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O QUE É ANTROPOLOGIA

Robert Weawer Shirley1

A Antropologia é uma ciência ao mesmo tempo social e natural, devido ao enorme


alcance de sua função. O estudo do homem é quase um campo sem fronteiras, um mar de
conhecimentos. A Antropologia física ou biológica, uma de suas subdivisões, estuda a
genética humana, a fisiologia e a biologia, bem como os parentes evolutivos do homem – os
primatas. A Arqueologia, outra das subdivisões da Antropologia, pesquisa a origem e a
evolução da raça humana, não somente a evolução biológica, mas também a social. A
lingüística antropológica deriva do estudo de línguas não escritas e tem dado contribuições
notáveis à psicologia, à história e à natureza do conhecimento humano. Os antropólogos são,
todavia, provavelmente mais conhecidos pelo estudo dos povos "exóticos", povos que ainda
vivem ou mesmo que viveram até recentemente em formas de vida tribais e tradicionais. Este
estudo de sociedades simples e sem língua escrita é a grande tradição da Antropologia social
e cultural.
Como se desenvolveu uma disciplina de âmbito tão amplo, diante da especialização
crescente do conhecimento nesta época moderna? A resposta pode ser encontrada na sua
própria história. A Antropologia começou como o estudo de povos sem uma tradição escrita e
este fato obrigou os antropólogos a tentarem entender de tudo: a língua, a economia, a
religião, a mitologia, as leis e mesmo a biologia de um povo como partes de um todo, não
como fragmentos estanques. Por isso o antropólogo teve de se tornar um generalista mesmo
quando seus interesses eram mais centralizados.
A Antropologia, como o estudo sistemático de culturas diferentes das do pesquisador,
é uma disciplina muito antiga. Com um pouco de esforço, poder-seia remontá-la a Heródoto,
ou mesmo ao grande historiador chinês Sima Quan, que viveu há centenas de anos antes de
Cristo, porém a maioria dos antropólogos reivindicaria uma história bem mais recente, de
pouco mais de um século. A Antropologia moderna, na nossa opinião, tem três temas que se
entrecruzam, todos importantes para a compreensão da disciplina, e que podem ser chamados
de tema pragmático, tema romântico e tema científico.
O pragmatismo pincelado de romantismo é a verdadeira base da Antropologia social.
Desenvolveu-se como um sub-produto do expansionismo da Europa imperial no século
passado. As nações européias, principalmente a britânica, a espanhola, a francesa, a holandesa
e a portuguesa, viram-se efetivamente com o domínio e a conquista de enormes áreas e de
milhões de pessoas de quem quase nada sabiam. Os primeiros impérios, o espanhol e o
português confiaram o papel de conhecer e compreender esses povos conquistados à Igreja
Católica Romana. Os missionários, principalmente os jesuítas, realizaram mesmo numerosas
pesquisas de caráter antropológico.
Existe, porém, uma distinção fundamental entre o papel de um missionário e o de um
antropólogo. O missionário vem ensinar a ideologia e a fé européias a um povo não-europeu.
O antropólogo vem aprender o que esse mesmo povo tem para ensinar a si e à sua própria
sociedade. O interesse do missionário é essencialmente pragmático, embora tenha havido
exceções muito valiosas. Ele procura conhecer um povo a fim de mudá-lo e, na maioria dos
casos, dominá-lo. Devido a esta profunda contradição dentro do campo missionário, muitos
de seus elementos antropológicos, foram finalmente reprimidos, especialmente quando os
missionários mais profundamente envolvidos começaram a defender esse mesmo povo contra
os próprios interesses imperiais que os sustentavam. Esta foi uma das principais razões da
expulsão dos jesuítas da América Latina no século XVIII.
Os britânicos, franceses e holandeses estavam, contudo, muito menos interessados na
religião que no comércio. Não é por acaso que muitos dos maiores antropólogos vieram
desses países. Alguns dos melhores antropólogos do século XIX estavam abertamente a
serviço do governo imperial. Por exemplo, um dos mais completos estudos já realizados sobre
a história e a sociedade da ilha de Java foi feito pelo seu governador britânico, Sir Stamford
                                                                                                               
1
SHIRLEY, Robert Weaver. “O que é Antropologia”. In: Antropologia Jurídica. São Paulo: Saraiva, 1987.
Raffles, que fundou a cidade de Singapura. Outro foi o de Lord Lugard, o fundador da
Nigéria. A Inglaterra produziu centenas desses imperialistas eruditos que, por razões práticas,
às vezes, e outras, românticas, vieram a estudar e conhecer povos de todo o mundo, viver com
eles e, em muitos casos, escrever sobre eles. O exemplo mais famoso foi o de Lawrence da
Arábia, que se tornou mais árabe do que inglês.
Porém nos Estados Unidos da América o problema imperial foi menos sério. Os
povos nativos da América do Norte e do norte do México não eram muito numerosos e
tinham sido dizimados pelas doenças européias muito antes da expansão ao oeste do país.
Exceto em poucas áreas isoladas dos planaltos centrais (onde o General Custer fora derrotado
pela nação Sioux), os índios americanos raramente ofereceram qualquer séria ameaça à
expansão dos Estados Unidos. Apesar disso, foi fundado em 1864, em parte por razões
científicas, mas com vistas ao controle pacífico dos povos nativos do oeste, o Departamento
Americano de Etnologia (Bureau of American Ethnology), comandado não por um
antropólogo, mas pelo General John Wesley Powell.
Este tema prático (o imperial) da história da Antropologia é um fato social e
econômico. Entretanto, isto não deve sugerir uma crítica moral a toda disciplina, nem mesmo
à maioria dos antropólogos, inclusive aos missionários, da época. Aqui, deve-se reconhecer a
importância do tema romântico na Antropologia. Embora muitos estudiosos e missionários de
então aceitassem a visão do "fardo do homem branco" ou de trazer a "civilização" aos
"primitivos", muitos outros se tornaram profundamente envolvidos com o povo que
estudaram e, na prática, vieram a ser defensores impetuosos de sua independência cultural.
Esta é também uma característica comum aos antropólogos modernos. Pode-se notar que
alguns foram além das pesquisas para serem incorporados à tribo estudada. No Brasil, vários
antropólogos aceitaram a vida dos nativos. Todos do meio sabem que o famoso Kurt
Nimoendaju manteve várias famílias nativas além de sua família "oficial" no Rio de Janeiro.
Outro caso célebre foi o do professor Frank Cushing, da Universidade de Colúmbia, que após
alguns anos de Pesquisa intensiva sobre a religião dos índios Zuni, do Novo México, tornou-
se realmente um sacerdote Zuni — queimou todas as suas notas de pesquisa de campo e
jamais voltou à Nova Iorque e à cátedra de Antropologia. Este romantismo de tal ciência, o
fato de poder compreender e conhecer bem outros povos, tem sido uma de suas mais belas
características.
Contudo, não se deve esquecer que a Antropologia é também uma ciência natural e
descritiva de outros povos, e ainda uma ciência comparativa, que tenta compreender todas as
sociedades humanas.
Talvez seja correto dizer que a Antropologia como ciência mas também como
profissão surgiu no começo do século XX, tendo como precursores Franz Boas, nos Estados
Unidos, e Bronislaw Malinowski, na Inglaterra. Boas participou da primeira grande expedição
antropológica organizada com finalidade especificamente científica – a "Jessup North Pacific
Expedition" – para estudar os povos da costa noroeste do Pacifico, do Canadá e do Alasca.
Mais tarde, voltou para ocupar a primeira cadeira de Antropologia numa universidade
americana – a Universidade de Colúmbia, em Nova Iorque. Seus alunos formam a maioria na
lista dos grandes antropólogos americanos da geração passada: Kroeber, Melville Herskovits,
Ruth Benedict, Ralph Linton, Margaret Mead, etc. Muitos deles fundaram departamentos de
Antropologia em todo o país. Boas era, acima de tudo, um cientista formado em física famoso
por exigir demasiado de seus discípulos, sempre com a visão de que a Antropologia devia
tentar ser tão rigorosamente científica quanto possível.
Por outro lado, Malinowski foi o criador do método científico, essencialmente
fundamental na Antropologia – o da observação participante. Por uma série de razões, durante
a Primeira Guerra Mundial, ele viveu cerca de quatro anos nas ilhas Trobriand, no sul do
Pacifico. Lá estudou meticulosamente quase todos os aspectos da vida desse povo melanésio:
a produção econômica e o câmbio, a vida familiar, a religião, os mitos e até a poesia. Tendo
voltado à Inglaterra após a guerra, aceitou a cadeira de Antropologia social da Universidade
de Londres e lá permaneceu até sua morte, em 1941. Sua influência proveio não somente de
sua extrema dedicação como professor, mas também de sua extraordinária habilidade em
escrita. Da experiência adquirida com os habitantes das ilhas Trobriand, surgiu uma série de
livros clássicos em Antropologia, todos impressos até hoje: Argonauts of the western Pacific,
Coral gardens and their magic, The sexual life of savages in North Western, A cientific theory
of culture e Crime and custom in savage society. Só os títulos já refletem o alcance de seu
interesse como antropólogo e pesquisador científico do campo.
Esses dois homens, Franz Boas e Malinowski, muito diferentes em experiências e
temperamento – um, judeu-alemão formado em física; outro, um polonês expatriado formado
em matemática, porém em muitos sentidos aventureiros, criaram a ciência moderna da
Antropologia como matéria universitária e incentivaram e patrocinaram muitos estudos e
pesquisas. Embora suas idéias diferissem em certos aspectos, ambos ensinaram idéias
fundamentais que se tornaram preceitos básicos da Antropologia moderna.
1) O primeiro desses preceitos é o método da observação participante, desenvolvido
por Malinowski, que requer um longo período de convivência (um ano, no mínimo) com o
povo a ser estudado.
A observação participante implica que um antropólogo não apenas observe uma outra
cultura, mas se torne realmente envolvido na vida diária do povo, aprenda sua língua e aceite
seus costumes. Certamente há limites para o grau em que um antropólogo possa ou deva
tornar-se membro de uma outra cultura. Por exemplo, poucos se casam dentro de uma cultura
ou travam combates em guerras locais, ou tiram cabeças de seus inimigos como troféus.
Porém, como regra geral, o método tem muita força, já que o pesquisador científico, ao
conviver com um povo, tem que se envolver em suas vidas, seus problemas, temores, crenças
e aspirações. O antropólogo desenvolve uma dupla visão de vida, torna-se multicultural. De
certo modo, converte-se no que estuda. Esta "experiência antropológica" é a marca do
pesquisador do campo e ela muda sua personalidade para sempre. A experiência de viver
numa outra cultura, com o objetivo de aprender esta cultura, tem efeitos profundos nas
pessoas que dela participam. O trauma original é hoje bastante conhecido como "choque
cultural" – um distúrbio intenso que pode durar vários meses ou eventualmente não
desaparecer de todo. A experiência de uma pesquisa científica extensa não só permite ao
antropólogo aprender uma outra cultura, mas também, em muitos casos, faz com que ele
esqueça ou questione os dogmas de sua própria cultura.
2) Este é um outro preceito antropológico desenvolvido pelos fundadores da
Antropologia moderna: a negação do etnocentrismo. O etnocentrismo é simplesmente a
crença firme na verdade da própria cultura de alguém. Cultura, no sentido antropológico, é o
conjunto de conhecimentos, crenças e valores de uma sociedade. Todas as pessoas crescem
aprendendo uma cultura. O etnocentrismo é a idéia de que a própria cultura e crenças de cada
um são "a verdade" ou, pelo menos, a maneira superior de lidar com o mundo. É
perfeitamente natural acreditar que aquilo que lhe foi ensinado quando criança, sua religião,
seus valores, seus modos de conduta são os melhores, os mais corretos e verdadeiros, e que a
cultura de outros povos é errada, supersticiosa e inferior. Mas os fundadores da Antropologia
ensinaram que o etnocentrismo é falso – que todas as culturas são, em geral, iguais, que
nenhuma cultura ou sociedade possui o monopólio da verdade e que, de qualquer forma, todas
elas merecem respeito.
A destruição do etnocentrismo (a certeza sobre a verdade da própria cultura de
alguém) e a aceitação da validade de outras culturas, de outros modos de vida e de outras
crenças, foram ensinamentos dos fundadores da Antropologia moderna, que são aceitos pela
grande maioria dos antropólogos de hoje. O próprio método do trabalho antropológico
científico, incluindo longos períodos de convivência com membros de uma outra cultura,
destrói o etnocentrismo do pesquisador. O conhecimento de que existem outros meios de
fazer certas coisas, outras maneiras de pensar, de falar, outras leis e regras, elimina a
confiança natural de uma pessoa na própria cultura. É por isso que a experiência
antropológica é tão perturbadora e ao mesmo tempo tão gratificante. O antropólogo perde a
certeza de sua própria cultura, porém ganha profunda consciência de uma outra. Ele se torna
menos um cidadão de uma nação e mais um cidadão de muitas nações. Isto é tão belo quanto
assustador, já que significa que o antropólogo não mais pertence à sua própria sociedade. Ele
passa a ser, de uma forma bem real, profissionalmente marginalizado. Mas, no sentido
humanista, torna-se mais desenvolvido. Pertence ao mundo.
3) O próprio fato de o antropólogo conhecer profundamente mais de uma cultura e
sociedade é o elemento predominante do campo como ciência. Um outro elemento
introduzido pelos fundadores da Antropologia moderna foi o conceito de comparação
controlada. Esta sugere que através do conhecimento de muitas culturas e sociedades pode-se
chegar a um entendimento mais científico do gênero humano em geral. A Antropologia
provou que muitas "leis" nas ciências sociais em geral eram em si mesmas etnocêntricas e
eliminou vários preconceitos inerentes à visão européia do mundo. Esta talvez tenha sido a
maior contribuição da Antropologia às ciências sociais. Hoje, em qualquer campo – da
psicologia e da educação à ciência política – a perspectiva multicultural desenvolvida pelos
antropólogos é muito importante. Num mundo cada vez mais complexo, a visão multicultural
pode ser essencial à sobrevivência humana.
Os fundadores da Antropologia moderna introduziram um elemento final: a
focalização da atenção dos antropólogos sobre sociedades de pequena escala e de tecnologia
simples – na época ainda chamadas de "primitivas". Na realidade, a ciência já pôde
comprovar que a última sociedade verdadeiramente primitiva provavelmente tenha
desaparecido há 30.000 anos, com o Neanderthal. Tanto Boas como Malinowski usaram o
termo "primitivo" (ou, no caso de Malinowski, "selvagem"), não no sentido de que pensassem
que os povos que eles estudaram eram biológica ou mesmo culturalmente inferiores às
sociedades modernas, como sugere hoje o uso equivocado do conceito. Tinham profundo
respeito por eles, contudo estavam interessados em estudar povos com tecnologias e
estruturas políticas relativamente simples e independentes, tanto quanto possível, das forças
econômicas e políticas dos impérios modernos. Desse modo, divergiam acentuadamente dos
antropólogos dos séculos anteriores. Seu interesse era realmente científico ao invés de prático.
Eles não tiveram a intenção de dominar os povos que estudaram, porém de entendê-los
cientificamente (com uma insinuação de romantismo em Malinowski). Mas, em última
análise, o esforço para achar tais povos "primitivos" isolados fracassou. Ainda em 1914,
quando Malinowski começou seu trabalho científico, tendo Boas realizado o seu há uma
década, o número de sociedades verdadeiramente independentes em qualquer parte do mundo
já era muito limitado.
Ainda persiste em Antropologia a tradição de pesquisa em sociedades simples, porém
com a crença de que estudando-as, facilita-se a compreensão das mais complexas. Todavia,
por muitos anos os antropólogos procuraram ignorar o fato de que a maioria dos povos que
pesquisavam era de fato dominada ou pelo menos solidamente influenciada pelos Estados e
culturas ocidentais. Eles tentaram recriar uma cultura "pura" e "tradicional", indagando sobre
o passado e ignorando os elementos modernos. Esta ênfase sobre o "primitivo" limitou o
campo e foi fonte de muitos erros em trabalhos posteriores.
O primeiro dos antropólogos a dar reconhecimento especifico à conexão entre as
sociedades pequenas e simples e os Estados modernos foi Robert Redfield (Tepoztlan: a
Mexican village, a study of folk life, 1930), que desenvolveu uma nova metodologia de
estudo das comunidades rurais dentro de um Estado maior. Primeiro no México e mais tarde
na China, ele pesquisou sobre as vilas rurais como part societies. Desse modo, libertou a
Antropologia de sua tradição de "primitivismo" e descobriu um novo campo extensivo para
pesquisa. Fez também a útil distinção entre a sociedade e cultura da elite urbana e a
camponesa rural, ou, com suas próprias palavras, entre a "grande tradição" das cidades e a
"pequena tradição" do campo. É interessante observar que Redfield, assim como Boas e
Malinowski, é hoje severamente criticado por não ter reconhecido a relação de poder e
autoridade que o Estado mantém sobre a comunidade rural. Esta critica é devida ao seu
primeiro trabalho no México. Contudo, nos estudos posteriores sobre a China, Redfield
examinou explicitamente os problemas do comércio e do poder na sociedade rural, sendo
esses trabalhos infelizmente pouco conhecidos hoje em dia.
Durante a década de 30 e até o presente, o campo da Antropologia tem-se
desenvolvido constantemente. Antropólogos como Edward Sapir (Language, an introduction
to the study of speech, 1921-1954), foram figuras fundamentais na criação da ciência da
lingüística. Psicólogos como Abram Kardiner (The individual in his society, 1956) e
antropólogos como a polêmica Margaret Mead (Coming of age in Samoa, 1928) dedicaram-se
à apreciação da personalidade e da cultura e abriram novas áreas no estudo da educação
comparada. As pesquisas antropológicas tornaram-se instrumento fundamental para se
compreender a organização social. Estudos de religião e de mitologia transformaram-se numa
grande área de pesquisa.
Enquanto estudo de produção e de troca, a Antropologia econômica, iniciada por
Malinowski, tem sido sensivelmente desenvolvida por antropólogos como Raymond Firth
(Malay fishermen, their peasant economy, 1946) e por marxistas como Maurice Godelier
(Racionalidade e irracionalidade na economia, 1975). A escola estruturalista francesa criada
por Claude Lévi-Strauss abriu muitas áreas novas na análise estrutural do parentesco, da
linguagem e da mitologia. Todas elas têm dado grande contribuição à ciência social bem
como ao humanismo científico.
Recentemente, os antropólogos começaram a examinar o fenômeno urbano. Este
trabalho envolve várias instituições urbanas, como igrejas e outras organizações religiosas,
fábricas e até escolas de samba (da Matta, Carnavais, malandros e heróis; Para uma sociologia
do dilema brasileiro, 1979; Velho, A utopia urbana, 1973; Oliven, Urbanização e mudança
social no Brasil, 1980). Há também estudos sobre bairros e outros grupos urbanos Como
Roberto da Matta já observou, os antropólogos têm uma tradição de estudar povos ignorados
pelas outras ciências sociais: favelados, gays, mendigos, índios e outros povos nativos
forçados a morar em cidades. A Antropologia, assim, tenta dar voz àqueles que são pouco
ouvidos.
Parece possível dizer agora que as velhas raízes pragmáticas da Antropologia como
elemento de dominação imperial estão sendo gradualmente substituídas pela Antropologia
como ciência. Ainda mais que o Código de Ética da Associação Americana de Antropólogos
proíbe ao antropólogo profissional participar de qualquer atividade que possa trazer prejuízo
ao povo que ele pesquisa. Isto não quer dizer que não possa se esforçar para ajudar tal povo
em suas relações com a sociedade moderna ou mesmo nas lutas, para que sobrevivam às
provações da modernização. Hoje, esta é uma das mais nobres e úteis tarefas da Antropologia
moderna, contanto que seja feita a pedido e com apoio das pessoas, e jamais de uma maneira
paternalista, arrogante e dominante.
Deste modo, a linha pragmática do campo tem sido modificada, mas a idéia de
domínio está sendo substituída pela de cooperação, e a assistência ainda não desapareceu. A
Antropologia como ciência social tem-se tornado mais vigorosa, com novas técnicas e novos
métodos de pesquisa, como o estruturalismo, a lingüística, a Arqueologia, a economia, a
biologia e a genética, todos a ela interligados. Mas ainda persiste a linha romântica e
provavelmente nunca desaparecerá. O mundo é extremamente complexo para que a
Antropologia se transforme numa ciência exata, coisa que nem os antropólogos desejam.
A Antropologia, mais famosa como sendo o "estudo das sociedades exóticas", tem
sido sempre um assunto de romantismo e apesar de todas as técnicas modernas, a maioria dos
antropólogos não deixa de ser basicamente humanista. Na realidade, a Antropologia como
ciência tende a dar um grau de objetividade e rigor, bem como controle de observação, ao que
ainda é uma arte – a de ser antropólogo.

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