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Resenha sobre o filme “Bacurau”.

Bacurau é um filme escrito e dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano


Dornelles. O filme vencedor do prêmio do júri no Festival de Cannes e de outros
prêmios, também foi aclamado pela crítica, principalmente pelo momento
mundial histórico que vivemos. Bacurau é o nome da Cidade, protagonista do
filme e remete ao último ônibus da madrugada no Recife, e a origem vem de
uma ave de hábitos noturnos comum nos sertões brasileiros, que era chamada
pelos povos tupis de wakuera’wa. O nome da cidade ainda é revelado por uma
das moradoras da cidade (a dona da merceraria) à um casal de forasteiros. A
forasteira pergunta à moradora o que “Bacurau” significa, e a moradora lhe
responde que é um pássaro: – “Hm, um passarinho?!” - “Não, um pássaro.” -
“Tá em extinção?” - “Não, tem aqui, mas ele só sai de noite, é brabo.” Esse
diálogo além de mostrar o desprezo da forasteira sobre a cidade nordestina,
também ressalta o sentimento de superioridade em relação a população.
Quando os moradores indicam que visitem o museu – que aparentemente é
algo muito importante para todos eles – ela responde que deixarão para outra
hora que estiverem com mais tempo. Esse sentimento de superioridade logo é
percebida por todos os moradores. O violeiro faz uma música improvisada e
mostra conhecer muito bem os forasteiros, sabe inclusive sua origem. Acácio,
que antes fazia questão de ser chamado pelo nome, se apresenta como Pacote,
o apelido que é conhecido na “guerra” contra o sistema. Pois bem, o filme tenta
demonstrar um futuro, mas logo no início nos sentimos no presente. Logo no
início, quando passamos pela placa de entrada da cidade, está escrito
“BACURAU, se for, vá na paz”. Esta placa já deixa um recado muito legal sobre
a cidade. Embora seja um lugar esquecido e ignorado por outras regiões do
país e pelos políticos que há gerações se beneficia da exploração das terras do
país e de seu povo, os moradores sempre estão Impresso por Diego Cardoso,
CPF 138.222.646-28 para uso pessoal e privado. Este material pode ser
protegido por direitos autorais e não pode ser reproduzido ou repassado para
terceiros. 15/02/2022 13:14:01 preparados para enfrentar os riscos do sertão. A
violência não parece ser um orgulho deles, Lunga se esconde, Pacote nega a
veracidade dos vídeos que circulam sobre ele, mas quando são chamados a
defender sua cidade e seu povo, estão preparados para defender como devem,
enfrentam os gringos, mas não matam Michael nem o prefeito. Voltando ao
início do filme, acompanhamos Teresa em seu retorno à Bacurau, de carona
com Erivaldo (dono do caminhão pipa), no caminho, além dos inúmeros buracos
que precisam desviar, o que por si só já nos lembra que o filme irá retratar a
verdade nua e crua do país, também passam por um acidente (que ocasionou
duas mortes e que também nos remete às estradas do Brasil que matam em
números superiores ao resto do mundo) e por vários caixões pela estrada. Os
caixões estão presentes em todo o resto do filme e na minha leitura
corresponde ao lema daqueles moradores “Resiste e luta ou morre”. Assim que
Teresa chega à Bacurau, ela é recebida por um dos moradores que coloca em
sua boca uma sementinha, “um forte psicotrópico” como dizem os moradores.
Aparentemente, essa sementinha serve como uma forma de superstição aos
moradores. Mendonça ao ser indagado sobre o que teria nessa sementinha, ele
respondeu em seu Twitter: “Tem coragem, tesão e compaixão, coisas que não
faltam em milhões de brasileiros”. (Completando sua postagem com um acrítica
ao governo e com uma foto de Domingas beijando sua mulher, dizendo ser essa
a imagem que ele queria do Brasil naquele dia 07 de setembro de 2019).
Quando Teresa chega em casa, a primeira coisa que ela faz é entregar os
medicamentos que ela levou para a população, porque provavelmente é a única
maneira de receber medicamentos sem estar vencidos. Depois, ela segue para
ver sua Avó que está sendo velada, no enterro Teresa vê o caixão saindo água,
toda aquela água que é privada daquele povo. De forma inversa ao que
acontece na cachoeira de “O som ao redor”. Somente quando nos
familiarizamos com o local e com as pessoas é que a trama verdadeiramente
começa a se desenvolver. Não ficou muito claro, para mim, se os gringos
pagaram ao prefeito pela cidade ou se foi o contrário. Fato é que logo eles
descobrem que estão sendo atacados. Uma cidade do futuro com amplo acesso
a internet, logo saí do mapa e depois ficam sem sinal. Impresso por Diego
Cardoso, CPF 138.222.646-28 para uso pessoal e privado. Este material pode
ser protegido por direitos autorais e não pode ser reproduzido ou repassado
para terceiros. 15/02/2022 13:14:01 Os primeiros acontecimentos faz Pacote ir
até Lunga, que procurado jamais é entregado pela comunidade, visto que ele
funciona como um defensor cangaceiro do lugar. Lunga vai com Pacote para
Bacurau e o interessante é que logo começam a se preparar de alguma forma
para a guerra que estão prestes a enfrentar. Nessa preparação, o que me
chamou atenção é que todos recebem a sementinha e também praticam a
capoeira. A prática da capoeira me lembrou os verbetes do “dicionário da
Escravidão” que fala justamente que a capoeira era também uma forma de se
preparem para as guerras e Bacurau como uma região produto da colonização
e com uma cultura muito rica, possui vários rituais. Ao decorrer do filme, um
ponto que eu achei extremamente brilhante é quando os gringos dizem aos
forasteiros que eles não são brancos, descrevem as características da mulher e
falam que o homem, no máximo poderia ser descendente de italiano, mas que
não eram brancos como eles. E mesmo que os forasteiros tentem justificar
dizendo que não são iguais aos moradores de Bacurau (quando são
confrontados por terem matado “dos seus”), eles simplesmente, aos olhos dos
gringos, são brasileiros mestiços, degenerados. Outra passagem do filme, em
relação aos gringos que também me chamou muita atenção, foi quando Joshua
irritado com Terry por este ter matado uma criança, Michael ironiza a situação –
Terry era caixa de supermercado e teria matado uma criança e Joshua que
trabalha no sistema prisional dos EUA estava nervoso com a situação, o que se
esperava era exatamente o contrário. Isso me tocou muito por vários motivos,
principalmente pelo fato de que, todos nós de alguma forma esperamos que o
mal venha de quem está no sistema acusador e aplicador de sanções, quando
na verdade, ele está em todo lugar e cada vez mais disseminado. Adiante,
quando os gringos resolvem atacar a cidade, os grupos se dividem, uma grande
parte está na escola, e mesmo a escola sendo metralhada ninguém é atingido,
por outro lado, os dois são executados pelos moradores que se escondiam na
escola. O fato de estarem na escola pode nos trazer também alguns recados
como por exemplo, é a educação que salva o povo esquecido e miserável do
padecimento. Impresso por Diego Cardoso, CPF 138.222.646-28 para uso
pessoal e privado. Este material pode ser protegido por direitos autorais e não
pode ser reproduzido ou repassado para terceiros. 15/02/2022 13:14:01 Quando
outro gringo entra no museu, é também atacado por outro grupo, e aqui o
museu também tem a mesma função da escola. (No final, limpam o chão mas
fazem questão de deixar as paredes intocadas, mesmo triste, aquilo também faz
parte da história de Bacurau e os moradores têm o maior orgulho disso). Outros
aspectos que gostaria de ressaltar é os livros que são jogados de qualquer
forma e mesmo assim aproveitados pelo professor, os medicamentos tarja preta
que além de vencidos causam efeitos talvez muito desejados pelo prefeito. O
filme é lindo e tocante de várias formas. A nossa percepção depende muito das
nossas experiências e realidades e eu poderia destacar muito mais coisas à
despeito das mensagens que o filme me passou, como por exemplo questões
políticas, mas me atenho ao que apresentei, porque de fato foram coisas que
mexeram profundamente comigo.

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