despertar do público, o momento
histórico do take off".

Com Oh! Oh! Oh!... o TE ganha dinheiro e vislumbra a possibilidade de


realizar um grande espetáculo para viajar pelo Brasil e profissionalizar-se.
Em 1968, o grupo convida um diretor de fora de Minas Gerais, Amir
Haddad, que traz consigo o cenógrafo Joel de Carvalho. A peça escolhida é
Numância, de Miguel de Cervantes, que nessa montagem recebe o subtítulo
Ou Ficar a Pátria Livre... No espetáculo, o cerco dos romanos à cidade
Numância é metaforizado no confronto entre o movimento estudantil
brasileiro e as forças da repressão da ditadura. O cenário de Joel de
Carvalho eleva-se sobre um palco giratório que exige alto investimento.
Em novembro a peça estréia em Belo Horizonte com sucesso e já com
temporadas marcadas em várias capitais brasileiras para o ano seguinte.
Entretanto, como conseqüência do Ato Institucional nº 5 (AI-5), a peça é
integralmente censurada e proibida de ser apresentada em todo o território
nacional, dificultando a profissionalização do TE. Jonas Bloch muda-se
para o Rio de Janeiro e Carlos Alberto Ratton, que acompanha a montagem
de Numância, agrega-se ao grupo.

Em 1969, com produção do TE, Ratton dirige Procura-se uma Rosa, de


Glaucio Gill. A peça marca a entrada no grupo do arquiteto, cenógrafo e
figurinista Raul Belém, que assina seu primeiro cenário e daí em diante
acompanha Dangelo em praticamente todas as montagens. Nesse mesmo
ano, inspirados nas propostas de Jerzy Grotowski, Dangelo e Ratton
escrevem Futebol, Alegria do Povo. Pela primeira vez, o grupo abandona o
palco italiano e experimenta espaços não convencionais. O espaço
alternativo, no formato arena, é utilizado também em 1970 na peça escrita e
dirigida por José Antônio de Souza, O Fedor.

Ainda em 1970 vem a público o primeiro espetáculo de som e luz


produzido no Brasil, Inconfidência na Praça, montado em Ouro Preto por
ocasião do feriado de 21 de abril. O cenário de Raul Belém ocupa todo o
espaço da Praça Tiradentes, os figurinos são de Joel de Carvalho e a voz de
Paulo Autran narra o texto de Dangelo. Esse tipo de espetáculo, feito em
espaços abertos e com falas gravadas, é realizado por ocasião da Semana
Santa ou no 21 de abril, nas cidades mineiras de Belo Horizonte, Ouro
Preto, São João del Rey e Tiradentes, sempre com texto, direção e
iluminação de Jota Dangelo, e cenários e figurinos de Raul Belém. A vida
de Cristo e de Tiradentes são pretextos para denunciar o clima de opressão,
tortura e delação em que vive o país e servem de tema para os espetáculos
Uma Certa Sexta-Feira, 1972, O Encontro na Praça, 1974, O Encontro na
Sexta-Feira, 1976, De Corpo Presente, 1977, O Aleijadinho de Vila Rica,
1977, O Caminho do Calvário, 1978, e O Julgamento na Praça, 1980.

Com a mesma intenção de denúncia e resistência, o TE encena Frei


Caneca, de Carlos Queiroz Telles, em 1972, com alusões à guerrilha
revolucionária; O Interrogatório, de Peter Weiss, 1973; e A Casa de
Bernarda Alba, de Federico García Lorca, 1973, textos escolhidos pelas
críticas ao autoritarismo. Afastado da linha experimental, o TE, em 1974,
passa a se chamar O Grupo. Nesse momento, outros atores e atrizes já estão
incorporados à companhia, destacando-se Helvécio Ferreira, José Maria
Amorim, Pedro Paulo Cava, João Bosco Alves, Eduardo Rodrigues, Arildo
de Barros, Sônia Valadares, Lígia Lira, Maria Olívia, Regina Reis e Eliane
Maris.

Entre 1974 e 1989, O Grupo monta 17 peças, algumas destinadas ao


público infantil. Destacam-se Pelos Caminhos de Minas, 1975, que dá
continuidade à pesquisa sobre a cultura mineira; Os Riscos da Fala, 1979,
experiência de tratamento dramático de textos de 21 poetas mineiros; Qualé
Brasil, 1980; depoimento pessoal de Dangelo sobre a repressão política; e
Noel, o Feitiço da Vila, 1988, musical sobre a vida do compositor carioca
Noel Rosa, interpretado por Beré Lucas, que chama atenção pela
semelhança física com o personagem. As três primeiras são selecionadas
para o Projeto Mambembão, promovido inicialmente pelo Serviço Nacional
de Teatro (SNT) e, a partir de 1979, pelo Instituto Nacional das Artes
Cênicas (Inacen), que possibilita aos grupos de vários estados brasileiros
viajar para Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo com peças representativas
da diversidade cultural do país. Noel também viaja por essas praças,
alcançando sucesso de público e crítica.

Em 1990, o casal Jota Dangelo e Mamélia Dornelles, que se mantém na


liderança do grupo durante toda a sua trajetória, aluga um local para ser a
sede da companhia. Esse espaço é denominado Casa de Cultura Oswaldo
França Júnior, em homenagem ao escritor mineiro, nome que também é
adotado pelo grupo. Entre 1990 e 1998, quando encerra suas atividades, são
montados 21 espetáculos. Destacam-se A Conjuração, 1990, fusão de
música, texto e encenação sobre a Inconfidência Mineira, com músicas
originais de Tavinho Moura, Robertinho Brant e Fernando Brant; Ri
Melhor Quem Ri Primeiro, 1992, comédia sobre os sobressaltos cotidianos
da vida urbana; Contos Contidos, 1990, e A Mulher Iluminada, 1992, que
abordam a questão feminina. Entre as peças destinadas ao público infantil,
dirigidas por Mamélia Dornelles, estão a remontagem de Pluft, o
Fantasminha, 1991; a adaptação do livro de Neuza Sorrenti O Menino Léo
e o Poeta Noel; e a adaptação para o teatro dos livros de Ângelo Machado,
com temas ecológicos: O Menino e o Rio, 1992; O Chapeuzinho Vermelho
e o Lobo Guará, 1994; e O Casamento da Ararinha Azul, 1995. Várias
dessas montagens contam com a presença do ator José Geraldo Peninha,
parceiro de Dangelo, Mamélia Dornelles e José Maria Amorim nessa fase
do grupo.

Em suas três fases, contadas a partir de 1959, o Teatro Experimental realiza


72 espetáculos, com 11 diretores, 12 cenógrafos, 15 figurinistas, 127
técnicos e 276 atores, volume que demonstra a forte presença do grupo no
teatro mineiro.

Fases

1956-1973 - Belo Horizonte MG - Teatro Experimental

1974-1988 - Belo Horizonte MG - O Grupo

1990-1998 - Belo Horizonte MG - Casa de Cultura Oswaldo França Jr.


8. Grupo de Teatro Universitário

Rio de Janeiro

Dentro do movimento de teatro estudantil e amador que, na década de


1940, renova o panorama carioca, o Teatro Universitário é um dos
conjuntos cuja atividade é mais contínua. O espetáculo de estréia,
Filigranas, em 1938, é uma "fantasia musical", nas palavras de Jerusa
Camões, uma das criadoras do Teatro Universitário - TU e co-responsável
pelos arranjos junto com Hugo Lacorte Vitale. A montagem inclui trechos
da Cavalaria Rusticana, La Bohème e Rigoletto intercalados com esquetes,
poesias e números independentes. A estrutura do programa faz jus à Escola
Nacional de Música, onde nasceu o grupo. Após alguns espetáculos de
êxito, o ministro Gustavo Capanema lhes cede salas na sede da União
Nacional dos Estudantes - UNE, e uma dotação do orçamento para a
produção de peças, o que faz com que o grupo amador passe a ter
responsabilidades de companhia profissional. Para cumprir a agenda, os
estudantes ensaiam à noite e nas férias. Constam da temporada de 1943 A
Viúva Alegre, opereta de Franz Lehar; As Mulheres Nervosas, de Ernest
Blum e Raul Touché, com direção geral de Jerusa Camões e direção
artística de Mario Brasini; Dirceu e Marília, de Afonso Arinos de Mello
Franco; Irmão das Almas, de Martins Pena; Cabecinha de Vento, de Silvio
Zambaldi; O Carnaval, de J. Macedo Soares. Esther Leão incumbe-se
freqüentemente da direção, na qual se revezam também Mario Brasini,
Adacto Filho, Fernando Pamplona e outros. No elenco figuram atores
estreantes como Nathália Timberg, Jaime Barcelos, Sergio Cardoso, Sergio
Britto, Paulo Fortes, Fernando Torres - que no futuro farão carreira no
teatro. São realizações do Teatro Universitário - TU: Romeu e Julieta, de
William Shakespeare, 1945; Gonzaga ou A Revolução de Minas, de Castro
Alves (1847 - 1871), 1947; A Dama da Madrugada, de Alejandro Casona,
1948; O Pai, de Strindberg, 1949; Quebranto, de Coelho Neto,1950, todos
sob a direção de Esther Leão.
O TU realiza seus espetáculos nos locais mais diversos. Desloca-se para
outras cidades para récitas beneficentes e representa em pátios, hospitais,
escolas, quartéis, fábricas, onde quer que seja chamado. O projeto da
companhia transcende a produção teatral: para conseguir recursos para as
entidades estudantis, o grupo faz sociedade com um homem que possui
brinquedos de parque de diversões, e transforma uma praça em parque,
com apoio do Presidente da República, que autoriza sua instalação, por
tempo indeterminado, em plena Praça do Russel, e do ministro da Guerra,
que cede soldados para servirem de cerca. No parque, o TU remonta um
antigo sucesso, A Viúva Alegre, de Franz Lehar, criados por eles em 1943.

Jerusa Camões, atriz do grupo, avalia, em depoimento, sua contribuição


para a história do teatro: "O TU tinha como proposta definida fazer teatro,
qualquer que fosse, como diversão, sem grandes revoluções cênicas. Coisas
que nos alegrassem a vida. (...) No sentido de contribuir para essa alteração
de mentalidades, acho que o nosso trabalho foi significativo. Por isso,
costumo dizer que fomos necessários no nosso tempo. (...) Depois, o apoio
ao estudante, naquele tempo, era coisa de se contar prosa. Era apoio
mesmo. E confiança. Desde o governo até o crítico mais exigente estavam
sempre dando apoio a nosso teatro. Nossos espetáculos faziam o maior
sucesso. Nossas casas viviam superlotadas de gente. Pessoas das mais
variadas posições sociais".

São Paulo

Grupo criado dentro da Universidade de São Paulo sob a direção artística


de Décio de Almeida Prado, é uma das raízes do Teatro Brasileiro de
Comédia, juntamente com o Grupo de Teatro Experimental, de Alfredo
Mesquita.

Com o patrocínio do Fundo Universitário de Pesquisa surge, em 1943, por


iniciativa do reitor Jorge Americano, um grupo teatral ligado à Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo - USP. A
presidência do conjunto cabe a Décio de Almeida Prado, a vice-presidência
a Carlos Lacerda, com assistência de Lourival Gomes Machado, e a
cenografia a Clóvis Graciano. O grupo apresenta um repertório formado
preferencialmente por peças escritas em língua portuguesa.

A estréia dá-se ainda em 1943, com um espetáculo composto por Auto da


Barca do Inferno, de Gil Vicente; O Irmão das Almas, de Martins Pena, e
Pequenos Serviços em Casa de Casal, de Mário Neme. A realização conta
com Cacilda Becker que, já profissionalizada, colabora com o grupo, cujo
elenco inclui Irene Bojano, Augusto Fisal, Caio Cayubi, Carlos Falbo,
Douglas Michalany, Gastão Gorenstein, Sônia Coelho, Hamilton Ferreira,
Luciano Centofant, Salim Belfort, Tito Fleury e Waldemar Wey. Ruy
Coelho, posteriormente professor emérito de sociologia da arte e da
literatura trabalha como ponto do conjunto; os cenários e figurinos são do
pintor Clóvis Graciano e o maquiador da equipe é Ronald Eagling, um
inglês ligado aos English Players.

Fora de São Paulo, o conjunto apresenta-se em cidades do interior,


acompanhado do próprio reitor e de alguns professores, como André
Dreyfus e Jaime Regalo, que divulgam e explicam o Fundo de Pesquisa.

Evidenciando sua irreverência para com Décio de Almeida Prado e


Lourival Gomes Machado ligados à revista Clima, Oswald de Andrade
comenta: "Os chato-boys estão de parabéns. Eles acharam o seu refúgio
brilhante, e sua paixão vocacional, talvez. É o teatro. Funcionários tristes
da sociologia, quem havia de esperar desses parceiros dum cômodo sete-e-
meio do documento aquela justeza grandiosa que souberam imprimir ao
Auto da Barca de Gil Vicente, levado à cena em nosso teatro principal?
Honra aos que tiveram a audaciosa invenção de restaurar no palco um
trecho do Shakespeare lusitano, com os elementos nativos que possuíam.
Os Srs. Décio de Almeida Prado, Lourival Gomes Machado e Clóvis
Graciano, secundados pela pequena troupe universitária, ficam credores de
nossa admiração por terem realizado diante do público um dos melhores
espetáculos que São Paulo já viu".

Numa segunda temporada, em 1945, ao espetáculo Farsa de Inês Pereira,


de Gil Vicente, é anexado um trecho de A Farsa do Escudeiro - geralmente
conhecida como Quem Tem Farelos? Estréia, no mesmo ano, no Theatro
Municipal, num programa complementado por uma peça de Carlos
Lacerda, Amapá, que aborda a presença dos norte-americanos no norte do
país.
Não tendo encontrado um original brasileiro adequado ao que pretendia
apresentar, o Grupo de Teatro Universitário - GTU, em 1947, opta por
encenar O Baile dos Ladrões, de Jean Anouilh, prosseguindo em seu
intento de fazer um teatro de alta qualidade e direcionado a um público
intelectualmente exigente. Com a fundação do Teatro Brasileiro de
Comédia - TBC, em 1948, parte do grupo é absorvido pelo
profissionalismo.

O historiador Gustavo Dória, ressalta a importância do GUT: "A atividade


desenvolvida pelo GUT foi das mais proveitosas, pois que além de
excursionar por diversas cidades do interior do Estado, divulgou ele um
repertório de grande objetividade, não somente como qualidade mas
principalmente capaz de atrair e conquistar novas platéias".

9. Os Comediantes

1938/1947 - Rio de Janeiro RJ

A companhia consolida o movimento de teatro amador que desde o final


dos anos 1920 procura transformar o panorama teatral no Rio de Janeiro,
onde predominam montagens comerciais de comédias de costumes. Com a
encenação de Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, sob a direção de
Ziembinski, Os Comediantes inauguram a modernidade no teatro
brasileiro.

A companhia nasce da inquietação de um grupo de intelectuais interessados


na entrada, mesmo que tardia, do teatro brasileiro no movimento iniciado
pela Semana de Arte Moderna. Amadores, Os Comediantes intentam
modificar o panorama do teatro que se faz na época, dominado pelo teatro
de revista e pelos atores-empresários, tais como Dulcina de Moraes,
Procópio Ferreira e Jaime Costa. São seus fundadores Brutus Pedreira,
Tomás Santa Rosa e Luiza Barreto Leite. Segundo o crítico Gustavo Dória,
o percurso do grupo está bastante ligado ao da Associação de Artistas
Brasileiros, fundada no início dos anos 1930 e freqüentada por modernistas
como Di Cavalcanti, Candido Portinari, Tomás Santa Rosa e Lasar Segall.1
O espetáculo de estréia é A Verdade de Cada Um, de Luigi Pirandello, com
direção de Adacto Filho, 1940. Ainda nesse ano, com o mesmo diretor,
segue-se Uma Mulher e Três Palhaços, de Marcel Achard.
Recém-chegado ao Brasil, o polonês Ziembinski aproxima-se do grupo,
trabalhando como iluminador de A Verdade de Cada Um, na remontagem
de 1941. Em 1942, Ziembinski dirige Orfeu, de Jean Cocteau, e As
Preciosas Ridículas, de Molière, com o Teatro dos Novos e Os
Comediantes participam do evento em benefício da Cruz Vermelha
Internacional. Os Comediantes encenam, com direção de Adacto Filho,
Capricho, de Musset, e Escola de Maridos, de Molière, em um só
programa, e O Escravo, de Lucio Cardoso, em 1943. No mesmo ano,
Ziembinski realiza sua primeira direção com a companhia, montando Fim
de Jornada, de Sheriff.

O texto de Vestido de Noiva, tinha sido inicialmente entregue à Comédia


Brasileira, companhia oficial que pretendia montá-lo como um espetáculo
realista, mas acaba desistindo do texto, que chega às mãos do diretor
polonês. Apesar de ser uma companhia amadora, Os Comediantes contam
com o apoio do ministro da Cultura, Gustavo Capanema, que custeia a
montagem desse e de outros espetáculos do grupo. Com cenários de Tomás
Santa Rosa, que constrói um aparato cênico jamais visto antes no país, e
um texto que mistura tempos e planos de ação, passando da realidade à
memória e à alucinação, o espetáculo causa deslumbramento, mesmo entre
os que, pelo ineditismo dramatúrgico e plástico, dizem não compreendê-lo.

Em 1944, a companhia alterna a direção de Ziembinski em Pelleas e


Melisanda, de Maurice Maeterlinck, e a de Adacto Filho em O Leque, de
Carlo Goldoni, e leva seu repertório a São Paulo. O ano de 1945 se sustenta
apenas com a remontagem do sucesso de Nelson Rodrigues. Em 1946,
depois de encenar A Mulher sem Pecado, de Nelson Rodrigues, e Era uma
Vez um Preso, de Jean Anouilh, a companhia se profissionaliza e, passando
por reestruturações de elenco e funcionamento, volta à cena com Desejo, de
Eugene O'Neill, e A Rainha Morta, de Henry de Montherlant, ambos ainda
em 1946. No ano seguinte, a companhia leva à cena Terras do Sem Fim,
adaptado de Jorge Amado, Não Sou Eu..., de Edgard da Rocha Miranda, e
nova remontagem de Vestido de Noiva, com Maria Della Costa e Cacilda
Becker no elenco. São os últimos espetáculos do grupo, que encerra suas
atividades em 1947.

Entre seus principais integrantes estão Agostinho Olavo, Gustavo Dória,


Carlos Perry, Bellá Paes Leme, Adacto Filho, Graça Mello, Stella Perry,
Armando Couto, Miroel Silveira, Olga Navarro e Labanca.
Além da montagem histórica de Vestido de Noiva, que muda os parâmetros
da encenação brasileira, Os Comediantes, pela continuidade de sua atuação
e sua opção de repertório, reúnem, na sociedade carioca, um público
interessado em espetáculos não convencionais e não comerciais. A partir de
então, investir no trabalho de equipe e na regência de um encenador passará
a ser algo essencial na construção de um espetáculo teatral.

10. O Teatro Experimental do Negro


O Teatro Experimental do Negro (TEN) é fundado em 13 de outubro de
1944, no Rio de Janeiro, por iniciativa do economista e ator Abdias do
Nascimento (1914-2011), com o apoio de amigos e intelectuais brasileiros.
A proposta de ação da companhia é reabilitar e valorizar socialmente a
herança cultural, a identidade e a dignidade do afro-brasileiro por meio da
educação, da cultura e da arte.

Em dezembro de 1944, o grupo faz uma participação especial em uma cena


da peça Palmares, da poetisa Stella Leonardos (1923), representada pelo
Teatro do Estudante do Brasil (TEB). Por intermédio do escritor Aníbal
Machado (1894-1964), o TEN consegue o empréstimo dos salões e do
restaurante da sede da União Nacional dos Estudantes (UNE), e o espaço é
utilizado no período noturno, após o término das atividades da entidade
estudantil, para a realização de ensaios e atividades culturais.

O TEN elabora um trabalho alternativo de educação direcionado à


população negra e oferece programas de alfabetização e iniciação cultural.
A criação de um curso de alfabetização surge pela dificuldade dos atores
em memorizar e decorar o texto, e as aulas de iniciação cultural utilizam as
peças teatrais como principal material pedagógico.

Com essas atividades, o TEN valoriza a construção de uma identidade


negra e viabiliza a formação de elenco próprio. Em plena década de 1940,
tal fato implica uma mudança no mercado de trabalho e na expectativa do
público, habituado a ver atores brancos que se pintam para poder
representar personagens negros.

Para a estreia do TEN, Nascimento não encontra, na dramaturgia brasileira,


um texto adequado ao objetivo do grupo, que é mostrar os “heróis negros”
da “epopeia afro-brasileira”. O repertório nacional possui apenas alguns
“poucos dramas superados, nos quais o negro faz o cômico, o pitoresco, ou
a figuração decorativa”. A alternativa mais indicada para o momento é O
Imperador Jones, do dramaturgo norte-americano Eugene O'Neill (1888-
1953). A peça, dirigida por Nascimento, estreia em 1945, no Theatro
Municipal do Rio de Janeiro. Na abertura do espetáculo, o Recitativo Coral
do TEN apresenta uma seleção de poesias afro-americanas. Apesar da
descrença do meio intelectual em relação à ousadia do grupo amador de
intérpretes, quase todos desconhecidos, de montar um autor da força de
O’Neill, a encenação obtém boa receptividade e elogios da crítica ao
protagonista Aguinaldo Camargo (ca.1918-1952).

Nos anos 1940, o TEN, assim como Os Comediantes, se destacam das


companhias profissionais por apresentar uma perspectiva inovadora.
Ambos optam por uma dramaturgia que coloca desafios à representação,
enquanto os artistas profissionais dão pouca importância ao texto teatral e
ignoram as técnicas modernas de encenação. Em 1946, o sucesso de estreia
leva o TEN à escolha de outra peça de O’Neill, intitulada Todos os Filhos
de Deus Têm Asas, com a direção de Camargo. O crítico Gustavo Doria
(1910-1979) comenta a modernidade da companhia no tocante à escolha do
repertório e ao cuidado na mise-en-scène e observa que, além do interesse
em representar, a direção do grupo tem um programa de trabalho de longo
prazo.

Em colaboração com Os Comediantes, o TEN encena, em 1947, Terras do


sem Fim, do escritor Jorge Amado (1912-2001), adaptação do ator Graça
Mello (1914-1979), direção do polonês Zygmunt Turkow (1896-1970) e
cenários de Santa Rosa (1909-1956), considerado o primeiro cenógrafo
moderno brasileiro. o TEN procura estimular a criação de textos que
sirvam aos seus propósitos. A primeira resposta à demanda dramatúrgica da
companhia é O Filho Pródigo, do escritor Lucio Cardoso (1913-1968),
reinterpretação da parábola bíblica e o primeiro original brasileiro do
repertório, encenado em 1947.

Aruanda, de Joaquim Ribeiro (1907-1964), estreia em 1948. O texto,


escrito especialmente para a companhia, versa sobre a religiosidade afro-
brasileira e possui uma ação simples que estrutura os conflitos abordados
na peça: uma lenda de amor entre Rosa Mulata e a entidade Gangazuma,
encarnada em Quelé, seu marido. Em 1949, é a vez de Filhos de Santo, de
José de Moraes Pinho, que trata de várias questões diretamente ligadas à
temática do grupo como o preconceito racial, a desigualdade social e a
religiosidade de matriz africana.

Com base nas dissidências do TEN, surgem algumas companhias de teatro


e dança criadas por ex-participantes: o Grupo dos Novos, em 1949,
liderado por Haroldo Costa, mais tarde transformado no Teatro Folclórico
Brasileiro e, em seguida, no Balé Brasiliana; o Teatro Popular Brasileiro,
fundado em 1950, pelo ator Solano Trindade (1908-1974) e o Balé
Folclórico Mercedes Baptista, criado em 1953, pela coreógrafa Mercedes
Baptista (1921-2014).

Paralelamente à atividade teatral, o TEN propõe a reflexão e o debate em


torno de temas ligados à cultura afro-brasileira e promove uma série de
encontros, como a 1ª Reunião da Convenção Nacional do Negro, em 1945,
e o 1º Congresso do Negro Brasileiro, em 1950. Funda o Instituto Nacional
do Negro, em 1949, departamento de estudos e pesquisas do TEN e
publica, entre 1948 e 1950, dez números do jornal Quilombo, com notícias
sobre as atividades do TEN e de outras entidades do movimento negro.

Nascimento escreve Sortilégio para o TEN, encenada por Léo Jusi (1930)
no Theatro Municipal do Rio de Janeiro em 1957. De acordo com o crítico
Edélcio Mostaço (1949), o texto revela influências de O´Neill, Nelson
Rodrigues (1912-1980) e Shakespeare (1564-1616), sendo uma “obra
dramaturgicamente amadurecida, não desmerecendo os modelos nos quais
deliberadamente se apoia”. A peça sintetiza o longo percurso do grupo na
procura de uma dramaturgia intrinsecamente negra.4 É criado, em 1964, o
Curso de Introdução ao Teatro Negro e às Artes Negras.

Em 1966, já no período da ditadura militar, o TEN é impedido pelo


Ministério das Relações Exteriores de se apresentar no 1º Festival de Arte
Negra no Senegal com a peça Além do Rio – uma adaptação de Medeia, de
Eurípides (484- 406 a.C.), feita por Agostinho Olavo. O espetáculo é
considerado pelas autoridades como não representativo da cultura
brasileira.

Com a repressão política, as estratégias de ação do TEN tornam-se restritas.


Nascimento fica à frente do Teatro Experimental do Negro até 1968, mas,
em decorrência do endurecimento do regime militar e da inclusão do seu
nome em vários inquéritos policiais militares, acaba por exilar-se nos
Estados Unidos.
O antropólogo Julio Cesar Tavares classifica o TEN como “teatro de
intervenção”: “[...] seu signo mais relevante foi de ordem pedagógica-
política. Sua função se afirmou, num país de analfabetos, como a de um
veículo conscientizador e gerador de novas saídas para o negro, dentro da
clausura gerada por um processo de permanente exclusão”.5 O TEN
contribui para a formação de uma importante geração de atores negros para
teatro, cinema e televisão, da qual fazem parte Ruth de Souza (1930),
Haroldo Costa, Léa Garcia (1933) e José Maria Monteiro (1923-2010).

Para Abdias do Nascimento: “O Teatro Experimental do Negro é um


processo. A negritude é um processo. Projetou-se a aventura teatral afro-
brasileira na forma de uma antecipação, uma queima de etapas na marcha
da história. Enquanto o negro não desperta completamente do torpor em
que o envolveram. Na aurora do seu destino, o Teatro Negro do Brasil
ainda não disse tudo ao que veio”.

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