Você está na página 1de 14

Grupo de Estudos

A Obra de Freud: fundamentos conceituais e clínicos

Prof. Dr. Claudio Bastidas

dr.claudio.bastidas@gmail.com

[A chamada “Psicanálise Aplicada”]


BASTIDAS, C. Outra beleza: estudo da beleza para a psicanálise. São
Paulo: Escuta, 1996.

Freud aplicou teorias nascidas da prática clínica à análise de temas de


diferentes campos do conhecimento, como a arte, a religião e a
sociedade. Por outro lado, Freud também tomou como ponto de partida
para pensar a clínica diferentes elementos desses campos, como a
Mitologia, por exemplo, nos casos do mito de Narciso e da tragédia grega
Édipo Rei. Por vezes, alertava que seriam apenas “conjecturas”, mas não
deixou de desenvolver a chamada “Psicanálise Aplicada” ao longo de toda
a sua produção teórica.

SOCIEDADE, CULTURA E RELIGIÃO


“NÃO SE ENGANEM! TEMAS TAMBÉM LIGADOS À CLÍNICA” (neurose
obsessiva, dependência de drogas e do álcool, narcisismo...)
FREUD, S. (1913). Totem e tabu. In: ______ Edição standard das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1980.
[Tabu]
p.42: “A palavra ‘tabu’ denota tudo - seja uma pessoa, um lugar, uma
coisa ou uma condição transitória - que é o veículo ou fonte desse
misterioso atributo. Também denota as proibições advindas do mesmo
atributo. E, finalmente, possui uma conotação que abrange igualmente
‘sagrado’ e ‘acima do comum’, bem como ‘perigoso’, ‘impuro’ e
‘misterioso’.
(...) os tabus dos selvagens polinésios, afinal de contas, não se acham tão
longe de nós como estivemos inclinados a pensar, a princípio; outra é que
as proibições morais e as convenções pelas quais nos regemos podem ter
uma relação fundamental com esses tabus primitivos (...).”
[Neurose obsessiva]
p.46: “O ponto de concordância mais evidente e marcante entre as
proibições obsessivas dos neuróticos e os tabus é que essas proibições são
igualmente destituídas de motivo (...) há uma certeza interna, uma
convicção moral, de que qualquer violação conduzirá à desgraça
insuportável (...) [envolvendo] ações expiatórias e defensivas (...).”
[Tabus impostos aos governantes como resultado do ódio inconsciente]
p.66: “Alguns dos tabus impostos aos reis bárbaros fazem lembrar
vividamente as restrições impostas aos assassinos (...).”
[Paranoia: a idealização extrema dos governantes (que segue o modelo
da idealização da figura paterna) é semelhante ao delírio de perseguição
do paranoico, que atribui superpoderes ao perseguidor]
p.71: “(...) o modelo no qual os paranoicos baseiam seus delírios de
perseguição é a relação de uma criança com o pai.”
[O animal totêmico – um substituto da figura paterna – protege e é
temido. É cultuado, morto, devorado e, posteriormente, pranteado. O
mesmo ocorreu com o “pai da horda primeva”. Ponto de partida das
religiões (Deus que protege e impõe limites) e da nossa sociedade]
p.170: “O violento pai primevo fora sem dúvida o temido e invejado
modelo de cada um do grupo de irmãos; e, pelo ato de devorá-lo,
realizavam a identificação com ele (...).”

FREUD, S. (1927). O futuro de uma ilusão. In: ______ Edição standard


das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro:
Imago, 1980.
[Ilusão]
p.44: “Podemos, portanto, chamar uma crença de ilusão quando uma
realização de desejo constitui fator proeminente em sua motivação e,
assim procedendo, desprezamos suas relações com a realidade, tal como
a própria ilusão não dá valor à verificação.
[Debilidade humana]
p.63: “(...) o homem é uma criatura de inteligência débil, governada por
seus desejos instintuais [pulsionais].”
[A figura paterna e a religião]
p.36: “a atitude da criança para com o pai é matizada por uma
ambivalência peculiar. O próprio pai constitui um perigo para a criança,
talvez por causa do relacionamento anterior dela com a mãe. Assim, ela o
teme tanto quanto anseia por ele e o admira. As indicações dessa
ambivalência na atitude para com o pai estão profundamente impressas
em toda religião, tal como foi demonstrado em Totem e Tabu. Quando o
indivíduo em crescimento descobre que está destinado a permanecer uma
criança para sempre, que nunca poderá passar sem proteção contra
estranhos poderes superiores, empresta a esses poderes as características
pertencentes à figura do pai; cria para si próprio os deuses a quem teme, a
quem procura propiciar e a quem, não obstante, confia sua própria
proteção. Assim, seu anseio por um pai constitui um motivo idêntico à sua
necessidade de proteção contra as consequências de sua debilidade
humana. É a defesa contra o desamparo infantil que empresta suas
feições características à reação do adulto ao desamparo que ele tem de
reconhecer - reação que é, exatamente, a formação da religião.”

FREUD, S. (1930). O mal-estar na civilização. In: ______ Edição standard


das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro:
Imago, 1980.
[O mal-estar civilização/cultura (obs: Freud trata os termos como
sinônimos)]
p.118: a civilização é produto da renúncia às pulsões. Essa “frustração”,
(...) “domina o grande campo dos relacionamentos sociais.”
[O “sentimento oceânico” teria por base um anseio narcísico]
p.90: “Posso imaginar que o sentimento oceânico se tenha vinculado à
religião posteriormente. A ‘unidade com o universo’, que constitui seu
conteúdo ideacional, soa como uma primeira tentativa de consolação
religiosa, como se configurasse uma outra maneira de rejeitar o perigo
que o ego reconhece a ameaçá-lo a partir do mundo externo.
[Eros e a civilização]
p.144-145: “Em determinado ponto do decorrer dessa investigação ver
[[1]], fui conduzido à idéia de que a civilização constituía um processo
especial que a humanidade experimenta, e ainda me acho sob a influência
dela. Posso agora acrescentar que a civilização constitui um processo a
serviço de Eros, cujo propósito é combinar indivíduos humanos isolados,
depois famílias e, depois ainda, raças, povos e nações numa únicagrande
unidade, a unidade da humanidade. Porque isso tem de acontecer, não
sabemos; o trabalho de Eros é precisamente este.”

FREUD, S. (1933). Por que a guerra? In: ______ Edição standard das
obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago,
1980.
* a agressividade é reprimida para que surja a sociedade. A guerra é
resultado da agressividade primitiva. Para que a sociedade prospere,
devemos apostar na paz.

ARTE
“NÃO SE ENGANEM! ARTE TAMBÉM LIGADA À CLÍNICA” (terror, perversões, sexualidade
feminina, aparições do demônio, histeria, homossexualidade...)

Coleção de Arte de Freud

Aqui, vou mencionar 20 textos!

FREUD, S. O Prêmio Goethe (v. XXI, 1930)

[O artista vai à frente da Psicanálise]

 Freud recebeu o prêmio, criado pela cidade de Frankfurt. No discurso na casa de


Goethe: “Penso que Goethe não teria rejeitado a psicanálise num espírito inamistoso,
como tantos de nossos contemporâneos fizeram. Ele próprio dela se aproximou numa
série de pontos; identificou, através de sua própria compreensão interna, muita coisa
que pudemos confirmar (...)”

 Em uma carta, [Goethe] descreve, em tom de gracejo, a ajuda que proporcionou a


uma mulher com “tensão hipocondríaca”: “Fiz com que ela me dissesse e confessasse
tudo, as más ações de outras pessoas e as suas próprias faltas com suas mais
minuciosas circunstâncias e consequências (...).” Como a mulher se curou do estado de
tensão, Freud comparou a ação de Goethe com o trabalho do psicanalista.
FREUD, S. A interpretação dos sonhos (vol. IV, 1905)

[Hamlet semelhante a Édipo Rei]

 P.277: “Édipo Rei” (Sófocles): o trabalho do psicanalista é semelhante à ação da peça:


o processo de revelar [quem é Édipo]. Sófocles “compele” a todos a reconhecer nossos
impulsos reprimidos

 P.280: Hamlet (Shakespeare): a fantasia está reprimida. Desejou matar o seu pai (tal
como seu tio teria supostamente feito) e por causa disso, hesita matar o tio durante a
peça

FREUD, S. Tipos psicopáticos no palco (v. VII, 1905 ou 1906)

 Nota do editor: texto que não foi publicado em vida. O ponto de partida é uma peça
de Hermann Bahr, intitulada Die Andere.

 “peça” = “schauspiel”, que Freud escreve separando com hífem: “schau-spiel”,


aludindo a “schau” (espetáculo) e “spiel” (peça ou jogo). A peça é para o adulto o que
o brinquedo é para a criança. O espectador se identifica com o personagem, ao mesmo
tempo “tudo é apenas um jogo”.

 Diferentes identificações, por exemplo: masoquista, com o personagem que sofre.

 “Parecia ser tarefa do dramaturgo induzir a mesma doença [de Hamlet] em nós, e isso
pode ser alcançado da melhor forma se formos levados a acompanhar o
desenvolvimento da moléstia junto com o sofredor.”

 “teatro psicológico”: luta (entre diferentes impulsos e renúncia) travada na mente do


herói. Tragédias de amor. Instituições causando conflitos.

 O teatro se origina de ritos sacrificiais.

 “herói X deuses” = certas tragédias

 “herói X sociedade” = tragédias sociais

 “homens X homens” = tragédias de caráter

 “homem X sociedade” = dramas sociais

 “drama psicopatológico”: “impulso consciente X impulso inconsciente”. O espectador


que tiver prazer é neurótico (envolve repressão frágil). Quem não é neurótico, sente
aversão.

 Hamlet (Shakespeare): neurótico. 1) torna-se “psicopata” durante a peça. 2) a


repressão falha. “(...) somos suscetíveis ao mesmo conflito que ele.” Identificação do
público com o herói. 3) o impulso não é claramente reconhecido – “nunca recebe um
nome definido” – pelo herói e pelo público (processo semelhante ao da análise).
 Se o público visse apenas a neurose, “chamaríamos o médico” e o personagem seria
inadmissível no palco. Mas, em Hamlet, o público reconhece em si o mesmo conflito e
se identifica.

 “Em geral, talvez se possa dizer que a instabilidade neurótica do público e a habilidade
do dramaturgo em evitar resistência e oferecer prazeres antecipados podem, somente
elas, determinar os limites fixados ao emprego de personagens anormais no palco.”
(p.327)

FREUD, S. Escritores criativos e devaneios (1908)

[O escritor acessa o nosso mundo de fantasias inconscientes]

 De que fontes o escritor criativo retira seu material e como desperta emoções “das
quais talvez nem nos julgássemos capazes”?

 “O escritor criativo faz o mesmo que a criança que brinca. Cria um mundo de fantasia
que ele leva muito a sério (...) [e] mantém uma separação nítida entre o mesmo e a
realidade” (p.150)

Em alemão: “schauspieler” [“atores”] = “jogadores de espetáculo” (numa tradução


literal)

 “Na realidade, nunca renunciamos a nada; apenas trocamos uma coisa por outra.” A
criança troca o brincar pelo fantasiar. A imaginação do escritor é produto de temáticas
infantis.

 O prazer que o escritor desperta no leitor: altera e suaviza suas próprias [do escritor]
fantasias e “(...) nos suborna com o prazer puramente formal, isto é, estético, que nos
oferece na apresentação de suas fantasias.” [o prazer estético] “procede de uma
liberação de tensões em nossas mentes.”

FREUD, S. Delírios e sonhos na Gradiva, de Jensen (v.IX, 1907)

[A personagem Zoe tem um papel semelhante ao do psicanalista]

 Notas do Editor: Jung recomendou a Freud o livro de Jensen (“Gradiva: uma fantasia
pompeiana”). Freud escreveu para Jensen, que ficou lisonjeado com a análise e parece
ter aceito as interpretações. Freud era fascinado por Pompéia (visitou a cidade) e com
a metáfora da repressão como “soterramento”.

 Um “sonho criado” por um escritor.

 Freud afirma que os escritores “estão à frente” do psicanalista.

 Resumo do livro: o jovem arqueólogo Norbert Hanold conseguiu uma cópia de gesso
do relevo da Gradiva e a chamou de “a jovem que avança’. Afastado das mulheres,
decidiu “observar a vida” (os pés das mulheres) para descobrir se o andar de Gradiva
seria verossímil. Concluiu que não e ficou aborrecido.
Sonhou que Gradiva andava, não escutou seu chamado, deitou-se num templo, com
expressão serena e as cinzas do Vesúvio a cobriram. Acordou, foi à janela, ouviu o
canto de um canário e julgou ter visto Gradiva na rua. Saiu correndo atrás dela, com
roupas de dormir, foi ridicularizado pelos transeuntes e voltou.

No apartamento, ouviu novamente o canário e pensou que, de forma semelhante, ele


também estava engaiolado. Decidiu viajar da Alemanha para a Itália, “com propósitos
científicos”. Na Itália, sentia-se incomodado com casais de namorados à sua volta.
Achava que “faltava algo” para ele, mas não sabia o que seria. Em Pompéia, viu
novamente Gradiva andando e ele vai atrás dela. Tentou se comunicar em grego e em
latim, mas ela respondeu: “É melhor falar em alemão”. Surge uma borboleta e Gradiva
desaparece.

Voltou no dia seguinte, reencontrou a Gradiva e conversaram muito. A pedido do


arqueólogo, Gradiva andou para que ele visse, mas ela calçava botas. Obs: o escritor
sustenta a dúvida do leitor: delírio ou realidade?

Gradiva afirma que seu nome é Zoe (“vida”). O proprietário do hotel conta a história
de um casal que decidiu morrer abraçado em Pompéia. Norbert avista um casal (real)
de namorados se beijando e considera eles simpáticos. Novamente com Gradiva, para
saber se ela é real, toca em sua mão sem pedir autorização, usando como disfarce o
pretexto de que espantava uma mosca. Ela afirma: “Perdeste mesmo o juízo, Norbert
Hanold!” Surge o casal e o arqueólogo foge. Zoe conta ao casal que tem intenções
terapêuticas para com Norbert e também “outros propósitos secretos”.

Ao final da história, Norbert namora com Zoe (vizinha e amiga de infância). [obs: ao
mergulhar na relação de Norbert com a relevo de Gradiva, Zoe cura o rapaz]

FREUD, S. Leonardo da Vinci e uma lembrança de sua infância (v. XI, 1910)

[A partir da obra, tentar analisar o autor]

 Nota do Editor: Oskar Pfister observou o “pássaro oculto”

 Leonardo da Vinci: adorava o belo, nunca terminou uma pintura, ociosidade, libertava
pássaros e não comia carne porque não queria a morte dos animais, observava
condenados à morte para desenhar sua expressão de medo, projetava armas de
guerra, rejeição da atividade sexual (considerava o sexo “abjeto”), discípulos
escolhidos pela beleza pessoal (e não pelo talento)

 Sublimação: conhecimento

 “lembrança” (fantasia) de um pássaro que pousou em seu berço e roçou a cauda em


sua boca. A fantasia envolve o desejo de felação.

 Narcisismo e homossexualidade

 Descrição minuciosa das despesas com o funeral da mãe. Neurose obsessiva?

 O misterioso sorriso de Mona Lisa parece se repetir na figura de Sant’Ana (que


revelaria uma expressão de “felicidade maternal”). A pintura teve início após a obra de
Mona Lisa. Leonardo teve “duas mães”: Caterina (até os 3 ou 5 anos de idade) e Dona
Albiera (nova esposa do pai). A pintura parece fundir as “duas mães”, pois não permite
que se diferenciem os corpos das mulheres.

FREUD, S. (1911). Formulações sobre os dois princípios do funcionamento mental. In: ______
Edição standard das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago,
1980.

[Artista concilia o princípio do prazer com o princípio da realidade]

p.139: “A arte ocasiona uma reconciliação entre os dois princípios, de maneira peculiar. Um
artista é originalmente um homem que se afasta da realidade, porque não pode concordar
com a renúncia à satisfação instintual que ela a princípio exige, e que concede a seus desejos
eróticos e ambiciosos completa liberdade na vida de fantasia. Todavia, encontra o caminho de
volta deste mundo de fantasia para a realidade, fazendo uso de dons especiais que
transformam suas fantasias em verdades de um novo tipo, que são valorizadas pelos homens
como reflexos preciosos da realidade.”

FREUD, S. O tema dos três escrínios (v. XII, 1913)

[Os escrínios (porta-joias ou cofrinho para material de papelaria) como símbolos femininos]

 Shakespeare: “O Mercador de Veneza”: três escrínios (ouro, prata e chumbo – o


último contém um retrato da filha). Para Freud, o escrínio (bem como caixas, arcas,
cestos e outros) são símbolos femininos.

 Escrínio (guarda-jóias ou pequeno cofre para papéis e material de escrita)

 Numa carta a Fereczi, Freud relacionou a “determinante subjetiva” do artigo com suas
três filhas

 Cinderela: o príncipe escolhe entre três mulheres.

 Shakespeare: “Rei Lear”: quer ouvir das filhas declarações de amor, para dividir seu
reino na proporção do amor expressado por elas. Quer ser amado e fugir da morte.
Filhas representam três mulheres: mãe, esposa e a “terra mãe” (a morte). Ao final da
tragédia, entra com Cordélia morta. Isso representa a conciliação do velho com a
morte.

FREUD, S. O Moisés de Michelângelo (v. XIII, 1914)

[Partindo da obra, refletir sobre o que revela sobre o nosso psiquismo]

 Nota do Tradutor: na primeira publicação (1914), feita na Revista Imago, aparece


como de autoria “de ***”. Freud só assume a autoria dez anos após (1924).

 Tentar descobrir a intenção do artista, o que ele queria expressar “e nos fazer
compreender”

 “(...) nossa interpretação não diminui a sua obra.”

 Olhar de Moisés: mescla de ira, dor e desprezo. Calma “exterior” e emoção “interior”.
 Sentiu fúria, mas dominou a tentação. “(...) ira congelada e seu sofrimento mesclado
de desprezo. (...) Lembrou-se de sua missão e, por causa dela, renunciou à satisfação
de seus sentimentos.” (p.272)

 Bíblia (p.273-274)

 Michelângelo esculpiu um Moisés que não quebrou as tábuas da lei, “(...) uma
expressão concreta da mais alta realização mental (...) combater com êxito uma paixão
interior pelo amor de uma causa a que se devotou.” (p.275)

JÁ FOI ABORDADO EM DUAS AULAS ANTERIORES, AO REFLETIR SOBRE SHAKESPEARE


(RICARDO III E MACBETH) QUANDO TRATAMOS DAS NEUROSES, PERV E PSICOSES,

FREUD, S. (1916). Alguns tipos de caráter encontrados no trabalho psicanalítico. In: ______
Edição standard das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago,
1980.

FREUD, S. O estranho (v. XVII, 1919)

[O “estranho” é também “familiar” (a castração). Chave para interpretar obras de terror. O


duplificado como representação da morte. Obs: conjecturas sobre clones humanos]

 “unheimlich”: estranho, assustador, provoca medo e horror. Em árabe e hebreu:


demoníaco, horrível. Remete ao que é conhecido e familiar. (p.277)

 “O Homem de Areia” (de Hoffmann): arranca os olhos das crianças, jogando areia nos
rostos delas, quando não querem dormir. Os olhos servem de alimento para os seus
filhos, que tem bicos curvos como os da coruja. Nataniel “lembra” (fantasia) que
Copélio costumava visitar o seu pai e, certa vez, o pai salvou Nataniel de Copélio, que
queria arrancar seus olhos, atirando pedaços de carvão em brasa. Um ano depois, o
pai morre numa explosão. Quando jovem, reconhece Copélio em Giuseppe Coppola,
que lhe oferece “olhos” (óculos). Nataniel compra dele um pequeno telescópio.
Observa Olímpia (filha de Spalanzani) com o telescópio e se apaixona. Ela é bela e
“estranhamente silenciosa e imóvel”. Ela é uma boneca, cujos olhos foram dados por
Coppola. Nataniel ataca Spalanzani, que deixou Coppola levar Olímpia consigo.
Tempos depois, fica noivo de Clara, mas, num passeio pela cidade, do alto de uma
torre, avista Copélio. Enlouquecido, atira-se para baixo e morre.

 “olhos roubados” = castração

 Pais “duplos”: seu pai (que o salvou de Copélio) e Copélio/Homem de Areia (p.290)

 O “duplo” (p.293 e tb p.309): perpeturar-se no outro (o seu “igual”). Porém, esse


“igual” afigura-se também como a representação da morte.

ABAIXO NÃO
 Estética: teoria de beleza e também da “qualidade do sentir” (que está ligada também
ao inconsciente)

 “(...) deve começar por transportar-se para esse estado de sensibilidade, despertando
em si a possibilidade de experimentá-lo.”

 Relação entre o “duplo” e as instâncias “ego e superego”.

 P.298: “pressentimentos” no neurótico obsessivo. Articulação com o desejo


(“pressentir” revela a presença do desejo)

 Inveja projetada nos outros (por exemplo, no “mau-olhado”)

 P.303: transformar o “assustador” (castração) em “estranho”

 Pés decepados, cabeças decapitadas = castração

 Loucura

 P.304: “estranheza” = castração

 Imaginação (infantil) invadindo a realidade

 P.305: estranho (retorno do reprimido)/familiar & genital feminino

 P.305: Freud menciona Schnitzler (adaptado por Kubrick, em “De olhos bem
fechados”)

 P.314: silêncio, solidão e escuridão & ansiedade infantil

FREUD, S. (1920) Além do princípio do prazer. In: ______ Edição standard das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1980.

[Comparação entre o jogo do carretel (fort-da) com a Arte)

p. 29: “Finalmente, em acréscimo, pode-se lembrar que a representação e a imitação artísticas


efetuadas por adultos, as quais, diferentemente daquelas das crianças, se dirigem a uma
audiência, não poupam aos espectadores (como na tragédia, por exemplo) as mais penosas
experiências, e, no entanto, podem ser por eles sentidas como altamente prazerosas. Isso
constitui prova convincente de que, mesmo sob a dominância do princípio de prazer, há
maneiras e meios suficientes para tornar o que em si mesmo é desagradável num tema a ser
rememorado e elaborado na mente.”

FREUD, S. Uma neurose demoníaca do século XVII (v. XIX, 1923)

[Nova incursão de Freud na temática do terror. Demônio como figura paterna]

 Charcot: possessão e histeria


 Demônios: desejos repreensíveis. Visões de Jesus (que o repreendia) e da Virgem: o
pintor sofre tentações com comidas e belas mulheres

 Redenção do pacto com o demônio viria por meio da graça da Virgem Maria

 O manuscrito (Trophaeum Mariano-Cellense) analisado: 1º) relato de um compilador


monástico; 2º) fragmento do diário do pintor

 O pintor bávaro Christoph Haizmann (Haitzmann, em outro trecho), desalentado com


sua arte e com problemas financeiros, após ser tentado nove vezes, faz um pacto de
sangue com o demônio. Sua alma seria do diabo, depois de nove anos. Dias antes do
vencimento desse pacto, tem convulsões “assustadoras”.

 Em outra parte do diário, afirma que havia feito um outro pacto anteriormente, escrito
à tinta. Em dois exorcismos, viu o diabo devolver os textos dos pactos. Entrou para a
Ordem dos Irmãos Hospitalários. Foi tentado pelo diabo outras vezes – após beber
vinho “um pouco em demasia”, segundo um monge –, mas o repeliu.

[O diabo com seios. Obs: Melanie Klein e os objetos parciais]

 P.114: diabo nu e com seios

 Menções ao tema em Cartas a Fliess (nº 56 e 57) e Caráter e erotismo anal (v. IX,
p.174)

 P.102: “depressão melancólica” (por conta das dificuldades financeiras)

 P.104-105: ser “filho do diabo” (expressão que constaria no pacto) & pai real que havia
falecido

 P.109: primeira aparição: cidadão de idade. Posteriormente, cada vez mais


aterrorizador. Demônio como substituto do pai. Deus também é um substituto
paterno.

 P.110: ambivalência: Deus e diabo (bom e mau)

 P.112-113: “Se pudéssemos conhecer tanto sobre Christoph Haizmainn quanto


conhecemos sobre um paciente que faz análise conosco (...) contudo, não podemos
efetuar uma análise desse tipo com o pintor, que faleceu no ano de 1700.”

 P.113: o número nove (tentações e anos até a posse da alma): gravidez

 P.115: rebelar-se contra a atitude feminina para com o pai. Deslocamento do desejo
de castrar o pai e ternura pela mãe.

FREUD, S. (1927). O futuro de uma ilusão. In: ______ Edição standard das obras psicológicas
completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1980.

A arte é resultado das renúncias, em prol da civilização. Por outro lado, a Arte também
promove a satisfação narcísica ao proporcionar sentimentos de identificação
FREUD, S. O humor (v. XXI, 1927)

 O criminoso é levado à forca numa segunda-feira e diz: “Bem, a semana está


começando excelentemente.”

 O humor é rebelde. Em atitude de superioridade, o humorista é como o adulto que


sorri do que pode ser fonte de sofrimento para a criança.

 O humor é produto do superego. Os chistes são diferentes, porque são resultado de


pensamentos pré-conscientes entregues à revisão inconsciente.

FREUD, S. Dostoievski e o parricídio (v. XXI, 1928)

[O criminoso realiza o desejo de todos nós]

 Quando há um crime, importa saber também quem o desejou quem sentir prazer com
ele. Em Os irmãos Karamazov, um padre se ajoelha frente a um criminoso, Freud
interpreta isso como um agradecimento ao criminoso, que carregaria em si a culpa de
um homicídio que todos nós teríamos desejo de cometer – “Isso não é apenas piedade
bondosa, mas uma identificação com base em impulsos assassinos semelhantes (...)”
(p.219)

 Quatro facetas: artista criador, neurótico, moralista e pecador.

 Artista criador: “(...) a análise, ai de nós, tem que depor suas armas.”

 Moralista: depois da rebeldia, apoiou o Czar, o nacionalismo russo e o “Deus dos


cristãos”

 Pecador e neurótico: possível ataque sexual a uma garotinha, sádico em pequenas


coisas para com os outros e masoquista consigo mesmo nas grandes coisas.
Convulsões: epilepsia ou histeroepilepsia?

 “Epilepsia/histeria”: culpa por desejos parricidas

 Homossexualidade latente: atitudes estranhamente ternas para com adversários no


amor

 A condenação de Dostoievski à prisão foi injusta, mas ele se reconcilia com o Czar =
submissão masoquista ao pai, em razão dos desejos parricidas. “É fato que grandes
grupos de criminosos desejam ser punidos. O superego deles exige isso; assim se
poupam a si mesmos a necessidade de se infligirem o castigo.” (p.215)

 Dostoievski dependente de jogos de azar. Comportamento cíclico: prometia à esposa


que não jogaria, mas jogava, perdia tudo e se humilhava frente à ela. Depois escrevia.
Freud: a compulsão pelo jogo é resultado da culpa por desejos (masturbatórios e/ou
edípicos).

 [sobre a patologia de Dostoievski, numa carta a Theodor Reik]: “(...) a despeito de


minha admiração [por Dostoievski], de fato não gosto dele. Isso se deve a que minha
paciência com as naturezas patológicas está exaurida na análise. Na arte e na vida, não
as tolero.” (p.226)

FREUD, S. (1930). O mal-estar na civilização. In: ______ Edição standard das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1980.

[A arte como “suave narcose” e a dependência química]

p.93 e 96/97: “substâncias tóxicas que influenciam o nosso corpo (...) provocando sensações
prazerosas”.

p.97: “(...) é possível que haja substâncias na química de nossos corpos que apresentem
efeitos semelhantes, pois conhecemos pelo menos um estado patológico, a mania, no qual
uma condição semelhante à intoxicação surge sem administração de qualquer droga
intoxicante.”

p.100: “(...) a suave narcose a que a arte nos induz, não faz mais do que ocasionar um
afastamento passageiro das pressões das necessidades vitais

FREUD, S. Carta a Georg Fuchs (1931)

[A perseguição aos artistas e à Psicanálise]

 Fuchs foi um crítico literário, próximo do cinema, que foi preso por motivos políticos

 o tratamento dispensado aos prisioneiros está “(...) em prefeita harmonia com nossa
civilização, expressão necessária da brutalidade e falta de compreensão que dominam
a humanidade civilizada da época atual.” (p.309)

 “(...) sou persona ingrata, senão ingratíssima, para o povo alemão – e, além do mais
para as pessoas cultas, bem como para as incultas.” (p.308)

FREUD, S. FREUD, S. Prefácio a “A vida e as obras de Edgar Allan Poe: uma interpretação
psicanalítica”, de Marie Bonaparte (v. XXII, 1933)

 “Neste livro, Marie Bonaparte, minha amiga e discípula, dirigiu a luz da psicanálise
sobre a vida e a obra de um grande escritor de tipo patológico. Graças ao trabalho (...)
podemos compreender agora em que medida as características da obra desse autor
foram determinadas pela natureza especial do mesmo. Contudo, também verificamos
que isto foi consequência de poderosos laços afetivos e de experiências dolorosas do
início de sua adolescência. Investigações como esta não se destinam a explicar o
caráter de um autor, porém mostram quais as forças motrizes que o moldaram e qual
o material que lhe foi oferecido pelo destino.” (p.310)

FREUD, S. A Thomas Mann, no seu sexagésimo aniversário (v. XXII, 1935)

 “(...) as palavras de um escritor são ações.”

Você também pode gostar