Você está na página 1de 3

ALUNO (A):

TURMA: Terceiros Anos BIMESTRE: DATA: ___ / ___ /___________

DISCIPLINA: Língua Portuguesa e Literatura III PROFESSOR Davi Tintino

ESTUDO DO TEXTO DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVO


(INTRODUÇÃO)

(Material adaptado)

Orientação: Ao tentar responder às questões que seguem após a crônica em estudo, procure desenvolver textos
explicativos em forma de parágrafo, retomando algum ponto do comando da questão para estabelecer coesão e
coerência acerca do proposto para cada uma delas.

Crônica “No tempo do livro”, de João Ubaldo Ribeiro

Ah, nem conto a vocês como era, fico com medo de acharem que estou mentindo. Mas sei que não estou,
quando lembro o dia começando a se esgueirar por entre as frestas dos grandes janelões do casarão térreo em que
morávamos, e eu, menino de oito ou nove anos, pulando afobado da cama, para mais uma vez me embarafustar
pelo meio dos livros. Quase febril, ansioso como se o mundo fosse acabar daí a pouco, eu nem sabia com quem ia
me encontrar e aonde viajaria, em nova manhã encantada. Não havia problemas para eu me embolar com os livros,
porque eles não só estavam junto à minha cama, mas espalhados da cozinha ao banheiro, em estantes para mim al-
tas como torres, algumas das quais tão pejadas que volta e meia estouravam, viravam cachoeiras de papel e vinham
abaixo, dando a impressão de que as paredes e o chão se dissolviam em livros.
Problema havia na escolha, porque nenhum deles era proibido por meu pai, a não ser, como muito depois
ele me contou, os que ele queria que eu lesse, me escondendo sem saber que tinha caído num ardil. Podia ser mais
um volume da coleção de Tarzan que eu já tinha lido praticamente toda e não acabava nunca, porque repetia os fa-
voritos. Não, talvez o Dom Quixote, em dois tomos imponentes que eu mal conseguia sopesar e cheio de palavras
portentosas que eu não compreendia e não ousava me esclarecer com o velho, porque já conhecia a resposta.
— Dicionário, jumento bípede - respondia ele. - E copie o verbete para me mostrar depois.
— O que é verbete?
— Dicionário, miolo ralo. E copie esse também.
As gravuras de Gustave Doré que ilustravam as desditas do engenhoso fidalgo, em imagens cheias de
sombras e figuras desconhecidas, me metiam medo, mas eram irresistíveis e, mesmo sem entender direito o que
aquele livro tremendo me contava, eu sempre voltava a ele e muitas vezes me pilhei devaneando em meio a um
descampado e diante de cata-ventos, na companhia de um magrelo em seu cavalo ainda mais magro e de um gordo
em seu burrico. Mas eu podia preferir ingressar na Legião Estrangeira, relendo Beau Geste ou Beau Sabreur, que
me deixavam com sonhos de me alistar assim que completasse vinte anos, para ir viver entre os lendários tuare-
gues e conquistar o amor da mais linda princesa do deserto.
Ou podia ir para o Sítio do Pica-pau Amarelo. Quando Monteiro Lobato, ainda hoje, para mim, um dos
maiores escritores de todos os tempos, em qualquer lugar, morreu e seu enterro foi mostrado pela revista O Cruzei-
ro, demorei muito para acreditar. O sítio continuou a existir, do mesmo jeito que o pó de pirlimpimpim, a viagem
ao céu, o saci-pererê e toda a mágica que o grande Lobato criou. Tanto assim que peguei um caderno e comecei a
escrever novas aventuras de Narizinho, Emília e Pedrinho, até que meu pai olhou minha produção, disse que estava
mal escrita, me chamou de plagiário e me mandou ver no dicionário o que isso queria dizer. Desisti da empreitada,
mas persisti em escrever, para desgosto do velho, que até morrer lamentou que eu não fosse tabelião, como ele com
toda a razão queria.
Os outros meninos do bairro podiam não morar num mar de livros como eu ou, ainda menos, ter um pai
igual ao meu, mas não eram muito diferentes. Jogávamos bola (eu, hoje craque do passado, era fominha), brincá-
vamos de médico com as meninas, fazíamos tudo o que as crianças daquela época podiam fazer, mas todo mundo
gostava de ler, porque ler representava a liberdade e a fantasia. Comentávamos nossos heróis, organizávamos em-
préstimos de livros e gibis e mentíamos esplendidamente, em tertúlias em que acreditávamos nas histórias dos ou-
tros, contanto que acreditassem nas nossas - era tudo a verdade de nossas imaginações. A vã memória não distingue
mais entre o que eu contava e os outros contavam, mas isso não tem importância. Todos nós, afinal, voávamos com
Peter Pan e Sininho e alguns de nós namoraram com a Wendy. Não houve um que não tivesse enfrentado piratas,

Língua Portuguesa e Literatura III


| Professor Davi Tintino
1
descido ao fundo do mar, ficado invulnerável a qualquer arma ou invisível à vontade, decifrado códigos secretos,
falado todas as línguas e vencido todas as guerras e batalhas. Para isso, não tínhamos mais que os livros, não preci-
sávamos de mais que eles.
Mas isso era naquele tempo. Hoje, como nos informam a toda hora, os livros estão mudando, aperfeiçoam-
se cada vez mais. Para ler modernamente, dever-se-á usar um dos muitos leitores eletrônicos que já existem no
mercado e que ainda vão surgir. Segundo uma notícia, um desses aparelhos possibilita que seu usuário (não é mais
leitor, é usuário) interaja com as chamadas redes sociais na Internet. Suponho que se lê um pedacinho e se manda
um comentário via Twitter. Também estarão disponíveis, em breve, livros com trilha sonora e com trechos narra-
dos por voz. Os romances e peças virão com clipes dos cenários descritos pela narrativa, entrevistas com o autor,
facilidade em substituir palavras difíceis por sinônimos acessíveis, interatividade com o usuário ("faça seu final,
case Romeu com Julieta") - o céu é o limite. Acredito que, em relação a isso, vale uma comparação com o celular,
o qual começou como telefone, mas hoje é máquina fotográfica, batedeira de bolos e ferro de passar e desconfio
que está substituindo o(a) parceiro(a) sexual. Admirável livro novo, que faz uma maravilha atrás da outra e nem
puxa pela imaginação, tudo já vem imaginado para você. Espero que, tão famosamente equipado, o usuário ainda
encontre um tempinho para ler.

(In: SARMENTO, Leila Lauar. Oficina de redação. 4. ed. Volume único. São Paulo: Moderna, 2013, p. 339-340)

Questão 1
Quanto ao gênero, o que significa dizer que o texto de João Ubaldo Ribeiro é uma “crônica”?

Questão 2
Nessa crônica, o autor parece estabelecer um diálogo com os leitores.
a) Explique por que ele empregou a primeira pessoa na narrativa.

b) Por que o cronista se sente receoso de que as pessoas não creiam nele?

Questão 3
Ao falar de seu convívio com os livros e de seu interesse pela leitura, o autor emprega frases como estas: “para
mais uma vez me embarafustar pelo meio de dos livros” e “para eu me embolar com os livros”. Como podemos
interpretar, no contexto, o sentido dos verbos destacados?

Questão 4
A imaginação infantil era tão forte que o menino se sentia totalmente fora da realidade, sonhando com possíveis
personagens e histórias fantásticas. Como o cronista nos deixa perceber que esse fato era frequente em sua infân-
cia?

Questão 5
A paixão do autor pelos livros se torna evidente pelo jeito como ele se relaciona com as obras. Interpreta a lingua-
gem figurada ou subjetiva do seguinte trecho:
“em estantes para mim altas como torres, algumas das quais tão pejadas que volta e meia estouravam, viravam
cachoeiras de papel e vinham abaixo.”

Língua Portuguesa e Literatura III


| Professor Davi Tintino
2
Questão 6
O cronista menciona também os livros da turma do Sítio do Picapau Amarelo, de Monteiro Lobato, autor brasileiro
cuja obra infantil vem encantando sucessivas gerações de crianças. Explique o seguinte: a) Por que o menino que
ele era demorou a acreditar na morte do famoso escritor? b) Como Monteiro Lobato influenciou na vida de João
Ubaldo Ribeiro? (Resposta em parágrafo único)

Questão 7
Ao lembrar os amigos de infância, o autor revela um tempo bem diferente da realidade atual. Segundo ele, sua von-
tade de ler era maior que a dos outros meninos, mas todos apreciavam os livros e não só as brincadeiras comuns de
toda criança da época. Por que a leitura os fascinava tanto?

Questão 8
A partir do último parágrafo, o cronista passa a se situar na realidade atual. Observe que até o tempo verbal se mo-
difica: o uso do pretérito (passado) dá lugar ao presente.
a) O que se pode perceber, já no início desse parágrafo, quanto à reação do autor diante da produção dos novos li-
vros? Esclareça sua resposta com base no texto.

b) Ao descrever as características e possibilidades dos novos livros, pode-se dizer que o autor se revela um aficio-
nado da tecnologia?

Fonte consultada e referenciada neste material:


SARMENTO, Leila Lauar. Oficina de redação. 4. ed. Volume único. São Paulo: Moderna, 2013, p. 339-340.

Língua Portuguesa e Literatura III


| Professor Davi Tintino
3

Você também pode gostar