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caso de inúmeras utilidades domésticas. A produção de alimentos, inclusive cultivo de
cereais e criação de gado, assim como o preparo desses produtos para consumo
doméstico constituía atividade diária da família rural, e em grande grau o mesmo
acontecia com a produção domiciliar de roupas. O agricultor, sua mulher e filhos
dividiam entre si tarefas tais como as de fazer vassouras, colchões, sabão, carpintaria
e pequenos trabalhos em metal, curtumaria, fermentação e destilação, manufatura de
arreios, desnatação e fabricação de queijos, prensamento e fervura de suco para
melaços, corte de moirões e ripas para cercas, panificação, compotas e às vezes até
mesmo fiação e tecelagem. Muitas dessas atividades rurais continuaram como o
modo natural de vida da família, mesmo após os inícios da urbanização e
transferência do emprego da fazenda para a fábrica ou demais locais de trabalho. O
trecho seguinte descreve a vida dos trabalhadores na virada do século, mencionando
o grau de transformação que ocorreu nos últimos setenta a oitenta anos:
"Exceto nos distritos residenciais populosos das grandes cidades que abrigavam uma
pequena parcela da população urbana total -os habitantes da aldeia e da cidade
freqüentemente produziam parte de sua alimentação. Sobretudo nas regiões do
carvão e do aço, os terrenos em volta das casas urbanas e suburbanas pareciam às
vezes muito mais uma propriedade rural. Muitas famílias criavam galinhas ou coelhos,
outras vezes porcos ou cabritos, e até uma ou duas vacas, e cultivavam legumes e
frutos em suas hortas. Um estudo de 2.500 famílias residentes nas principais regiões
do carvão, ferro e aço, realizado em 189 O, indica que cerca de metade delas criava
gado, galinhas, tinha hortas ou todas essas coisas. Aproximadamente 30 por cento
não compravam legumes de espécie alguma a não ser batatas durante todo o ano. Ao
descrever a região do carvão de antracito da Pensilvânia em 1904, Peter Roberts
escreveu que 'é interessante percorrer os vales de Schuylkill e Tremont e ver as
muitas granjas que são cultivadas por empregados das minas da Companhia de
Carvão e Ferro de Filadélfia e Reading. Na greve de 1902, centenas de famílias de
mineiros não poderiam continuar na luta se não fossem as pequenas fazendas e
grandes hortas que eles cultivavam'.
A maior parte dos alimentos comprados vinha à casa urbana em seu estado natural,
em bruto, sem latas nem embrulho. Talvez a maioria das mulheres enfrentasse a
cansativa luta anual de conservar, fazer compotas, enlatar e fazer geléias, e a maior
parte da panificação era feita na cozinha da casa. Dentre 7 000 famílias da classe
trabalhadora estudadas pelo Departamento do Trabalho, entre 1889 e 1892, menos
de metade comprava qualquer tipo de pão, e quase todas compravam enormes
quantidades de farinha, em média 450 quílos por família anualmente. Mesmo entre as
famílias dos artífices qualificados, que ganhavam mais que os outros trabalhadores,
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um quarto delas não comprava pão, e o consumo de farinha era em média de um
quilo por família diariamente.
Nenhuma casa respeitável em 1890 deixava de ter sua surrada máquina de costura
-um dos primeiros artigos amplamente vendidos pelo plano de prestações. A maioria
das roupas masculinas era comprada, mas a' maior parte das roupas femininas e de
crianças era ainda feita em casa. Além disso, havia cortinas e lençóis a serem
remendados, chapéus, blusas e meias a serem tricotadas e cerzidas. Era normal que
toda futura mamãe tricotasse e costurasse um enxoval completo para o seu primeiro
filho, e o completasse depois quando necessário,"2
A maneira pela qual essa transição foi efetuada inclui uma ‘multidão de fatores inter-
relacionados, nenhum das quais pode ser destacada dos demais. Em primeiro lugar, o
condicionamento urbano mais apertado destrói as condições sob as quais é possível
levar a vida antiga. O anel urbano fecha-se em torna do trabalhador, e em torno do
agricultor expulso da terra, e as confina nas circunstâncias que impedem as antigas
práticas de auto-abastecimento dos lares. Ao mesmo tempo, a renda proporcionada
pelo trabalho torna disponível a dinheiro necessário para adquirir os meios de
subsistência fabricados pela indústria, e assim, exceto em períodos de desemprego, a
coação da necessidade que compelia a trabalhos domésticos é muito enfraquecida.
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Freqüentemente, o trabalho domiciliar torna-se anti-econômico em comparação com
o trabalho assalariado pelo barateamento dos artigos manufaturados, e isto,
juntamente com todas as demais pressões sobre a família da classe trabalhadora,
contribui para impelir a mulher da lar para a indústria. Mas muitos outros fatores
contribuem: a pressão do costume social sobretudo sobre a geração mais jovem
alternadamente pelo estilo, moda, publicidade e processos educacionais (tudo isto
que transforma o "feito em casa" em menosprezo com o "fabricado" ou "comprado
fora" em vanglória); a deterioração das especialidades (junto com a disponibilidade
de materiais); e a poderosa necessidade de cada membro da família de uma renda
independente, que é um dos sentimentos mais fortes instiladas pela transformação da
sociedade em um gigantesco mercado de trabalho e artigos, uma vez que a fonte de
status já não mais é a capacidade de fazer coisas mas simplesmente a capacidade de
comprá-las.
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surgem para preencher a lacuna resultante; e à medida que novos serviços e
mercadorias proporcionam sucedâneos para relações humanas sob a forma de
relações de mercado, a vida social e familiar são ainda mais debilitadas. Trata-se pois
de um processo que implica alterações econômicas e sociais de um lado, e profundas
mudanças nos padrões psicológicos e afetivos de outro.
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* Um anúncio no New York Times de 20 de fevereiro de 1973 fala de urna competição
para destruição de carros, assistida por quase 24 000 pessoas: "Em meio a um monte
de automóveis destroçados, um Cadillac Eldorado trazendo a inscrição: 'Veja Parnelli
Jones destruir este carro'; um Rolls Royce Silver Shadow. um Lincoln Continental
Mark IV e outros carros de último tipo no valor de cerca de 50.000 dólares foram
destruidos batendo-se uns contra os outros ontem nesse lugar. Considerada a
'competição de destruição mais rica do mundo', terminou num claudicante e baboso
confronto entre um Ford LTD e um Mercury destruidos ...
. 'Imagino isto como o fim do Império Romano', disse George Daines, quando
comprava ingressos (oito dólares para adultos e 4 para menores) para ele e seu filho.
'Gostaria de'estar aqui para presenciar o fim do império americano'. "
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efetuada em grande parte por mulheres que,de acordo com os preceitos da divisão do
'trabalho, executam uma das funções que antigamente executavam em casa, mas
agora a serviço do capital que lucra com o seu trabalho diário. Na fase do capitalismo
monopolista, o primeiro passo na criação do mercado universal é a conquista de toda
a produção de bens sob forma de mercadoria; o segundo passo é a conquista de uma
gama crescente de serviços e sua conversão em mercadorias; e o terceiro é um
"ciclo"de produtos, que inventa novos produtos e serviços, alguns dos quais tornam-
se indispensáveis à medida que as condições da vida moderna mudam para destruir
alternativas. Desse modo o habitante da sociedade capitalista é enlaçado na teia
trançada de bens-mercadoria e serviços-mercadoria da qual há pouca possibilidade de
escapar mediante parcial ou total abstenção da vida social tal como existe. Isto é
reforçado de outro lado por um desenvolvimento que é análogo ao que continua na
vida do trabalhador: a atrofia da competência. No fim, a população acha-se quer
queira quer não, na situação de incapacidade de fazer qualquer coisa que facilmente
não possa ser feito mediante salário no mercado, por um dos múltiplos ramos novos
do trabalho social. E enquanto do ponto de vista do consumo isso signifique total
dependência quanto ao mercado, do ponto de vista do trabalho significa que todo o
trabalho é efetuado sob a égide do capital e é suscetível de seu tributo de lucro para
expandir o capital ainda mais. O mercado universal é amplamente celebrado como
uma generosa "economia de serviço", e louvado por sua "conveniência",
"oportunidades culturais", "instituições modernas para cuidar dos excepcionais" etc.
Não precisamos ressaltar o quanto loucamente age a civilização urbana e quanta
desgraça ela abrange. Para os fins de nossa análise, é o outro lado do mercado
universal, seus aspectos desumanizadores, seu confinamento de amplo segmento da
população ao trabalho degradado, o que interessa principalmente.
Assim como na fábrica, não é nas máquinas que está o erro, mas nas condições do
modo capitalista de produção sob as quais elas são utilizadas; do mesmo modo, não é
na existência dos serviços que está o erro, mas nos efeitos de um mercado todo-
poderoso que, dominado pelo capital e seu investimento lucrativo, tanto é caótico
quanto profundamente hostil aos sentimentos de comunidade. Assim os próprios
serviços sociais que deveriam facilitar a vida social e a solidariedade social têm o
efeito contrário. À medida que os avanços da indústria de utilidades domésticas e de
serviços aliviam o trabalho da família, aumentam a futilidade da vida familiar; à
medida que removem os fardos das relações pessoais, esvazia-as de sentimentos; à
medida que criam uma intrincada vida social, despem-na dos vestígios da
comunidade e deixam em seu lugar um vínculo monetário.
É característico da maioria das funções criadas nesse "setor de serviços" que, pela
natureza dos processos de trabalho que elas incorporam, são menos suscetíveis de
mudança tecnológica do que os processos da maioria das indústrias produtoras de
bens. Assim, enquanto o trabalho tende a estagnar ou encolher no setor fabril, ele
aumenta nos serviços e encontra uma renovação das formas tradicionais de
concorrência anterior ao monopólio entre as muitas firmas que proliferam em campos
que exigem pequeno capital inicial. Essas indústrias, recorrendo a força de trabalho
amplamente não sindicalizada e retirada da reserva de pauperizados da parte inferior
da sociedade, criam novos setores de baixa remuneração, e essas pessoas são mais
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intensamente exploradas e oprimidas do que as empregadas nos setores mecanizados
da produção.