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O longo movimento pelos direitos civis e os usos políticos do passado


Jacquelyn Dowd Hall. Journal of American History. Bloomington. Mar 2005. Vol 91

(tradução – Jefferson Martins Viel) Não revisado

“A revolução negra é muito mais do que uma luta pelos direitos dos negros. Ela está
forçando a América a encarar todas as suas falhas inter-relacionadas - racismo, pobreza,
militarismo e materialismo. Ela está expondo males enraizados profundamente em toda
estrutura de nossa sociedade... e sugere que a reconstrução radical da sociedade é a real
questão a ser encarada.”
Martin Luther King Jr

“Histórias são coisas maravilhosas. E elas são perigosas”


Thomas King

O movimento pelos direitos civis circula pela memória americana através de moldes e
canais, que são, ao mesmo tempo, poderosos, perigosos e muito contestados. Os memoriais
dos direitos civis disputam espaço com os onipresentes monumentos sulistas, referentes ao
seu passado confederado. Estudos e documentários exemplares são abundantes e seus
participantes têm produzido ondas de autobiografias, ao menos duzentas até agora. Imagens
do movimento aparecem e reaparecem todo ano no feriado de Martin Luther King e durante o
Mês da História Negra. Ainda assim, recordar é sempre uma forma de esquecer e a narrativa
dominante do movimento pelos direitos civis - destilada da História e da memória; retorcida
pela ideologia e contestação políticas e incorporada nos passeios históricos, museus, rituais
públicos, livros didáticos e variados artefatos de cultura de massa - distorce e suprime tanto
quanto revela.
Centrando no que Bayard Rustin, em 1965, denominou a fase “clássica” da luta, a
narrativa dominante registra um curto movimento pelos direitos civis, que se inicia com a
decisão Brown contra Conselho de Educação (Brown versus Board of Education), de 1954,
prossegue através dos protestos públicos e culmina com a aprovação da Lei dos Direitos Civis,
de 1964, além da Lei do Direito ao Voto (Voting Rights Act), de 1965. Então, ainda segundo
essa narrativa, ocorre o declínio. Após uma temporada de clareza moral, o país é envolto pela
Guerra do Vietnã, por distúrbios urbanos e pela reação contra os excessos do final da década
de 1960 e começo dos anos 1970, entendidos, na maioria das vezes, como rebeliões
estudantis, militância negra, feminismo, tentativas de integração, ação afirmativa ou um
presumido estado de bem estar social. Uma resposta branca prepara o palco para um intervalo
conservador, que, para o bem ou para o mal, dependendo da convicção ideológica de cada um,
marca o início de outra história, a história que nos cerca agora.
Martin Luther King Jr é um tipo de narrativa definida como “figura congelada”. Ao
proclamar, em 1963, “eu tenho um sonho”, durante a marcha em Washington, seu discurso é
reproduzido infinitamente, mas mesmo citadas de forma seletiva suas manifestações mantêm
sua majestade ainda que percam sua fisgada política. Contudo, pouco é ouvido do King que
acreditava que “a questão racial enfrentada na América não é regional, mas um problema
nacional”, do homem que atacava a segregação também no norte urbanizado. Apagado
completamente é o ativista que se opôs à Guerra do Vietnã e que ligou o racismo em seu país
ao militarismo e imperialismo praticados pelo EUA no exterior. Esquecido é o King socialista
democrata, que defendia a sindicalização, planejou a Campanha dos Pobres e foi assassinado
em 1968, apoiando uma greve de trabalhadores da limpeza pública.
Ao restringir a luta pelos direitos civis ao sul, ao censurar heróis, limitar o movimento a
uma única e pacífica década, com objetivos não econômicos e restritos, a narrativa mestra
simultaneamente eleva e reduz o movimento. Ela garante o status da fase clássica, como um
momento triunfal dentro de uma narrativa maior sobre o progresso americano, ainda que com
isso termine por minar as virtudes desse progresso. Entretanto, Isso impede que um dos
movimentos em massa mais importantes na história americana dialogue de forma eficaz com
os desafios do nosso tempo.
Embora a narrativa que introduzi tenha várias fontes, este ensaio enfatizará como o
significado do movimento tem sido distorcido e como a Nova Direita está inclinada em reverter
seus ganhos. Irei, em seguida, traçar os contornos da história, que considero mais robusta,
contínua e mais verdadeira. A história de um longo movimento pelos direitos civis, que se
enraizou nos meios sociais liberais e radicais do final dos anos 1930, está intimamente ligada
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ao surgimento e queda do New Deal, que acelerou durante a 2ª Guerra Mundial, se estendeu
muito além do sul, foi contínua e ferozmente contestada e, nos anos 1960 e 1970, inspirou o
“movimento dos movimentos”, que desafia qualquer narrativa de colapso.
Complementar a essa história maior está a dialética entre o movimento e a reação
contra ele, um muro de resistência que não surge subitamente na muito criticada década de
1970. Ela aflorou em conjunto à ofensiva dos direitos civis, como consequência da 2ª Guerra
Mundial e culminou sob a égide da Nova Direita. As dimensões econômicas do movimento
estão no cerne das minhas preocupações e ao longo do texto chamarei a atenção para os
entrelaçamentos de gênero, classe e raça. Neste ensaio, contudo, as narrativas e os dilemas
raciais terão lugar central, pois, como sugerido por Lani Guinier e Gerald Torres, “aqueles que
são racialmente marginalizados são como os canários dos mineiros: sua angústia é o primeiro
sinal de um perigo que nos ameaça a todos”.
Um desejo de entender e honrar o movimento encontra-se no coração da rica e
transformadora literatura que se desenvolveu na década de 1950 e início de 1960. Cronistas
dessa época ajudaram a dotar a luta com uma aura de legitimidade cultural, que ao mesmo
tempo reflete e reforça seus profundos efeitos legais, políticos e sociais. Ao colocar eventos da
fase clássica, que agitaram o mundo no contexto de uma longa história, eu quero reforçar esse
projeto de representação e reiterar a autoridade moral de quem lutou por mudança naqueles
anos. Ao mesmo tempo, eu quero tornar os direitos civis mais sólidos, mais difíceis de serem
celebrados como uma progressão natural dos valores americanos, mais difíceis de serem
elencados como uma fábula moral satisfatória. Mais do que isso, mais difíceis de serem
simplificados, apropriados e controlados.

Os usos políticos das narrativas raciais


As bases da narrativa dominante estão na gangorra entre os estrategistas do
movimento e a resposta da mídia. Em dramáticos e sucessivos protestos, ativistas pelos
direitos civis expressaram suas exigências na linguagem dos direitos democráticos e do
universalismo cristão; demonstraram sua própria respeitabilidade e coragem e opuseram-se
através da não violência contra armas, cassetetes e punhos. Em disputas nas cortes, nos
tribunais, nas câmaras legislativas, nos locais de trabalho e nas ruas, esses dramas sociais
derrubaram o sistema sulista de cassação do direito ao voto e a segregação legalizada ou não
oficial, forçando a intervenção das autoridades federais e obrigando os governos locais a
ficarem de joelhos. A mídia, por sua vez, fez dos protestos uma das grandes notícias da era
moderna, mas o fez de uma maneira muito seletiva. O interesse dos jornalistas crescia e
diminuía conforme a habilidade dos ativistas de gerarem personalidades carismáticas
(comumente homens) capazes de grandes confrontos televisivos, preferencialmente aqueles
em que vilões brancos derramavam terror contra manifestantes pacíficos vestindo suas
melhores roupas dominicais. Trazidas para as salas de estar americanas, pelo sedutor e novo
meio televisivo, e repetidas desde então, tais cenas parecem vir de lugar nenhum e não ter
precedentes nem raízes históricas. Para compor essa distorção, a cobertura esmagadoramente
simpática da imprensa nacional, mesmo ilusória, mudou completamente em meados dos anos
1960 com o advento do Black Power e as revoltas negras no norte urbano. Treinando um olhar
hostil sobre essa transformação, as câmeras se afastaram do sul, ignorando as metas de
evolução da campanha daquela região, obscurecendo as semelhanças e ligações inter-
regionais, além de criar uma narrativa que impunha uma brecha entre o que as pessoas
pensavam sobre o movimento e as lutas populares em curso no final nos anos 1960 e 1970.
Os primeiros estudos sobre o movimento de libertação negra frequentemente estiveram
próximos ao princípio do jornalismo como “rascunho da história”, replicando seus julgamentos e
trajetória. Histórias, memórias e documentários mais recentes têm se esforçado em aliviar essa
influência. Por que, então, parece que a narrativa dominante tem consolidado seu poder? A
resposta está, em parte, no surgimento de outros contadores de histórias, os arquitetos da
Nova Direita, uma aliança de agentes do poder corporativo e intelectuais conservadores ao
velho estilo, além de neoconservadores (liberais e socialistas desiludidos, que se tornaram
águias da Guerra Fria).
A Velha Direita, do norte e do sul, esteve do lado errado da revolução, opondo-se ao
movimento pelos direitos civis e injuriando seus líderes em nome dos direitos à propriedade,
dos direitos do Estado, do anticomunismo, do direito divino e da inferioridade biológica dos
negros. Amplamente moribundo nos anos 1960, o movimento conservador reinventou-se nos
anos 1970, primeiro ao incorporar neoconservadores que se afastaram do racismo antiquado
para então, ao abraçar um ideal de igualdade formal, focar nas ostensivas falhas dos negros,
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posicionando-se como os verdadeiros herdeiros do legado dos direitos civis. Como todas as
tentativas de obter o poder discursivo e político, esta precisava da garantia do passado e a
narrativa dominante do movimento pelos direitos civis tinha sua carta na manga. Retrabalhando
essa história para seus propósitos, os novos “conservadores daltônicos” ignoraram a
complexidade e o dinamismo do movimento, seu crescente foco na desigualdade estrutural e
seus objetivos de "reconstrução radical". Em vez disso, eles insistiam que o daltonismo,
definido como a eliminação de classificações raciais e o estabelecimento de igualdade formal
ante a lei, era o único objetivo do movimento, o princípio pelo qual King e a Decisão Brown, em
particular, levantaram-se. Eles admitiram que o racismo existiu, mas deveria ser entendido
como uma intolerância individual (em um passado distante e principalmente no sul). Uma
concessão que seguramente deve ter pegado a Velha Direita de surpresa. Mas, para eles,
depois de legalizado Jim Crow foi desmantelado e tais irracionalidades reduzidas até a
insignificância. Assim, na ausência de leis abertamente discriminatórias e com o declínio do
preconceito consciente, as instituições americanas teriam se tornado basicamente justas.
Dessa forma, livres para competir numa sociedade de mercado, os afros americanos teriam
que arcar com o ônus de seu próprio fracasso ou sucesso. Se as desigualdades gritantes do
grupo persistiam, as atitudes dos negros, seu comportamento e as estruturas familiares eram
os culpados, segundo essa narrativa. Uma solução chamada “raça consciente”, concebida nos
anos 1960 e 1970, para implementar as vitórias do movimento, tais como distritos de votação
com maioria negra, abandono dos pontos comerciais exclusivo para minorias, ação afirmativa e
o intercâmbio racial escolar de mão dupla, não foi cunhada pelo autêntico movimento pelos
direitos civis. Ela foi Impingida sobre um público inconsciente, por uma “elite liberal” constituída
de juízes, intelectuais e burocratas do governo, essas políticas não apenas traíram os objetivos
originais do movimento, elas também tiveram um pequeno efeito sobre o progresso econômico
experimentado pelos negros no final da década de 1960 e 1970. Esse progresso foi ocasionado
não por reformas de base ou intervenção governamental, mas pelas forças impessoais do
mercado. De fato, a solução tornou-se causa dos problemas, criando ressentimento entre os
brancos, subvertendo a autoconfiança entre os negros e encorajando a “balcanização”, quando
nacionalismo e assimilação deveriam ser os objetivos. Ficou a cargo dos “conservadores
daltônicos” a tarefa de restaurar o propósito original das leis dos direitos civis, que deveriam
prevenir atos irregulares isolados contra indivíduos, mas, em vez disso, como muitos ativistas
pelos direitos civis e juristas afirmaram, para compensar o presente, institucionalizaram-se
manifestações históricas de injustiças contra os negros como grupo.
Desabrochada nos poços bem fundamentados do pensamento de direita e transmitida
para o público em geral, essa narrativa racial teve amplo apelo, em parte porque estava em
conformidade com os interesses da classe média branca e lisonjeava as vaidades nacionais,
em parte porque ressoava os ideais de esforço individual e mérito amplamente compartilhados.
A crença americana no individualismo de livre mercado, combinada com as vitórias ideológicas
do movimento (que assegurava que a supremacia branca devia “esconder sua face”) fez a
retórica do daltonismo central para a “guerra de idéias” iniciada pela Nova Direita nos anos
1970. Com a vitória presidencial de Ronald Reagan, em 1980, e sobretudo após a varredura do
Congresso em 1994, essa retórica entrincheirou-se na política pública. Articulada com o
retrocesso trazido pela política de raça específica entre os liberais centristas, ela cruzou as
fronteiras políticas tradicionais e agora molda o pensamento de uma grande maioria de
pessoas de boa vontade.
Evidentemente, as histórias que contamos sobre os direitos civis são importantes, elas
moldam a maneira como vemos nosso próprio mundo. “Fatos” devem ser interpretados e essas
interpretações narradas por poderosos contadores de histórias, retratadas em eventos
públicos, postas em prática através de leis, políticas, decisões judiciais e fundamentadas em
instituições tornam-se fontes primárias da ação humana. Aqueles que aspiram afetar a opinião
pública e política participando, assim, da infindável luta sobre nosso destino coletivo devem
sempre perguntar-se a si mesmos não apenas que histórias promover, contestar e aceitar
como ”verdade”, mas também como disciplinar essas histórias com pesquisa e experiência
para desenvolvê-las, então, com força. No mundo de políticas simbólicas, as respostas a essas
perguntas determinam quem irá prevalecer.
Nesse espírito, eu me voltarei agora para uma história de minha autoria – a história do
longo movimento pelos direitos civis e a resistência contra ele. Ao longo dessa jornada,
recorrerei ao trabalho de uma ampla gama de historiadores, enlaçando histórias que
geralmente são contadas separadamente, de modo a alterar entendimentos comuns da luta
negra por liberdade (e como desembarcamos nos dilemas do novo milênio) em no mínimo seis
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formas principais. Primeira, essa nova narrativa, maior e mais ampla, mina o discurso que
coloca o sul como “oposto da nação”, uma imagem que relega o racismo àquela parte do país e
protege de um exame minucioso tanto as dimensões econômicas quanto os padrões
institucionalizados de exploração e segregação em outras regiões – padrões que sobreviveram
ao movimento pelos direitos civis e agora também definem o panorama racial no sul. Segunda,
essa narrativa enfatiza o nó górdio que amarra raça a classe e direitos civis a direitos
trabalhistas. Terceira, ela sugere que o ativismo das mulheres e as dinâmicas de gêneros
foram centrais, tanto para o movimento por liberdade quanto para a reação contra ele. Quarta,
torna visíveis as lutas pelos direitos civis no norte, no meio oeste e no oeste, que entraram em
uma nova fase com a mudança para o nacionalismo negro na metade dos anos 1960, mas que
começaram, no mínimo, um quarto de século antes. Quinta, ela direciona atenção ao esforço
de se fazer uso das reformas conquistadas pelo movimento por direitos civis nos anos 1970,
após a suposta morte nacional do movimento e, finalmente, interpreta a ascensão Reagan-
Bush não simplesmente como uma resposta ao “movimento dos movimentos” do fim dos anos
1960 e 1970, mas como um desenvolvimento com raízes históricas profundas.

O longo contra ataque


Duas grandes migrações internas deram origem tanto ao longo movimento por direitos
civis quanto aos interesses e ideologias que fariam, em última análise, alimentar a resistência
mais notável contra ele: o êxodo de afro-americanos para as cidades do norte, sul e oeste
precipitado pelo colapso do sistema produtivo rural do sul e a suburbanização em massa dos
brancos. Aceleradas durante a Segunda Guerra Mundial, essas realocações de pessoas e
recursos transformaram a geografia racial do país. Cada uma causou uma resposta e,
reflexivamente, agiu sobre a outra. Elas estiveram necessariamente entrelaçadas, embora
frequentemente de modo invisível.
Sexo, classe, região e raça moldaram ambas as experiências migratórias. Por conta da
discriminação no norte, os piores trabalhos nas fábricas foram separados aos homens negros,
além disso, as mulheres carregavam o peso de uma dupla jornada. Relegadas principalmente
ao serviço doméstico, elas não combinavam apenas o trabalho assalariado aos afazeres
domésticos, mas também com serviços familiares e nas redes sociais, práticas enraizadas nas
tradições folclóricas e familiares do sul, o que ressaltou a união das vizinhanças e forneceu a
teia de segurança que as políticas de bem estar discriminatórias negaram. Tais redes também
ajudaram a apagar as fronteiras urbano-rurais, assegurando que as lutas na cidade e no campo
seriam mutuamente reforçadas
Enquanto o folclore negro rural se agarrou ao homem do campo, dominado por
políticas e práticas que exploravam seu trabalho, retirando-o da terra, migrantes urbanos
lutavam para “manter o Mississipi fora da Califórnia” e a “mentalidade rural” fora das cidades do
sul. De fato, a ressonância da metáfora da lavoura para o negro por todo o país sugere a
profundidade e duração das memórias regionais e das conexões inter-regionais. Entretanto, em
um sentido a metáfora é enganosa. Para os migrantes negros que construíram seu caminho
para a “terra prometida” e viram-se confrontando não o Mississipi na Califórnia, mas formas de
discriminação indígenas e segregação de fato. O resultado não “de costume”, mas “de fato”
implica em uma combinação de escolhas individuais e políticas governamentais (algumas
flagrantes e algumas aparentemente neutras). Frequentemente tinham a intenção de barrar os
afro-americanos do acesso a empregos decentes, escolas, habitação, bem como aos espaços
de lazer pagos, que simbolizavam de um modo crescente o chamado “fazendo-se na América”,
para as etnias brancas que estavam em direção à classe média.
Ironicamente, os programas do New Deal ajudaram a aumentar essas barreiras. Em
conjunto com os maiores salários conquistados pelos recém criados sindicatos no Congresso
das Organizações Industriais (COI), a expansão do estado de bem estar social atenuou a
terrível insegurança de vida das classes trabalhadoras negra e branca de modo semelhante.
Mesmo a mentalidade “racializada” e “de gênero” dos partidários do New Deal também acabou
por construir a desigualdade de raça e sexo dentro da fundação do estado moderno. Essas
desigualdades foram intensificadas pelas concessões exigidas tanto pelos congressistas
conservadores republicanos quanto pelos democratas dos sul, que deviam sua antiguidade no
Congresso e, assim, o domínio de comitês-chaves ao comprimido eleitorado da região e à
regra do partido único.
Uma demonstração da desigualdade sistêmica pode ser observada em um processo de
bem estar social de mão dupla enraizado em um ideal de “ganho familiar”, nele o trabalhador
era simbolizado como arrimo de família em tempo integral, aquele que sustentava os filhos, os
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dependentes e a esposa, que não recebia salário – um tipo ideal que excluía a maioria dos
negros. Quando o seguro desemprego foi promulgado em 1935, por exemplo, ele não foi
estendido aos trabalhadores rurais ou domésticos. Os reformistas não os viam como
independentes, arrimos de família em tempo integral, mas sim como dependentes dos baixos
salários da economia do sul. Como resultado, 55% de todos os trabalhadores afro-americanos
e 87% de todas as mulheres afro-americanas assalariadas foram excluídos de um dos
principais benefícios do New Deal. No lugar de tais proteções, eles se tornaram dependentes e
estigmatizados dos mesquinhos programas hoje conhecidos como “bem estar”.
Enquanto as populações metropolitanas explodiam, uma furiosa disputa por moradia
fez os afro-americanos ficarem face a face com outra limitação do New Deal. Os homens
brancos eram desproporcionalmente beneficiados pelo “G.I. Bill of Rights”, um gigantesco
programa de bem estar social aprovado pelo Congresso no fim da 2ª Guerra Mundial, que
concedia incentivos aos veteranos que regressaram do conflito. Combinado com um ambicioso
programa de habitação, o G.I. Bill of Rights atraiu ávidos trabalhadores étnicos e da classe
média branca para fora das cidades, para longe de vizinhos negros e dentro de arcos
suburbanos sempre em expansão. Séculos de difamação racial, agravados pelas divisões
construídas dentro do sistema de bem estar de mão dupla, predispuseram os cidadãos brancos
das cidades a temerem os migrantes negros. Mas o que veio a ser conhecido como “voo
branco” foi causado não apenas por atitudes individuais, mas também por uma gama de
lucrativas – e governamentais – políticas direcionadas. Conselhos locais de zoneamento e
construção em regiões de autoestradas equipararam negros a “ferrugem”, afugentando
compradores brancos e direcionando os investimentos para longe das vizinhanças negras
Corretores de imóveis fizeram os moradores brancos fugirem em debandada, induzindo-os a
venderem seus imóveis por baixos preços ao mesmo tempo em que os repassavam aos
negros por preços elevados. Delimitando esses territórios com linhas vermelhas, os bancos
negavam hipotecas aos afro-americanos e qualquer interessado em vizinhanças mistas. E o
mais relevante, a Agência Federal da Habitação seguiu políticas de crédito que não apenas
favoreceram, mas praticamente determinaram a homogeneidade racial.
Encorajados por incentivos fiscais, programas de construções de rodovias e um desejo
de flanquear os novos sindicatos, fábricas e negociantes também se mudaram para os
subúrbios, corroendo as bases fiscais das cidades, deteriorando as infraestruturas e
eviscerando os serviços municipais. O crescimento de subúrbios segregados também
exacerbou a tendência em direção da quase completa segregação nas escolas das cidades. A
prática de apoiar a educação pública através de impostos locais e a divisão ferozmente
guardada entre distritos escolares urbanos e suburbanos, combinada com escolhas
conscientes e racialmente motivadas, referentes à localização das escolas e à matrícula de
alunos, relegou aos migrantes negros as escolas que muitas vezes tão segregadas e desiguais
quanto aquelas que haviam deixado para trás.
O processo de migração em cascata, discriminação nos empregos, suburbanização e
reforma codificada pelo New Deal teve três efeitos principais. Primeiro, ao término do curso dos
anos 1940, a raça tornou-se cada vez mais espacializada, tornando-se invisíveis para os
brancos os privilégios que acumularam por meio da raça e cor, embasando o que os
moradores dos subúrbios passaram a ver como os frutos legítimos de seu próprio trabalho.
Segundo, a “fronteira suburbana” semeou uma nova política de proprietários de imóveis,
baseada em baixos impostos, direitos de propriedade, autonomia de vizinhança e um diminuto
senso de responsabilidade social, todos elementos que se envolveram com a identidade racial
de forma que seria extremamente difícil de desfazer. Finalmente, os afro-americanos, já
sobrecarregados pelas privações sociais e econômicas da escravidão, além de Jim Crow,
encontraram-se em desvantagem pelas práticas trabalhistas e políticas estatais, que
valorizavam ações afirmativas para os brancos. Em uma sociedade em que um lar
representava para a maioria das famílias a sua posse mais importante, o acesso diferenciado a
hipotecas, mercados imobiliários e a valorização racial dos bairros foram traduzidos em
enormes desigualdades para os negros. Passadas de geração em geração, essas
desigualdades persistem atualmente, causando curto-circuito no acúmulo geracional de saúde
e capital social, que impulsionaram outras minorias étnicas para a classe média após a 2ª
Guerra Mundial, essas políticas deixaram um legado de desigualdade racial que deve ser ainda
hoje seriamente discutido.

Estratégias sulistas
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Temos agora uma vasta literatura sobre a suburbanização pós-guerra e o


aprofundamento da segregação no norte e oeste. Mas com muita freqüência o segregado, rural
e atrasado sul figura nesta história apenas como uma nota de rodapé ou como uma exceção à
regra. De fato, por conta do crescimento das cidades da região na era do New Deal, o
automóvel e a expansão suburbana, o moderno sul pode ser melhor visto como um paradigma.
Olhando para trás, a partir da perspectiva da narrativa dominante, é fácil ver um
peculiar sistema legal de segregação como uma característica definidora do sul. Mas
separação espacial nunca foi o objetivo principal dos brancos sulistas. Negros e brancos
engajaram-se em constantes e matizadas interações, regradas pelas amarras pessoais,
interesses econômicos, dinâmicas de classe e sexo e marcadas por trocas sociais.
Acontecendo dentro de um contexto de hierarquia racial, essas interações não diminuíram a
perniciosidade e o poder da segregação, ainda que fornecendo a sensação de contato
permanente entre negros e brancos, porém mantendo o crucial papel dos negros como fonte
barata de trabalho. O que definimos como era da segregação deve ser melhor entendida como
a era do “capitalismo racial”, em que a segregação era apenas um instrumento da supremacia
branca, que implicava não apenas dominação racial, mas também práticas econômicas.
Seguida por uma oligarquia industrial e agrícola que buscava engrandecer-se e implementar
uma estratégia de desenvolvimento particular para a região, essas práticas envolveram a
redução de impostos, investimento mínimo em capital humano, separação e imobilização
política de negros e brancos pobres do sul, exploração dos não sindicalizados, subemprego
para negros e brancos e controle patriarcal das famílias e instituições locais.
Essas estratégias criaram um sistema social baseado na raça de forma ostensiva e
particularmente brutal, especialmente no extremo sul. Porém, suas doutrinas básicas –
subordinação de classe e raça, regulação governamental limitada, locais de trabalho
dessindicalizados e uma classe trabalhadora racialmente dividida – encaixaram-se sem
problemas com uma ética de capitalismo laissez-faire, enraizada profundamente em solo
americano. Isso não minimiza diferenças regionais, mas serve, entretanto, para sugerir que
quanto mais nos afastamos das campanhas que derrubaram o sistema distintivo do sul de
segregação patrocinada pelo Estado, mais fácil torna-se observar os mais amplos e, em última
análise, mais duráveis padrões de privilégios e exploração que eram americanos, não sulistas,
em suas origens e consequências.
Padrões comuns significavam que a prosperidade sulista pós-guerra poderia estreitar
diferenças regionais sem eliminar lacunas raciais. A mudança começa a ocorrer seriamente na
década de 1940 e se acelera nas duas décadas seguintes. Enquanto os sulistas, respondendo
seletivamente ao estado ativista do New Deal (ao invés de combatê-lo, como os observadores
muitas vezes admitem), usavam sua antiguidade no Congresso para angariar uma parcela
desproporcional dos gastos com defesa, ao mesmo tempo demandavam controle local e do
governo sobre programas federais para habitação, construção de hospitais, educação e afins.
A estratégia ajudou a aumentar os salários e triplicar a renda regional nos anos 1940, mas
também mitigou os esforços federais antidiscriminação. Simultaneamente, indústrias sulistas,
como suas compatriotas em outras regiões, reagiram ao aumento salarial e à militância
trabalhista que se seguiu à 2ª Guerra Mundial, instalando máquinas automáticas e eliminando
empregos mantidos pelos negros, ao mesmo tempo em que os brancos monopolizavam os
novos empregos especializados e os de colarinho branco, os quais demandavam qualificação,
negada aos negros tanto pelas desigualdades educacionais quanto pelas práticas
discriminatórias que os impediam de aprender no trabalho. Portanto, enquanto o sul
prosperava, as disparidades raciais se ampliavam.
Além disso, muito da nova força de trabalho técnica e administrativa do sul foi
importada do norte urbanizado. Antes da 2ª Guerra Mundial, o objetivo principal da maioria dos
políticos era manter o isolamento da região e a oferta de trabalho cativo, do qual o sistema rural
dependia. Mais tarde, o ufanismo tornou-se a razão de ser desses líderes e a “venda do sul”
começou. Baixos impostos corporativos, reduzidos benefícios sociais e uma política ambiental
de “vistas grossas”, juntamente com a construção de rodovias financiadas pelo governo federal,
atraíram indústrias e um influxo de nascidos no norte, republicanos, diretores de agências
raciais, supervisores e técnicos. Esses recém chegados, equiparados a seus correspondentes
sulistas em classe – e raça – acentuaram enclaves criados pelas mesmas políticas públicas de
neutralidade racial, que espalharam as raças no norte. Com a multiplicação da suburbanização
vieram as atitudes e vantagens que embasariam a versão sulista da política dos proprietários
de imóveis. A política do enfrentamento em todos os lugares. A estratégia sulista de Richard M.
Nixon, que atacou os benefícios sociais, a integração escolar e as ações afirmativas, de modo
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a trazer os brancos do sul à orla republicana, tinha como alvo os seguintes eleitores:
moradores de classe média dos subúrbios, incluindo trabalhadores especializados vindos de
fora do sul e jovens famílias que chegaram após a “Brown Decision” e estavam desconfortáveis
com a retórica abertamente racista de resistência massiva. Também destinada aos
trabalhadores urbanos do norte, essa estratégia ajudou a fazer do sul um dos principais redutos
do partido republicano, enquanto durante o próximo quarto de século o partido abandonaria sua
moderação e começaria a desmantelar as políticas do New Deal.

O longo movimento pelos direitos civis


Ainda que o resultado não fosse inevitável, seriam necessários muitos anos de astuta e
agressiva organização para trazer o regime conservador ao poder de hoje. Isso exigiu muito
esforço, pois outra força surgiria do caldeirão da Grande Depressão chegando a seu auge nos
anos 1940: um poderoso movimento social desencadeado pela alquimia de trabalhistas,
ativistas por direitos civis e progressistas defensores do New Deal, além de negros e brancos
radicais, alguns dos quais associados ao partido comunista. Robert Korstad os chamou:
“sindicalismo pelos direitos civis”, Martha Biondi de “frente popular negra”; ambos os termos
significam o compromisso do movimento em construir coalizões, a expansividade da sua visão
social democrática e a importância de seu radicalismo negro e liderança trabalhista. Um
movimento nacional, cuja ala sulista tornou-se vital, o sindicalismo pelos direitos civis não foi
apenas um precursor do moderno movimento pelos direitos civis, ele foi uma primeira e
decisiva fase.
A ligação entre raça e classe está no coração do imaginário político do movimento.
Historiadores têm retratado os anos pós-guerra como o momento em que a raça obscureceu a
classe como questão fundamental do liberalismo americano. Mas entre os sindicalistas dos
direitos civis nem classe nem raça sobrepunham-se e ambas eram amplamente entendidas.
Partindo do princípio que, desde a fundação da república, o racismo tem sido ligado à
exploração econômica, sindicalistas dos direitos civis buscaram combinar proteção contra
discriminação com políticas sociais universalistas e direitos individuais com direitos trabalhistas.
Para eles, locais de trabalho democráticos, contribuição sindical, além de empregabilidade
justa e total trariam habitação a preços acessíveis, emancipação política, igualdade
educacional e uma reforçada rede de segurança, incluindo assistência médica para todos.
A realização dessa visão dependia das respostas a duas questões. Primeiro, poderia a
coalizão de trabalhadores negros de esquerda reformar as políticas sociais forjadas durante a
Grande Depressão, estendendo aos negros a cidadania econômica e social que o New Deal
promoveu a uma classe média em expansão subsidiada pelo Estado e a um escalão superior
de trabalhadores do sexo masculino? Segundo, poderia a coalizão tirar vantagem do New Deal
e do surgimento do pensamento e das políticas progressistas no sul dos Estados Unidos para
quebrar o domínio da oligarquia na região?
Estender o New Deal e reformar o sul eram os dois lados da mesma moeda, isso
porque sete em cada dez americanos ainda viviam nos antigos estados confederados e porque
conservadores sulistas democratas possuíam poder desproporcional no Congresso. Para
desafiar a força desses congressistas democratas, o movimento tinha que emancipar
trabalhadores negros e brancos do sul e trazê-los para dentro dos locais de trabalho, criando,
assim, um eleitorado com o qual os emergentes políticos pró-trabalhadores da região
pudessem contar. Se o projeto falhou e a ala conservadora do partido democrata triunfou, o sul
se tornaria um imã para indústrias desertoras e base sólida para um movimento nacional
conservador, minando os bastiões do trabalho organizado do norte e desfiando o New Deal.
Durante os anos 1940, meio milhão de trabalhadores negros sindicalizados, do norte e
do sul, colocaram-se nas primeiras fileiras dos seguintes esforços: campanha “duplo V” por
vitória sobre o fascismo no exterior e o racismo no país; políticas pró-trabalhistas da
administração Roosevelt; economia em expansão, que fez a mão de obra tornar-se escassa e
provocou o maior salto nos ganhos dos negros desde a emancipação da escravatura;
militância negra – e a liderança de esquerda dos sindicatos; retorno de veteranos negros. Tudo
isso acontecendo simultaneamente gerou uma consciência de direitos que deu à classe
trabalhadora e à militância negra uma justificação moral, de algum modo tão poderosa quanto a
evocada por (Afro-cristandade) uma geração posterior.
Acontecimentos internacionais aprofundaram e ampliaram essa consciência. Afro-
americanos e seus aliados estiveram entre os primeiros a compreender a enormidade da
perseguição nazista aos judeus e a trazer para sua realidade os paralelos entre racismo e anti-
semitismo. Ao fazê-lo, usaram o asco contra o holocausto para minar o racismo em casa e para
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virar a opinião mundial contra Jim Crow. Um vento crescente de anticolonialismo popular,
inspirado pelas lutas nacionais de libertação na África e na Ásia, irrompidas após a Guerra,
também legitimaram as aspirações negras e ligaram as negações de direitos civis à exploração
dos povos colonizados ao redor do mundo, bem como às leis racialmente exclusivas de
imigração e naturalização.
Ao mesmo tempo, a frente popular cultural incentivou o trabalho do feminismo, em que
diversas categorias, orientadas pelos sindicatos, atuavam dentro do movimento feminino. Nele,
desempenhavam um papel central. As mulheres juntaram-se ao movimento trabalhista em
número recorde nos anos 1940 e ao final da década alcançaram postos de liderança. As
feministas, entre elas, lutaram por acesso a empregos, tratamento justo e expandiram os
apoios sociais dentro de seus sindicatos e no chão das fábricas. Elas visavam a
“dessexualizar” a ideia do salário família ao afirmarem que as mulheres também eram arrimos
de família. Também desejavam transformar o “padrão masculino” de trabalho, primeiro ao
eliminar todas as distinções individuais entre trabalhadores homens e mulheres, demandando
inovações, tais como creches financiadas pelo governo federal, destinadas a reduzirem o peso
da dupla jornada das mulheres. Paralelamente e reforçando o feminismo trabalhista, as
mulheres no movimento comunista lançaram uma campanha de libertação feminina. Articulado
por Claudia Jones, a principal líder negra no partido comunista e apoiado pelo Congresso de
Mulheres Americanas, o conceito de tripla opressão das mulheres negras – devido à raça,
classe e sexo – permaneceu no centro da tradição de esquerda ou feminismo progressista, que
via os assuntos das mulheres como inseparáveis daqueles de raça e classe.
Estimulado por essa ampla insurgência, bem como pela volta dos líderes negros do
“paralelismo” (a criação de instituições negras e a demanda por serviços públicos separados,
mas iguais) para pressionarem por inclusão completa, o ativismo político negro se elevou e as
barreiras às democracias políticas e econômicas desabaram. O ato Wagner e o Conselho
Nacional de Trabalho de Guerra ajudaram os trabalhadores a moderar o poder das
corporações e alavancar o sonho de um local de trabalho democrático, o que animou a
consciência reformista americana desde a era progressista. Em resposta à pressão que vinha
de baixo, liderada principalmente por A. Philip Randolph e pela Irmandade dos Trabalhadores
no Sistema Ferroviário, o presidente Franklin D. Roosevelt estabeleceu um Comitê de Práticas
Trabalhistas Justas, (FEPC), da sigla em inglês, em 1941, colocando a discriminação racial na
agenda nacional pela primeira vez desde a Reconstrução. Em 1944, a Suprema Corte deu fim
a meio século de consentimento à exclusão política, quando declarou a primária branca
inconstitucional. Tão importante quanto a posterior e mais celebrada “Brown Decision”, “Smith
contra Allwright” desencadeou uma onda ainda maior de registros de eleitores no sul. Outras
vitórias incluíram a dessegregação no serviço militar, a proibição de cláusulas restritivas
baseadas em critérios raciais e segregação no comércio interestadual, bem como no ensino
superior e a equalização dos salários entre professores negros e brancos em alguns estados
do sul.

A frieza da Guerra Fria


Essas conquistas contribuíram para o avanço do movimento, mas elas também
encontraram feroz resistência, enquanto o contra ataque acelerava. No fim dos anos 1940,
interesses empresariais do norte juntaram conservadores democratas do sul em uma
empreitada para reverter os ganhos dos trabalhadores nos tempos de guerra, proteger o
suprimento de trabalho barato do sul e deter a expansão do New Deal. A arma escolhida foi
uma cruzada anticomunista baseada nas massas, porém manipulada pela elite, que alteraria
profundamente o terreno cultural e político.
O principal alvo foi a lei trabalhista do New Deal. Com os programas
antidiscriminatórios e de ação afirmativa nos anos 1960 e 1970, o FEPC enfureceu a aliança
conservadora (defensora do direito dos empregadores de contratarem e demitirem à vontade)
ao igualar práticas justas de contratação através de cotas. Após a guerra, conservadores pró-
empresários anularam a campanha por um FEPC permanente, o principal item na agenda dos
legisladores de esquerda representantes dos trabalhadores negros, em parte ao estruturarem a
sua oposição na nova e poderosa linguagem da Guerra Fria. O senador Strom Thurmond, da
Carolina do Sul, por exemplo, pintou o FEPC como uma violação do “princípio americano” de
“autogoverno local”, alegando que ele seria uma espécie de “polícia federal do estado” aos
moldes da União Soviética. Ao demonizar os comunistas do movimento trabalhista, os
conservadores também conseguiram a aprovação do Ato Taft-Harley no Congresso. Com as
restrições advindas desse Ato, o Congresso das Organizações Industriais, CIO, da sigla em
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inglês, expulsou seus sindicatos de esquerda, preparou a luta pelos programas sociais, que
beneficiariam toda a classe trabalhadora e estabeleceu um sistema cada vez mais
burocratizado de negociação coletiva, assegurando elevados ganhos e programas sociais
privativos a seus próprios membros, principalmente trabalhadores brancos do sexo masculino,
que atuavam em grandes indústrias. A despeito do chamado acordo entre trabalhadores e
empregadores, as corporações americanas permaneceram fundamentalmente hostis, tanto
para os sindicatos quanto para as políticas regulatórias, deixando até mesmo os trabalhadores
que lucraram com o apertado sistema de negociação coletiva vulneráveis a uma renovada
ofensiva corporativa nos anos 1970 e 1980. Uma ofensiva que, combinada com a estagnação
econômica, desindustrialização e automação, deixaria aleijado o movimento sindical pelos anos
vindouros.
Ainda que doméstico, o anticomunismo ajudou a guiar os trabalhadores para a direita e
a enfraquecer a base institucional do sindicalismo dos direitos civis, mas também deu aos
defensores dos direitos dos negros uma potente arma: o argumento que o tratamento dado
pelos Estados Unidos a seus cidadãos negros minava sua credibilidade no exterior. No
momento em que o Departamento de Estado trabalhava para desenhar um grande contraste
entre a democracia americana e o terror soviético, conquistar a lealdade das nações recém-
independentes da Ásia e África e reivindicar a liderança do "mundo livre", a competição com a
União Soviética deu ao governo uma razão convincente para amenizar o descontentamento
dos negros e, acima de tudo, a administrar a imagem das relações raciais americanas no
exterior. Como resultado, líderes dos direitos civis que se mostraram dispostos a silenciar suas
críticas à política externa americana e a se distanciarem da esquerda ganharam um grau de
acesso aos corredores do poder como nunca antes. Ao fazerem um balanço do movimento, os
historiadores têm enfatizado a eficácia dessa estratégia e visto o sucesso da luta nos anos
1950 como, no mínimo em parte, um produto da Guerra Fria. Visto através da ótica do longo
movimento pelos direitos civis, entretanto, os direitos civis parecem menos um produto da
Guerra Fria e mais uma casualidade.
Isso porque o antifascismo e o anticolonialismo já haviam internacionalizado o assunto
da raça e, ao ligar o destino dos afroamericanos ao do povo oprimido em toda parte, tinham
dado a sua causa um significado transcendental. O anticomunismo, por outro lado, abafou os
impulsos sociais democráticos que o antifascismo e o anticolonialismo encorajaram,
substituindo-os por um liberalismo racial da Guerra Fria que, na melhor das hipóteses, falhou
em cumprir suas promessas de reforma (com exceção parcial do sistema judiciário, o governo
federal não adotou ações efetivas ao longo dos anos 1950) e na pior delas foi conivente com o
perigo vermelho da direita para estreitar a base ideológica sobre a qual ativistas dos direitos
civis poderiam se apoiar. Para dar apenas um exemplo: tanto esquerdistas quanto líderes
negros de centro agarraram a oportunidade oferecida pela fundação das Nações Unidas (ONU)
para definir a situação dos afro-americanos como uma questão de “direitos humanos”, um
conceito que nos tratados da ONU denotava não apenas libertação das discriminações política
e legal, mas também o direito a educação, saúde, assistência social, habitação e emprego.
Apesar de ansioso por convencer as nações emergentes africanas do progresso racial dos
Estados Unidos, o Departamento de Estado bloqueou esse esforço, isolando os assuntos
internos da supervisão da ONU, enquanto cuidadosamente separava liberdades civis
protegidas de justiça econômica, estigmatizando toda a luta que buscava um robusto programa
de direitos humanos como uma conspiração soviética. Frustrada em seus esforços, a
Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor, (NAACP) da sigla em inglês,
abandonou os assuntos econômicos e a luta contra a segregação no norte, devotando seus
consideráveis recursos para combater casos óbvios de segregação de direitos no sul, cortando
seus laços com a Frente Popular Negra e enfraquecendo cada vez mais a ligação entre raça e
classe.
A campanha presidencial de 1948 marcou tanto o ponto auto quanto a morte da
coalizão dos trabalhadores negros de esquerda do pós-guerra. A coalizão encontrou uma voz
nacional em Henry Wallace, um defensor do New Deal, que rompeu com o partido Democrata e
concorreu à presidência por uma terceira chapa. Cortejando o voto negro com uma plataforma
de direitos civis progressista, o candidato do partido democrata Harry S. Truman derrotou
Wallace, mas afastou os Dixiecrats, congressistas conservadores do sul, que saíram da
convenção democrata para formarem seu próprio partido, um ponto de parada, como se
mostrou, no caminho que levaria muitos conservadores brancos do sul a apoiarem George C.
Wallace. Logo em seguida e com a eleição de Richard M. Nixon, em 1972, eles se transferiram
em grande número para o Partido Republicano.
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Os Dixiecrats também deixaram outro legado. Fizeram uma combinação perfeita de


raça e perseguição da esquerda, derrotando os líderes políticos do New Deal no sul na crítica
eleição de 1950, o que, dez anos depois, permitiu aos segregacionistas afirmarem que o
movimento pelos direitos civis foi inspirado nos comunistas. A perseguição da esquerda, então,
tem um segundo momento, que resulta uma densa rede de “pequenos HUACs” e pequenos
FBIs”, imitações locais do “Comitê de Atividades Antiamericanas” (House Committee on Un-
American Activities) e do Serviço Federal de Investigação (Federal Bureau of Investigation) por
todo o sul. Lideradas por um dos mais poderosos políticos, o notável James Eastland, do
Mississipi, essas agências perseguiram “subversivos” de toda espécie, de veteranos da aliança
de trabalhadores negros de esquerda a oficiais locais da NAACP, passando por professores
gays e líderes nacionais da luta pelo direitos civis, estendendo, assim, o McCartismo até os
anos 1960, mesmo muito depois de ele ter caído em descrédito em nível nacional.

A fase clássica do movimento


No sul, talvez mais do que em qualquer outro lugar no país, a Guerra Fria destruiu as
instituições da Frente Popular e desviou o movimento pelos direitos civis para novas vias.
Quando a chamada fase clássica do movimento surgiu, no final da década de 1950 e início de
1960, ela envolveu negros e brancos, nortistas e sulistas, população local e agentes federais,
secularistas e homens e mulheres de fé. Ela também se estendeu muito além do sul e por todo
país atraiu várias correntes ideológicas divergentes. Porém, na base, no sul, a habilidade do
movimento de agrupar participantes, de frustrar seus inimigos e romper o nevoeiro da Guerra
Fria veio em grande parte da tradição profética da igreja negra. Os liberais da Guerra Fria
aconselhavam paciência, enquanto opunham-se à crítica internacional, sugerindo que o
racismo não foi tecido no interior das instituições norte-americanas e que ele era limitado
apenas ao sul, uma região retrógrada, onde o desenvolvimento econômico poderia,
eventualmente, alinhá-la com a outra nação democrática do norte. Em contraste, ativistas pelos
direitos civis do sul, mobilizando os temas latentes da justiça e da libertação em uma religião
transcendental, exigiam “liberdade agora”, não gradual, uma melhoria de cima para baixo. Essa
visão profética deu aos crentes a coragem de engajar a história como um processo contínuo de
reconstrução e de arriscar tudo por ideais que poderiam nunca ver realizados.
Esses ideais foram muitas vezes mal interpretados, não apenas pela direita, que os
reduziam a daltonismo, mas também pelos integrantes da esquerda, que enfatizavam as
limitações do movimento. Em seu zelo para suprir a falta de atenção dada à luta pela liberdade
no Norte e Oeste, por exemplo, historiadores urbanos, às vezes, traçam um contraste
enganoso entre economia e Black Power no norte e um compromisso do sul com um programa
minimalista de interação racial e integração. Essa dicotomia ignora tanto a longa história de
lutas não violentas contra a segregação no norte quanto o fato de que os negros do sul foram
educados a buscar acesso e autodeterminação, que remonta anteriormente à emancipação.
Uma busca que convocava estratégias avançadas, variando entre alianças táticas sobre a linha
de cor à construção de instituições separadas, imigração, boicotes econômicos e ação direta.
Em ambas as regiões o sucesso do movimento dependeu não apenas do idealismo e coragem,
mas de uma compreensão aguda e pronto uso dos sustentáculos do poder.
Não houve, além disso, nada de minimalismo sobre desmantelar Jim Crow, um sistema
construído mais sobre a exploração econômica do que baseado em uma separação espacial
de fato e de direito. No pensamento dos ativistas do movimento, a integração nunca buscou
apenas “mistura racial” ou “meramente sentar-se ao lado de brancos na escola”, como vemos
algumas vezes caricaturado. Também não implica assimilação em instituições estáticas
reservadas a brancos, embora muitos brancos assumam que teria sido assim. A verdadeira
integração foi e é um objetivo crescente e radical, não um final ou abolição de algo que certa
vez foi a separação de corpos por raça, mas um processo de transformar instituições e
construir uma sociedade igualitária, democrática, multiracial e multiétinica.
A marcha de 1963, em Washington, ocorrida no auge do que figura na narrativa
dominante como o bom movimento daltônico, é um exemplo. Os conservadores de hoje fazem
dela mais do que o sonho de Martin Luther King, em que “as crianças um dia viveriam em uma
nação onde não seriam julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo do seu caráter”. Porém,
nada na narrativa dominante nos levaria a supor uma imagem da marcha que mostrasse
mulheres carregando cartazes exigindo empregos para todos, habitação decente, salários
justos e direitos iguais “AGORA”, portanto, afirmando tanto sua solidariedade racial quanto sua
identidade como ativistas e trabalhadoras e, desse modo, iguais aos homens. Nada na história
dominante nos lembra que essa demonstração, que mobilizou pessoas de todas as esferas e
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partes do país, foi uma “marcha por empregos e liberdade” e que desde cedo as mulheres
estavam nas primeiras fileiras ajudando a interligar raça, classe e sexo, prenunciado o
feminismo negro e o crescente movimento dos movimentos, que a luta por direitos civis pôs em
ação.
Nos anos recentes, temos aprendido mais e mais sobre as continuidades entre os anos
1940 e 1960, especialmente sobre os ativistas dos direitos civis, que adquiriram consciência
política no período inicial e então prepararam e guiaram homens e mulheres jovens, os quais
deram um passo além anos mais tarde. E.D. Nixon, o forte líder da NAACP, que recrutou King
para o boicote ao transporte público, veterano da Irmandade dos Trabalhadores no Sistema
Ferroviário, sindicato liderado por negros e central para o movimento nos anos 1940. Ella Baker
repassou ao Comitê de Coordenação Estudantil Não Violenta (SNCC), da sigla em inglês, a
pedagogia radical e o estilo de organização, aprendidos em sua educação no sul rural e com as
políticas de esquerda do Harlem, nos anos 1930 e 1940. Bayard Rustin, um dos mais brilhantes
estrategistas do movimento, foi “um ardente jovem explorador da esquerda americana”, como
geralmente definido. Anne Braden, uma branca sulista que se tornou uma “lenda” para os
radicais jovens, conforme definição de Angela Y. Davis. Anne trabalhou para os sindicatos
liderados por negros no fim dos anos 1940 e continua a carregar a bandeira do antirracismo até
hoje. Francis Pauley começou a trabalhar para o New Deal na Georgia, ajudou a mobilizar
mulheres brancas a favor da dessegregação e despendeu o resto de sua vida na luta por
direitos civis e contra a pobreza.
As diferenças, bem como as descontinuidades também eram críticas. Os ativistas dos
anos 1960 dependiam de organizações de protestos independentes; também não puderam
basear suas lutas nos crescentes e vibrantes sindicatos sociais democratas. Eles ainda
sofreram de uma ruptura na narrativa, um vazio no centro da história da luta pelos direitos civis
modernos, que só agora está começando a ser preenchido. Muitos ativistas jovens dos anos
1960 viram seus esforços como uma nova saída e a si mesmos como uma geração
incomparável e não como atores do processo, com muito a aprender com a geração anterior.
Até então o trabalho havia inspirado a tradição dos direitos civis. Perseguição, censura e
autocensura reforçaram essa divisão geracional por radicais negros independentes de uma
corrente lateral, portanto embranquecendo a memória e a historiografia da esquerda, além de
deixar as gerações seguintes com um entendimento das políticas negras que dicotomiza
nacionalismo e integracionismo. O sindicalismo por direitos civis dos anos 1940, que combinou
uma crença baseada em princípios e tática de organização inter-racial, com uma forte ênfase
na cultura negra e nas instituições, ficou perdido na memória. Enquanto o movimento se
esvaziava e as forças políticas contrárias retomaram o poder, essa perda deixou um vácuo
para a narrativa dominante atual preencher.

Além da decadência
Na narrativa dominante, o declínio do movimento segue no rastro da publicação dos
Atos dos Direitos Civis e do Direito ao Voto, além disso as lutas populares dos anos 1970
tornam-se nada mais do que políticas de identidade, disputas que promoveram o tribalismo,
alienaram trabalhadores brancos e engrossaram as fileiras da Nova Direita. A visão dos anos
1970 como um desfecho trágico e desmerecedor da segunda onda de feminismo e de outros
movimentos que emergiram da luta negra por liberdade institucionalizou-se como se aqueles
movimentos tivessem servido como antagonistas da Nova Direita. Isso também apaga da
memória popular o modo como as vitórias do começo dos anos 1960 fundiram-se em uma
revolução social duradoura, como milhares de pessoas comuns escancararam suas portas
para darem passagem ao movimento que trabalhou para criar novas e integradas instituições
onde antes não havia nada.
A literatura que trata do pós anos 1960 ainda está em sua infância e, exceto nas
causas dos movimentos por direitos das mulheres e dos gays, estudiosos de esquerda, direita
e centro têm contado histórias de declínio. Uma explosão de novos trabalhos sobre o
movimento Black Power, entretanto têm se afastado desse modelo, documentando um
renascimento político afro-americano nos anos 1970, em que os defensores do poder político
negro propõem um programa de reforma urbana, que ecoa as demandas surgidas trinta anos
antes. Estudos de outros aspectos do movimento negro por liberdade no norte também
oferecem poderosas evidências que os movimentos por direitos civis não morreram quando
foram para aquela região no fim dos anos 1960, em parte porque tinham sido do norte durante
todo o tempo. Ainda são necessárias mais pesquisas sobre todos os aspectos do movimento
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dos movimentos no pós 1960, que rivaliza em nuance e complexidade com o que sabemos
sobre a fase clássica.
Os estudos que já temos revelam lutas de base sobrepostas. Uma luta envolveu a
mudança de paradigma para uma abrangente dessegregação escolar no sul, ocorrida nos anos
1970, não durante o turbulento e curto movimento por direitos civis, mas depois que os
holofotes da mídia tinham se afastado da região. Outra envolveu a dessegregação dos lugares
de trabalho e a ampla aceitação de práticas justas de emprego como um objetivo digno. Como
o sindicalismo dos direitos civis, ambos os avanços têm sido esquecidos ou distorcidos e
merecem sair das margens para o centro da saga dos direitos civis. Ambos, além disso,
pertencem não ao passado, mas ao presente, não a uma história de triunfo da direita ou algo
ultrapassado, mas a um projeto em andamento, cujas principais crises podem ainda estar à
frente.
A Decisão Brown e as mobilizações de apedrejamento de Little Rock ocupam lugar de
destaque na narrativa popular de dessegregação escolar no sul. O caso em que negros e
brancos do sul lutaram contra a espacialização da raça na região é outro ponto crítico, mas
escassamente observado. Em “Swarm contra Conselho de Educação de Charlotte-
Mecklenburg” (1971), um caso originado na Carolina do Norte, os advogados dos direitos civis
expuseram a distinção artificial entre segregação de direito e de fato ao demonstrar, sem sobra
de dúvidas, que políticas governamentais, não costumes malignos, criaram um sistema escolar
quase totalmente segregado. “Eu vivi aqui por vinte e quatro anos sem saber o que estava
acontecendo”, comentou o juiz James Mcmillan, ao determinar uma integração de mão dupla
de crianças negras para o subúrbios brancos ricos e crianças dos subúrbios para escolas do
centro da cidade. Um vigoroso movimento de proprietários brancos lutou contra a decisão com
dentes e unhas, formulando sua oposição não na desacreditada retórica da resistência em
massa, que cercou o desastre de Little Rock, mas em uma linguagem de daltonismo que
ressoava em todo o país.
Mais surpreendente, o intercâmbio passou a simbolizar tudo o que deu errado com o
sonho de integração, uma coalizão de operários ativistas, grupos de mulheres, liberais brancos
e pais negros levantaram-se para derrotar o movimento dos proprietários. Além disso, Charlotte
adotou a incomum iniciativa de manter uma de suas históricas escolas negras de ensino médio,
em vez de destruí-la e colocar sobre os ombros dos estudantes negros o fardo de nadar ou
afundar em escolas hostis dominadas por brancos. Essa escola de ensino médio, West
Charlotte, lançou uma experiência em verdadeira integração que ecoa até hoje. Apesar de
muitos estudantes brancos do centro da cidade terem debandado para escolas particulares,
como fizeram por tudo o sul, o sucesso de Charlotte tornou-se um ponto de orgulho cívico.
Quando o presidente Ronald Reagan anunciou, durante uma parada na campanha presidencial
de 1984, que o intercâmbio ordenado pela corte “tiraria crianças inocentes das escolas da
vizinhança e as faria peões em um experimento social que ninguém gostaria”, seu amplo
público republicano respondeu com um embaraçoso silêncio, que falou mais alto que qualquer
palavra. Vinte anos depois, entrevistas conduzidas separadamente pelo Programa de História
Oral do Sul e por pesquisadores da Universidade de Columbia sugeriram que, especialmente
para os estudantes da escola West Charlotte, durante os anos de auge da integração,
confrontar diferenças e cruzar fronteiras raciais foram mudanças de vida, que estatísticas e
resultados de testes não podem capturar. Eles consideraram a experiência valiosa e sentiram
que ela dissipou a hostilidade e o ódio dos anos iniciais. Após isso, esses mesmos estudantes
lutaram para manter um grau de diversidade em suas vidas.
Na década de 1980, uma supervisão judicial agressiva aliada a uma pressão contínua
de pais negros, estudantes e seus aliados fizeram o que ninguém poderia ter previsto: tinham
dotado o sul com os sistemas de ensino mais integrados do país, uma conquista que
praticamente desapareceu da narrativa dominante, além de ser raramente registrada mesmo
nos relatos eruditos do movimento. A era da dessegregação também foi marcada por outras
formas de progresso político e econômico, mais notadamente o aumento no registro de
eleitores e a eleição de oficiais negros depois do Ato do Direito ao Voto, de 1965, além da
dessegragação da força de trabalho, enquanto ativistas de base aproveitavam-se do título VII
do Ato, que impedia a discriminação nos empregos por raça e sexo. Cada um desses avanços
reforçava o outro. Eleitores negros adquiriram influência com os Conselhos de Educação e
acesso a empregos públicos, o que nunca tinham experimentado antes. Como os estudantes
negros escaparam de escolas de pobreza concentrada, aproveitaram-se de programas pré e
pós-escolares, classes menores, instalações superiores e outros benefícios longamente
monopolizados por escolas suburbanas. Um percentual crescente teve acesso às faculdades e
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alcançou posições profissionais e de direção. Em uma sociedade na qual o status econômico


era cada vez mais determinado pela educação, a classe média negra expandiu-se. Nada,
talvez, reflita o sucesso desse impulso por representação política, empregos e educação mais
vividamente do que o fenômeno da migração de retorno para o Sul. Na década de 1970 os
afro-americanos, que por mais de meio século fugiram ou foram expulsos da região,
começaram a responder a um “chamado para o lar”. Atraídos por novas oportunidades, eles
voltaram em massa, não apenas para as grandes cidades, mas também para as pequenas,
além de áreas rurais da região.
Contudo, enquanto os negros procuravam reivindicar o sul e a reunião da região ao
país, parecia que tanto norte quanto sul estavam movendo-se, aparentemente de modo
inexorável, em direção à ressegregação. Em 1973 e 1974, a Suprema Corte tomou duas
decisões fatídicas, cada qual isolava distritos escolares predominantemente brancos dos
imperativos constitucionais da Decisão Brown e oferecia a pais brancos em distritos urbanos,
temerosos com a dessegregação escolar, paraísos de escolas predominantemente brancas,
para as quais poderiam escapar. Na primeira, a Suprema Corte em “Milliken contra Bradley”
(1974), isentou os subúrbios ao redor de Detroit dos planos de dessegregação baseando-se no
fato da região não ter se engajado em recentes e intencionais atos de discriminação. Em outra
decisão, “Distrito Escolar Independente de San Antonio contra Rodriguez“ (1973), a Corte
determinou que os Estados não possuíam qualquer obrigação frente à Constituição Federal no
sentido de igualar financiamentos entre distritos escolares. No começo dos anos 1990, os
tribunais de Reagan-Bush estavam revivendo os planos de dessegregação ordenados pelas
Cortes de 1970, mesmo em Estados em que sistemas escolares duplos haviam sido exigidos
por lei. Depois de apenas duas décadas, os tribunais abandonaram efetivamente o esforço de
fazer cumprir a dessegregação. No final da década de 1990, os juízes tinham ido tão longe a
ponto de proibir os Conselhos Escolares de voluntariamente usarem compensações raciais (e,
portanto, de história e realidade social) para manter seus progressos duramente conquistados
em direção à integração.
No Sul e por todo o país, exceto no nordeste, que nunca experimentou significante
dessegregação, a ressegregação está seguindo em ritmo acelerado. Frequentemente acusada
de racismo reflexivo, sugerida pelo termo “viagem branca” ou mais recentemente pela
desilusão dos negros com a integração, essa inversão pode ser mais bem entendida como o
resultado, em uma atmosfera de hostilidade judicial, de falhas de longo prazo, como delimitar a
segregação residencial, não deter a decadência de cidades do interior, impedir a expansão
urbana, acatar as crescentes divisões de classe e alterar a disposição do financiamento
escolar, que favoreceu escolas do subúrbio. Sob tais circunstâncias, não é de se admirar que
pais de ambas as raças sentissem aguda pressão para comprar casas em vizinhanças de boa
reputação, prover escolas melhores e que esses mesmos pais, em cidades hiper-segregadas
do interior, tivessem esperança de poder prover a seus filhos uma educação separada, mas
igual. Essas pressões, além disso, foram intensificadas enquanto o Ato “Nenhuma Criança
Será Deixada para Trás”, aprovado em 2002, modificava o foco da política educacional,
afastando-a do financiamento e direcionando-a a prestação de contas e avaliação, de modo
que frequentemente castigava escolas com poucos recursos, afastando os melhores
professores e estudantes, aprofundando a pobreza e a segregação. Ainda assim, apesar de
tudo isso, amplas maiorias, de ambas as raças, mantiveram um compromisso de reintegração
– um compromisso, cujos responsáveis pelas políticas públicas e especialistas nada fizeram
para promover, mas, ao contrário, estão fazendo seu melhor para dissipar.
Se a continua história da dessegregação escolar tem sido obscurecida por uma
narrativa de decadência pós 1965, a luta por justiça econômica tem sido apagada
completamente. Essa luta assumiu várias formas. Em Seattle, Washington, o Congresso da
Igualdade Racial (CORE), da sigla em inglês, lançou sua primeira campanha de ação direta
contra a discriminação nos empregos, em 1961, seguindo no ano de 1964 com uma das mais
ambiciosas campanhas no país. Em Memphis, Tennessee, trabalhadores negros persistiam em
ver direitos civis e direitos trabalhistas como dois aspectos da mesma luta. A greve dos
trabalhadores da limpeza pública, em 1968, mais conhecida como o contexto do assassinato
de Martin Luther King, foi parte de uma pressão de décadas dos trabalhadores negros para
alcançarem melhores condições de trabalho e salários justos. Em Oakland, Califórnia e outros
lugares, os Panteras Negras apelaram por uma redistribuição de poder econômico e político
em cidades devastadas por quatro décadas de políticas metropolitanas falidas.
Mais suscetível de ser incluída na narrativa dominante é a guerra contra a pobreza do
presidente Lyndon B. Johnson, um ambicioso esforço que buscava unir não apenas questões
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econômicas e de direitos civis, mas também de expandir o New Deal, de modo a discutir as
desigualdades incorporadas nas instituições americanas. Lançado em 1965, o programa ficou
muito aquém de suas metas, não porque teria “jogado dinheiro fora”, como os conservadores
teriam afirmado, em problemas que apenas a iniciativa privada e esforço individual poderiam
resolver, mas porque ele não foi longe o suficiente e as iniciativas minimamente consolidadas
que ele lançou focaram muito pesadamente o lado da cadeia produtiva, tais como treinamentos
para empregos, em vez de pleno emprego, sindicalização e redistribuição de recursos
econômicos. Não obstante, a Grande Sociedade produziu resultados duradouros e importantes
(assistência médica para os pobres e assistência social para crianças carentes vêm
imediatamente à mente) voltando muitos ativistas na direção de soluções econômicas
estruturais.
Em contraste, a organização de base iniciada pelo Título VII da Lei dos Direitos Civis
de 1964, esteve entre os fatores menos notados nas dimensões econômicas do movimento.
Milhares de homens e mulheres, incluindo uma constante e crescente rede de trabalhadoras
feministas, perseguiram seus direitos sob essa lei histórica ao assinarem petições e ações
judiciais coletivas, buscando políticas de ação afirmativa, que especificavam metas de
contratação e horários de trabalho, dando um passo à frente ao se tornarem corajosas
pioneiras, as primeiras de sua raça ou sexo a enfrentarem os campos minados das funções há
tempos segregadas. Uma vez no emprego, os trabalhadores negros se tornavam os mais
ávidos membros do novo sindicalismo e do entendimento dos direitos trabalhistas. Isso inspirou
o surgimento da organização no setor público, que se tornou um dos pontos mais brilhantes em
uma paisagem sombria para o trabalho organizado. Associadas a isso, intervenção
governamental e ações de base fizeram de 1965-1975 um período de avanço no progresso
econômico dos negros, especialmente no sul. Essas vitórias inspiraram os latinos e outros a
fazerem exigências similares e a adotarem estratégias parecidas. Como resultado, a proteção
legal dos indivíduos da discriminação nos ambientes de trabalho foi estendida a uma ampla
maioria de americanos, incluindo não apenas negros e mulheres, mas também idosos e
deficientes.
No começo da década de 1970, além disso, um memorável movimento de democracia
sindical procurou revitalizar o movimento trabalhista e uma onda de greves varreu o país,
sugerindo que os trabalhadores brancos, agora vistos como predestinados “democratas de
Reagan” não eram tão leais ao governo e que sua fidelidade existia enquanto recebessem
vantagens. Ao mesmo tempo um grupo pouco notado de veteranos da luta pelos direitos civis
uniu-se ao movimento trabalhista, lançando campanhas em seu apoio. Como simples
trabalhadores, líderes trabalhistas ascendentes, advogados trabalhistas e similares, eles se
uniram a outros ativistas em um esforço para suscitar questões de igualdade econômica até o
elevado campo moral antes ocupado pelo ataque contra segregação ‘de direito’.
Como a batalha para dessegregar as escolas públicas, a luta por justiça econômica
encontrou barreiras formidáveis. Algumas profundamente enraizadas, tais como o
individualismo americano, a intensificação da fuga de capitais e o legado do anticomunismo,
que, combinado com a “guerra de idéias” da Nova Direita, macularam todas as tentativas de
redistribuição. Outros obstáculos foram produzidos pela incomparável crise econômica dos
anos 1970 e interpostos pelo simultâneo aumento no desemprego e na inflação. Conhecida
como “estagflação”, a crise galvanizou uma ofensiva corporativa contra os sindicatos e
acelerou um processo contínuo de reestruturação econômica, que encaminhou o surgimento
de uma economia de serviços e destruiu não apenas as fortalezas do trabalho organizado no
cinturão da manufatura, também conhecido como cinturão da ferrugem, mas também as
indústrias tradicionais do sul. Ao mesmo tempo, a mudança econômica na América Latina e a
alteração nas restrições de imigração nos anos 1960 obrigaram milhões de latinos a buscarem
emprego nas cidades do norte. Essa onda de imigração do “terceiro mundo” criou novas
identidades híbridas, resultando novos movimentos de libertação. Mas, enquanto a oferta de
trabalho cresceu e os empregos de colarinho branco tornaram-se acessíveis com o fim do titulo
VII, comunidades de negros sofriam de taxas de desemprego chocantes e cidades do interior
tornaram-se terras de ninguém, de onde poucos tinham a esperança de escapar.
Como as demissões dispararam, um número crescente de trabalhadores brancos do
sexo masculino, influenciado pelas reivindicações pseudopopulistas dos conservadores,
responsabilizou as ações afirmativas pela perda de seus empregos, a despeito de evidências
conclusivas que os esforços dos empregadores em contratar e promover negros e mulheres
não conduziram a significante reversão da discriminação. Como Thomas Sugrue notou,
“reestruturação econômica de longo prazo era incogitável para a maioria dos trabalhadores
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brancos, mas as ações afirmativas eram um alvo fácil”, em parte porque poderosos narradores
e histórias fizeram isso acontecer. A luta pela Emenda dos Direitos Iguais e Direito ao Aborto
teve um impacto semelhante sobre algumas esposas da classe trabalhadora. Dependentes dos
maridos em uma atmosfera de profunda insegurança econômica e inundadas por ataques da
Nova Direita contra o movimento das mulheres, que as nomeou “conspiração anti-família”, elas
se opuseram às reformas em parte por temerem que o feminismo libertasse primeiro os
homens, deixando as mulheres sem a reivindicação da proteção e apoio masculinos.
Esses desenvolvimentos ajudaram a impulsionar a Nova Direita ao poder e a encorajar
esforços da administração Reagan no sentido de esvaziar a aplicação de mecanismos
antidiscriminação. A desregulamentação do mercado de trabalho levou ao ressurgimento de
uma discriminação anti-negros baseada em “preferências ocultas” e estereótipos, muito bem
documentada, mas quase impossível de provar, que ajudou a reverter quase duas décadas de
ganhos econômicos. Ainda, como Nancy MacLean argumenta, o triunfo da direita não foi
completo em hipótese alguma, em parte porque os esforços de Reagan provocaram uma
tempestade de oposição dos grupos de defesa dos negros e em parte porque grandes
corporações, depois de anos de resistência, adotaram ações afirmativas, se bem que na nova
e diluída forma de “diversidade” – um movimento desenhado não para avançar na
redistribuição da justiça, mas para ajudar as empresas a alcançarem novos consumidores e a
operarem em mercados globais. O resultado é um impasse que ressalta tanto o espaço
conquistado pelos defensores do acesso econômico quanto a necessidade de uma ação
federal mais ampla para promover o pleno emprego, amansar o poder das corporações e
proteger os sindicatos. Por um lado, a política governamental, conduzida por pressões das
bases, teve êxito em rachar o monumento da discriminação racial, erguido ao longo do tempo
tanto por empregados quanto por sindicatos dominados por brancos. Por outro, a
reestruturação econômica mostrou o quão raso está o alcance das proteções governamentais
contra os dilemas da discriminação aos trabalhadores.. Sem uma forte voz coletiva, os
trabalhadores não tinham chance de se defender contra práticas trabalhistas injustas (em
oposição ao preconceito individual intencional) ou de contra-atacar o controle corporativo do
Estado. Tampouco podiam construir e expandir a legalidade do sindicalismo dos direitos civis,
ao transformar a luta por emprego justo em um projeto anti-racista, anti-machista e social
democrata para o século vinte e um.

Conclusão
Os desafios encarados pelo movimento pelos direitos civis deveram-se ao que Martin
Luther King chamou “males que estão profundamente enraizados em toda a estrutura de nossa
sociedade”, males que refletiram não apenas o legado da escravidão, mas também a
perpetuação dessa herança durante as gerações subsequentes, por meio de políticas de
Estado racializadas, que teceram o privilégio branco na construção da cultura e das instituições
americanas. A despeito dos inegáveis triunfos do movimento, esses males persistem e em
alguns aspectos eles têm se agravado. A ressegregação das escolas públicas; a hiper-
segregação de cidades do interior; as crescentes taxas de desemprego entre negros e latinos
jovens; a corrosão do direito a voto das minorias; o enfraquecimento do movimento trabalhista;
a riqueza e as diferenças salariais, que estão fazendo os Estados Unidos voltarem às
condições pré New Deal; a desconstrução da rede de proteção social; a sempre crescente
habilidade do capital não produtivo de mover-se conforme sua vontade; o maligno crescimento
do “complexo penitenciário-industrial”, que supera de longe a era do Apartheid da África do Sul
no encarceramento de homens negros. Esses legados históricos não podem ser afastados
para longe com uma declaração de vitória, por determinação legal, políticas públicas
racialmente neutras ou admitindo que as forças do mercado imperem.
Nem, é claro, a compreensão de como o passado pesa sobre o presente resolve os
problemas atuais. Mas isso pode ajudar a cortar o miasma da evasão e da confusão que mutila
nossa criatividade desde o início. Para muitos, os americanos brancos mudaram para o que o
crítico Walter Benjamin chamou “essa tempestade chamada progresso” sem chegar a um
acordo com o passado. Essa falta de consideração abre o caminho para um conservadorismo
daltônico terrivelmente a-histórico e cego para os fatos sociais. Isso empobrece o discurso
público, desencoraja o investimento em instituições públicas e mina nossa vontade de enfrentar
as desigualdades e injustiças que nos cercam agora.
As narrativas tecidas pelos novos conservadores mantêm uma forte influência sobre a
imaginação pública, em parte porque têm sido repetidas com muita frequência e transmitidas
amplamente, em parte porque evitam questionamentos desconfortáveis entre a vantagem
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acumulativa dos brancos e os males sociais do presente. No entanto, há razões para esperar
que as histórias de compensação possam se fazer ouvir e até mesmo prevalecer. Sucessivas
pesquisas de opinião indicam que as atitudes raciais dos brancos mudaram drasticamente
desde a 2ª Guerra Mundial, que o apoio aos princípios de integração e tratamento igual
permanece elevado (mesmo quando a aprovação de intervenção governamental para realizar
esses objetivos tem diminuído) e que a maioria dos brancos, bem como dos negros, continua a
proteger os pilares da ordem do New Deal. Essas atitudes não devem ser superestimadas.
Elas não significam que preconceitos ocultos ou mesmo ostensivos desapareceram ou que
sedimentadas práticas institucionais tenham sido eliminadas. Contudo, são a base em que
novos entendimentos da problemática atual podem prosperar. Esses entendimentos devem se
agarrar tanto à história, que elimina a noção de que as disparidades raciais são causadas por
deficiência dos negros, quanto à abundante evidência de que o sofrimento das pessoas negras
hoje é, de fato, “o primeiro sinal de um perigo que nos ameaça a todos”. Esse perigo – cujos
sinais abrangem desde cada família por si na busca por boas escolas, ao alto custo de prisões,
polícia, serviços de saúde superficiais e outras medidas reativas – se amplificado por
contadores de histórias públicas, poderia ser combinado com princípios anti-racistas para criar
um clima no qual novas soluções para os problemas sociais pudessem emergir.
Os historiadores podem e devem desempenhar um papel central em uma luta que se
torna tão essencial na compreensão do legado do passado. Mas como podemos nos fazer
ouvir sem reduzir a história aos mantras estereotipados com os quais geralmente são contadas
as narrativas políticas? Para contarmos nossas histórias, com verdade e eficiência, precisamos
de modos de escrever e falar que enfatizem a atuação individual, o essencial da narrativa, ao
mesmo tempo em que dramatizamos a história oculta das instituições e políticas - as escolhas
publicamente sancionadas, que continuamente dão forma e remodelam a paisagem social e
ainda são frequentemente invisíveis aos cidadãos treinados em não ver e pensar
exclusivamente de modo a-histórico, em termos pessoais. Não podemos nos satisfazer com
simples dicotomias (especialmente aquelas que opõem raça contra classe, raça alvo contra
soluções universalistas e a chamada identidade política contra política econômica e
sindicalização) não importando quão sedutoras elas possam ser. Finalmente, devemos nos
anteceder a fáceis conclusões e satisfatórios gráficos ascendentes e descendentes.
Apenas essas novas formas de contar as histórias podem transmitir o que significa ter
vivido uma revolução que não foi derrotada, mas que também foi incompleta. Um dos
movimentos sociais que definiram o mundo e que experimentou derrotas e vitórias e cujos
triunfos estão sendo parcialmente anulados novamente. Tanto as vitórias quanto as derrotas
chamam-nos à ação, como cidadãos e historiadores com poderosas histórias a contar. E
ambas são parte de um longo e contínuo movimento pelos direitos civis. E essas vitórias e
derrotas podem nos ajudar a imaginar – para o nosso próprio tempo – um novo modo de vida,
uma revolução contínua.

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