Você está na página 1de 16

FARMACOBOTÂNICA

Introdução à
fitoterapia: conceitos
e definições
Marcella Gabrielle Mendes Machado

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Definir os principais conceitos relacionados à fitoterapia.


>> Identificar as principais diferenças entre fitoterapia popular, tradicional e
científica ocidental.
>> Reconhecer passos importantes para uma fitoterapia baseada em evidências.

Introdução
A fitoterapia é caracterizada pela utilização de plantas medicinais em suas di-
ferentes formas farmacêuticas como recurso terapêutico. As plantas medicinais
são utilizadas pela população desde milhares de anos antes da civilização cristã.
Elas são uma fonte rica em metabólitos secundários como alcaloides, flavonoides
e taninos, que apresentam potencial relevância terapêutica.
No entanto, o uso inadequado de plantas medicinais frequentemente ocorre
por falta de conhecimento sólido em relação a dosagem, posologia, modo de
preparo, contraindicações e reações adversas. Com isso, a fitoterapia baseada em
evidências busca promover a avaliação crítica das plantas medicinais e fitoterápi-
cos como alternativas terapêuticas, maximizando seus benefícios e minimizando
as reações adversas.
Neste capítulo, você acompanhará o histórico do uso de plantas medicinais e
fitoterápicos e os fatores que têm despertado o interesse no uso da fitoterapia
2 Introdução à fitoterapia: conceitos e definições

pela população e pelos profissionais de saúde. Além disso, conhecerá alguns


exemplos de formulações fitoterápicas para o tratamento de alguns distúrbios
menores.

Histórico da fitoterapia
Desde os tempos mais remotos, os seres humanos utilizam plantas pelos
seus diversos efeitos medicinais. De acordo com Saad et al. (2018), os regis-
tros mais antigos que indicam a utilização de plantas para fins terapêuticos
remontam à Era Paleolítica. Registros mais sistematizados do uso de plantas
medicinais em regiões como Índia, China e Egito datam de milhares de anos
antes da civilização cristã. Nessas regiões, era muito comum a associação da
terapêutica com práticas espirituais, sendo que muitos sacerdotes atuavam
como médicos.
Há registros na Índia de cerca de 3000 a.C., em que canções de louvor às
plantas eram realizadas (SAAD et al., 2018). O Ayurveda, uma filosofia médica
oriental que surgiu na Índia durante o período de 2000–1000 a.C., utiliza as
plantas medicinais como ferramentas terapêuticas e propõe que, para se
alcançar a felicidade, a vida humana deve estar em harmonia com as leis da
natureza, sendo a saúde um estado de completude (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA
DE AYURVEDA, [2020?]).
Na China, o imperador Shen Nong, por volta de 2500 a.C., compilou as
bases da medicina chinesa em um livro denominado Pen Tsao, no qual foram
registradas 365 drogas, incluindo plantas medicinais como o chá-da-índia
(Thea sinensi, atualmente catalogada como Camellia sinensis) e a efedra
(Ephedra sinica). A medicina chinesa encontra-se inserida na visão de mundo
da filosofia taoísta e utiliza a fitoterapia como uma forma de tratamento e
prevenção de doenças (SAAD et al., 2018).
O Papiro de Ebers, que data de cerca de 1550 a.C., é um tratado médico do
Antigo Egito. Foi descoberto no século XIX e contém a descrição de procedi-
mentos médicos, bem como do uso de plantas medicinais. Nesse documento,
foram registradas cerca de 700 substâncias medicamentosas, sendo que
muitas delas ainda são utilizadas e descritas em farmacopeias ocidentais,
como o rícino (Ricinus communis), a hortelã (Mentha sp.), a papoula (Papaver
somniferum), a mirra (Commiphora molmol) e o alecrim (Rosmarinus officinalis)
(SAAD et al., 2018).
Na Grécia Antiga, as práticas curativas utilizavam métodos mágico-te-
rapêuticos acompanhados do uso de plantas medicinais, como os descritos
nas poesias de Homero. De acordo com Saad et al. (2018), há indícios de que
Introdução à fitoterapia: conceitos e definições 3

a medicina grega antiga teve influência da medicina egípcia, com algumas


plantas de origem da Índia e do Egito, e algumas receitas com características
semelhantes.
Pitágoras, por volta de 500 a.C., estudou como as drogas vegetais atuavam
no organismo, o que levou à formulação das bases da medicina humoral
e da dietética, as quais influenciaram Hipócrates, pai da medicina, alguns
anos mais tarde. Hipócrates desmistificou a associação de cura pelo uso das
plantas medicinais com forças sobrenaturais, e deu início à medicina racional-
-naturalista, descrevendo sinais, sintomas e a sazonalidade de doenças,
bem como a influência do emocional e condições de moradia na saúde dos
pacientes (SAAD et al., 2018).
Com a descoberta de novas regiões pelas grandes navegações no perí-
odo da Renascença, novas drogas vegetais, assim como especiarias, foram
adquiridas pela Europa, aumentando seu arsenal terapêutico. Os estudos
desenvolvidos pelo médico conhecido como Paracelso (1493–1541) levaram a
um novo entendimento a respeito das plantas medicinais. De acordo com Saad
et al. (2018, p. 3), Paracelso “[...] anunciou a noção de que a planta medicinal
encerra um componente terapeuticamente ativo, suscetível de ser extraído
por processo químico, e que o processo utilizado para isso era a destilação”.
Naquela época, a planta medicinal era utilizada na sua forma inteira ou em
partes (folhas e raízes), sendo essa forma ainda utilizada nos dias atuais nas
práticas populares.

A partir do desenvolvimento da química medicinal e da síntese do


ácido acetilsalicílico (Aspirina), princípio ativo que foi obtido a partir
da modificação estrutural do ácido salicílico isolado da casca do salgueiro (Salix
alba), as plantas medicinais passaram a ser utilizadas como matéria-prima para
a obtenção de fármacos semissintéticos e como protótipos para a síntese de
novas moléculas (SAAD et al., 2018).

Embora o uso de plantas medicinais tenha diminuído por um tempo frente


ao processo de industrialização e desenvolvimento de fármacos sintéticos,
seu uso pela população voltou a ganhar força nas últimas décadas. Muitos
fatores têm contribuído para o aumento da utilização das plantas medicinais
pela população, incluindo os efeitos adversos relacionados ao uso de medi-
camentos industrializados, o difícil acesso à assistência médica, o aumento
do consumo de produtos naturais em busca de uma vida mais saudável e a
tendência à prática da medicina integrativa (SÃO PAULO, 2019).
4 Introdução à fitoterapia: conceitos e definições

Atualmente, além de matéria-prima para fármacos semissintéticos, as


plantas medicinais são utilizadas in natura (como em chás de plantas me-
dicinais), em preparações galênicas simples (como em extratos fluidos e
tinturas) e em formulações farmacêuticas com maior valor agregado, como
os fitoterápicos (SIMÕES et al., 2017).
A planta medicinal in natura consiste na planta fresca, coletada no mo-
mento do uso, enquanto a planta medicinal seca (ou suas partes) passa pelos
processos de coleta, estabilização (quando aplicável) e secagem, podendo
ser disponibilizada na forma íntegra, rasurada, triturada ou pulverizada.
Ademais, as formulações de fitoterápicos podem ser encontradas em
forma de monodroga ou com composição com mais de uma droga vegetal,
ambas comercializadas em diversas formas farmacêuticas (comprimidos,
envelopes, sachês, xaropes, tinturas e extratos fluidos). O fitoterápico ma-
nipulado é produzido pela farmácia de manipulação, enquanto o fitoterápico
industrializado é produzido pela indústria farmacêutica ou pelo laboratório
oficial (SAAD et al., 2018).

Fitoterápicos
A cartilha Plantas medicinais e fitoterápicos (SÃO PAULO, 2019, documento
on-line) define a fitoterapia como “[...] a terapêutica caracterizada pelo uso de
plantas medicinais em suas diferentes formas farmacêuticas, sem a utilização
de substâncias ativas isoladas, ainda que de origem vegetal”.
Uma planta medicinal pode ser definida como a espécie vegetal, cultivada
ou não, utilizada com fins terapêuticos e/ou profiláticos, enquanto fitoterápico
é definido pela Anvisa (BRASIL, 2021, p. 11), como

[...] o produto obtido exclusivamente de matéria-prima ativa vegetal (compreende


a planta medicinal, ou a droga vegetal ou o derivado vegetal), exceto substâncias
isoladas, com finalidade profilática, curativa ou paliativa. Podendo ser simples,
quando o ativo é proveniente de uma única espécie vegetal medicinal, ou com-
posto, quando o ativo é proveniente de mais de uma espécie vegetal medicinal.

Embora as plantas medicinais venham sendo utilizadas desde a Antigui-


dade, o uso oficial de fitoterápicos só foi reconhecido mundialmente pela
Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1978, por meio da Declaração de
Alma-Ata. No Brasil, o Ministério da Saúde passou a incentivar como prio-
ridade o estudo das plantas medicinais para aplicação clínica por meio da
Portaria nº 212/1981. Em 2006, a fitoterapia foi inserida no Sistema Único
Introdução à fitoterapia: conceitos e definições 5

de Saúde (SUS), sendo que a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fi-


toterápicos foi regulamentada pelo Decreto nº 5.813, de 22 de junho de
2006 (BRASIL, 2021). Atualmente, são ofertados pelo SUS 12 medicamentos
fitoterápicos, listados no Quadro 1.

Quadro 1. Medicamentos fitoterápicos ofertados pelo SUS

Denominação genérica Apresentação Indicação/ação

Alcachofra (Cynara Cápsula, Tratamento dos sintomas de


scolymus L.) comprimido, dispepsia funcional (síndrome
solução oral, do desconforto pós-prandial)
tintura e de hipercolesterolemia leve
a moderada. Apresenta ação
colagoga e colerética.

Aroeira (Schinus Gel e/ou óvulo Apresenta ação cicatrizante,


terebinthifolius Raddi) vaginal anti-inflamatória e antisséptica
tópica, para uso ginecológico.

Babosa [Aloe vera (L.) Creme, gel Tratamento tópico de


Burm. f.] queimaduras de 1º e 2º graus e
como coadjuvante nos casos de
psoríase vulgaris.

Cáscara-sagrada Cápsula, tintura Coadjuvante nos casos de


(Rhamnus purshiana DC.) obstipação intestinal eventual.

Espinheira-santa Cápsula, emulsão, Coadjuvante no tratamento de


(Maytenus officinalis suspensão oral, gastrite e úlcera gastroduodenal
Mabb.) tintura e sintomas de dispepsia.

Garra-do-diabo Cápsula, Tratamento da dor lombar baixa


(Harpagophytum comprimido, aguda e como coadjuvante nos
procumbens DC. ex comprimido casos de osteoartrite. Apresenta
Meissn.) de liberação ação anti-inflamatória.
retardada

Guaco (Mikania Solução oral, Apresenta ação expectorante e


glomerata Spreng.) tintura, xarope broncodilatadora.

Hortelã (Mentha x Cápsula Tratamento da síndrome do


piperita L.) cólon irritável. Apresenta
ação antiflatulenta e
antiespasmódica.

Isoflavona-de-soja Cápsula, Coadjuvante no alívio dos


[Glycine max (L.) Merr.] comprimido sintomas do climatério.

(Continua)
6 Introdução à fitoterapia: conceitos e definições

(Continuação)

Denominação genérica Apresentação Indicação/ação

Plantago (Plantago ovata Pó para dispersão Coadjuvante nos casos de


Forssk.) oral obstipação intestinal habitual.
Tratamento da síndrome do
cólon irritável.

Salgueiro (Salix alba L.) Comprimido, Tratamento de dor lombar


elixir, solução oral baixa aguda. Apresenta ação
anti-inflamatória.

Unha-de-gato (Uncaria Cápsula, Coadjuvante nos casos


tomentosa — Willd. ex comprimido, gel de artrites e osteoartrite.
Roem. & Schult. — DC.) Apresenta ação anti-inflamatória
e imunomoduladora.

Fonte: Adaptado de Brasil (2020).

A indústria de fitoterápicos está em constante desenvolvimento em todo o


mundo, e é crescente o interesse em pesquisas com plantas medicinais a fim
de comprovar sua eficácia e confirmar as indicações terapêuticas relacionadas
ao seu uso. Na prática médica, são bem-vistos os medicamentos fitoterápicos
e plantas medicinais que passam por testes farmacológicos, toxicológicos, pré-
-clínicos e clínicos, representando uma alternativa ao uso de medicamentos
sintéticos, por sua vez relacionados a um maior número de efeitos adversos. O
crescimento da indústria de plantas medicinais e fitoterápicos no Brasil ainda
é impulsionado pela grande biodiversidade nacional e pelo conhecimento
tanto popular quanto científico a respeito dessas plantas (SAAD et al., 2018).

A produção de medicamentos fitoterápicos no Brasil tem apresentado


um crescimento exponencial de cerca de 10% ao ano em valores. Em
2018, o mercado de fitoterápicos faturou R$ 2,3 bilhões, o que representa 2,2%
do mercado farmacêutico total (RIBEIRO, 2016).

Fitocomplexo
De acordo com a Anvisa (BRASIL, 2021, documento on-line), fitocomplexo é o
“[...] conjunto de todas as substâncias, originadas do metabolismo primário
e/ou secundário, responsáveis, em conjunto, pelos efeitos biológicos de
Introdução à fitoterapia: conceitos e definições 7

uma planta medicinal ou de suas preparações”. O metabolismo primário de


plantas origina proteínas, aminoácidos, carboidratos, vitaminas e clorofila.
Já o metabolismo secundário origina substâncias que não apresentam dis-
tribuição universal dentre as espécies vegetais, mas que são essenciais para
sua adaptação e para sua defesa contra o ataque de patógenos e demais
agentes. Esses metabólitos costumam apresentar potencial relevância
terapêutica.
As plantas medicinais são uma fonte rica em metabólitos secundários.
De maneira geral, essas substâncias podem ser classificadas em grupos
químicos, embora apresentem muitas vezes uma grande variabilidade química
estrutural. No Quadro 2, é possível ver os principais grupos fitoquímicos e
suas respectivas características biológicas e/ou químicas.

Quadro 2. Relação dos principais grupos fitoquímicos com suas caracterís-


ticas biológicas e/ou químicas

Definição / Propriedades /
Classe características características

Alcaloides Aminas básicas Importantes fármacos


(morfina, atropina,
vincristina) — mais de 12 mil
substâncias conhecidas e
mais de 13 classes

Flavonoides Pigmentos dos vegetais Anti-inflamatórios,


(flores, frutos) antioxidantes

Glicosídeos Presença de açúcar Mais de 10 classes e mais de


3 mil substâncias conhecidas

Saponinas Glicosídeos com Vários grupos químicos —


característica de sabão alguns estão envolvidos no
metabolismo dos esteroides

Taninos Polifenólicos, a maioria Substâncias adstringentes


precursora do ácido que atuam como
gálico antidiarreicos, hemostáticos
e cicatrizantes

Terpenoides Derivados de unidades de Mais de 20 mil substâncias


5 carbonos de isoprenos conhecidas; seis classes
(10, 15, 20, 30, 40, > 40) e estruturalmente
heterogêneos

Fonte: Adaptado de Saad et al. (2018).


8 Introdução à fitoterapia: conceitos e definições

A partir de plantas medicinais, também podem ser obtidos os óleos es-


senciais, que consistem em misturas complexas de substâncias voláteis e
lipofílicas, responsáveis, por exemplo, pelas fragrâncias e aromas. De acordo
com Saad et al. (2018, p. 29):

[...] os grupamentos funcionais mais encontrados nos óleos essenciais são hidro-
carbonetos, alcoóis, aldeídos, cetonas, fenóis, óxidos, éteres e ésteres. Assim,
os óleos essenciais são misturas bastante complexas, de várias substâncias
simples, em que cada componente contribui para o efeito biológico da mistura
como um todo.

Dentre as diversas propriedades biológicas dos óleos essenciais, podemos


destacar as atividades antimicrobiana (como em óleos de cravo-da-índia
[Syzygium aromaticum], eucalipto [Eucalyptus globulus Labill.] e alecrim [Ros-
marinus officinalis]), antiexpectorante (como em óleos obtidos das folhas de
eucalipto e folhas de hortelã-pimenta [Mentha x piperita L.]) e estomáquica,
carminativa e colagoga (como em óleo da casca da laranja-amarga [Citrus
aurantium L.]) (SIMÕES et al., 2017).

Fitoterapia baseada em evidências


A fitoterapia representa um importante recurso terapêutico em todo o mundo,
sendo incentivada por órgãos federais e inserida no SUS por meio da Política
Nacional de Práticas Integrativas. As plantas medicinais e medicamentos
fitoterápicos constituem uma alternativa ao uso de medicamentos sintéticos
em uma população cada vez mais preocupada com a saúde e bem-estar.
Contudo, é importante conhecer bem as dosagens, os modos de utilização,
contraindicações e reações adversas das plantas medicinais, a fim de garantir
a saúde do paciente e alcançar o benefício terapêutico dessas plantas.
Grande parte da população que faz uso de plantas medicinais desconhece
seus possíveis efeitos tóxicos, assim como a forma correta de preparo e as
indicações e contraindicações de cada planta. Por serem produtos de origem
natural, há uma crença de que as plantas medicinais e fitoterápicos não
podem causar prejuízo algum à saúde do usuário, crença esta que não tem
embasamento científico (BRUNING et al., 2012).
A fitoterapia baseada em evidências busca promover a avaliação crítica
de plantas medicinais e fitoterápicos como alternativas terapêuticas, ma-
ximizando seus benefícios e minimizando as reações adversas. Além disso,
Introdução à fitoterapia: conceitos e definições 9

busca conduzir o estudo sobre a eficácia, segurança e qualidade dessas


formulações. De acordo com Alexandre (2004), muitas vezes a experiência
popular, o folclore e estudos não científicos são mais valorizados do que os
ensaios pré-clínicos e clínicos das formulações, os quais fornecem dados
sobre indicações, doses, qualidade, eficácia e segurança das plantas me-
dicinais e dos fitoterápicos. Com isso, a fitoterapia baseada em evidências
detecta os melhores resultados disponíveis, sistematizando o acesso a essas
informações e analisando-as quanto às aplicações em ações de saúde e nos
cuidados ao paciente.
Os profissionais de saúde têm apresentado interesse crescente nessa
área, buscando capacitação e conhecimento, com o objetivo de realizar uma
adequada prescrição e uso de plantas medicinais e fitoterápicos em seus
atendimentos. Por outro lado, muitos profissionais de saúde não reconhe-
cem o valor da fitoterapia, em parte por não receberem a formação sobre o
assunto durante a graduação. Com isso, faz-se necessário a atualização dos
profissionais de saúde frente à fitoterapia, a fim de fornecer informações
seguras aos usuários e promover o uso racional de plantas medicinais e
fitoterápicos (BRUNING et al., 2012).
Em resposta às demandas de prescrição e dispensação de plantas me-
dicinais, drogas vegetais e fitoterápicos, em 2011 foi publicado pela Anvisa
a primeira edição do Formulário de Fitoterápicos da Farmacopeia Brasileira.
As formulações relacionadas nesse formulário podem ser manipuladas pelos
estabelecimentos autorizados para essa atividade, seguindo a legislação
vigente, e servem de referência para o sistema de notificação da Anvisa. Em
2021 foi publicada a segunda edição do documento, em que foram revisadas
as monografias da primeira edição e incluídas novas monografias. Nesta
mais recente edição, são apresentadas 85 monografias, com um total de 236
formulações (BRASIL, 2021).
Grande parte dos fitoterápicos industrializados são isentos de prescrição
médica. Para a dispensação de produtos que exijam prescrição médica,
exige-se a especialização na área clínica, comprovando-se conhecimentos
técnico-científicos e habilidades para uma adequada prescrição. Alguns fito-
terápicos vendidos sob prescrição médica incluem ginkgo (Ginkgo biloba L.),
hipérico (Hypericum perforatum L.), kava-kava (Piper methysticum G. Forst.)
e valeriana (Valeriana officinalis L).
No Quadro 3, são descritas algumas sugestões de formulações fitoterápi-
cas para o tratamento de distúrbios menores, como a gripe e a estagnação.
10 Introdução à fitoterapia: conceitos e definições

Quadro 3. Formulações fitoterápicas para o tratamento de distúrbios


menores

Condição Principais sinais/ Plantas indicadas Sugestão de


clínica indicações para o tratamento formulação

Gripe „„ Febre alta „„ Citrus aurantium Xarope:


„„ Sudorese (laranja-da-terra) „„ Tintura de poejo 5%
„„ Cefaleia „„ Echinacea „„ Tintura de laranja-
„„ Dor de garganta purpurea da-terra 5%
„„ Tosse (equinácea) „„ Tintura de guaco 5%
„„ Secreção „„ Mentha pulegium „„ Tintura de própolis
amarelada (poejo) 2%
„„ Sede „„ Extrato de „„ Mel q.s.p. 100 mL
„„ Mialgia própolis Modo de usar: tomar 10
„„ Língua com a mL 3 a 6 vezes/dia.
saburra amarelada

Palpitações „„ Palpitações „„ Crataegus Uso oral:


e arritmias e arritmias oxyacantha „„ Crataegus
ocasionais. Obs.: (crataego) oxyacantha (fruto)
situações agudas „„ Valeriana (extrato seco) 300
com taquicardia officinalis mg (por dose)
ou bradicardia (valeriana) „„ Valeriana officinalis
intensas „„ Chamomila (raiz) (extrato seco)
acompanhadas recutita 50 mg (por dose)
de vertigem e (camomila) „„ Preparar cápsulas
dispneia merecem para 30 dias.
investigação Modo de usar: tomar 1
cardiológica dose 3 vezes/dia.
imediata

Varizes „„ Sensação de „„ Aesculus Uso oral:


desconforto e hippocastanum „„ Aesculus
edema (castanha-da- hippocastanum
índia) (fruto)
„„ Centella asiatica „„ (extrato seco 5:1) 200
(centela) mg (por cápsula)
„„ Melilotus „„ Centella asiatica
officinalis (erva)
(meliloto) „„ (extrato seco 5:1) 33
„„ Hamamelis mg (por cápsula)
virginiana Preparar 60 cápsulas.
(hamamélis) Modo de usar: tomar 1
„„ Vitis vinifera cápsula 2 vezes/dia.
(uva)

(Continua)
Introdução à fitoterapia: conceitos e definições 11

(Continuação)

Condição Principais sinais/ Plantas indicadas Sugestão de


clínica indicações para o tratamento formulação

Hemorroidas „„ Dor e desconforto „„ Aesculus Uso tópico:


hippocastanum „„ Aesculus
(castanha-da- hippocastanum
índia) (tint.) 3,3%
„„ Aloe sp. (babosa) „„ Paeonia alba (tint.)
„„ Hamamelis 3,3%
virginiana „„ Hamamelis
(hamamélis) virginiana (tint.)
„„ Paeonia alba 3,3%
(peônia-branca) Base pomada q.s.p. 30 g
Modo de usar: usar
4 vezes/dia até a
melhora dos sintomas.

Dores „„ Dor „„ Arnica montana Uso tópico:


agudas e „„ Edema (arnica) „„ Cordia verbenacea
pós-trauma „„ Vermelhidão „„ Cordia (folhas) 10%
„„ Hematoma verbenacea „„ Arnica montana
„„ Pulso e língua sem (erva-baleeira) (flores) 10%
alterações „„ Harpagophytum Base creme ou gel
procumbens q.s.p. 30 g
(garra-do-diabo) Modo de usar: aplicar
3 vezes/dia no local
afetado.

Dispepsia „„ Náuseas e vômitos „„ Baccharis trimera Citrus reticulata (casca


funcional „„ Eructação (carqueja) do fruto) (pó) 500 mg
(estagnação) „„ Distensão „„ Cinnamomum (por dose)
„„ Má digestão zeylanicum Preparar 60 doses.
„„ Língua com saburra (canela) Modo de usar: tomar
acentuada „„ Citrus aurantium uma dose após o
(laranja-da-terra) almoço e o jantar por
„„ Citrus reticulata 30 dias.
(tangerina)
„„ Cynara scolymus
(alcachofra)
„„ Foeniculum
vulgare (funcho)
„„ Mentha x piperita
(alevante)
„„ Peumus boldus
(boldo-do-chile)
„„ Plectranthus
barbatus (boldo
brasileiro)

Fonte: Adaptado de Saad et al. (2018.)


12 Introdução à fitoterapia: conceitos e definições

A partir do conteúdo abordado, foi possível conhecer o histórico da


fitoterapia, passando pelas antigas civilizações da Índia, China e Egito até
os dias atuais, bem como alguns conceitos que devem ser distinguidos,
como planta medicinal, fitoterápico e fitocomplexo. Como a fitoterapia
representa um recurso terapêutico importante, foram apresentados os
principais metabólitos secundários presentes nas plantas medicinais e
suas propriedades biológicas. Por fim, para nortear o profissional ao propor
terapias com plantas medicinais, alguns exemplos de formulações fitote-
rápicas foram apresentados.

Referências
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE AYURVEDA. Ayurveda ou medicina ayurvedica. [S. l.]: ABRA,
[2020?]. Disponível em: https://ayurveda.org.br/a-abra/o-que-e-ayurveda/. Acesso
em: 1 abr. 2021.
ALEXANDRE, R. F. Fitoterapia baseada em evidências: exemplos dos medicamentos fito-
terápicos mais vendidos em Santa Catarina. 2004. Dissertação (Mestrado em Farmácia)
— Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências da Saúde, Florianópolis,
2004. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/86886. Acesso
em: 1 abr. 2021.
BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Formulário de Fitoterápicos da Far-
macopeia Brasileira. 2. ed. Brasília: ANVISA, 2021.
BRASIL. Relação Nacional de Medicamentos Essenciais: Rename 2020. Brasília: Mi-
nistério da Saúde, 2020. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/
relacao_medicamentos_rename_2020.pdf. Acesso em: 1 abr. 2021.
BRUNING, M. C. R. et al. A utilização da fitoterapia e de plantas medicinais em
unidades básicas de saúde nos municípios de Cascavel e Foz do Iguaçu-Paraná: a
visão dos profissionais de saúde. Ciência & Saúde Coletiva, v. 17, n. 10, p. 2675–2685,
2012. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012001000017. Acesso
em: 1 abr. 2021.
RIBEIRO, W. Prefeitura de São Paulo distribui mais de 6,7 milhões de medicamentos
fitoterápicos. Anápolis: ICTQ, 2016. Disponível em: https://www.ictq.com.br/politica-
-farmaceutica/1128-prefeitura-de-sao-paulo-distribui-mais-de-6-7-milhoes-de-
-medicamentos-fitoterapicos. Acesso em: 1 abr. 2021.
SAAD, G. A. et al. Fitoterapia contemporânea: tradição e ciência na prática clínica. 2.
ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018.
SÃO PAULO. Conselho Regional de Farmácia. Plantas medicinais e fitoterápicos. 4. ed.
São Paulo: CRFSP, 2019. Disponível em: http://crfsp.org.br/images/cartilhas/Plantas-
Medicinais.pdf. Acesso em: 1 abr. 2021.
SIMÕES, C. M. O. et al. Farmacognosia: do produto natural ao medicamento. Porto
Alegre: Artmed, 2017.
Introdução à fitoterapia: conceitos e definições 13

Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos


testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da
publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas
páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores
declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou
integralidade das informações referidas em tais links.

Você também pode gostar