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ZILBERMAN, R.; LAJOLO, M. Indústria cultura & renovação literária. In: ____.

Literatura
infantil: histórias e histórias. São Paulo : Ática, 1985, pp.123-162.

6.1. ESCRITORES DE HOJE (décadas de 1970/1980)

 A partir da década de 1960, há uma ampliação do número de instituições e programas


voltados para a leitura e para a LI (FNLIJ – 1968), Instituto Nacional do Livro (1937)
co-edita vários títulos de LI.
 Estado e iniciativa privada apoiam a LI, inovando as formas de sua circulação e estimula
o lançamento de novos títulos (inclusão de instruções e roteiros/fichas de leitura junto
aos textos).
 Desenvolvimento de um comércio especializado para a LI voltado para um público
grande e ávido de livros. Assim, grande número de profissionais é atraído para esse
mercado (autores, ilustradores, editoras etc). Autores consagrados voltam à cena da LI
(Mario Quintana, Cecília Meirelles, Vinícius de Moraes) = conquista progressiva da LI e
ampliação vertiginosa do mercado de livros no Brasil.
 No período em análise (1960 -1980), a LI insere-se num contexto moderno de produção
e circulação e assume os traços mais fortes da herança lobatiana. Há uma modernização
do processo de produção (incremento na materialidade do objeto livro).
 No período há retomada da produção de livros em série em atendimento à necessidade de
produção em escala industrial (Ex: João Carlos Marinho, Stella Car Ribeiro)
 LI volta a ser contestadora, abordando a temática urbana no Brasil, suas crises e
impasses (pobreza, injustiça social, autoritarismo, preconceito etc).
 A crítica à sociedade se exprime de forma mais intensa por meio de representações mais
realistas nas quais se focaliza o sofrimento e a miséria infantis > Pivete, A casa da
madrinha, Os meninos da rua da praia etc.
 Há a criação de uma vertente muito significativa da LI que envereda pelo social
discutindo temas problemáticos antes não tratados. Tais temas são tratados de forma
realista e, às vezes, até violenta (separação conjugal, marginalização da velhice, poluição
da natureza, repressão do choro do menino, preconceito racial etc).
 Outra importante vertente é a que vai questionar os valores autoritários e conservadores
(A fada que tinha idéias – F. L. de Almeida, História meio ao contrário - R. Rocha, O
reizinho mandão – R. Rocha, etc), patrocinando uma reconstituição dos contos e fábulas
tradicionais.
 Juntamente com tais temas, surgem textos nos quais as crianças vão ser representadas em
sua forma mais identitária, refletindo suas crises em meio a situações problemáticas (A
bolsa amarela, Corda bamba – L.B. Nunes).
 Outra importante vertente é a da ficção científica e do mistério policial. Muitos livros
vão integrar séries que seguem o modelo da novela policial (O gênio do crime – J. C.
Marinho, O caso da estranha fotografia – Stella Car Ribeiro).
 Fato importantíssimo do período é a modernização dos aspectos materiais na composição
dos livros que se tornam elementos autônomos (ilustração, ênfase no canal), de forma a
transforma imagem e a materialidade em elementos composicionais do texto.
 Com relação à poesia, houve grande desenvolvimento com a incorporação dos
procedimentos característicos da poética modernista.
 Há, de forma geral, uma incorporação pela LI, de algumas técnicas de composição
típicas da modernidade - perplexidade do narrador moderno – Clarice Lispector,
revitalização do fantástico voltado para I e Juventude – Marina Colassanti, utilização da
literatura popular – Ricardo Azevedo.
 Todas essas vertentes são desenvolvidas dentro de um contexto marcado pela
dependência do país ao mundo ocidental capitalista – notadamente dependência norte-
americana – sobretudo em virtude da ditadura militar imposta após o golpe de 1964.

6.2. TEMPOS DE MODERNIZAÇÃO CAPITALISTA

 Anos 60 – ruptura nos setores dominantes brasileiros (classe industrial X agricultores).


Os industriais, frente as novas configurações do capitalismo internacional, anseiam pela
superação das estruturas arcaicas a fim de se estabilizar no poder.
 No governo de João Goulart os movimentos esquerdizantes crescem, reforçando ideais
nacionalistas e antiimperialistas. Ao mesmo tempo, Jango opta por uma política de apoio
ao povo, o que desagrada as classes dominantes (tanto agricultores quanto industriais).
Esses setores entendem o posicionamento de Joaõ Goulart como contrário aos seus
interesses.
 Assim, somando-se a força ideológica de esquerda que se organizava e recebia certo
apoio do governo às posições políticas aos setores populares (reforma agrária, reformas
de base, limitação da remessa de lucros para fora do país), as classes dominantes
sentem-se ameaçadas.
 Este quadro é que levará ao Golpe de 1964 no qual se associaram as classes dominantes
(agricultores + industriais) e o Exército, apoiados pela classe média.
 Assume o Pres. Castelo Branco que iniciará um processo político de pleno apoio ás
classes dominantes, de captação de recursos externos (empréstimos dos EUA).
 A presença dos movimentos de resistência levará o governo a ações drásticas na
manutenção do poder e da legitimação de suas ações (assinatura do AI- 5, censura,
cassação de mandatos, exílio de dissidentes, eleições indiretas etc);
 Cenário de guerra no país: assaltos a bancos para financiamento da resistência armada,
troca de presos políticos por embaixadores, porões da ditadura;
 Governo Médici> vive-se o milagre brasileiro com a injeção de capital americano >
expansão do mercado automobilístico, construção civil, projetos faraônicos como
Transamasônica e Itaipu. Classes baixas sofrem com o arrojo salarial e as classes médias
vivem o milagre temporário.
 A partir de 1975, a morte de prisioneiros dissidentes do regime associada à carestia e ao
protesto dos movimentos populares (movimento operário e estudantil), a oposição vai
ganhando força até que o país pudesse se reorganizar rumo ao processo de
redemocratização que começa com o governo Gaisel (retorno dos exilados,
bipartidarismo, Lei da anistia) até chegar ao movimento Diretas Já que leva o país,
finalmente, de volta à democracia.

6.3. LITERATURA: ARTIGO DE CONSUMO

 Os últimos 20 anos de Literatura Brasileira revelam a influência prolongada de autores


como João Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de
Melo Neto, cujas obras formam modelos do fazer literário.
 A partir dos anos 60 temos a consolidação da infraestrutura para a modernização dos
modos de produção e circulação literária que assim atingem maior maturação e eficácia.
 Nas décadas de 60 e 70 tivemos um número maior de capitais investidos em cultura,
tendo condições semelhantes a semiprofissionalização do escritor de literatura infantil que
aconteceu a partir dos anos 50.
 As mudanças ideológicas e políticas que permeavam a discussão das reformas de base
vão constituir um canal de mediações dos intelectuais e das camadas populares. A partir desse
momento vamos ter obras dedicadas a massas que antes eram distantes da arte e da cultura,
principalmente da literatura.
 Entre os anos de 62 e 64 os Centros Populares de Cultura (CPCs) e os Movimentos de
Cultura Popular (MPC) vão constituir meios/canais em que o público vai ter acesso, através de
comícios/passeatas, a produção musical, teatral e literária voltada a valores e linguagem de
esquerda.
 Esse novo mecanismo na literatura, faz com que os poemas tratem do latifúndio, fome e
o imperialismo, cujo o meio serão as antologias “Violão de Rua”; livros pequenos e baratos.
 Na mesma concepção da poesia libertária, há novas publicações como “Cadernos do
Povo” que em uma linguagem acessível vai tratar das reivindicações do povo, como podemos
observar em seus títulos “O que é reforma agrária?” ou “Quem é o povo no Brasil”.
 A temática esquerdizante não é restrita na literatura, pelo contrário, vai estar presente
nos filmes “Deus e o diabo na terra do sol”, nas músicas “Subdesenvolvido” e no teatro 'Brasil,
versão brasileira”, de Millor Fernandes.
 A cultura de forma geral (poemas, peças, romances) como instrumento de pedagogia
política vai se aproximar da produção cultural da Literatura infantil.
 A participação a esse processo político supõe que o artista acredite na neutralidade da
linguagem e na transparência do enunciado verbal. E tanto a neutralidade quanto a transparência
estariam revestidas de retórica.
 O resultado disso é o simplismo formal da maioria dos textos.
 Temos a contextualização da metade dos anos 60, um período de repressão e da
implantação do AI-5, todos os mecanismos da repressão não foram suficientes para acabar com
o tom esquerdizante de uma parte da produção cultural.
 O romance “Quarup” de Antônio Callado de 1967 parece inaugurar um novo rumo da
ficção nacional ao retratar o Brasil.
 Do ponto de vista das vanguardas e da crítica mais exigente, a Literatura CPC era
considerada ultrapassada.
 Nos anos posteriores a 64, há uma grande circulação de obras, mesmo sem o
reconhecimento da crítica, fortalecendo e alimentando um público médio.
 Nos anos 70 há uma reformulação completa do Instituto Nacional do Livro (INL),
bancando um número considerável de co-edições.
 A partir de então o Estado dá apoio a iniciativa privada, favorecendo as editoras e não os
autores.
 Ocorre a migração dos escritores do funcionalismo público para o jornalismo e a
publicidade, devido a transformação da sociedade brasileira que está mais moderna e oferece
novas formas de profissionalização para o homem de letras.
 Nos anos 50 corre o sucesso da crônica, que com publicações em revistas como “O
Cruzeiro” e “Manchete”, se tornaram conhecidas.
 Nos anos 70 nasce o traço biográfico, sendo uma das novas tendências da literatura
brasileira.
 A partir dos anos 70 se escreve muito: entre 1973 e 1979, o número de títulos editados o
Brasil saltou de 7.080 para 13.228 e o número de exemplares, de 166 milhões para 249 milhões,
acompanhando, progressivamente a expansão do ensino médio e superior, sem dúvidas
responsáveis pelo consumo de tantos livros.
 Vai ocorre nessa época o aparecimento da poesia marginal, que era mal impressa,
geralmente curtíssima e de comunicação imediata com seu leitor, tematizando perplexidades
existenciais.
 Os poetas se reúnem em grupos de nomes sugestivos como “Poetasia, Sanguinovo e
Nuvem Cigana”.
 Essa nova geração em relação aos concretos tem sua reflexão e a prática da produção
poética mais avançada, procurando caminhos alternativos para a circulação de seu texto.
 Para fugir do convencionalismo a poesia emigrou para a música, temos como exemplo
Vinícius de Morais.

6.4 – A NARRATIVA INFANTIL EM TOM DE PROTESTO


 Até os anos 50 o elogio do Brasil rural marcava a maioria das histórias destinadas à
infância;
 A década de 60 marca, na literatura infantil, a emergência do Brasil urbano;
 Entretanto, a imagem da cidade nos livros é tão idílica quanto a imagem da vida rural no
período anterior;
 Uma ruptura com a imagem otimista da vida urbana começa timidamente em 1964 com
Aventuras do escoteiro Bila (Odette de Barros Mott);
 Em 1970, a crise social é documentada com mais vigor com a publicação de Justino, o
retirante (Odette de Barros Mott), cujo texto é suficientemente complexo para registrar
transformações profundas trazidas pela modernização econômica da sociedade brasileira;
 Em Aventuras do escoteiro Bila e em Justino, o retirante, a realidade urbana constitui
um mito, já que a primeira história termina antes de Bila se mudar para a cidade e na
segunda história a cidade possui uma dimensão acanhada;
 Em 1972 com a publicação de A rosa dos ventos (Odette de Barros Mott), temos uma
realidade urbana mais degradada: um grupo de jovens que mora na periferia de São
Paulo e trabalha no centro da cidade, vivem com famílias desfeitas, são pobres e têm de
enfrentar o humor do patrão; as várias situações do enredo fazem o livro avançar em
relação aos anteriores;
 A rosa dos ventos, outro livro do período tematiza uso de drogas, carência afetiva,
tendências homossexuais, aliado ao retrato quase sem retoques da realidade urbana e da
marginalização econômica vivida por crianças e jovens;
 A rosa dos ventos é mais isenta de idealização do que Aventuras do escoteiro Bila e
Justino, o retirante; A partir de A rosa dos ventos o submundo de menores abandonados
se faz presente em muitas obras: Lando das ruas (1975 – Carlos Marigny), Pivete (1977
– Henry Correia de Araújo), A casa da madrinha (1978 – Lygia Bojunga Nunes), Coisa
de menino (1979 – Eliane Ganem), Os meninos da rua da praia (1979 – Sérgio
Caparelli);
 Em Pivete há uma radicalização na representação da vida de crianças pobres numa
cidade grande;
 Com essas narrativas que tematizam pobreza, miséria, injustiça e marginalidade, o
cenário urbano passa a ocupar o lugar central da narrativa infantil contemporânea;

6.5. A LITERATURA INFANTIL EM RITMO DE SUSPENSE

 O aumento do mercado jovem, a bem-sucedida importação de produtos da indústria


cultural norte-americana, mais o relativo abrandamento da atitude escolar frente a livros
não imediatamente formativos nem edificantes, permitiram um considerável
fortalecimento, tanto da história policial, quanto da ficção científica destinadas ao
público jovem.
 O florescimento da ficção científica e do mistério policial na literatura infantil brasileira
dos anos 70 não tem similar na literatura não-infantil, de tradição bastante pobre nessa
área.
 O que identifica certos livros policiais e de ficção científica como infantis é a presença
de crianças como detetives ou beneficiários dos poderes agenciados pela ciência.
 Dilui-se igualmente a fundamentação científica e a digressão filosófica que permeia os
melhores romances não-infantis de ficção científica, confinando o projeto para jovens no
arremedo do discurso científico, permeado de estereótipos veiculados pela indústria
cultural, como o pesquisador maluco, os viajantes extraterrestres, etc.
 O primeiro livro de Edy Lima, A vaca voadora (1972), é ao mesmo tempo exemplar e
excepcional enquanto exemplo desta vertente.
 O gênio do crime (1969), de João Carlos Marinho, incorpora e parodia os elementos
mais tradicionais do gênero, a começar pela natureza do crime, que envolve o universo
infantil de álbuns e figurinhas
 Em O caneco de Prata (1971) o mistério afeta o mundo das crianças: um campeonato
estudantil de futebol cujo prêmio, um caneco de prata, leva o técnico de um dos times a
lançar mão de todos os recursos para garantir a vitória de seus jogadores
 No livro policial infantil, o papel de vilão é sempre reservado a adultos;
 O desvendamento do mistério por um protagonista criança representa uma espécie de
confronto entre o universo adulto e o infantil;
 As crianças levam sempre a melhor sobre os adultos: desbaratam a quadrilha de
falsificadores em O gênio do crime, neutralizam a guerra bacteriológica em O caneco de
prata e vencem os bandidos que contrabandeiam sangue de crianças brasileiras em
Sangue fresco.
 Ao contrário de livros mais tradicionais, onde as aventuras se confinam ao tempo de
férias e a um espaço quase mítico, as aventuras narradas nessas histórias colam-se à vida
cotidiana de suas personagens, crianças da classe média paulistana, que vão à escola,
namoram, enganam os pais, apresentado, pois, comportamentos que têm vários pontos de
contato com a vivência dos leitores.
 Ao contrário de O caneco de prata, O gênio do crime e Sangue fresco têm uma estrutura
narrativa bastante convencional, onde os episódios se sucedem uns aos outros. Mas,
desde sua primeira obra, o estilo de João Carlos se define pelo acúmulo de detalhes de
que o autor se vale.
 Ainda na linha policial, destacam-se os livros de Stella Carr. À semelhança de João
Carlos, vários de seus livros são protagonizados por um conjunto fixo de personagens. O
caso da estranha fotografia (1977), O enigma do autódromo de Interlagos (1978), O
incrível roubo da loteca (1978), O fantástico homem do metrô (1979) e O caso do
sabotador de Angra (1980) têm os irmãos Encrenca — Marcos, Eloís e Isabel — na
posição de heróis.
 Também nessas obras, as personagens mais jovens levam a melhor sobre os adultos; e é,
igualmente, do mundo dos adultos que vêm os vilões, muito embora o risco do
maniqueísmo se atenue pela presença de adultos bons na função de coadjuvantes dos
jovens detetives.
 É na lição do best-seller mais contemporâneo que Stella busca os elementos
responsáveis pela extraordinária comunicabilidade de seus livros. A partir dos títulos,
suas obras contêm o apelo forte de locais conhecidos e populares, a promessa de
tematizar espaços e instituições tão marcados como o metrô de São Paulo, o autódromo
de Interlagos, a loteria esportiva.
 Os livros de Stella não hesitam em incorporar cenas violentas que, somadas ao timing de
uma narrativa que se torna cada vez mais complexa pela incorporação progressiva de
novas personagens, propicia aos leitores todo o envolvimento esperado de um livro
policial.
 Nas entrelinhas da narração policial, quer nas preocupações ecológicas de Stella Carr,
quer nas problematizações mais existenciais de João Carlos Marinho, ressurgem traços
do Brasil contemporâneo, focalizado agora através de textos cujo primeiro plano é
ocupado por aventuras só aparentemente inconseqüentes

6.6. A RUPTURA COM A POÉTICA TRADICIONAL

 Neste momento, ocorre a solidificação da produção poética para a infância, em termos de


quantidade, diversidade e, principalmente, termos de qualidade, desvencilhando-se do
recorte didático e pedagógico que marcara o gênero até então;
 A primeira marca dessa poesia infantil é que ela deixa de ser veículo privilegiado de
conselhos, ensinamentos e normas com o abandono da tradição didática. Há umo
rompimento com o universo ideológico, mergulhando na poética da modernidade;
 Até a década de 60 a poesia infantil brasileira guardava resquícios parnasianos quer pelo
conservadorismo, quer pelo seu compromisso com a pedagogia.
 A rigidez de valores permanece com Guilherme de Almeida em O sonho de Mariana
(1941) onde há uma caracterização convencional da criança;
 Em 1940, Murilo Araújo atenua a presença de valores mais tradicionais como em A
estrela azul;
 Em alguns poemas do mesmo livro, principalmente os dedicados à crianças maiores
ressurgem os temas patrióticos;
 Os poemas de Henriqueta Lisboa abrem espaço para a tematização do cotidiano da
criança, ao lado dos assuntos natureza, religião e animais, no entanto não deixa de ter
como referência um sistema de valores convencionais;
 É bastante lenta a independência da poesia infantil em ralação à função pedagógica e da
tematização de bichos, paisagens, vultos familiares e patrióticos de um ponto de vista
exemplar e educativo;
 O ponto de encontro entre o poeta e a criança, na poesia contemporânea ocorre ou pela
tematização do cotidiano infantil ou pela adoção, por parte do autor, de um ponto de
vista anticonvencional. Por exemplo, o poema “A Casa” de Vinícius de Morais, que foge
à representação mimética do real, criando um universo fantástico e quase surrealista;
 Muitos textos elegem como tema o cotidiano infantil, focalizando situações individuais
ou familiares, o texto fala de crianças e torna-se aliado delas;
 Ganha espaço e relevo a recuperação de modinhas infantis, canções de ninar e
brincadeiras de roda, estabelecendo com o destinatário infantil a cumplicidade de
linguagem e de repertório cultural;
 A poesia para criança potencializa ao máximo aliterações, onomatopéias, rimas internas.
O trabalho com a sonoridade torna livros raros;
 Antropomorfização, atribuindo aos animais o dom da palavra. Esses animais escapam do
contexto conservador (ex. animais que fogem à conduta do cão fiel ou do pássaro
cativo);
 Apesar de assumir a ingenuidade do olhar infantil ou inspirar-se no cotidiano das
crianças, a poesia moderna não perde a sua profundidade. Pois o lirismo mais profundo
pode ser trabalhado através dos temas mais prosaicos e mais cotidianos;
 Cecília Meireles é o exemplo perfeito da fusão lirismo-criança-cotidiano. Autores
principais: Sidónio Muralha, Vinícius de Morais, Murilo Araújo, Mário Quintana,
Henriqueta Lisboa,
6.7. EM BUSCAS DE NOVAS LINGUAGENS

 Marca bastante típica dos livros infantis de 1960 para cá é a incorporação da oralidade,
tanto na narrativa como na poesia, essa tentativa visava uma aproximação tanto da
proposta dos modernistas de 22 como a herança lobatiana.
 A oralização dos discursos tem o objetivo de trazer para as histórias infantis o
heterogêneo universo de crianças marginalizadas, de pobres, de índios. Assim, a
linguagem também se distanciou do padrão da forma culta, temos a presença de gírias de
rua, falares regionais e dialetos sociais adequados aos novos conteúdos.
 Em Apenas um curumim (1979), de Werner Zotz, e em O curumim virou um gigante,
temos a tentativa de aproximar esta literatura de uma linguagem primitiva.
 Em muitos casos, por exemplo, em obras urbanas há a tentativa de afastamento da
norma padrão, ocasionando certa de anacronia e descontextualizarão de gírias e da
superposição não significativa de diferentes registros linguísticos. Porém, com Lando
das ruas (1976), de Carlos de Marigny e, com Pivete (1977), de Herry Correia de
Araújo, esse uso literário de novos dialetos ganha maturidade, e a parti daí se expande.
 Em muitos casos o texto infantil tematiza seu próprio processo de escrita e produção,
fazendo referencias a outras obras, como um diálogo. Fazendo se aproximar das obras
infantis e obras não infantis;
 O primeiro escritor que trouxe para a narrativa infantil os dilemas do narrador moderno
foi Clarice Lispector, suas obras:

1. Abandonam a onisciência, aflorando todas as hesitações do narrador;


2. Pode atenuar a assimetria que preside a emissão adulta e a recepção infantil
dentro do livro infantil;
3. Fragmentação e a diluição da narrativa, exigindo a participação do leitor a quem
o narrador se dirige com freqüência;

 Obras que apresentam a modernidade da literatura infantil, na linguagem: O caneco de


prata (1971), João Carlos Marinho, Marcelo marmelo martelo (1976) e o Reizinho
mandão (1978) de Ruth Rocha, Chapeuzinho Amarelo (1979) de Chico Buarque;
 História meio ao contrário (1979) de Ana Marina Machado;
 Lygia Bojunga Nunes, nas obras - Os colegas, 1972, Angélica, 1975, A bolsa amarela,
1976, A casa da madrinha, 1978, Corda bamba, 1979, e o Sofá estampado,1980
apresenta histórias que contam desajustes, frustrações, marginalização social e familiar;
 Marina Colasanti, em Uma ideia toda azul (1979), volta a apresentar os temas de contos
de fadas, reis, princesas e rainhas.;
 Contra o maniqueísmo: A fada que tinha idéias e Soprinho, de Fernanda Lopes de
Almeida, A fada desencantada, de Eliane Ganen, Histórias meio ao contrário, de Ana
Maria Machado, Onde tem bruxa tem fada, Bartolomeu Campos Queirós;
 Contos: Uma idéia toda azul e Doze reis e a moça do labirinto do vento (1983), O
misterioso rapto de Flor- do- Sereno (1979), de M. Colasanti caracterizam-se por serem
escritas simbólicas;

6.8. BALANÇO GERAL

 Nos anos de 1960 a 1970, observa-se a implantação do modelo capitalista e o reforçpo


para a produção cultural no país;
 Imersa nesse contexto que favorece um modelo industrial de produção cultural, a
literatura infantil brasileira, frágil por sua recente e frágil tradição, apresenta traços tanto
de manutenção de velhas fórmulas quanto um esforço renovador;
 Tendência de manutenção de velhas fórmulas > continuidade da produção em série,
favorecida por um mercado pouco exigente e que precisa preencher a cota de livros para
a infância e juventude;
 Tendência renovadora > a literatura infantil adere aos moldes renovadores apresentados
pelas propostas modernistas e se torna questionadora, crítica e inovadora em suas
fórmulas artísticas. Além disso, passa a olhar a realidade de forma mais efetiva, com
denúncia de problemas sociais e políticos, promovendo a inversão e valores ideológicos
do passado. Afastamento de valores tradicionais.
 Há produção de gêneros não contemplados na literatura adulta, tais como a história
policial e a ficção científica
 Fortalecimento e crescimento da produção poética (multiplicação de poetas que se
dedicam à infância);
 Reaproveitamento do fantástico, do imaginário nas obras;
 Ruptura com o tradicional e inovação linguística;
 Estabelecimento (aceitação) da literatura infantil como uma modalidade literária de
prestígio, tal qual a literatura produzida para adultos;
 O fato de ter se estabelecido como modalidade literária não a desvincula de alguns
problemas relativos à sua gênese: i) dependência do meio escolar; ii) influência
manipuladora de seus produtores.

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