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ste de Soluções

Transcrições dos recursos áudio e vídeo aves, que se criam, e vivem connosco, o papagaio nos fala, o
rouxinol nos canta, o açor nos ajuda, e nos recreia; e até as
grandes aves de rapina encolhendo as unhas reconhecem a
Manual mão de quem recebem o sustento. Os peixes pelo contrário
lá se vivem nos seus mares, e rios, lá se mergulham nos seus
Sequência 1 – Padre António Vieira, «Sermão de Santo pegos, lá se escondem nas suas grutas, e não há nenhum tão
António» grande, que se fie no homem, nem tão pequeno, que não
fuja dele. Os Autores comummente condenam esta condição
Compreensão do oral FAIXA I dos peixes, e a deitam à ouca docilidade, ou demasiada
bruteza; mas eu sou de muito diferente opinião. Não
Exposição sobre um tema (p. 25) condeno, antes louvo muito aos peixes este seu retiro, e me
parece que se não fora natureza era grande prudência.
As virtudes dos peixes no Peixes, quanto mais longe dos homens, tanto melhor: trato,
«Sermão de Santo António» e familiaridade com eles, Deus vos livre. Se os animais da
Capítulo II terra, e do ar querem ser seus familiares, façam-no muito
embora, que com suas pensões o fazem. Cante-lhe aos
(1.o parágrafo) homens o rouxinol, mas na sua gaiola; diga-lhe ditos o
Vindo, pois, irmãos, às vossas virtudes, que são as que papagaio, mas na sua cadeia; vá com eles à caça o açor, mas
só podem dar o verdadeiro louvor; a primeira, que se me nas suas piozes; faça-lhe bufonarias o bugio, mas no seu
oferece aos olhos hoje, é aquela obediência, com que cepo; contente-se o cão de lhe roer um osso, mas levado
chamados acudistes todos pela honra de vosso Criador, e onde não quer pela trela; preze-se o boi de lhe chamarem
Senhor, e aquela ordem, quietação e atenção, com que formoso, ou fidalgo, mas com o jugo sobre a cerviz, puxando
ouvistes a palavra de Deus da boca de seu servo António. Oh pelo arado, e pelo carro; glorie-se o cavalo de mastigar
grande louvor verdadeiramente para os peixes, e grande freios dourados, mas debaixo da vara, e da espora; e se os
afronta, e confusão para os homens! Os homens tigres, e os leões lhe comem a ração da carne, que não
perseguindo a António, querendo-o lançar da terra, e ainda caçaram no bosque, sejam presos, e encerrados com grades
do mundo, se pudessem, porque lhes repreendia seus vícios, de ferro. E entretanto, vós, peixes, longe dos homens, e fora
porque lhes não queria falar à vontade, e condescender com dessas cortesanias vivereis só convosco, sim, mas como
seus erros; e no mesmo tempo os peixes em inumerável peixe na água. De casa, e das portas adentro tendes o
concurso acudindo à sua voz, atentos, e suspensos às suas exemplo de toda esta verdade; o qual vos quero lembrar,
palavras, escutando com silêncio e com sinais de admiração, porque há Filósofos que dizem que não tendes memória.
e assenso (como se tiveram entendimento) o que não
entendiam. Quem olhasse neste passo para o mar, e para a (3.o parágrafo)
terra, e visse na terra os homens tão furiosos, e obstinados, No tempo de Noé sucedeu o Dilúvio, que cobriu e
e no mar os peixes tão quietos, e tão devotos, que havia de alagou o mundo; e de todos os animais, quais livraram
dizer? Poderia cuidar que os peixes irracionais se tinham melhor? Dos leões escaparam dois, leão, e leoa, e assim dos
convertido em homens, e os homens não em peixes, mas em outros animais da terra; das águias escaparam duas, fêmea,
feras. Aos homens deu Deus uso de razão, e não aos peixes; e macho, e assim das outras aves. E dos peixes? Todos
mas neste caso os homens tinham a razão sem o uso, e os escaparam; antes não só escaparam todos, mas ficaram
peixes o uso sem a razão. Muito louvor mereceis, peixes, por muito mais largos que dantes, porque a terra, e o mar tudo
este respeito, e devoção, que tivestes aos Pregadores da era mar. Pois se morreram naquele universal castigo todos
palavra de Deus; e tanto mais quanto não foi só esta a vez, os animais da terra, e todas as aves, porque não morreram
em que assim o fizestes. Ia Jonas, Pregador do mesmo Deus, também os peixes? Sabeis porquê? Diz Santo Ambrósio:
embarcado em um navio, quando se levantou aquela grande porque os outros animais, como mais domésticos, ou mais
tempestade; e como o trataram os homens, como o vizinhos, tinham mais comunicação com os homens; os
trataram os peixes? Os homens lançaram-no ao mar a ser peixes viviam longe, e retirados deles. Facilmente pudera
comido dos peixes, e o peixe, que o comeu, levou-o às praias Deus fazer que as águas fossem venenosas, e matassem
de Nínive, para que lá pregasse, e salvasse aqueles homens. todos os peixes, assim como afogaram todos os outros
É possível que os peixes ajudam à salvação dos homens, e os animais. Bem o experimentais na força daquelas ervas, com
homens lançam ao mar os ministros da salvação? Vede, que inficionados os poços, e lagos, a mesma água vos mata;
peixes, e não vos venha vanglória, quanto melhores sois que mas como o Dilúvio era um castigo universal, que Deus dava
os homens. Os homens tiveram entranhas para deitar Jonas aos homens por seus pecados, e ao mundo pelos pecados
ao mar, e o peixe recolheu nas entranhas a Jonas, para o dos homens, foi altíssima providência da divina Justiça que
levar vivo à terra. nele houvesse esta diversidade, ou distinção; para que o
mesmo mundo visse que da companhia dos homens lhe
(2.o parágrafo) viera todo o mal: e que por isso os animais, que viviam mais
Mas porque nestas duas ações teve maior parte a perto deles, foram também castigados, e os que andavam
Omnipotência que a natureza (…), passo às virtudes naturais, longe ficaram livres. Vede, peixes, quão grande bem é estar
e próprias vossas. Falando dos peixes Aristóteles diz que só longe dos homens! (…)
eles entre todos os animais se não domam nem
domesticam. Dos animais terrestres o cão é tão doméstico, o
cavalo tão sujeito, o boi tão serviçal, o bugio tão amigo, ou Padre António Vieira, «Sermão de Santo António»,
tão lisonjeiro, e até os leões, e os tigres com arte, e in Obra Completa (dir. José Eduardo Franco e Pedro Calafate),
benefícios se amansam. Dos animais do ar afora aquelas tomo II, volume X, Lisboa, Cicrculo de Leitores, 2014, pp. 140-143
Transcrições

O amor é frequentemente celebrado como um


Compreensão do oral fenómeno místico, muitas vezes espiritual, por vezes apenas
físico, mas sempre como uma força capaz de determinar o
Discurso político (p. 51) nosso comportamento. Sem querer discutir a magia do
amor, hoje vamos apenas abordar o amor do ponto de vista
Transcrição do discurso de da química que lhe está associada: os compostos químicos
José Saramago, em Estocolmo, 1998 que atuam sobre o nosso corpo – sobre o nosso cérebro, em
particular – e nos transmitem todas as sensações e
«Cumpriram-se hoje exatamente 50 anos sobre a comportamentos que associamos ao amor.
assinatura da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Não têm faltado comemorações à efeméride. Sabendo-se, As três fases do amor romântico
porém, como a atenção se cansa quando as circunstâncias Foi a antropóloga Helen Fisher, famosa pelos seus
lhe pedem que se ocupe de assuntos sérios, não é arriscado estudos sobre a bioquímica do amor que propôs a existência
prever que o interesse público por esta questão comece a de três fases no amor, cada uma delas com as suas
diminuir já a partir de amanhã. Nada tenho contra esses atos características emocionais e os seus compostos químicos
comemorativos, eu próprio contribuí para eles, próprios.
modestamente, com algumas palavras. E uma vez que a data
A primeira fase é chamada «fase do desejo» e é
o pede e a ocasião não o desaconselha, permita-se-me que
desencadeada pelas nossas hormonas sexuais, a
diga aqui umas quantas mais.
testosterona nos homens e o estrogénio nas mulheres. É a
Neste meio século não parece que os governos tenham circulação destas hormonas no nosso sangue – que se inicia
feito pelos direitos humanos tudo aquilo a que moralmente na fase da adolescência – que torna o nosso cérebro
estavam obrigados. As injustiças multiplicam-se, as interessado em parceiros sexuais.
desigualdades agravam-se, a ignorância cresce, a miséria
A segunda fase é a «fase da atração», enamoramento
alastra. A mesma esquizofrénica humanidade capaz de
ou paixão: é quando nos apaixonamos, ou seja, é a altura em
enviar instrumentos a um planeta para estudar a
que perdemos o apetite, não dormimos, não conseguimos
composição das suas rochas, assiste indiferente à morte de
concentrar-nos em nada que não seja o objeto da nossa
milhões de pessoas pela fome. Chega-se mais facilmente a
paixão. É uma fase em que podem acontecer coisas
Marte do que ao nosso próprio semelhante.
surpreendentes, que por vezes dão origem a situações
Alguém não anda a cumprir o seu dever. Não andam a divertidas (para os outros) e embaraçosas (para o próprio):
cumpri-lo os governos, porque não sabem, porque não as mãos suam, a respiração falha, é difícil pensar com
podem, ou porque não querem. Ou porque não lho clareza, há «borboletas no estômago»... enfim... e isto tem a
permitem aquelas que efetivamente governam o mundo, as ver com outro conjunto de compostos químicos que afetam
empresas multinacionais e pluricontinentais cujo poder, o nosso cérebro: a norepinefrina que nos excita (e acelera o
absolutamente não democrático, reduziu a quase nada o bater do coração), a serotonina que nos descontrola, e a
que ainda restava do ideal da democracia. Mas também não dopamina, que nos faz sentir felizes.
estão a cumprir o seu dever os cidadãos que somos.
Curioso é verificar que todos estes compostos químicos
Pensamos que nenhuns direitos humanos poderão subsistir
– designados por neurotransmissores – são controlados por
sem a simetria dos deveres que lhes correspondem e que
um outro, chamado feniletilamina que está presente no
não é de esperar que os governos façam nos próximos 50
chocolate. Estará aqui a razão para o chocolate ser uma
anos o que não fizeram nestes que comemoramos.
prenda tão apreciada para os namorados, ou para ser tantas
Tomemos então, nós, cidadãos comuns, a palavra. Com a
vezes a compensação para um amor não correspondido?
mesma veemência com que reivindicamos direitos,
reivindiquemos também o dever dos nossos deveres. Talvez A terceira fase é a «fase de ligação» – passamos à fase
o mundo possa tornar-se um pouco melhor. do amor sóbrio, que ultrapassa a fase da atracão / paixão e
fornece os laços para que os parceiros permaneçam juntos.
Não esqueci os agradecimentos. Em Frankfurt, no dia 8
Há duas hormonas importantes nesta fase: a oxitocina e a
de outubro, as primeiras palavras que pronunciei foram para
vasopressina. A oxitocina é também chamada a hormona do
agradecer à Academia Sueca a atribuição do Prémio Nobel
«carinho» ou do «abraço». A oxitocina é uma pequena
da Literatura. Agradeci igualmente aos meus editores, aos
proteína, produzida numa zona cerebral que se chama
meus tradutores e aos meus leitores. A todos torno a
hipotálamo. Esta proteína atua tanto em certas partes do
agradecer. E agora também aos escritores portugueses e de
corpo quanto em regiões cerebrais cuja função está
língua portuguesa, aos do passado e aos de hoje: é por eles
associada com emoções e comportamentos sociais.
que as nossas literaturas existem, eu sou apenas mais um
que a eles se veio juntar. Disse naquele dia que não nasci A vasopressina é atualmente conhecida como a
para isto, mas isto foi-me dado. Bem hajam portanto.» hormona da fidelidade. É também uma pequena proteína e
o seu papel no corpo humano é vasto – o nome
Sequência 2 – Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa
vasopressina, por exemplo, está claramente relacionado
Compreensão do oral com a sua ação sobre a pressão sanguínea – e algumas
experiências recentes revelaram a sua relação com o
Exposição sobre um tema (p. 77) comportamento monogâmico dos machos.
FAIXA 2 Estaríamos finalmente em condições de manter uma
A química do amor
ligação eterna e fiel com o ser amado, mas nem sempre isso
acontece…
Paulo Ribeiro Claro, «Química do Amor», in Química, nº 100, associada a este novo meio de transporte, de resto como já
Sociedade Portuguesa de Química, 2006 (texto adaptado) vinha acontecendo com os projetos de construção de
Sequência 3 – Almeida Garrett, Viagens na minha terra estradas, motivou vários movimentos críticos que
confrontaram, por um lado os defensores que reconheciam
Compreensão do oral os benefícios que daí advinham para a melhoria das
condições de circulação de pessoas e mercadorias e, por
Exposição sobre um tema (p. 154) FAIXA 4
outro, contracorrentes movidas pela desconfiança sobre os
seus efeitos para a sociedade, estes convencidos da utopia
Meios de comunicação e transporte do projeto.
durante a primeira metade do século XIX
No Governo de António Bernardo da Costa Cabral (1842-
Até à segunda metade do século XVIII, altura em que 1846) define-se o sistema de estradas principais diretas de
entrou em serviço a malaposta para o transporte do correio, Lisboa para as capitais de distrito bem como as estradas
as deslocações em Portugal faziam-se a pé, com o recurso a principais indiretas, ou ligações dos ramos das estradas
animais, e por via fluvial, confinando-se a espaços muito principais diretas entre si. É também criada a Companhia das
restritos. Obras Públicas de Portugal, à qual compete a construção do
caminho de ferro cujos trabalhos de conceção já se tinham
Com D. Maria I, a partir de 1780, é possível observar um iniciado em 1835, mas só na década de 50, com a
conjunto de ações e obras, como a construção de pontes, a Regeneração, iriam avançar em definitivo.
realização de projetos para a estrada de Lisboa a Coimbra
Elsa Pacheco, Alteração das acessibilidades e dinâmicas
(que só viria a ficar pronta 18 anos depois) e outras estradas,
territoriais na Região Norte: expectativas, intervenções e resultantes.
nomeadamente na área do Douro as quais, apesar de Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, GEDES, 2004
circunscritas a pequenas parcelas do território, dão conta da (texto adaptado)
necessidade de promover determinadas ligações.
Sequência 4 – Camilo Castelo Branco,
As intervenções na rede de estradas marcam a viragem
Amor de perdição
para o século XIX, numa altura em que, como se ilustra a
propósito do parco sucesso da malaposta entre Lisboa e
Compreensão do oral
Coimbra, «o português (...) bisonho e pouco afeito a viagens,
não acolheu a iniciativa com o interesse que seria necessário FAIXA 5
Exposição sobre um tema (p. 208)
para que ela pudesse manter-se e progredir.» (...). De
qualquer forma, a Carta Militar das Principais Estradas de
A igualdade de género
Portugal de 1808 deixa perceber a presença de uma rede
relativamente densa (o que não significa de qualidade) que
A mulher percorreu um longo caminho para alcançar um
cobre de uma forma bastante homogénea o território
estatuto de igualdade face ao homem e saiu da sombra a
português. Este facto pode confirmar-se com os tempos de
que a História a tinha condenado.
viagens do correio expresso entre Lisboa e as capitais de
distrito, uma vez que, se entre a capital e o Porto a viagem é Atualmente a nossa Constituição consagra a igualdade de
de 3 dias, até Bragança a diferença é de apenas mais um dia direitos para todos, mas este estatuto é bastante recente e
e duas horas, o que revela a possibilidade de fazer o trajeto sofreu bastantes evoluções e retrocessos ao longo deste
pelo interior, desenvolvendo um percurso de comprimento último século, consoante mudaram os regimes políticos no
inferior ao atual. país. Contudo, este caminho não está ainda terminado.
Existem ainda muitas situações de injustiça e desigualdade
Mas terá sido a partir do triunfo do Liberalismo, em
face ao sexo feminino que têm de ser combatidas, muitas
1834, que se verificou um surto de reflexões e ações que
delas devido a uma cultura enraizada de poder masculino.
revelam o esforço de definir os objetivos e princípios
orientadores da construção da rede viária. Baseada na lei de Assim, apesar do nível académico médio das mulheres ser
19 de dezembro de 1834, a lei de 12 de março de 1835 cria a hoje bem superior ao dos homens, elas continuam a ser
Comissão de Melhoramentos de Comunicação Interior a discriminadas no mercado de trabalho: mais dificuldade de
qual devia elaborar um plano de transportes que envolvesse acesso, mais precariedade, mais assédio, menor salário,
os diversos modos, devendo também propor as dimensões mais desemprego; continuam a ser discriminadas no acesso
para cada classe das estradas classificadas. Mascarenhas à riqueza – constituem a franja mais pobre e vulnerável;
Neto protagoniza esta tarefa, e classifica as estradas como continuam a ser discriminadas no acesso aos lugares de
reais (todas as que ligam Lisboa às capitais de distrito), de decisão – nos empregos, nos organismos de representação
comércio (ligam as cidades e vilas com pelo menos 500 social, na política.
fogos), as públicas (estabelecem a ligação a localidades com Continuam a ser as vítimas, de longe mais expressivas, de
pelo menos 300 fogos) e, finalmente, as restantes, que violência doméstica; A sua saúde continua a ser tratada em
designa por estradas de vizinhança. O ânimo criado em função de paradigmas masculinos; Ninguém as dispensa da
torno desta iniciativa mereceu um «Voto de confiança dado dupla jornada de trabalho – fora de casa e dentro de casa,
pelas Câmaras ao sr. Ministro do Reino» no mês de maio de não se lhes reconhecendo o direito ao lazer ou à partilha de
1835, ao considerar-se que, desta forma, (...) vão-se facilitar tarefas; Continuam a ser as principais vítimas de tráfico de
as operações comerciais e diminuir as despesas de seres humanos; Conjuntamente com as crianças, são as
transporte. principais vítimas dos conflitos armados.
O ano de 1835 ficou ainda marcado pela proposta para a Trata-se, finalmente, de um problema estrutural. Faz parte
introdução do caminho de ferro em Portugal. A inovação do inconsciente coletivo a subalternização da mulher, e a
Transcrições

nossa sociedade continua a exercer bastantes injustiças para Senso-ji, o mais antigo da cidade e onde acorrem os
com o sexo feminino. Não basta que a lei consagre a japoneses em dias festivos em busca de bons auspícios, e o
igualdade, é necessário educar a sociedade para essa de Meiji-Jingu, palco de casamentos e onde se reúnem três
igualdade. Este será, certamente, outro longo caminho a milhões de pessoas para rezar no dia de Ano Novo.
percorrer pelas mulheres. http://fugas.publico.pt/Viagens/
www.democracia-aberta.pt/ (texto adaptado, consultado em 15.09.2015)
(texto adaptado, consultado em 11.08.2015)

Sequência 7 – Cesário Verde, Cânticos


do Realismo Dossiê Prático do Professor

Compreensão do oral Testes de compreensão do oral

Exposição sobre um tema (p. 319) FAIXA 19 TESTE DE COMPREENSÃO DO ORAL Nº 1 – Sequência 1

Cidades que se recusam a dormir Padre António Vieira, «Sermão de Santo António»
(…)
Tóquio Discurso político (p. 234)
Cai a noite, brilha o néon em Tóquio e uma estranha
metamorfose apodera-se da cidade imensa. Discurso de vitória de Barack Obama no dia 4 de
novembro de 2008 no Parque Grande de Chicago, após ter
– Quando passeio por Tóquio, sinto que acabo de chegar vencido as eleições ao seu concorrente John McCain.
a um outro planeta, um sentimento que se exacerba quando
a noite chega – muita iluminação, muito barulho, muito Primeira parte (desde o início até ao 0:49 segundos)
movimento, admite Mika Ono. (…)
Os estabelecimentos comerciais, em plena atividade, O caminho que nos espera é longo. A nossa subida
rugem de vida, as persianas dos escritórios são fechadas e as difícil. Podemos não chegar lá num ano, ou mesmo num
bocas do metro engolem homens, mulheres e crianças. mandato. Mas, América, nunca tive tanta esperança como a
Alguns homens de negócios acabaram as suas reuniões que tenho hoje de que chegaremos lá.
tardias, vivem a uma centena de quilómetros de Tóquio e às Prometo-vos, que como pessoas chegaremos lá.
oito da manhã já estão de novo a trabalhar — metem as Teremos contrariedades e falsas partidas. Haverá muitos
suas gravatas no bolso e dormem num hotel-cápsula. que não irão concordar com cada decisão que tome como
– Gosto de apreciar o contraste entre jovens divertidos, presidente. E sabemos que o governo não é capaz de
com tantas opções, seja para compras ou lazer, e homens de resolver todos os problemas.
fato e gravata, cansados e transportando o peso de uma Mas serei sempre honesto convosco em relação aos
vida escravizada. Muitos deles acabaram de se formar, sem desafios que enfrentamos. Vou ouvir-vos, em especial
direito a férias no primeiro ano e permanecem até altas quando discordarmos. E, acima de tudo, vou pedir-vos para
horas da noite fechados em escritórios. De um lado a que se juntem a mim no trabalho de reconstrução desta
liberdade, do outro, o oposto, ressalva ainda a tradutora. nação, da única forma que sempre foi feito na América nos
Na capital nipónica pouco ou nada resta de antigo — últimos 221 anos – bloco a bloco, mão calosa em mão
durante o século XX foi destruída duas vezes, primeiro pelo calosa.
grande terramoto de 1923 e, anos mais tarde, pelos
bombardeamentos da II Guerra Mundial. A melhor maneira Segunda parte (desde 0:50 segundos a 4:25 minutos)
de viajar em Tóquio é de metro, complicado no início, rápido O que começou há 21 meses no inverno não pode
e eficaz quando se percebe a sua dinâmica de terminar nesta noite de outono.
funcionamento, de preferência acompanhado de um mapa
com caracteres latinos. Não é esta vitória a mudança que pretendemos. É a
única forma de começarmos a mudança. E isso não pode
– O transporte é diversificado e eficiente, cada estação acontecer se voltarmos a ser como éramos.
de metro ou de comboio tem lugares para todos os gostos.
Nem Londres, nem Paris, nem Nova Iorque — nenhuma Não acontece sem vós, sem o novo espírito de serviço, o
delas vive num ritmo tão frenético como Tóquio. E, ao novo espírito de sacrifício.
mesmo tempo, no meio de tanta modernização, existem Vamos unir-nos num novo espírito de patriotismo, de
lugares históricos, templos budistas ou sintoístas, tão responsabilidade, em que cada um de nós resolve participar
impregnados de silêncio e capazes de transmitir uma e trabalhar mais e olhar não só por nós mesmo mas também
energia positiva. Tóquio, uma cidade muito segura, também pelos outros.
vive de contrastes, entre o modernismo e o tradicional, e a
Não nos esqueçamos que se a crise financeira nos
convivência é perfeita, observa a japonesa.
ensinou alguma coisa foi que não podemos ter uma Wall
A despeito das destruições no século passado, ainda se Street florescente enquanto que os outros sofrem.
encontram interessantes vestígios da deslumbrante Edo, a
Neste país, levantamo-nos e caímos como uma nação
antiga povoação sobre a qual se ergue Tóquio. O bairro mais
só, como um povo.
antigo e onde ainda se respira o espírito de tempos de
antanho é o Asakusa, com as suas casas térreas, o templo
Resistamos à tentação de voltar a cair no mesmo
sectarismo, na mesma mesquinhez e imaturidade que
envenenou a nossa política durante tanto tempo.
Relembremos que foi um homem deste Estado que, pela Quarta parte (desde 6:45 a 7:54 minutos)
primeira vez, carregou a bandeira do Partido Republicano
até à Casa Branca, um partido que teve por base a autocon- América, chegamos até aqui. Já vimos muito. Mas ainda
fiança, a liberdade individual e a unidade nacional. há muito para fazer. Por isso, esta noite, perguntemos a nós
mesmos: se as nossas crianças viverem para chegar ao
Esses são os valores que todos partilhamos. E apesar do próximo século; se as nossas filhas tiverem a sorte de viver
Partido Democrata ter conquistado uma grande vitória esta tanto como Ann Nixon Cooper, que mudanças vão poder
noite, fazemo-lo com a humildade e a determinação de sarar ver? Que progressos teremos feito?
o que nos divide e que impediu o nosso progresso.
Esta é a nossa oportunidade de responder a essa
Como Lincoln disse a uma nação muito mais dividida do questão. Este é o nosso momento.
que a nossa, «não somos inimigos», mas sim amigos. Apesar
da paixão nos levar a exageros, não deve quebrar os nossos Este é o nosso tempo, de voltar a dar trabalho à nossa
laços afetuosos. gente, de abrir as portas da oportunidade aos nossos filhos;
de restaurar a prosperidade e promover a paz; de reclamar o
E àqueles americanos, cujo apoio ainda tenho de sonho americano e de reafirmar a verdade fundamental de
conquistar, posso não ter ganho o vosso voto esta noite, que, no meio de muitos, somos um; que enquanto
mas ouço a vossa voz. Preciso da vossa ajuda. E serei, respiramos, mantemos a esperança. E aqui estamos nós,
também, o vosso presidente. frente a frente com o cinismo e as dúvidas daqueles que nos
E para todos os que têm os olhos postos em nós esta dizem que não somos capazes, e a quem respondemos com
noite, para além das nossas costas, dos parlamentos aos o credo intemporal que representa o espírito de um povo:
palácios, para aqueles que se juntaram à volta de rádios nos Sim, somos capazes.
cantos mais esquecidos do mundo, as nossas histórias são Obrigado. Deus vos abençoe. E que Deus abençoe os
diferentes mas o nosso destino é partilhado, e uma nova Estados Unidos da América.
aurora se levanta na liderança americana.
http://maioresdiscursos.blogspot.pt/
Para aqueles que querem destruir o mundo: nós vamos (consultado em 10.01.2016)
destruir-vos. Para os que querem paz e segurança: nós
apoiamos-vos. E para aqueles que se interrogam sobre se a TESTE DE COMPREENSÃO DO ORAL Nº 2 – Sequência 2
luz de liderança da América continua viva: esta noite
provamos, mais uma vez, que a força da nossa nação não Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa
vem do nosso poder militar ou da escala da nossa riqueza,
mas do enorme poder dos nossos ideais: democracia, Exposição sobre um tema (p. 236)
liberdade, oportunidade e esperança.
Essa é a verdadeira genialidade da América: a sua Mitos sobre o amor romântico
capacidade de mudança. A nossa união pode ser perfeita. O
que conseguimos hoje dá-nos ainda mais esperança em Primeira parte
relação ao que podemos conseguir amanhã. Das lendas arturianas aos filmes de Hollywood, o mito
do amor romântico – perfeito, eterno, fiel, trágico,
Terceira parte (desde 4:25 a 6:45 minutos) irracional... – atravessa o imaginário coletivo do mundo
Esta eleição tinha muitas estreias e muitas histórias que ocidental. Esta idealização explica o fracasso de muitas
serão contadas ao longo de gerações. Mas uma que está na relações, nas quais se procura uma paixão impossível.
nossa mente hoje é sobre uma mulher que votou em
Atlanta. Ela assemelha-se a muitos milhões que estiveram na Segunda parte
fila para fazer ouvir a sua voz nesta eleição por uma razão: Estudos recentes, efetuados para promover sites de
Ann Nixon Cooper tem 106 anos. encontros na internet, confirmam que o mito do amor
Ela nasceu na geração da escravatura; num tempo em romântico se encontra bem enraizado. No entanto,
que não havia carros na estrada, aviões no céu; quando devíamos fazer, primeiro, uma pergunta elementar: trata-se
alguém como ela não podia votar por duas razões: porque de uma emoção? Para quem estuda essa manifestação da
era mulher e por causa da cor da sua pele. psique humana, não. O grande pioneiro na investigação do
tema foi Paul Ekman, considerado um dos 100 psicólogos
E, esta noite, penso em tudo o que viu no centenário de mais influentes do século XX. Em 1999, apresentou uma lista
vida na América – o desespero e a esperança; a luta e o elementar de emoções baseada em estudos interculturais
progresso; as vezes em que nos disseram que não éramos que desenvolvera na Papuásia–Nova Guiné: não incluía o
capazes e aqueles que mantiveram a sua capacidade de nosso protagonista. Os motivos para a clamorosa exclusão
dizer: Sim, somos capazes. são diversos: que o amor é uma mistura de outras emoções,
E este ano, nesta eleição, ela tocou com o dedo no ecrã como a alegria, a ansiedade e os ciúmes; que se trata mais
e fez o seu voto, porque depois de 106 anos na América, de um sentimento ou uma atitude; que, ao contrário da
depois dos melhores tempos, dos mais obscuros, ela sabe tristeza, da felicidade e da irritabilidade, não pode produzir-
que a América pode mudar. se sem a intervenção de um objeto.
Sim, somos capazes.
Terceira parte
Transcrições

Isto revela um fosso entre a academia e a rua. Até


meados dos anos 70, a temática amorosa estava ausente
dos textos convencionais de psicologia; possivelmente, pela
dificuldade intrínseca do assunto, que englobava outras
disciplinas, como é o caso da biologia e da antropologia. TESTE DE COMPREENSÃO DO ORAL Nº 3 – Sequência 3

Quarta parte Almeida Garrett, Viagens na minha terra


Vivemos, pois, imersos num cliché mental que se foi
forjando na cultura ocidental e que alcançou o apogeu Exposição sobre um tema (p. 238) FAIXA 2
durante a época do Romantismo. Continuamos a acreditar
nas histórias dos filmes mais lamechas de Hollywood, como Uma viagem no tempo
a existência de uma alma gémea predestinada. Algo A circulação de passageiros e correio fazia-se até
absurdo, se tomarmos em consideração que a maioria dos meados do século XIX essencialmente em diligências e na
inquiridos diz ter conhecido o parceiro no meio que mala-posta, que despendiam cerca de dois dias para chegar
frequenta (morada, escola, trabalho) ou de modo fortuito. da capital a Coimbra e outros tantos para vencer a distância
Quinta parte entre a cidade dos estudantes e o Porto. Enfim, um
verdadeiro suplício para o corpo e para a paciência dos
Outro lugar-comum é que o sentimento do amor dura
temerários viajantes, que não seriam assim tantos.
para toda a vida. Além de ingénuo, revela-se dificilmente
compatível com certos imperativos psicológicos e biológicos. Enquanto as estradas tardavam em aparecer e se
A paixão eterna costuma desvanecer-se passado cercade modernizar, as viagens passaram a fazer-se por via marítima.
quatro anos, segundo indicam alguns estudos recentes. E o As mudanças tecnológicas oferecidas pela Revolução
que dizer da ideia de que, quando se ama verdadeiramente, Industrial, com destaque para a máquina a vapor, não
se é fiel para sempre? Ou a de que o amor tudo vence? tardaram a chegar aos meios de transporte marítimos. E,
rapidamente, os barcos a vapor surgiram como alternativa
Sexta parte
ao moroso e cansativo transporte terrestre.
Paixão de ouvir dizer
As ligações por mar permitiam estreitar as distâncias e
Este último mito vive confortavelmente instalado no melhorar o conforto dos passageiros. Contudo, essa opção
Ocidente, ao ponto de transformar o amor à primeira vista só era válida para viagens entre cidades costeiras, e apenas
no ideal romântico por excelência. Culturalmente, teve a sua quando a meteorologia e o oceano o permitiam, o que nem
origem na época do amor cortês: nascido no século XI, na sempre acontecia. Por conseguinte, desde julho de 1821,
Provença, é o de Tristão (indefetível e adúltero) e Isolda, ou quando o paquete Conde Palmela passou a assegurar a
o de Guinevere e Lancelot. Estamos a falar de histórias carreira regular entre Lisboa e Porto, muitos foram os
trágicas ou fatais, como a dos amantes Abelardo e Heloísa, naufrágios que mancharam com vítimas mortais as ligações
ou de outras de caráter mais cómico. O romance à primeira marítimas nacionais. Os infortúnios com os paquetes
vista de Amadis de Gaula (1508), entre o cavaleiro e Oriana, Lusitano (1823) e Porto (1852) são apenas alguns dos
foi levado ao extremo por Cervantes quando coloca D. exemplos que figuram na lista trágico-marítima das
Quixote a afirmar que está «apaixonado de ouvir dizer e da embarcações a vapor.
grande fama que tem de formosa e discreta» a incomparável
Dulcineia. Nascem as estradas de ferro
Sétima parte Por volta de 1852, apesar das dificuldades económicas
Presos a essa idealização, minimizamos o que poetas e que o país atravessava, houve quem visse no caminho de
escritores deixaram explícito ao longo dos séculos: que é um ferro a solução para tirar Portugal do seu atraso ancestral.
sentimento essencialmente desgraçado. Camões definiu-o Um atraso que se explicava, entre outras razões, pela
magistralmente nos seus versos: «Amor é um fogo que arde geografia montanhosa da maior parte do território, pelas
sem se ver / É ferida que dói e não se sente / É um arriscadas viagens marítimas que apenas permitiam ligação
contentamento descontente / É dor que desatina sem entre as principais urbes litorais e pelos perigosos e exíguos
doer». Trágica é também a história dos dois adolescentes acessos terrestres, que condenavam a maior parte das
Romeu e Julieta, que passaram a representar, desde que localidades portuguesas a um isolamento quase total. Por
Shakespeare retratou a sua fatal paixão, o arquétipo do tudo isto, e certamente por muitas outras razões que não
amor juvenil. Mais maduro e marcado pelo lirismo cabe aqui enumerar, foi sem grande espanto, embora com
romântico, mas igualmente infeliz, é o amor de Margarida muita curiosidade, que o povo de Lisboa assistiu, com
Gautier, a Dama das Camélias. pompa e circunstância, ao lançamento da primeira pedra do
primeiro troço ferroviário português. Em bom rigor, não terá
Oitava parte sido bem uma pedra, mas, segundo reza a história, uma
O que exalta o lirismo ocidental não é o prazer dos pazada de terra que foi lançada por D. Fernando, em 7 de
sentidos, nem a vida de casal, nem o respeito pelo outro, maio de 1853.
mas o amor como sofrimento.
Corria o ano de 1856 quando, na manhã soalheira de 28
Superinteressante, nº 170, junho de 2012
http://www.superinteressante.pt (texto adaptado,
de outubro, os lisboetas voltaram a ser chamados a Santa
consultado em 26.12.2015) Apolónia (que na altura ainda não se designava assim, sendo
o local conhecido como «Cais dos Soldados»), para a
cerimónia de abertura do caminho de ferro. Sob os auspícios
do rei D. Pedro V, fervoroso defensor da via férrea, realizou-
-se aquela que ficaria registada nos anais como a primeira almanaque das senhoras, em 1870; Elisa Curado dirige A
viagem de um comboio em terras lusitanas. Apesar de terem mulher, surgido em 1883; Beatriz Pinheiro funda e dirige A
sido percorridos apenas parcos quilómetros (trinta e sete, ave azul, em 1898.
mais precisamente) entre Lisboa e o Carregado, e das várias
vicissitudes acontecidas no passeio inaugural, aquele foi Na viragem do século, este grupo de mulheres dá lugar a
considerado um grande acontecimento nacional. Não era outro que, também na imprensa, se vai assumindo como
para menos. Afinal, estava dado o passo inicial para a vanguarda mobilizadora do movimento feminista da
aventura ferroviária portuguesa. primeira vaga que reivindica a igualdade de direitos
O comboio, sendo um meio de transporte muito mais jurídicos, económicos, civis e políticos entre os sexos. Se no
confortável e veloz do que a tração animal e o navio, trouxe início, a convergência de ideais unia mulheres conservadoras
maior mobilidade à circulação de pessoas e bens. Assim, e monárquicas, como Olga Morais Sarmento da Silveira e
desde cedo, foi elevado à condição de desígnio nacional, Domitila de Carvalho, às republicanas Ana de Castro Osório,
tendo começado a contrariar a geografia acidentada do Adelaide Cabete, Maria Veleda e Carolina Beatriz Ângelo,
território e levado a que no país se semeassem trilhos, entre outras, com a aproximação destas últimas ao partido
túneis, pontes, estações e apeadeiros. republicano, dá-se a cisão definitiva.

Nessa senda de desenvolvimento, em que o caminho de Nas primeiras décadas do século XX surgem assim as
ferro era o veículo privilegiado, até os lugarejos mais ermos associações femininas e feministas que agregam mulheres
da nação, onde nunca haviam chegado estradas de jeito, de todos os estratos sociais: escritoras, professoras,
passaram a ser visitados por carruagens apinhadas de gente médicas, advogadas, comerciantes, industriais, costureiras,
e mercadorias. Lugares recônditos, de cuja existência apenas domésticas... As mulheres republicanas fundam, em 1907, o
se sabia porque constavam dos mapas, passaram a estar «Grupo de Estudos Feministas», em 1909, «A Liga
unidos ao resto do mundo. Republicana das Mulheres Portuguesas», em 1911, a
«Associação de Propaganda Feminista», em 1914, o
Com o apito do comboio a fazer-se ouvir nos mais «Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas», em 1915, a
longínquos recantos da «pequena casa lusitana», Portugal «Associação Feminina de Propaganda Democrática» e, em
nunca mais voltaria a ser o mesmo. 1916, a «Cruzada das Mulheres Portuguesas».
Superinteressante, nº 160, agosto de 2011.
A aliança entre os dirigentes do partido republicano e as
http://www.superinteressante.pt/
(texto adaptado, consultado em 19.01.2015) mulheres republicanas foi reforçada com a iniciação de
muitas delas na maçonaria e a militância ativa na «Loja
Humanidade», agremiação feminina com igualdade de
TESTE DE COMPREENSÃO DO ORAL Nº 4 – Sequência 4 direitos e representação junto das hierarquias maçónicas.
Naquela época, maçonaria feminina, República e feminismo
Camilo Castelo Branco, Amor de perdição eram expressões do mesmo ideal e espaços de intervenção
na conquista da liberdade, da igualdade e do direito de
Exposição sobre um tema (p. 240) FAIXA 3 cidadania.
Natividade Monteiro, professora e investigadora e Faces
As origens da emancipação feminina de Eva-Cesnova e do CEMRI – Universidade Aberta,
in http://www.aph.pt/ex_assPropFeminina4.php
em Portugal
(consultado em 10.08.2015)
Embora lentamente, muitas mulheres instruídas viram
na escrita e no ensino uma forma de escaparem ao silêncio e
à invisibilidade que, desde há muito, a sociedade impunha TESTE DE COMPREENSÃO DO ORAL Nº 6 – Sequência 7
ao sexo feminino. Ao longo do século XIX, estas mulheres
fazem da imprensa periódica a sua tribuna, exprimindo Cesário Verde, Cânticos do Realismo
ideias, debatendo problemas e propondo soluções. É através (O Livro de Cesário Verde)
da escrita que se afirmam como seres independentes, que
se pretendem livres de qualquer tutela, e reclamam o lugar Exposição sobre um tema (p. 244) FAIXA 4
a que se julgam com direito.
Se na primeira metade do século muitas se escondem O Portugal de Cesário
sob o anonimato, na segunda metade assumem sem Em 1886, Portugal era um país predominantemente
preconceitos as suas identidades e aventuram-se na rural. Fora de Lisboa e do Porto, não havia verdadeiramente
fundação e direção de revistas e jornais e na propagação das cidades. A maior parte da população – oito em cada dez
ideias emancipadoras do direito à educação e ao exercício portugueses – vivia no campo, trabalhando uma terra pouco
de uma profissão, a fim de se tornarem economicamente fértil mal distribuída. A norte do Mondego predominava a
autónomas. Em 1849, surge A assembleia literária, o pequena propriedade, cultivada por camponeses e rendeiros
primeiro jornal fundado e dirigido por uma mulher, Antónia pobres; a sul, o latifúndio.
Gertrudes Pusich, consagrado à instrução do sexo feminino.
Ao contrário do que sucedia nalguns países europeus, a
Nos anos que se seguem, entre os periódicos femininos
maioria dos senhores residia nas cidades, administrando as
destinados a entreter a preguiça e a frivolidade, aparece
suas terras por intermédio de feitores; só um punhado de
outros apostados na defesa dos direitos das mulheres e na
proprietários rurais se interessava o suficiente pelas suas
mudança de mentalidades e comportamentos sociais.
explorações para aí tentar introduzir as inovações que sabia
Francisca Wood funda A voz feminina, em 1868, e O
estarem a ser utilizadas no estrangeiro. Mas, num país que
progresso, em 1869; Guiomar Torrezão toma a direção d'O
Transcrições

dispunha de uma mão de obra barata inesgotável, como O caráter fortemente voluntarista do herói [romântico]
Portugal, a mecanização raramente foi um êxito. Apesar de, projeta-se inevitavelmente na ação. E o herói é-o tanto mais
em 1843, na Granja Real de Mafra, terem sido exibidas quanto mais insubmisso for, portanto, quanto mais em luta,
várias máquinas agrícolas, quarenta anos mais tarde o seu em oposição se constituir.
número era extremamente reduzido. Dos três produtos
cultivados em grande escala, o trigo, a vinha e o arroz, só Não é difícil constatar este facto, por exemplo, n’ «A
com o primeiro era possível utilizá-las. Assim, a maioria dos morte do lidador», n’ «O castelo de Faria ou n’ «A abóbada».
trabalhos agrícolas continuou a ser feita por trabalhadores Nos três textos, de facto, os heróis afirmam-se pela sua
rurais, camponeses ou assalariados, com os métodos que os vontade, pela sua não submissão a regras, convencionais e
seus pais e avós usavam há séculos. até mesmo físicas, que condicionariam «toda a gente». O
Nas cidades, a Civilização penetrou mais facilmente. lidador e o alcaide do castelo de Faria afirmam a sua
Depois das tempestades da primeira metade do século, vontade para lá da própria morte, que ambos escolhem e
Portugal atravessou um período calmo, durante o qual um procuram; Afonso Domingues ergue-se contra a cegueira, a
grupo de políticos enérgicos se entregou à exaltante tarefa velhice e o «lugar sensato» a que a burocracia do Conselho
de modernizar o país. Durante alguns anos, a realidade do rei o queria limitar. Talvez por isso mesmo possamos
correspondeu às expectativas. A indústria desenvolveu-se: dizer que a questão se põe, em termos alternativos, como
Lisboa especializou-se na estamparia de tecidos e na submissão ou capacidade de transcendência em relação às
metalurgia; o Porto, na fiação e tecelagem de algodão. limitações impostas pelo exterior – interessa, pois, o modo
Apesar do esforço do Fontismo, no que diz respeito a vias de como a personagem se posiciona enquanto demonstração
comunicação, o mercado interno estava longe de se da sua capacidade de «ultrapassar» barreiras, e a
encontrar unificado. Em muitas aldeias, os camponeses possibilidade de se afirmar qualitativamente não submisso à
continuavam a comer o que produziam e a vestir o que o ordem social (Afonso Domingues não teme a ordem
artesanato local lhes fornecia, como sempre haviam feito. representada pelo rei), capaz justamente de representar a
criação de novos limites. Por outras palavras, o herói é
No litoral, as fábricas produziam alguns bens de condição de um progresso evolutivo. O indivíduo
consumo simples, tecidos, pás e enxadas, tabaco, papel e verdadeiramente digno deste nome é pois o que não se
rolhas. Apenas se exportavam conservas de peixe e de deixa submeter pela sociedade organizada, mas a cria e a
cortiça. transforma, ultrapassando os limites que ela lhe apresenta.
Entre 1850 e 1880, a indústria crescera vagarosamente, É então, por definição, um marginal, um proscrito.
mas crescera: em 1850, o total de cavalos-vapor existentes Não deixa de ter importância sublinhar, neste contexto,
era de 938; em 1880 subira para 7000. No têxtil, cortiças e a inevitabilidade da afirmação pública da ação individual;
tabacos existiam agora fábricas com mais de 500 operários. não há, não pode haver, com efeito, oposição de base entre
Infelizmente, Portugal estava suficientemente perto da o «ato pessoal» do herói e a incidência pública que ele,
Europa para que os progressos destes países afinal, acaba por representar – a sua vontade é uma vontade
ensombrecessem o que aqui se passava. Em 1881, um de grupo ou, melhor, a «vontade da nação». O seu ato é
membro da comissão do Inquérito Industrial que o Governo afinal sempre público, porque deriva de uma compreensão
mandou efetuar escrevia desencantadamente: «Levam-nos globalizante pela qual o indivíduo se torna, mais até do que
um grande avanço as nações industriais, tocaram quase a o representante, o símbolo do próprio sentimento e do
meta, quando nós principiámos ainda a caminhar», e próprio ser nacional. Por isso, Afonso Domingues «é» o
acrescentava «Esforços e energias de que valem, se os mosteiro, e o mosteiro «é» a vitória da identidade da nação.
passos que nós damos para diante são sempre fartamente Por isso, o lidador e o alcaide fundam nas suas mortes
compensados por outros mais largos e mais rápidos que eles (voluntárias e sacrificiais, como a de Afonso Domingues) as
dão no mesmo sentido?». raízes da sobrevivência nacional, contra o invasor, árabe ou
castelhano.
Na agricultura, as coisas não tinham corrido mal. O
Minho exportava quantidades razoáveis de vinho e de gado O herói herculaniano torna-se, por necessidade dos
para os ricos mercados europeus; o Sul, laranjas, maçãs, pressupostos que o constituem, o que (se) exibe enquanto
figos, azeite e amêndoas. Mas em meados de 1880, Portugal tal, e se afirma por meio dessa exibição – de onde a
começou a ter rivais temíveis nos mercados europeus. A fundamental incidência do estatuto público dos seus atos.
exportação de gado ressentiu-se imediatamente, sofrendo o E, afinal, que maior dimensão pública do que a
Minho uma severa recessão: nos «leilões dos estrangeiros», dimensão nacional, que é como quem diz, sob certos
o concorrente consegue vencer-nos «por uma cotação que aspetos, universal?
nos desvia». O modelo fontista entrava em crise.
Helena Carvalhão Buescu, (apresentação crítica, seleção, notas
Maria Filomena Mónica, in Revista Prelo, nº 12, 1986 e linhas de leitura) in Lendas e narrativas de Alexandre Herculano,
Lisboa, Editorial Comunicação, 1987, pp. 31-32
Alexandre Herculano, «A Abóbada»

Compreensão do oral

Exposição sobre um tema (p. 295)

O herói romântico

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