Você está na página 1de 4

Mutações nos comportamentos e na cultura

a) Transformações na vida e na cultura


Nas vésperas da 1ª Guerra Mundial verificava-se uma crescente
concentração populacional que veio provocar significativas alterações na
vida e nos valores tradicionais do mundo ocidental: um novo modo de
viver e de convívio no meio da multidão.

I) Uma nova sociedade


Ao concentrar-se nas cidades, a população abandona hábitos e vínculos
sociais anteriores e adquire novas formas de sociabilidade, num ambiente
estranho e, por vezes, hostil. Este desenraizamento individual desumaniza
e despersonaliza a vida urbana que segue um modelo estandardizado, ou
seja, a vida urbana atinge a massificação (género de vida na cidade em
que os comportamentos seguem normas, padrões e práticas, tornando as
pessoas indiferenciadas) – saída para o emprego, uso dos meios de
transporte, viver em apartamentos, compra dos mesmos produtos e
realização das mesmas tarefas, nos tempos livres, por ex. (cafés, cinema,
desporto).
Surge uma nova visão de ócio e forma de organizar os tempos e espaços
dedicados ao lazer e lugares públicos de convívio: jardim, clubes
nocturnos, esplanadas, etc. A racionalização e consequente redução do
tempo de trabalho, assim como a melhoria do nível de vida, permitiram
dispor de tempo e dinheiro para o divertimento e o prazer. Abriu-se um
outro ciclo de solidariedade humana e convivência entre sexos, de modo
mais ousado e livre, que rompeu com todas as regras sociais impostas até
aqui. O ritmo de vida torna-se frenético e o gosto pela acção e pela
velocidade é visível pela prática desportiva e uso do automóvel, no
aparecimento de novos ritmos como o Jazz, o fox trot ou o charleston, que
fazem moda para escândalo dos mais conservadores. As viagens e as férias
democratizam-se.
Inicialmente, as mudanças limitavam-se às camadas superiores da
sociedade, mas cedo se estendem às camadas inferiores, desejosas de
imitar os novos padrões, veiculados pelo novo e poderoso meio de massas
– o cinema, não esquecendo o rádio.

II) A crise dos valores tradicionais


O progresso e cultura que dava ao mundo ocidental uma superioridade na
viragem do século foi posta em causa pela 1ª Guerra Mundial
desmoronando toda a moral burguesa anterior, como referido
anteriormente relativamente aos comportamentos.
A morte de milhões de soldados, a miséria e a destruição gerou um
sentimento de desalento e descrença no futuro, afectando toda a
sociedade. Por outro lado, a massificação da vida urbana, a laicização da
sociedade e as novas concepções científicas e culturais são também
responsáveis por esta ruptura no padrão de valores e comportamentos
sociais vigentes.
Deu-se uma profunda crise de consciência que atinge todos os sectores da
vida: na família (métodos anticoncepcionais levam ao controlo da
natalidade e à sua redução), no casamento (regulamentação do divórcio
torna o casamento mais instável), na moral sexual (dissocia-se da função
reprodutora), na religião, no papel da mulher, em toda a conduta social
(Anomia social – conjunto de comportamentos desviantes por parte de
alguns indivíduos alheando-se das regras impostas pelo grupo – em que
este chega a já não distinguir o certo do errado).

III) A emancipação da mulher


O novo papel que a mulher vai ocupar na sociedade é bem exemplo das
alterações verificadas. Nos “Loucos Anos 20”, fruto da euforia do pós-
guerra (procura de prazer e evasão – anos de recuperação económica,
confiança no futuro, desejo de esquecer o horror da guerra), as jovens
sobem as saias até ao tornozelo, cortam o cabelo à rapaz, e desafiam as
convenções sociais (vida nocturna). No entanto, este foi apenas o lado
escandaloso do nascente feminismo (luta levada a cabo pelas mulheres
com vista a obter a igualdade de direitos para ambos os sexos) ou da
emancipação da mulher.
Este movimento, iniciado nos finais do século XIX, começa por reivindicar
certos direitos das mulheres casadas: propriedade dos bens, tutela dos
filhos, acesso à educação e a uma carreira profissional, num esforço de
tirar a mulher da posição secundária e subalterna que a obrigavam a ter
na sociedade burguesa. Já no século XIX, a mulher lutava pelo direito ao
voto – Sufragistas (defensoras do alargamento do voto às mulheres /
sufrágio universal). Estas destacavam-se através de acções como
manifestações e greves de fome.
Em Portugal, em 1909, surge a Liga Republicana das Mulheres
Portuguesas e, em 1911, a Associação de Propaganda Feminina com os
mesmos objectivos, salientando-se nomes como Ana Castro Osório e
Carolina Beatriz Ângelo, entre outras.
As feministas utilizaram várias formas de chamar a atenção (moda,
vestuário, cabelo, substituição do espartilho pelo soutien, etc.). Tudo o
que significasse uma libertação da mulher em relação aos preceitos
tradicionais. Inicialmente, alvo de escárnio e censura, após a 1ª Guerra, as
mulheres rapidamente conquistaram as suas reivindicações. Para este
facto, muito terá contribuído a força das mulheres e sua adaptação às
circunstâncias trazidas pelo conflito mundial, pois estas tinham
conseguido substituir o homem em praticamente todas as tarefas.
Valorizando as pretensões das mulheres e dando-lhes autoconfiança.
Assim, ao terminar o conflito, na maioria dos países, tinham já conseguido
tudo aquilo porque haviam lutado antes.
Entre as principais conquistas dos movimentos feministas na final dos
anos 20 destaca-se o reconhecimento às mulheres, em muitos países: do
direito a votar e exercer funções políticas; pleno acesso aos cargos
públicos; igualdade no quadro familiar e no trabalho; o convívio social e
frequência dos espaços públicos e todas as conquistas na forma de vestir e
apresentar.
É uma emancipação limitada a áreas sociais restritas, no entanto é um
passo importante para o caminho que as mulheres terão de percorrer. Nas
décadas seguintes verifica-se um certo retrocesso, com a mulher a voltar
aos seus papeis mais tradicionais (esposa, mãe, dona de casa), para só nos
anos 60 se começar a verificar uma mudança radical, muito por culpa da
revolução sexual trazida pela pílula contraceptiva – uma invenção
libertadora.
Embora ainda hoje existam algumas resistências, sobretudo na prática, à
consignada igualdade da mulher.

Você também pode gostar