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Detecção preventiva de patologias em edificações

A manutenção predial
compreende importantes
processos que contribuem para a
conservação e melhora de
performance das construções.
Além disso, empreendimentos de
recuperação e reabilitação são
custosos, o que aumenta a
relevância da manutenção predial
e da prevenção de patologias em
edificações. Neste contexto, o
Foto 1 - Fissuras no concreto paralelas à armadura
estudo e a sistematização do
conhecimento nessa área são necessários para que se desenvolvam novas
tecnologias para a gestão da manutenção predial.

A aplicação de sistemas periódicos de inspeção das edificações é uma das


soluções viáveis para que a detecção de patologias possa ocorrer antes mesmo
que seus efeitos danosos possam ser sentidos. No entanto, o que se verifica é
uma intensa despreocupação dos gestores de edificações com esse aspecto,
quadro que apenas é invertido quando problemas patológicos começam a
alterar a funcionalidade da construção.

Em geral, estruturas que parecem estar bem conservadas e funcionais podem


apresentar sintomas sutis de defeitos que, caso não recebam tratamento
adequado, podem gerar consequências graves. A observação desses sintomas,
associada à coleta de dados sobre alterações na rotina da construção, deve
constituir a primeira etapa de uma inspeção periódica.

Alguns defeitos da construção não estão diretamente relacionados com


patologias que podem gerar inutilização da estrutura a curto prazo. Entretanto,
a funcionalidade e a durabilidade não são os únicos parâmetros a serem
considerados para a manutenção predial, sendo a habitabilidade e a
conservação arquitetônica outros fatores relevantes.

Após a avaliação global da


construção, ponderados os
fatores anteriormente citados, a
obtenção de um resultado que
diagnostique um desempenho
pouco satisfatório não deve ser
decisiva para a inutilização da
estrutura. Ao contrário, deve

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servir como estímulo para o início


de um estudo das patologias
encontradas, como subsídio para
intervenções visando a
recuperação da edificação (Souza
e Ripper, 1998).

Etapas da construção

Desde o início das civilizações, o


planejamento e a construção de
estruturas têm se baseado nas
necessidades do ser humano, Foto 2 - Exposição de armaduras corroídas

sejam elas de qualquer natureza. Essas necessidades humanas possibilitaram o


acúmulo de uma grande quantidade de conhecimento técnico-científico a
respeito da construção civil, associada às inovações e ao desenvolvimento de
novas tecnologias.

No entanto, todo esse acervo científico não é suficiente para impedir que as
estruturas apresentem problemas e danos causados por vários fatores, desde
falha na elaboração do projeto até a falta de manutenção. Essas situações
caracterizam a deterioração estrutural que, se não tratada corretamente,
compromete a estrutura, levando-a à inutilização e até mesmo ao
desabamento.

A área de pesquisa da patologia estrutural compreende a sistematização dos


conhecimentos em problemas e defeitos estruturais, no sentido de prevenir e
recuperar estruturas atingidas por deterioração. Essa nova área da engenharia
se propõe a analisar não somente a caracterização dos defeitos, mas também
suas causas e consequências, além dos processos mecânicos que os envolvem.

Um processo de construção abrange atividades que, embora apresentem


diferentes níveis de dificuldade e ocorram em etapas distintas da construção,
contribuem com igual fração para o bom desenvolvimento da obra e para a
obtenção da construção desejada.

A tentativa de caracterizar e separar em estágios essas inúmeras atividades


constitui uma tarefa bastante difícil. No entanto, em termos práticos, pode-se
incluí-las em três grandes etapas que devem ser comuns a todos os processos
construtivos. São elas: planejamento, execução e manutenção.

O planejamento compreende a elaboração do projeto arquitetônico, a


formulação e análise do estudo de viabilidade e também a criação de um
cronograma de obra e de um orçamento. É nesta fase que devem ocorrer as
discussões entre o cliente, o projetista e o construtor no sentido de promover
uma construção adequada às necessidades do cliente, porém, dentro das
possibilidades técnicas de execução e manutenção.

A execução consiste da aplicação prática dos serviços propostos pela etapa de


planejamento. Essa etapa constitui um momento em que vários fatores
apresentam interferência direta na qualidade da construção, dentre eles,

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destacam-se o correto uso do material e a correta aplicação do projeto. A


gestão de qualidade do serviço, embora deva estar presente ininterruptamente
durante todas as fases da construção, torna-se uma importante aliada ao bom
desempenho do serviço durante a execução.

A manutenção se segue como etapa a ser realizada após a inauguração e


durante a efetiva utilização da estrutura. Pode-se definir a manutenção como
um conjunto de técnicas, práticas e rotinas necessárias ao bom desempenho da
estrutura (Souza e Ripper, 1998). De acordo com esse conceito, cabe destacar
as duas formas em que esta etapa pode ser realizada: a manutenção preventiva
e a manutenção corretiva.

Basicamente, a manutenção preventiva consiste na inspeção e revisão de itens


previamente listados e na recuperação ou troca de partes defeituosas, além da
aplicação de processos que permitam a conservação da estrutura em bom
estado. A manutenção preventiva deve ser periódica e não deve deixar de ser
realizada sob qualquer circunstância, pois garante a durabilidade e a
possibilidade de uso da estrutura. A periodização da manutenção deverá ser
calculada pelo construtor.

A manutenção corretiva geralmente tem caráter emergencial e é empregada


para permitir a recuperação da estrutura gravemente avariada, quando
normalmente já existe impossibilidade de uso. Quando há prevenção, essa
forma de manutenção é evitada, pois a estrutura está sendo regularmente
inspecionada e seus pequenos defeitos corrigidos, impedindo a gênese de uma
grave patologia estrutural.

No entanto, é importante ressaltar que a existência de patologias estruturais


agudas, as quais demandam manutenção emergencial, não é resultado único da
falta de conservação estrutural. Outros fatores, tais como os ambientais, podem
originar falhas na estrutura e estas levam à ocorrência de patologias.

Procedimentos de inspeção

A exposição das edificações aos variados mecanismos de deterioração exige que


cuidados sejam adotados para preservar a funcionalidade da estrutura e o
aumento de sua vida útil. Esses cuidados se refletem na existência de uma
proposta de manutenção eficiente, que inclua os procedimentos necessários ao
bom estado da construção.

No entanto, em muitos casos, o processo de manutenção é inadequado ou


insuficiente para evitar a ocorrência de problemas patológicos nas construções.
Uma recuperação emergencial se faz necessária para evitar a inutilização da
estrutura.

Nesse contexto, evidencia-se a importância dos procedimentos de inspeção na


manutenção do bom estado das edificações. As inspeções constituem parte
fundamental de qualquer processo de reforma e manutenção, seja de caráter
previsível ou emergencial. O conhecimento das formas, metodologias e técnicas
de inspeção é um fator bastante relevante na análise dos problemas de ordem
patológica.

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De modo geral, as inspeções podem ser classificadas entre os seguintes tipos:


cadastral, rotineira, extraordinária, especial e intermediária. No campo da
manutenção predial, essas definições assumem uma maior importância, dado
que o estado funcional da edificação será um critério para se definir o tipo de
inspeção necessário.

A seguir, são listados alguns cuidados para a realização de um bom processo de


inspeção periódica em edificações.

Observação do ambiente

O ambiente em torno da estrutura é decisivo na ocorrência de deficiências e


problemas patológicos em uma construção. Essas manifestações patológicas - e
suas respectivas velocidades de deterioração - são consequentes, em
megaescala, da influência do meio na durabilidade dos materiais empregados.

A inserção de uma estrutura em um meio suficientemente agressivo levará à


formação de patologias em uma velocidade mais elevada do que em um
processo natural de deterioração. Como forma de evitar patologias nesses
ambientes, tem-se a diminuição dos intervalos de inspeção e o aumento da
perícia e precisão.

As construções brasileiras estão normalmente sujeitas a condições ambientais


agressivas, devido às características climáticas verificadas no País. A elevada
temperatura média anual e a média amplitude térmica diária, a alta salinidade
do litoral, a incidência pluviométrica e a macrodinâmica de ventos são alguns
dos fatores que contribuem para a deterioração das edificações no País.

Outro aspecto importante nos processos de deterioração da estrutura é a


proximidade dela com o meio urbano ou rural. Essa proximidade afeta algumas
condições ambientais, tais como poluição, incidência de radiação e umidade
relativa, o que, por sua vez, interfere na velocidade de corrosão da estrutura,
tanto em construções metálicas quanto em estruturas de concreto armado.

Todos esses fatores ambientais devem ser considerados durante o processo de


inspeção das edificações. O conhecimento do ambiente em torno da construção
facilita e otimiza o diagnóstico da estrutura, além de possibilitar a aplicação de
técnicas mais precisas em sua recuperação. Deve-se considerar também as
características ecológicas do ambiente em que a construção está inserida.
Alguns meios, como praias, margens de rios e manguezais, são naturalmente
agressivos em função dos mecanismos fisiológicos dos organismos que vivem
ali. Por esse motivo, manifestações patológicas tendem a se intensificar nessas
regiões, exigindo maior atenção durante a vistoria. Mesmo em procedimentos
rotineiros de inspeção, a agressividade ambiental deve ser avaliada e
comparada com medições anteriores, observando-se então se houve
intensificação ou diminuição da agressividade.

Ausência de registro adequado

Muitos procedimentos de inspeção são realizados sem o devido registro das


atividades e ensaios realizados, de modo que não se tem uma análise final

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conclusiva sobre o estado da edificação. Além disso, para inspeções futuras, não
haverá referências e padrões para se inferir a evolução do estado de
conservação da estrutura.

Nesse sentido, é de extrema importância que todos os procedimentos sejam


devidamente descritos em relatórios, preferencialmente com conteúdo
fotográfico e resultados parciais obtidos. Não se deve esquecer que a inspeção é
uma coleta de dados que, posteriormente, servirá como base para qualquer
medida a ser adotada.

Representatividade das áreas analisadas

Algumas edificações apresentam detalhes estruturais e arquitetônicos


complexos, o que pode dificultar a observação dessas áreas. Em outras
situações, a área a ser analisada apresenta dimensões bastante grandes,
tornando a vistoria um processo oneroso e demorado. Nestes casos, os
responsáveis pelo processo de vistoria podem adotar soluções alternativas,
como a adoção de áreas de amostragem para detectar os principais problemas
generalizados da construção.

Entretanto, deve-se ter bastante cautela ao aplicar essa técnica, considerando-


se que uma quantidade significativa de informações relevantes pode ser
perdida, caso as áreas amostradas não sejam representativas do total da
edificação. Alguns sintomas podem ficar ocultos e revelarem graves patologias
no futuro. Portanto, o processo de inspeção realizado terá sido ineficaz perante
a estratégia de manutenção predial.

A importância da inspeção visual

A análise visual constitui uma etapa importante do processo global, pois permite
a observação da sintomatologia apresentada. A partir dessa análise, pode-se
recomendar a realização de testes, ensaios e verificações específicas em partes
da estrutura.

A inspeção visual deve incluir o uso de pequenos equipamentos auxiliares da


visão ou de localização, como binóculos, lupas e câmeras fotográficas com alta
resolução. Esses instrumentos são imprescindíveis para a precisão no resultado
final.

CASCUDO (1997) recomenda que a descrição da sintomatologia em estruturas


de concreto seja baseada nas seguintes verificações:

Fissuras no concreto paralelas à armadura (Figura 1);


Fragmentação e destacamento do concreto de cobrimento;
Lascamento do concreto;
Exposição de armaduras corroídas (Figura 2);
Acúmulo de produtos de corrosão nas armaduras expostas, formando
crostas;
Visível perda de seção das armaduras;
Comprometimento da aderência barra-concreto;
Flambagem das armaduras longitudinais de pilares;

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Manchas de ferrugem na superfície do concreto, denotando a migração dos


produtos de corrosão;
Deformações estruturais próximas a áreas com manifestações de corrosão.

Além destas, devem ser sugeridas as seguintes verificações para edificações:

Deterioração de elementos de acabamento;

Evidências de infiltrações na alvenaria;

Presença de fungos na alvenaria, com ênfase nas fachadas;

Grau de alteração do padrão arquitetônico da construção.

A descrição desses fatores deve ser feita de maneira detalhada, citando-se


todas as características observadas na estrutura e também condições
excepcionais encontradas na construção.

Os ensaios e testes são etapas importantes da inspeção de edificações. No


entanto, é a análise visual que permite ao avaliador ter uma noção da dimensão
superficial das anomalias.

Conclusões

Um bom programa de manutenção predial para edificações deve incluir


procedimentos periódicos de inspeção que levem em consideração o ambiente
no qual a construção está inserida, as condições prévias da estrutura, a análise
criteriosa dos métodos que serão utilizados para se diagnosticar os problemas
da edificação e também a importância da análise visual para a identificação da
extensão dos danos.

A gestão da manutenção predial é uma forma racional e pouco custosa para a


detecção preventiva de patologias e para a correta intervenção em construções
que apresentem danos. O estudo de caso corrobora a ideia de que a maior parte
das anomalias verificadas nas edificações é o resultado da negligência de seus
gestores em adotar programas eficientes de manutenção predial.

Espera-se que os conceitos aqui explicitados sirvam de base para a elaboração


de programas mais eficientes de manutenção predial e que estes sejam cada
vez mais adotados, de forma a se evitar que edificações sejam inutilizadas ou
necessitem de grandes projetos de recuperação, em função da não identificação
preventiva dos defeitos da construção.

Líbia da Costa Lourenço, Mestre em Engenharia Civil e Pesquisadora da Universidade Federal


Fluminense, Email: libia@vm.uff.br

Luiz Carlos Mendes, Doutor em Engenharia Civil e Professor Associado da Universidade Federal
Fluminense, Email: lcarlos@predialnet.com.br

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Leia Mais

O controle da corrosão de armaduras em concreto - inspeção e técnicas eletroquímicas. O.


Cascudo. Editora UFG, Goiânia, 1997.
Patologia, recuperação e reforço de estruturas de concreto. V.C.M. Souza; T. Ripper. São
Paulo, PINI, 1998.

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