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Revista EducAção 5 – GESTÃO, CURRÍCULO E DIVERSIDADE - PMSP

“O sonho é assim uma exigência ou


uma condição que se vem fazendo
permanente na história que fazemos e que
nos faz e re – faz” (Paulo Freire)

1
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO______________________________________________03

INTRODUÇÃO_________________________________________________04

CURRÍCULO NA PERSPECTIVA DA
DIVERSIDADE_________________________________________________06

CICLO NA REDE MUNICIPAL DE


ENSINO______________________________________________________16

GESTÃO DEMOCRÁTICA,
CURRÍCULO E A CONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO–
PEDAGÓGICO_________________________________________________23

FORMAÇÃO E
ACOMPANHAMENTO___________________________________________33

O CEU, A CIDADE E A
EDUCAÇÃO___________________________________________________40

AVALIAÇÃO - SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO


2003_________________________________________________________45

2
Apresentação
Este documento apresenta parte das reflexões e do
aprofundamento acerca dos temas priorizados pela Política Educacional da
Secretaria Municipal de Educação (SME) na revista EducAção nº 4 e no
Caderno Temático de Formação 1, estabelecendo uma interlocução entre eles
e atendendo à diretriz Qualidade Social de Educação, compreendida na
integração entre a Democratização do Acesso e Garantia da Permanência e a
Democratização da Gestão.
Os temas aqui apresentados não são novos, pois os mesmos
permeiam o cotidiano das Unidades Educacionais da Rede Municipal de
Ensino e trazem questões conhecidas pelos educadores e educadoras,
educandos e educandas. O que há de novo é a busca de caminhos, em
conjunto, para avançar na qualidade da educação oferecida à população da
cidade de São Paulo.
Esses temas deram sustentação ao processo de Formação e
Acompanhamento desencadeado na cidade desde 2001, sendo reorganizados
no Plano de Metas/2003-2004, na perspectiva da consolidação dos princípios e
dos eixos presentes nas diretrizes traçadas pela Secretaria Municipal de
Educação para esta gestão (2001-2004).
Destaca-se o caráter reflexivo dos textos, na busca do diálogo
com educadores e educadoras, educandos e educandas sobre os temas aqui
apresentados e a construção coletiva dos mesmos, envolvendo as equipes da
Diretoria de Orientação Técnica e das Coordenadorias de Educação das
Subprefeituras, durante o processo de formação desencadeado em 2003 pela
SME.
Assim, a Secretaria Municipal de Educação, atendendo aos
princípios de descentralização, autonomia e participação e na perspectiva de
fortalecer as diretrizes de inclusão, humanização e de cidadania ativa, convida
a todos e a todas a partilharem deste diálogo, buscando garantir a apropriação,
manifestação e produção cultural das crianças, adolescentes, jovens, adultos e
idosos.
Cida Perez
Secretária de Educação

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INTRODUÇÃO

O diálogo proposto neste documento, presente nos


questionamentos de cada um dos textos, traz definições e indagações com
relação aos temas priorizados pela Política Educacional da Secretaria
Municipal de Educação (SME) na revista EducAção nº 4 e no Caderno
Temático de Formação 1, estabelecendo uma interlocução entre eles.
O conjunto dos temas constitui-se em instrumento para garantir
as discussões curriculares, integradas à gestão e à formação, a partir da
problematização das práticas, para que o currículo vivido possa considerar os
princípios da inclusão social.
Iniciamos este diálogo com o texto “Currículo na Perspectiva da
Diversidade”, no qual o currículo é definido como a construção sócio-cultural e
histórica e instrumento privilegiado da constituição de identidades e
subjetividades.
A educação, neste sentido, está voltada para a humanização e
contribui com a construção de uma sociedade que assegura direitos sociais,
políticos, econômicos e culturais a todos e a todas e garante ações que
rompam com as práticas de exclusão.
O currículo constitui-se, assim, na Rede Municipal de Ensino,
pela totalidade das relações das Unidades Educacionais, envolvendo todos e
todas como educadores e educadoras, independentemente do espaço que
ocupam na construção da identidade da Comunidade Educativa.
Com o texto “Os Ciclos na Rede Municipal de Ensino”, reiniciamos
a interlocução sobre o tema tratado na EducAção nº 4, identificando e
contextualizando os diferentes modelos de organização escolar existentes e
propondo um olhar sobre o modelo de ciclos na Rede Municipal de Ensino
(ciclos com blocos de séries), na perspectiva de avançar rumo à concretização
dos ciclos de formação.
Destacamos, no texto “Gestão Democrática, Currículo e a
Construção do Projeto Político Pedagógico”, a importância de tornar todos
protagonistas das situações decisivas e questionadoras dos processos
instaurados nas Unidades Educacionais. Pretendemos o diálogo que articule os
diferentes papéis exercidos pelos autores/atores da Comunidade Educativa,
possibilitando que todas as vozes sejam ouvidas e suas idéias consideradas. A
Gestão Democrática refere-se principalmente ao direito à aprendizagem de
todos e todas na perspectiva da emancipação social, da inclusão, do diálogo e
da construção de novas marcas para a participação e para o protagonismo.

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No texto “Formação e Acompanhamento”, consideramos a
concepção freiriana de Formação Permanente por acreditarmos na
possibilidade de todos e de todas, pela práxis, explicitarem as suas opções
quanto aos saberes eruditos, saberes da experiência e saberes instituídos
propondo a transformação da ação educativa.
Acreditamos que as Unidades Educacionais são pólos de
manifestação e produção cultural e histórica e que possibilitam a culminância
do exercício da tarefa de construir algo que pertence a vários e que não é
posse de um único sujeito. Nesse espaço, a formação pretende transformar as
relações de exclusão e de alienação dos sujeitos, para que não permaneçam
na condição de silenciados e de oprimidos.
No texto, “O CEU, a Cidade e a Educação”, apontamos o Projeto
CEU (Centro Educacional Unificado) como pólo de integração local de
diferentes Secretarias, concretizando a perspectiva da intersetorialidade local e
pretendendo romper com as situações antagônicas vividas simultaneamente na
cidade de São Paulo. Esse texto nos desafia a pensar na concretização da
interação dos espaços de esporte, de lazer e de irradiação e produção cultural
no sentido da construção curricular, potencializando, assim, os pensares e
fazeres de todas as Unidades Educacionais para que transformem todos os
ambientes internos e externos em espaços pedagógicos. Concretiza, assim, o
atendimento integral e integrado prescrito no corpo da legislação construída:
Constituição Federal, Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei de Diretrizes e
Bases, Lei Orgânica da Assistência Social e Lei Orgânica do Município.
Apresentamos também, neste documento, alguns destaques
referentes à avaliação da trajetória da SME, nesta gestão, realizada em
diferentes espaços de atuação e de reflexão de todos os seus integrantes,
bem como propostas para 2004.
Portanto, dando continuidade ao diálogo iniciado pelas revistas
EducAção nos 1, 2, 3 e 4 e pelo Caderno Temático de Formação 1, propomos
refletir sobre as marcas apontadas em direção à construção do currículo sócio-
cultural e histórico sob a perspectiva da diversidade.
Marívia P. S. Torelli
Diretora de Orientação Técnica

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CURRÍCULO NA PERSPECTIVA DA DIVERSIDADE

“Não basta criar um novo conhecimento, é preciso que alguém se reconheça nele. De nada
valerá inventar alternativas de realização pessoal e coletiva, se elas não são apropriáveis por
aqueles a quem se destinam”

Milton Santos
A ausência de uma preocupação efetiva com a escolarização das
mulheres, negros, indígenas e brancos pobres é uma das marcas mais
significativas das ações da metrópole portuguesa, no período colonial, séculos
XV-XVIII, bem como do Estado Brasileiro a partir da sua constituição, ou seja,
no Império ou na República, século XIX. Tal fato se altera apenas no começo
do século XX, quando da expansão industrial e urbana, obedecendo à lógica
dos interesses do capital industrial que, naquele momento, necessitava de
mão-de-obra minimamente qualificada para o trabalho.
As primeiras preocupações com o currículo, no Brasil, datam dos anos 20. Desde então,
até a década de 1980, o campo foi marcado pela transferência instrumental de teorizações
americanas.
(Lopes e Macedo,
2002:13)

A presença de um grande contingente de pessoas estudando em


escolas públicas, incluindo as creches, é um fenômeno ainda muito recente
entre nós, datando dos anos 60 e 70, um ato de preparação das classes
populares como mão-de-obra qualificada e barata.
Simultaneamente, o conceito de currículo passa a ser objeto de
discussões entre os pesquisadores da educação brasileira. Apenas em 1980,
uma instituição desvinculada do governo e ligada às questões da educação, a
Associação Nacional de Pesquisa em Educação (ANPED), criou um grupo de
trabalho sobre currículo. Foi realizado o primeiro Seminário de Tendências e
Prioridades de Currículo na Realidade Brasileira em 1984, na cidade de São
Paulo, ligado ao programa de pós-graduação em currículo e supervisão da
PUC-SP.
Essa cronologia nos ajuda a entender a relativa novidade das
discussões curriculares no Brasil e aponta a grande contribuição daqueles
preocupados em problematizar os arranjos hegemônicos da sociedade
capitalista, colocando o dedo numa lógica que sempre respondeu aos
interesses das elites deste país.
Pensar educação hoje, do ponto de vista democrático, é pensá-la na
perspectiva de construir uma sociedade capaz de assegurar direitos sociais,
políticos, econômicos e culturais a todos os brasileiros e brasileiras. É garantir
que as diferenças de classe, raça/étnicas, etárias, de gênero e sexualidade não

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signifiquem processos de legitimação de hierarquias sociais e exclusão. A
educação deve, necessariamente, estar voltada para a humanização.
É nesse contexto que se inserem as reflexões e provocações que
faremos sobre currículo. Conceituamos currículo como construção sócio-
cultural e histórica. Aqui, não estamos falando de currículo como grade
curricular ou rol de disciplinas. Sobre o que estamos falando então?
Refletir sobre currículo no Brasil nos remete à origem etimológica da
palavra currículo que, no latim curriculum, significa pista de corrida. Esta pista
de corrida, que corta e recorta o Brasil em todas as direções, nos revela como
tem sido construída a (in)visibilidade de atores e autores sociais como negros,
indígenas, mulheres, crianças, adolescentes, idosos e dos trabalhadores com
seus marcadores identitários plurais (gênero, sexualidade, religiosidade,
classe, raça/etnias, região e pessoas com deficiência sensorial, física, mental
e distúrbios globais do desenvolvimento) .
É como se olhássemos uma tela de pintura onde diversas pessoas
estivessem presentes, mas poucos conseguissem enxergá-las. As diversas
formas de registro não enfatizam a presença dessas pessoas nessa pista onde
nos formamos.
O silêncio e o silenciamento constituem uma forte marca sobre a
presença desses sujeitos. Mas não os vimos, não encontramos registros que
dão conta desse percurso. É como se não tivessem maior importância na
constituição de nossa formação histórica. A necessidade de assegurar visibilidade
aos silenciados na construção curricular, está articulada a um movimento mais geral de
mudanças na sociedade.
O Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos do Município de São Paulo – MOVA-SP é um verdadeiro
exercício de cidadania, em parceria com os movimentos populares.

Neste sentido, os saberes acumulados com a participação da


sociedade (trabalhadores, lideranças comunitárias, movimentos populares e
sociais, ONG - organizações não-governamentais, grupos religiosos e partidos
políticos) inserem-se na Unidade Educacional a partir de: crianças,
adolescentes, jovens, adultos e idosos, que interagem construindo uma rede de
relações com o território.
Inserimos os objetivos do Projeto Vida, Recreio nas Férias e
Programas Especiais da Secretaria Municipal de Educação no bojo desta
discussão, assim como outros projetos e programas que constituem,
efetivamente, currículo. Na maioria das vezes a Unidade Educacional
considera isso à parte, um hiato na vida de educandos e educandas que não
influencia no seu ser e estar na Unidade.

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As ações do Projeto Escola Aberta ou do Recreio nas Férias, do
Educom.rádio colocam em foco atores e autores da Comunidade Educativa
que participam da construção curricular, explicitam princípios da diversidade
cultural, praticam a gestão democrática, mobilizam as relações da escola com
a região, fortalecem vínculos, mas são desconsiderados como currículo pela Unidade
Educacional.
Os Centros Educacionais Unificados (CEU), sem dúvida, se inserem
nesta perspectiva de currículo, pois “a arquitetura do CEU, ao integrar
diferentes atividades, forma um ambiente propício para o letramento, não só de
crianças, mas também de jovens e adultos; permite novas relações (formas de
convivência) e, conseqüentemente, novas formas de aprendizagem”. (gestores
do CEU - Formação de Formadores, 13/8/2003).
A concepção do Projeto CEU potencializa a constituição da Rede de
Proteção Social, fundamental para consolidação da Cidade Educadora, cujo
Projeto Político-Pedagógico do CEU, necessariamente, efetiva a relação com
a cultura local, com práticas de letramento existentes, com expectativas de
acesso e inserção da comunidade. Deve ser planejado no coletivo, com
contribuições dos grupos organizados da região, articulando com a
Coordenadoria de Educação, com as Unidades Educacionais próximas e com
as diferentes iniciativas educacionais.
Esse processo de participação coletiva, constitui o CEU como pólo na
interlocução com todas as Unidades Educacionais do entorno, como locus de
participação de todos e todas nas práticas educacionais problematizadoras e
propositivas. Processo que se estende a todas as Unidades Educacionais da
Rede.
Esse quadro evidencia o currículo que está presente nos diversos
tempos e espaços escolares como a convivência entre as pessoas, o intervalo,
os pátios, as refeições, a sala dos professores e professoras, os parques, as
quadras, o portão, a piscina, as demais salas da Unidade Educacional, além da
manifestação e produção de saberes. Currículo como instrumento privilegiado
de construção de identidades - que não se constroem senão na relação com os
outros (crianças e crianças, adultos e crianças, adultos e adultos) - e
subjetividades, num contexto sócio-cultural, político e histórico.Manifesta-se na
relação entre sujeitos, permeada pelo exercício do poder.
Historicamente, a critica às relações verticalizadas, muitas vezes, foi
respondida com exílio, exposição pública, objetivando fragilizar o ato de
divergir. Para que falas dominantes e vozes silenciadas sejam efetivamente

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superadas como um desafio que mobiliza todos os atores e autores presentes
nos fazeres da escola, é necessário “... um sensível olhar pensante”
(Martins,1992), assim como ouvidos atentos.
Como respondemos às críticas em nosso fazer pedagógico?
Partindo do pressuposto que currículo não está desvinculado da
gestão, como está a Gestão na nossa escola? Como exercemos o poder?

Nessa visão de currículo, todos e todas são educadores e educadoras,


independentemente do espaço que ocupem na Unidade Educacional. Então,
na nossa perspectiva, currículo é a totalidade das relações que se estabelecem
nesses espaços. A centralidade está nos sujeitos e nos processos vividos, em
que se compreendem, reconhecem, consideram e incorporam as diferenças
como identidade dos sujeitos, na perspectiva histórica da transformação social.
Tem a ver fundamentalmente com o nosso fazer pedagógico, com nossas
práticas.
Então, é necessário perguntar: como estão nossas práticas? Como
a diversidade está presente no Projeto Político-Pedagógico da Secretaria
Municipal de Educação - órgão central, Coordenadorias e Unidades
Educacionais?
Nos diferentes espaços educativos, por exemplo: Como educadores e
educadoras consideram a diversidade? Essa diversidade é tematizada?
Pensa-se em construir materiais pedagógicos que contemplem a
diversidade presente na sociedade brasileira? Consideram que a
exclusão e a invisibilidade influenciam no processo de ensino e
aprendizagem?
O processo de discussão curricular vivido pela Secretaria Municipal de
Educação, tendo como uma de suas produções o Caderno Temático de
Formação 1, problematiza a prática dos educadores, educadoras, educandos e
educandas no que diz respeito à diversidade.
Um exemplo é a prática do racismo, da discriminação racial e do
preconceito explícito ou velado que provocam a expulsão de educandos e
educandas de nossas Unidades Educacionais.
Poderíamos também falar de diferentes integrantes da Comunidade
Educativa (professores, auxiliares de desenvolvimento infantil, diretores,
coordenadores pedagógicos, agentes escolares, vigias, família e comunidade)
que contribuem para a expulsão da Unidade Educacional de educandos ou de
educandas em função de sua orientação sexual (heterossexual, homossexual

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ou bissexual) ou de gestos corporais, vividos por esses, que não condizem com
o padrão imposto pela sociedade para menino ou menina.
Para além da denúncia com base na legislação anti-discriminatória nós,
educadores e educadoras, temos que nos perguntar: como resolver esses
casos numa perspectiva pedagógica?
Existem, ainda, os que categorizam os educandos e as educandas pelo
seu modo de vestir, não considerando calças largas, bonés, miniblusas e tênis
como manifestações culturais e identitárias próprias de uma geração,
encaixando-os em critérios de marginalidade ou promiscuidade.
Sob a perspectiva da diversidade, é fundamental pensarmos naquela
criança, adolescente, jovem, adulto ou idoso com deficiências físicas,
sensoriais ou com distúrbios globais de desenvolvimento, invisíveis nas últimas
carteiras da sala de aula ou nos cantos da Unidade Educacional,
desconsiderados ou desconsideradas no processo de ensino e de
aprendizagem quer pelo preconceito de percebê-los incapazes, quer pelo fato
de não sabermos o que fazer com eles e elas.
A visão de currículo, na perspectiva da inclusão, considera as crianças
e os adolescentes cumprindo medidas sócio-educativas. Eles, muitas vezes,
têm visibilidade extrema nas Unidades Educacionais, mas são colocados à
margem quando pensamos uma Unidade Educacional para todos e todas.
Poderíamos também falar no caso de nossos educandos e educandas,
família, ou mesmo, educadores e educadoras nordestinos ou descendentes
que escondem sua identidade para não serem submetidos a situações
vexatórias e humilhantes nas nossas Unidades Educacionais, vítimas de
preconceitos quanto à sua região de origem.
Para além das situações apresentadas, a concepção de currículo como
construção sócio-cultural e histórica problematiza essas situações de exclusão
e invisibilidade vivenciadas na relação entre educadores e educadoras, entre
educandos e educandas.
Essas situações e tantas outras apresentam o desafio de reconhecê-
las em todas as modalidades de ensino e espaços das Unidades Educacionais:
salas de aula, de coordenação, de direção, de informática e de leitura,
secretaria, parques, berçário, ambientes de recreio e de jogos de faz de conta,
enfim, em todos os espaços relacionais.

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Pensando essas situações, poderíamos perguntar: a prática
pedagógica tem sido transformada nas Unidades Educacionais na visão
de educação inclusiva proposta na revista EducAção 4?
A formação inicial e permanente que propomos tem sido orientada para
o diálogo com o tema da diversidade. Pensamos que a formação do educador
exerce influência direta na sua visão sobre os sujeitos (negros, indígenas,
mulheres, homossexuais, pessoas com necessidades especiais e os vários
agrupamentos urbanos).
Educadores e educadoras, de várias regiões do Brasil, estão repensando o seu fazer
pedagógico, propondo e desenvolvendo experiências de promoção da igualdade no ambiente
escolar.
Essas experiências têm se constituído como referencial no processo de formação de formadores, na
construção de materiais pedagógicos, nas discussões de currículo e na construção do Projeto Político
Pedagógico nas Unidades Educacionais.

Se a formação inicial que os educadores trazem não dá conta de uma


visão positiva sobre o africano ou a população negra brasileira, as
comunidades indígenas, os migrantes, a mulher, as diferentes orientações
sexuais, a invisibilidade da pessoa com deficiência sensorial, física, mental e
distúrbios globais do desenvolvimento, consideramos de fundamental
importância que os momentos de formação permanente sejam pautados por
essa discussão, no sentido de educar o olhar de nossos educadores e
educadoras para a diversidade presente na sociedade brasileira, contribuindo
para a melhoria dos processos de ensino e de aprendizagem, bem como das
relações sociais.
Uma iniciativa da Secretaria Municipal de Educação para fortalecer a
tradição e a cultura guarani é o Projeto CECI – Centro de Educação e Cultura
Indígena, que atenderá crianças e adolescentes indígenas em cada uma das
três aldeias guaranis existentes na Cidade de São Paulo: Aldeia Krucutu e
Aldeia Tenondé Porã em Parelheiros e a Aldeia Jaraguá Ytu no Jaraguá.
O CECI será uma extensão das comunidades indígenas, tendo como proposta fundamental: o fortalecimento
do modo de ser e de vida Guarani (nhandereko); a reafirmação da identidade indígena Guarani; a valorização
do saber e do conhecimento dos mais velhos (xe ramói); a recuperação de suas histórias, lendas, memórias
dos Guaranis; o fortalecimento das formas de transmissão da cultura oral; o resgate da educação Guarani,
através de currículo próprio, especificamente indígena; a valorização da língua materna, como forma de
preservação da realidade sociolingüística do povo Guarani e a divulgação da realidade e da cultura Guarani
para os não índios (juruás).

Educar o olhar na visão de currículo que defendemos significa dialogar


com a identidade cultural do educador e da educadora, do educando e da
educanda, com a concepção de ensinar e de aprender, com a democratização
das relações e, sobretudo, dialogar com a mentalidade de exclusão e
invisibilidade que perpassa a sociedade.
Educar a escuta na nossa visão de currículo, significa incorporar a
necessidade visceral da leitura e do exercício cotidiano de elaborar análise de

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conjuntura. É fundamental compreender as bases da formação do povo
brasileiro e se opor, explicitamente, a qualquer forma de discriminação, no
contexto nacional e internacional.
As escolas ora recusam as perguntas, ora burocratizam o ato de perguntar. A questão não está simplesmente
em introduzir no currículo o momento das perguntas ... A questão nossa não é burocratização das perguntas,
mas reconhecer a existência como um ato de perguntar! ... Radicalmente, a existência humana implica
assombro, pergunta e risco. E, por tudo isso, implica ação, transformação. (Freire, 1988:51).

Pensamos que tudo isso é possível a partir de uma metodologia com


base na dialogicidade a partir de:

a) A investigação, como primeiro momento, envolve o levantamento preliminar


com base em dados qualitativos e quantitativos coletados na Unidade Educacional e na
realidade local. Trata-se também de recolher informações divulgadas na sociedade (livros,
institutos de pesquisa, produção acadêmica) e colocá-las a serviço da implementação da
política educacional, do ponto de vista da diversidade.
b) A problematização, ao utilizar a pesquisa participante como
elemento fundamental, objetiva caracterizar a rede de relações que perpassa a
Comunidade Educativa, desvelando a intencionalidade dos sujeitos históricos e
de suas ações. O cerne da questão é perceber os limites explicativos da
Comunidade Educativa, suas contradições e a tomada de consciência das
diferenças na forma de compreender e atuar na realidade. Essa
problematização visa a análise das práticas em busca das soluções e
superações de situações despercebidas ou percebidas parcialmente e não
analisadas.
c) A sistematização é estabelecida a partir do diálogo entre
educadores, educandos e a produção teórica, criando uma rede de relações,
ultrapassando o que aparece como “senso comum”, possibilitando análise e
produção de sínteses de situações vivenciadas individualmente ou
coletivamente. Essa ação provocará, sem dúvida, um diálogo com o currículo
estabelecido, reavaliando-o na perspectiva da construção da Qualidade Social
da Educação e da escolha de conteúdos significativos das diferentes áreas de
conhecimento que contribuam para a emancipação dos sujeitos envolvidos no
processo.
d) Apreensão crítica é a escolha do ponto de partida para a construção
da prática pedagógica. Significa dar consistência à prática, conceber todos
como sujeitos históricos em emancipação, referência fundamental para a
compreensão das práticas. Compreender a realidade vivenciada como rede de
relações e elaborar um plano de ação que articule as “práticas pedagógicas
transformadoras da realidade concreta”. (Gouvêa, 2003).

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e) A avaliação, a partir dos registros e subsídios da prática (vivências
cotidianas), da identidade forjada, das sínteses produzidas provisoriamente,
das pesquisas, dos livros, da produção acadêmica, tendo como foco os
espaços educativos e o trabalho com os educandos e educandas. Ela é um
diálogo entre os atores e autores do processo educacional.
A educação é base para a transformação da dinâmica de uma
sociedade, em que as oportunidades reais de inserção no mercado de trabalho
e a manifestação e produção cultural são determinadas, em parte, pelo grau de
instrução. O fato de sermos herdeiros de uma educação de matizes culturais
europeus faz com que questões relativas à diversidade sejam desconsideradas
e suas especificidades abortadas. Raramente concepções de mundo
relacionadas à territorialidade dos educandos e educandas estão presentes no
currículo.
“O papel do lugar é determinante. Ele não é apenas um quadro de vida, mas um espaço vivido,
isto é, de experiência sempre renovada, o que permite, ao mesmo tempo, a reavaliação das
heranças e a indagação sobre o presente e o futuro. A existência naquele espaço exerce um
papel revelador sobre o mundo.” (Santos, 2000:114)
Como os espaços micro e macro dialogam na construção do
currículo?
Viabilizar a proposta de currículo tem a ver, fundamentalmente, com
o reconhecimento dos sujeitos e sua identidade e a potencialização do ler e
escrever como desafio de todos, a construção da cultura da infância, do
adolescente, do jovem, do adulto e do idoso. Inserir questões relativas à
diversidade no Projeto Político-Pedagógico das Unidades Educacionais e
propor a participação desses sujeitos na vida política e social da região e da
cidade significa melhorar as condições básicas de vida, bem como de ensino e
de aprendizagem. Neste sentido, o papel dos educadores é preponderante,
sobretudo na construção da identidade da Comunidade Educativa.
A Unidade Educacional é local de exposição de idéias, diálogo de
saberes, debates, reflexões e não espaço de omissão e negação das
contradições existentes nas relações educacionais, sociais e étnicas. Ela não
pode negar as diferenças e desigualdades e, muito menos, deixar de ponderar
sobre os fatores históricos, sociais, políticos e econômicos como determinantes
da situação de vida de parcela significativa da população brasileira.
- Como estão as práticas educativas na nossa Unidade
Educacional? Como a diversidade está presente no Projeto Político-
Pedagógico?

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- Que espaços vocês educandos e educandas consideram
importantes para sua participação na Unidade Educacional?
- Que espaço a Secretaria da Escola ocupa no currículo da
Unidade Educacional?

- Como são construídas alternativas de formação dos educadores,


considerando todos os segmentos da Unidade Educacional?

- Como vocês educadores ou educadoras pensam o currículo? O


que está sendo construído nos espaços educativos do ponto de vista do
currículo?

- Como os Auxiliares Técnicos Educacionais I, Vigias, Agentes


Escolares e Auxiliares de Direção compreendem sua função como ação
educativa?

- Como vocês, educandas e educandos e as famílias, participam


da discussão e definição do currículo?

Essas e outras questões apontam para que pensemos currículo sob a


perspectiva da diversidade e exige de nós uma reflexão sobre a organização
da Unidade Educacional em ciclos.

Referências:

CARDOSO, SANTANA, BARROS e MOREIRA. Os livros tradicionais de


currículo. In: Cadernos CEDES 13. 1984. p. 3-25.

FREIRE, P. e FAUNDEZ, A. Por uma pedagogia da pergunta. Rio de Janeiro :


Paz e Terra, 1985.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1984.

LOPES, A. C. e MACEDO, E. Currículo: debate contemporâneo. São Paulo :


Cortez, 2002.

MARTINS, M. C. Aprendiz da arte: do sensível olhar pensante. São Paulo :


Espaço Pedagógico, 1992.

MOREIRA, A.F.B. Currículos e Programas no Brasil. Campinas: Papirus, 1990.

______________. Currículo: Questões atuais. Campinas : Papirus, 1997.

14
______________. Currículo: Políticas e Práticas. Campinas. Papirus, 1999.

PORTINARI, C. Escravos. 1943. http://


www.portinariorg.br/IMGS/ipgobras/Oam_4941.jpg. Acesso em 24/12/2003.

SANTOS, M. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência


universal. Rio de Janeiro : Record, 2000.

SILVA, A.G. Reorientação Curricular na perspectiva crítica e da Educação


Popular. São Paulo : 2003.

Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. Revistas EducAção 1, 2, 3 e


4. São Paulo : SME/SP, 2001-2003.

Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. Caderno Temático 1 “Leitura


de Mundo, letramento e alfabetização: diversidade cultural, gênero,
sexualidade e etnia. São Paulo : SME/SP, 2003.

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OS CICLOS NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO

“Os tempos e espaços escolares devem ser reorganizados, liberando as unidades


escolares da ‘prisão’ a que se sentem submetidas por força das ‘grades horárias e
curriculares’ e permitindo a flexibilização na apresentação dos conteúdos
programáticos.” Programa para área da educação - Governo Lula

A forma de organização do Ensino Fundamental em ciclos tem sido


tema de debates, tanto no âmbito dos grupos que elaboram políticas públicas
de educação quanto nos grupos de professores e equipes técnicas das escolas
que trabalham com crianças, adolescentes, jovens e adultos. Essa discussão
chega também aos grupos de pais e mães de alunos que, ao ouvir críticas ao
modelo de organização do ensino em ciclos, trazem questões para as escolas
que ainda permanecem sem resposta. Dessa forma, a organização da escola
em ciclos é um dos eixos do programa de formação assumido por nós e
descrito na revista EducAção nº 4.
Atualmente, no Brasil, são três os modelos de organização escolar
mais freqüentes: a escola estruturada em séries, em ciclos (bloco de séries) ou
progressão continuada e a estruturada em ciclos de formação. Nossas escolas
de Ensino Fundamental estão organizadas em ciclos (blocos de séries) e aqui
estamos propondo iniciar o caminho rumo aos ciclos de formação.
Os ciclos de formação requerem esforços no sentido de uma efetivação
do currículo sócio-cultural e histórico, dos tempos e dos espaços de
escolarização (liberando-os das “grades” a que se encontram tradicionalmente
submetidos), considerando os educandos e educandas reais de nossas
Unidades Educacionais, tanto sob o ponto de vista de seus processos de
aprendizagem, como dos diferentes tempos de vida (infância, adolescência,
juventude e mundo adulto) e de suas culturas de origem.

A estrutura escolar seriada

A escola organizada em séries reflete a mesma lógica de uma linha de


montagem industrial: a organização taylorista/fordista do trabalho. O Ensino
Fundamental, no final do século XIX, deveria encarregar-se de formatar os
trabalhadores ou “homens-boi”, segundo Taylor, tornando-os disciplinados,
dóceis e de fácil adaptação.

16
Em decorrência dessa lógica, o currículo foi tratado de forma
estritamente técnica: as disciplinas consideradas essenciais para o mundo do
trabalho moderno foram divididas ao longo da semana, cabendo a cada uma
delas a duração de um tempo que permitisse ter mais do que uma matéria a
cada dia. A divisão do ensino em séries foi planejada para que as provas finais
antecedessem o período de contratação de novos operários. Com tais
objetivos, os tempos estabelecidos para a escolarização foram tratados de
forma absolutamente alheia às necessidades de formação humana e cidadã.
Do professor exigia-se que fosse um mero técnico em reproduzir
conteúdos pré-estabelecidos. Os professores passaram a ser objetos de
controle externo: enquanto os livros didáticos definiam a quantidade e o ritmo
de conteúdos a serem repassados, o trabalho desenvolvido passou a ser
controlado por meio dos diários de classe e o rendimento de sua produção
(quantidade de alunos preparados para ingressar no mercado de trabalho, a
cada ano) controlado por inspetores. Portanto, não cabia ao professor produzir
e planejar os conteúdos e procedimentos de aprendizagem, o que resultava (e
resulta) na fragmentação dos conhecimentos escolares: produto típico da
escola organizada em séries.
Cerca de 80% das escolas brasileiras são organizadas em séries e 20% em ciclos e em ciclos
de formação. Esses dados demonstram a falácia de se atrelar aos ciclos e ciclos de formação a
presença de alunos e alunas com dificuldades de leitura e escrita ao final do Ensino
Fundamental.
Em síntese, sob tal estrutura, o currículo foi (e é) entendido como
listagens de conteúdos a serem transmitidos aos alunos. Ensinar foi (e é)
sinônimo de transmissão de informações seqüenciadas, desde as mais simples
até as mais complexas. Avaliar foi (e é), pois, selecionar os que aprenderam, o
que foi transmitido pelo professor. Quem consegue provar que aprendeu
continua a seqüência de conteúdos estabelecidos para a próxima série. Caso
contrário, repete de ano, sendo abandonado dentro ou fora da Unidade
Educacional, gerando um histórico de fracasso que vai muito além do escolar -
repercute na história de vida pessoal e profissional dessas pessoas. Podemos
dizer que a organização do ensino de forma seriada é excludente, por
natureza.

A estrutura escolar
por ciclos (blocos de séries)

A partir da década de 90, com a educação em pauta nos círculos


políticos mundiais, governos estaduais, municipais e até o federal, de matizes
17
ideológicos diversos, questionaram a estrutura seriada propondo novos
modelos de organização do tempo escolar.
Alguns sistemas educacionais flexibilizaram a rigidez do sistema
seriado organizando o Ensino Fundamental em ciclos que agrupam blocos de
séries, propondo compreender currículo para além de listagens de conteúdos.
Na Rede Municipal de Ensino, a implementação dos ciclos se
concretizou a partir de um conjunto de ações da política educacional, à época,
quais sejam: as discussões sobre avaliação como processual, contínua e
como referencial ao processo de planejamento e replanejamento das
atividades de ensino marcadas pela concepção sócio-construtivista. O trabalho
coletivo foi concebido tanto como forma de construção curricular, como de
formação profissional. O que levou à efetivação da jornada de trabalho dos
professores contemplando momentos de trabalho coletivo nas Unidades
Educacionais, uma conquista significativa.
A organização da escola em ciclos foi um avanço significativo na
direção da construção da Qualidade Social da Educação, interferindo
diretamente no campo conceitual e metodológico das áreas do conhecimento,
consolidando o respeito aos diferentes tempos e espaços do ensinar e do
aprender.
Assim, acreditamos que podemos (re)iniciar nosso percurso em direção
aos ciclos de formação, em que o centro da construção curricular são os
educandos e educandas, considerando a concepção de territorialidade já
expressa neste documento, não as áreas do conhecimento.

A estrutura escolar
por ciclos de formação

Ao perguntarmos qual a origem do ciclo de formação, teremos uma


série de respostas voltadas para administrações ou alguns educadores e
educadoras identificados como progressistas. Mas é importante lembrar que a
proposta de organizar os tempos escolares em ciclos de formação surgiu na
França, em 1936, com Jean Zay, e ganhou novo impulso, anos mais tarde,
após a 2ª Guerra Mundial, na reforma francesa Langevin-Wallon.

Na cidade de São Paulo, na gestão 89/92, destacamos as reflexões e ações pioneiras


realizadas no sentido de compreender a organização da escola em ciclos de formação.A
implantação de ciclos em 1992, da forma como estão delineados no Regimento Comum das
Escolas Municipais, veio consolidar as discussões sobre a integração gestão - currículo -

18
interdisciplinaridade, realizadas desde 1989. Nos anos que se seguiram a essa gestão, a falta
de implementação da organização político-pedagógica das escolas em ciclos, que possibilitaria
reflexões permanentes sobre sua concretização, provocou o retorno e a permanência de
muitas escolas, explícita ou implicitamente, às estruturas seriadas ou em blocos de séries.

A escola organizada em ciclos de formação rompeu com a estrutura


seriada e seus princípios ao redefinir o tempo escolar a partir dos educandos e
educandas: de seus desejos, interesses e necessidades, a partir das interações
de cada tempo de vida, ou seja, infância, adolescência, juventude e idade adulta.
Com Miguel Arroyo (1996) afirmamos que a Unidade Educacional, na
perspectiva dos ciclos de formação, precisa ser compreendida como um tempo
e espaço bastante especial, um palco em que as gerações se encontram, em
que todos são, simultaneamente, educadores, educadoras e aprendizes. E
mais, nos faz pensar que o cotidiano escolar, dentro e fora das salas de aula, é
ocasião permanente de construção de currículo e de aprendizado, de como
lidar com pessoas, como perceber e acompanhar seus processos complexos
de formação, manifestação e produção de saberes.
Esse aprendizado em serviço efetiva a formação dos educadores e
educadoras como profissionais dinamizadores de uma política educacional
inclusiva e de uma ética vivida no dia-a-dia. Desta forma,“(...) no fundo, o que
está em questão é uma maior sintonia com a dinâmica de construção social,
reconhecer a diversidade de sujeitos históricos. Superar uma visão demasiado
verticalizada que termina por fazer de todos nós vítimas e não sujeitos da
história. Nossa função não é apenas resistir a políticas verticais, mas construir
políticas democráticas” (Arroyo: 1996).
Assim, a concepção de ciclos de formação pressupõe o direito a uma
formação permanente e, para tanto, é preciso uma organização mais flexível e
coletiva em seus tempos e espaços, que considere a diversidade presente no
seu interior e exterior, buscando uma identidade profissional de cooperação,
participação e luta em defesa dos direitos dos educandos e educandas,
visando à apreensão da realidade, incentivando a pesquisa e a reflexão crítica.
O pensamento de Wallon é referencial na construção dos ciclos de
formação. Para ele, essa organização ressignifica o processo de aprender. Ela
surge como a estrutura que possibilita a formação do ser humano, tanto como
ser cultural e histórico, como ator e autor social.
Os ciclos de formação, na perspectiva do currículo, passam a ser
entendidos como um projeto de formação dos sujeitos. O processo de
aprendizagem não ocorre fora do contato com o ambiente sócio-cultural e

19
histórico que fornece aos sujeitos, e com eles (re) elabora, conteúdos culturais
(materiais ou simbólicos), interpretações, modos de agir, pensar, sentir, ser e
intervir no mundo.
É importante destacar que a organização escolar em ciclos de
formação continua a encontrar no registro um instrumento privilegiado. O
compartilhar entre educadores e educadoras registros contínuos do processo
de ensino e de aprendizagem de seus educandos e educandas possibilita o
levantamento de hipóteses a respeito do que tem garantido ou dificultado a
relação dos educandos e educandas com o saber, com a manifestação e
construção de conhecimento. A concepção de ciclos de formação reforça a
idéia de que todos podem ensinar e aprender.

Fazer valer os ciclos de formação:


um desafio para a
Rede Municipal de Ensino

O Ensino Fundamental, na Rede Municipal de Ensino, está, desde


1992, organizado em ciclos: inicialmente, três ciclos e, após 1998, inclusive na
modalidade Educação de Jovens e Adultos, em dois ciclos, agrupando o
equivalente a quatro séries em cada um.
A implementação dos ciclos de formação exige mudança no olhar e na
postura de todos e todas que atuam nas diferentes instâncias da Rede
Municipal de Ensino no sentido de subsidiar os educadores e educadoras para
as transformações na direção da opção político pedagógica que assumimos.
Exige uma transformação na organização dos tempos e dos espaços,
envolvendo a Comunidade Educativa em busca de sentido e de saídas para os
problemas enfrentados nessa construção. Exige a inclusão radical de todos e
todas no processo de apropriação, manifestação e produção de saberes
significativos, levando em conta as perspectivas de classe social, gênero,
sexualidade, raça/etnia e regionalidade, entre outros.
Mas, como nos aproximarmos dessa lógica de organização
escolar? Como planejar o cotidiano da Unidade Educacional sob a
perspectiva de ciclos de formação, considerando os ambientes
pedagógicos e de formação de educadores e de educadoras? Quais
práticas curriculares seriam, prioritariamente, revistas? Como envolver o
Conselho de Escola nessa discussão?

20
A mudança de olhar da Comunidade Educativa sobre ensinar e
aprender, na perspectiva freiriana, propõe também a mudança de olhar sobre a
forma como esses processos se organizam. Fazer valer os ciclos de formação
na Rede Municipal de Ensino exige efetivarmos as mudanças no sentido de
garantir que o educando e a educanda sejam o foco da construção curricular,
rompendo com o esquema tradicional de organização escolar a partir das áreas
de conhecimento.
Conhecer e validar a cultura da criança, do adolescente, do jovem, do
adulto e do idoso no nosso saber e fazer pedagógico é um dos passos para a
inclusão de todos no processo educacional. Entretanto, precisamos refletir
sobre o exercício do direito participativo e da criação de direitos, rompendo ou
não com a perpetuação das vozes dominantes.
Essas e outras problematizações podem alicerçar a Gestão Democrática
pretendida em bases sólidas, sustentadas pela inclusão, diálogo e avaliação
contínua, fortalecendo a construção de novos horizontes, no qual a
participação e o protagonismo sejam marcas inovadoras, revolucionárias e
indeléveis desta administração.

Referências

ARROYO, Luís Carlos de. Ciclos, seriação e avaliação: confrontos de lógicas.


São Paulo: Moderna, 2003.

FREITAS, Luiz Carlos de. Ciclos, seriação e avaliação: confrontos de lógicas.


São Paulo : Moderna, 2003.

GALVÃO, Izabel. Henri Wallon: uma concepção dialética do desenvolvimento


infantil. Petrópolis : Vozes, 1995.

LIMA, Elvira Souza. Ciclos e formação: numa reorganização do tempo escolar.


São Paulo : Sobradinho, 2002.

KRUG, Andréa. Ciclos de formação: uma proposta político-pedagógica


transformadora. Porto Alegre : Mediação, 2001.

LA TAILLE, Yves de. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em


discussão. São Paulo : Summus, 1992.

FREIRE, Ana Maria Araújo (org.). A pedagogia da libertação em Paulo Freire.


São Paulo : Unesp, 2001.

21
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE PORTO ALEGRE. Ciclos de
formação: proposta político-pedagógica da escola cidadã. In: Caderno
Pedagógico nº 9. Porto Alegre : SME/PA, maio/2003.

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO. Regimento


Comum das Escolas Municipais. São Paulo: SME/SP, 1992.

CD Rom – Encontro Nacional do Ensino Fundamental. Toda Criança


Aprendendo. Repensando o tempo e o espaço escolar. Ministério da
Educação. Secretaria da Educação Infantil e Fundamental.

22
GESTÃO DEMOCRÁTICA, CURRÍCULO E A CONSTRUÇÃO
DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO

“ A vida é uma teia intrincada em que cada ser se relaciona com muitíssimos
outros, numa coexistência de complementaridade e interdependência” Darcy Ribeiro
Assumir e defender uma gestão democrática exige de nós um
compromisso maior, muito mais ético, com a construção intencional de um
trabalho coletivo, no qual a participação não seja, simplesmente, o estar
fisicamente, mas sim, assumir uma postura embasada no ser sujeito de cada
um, na participação ativa, isto é, na co-autoria, na construção do coletivo e na
emancipação. A recente reorganização da cidade em Subprefeituras, com o
processo de descentralização do governo,tem dado um bom exemplo e,
embora ainda muito recente, já se pode sentir quais serão os reais benefícios
para a população em geral.
A gestão democrática como diretriz da Secretaria Municipal de
Educação não se resume ao movimento promovido nas Unidades
Educacionais por meio do conjunto das ações propostas pelos diferentes
projetos, como é o caso do Projeto Escola Aberta.
Na construção da Proposta Pedagógica da SME, desencadeamos um
movimento de construção coletiva entre os educadores e educadoras que
compõem as atuais Coordenadorias de Educação e as demais instâncias
dessa Secretaria – Assessoria Técnica de Planejamento e Diretoria de
Orientação Técnica – que objetivou refletir sobre as realizações do atual Ensino
Municipal e projetar as metas para 2003 e 2004. Esse movimento constituiu –
se de plenárias e de momentos de sínteses provisórias que culminaram na
escrita da revista EducAção nº4.
Esta trajetória percorrida, caracterizada pelo exercício da democracia,
consolidou – se como marca no processo de tomada de decisões por meio de
colegiados, considerando o princípio da participação democrática nas
diferentes instâncias da Secretaria.
Assim, buscando problematizar nossas práticas gestionárias, rumo a
uma gestão democrática, crítica e libertadora e trabalhando para a superação
da injustiça e da exclusão social na perspectiva de uma metodologia
investigativa, apresentamos algumas questões:
Quais as práticas de gestão democrática crítica e libertadora que
realizamos?

23
Nós, educadores e educadoras, como temos nos comprometido
com a gestão do Projeto Político Pedagógico da nossa Unidade
Educacional?
Os questionamentos se fazem necessários, pois temos atravessado,
especialmente nos últimos vinte anos, momentos na história brasileira de
grandes desafios sociais e políticos, para firmar nossas reivindicações de
direitos como cidadãos. Contextualizadas no momento histórico, político e
social, das décadas de 1970 e 1980, ocorreram grandes mobilizações da
população por meio de movimentos sociais e populares tais como: o contra a
carestia, o de moradia, por saúde, por educação, por creches.
É importante distinguir direitos humanos – inerentes a toda
pessoa humana – dos direitos do cidadão, que podem variar de acordo com leis e vínculos de
nacionalidade (Benevides, 1994:8)

Nesse mesmo período, houve a intensificação das reivindicações da


população que lutava por mais participação nas instâncias de decisões do
poder público, desde eleições diretas de diretores de escola até presidente da
república. (Camargo, 1997).
Muitas foram as formas de organização para viabilizar a participação.
Os conselhos, inclusive o de escola, surgiram nessa perspectiva, apresentando
avanços e retrocessos, de acordo com os princípios das administrações
municipais que se sucederam.
Tomaremos aqui como exemplo o Conselho de Escola, que no seu
início tinha um caráter consultivo e, na gestão 89 - 92, adquiriu caráter
deliberativo e tem hoje, garantido legalmente aos seus representantes a
participação nas tomadas de decisões da escola, um verdadeiro palco de
disputas de interesses dos diferentes segmentos. Entretanto, de um modo
geral, não tem garantido condições de igualdade aos participantes.
Retomar a construção crítica de uma cidadania cada vez mais
participativa, com cidadãos comprometidos com suas comunidades é ação que
se deve fazer no chão da Unidade Educacional. Para tanto, necessitamos de
diretores, coordenadores, vigias, agentes escolares, professores, auxiliares de
desenvolvimento infantil e famílias, ou seja, educadores e educadoras, que se
comprometam em construir permanentemente a participação crítica e ativa de
todos os segmentos envolvidos com suas práticas educacionais.
Esse fazer é difícil mas necessário. A história brasileira tem
conduzido as relações humanas, respaldada em valores autoritários, acríticos,
por meio de gestões verticalizadas, sustentadas por poderes econômicos,
políticos e privilégios, portanto, muito distante da dimensão da realização

24
humana com dignidade. Apesar de nossos conceitos estarem presentes em
nossos diálogos, tal traço histórico, não raro, manifesta–se em nossas práticas
pedagógicas cotidianas, que revelam não apenas o que sabemos fazer, mas os
valores que orientam nossos posicionamentos político–pedagógicos ao nos
confrontarmos com pontos de vista diferentes do nosso.
Assim, adquire importância a reflexão sobre saberes, fazeres e
valores verticalizados, que muitas vezes vêm à tona, quando nos utilizamos de
instrumentos de poder na resolução de inúmeras situações cotidianas.
Realizamos uma gestão educacional voltada para a inclusão e para a
promoção dos direitos, fazendo valer o papel social da educação e garantindo
uma gestão que possibilite em todos os espaços da Unidade Educacional, o
exercício do direito participativo de todos os segmentos nas tomadas de
decisões no que diz respeito aos destinos da Comunidade Educativa.
Este talvez seja o grande desafio da educação: desenvolver exercícios
de práticas cidadãs, pela consolidação da autonomia na realização de projetos
educacionais em que todos se sintam sujeitos na manifestação e construção
coletiva do conhecimento.
Assumimos o compromisso ético e a ousadia inovadora na forma de
gerir os espaços, os saberes, os tempos e as relações humanas, ao propormos
uma prática educacional comprometida com a emancipação individual e
coletiva e com as ações transformadoras das desigualdades e injustiças
sociais. Esse fazer educativo, que objetiva romper com as estruturas políticas e
econômicas que promovem a exclusão, nos desafia a buscar uma práxis que
responda às demandas postas por este tempo histórico.
Nesta perspectiva, indagamos: Qual/quais a(s) concepção /
concepções que sustentam as práticas de gestão defendemos?
Com base nessa pergunta, dialogamos com e sobre as nossas
possibilidades, no contexto das condições reais em que vivemos. Ao
verificarmos como estamos agindo em nossas organizações (estruturas,
normas e conhecimentos), muitas vezes, podemos reconhecer que limitamos
e/ou excluimos crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos da participação
ativa nos processos decisórios da comunidade.

Participação

A temática participação aqui considerada refere-se a como são e estão


sendo construídas as relações de poder dentro de cada instância do sistema
25
público, o que vivenciamos como participação e qual a implicação do
aprofundamento do tema para a construção do Projeto Político Pedagógico e
seus desdobramentos no Currículo praticado pelas Unidades Educacionais.
Participação Ativa é aquela “que institui o cidadão como portador de direitos e
deveres, mas essencialmente criador de direitos para abrir novos espaços de
participação política”. ( Benevides, 1994 p.9)
Para Bordenave (1985:22) participação é fazer parte, tomar parte, ter
parte ou sentir-se parte. Ocorre que há vivências diferenciadas de participação
nos espaços educativos, porque há também tipos e níveis diferenciados de
participação. Como é possível fazer parte sem tomar parte, na elaboração
do Projeto Político Pedagógico, na constituição do Conselho de Escola,
do Grêmio Estudantil e demais conselhos/colegiados? As formas de
participação que predominam nas instâncias de decisão revelam a
concepção de currículo de que estamos tratando?
Em muitos casos, a participação está vinculada apenas à execução de
tarefas (limpar a escola, cortar a grama, costurar e lavar cortinas, auxiliar de
diferentes formas nas festas), em horários e situações estratégicas
estabelecidas pela Unidade Educacional. É urgente que em nossas discussões
a participação tenha como eixo o envolvimento de todos e todas nas tomadas
de decisões de forma direta e indireta.
O Projeto Político Pedagógico, discutido e revisitado, deve ter na sua
centralidade todos autores e atores que utilizam e atuam nos espaços
educativos.
Por que mães e pais, geralmente, participam nas execuções de
tarefas e estão distantes das assembléias e das discussões do Projeto
Político Pedagógico e do Regimento Escolar? Como preencher esse
espaço pela comunidade?
Que canais de comunicação são estabelecidos entre educadores e
educadoras nas salas, nos berçários, no pátio, na secretaria, na cozinha,
tendo em vista um currículo que compreenda a manifestação e
construção de conhecimento, conteúdos, valores, atitudes e
emancipação? Como nossa Unidade Educacional trabalha com a
diferença diante de tantas identidades?
Que formação vem ocorrendo para garantir a participação ativa de
todos segmentos da sociedade?

Conselhos: um exercício participativo

26
Uma gestão pública que vem consolidando, em suas vivências
práticas, conceitos que sustentam a participação de todos os segmentos da
sociedade tem como compromisso ético, em especial na área educacional,
aprofundar experiências e exercitar inovações participativas, superadoras de
qualquer ato que signifique exclusão.
Assim, devemos organizar Conselhos nas Subprefeituras, nas
Coordenadorias de Educação, entre outros, que sejam expressões dos
interesses populares, possibilitando aos novos segmentos, que vêm se
constituindo como autores sociais em nossas comunidades, integrar-se nessa
construção democrática. Decisões coletivas sinalizarão os rumos políticos,
culturais e econômicos de nossas organizações sociais e políticas.
O Conselho de Escola é um colegiado formado por todos os segmentos da comunidade
escolar: pais, alunos, professores, direção e demais funcionários. Através dele, todas as
pessoas ligadas à escola podem se fazer representar e decidir sobre aspectos
administrativos, financeiros e pedagógicos. Assim, esse colegiado torna-se não só um
canal de participação, mas também um instrumento de gestão para a própria escola.
(Antunes, 2002 :21)
O Conselho Gestor dos Centros de Educacionais Unificados -
CEU, os Conselhos de Escola, os Conselhos do Centro de Educação Infantil,
os CRECE, que foram descobertos por muitos como instâncias de poder, e que
têm como responsabilidade maior, constituir decisões que atendam às
demandas públicas, devem estar abertos a alterações, mudanças que
possibilitem corrigir possíveis desvios dos caminhos democráticos,
contemplando assim a diversidade e demandas de nosso tempo.
A gestão do CEU, em particular, que acontece desde os primeiros
momentos de sua organização, articula seus diferentes colegiados (Conselho
Gestor do CEU, Grupo de Ações Integradas, Conselhos e Grêmios)
representativos das diferentes unidades que o constitui. Tal gestão
fundamenta–se numa perspectiva dialógica, socializada e ascendente com um
caráter permanentemente comunicativo e interativo entre os diferentes
equipamentos, respeitando suas especificidades educacionais.
A representação no Brasil permanece, efetivamente, uma representação no sentido
teatral: a representação do poder diante do povo e não a representação do povo diante
do poder. (Benevides, 1994:12)
Diante da realidade vivida no exercício da gestão, as dificuldades
se evidenciam principalmente em relação às questões da representatividade e
da paridade. Assim, a concepção de gestão, que se constrói a partir do CEU e
de experiências que ocorrem na RME, aponta para a ousadia de passos mais
radicais no exercício de uma democracia direta, por meio de assembléias

27
setoriais e ou gerais, em que os cidadãos possam decidir e avaliar nossas
diretrizes e políticas educacionais.
Na certeza de nossa coerência ética, devemos responder, na
prática, às questões que firmamos em nossos discursos.
O Conselho da Unidade Educacional tem garantido uma
proporcionalidade entre servidores públicos e população? Como?
Quanto ao funcionamento/reuniões: os horários, os dias, a pauta
(e sua elaboração) têm atendido os interesses e possibilidades da
comunidade?
Como a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e a Educação de
Jovens e Adultos têm sido representados nos espaços de gestão?

Protagonismo infanto-juvenil

O tema do protagonismo infanto-juvenil nos remete ao contido na


reflexão de uma adolescente, aluna da Rede Municipal de Ensino, realizada
num encontro entre os Coordenadores Pedagógicos das EMEF com o
professor César Muñoz (consultor espanhol da infância e da juventude e da
participação cidadã na cidade de Barcelona)::
“Eu acho muito estranho vocês falarem sobre o que nós adolescentes
queremos e decidir o que seria bom pra gente. Nunca ninguém pergunta pra
gente o que queremos ou do que nós gostamos. Nesses encontros, que são
pra falar da gente, nunca somos convidados para ajudar a decidir ou, pelo
menos, falar o que realmente nos interessa...”
Nós, adultos, geralmente, quando pensamos ou tratamos sobre
protagonismo infanto-juvenil, nos reportamos a um mundo que é o nosso, com
nossas idéias, com nossos valores, sem, em geral, ouvirmos, percebermos ou
mesmo enxergarmos a voz dos interessados.
Retomar os temas da infância e da adolescência possibilita considerar
o que crianças e adolescentes pensam, sentem e querem.

O que sabemos nós desse universo?

Muitos de nós, partindo deste questionamento, interpretamos, ou


tentamos compreender o mundo das crianças e dos adolescentes dessa
maneira. Entretanto, não podemos nos esquecer que o ambiente coletivo, ou

28
dos grupos nas Unidades Educacionais, diferencia-se do ambiente do jeito de
operar do grupo familiar.
A cidadania exige instituições, mediações e comportamentos próprios, constituindo-se
na criação de espaços sociais de lutas (movimentos sociais, sindicais e populares) e na
definição de instituições permanentes para a expressão política, como partidos,
legislação e órgãos do poder público (Benevides,1994:9)
Além disso, o protagonismo é a semente, a fagulha, a faísca, como nos
diz o professor César Muñoz, para a participação cidadã, um compromisso
político da Unidade Educacional. Falamos tanto em cidadania e que queremos
que nossos educandos e educandas sejam cidadãos, mas não nos
perguntamos, por exemplo, quais são os educadores da Rede Municipal de
Ensino que discutem ou já discutiram com seus educandos e educandas a
Constituição do nosso país? Quem de nós já discutiu o Estatuto da Criança e
do Adolescente, tanto coletivamente, com nossos pares na escola como com
nossos educandos e educandas? O que temos nesses documentos são as
bases para pensarmos a cidadania ativa e devemos, portanto, reportarmo-nos
com mais freqüência a esses documentos.
Se quisermos, de fato, que nossas crianças e adolescentes colaborem
na definição dos rumos da sua Unidade Educacional, do seu bairro, da sua
cidade e do seu país, temos que lhes oferecer instrumentos para tal.
O protagonismo infanto-juvenil se dá, desde a infância e a
adolescência, com o apoio dos educadores, educadoras e adultos. Todos
somos imprescindíveis no processo de mudança social. As crianças,
adolescentes e jovens necessitam ter voz para que possam construir sua
autonomia, promovendo a consciência crítica e a possibilidade de novos
olhares sobre sua forma de ver o mundo e as relações que nele se constituem.
Coerente com essa concepção, a SME desenvolve projetos que
possibilitam a concretização da idéia do protagonismo infanto-juvenil, tais
como: o Orçamento Participativo Criança, o Educom.rádio, o Grêmio Estudantil,
o Recreio nas Férias, o Escola Aberta ou, ainda, a construção coletiva da
brincadeira, do esporte, da cultura.
Neste sentido, nossa meta é a formação dos Grêmios Estudantis em
todas as EMEF. Na Educação Infantil, a criança como protagonista é princípio,
ou seja, as práticas educativas devem considerá-las, pois desde muito
pequenas são capazes de emitir suas opiniões e fazer suas escolhas.
Assim, seja na formação dos Grêmios Estudantis nas EMEF, seja na
constituição de fóruns de participação na Educação Infantil, o protagonismo
infanto – juvenil rompe com a lógica que condena crianças e jovens ao

29
individualismo, à competitividade, ao consumismo e ao discurso único do
adulto.
No protagonismo infantil e juvenil vivido em nossas Unidades
Educacionais, há impedimento, tutela ou autonomia? Como estão sendo
constituídos?
Como podemos efetivar o protagonismo dos bebês?

Gestão dos Espaços de Aprendizagem

A amorosidade da ação de ser educadora e educador reside no desejo


permanente do exercício da aprendizagem crítica, alegre e humanizadora. Ato
fundado na construção dos valores da vida, no compromisso maior da
realização de cada criança, de cada cidadão.
Nesta perspectiva, nos cabe indagar sobre o que consideramos
relevante ou não em nossas práticas educativas cotidianas, questionando as
dimensões e valores diversos que organizam o funcionamento da sociedade
brasileira: quem tem poder? quem decide? que concepção de cultura
infantil validamos? que escuta praticamos? que concepção de sociedade
e de ser humano defendemos? que valores de convivência
consolidamos? por que, como e para que realizamos nossas ações
educativas?
O imprescindível, nessa ação gestora da aprendizagem, é refletir
sempre a partir de nossas práticas institucionais, problematizando-as na
direção de criar e recriar diferentes canais de articulação de saberes,
considerando os contextos sociais e culturais em que estas estão inseridas e
indagar se essas consolidam a emancipação, autonomia e criticidade.
Vivemos novas exigências, tempos, espaços, valores e organizações.
Portanto, exige-se modelo de gestão com características diferenciadas, mais
participativas e horizontalizadas.
Na gestão dos ambientes pedagógicos, dos espaços e tempos das
Unidades Educacionais, dos conselhos e comissões, temos vivenciado
princípios participativos?
Assim, praticar a Democratização da Gestão exige subverter a lógica
perversa da educação tradicional, nas Unidades Educacionais, rompendo
com as concepções, com as práticas cristalizadas ao longo da história de
nosso país, investigando–as e problematizando–as à luz de um novo
conhecimento. A organização de sínteses provisórias sistematizadas e a sua

30
apreensão crítica possibilitam a transformação desta realidade, articulando os
atores e autores da Comunidade Educativa, a fim de que todos e todas tenham
suas vozes ouvidas, suas idéias acatadas e/ou dialogadas e suas co-
responsabilidades definidas.
As transformações permanentes que ocorrem com este movimento
instauram em todos os espaços decisórios a avaliação permanente e coletiva
de nossas práticas institucionais. Comprometemo–nos com a investigação,
problematização, sistematização, apreensão crítica e os processos
avaliativos das práticas gestionárias?
Todos estes questionamentos nos remetem à relevância da Formação
e do Acompanhamento, para que as reflexões sobre currículo e diversidade,
sob a ótica dos temas até aqui tratados, possam verdadeiramente penetrar nos
espaços das Unidades Educacionais. Constituir territórios implica na integração
interna e externa, global e local e no rompimento das relações de poder
estabelecidas.

Referências

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Constituição Federal de 1988 e PARO, Vitor Henrique. O princípio da gestão
escolar democrática no contexto da LDB. In: OLIVEIRA, Romualdo Portela de
e
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Paulo: Xamã, 2001, pp. 69-78 e 79-88.

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Revista de Cultura e Política. 1994, nº33 pp. 5-16.

BORDENAVE, J. E. D. O que é participação? São Paulo, Brasiliense, 1985.

CAMARGO, Rubens Barbosa de. Gestão Democrática e nova qualidade de


ensino. São Paulo: Tese/FEUSP, 1997.

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31
GOHN, Maria da Glória. História dos movimentos e lutas sociais a construção
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MUNÕZ,César. Viver, Educar: desde la seducción, el amory la pasion.
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PARO, Vitor Henrique. Por dentro da Escola Pública. São Paulo: 3ª ed. Xamã,
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movimentos populares. São Paulo: Hucitec, 1991.

RIBEIRO, Darcy. Noções de Coisas. São Paulo: FTD, 2000

32
FORMAÇÃO E ACOMPANHAMENTO

Adianta querer saber muita coisa?


O senhor sabia, lá para cima, me disseram.
Mas, de repente, chegou neste sertão,
viu tudo diverso, diferente, o que nunca tinha visto.
Sabença aprendida não adiantou para nada... Serviu algum?
Guimarães Rosa

A construção da Qualidade Social de Educação na Política Educacional


da atual gestão diferencia-se da política neoliberal, pois compreende a Unidade
Educacional como espaço coletivo privilegiado de manifestação, apropriação,
transformação e produção de cultura e de conhecimento, organizado e
intencionalizado - lugar educativo, mais que meramente instrutivo. Nesse
espaço, a formação deve transformar as relações de exclusão e de
invisibilidade dos sujeitos e possibilitar a criação de formas e indicadores da
avaliação do fazer e do pensar pedagógico, para que não permaneçam na
condição de silenciados e de oprimidos. (Freire, 2001)
Buscar pistas na história da educação recente nos possibilita
compreender qual a concepção de formação mais coerente com a concepção
de currículo que queremos.
Todos nós já passamos por processos de formação em diferentes
momentos e contextos históricos, com pressupostos que nos orientaram.
Nesse percurso, já “fomos reciclados”, “fomos capacitados”, “fomos treinados”
e hoje perseguimos a idéia de formação. O que aconteceu? Só o nome dessa
ação foi mudada? Será que são os mesmos pressupostos que iluminam a
reciclagem, o repasse, a capacitação e a formação? O que precisamos saber e
fazer para ressignificar a ação formadora atendendo às necessidades
colocadas aos educadores hoje, sujeitos de sua ação?
Ampliando essas questões, na perspectiva das diretrizes da SME, e
trazendo para o bojo das discussões curriculares que fazemos hoje, nos
perguntamos ainda: as discussões e reflexões dos sujeitos envolvidos apontam
em direção à leitura de mundo, letramento e alfabetização, ciclo, avaliação em
todas as instâncias, à participação ativa, às manifestações culturais como
produção de conhecimento, à reflexão sobre os espaços e tempos da e na
Unidade Educacional?
Qualidade Social da Educação, aqui, é compreendida como a garantia
do acesso e da permanência e o compromisso com a gestão democrática em

33
espaços coletivos, nos quais educadores e educandos, sujeitos históricos,
sociais e culturais, constroem suas trajetórias. Esses espaços devem promover
novas relações sociais constituídas pela construção compartilhada, envolvendo
a Comunidade Educativa.
As histórias dos autores e atores do cenário educacional tornam–se
elementos preciosos na medida que explicitam seus referenciais, suas matrizes
pedagógicas, entendidas por Furlaneto (2003) como “espaços, nos quais a
prática dos professores é gestada. Conteúdos do mundo interno encontram-se
com os do mundo externo e são por eles fecundados originando o novo”. A
autora ainda nos remete para as seguintes questões:
Como essas matrizes são constituídas? Elas podem ser
modificadas?
Que formatos construímos para que elas sejam avaliadas?
Nesse processo de construção identitária, formar pressupõe o resgate
das trajetórias dos educadores, contextualizadas na história sócio-cultural,
abrangendo a memória documental e a não documental, que, ao se
entrelaçarem, dinamizam todas as ações no interior da Unidade Educacional.

Quem são esses autores e atores?

Pensando na construção compartilhada, autores e atores são todos os


integrantes da Comunidade Educativa, protagonistas do conhecimento, da
investigação, da sistematização e da reflexão sobre as práticas educativas.
A Formação Permanente dos educadores pressupõe reconhecimento
da práxis como ponto de referência para o debate da Qualidade Social de
Educação. Nesse sentido, é preciso considerar os saberes da experiência, os
saberes do instituído; saberes da erudição, saberes relacionais, assim como as
escolhas que o educador faz deles e como os prioriza na construção do
saber-fazer pedagógico.
Entendemos, como Paulo Freire, que
“A educação é permanente não porque certa linha ideológica ou
certa posição política ou certo interesse econômico o exijam. A educação
é permanente na razão, de um lado, da finitude do ser humano, de outro,
da consciência que ele tem de sua finitude. Mais ainda, pelo fato de ao
longo da história, ter incorporado à sua natureza não apenas saber que
vivia, mas saber que sabia e, assim, saber que podia saber mais. A
educação e a formação permanente se fundam aí (...) o ser humano jamais

34
pára de educar-se (...) A melhora da qualidade da educação implica a
formação permanente dos educadores. E a formação permanente se
funde na prática de analisar a prática. É pensando sua prática,
naturalmente com a presença de pessoal altamente qualificado, que é
possível perceber embutida na prática uma teoria não percebida ainda,
pouco percebida ou já percebida, mas pouco assumida”
(Freire, 1997:20-72).
Assim, propomos um Programa de Formação Permanente e
Acompanhamento, entendendo que “formar é acompanhar” e “acompanhar é
formar” objetivando reconhecer e considerar as especificidades sociais,
econômicas e culturais de cada localidade a favor da aprendizagem de todos e
implementar a Política Educacional de uma Cidade que se pretende
Educadora.

Os sentidos da formação

A SME, na revista EducAção nº 4, anunciou a sua política de formação e


apontou a implementação desta por meio do Plano de Metas, nela contido. As
diferentes regiões da cidade e os encontros da Diretoria de Orientação
Técnica/SME com as Coordenadorias de Educação das Subprefeituras têm
desenvolvido ações relacionadas a este Plano com seminários, mesas-
redondas e grupos de formação com vistas à ação política de todos e todas em
relação à Qualidade Social da Educação. Essa formação, subsidiada também
pelo Caderno Temático de Formação 1, exigiu um posicionamento em relação
aos processos gestionários e ao currículo, no sentido de romper com as
desigualdades e com a exclusão presentes na cidade de São Paulo e em seu
Sistema Educacional de Ensino .
Nessa formação, acreditamos que os sujeitos em suas relações
cotidianas flagram suas incompletudes, gerando a necessidade e o desejo de
ampliarem conhecimentos que contribuam para a construção da autonomia,
constituindo-os autores de sua prática e fortalecendo-os em suas decisões
político-pedagógicas.
Nesse sentido, autoria e autonomia se constituem nas vivências das
relações que permitem conflitos, construções e reconstruções. Em outras
palavras, permitem refletir sobre o vivido, proporcionando a transformação das
vivências em experiências. Sob essa perspectiva, a formação permanente
possibilita a tomada de consciência em relação à realidade e ao momento
histórico, explicitando as opções teóricas e práticas do educador.

35
A Unidade Educacional, onde se produzem diferentes narrativas e
diferentes fazeres, torna-se, portanto, locus privilegiado desta formação. Olhar
para esse cenário implica num distanciamento que possibilite transformar a
ação educativa em objeto de estudo. O processo de formação e
acompanhamento não pode prescindir da opção metodológica que
defendemos, nem da criação de indicadores que permitam avaliar o quanto
nossas intervenções têm possibilitando a efetivação das diferentes diretrizes da
SME. Poderíamos, então nos perguntar: a formação e o acompanhamento
que estamos desenvolvendo têm provocado a transformação das práticas
e a melhoria da aprendizagem?
Os diferentes olhares sobre esse objeto são fundamentais parao
redimensionamento das práticas mediadas pelo diálogo provocado pelos
educadores, nos momentos coletivos, e também pelo olhar do Grupo de
Acompanhamento da Ação Educativa (GAAE).
O Grupo de Acompanhamento
da Ação Educativa (GAAE) iniciou sua trajetória em 2001
e, hoje, foi definido
como prioridade pelas Coordenadorias de Educação,
constituindo–se como fundamental na formação de formadores e na discussão das
práticas em todas as modalidades. Esse processo vem consolidando a parceria entre os
diferentes atores e autores da instância regional e destes com as Unidades
Educacionais, “propiciando a vivência de uma parceria pautada nas possibilidades de
diálogo entre profissionais que desempenham, em espaços múltiplos, diferentes
funções. Diálogo por meio do qual as experiências concretas e plurais dos participantes
serão inseridas no processo de formação como objeto de discussão e reflexão” (Revista
EducAção 2, 2001:10)

Compreendemos o GAAE como forma de potencializar a formação nas


diferentes instâncias, constituindo-se como ação de formação. Os temas ciclo,
gestão, leitura de mundo/letramento/alfabetização, cultura da
criança/adolescente/adulto/idoso e avaliação integram a Política Educacional
desta administração e devem estar presentes na problematização do cotidiano,
na perspectiva da construção do Mapa da Inclusão Social.
Acompanhar pressupõe a atitude presencial e contínua com
intencionalidade e intervenções. Pressupõe também uma metodologia que
inclui a investigação, a escuta e o olhar atentos para a ação e para o discurso;
a problematização das práticas de dentro e fora do contexto; a sistematização,
em sínteses provisórias, os encaminhamentos e registros; a apreensão crítica,
como ponto de partida para a construção da prática pedagógica, concebendo
todos como sujeitos históricos em emancipação; avaliação como um olhar
crítico da práxis pedagógica.

36
Esse movimento reitera o caráter de construção coletiva no interior das
Unidades Educacionais, fortalecendo o papel das equipes pedagógicas,
provocando a articulação entre os diferentes segmentos e a interlocução entre
os diferentes espaços de ensino e de aprendizagem e os diferentes saberes.
Assim, a formação e o acompanhamento não se limitam aos pensares
e fazeres “intra-muros”, ampliam-se significativamente para todos os espaços
públicos da cidade, possiblitando o distanciamento do cotidiano imediato e
experiências que constituem sujeitos no coletivo como educadores e
educadoras.
Essas reflexões nos remetem à questão: Atualmente os espaços
coletivos no interior da Unidade Educacional vêm se constituindo efetivamente
em espaços de formação?
Coletivo pressupõe estabelecer vínculos entre todos e todas que dele
fazem parte. Pressupõe despojamento para o debate, oferecendo espaço para
a dúvida das próprias certezas. É espaço privilegiado para que os educadores
flagrem-se diante de suas incoerências na busca da superação. É a partir do
coletivo que o distanciamento de nossas ações cotidianas torna-se possível,
transformando-as, conseqüentemente, em objeto de estudo do educador e,
portanto, do grupo.
Coletivo refere-se a grupo, que refere-se à discussão, que refere-se à
argumentação, que refere-se a conhecimento que, por sua vez, refere-se a
grupo. O círculo que se constitui a partir desse movimento traz, no seu enredo,
a experiência dos educadores e educadoras como protagonistas do texto
tecido pela possibilidade de encontro no grupo. Coletivo imprime o caráter de
negociação dos pontos de vista de forma muitas vezes sofrida, dura, marcada
pela rigidez de fronteiras de cada um dos que ingressam nesse movimento,
que inclui ensinar e aprender. A Unidade Educacional como pólo de produção
cultural e histórica, produtora de saberes, é espaço que possibilita a
culminância do exercício da difícil tarefa de construir algo que é communis, que
pertence a vários, que não é posse de um único sujeito.
Como a formação pode subsidiar a todos os envolvidos na ação
educativa (educadores, crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos e
famílias) para que sejam sujeitos da manifestação e construção de
conhecimento e produtores de história e cultura?

Como articular as ações de formação e de acompanhamento na


perspectiva do fortalecimento do grupo social?

37
Como articularas reflexões de formação, acompanha-
mento, currículo, gestão e Projeto Político Pedagógico?
As ações de formação desenvolvidas pela Unidade Educacional
estão efetivamente voltadas à humanização dos sujeitos, reeducando os
diferentes olhares e respeitando os diferentes tempos dos educadores e
educandos?
Como a formação preocupa-se em subsidiar a todos e a todas
envolvidos na ação educativa para que essa ação garanta o direito à
aprendizagem de todos e de todas ?

Referências

CATANI, Denice Bárbara. Lembrar, narrar, escrever: memória e autobiografia


em história da educação e em processos de formação.
In: BARBOSA (Org.). Formação de educadores: desafios e perspectivas. São
Paulo : UNESP, 2003.

FREIRE, Madalena (Org.) (1996). Observação, registro e reflexão:


instrumentos metodológicos. 2. ed. São Paulo : Espaço Pedagógico, 1996.

FREIRE, Ana Maria Araújo (Org). Pedagogia dos Sonhos Possíveis/Paulo


Freire. São Paulo : UNESP, 2001.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 10. ed. Rio de Janeiro : Paz e Terra,
1981.

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FURLANETTO, Ecleide C. Como nasce um professor. São Paulo : Paulus,


2003

GANDIN, Danilo; GANDIN, Luiz Armando. Temas para um projeto político-


pedagógico. 2. ed. Petrópolis, Rio de Janeiro : Vozes, 2000.

KRAMER, Sonia. Infância e Educação Infantil. Rio de Janeiro : Papirus, 1999.

NETO, Elydio dos Santos. Aspectos humanos da competência docente:


problemas e desafios para a formação de professores. In: FAZENDA, Ivani
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Papirus, 2002.

38
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Revista EducAção nº2. São Paulo: SME/SP, 2001.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. 6. ed. São Paulo : Martins


Fontes, 1998.

39
O CEU, A CIDADE E A EDUCAÇÃO

“A possibilidade de ser cidadão depende de como se dá a nossa inserção no espaço


habitado, no território da cidade; depende da forma de apropriação deste território, das
relações de poder estabelecidas entre as pessoas e esse lugar”. (Milton Santos)

A cidade de São Paulo vive hoje uma situação antagônica, herdada de


um modelo econômico excludente: abriga equipamentos residenciais, de
comunicação e de movimentação financeira capazes de competir com o mundo
globalizado ao mesmo tempo em que convive com uma situação de pobreza da
população das periferias, marcada pela falta de moradia digna, de
equipamentos de saúde, de lazer e entretenimento, bem como pelo grande
número de desempregados ou sub-empregados. Há uma concentração de
espaços culturais com teatros, cinemas, artes plásticas e música na região
central em detrimento da escassez dessas ofertas nos bairros da periferia.
”O agravamento dos problemas que afetam a qualidade de vida da população de São
Paulo não atinge a cidade em geral. Sobretudo a partir das últimas três ou quatro décadas,
surgem e se expandem os bairros periféricos que, conjuntamente aos tradicionais cortiços e
favelas, alojam a população trabalhadora. É nessas áreas que se concentra a pobreza da
cidade e de seus habitantes” (KOWARICK: 1993, 34)

Essa forma de ocupação e de distribuição dos espaços urbanos da


cidade de São Paulo foi melhor diagnosticada a partir do Mapa da Exclusão
Social, de 2000, coordenado por Aldaíza Sposati1 e amplamente utilizado nesta
gestão para pensar um Mapa de Inclusão.
Esse diagnóstico da cidade constituiu –se como um referencial de
aplicação de políticas públicas, afinadas com uma visão de currículo que
desafia as Unidades Educacionais à construção do Projeto Político
Pedagógico, a partir da leitura da região e da apropriação de seus espaços
públicos.
Um dos principais projetos da Secretaria Municipal de Educação que
traduz tal visão é a criação do Centro Educacional Unificado – CEU, que pode
ser considerado um dos maiores projetos de inclusão social do País. É um
projeto que viabiliza espaços e equipamentos públicos de qualidade;
mecanismos de gestão e de participação que ampliam o exercício dos direitos
políticos, constituindo-se também em pólos de desenvolvimento das
comunidades locais e em pólos de difusão de experiências educacionais para
a Rede Municipal de Ensino.

1
Professora Universitária e atual Secretária da Assistência Social da PMSP.

40
O Centro Educacional Unificado, como todas as Unidades
Educacionais da Rede Municipal de Ensino, é um espaço de educação
inclusiva, de formação permanente e de humanização das relações sociais. A
elaboração do seu Projeto Político Pedagógico implica uma construção
processual que permite atualização das suas próprias experiências e
contextos, de modo a reconhecer, considerar e trabalhar com as diferenças.
A concepção de Centro Educacional Unificado integra no mesmo
espaço físico, equipamentos das Secretarias de Educação, de Cultura e de
Esporte Lazer e Recreação, com a presença efetiva ainda das Secretarias de
Assistência Social, da Saúde e da Segurança Urbana, na construção do
conceito de intersetorialidade, demonstrando como o poder local das
Subprefeituras, de forma integrada, pode atuar mais próximo das comunidades
locais e mais sintonizado com as reais necessidades do cidadão.
Dentro da nossa concepção de educação para a cidade, o Centro
Educacional Unificado propõe a articulação de uma rede de relações, que
promova o diálogo entre os diferentes equipamentos que o compõem: as
Unidades Educacionais, as Unidades da Cultura e do Esporte e o Telecentro,
concretizando em seu projeto o currículo proposto para a Rede Municipal de
Ensino.
A organização e o funcionamento de cada Centro Educacional
Unificado reflete um novo conceito na gestão do espaço público, propondo a
articulação das forças atuantes nas comunidades locais e, de modo especial,
na composição do Conselho Gestor e pela constituição de instâncias de
participação que contemplem as necessidades e os interesses dos diversos
segmentos ali representados. Reiteramos que esse mesmo conceito de gestão
deve estar presente nas nossas Unidades Educacionais e que o Conselho de
Escola seja de fato instância de participação e representação dos segmentos
escolares.
O Conselho Gestor no Centro Educacional Unificado, constitui uma
instância, ao mesmo tempo, de ampliação da participação política e de
exercício da cidadania ativa, como também de controle social sobre a
educação, a arte a cultura, o esporte e todos os demais serviços públicos que
podem ser oferecidos.
Formação e Acompanhamento - CEU: em 2003, foi constituído o Grupo de Trabalho
Intersecretarial - GTI, com a participação de: gestores dos CEU, representantes das
Coordenadorias de Educação das Subprefeituras e representantes das Secretarias Municipais
de Educação, de Esportes, Lazer e Recreação e de Cultura. O GTI consolidou-se como espaço
de formação e de acompanhamento das ações nos CEU.

41
Cada Centro Educacional Unificado constituirá sua identidade a partir
do contexto sociocultural em que está inserido, mas garantirá a unicidade do
projeto em relação aos fundamentos e princípios que orientam seu
funcionamento:
1- Garantia dos direitos constitucionais de acesso aos bens e serviços
socialmente produzidos: educação, lazer, cultura e esporte.
2- Fortalecimento de uma política pública regionalizada, no contexto da
descentralização da gestão municipal, articulada nos vários setores da
administração pública e da sociedade civil, no atendimento às necessidades
das crianças, jovens, adultos e idosos da localidade.
3- Constituição de uma Rede de Proteção Social e de educação
permanente, articulando o poder público e as organizações da sociedade civil
na sua área de abrangência.
4- Oferta de educação com qualidade social que pressupõe a
conjugação de diferentes espaços de aprendizagem e de gestão democrática.
5- Constituição de pólo de desenvolvimento humano e social da
comunidade na qual está inserido como projeto de educação popular inclusiva
e, portanto, para uma Cidade Educadora.
Nessa perspectiva, a SME dá importante passo na construção da Rede
de Proteção Social para a cidade, passo fundamental para constituir São Paulo
como uma Cidade Educadora, fortalecendo as Subprefeituras, no contexto da
descentralização da gestão municipal.
O envolvimento e a organização da comunidade do entorno são
essenciais para garantir os objetivos educacionais, socioculturais e esportivos
desse equipamento público nas suas dimensões ética, estética e cognitiva,
bem como favorecer a apropriação de diferentes linguagens pela população
como forma de ampliar suas possibilidades de manifestação e de produção
cultural, tornando-se, ao final, um pólo mobilizador e reorganizador das
relações sociais do bairro que estimule o desenvolvimento de uma identidade
local.
O sentimento de pertencimento é fundamental para garantir a
participação da população!
A gestão do Centro Educacional Unificado e das Unidades
Educacionais, a construção do projeto político pedagógico, a apropriação dos
espaços e equipamentos públicos por parte da população organizada, a

42
integração intersecretarial e a integração com equipamentos públicos do
entorno certamente possibilitarão novas relações sociais e humanas, novas
possibilidades de aprendizagem e novas formas de práticas políticas locais,
configurando-se então como um espaço de formação.
A Unidade Educacional, independente da proximidade ou não do
Centro Educacional Unificado, deve dialogar com a região, apropriar-se dos
equipamentos públicos e usar as potencialidades culturais e de lazer da região.
As Unidades Educacionais da Rede Municipal de Ensino e o Centro
Educacional Unificado se constituem como pólo cultural para a Comunidade
Educativa, permitindo a construção individual e coletiva da ação pedagógica e,
ao mesmo tempo, propondo a participação e organização dos diferentes
segmentos e movimentos sociais.
Buscam a constituição de espaço de intercâmbio de experiências,
desenvolvidas, promovendo o acesso, a produção e a divulgação de
conhecimento, bem como interlocução entre educadores e educadoras,
educandos e educandas, propiciando a reflexão no que diz respeito à
Qualidade Social da Educação.
Visam também promover a organização e a articulação no que se
refere aos projetos sociais e às ações de interesse local, contribuindo para
integrar as políticas públicas e os movimentos sociais organizados, no âmbito
das Subprefeituras, a favor dos interesses que emergem da comunidade.
As políticas sociais planejadas para a cidade de São Paulo têm no
Centro Educacional Unificado um espaço para o entrelaçamento de atividades
de formação que ampliam a troca de saberes referentes ao mundo do trabalho
e da cultura, bem como possibilidades de realizar atividades que valorizam
suas experiências anteriores e propiciam novos conhecimentos, inclusive do
mundo da tecnologia.
Um dos importantes objetivos do Centro Educacional Unificado é que,
sendo um espaço de formação para e pela cidadania, preocupa-se com a
condição contemporânea das crianças, dos adolescentes, jovens, adultos e
idosos, implementando programas educativos desde e com esses atores e
autores.
O Centro Educacional Unificado constitui-se, portanto, como uma
nova referência nos bairros, uma nova centralidade urbana e, portanto, pólo de
criação de sociabilidade e de identidade cultural. Por ser um equipamento
nunca antes oferecido à população local, ele provoca o estabelecimento de
novas relações entre estes equipamentos e a comunidade, interferindo em seu

43
“além-muros”, modificando o desenho do bairro, qualificando o espaço urbano
de regiões da cidade de São Paulo onde mora a maior parte de seus
trabalhadores.
Que compreensão temos dos Centros Educacionais Unificados
(CEU) como espaço de construção curricular?
Como as todas as Unidades Educacionais da Rede Municipal de
Ensino podem transformar os espaços públicos de lazer e de
manifestação e produção cultural da região em espaços de construção
curricular?

Referências

GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. Quinhentos anos de Periferia: uma


contribuição ao estudo da política internacional. Porto Alegre/RJ:Editora da
Universidade UFRGS/Contraponto. 1999.

KOWARICK, Lúcio. A espoliação urbana. São Paulo: Paz e Terra. 1993.

SANTOS, Milton. Por uma globalização: do pensamento único à consciência


universal. RJ: Record. 2003.

SPOSATI, Aldaíza. Cidade em Pedaços. SP: Brasiliense. 2001.

44
AVALIAÇÃO – SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO 2003

“O mundo não é. O mundo está sendo. Como subjetividade curiosa, inteligente,


interferidora na objetividade com que dialeticamente me relaciono, meu papel no mundo não é
só o de quem constata o que ocorre mas também o de quem intervém como sujeito das
ocorrências.” Paulo Freire

Ao chegar no quarto ano desta gestão, trilhamos um caminho


significativo no movimento de descentralização do poder público municipal e na
busca da unicidade do Sistema Municipal de Ensino, tendo desencadeado
ações na busca da concretização das diretrizes propostas no início dessa
administração. Entretanto, ainda temos um caminho a percorrer e acreditamos
no caráter processual e permanente da avaliação como instrumento de
investigação, problematização, sistematização e apreensão crítica, provocador
de novas avaliações e reorganizações em nossos pensares e fazeres.
Iniciamos nossa reflexão, pensando na perspectiva de constituir a
cidade de São Paulo como Cidade Educadora. Cabe a todos e a todas
tecerem a Rede de Proteção Social em diferentes espaços formais e não
formais, permitindo a experiência de sujeitos sócio-históricos em espaços
públicos e coletivos, potencializando suas histórias na produção conjunta de
cultura e conhecimento.
Esse movimento requer uma articulação entre parte e todo, exigindo
complementaridade entre as Subprefeituras das diversas regiões da cidade,
entre as diferentes Coordenadorias de cada Subprefeitura, entre as
Coordenadorias de Educação e, dentro dessas, a complementaridade entre as
Diretorias (Técnico–pedagógica, Programas Especiais e Planejamento). Exige
também a integração entre os pólos de Unidades Educacionais em que atua o
Grupo de Acompanhamento da Ação Educativa - GAAE e entre os diferentes
integrantes da Comunidade Educativa.
Pensar nessas inter-relações nos remete à necessidade constatada de
lidar com a exclusão social na cidade de São Paulo e ao compromisso de todos
em efetivar uma proposta para a inclusão social concretizada no currículo das
diferentes instâncias.
Nesse sentido, a Diretoria de Orientação Técnica da SME, junto às
Coordenadorias de Educação das Subprefeituras, busca a articulação e o
acompanhamento das ações de formação, os pensares e os fazeres das
localidades para que o todo não seja apenas uma somatória das partes, mas
que essas sejam potencializadas nessa totalidade, a ponto de que cada
localidade esteja fortalecida para realizar suas ações e reflexões específicas.
45
Acreditamos em uma autonomia constituída na experiência das práticas sociais
intencionalmente desencadeadas e refletidas no conjunto da cidade.
O caminho que percorremos até aqui foi avaliado em dezembro de
2003. Desta avaliação, destacamos algumas questões a serem consideradas
no planejamento de 2004, requerendo uma integração entre a realidade de
cada região e a totalidade da cidade de São Paulo.

1. Formação e Acompanhamento (delineados na Revista EducAção nº 4)

A Formação que refletiu sobre as dicotomias teoria/prática;


discurso/ação; proposta/realidade.

Cada vez mais as Coordenadorias de Educação das Subprefeituras


agem visando o fortalecimento do trabalho coletivo nas diferentes instâncias,
objetivando romper com essas dicotomias:

“Este movimento reflexivo (...)


deverá ter continuidade em 2004, de forma que o
professor, problematizando a sua prática, refletindo sobre
ela, planejando coletivamente, possa pensar o currículo
de forma mais abrangente, ou seja, como currículo sócio-
histórico-cultural (...) uma formação (...) que não seja
apenas teórica, mas tenha um movimento de ação-
reflexão-ação...”
(C.E. Perus)

“É importante perceber a
preocupação com os horários coletivos na discussão do
Projeto Político Pedagógico,
fortalecendo as relações e refletindo
na melhoria do processo ensino
aprendizagem.”
(C.E. Jaçanã/Tremembé)

Destacaram a conquista da apropriação desse espaço coletivo como


momentos privilegiados de formação:

“O processo de formação contribuiu


para a articulação coletiva dentro das unidades. As
equipes técnicas

46
ressaltaram que percebem a
revitalização da JEI enquanto espaço de formação dentro
das unidades escolares”
(C.E. São Miguel Paulista).

As ações de formação favoreceram espaços de reflexão sobre o


processo ensino e aprendizagem, subsidiando
discussões nos horários coletivos.
Esse movimento, conforme
avaliações realizadas junto às U.E.s, provocou mudanças
significativas na ação pedagógica, além da valorização da
teoria como complemento da prática”
(C.E. Freguesia do Ó/Brasilândia)
E ampliaram a concepção de Formação, integrando a todos e a todas
nesse processo:

“A Qualidade Social que vem sendo


construída pela Coordenadoria de Educação e pelas
Unidades Educacionais
Municipais compreende dois
movimentos articulados: por um lado, propõe-se ao amplo
debate envolvendo a Comunidade Educacional e a
Sociedade Civil nas diferentes localidades da cidade; por
outro lado, enfatiza a Formação Permanente dos
educadores”
(C.E. Vila Maria/Vila Guilherme)

As Coordenadorias de Educação das Subprefeituras perceberam


como os princípios e os procedimentos metodológicos possibilitaram a
transformação das práticas educativas nas diferentes instâncias. O Grupo de
Formação constituiu–se, assim, na metodologia que concretizou tal
transformação:

“Já podemos ver que em algumas


escolas criou–se um movimento de problematização e
reflexão, em que o professor que participa de grupo de
formação faz um diferencial nas discussões”
(C.E. Casa Verde/Cachoeirinha).

Os grupos de formação repercutiram também na potencialização dos


coletivos com todos os segmentos:

47
“A formação tem buscado não
apenas apurar o olhar do professor para sua criança, sua
sala de aula; mas também ampliar a idéia de coletivo,
saindo dos espaços ‘intra-muros’. Em nossa região,a
formação alcança grupos de alunos adolescentes /
adultos e grupos de mães / pais, que nos ajudam a
repensar a escola e a formação de seus educadores a
partir da perspectiva da população,do olhar de outros
trabalhadores.”
(C.E. Capela do Socorro)

Os educadores e educadoras revelaram suas concepções no resgate


das memórias:

Iniciamos com as memórias da


aprendizagem de cada professor, registramos, lemos,
contamos e fomos revelando ao grupo as lembranças que
guardamos de como fomos alfabetizadas. Muitas foram
boas lembranças, outras sofridas, mas nos permitiram
iniciar a discussão de como se aprende e de como se
ensina”
(C.E. Ipiranga)

Organizaram a formação integrando as diretrizes gerais e as


necessidades locais:

“Os investimentos em formações


pautadas nas diretrizes educadionais do governo e nas
necessidades locais procuraram valorizar a humanização
na educação, estimulando os educadores a refletirem
sobre as transformações de sua prática, educativa,
contribuindo assim, para a Qualidade Social da educação”
(C.E. Itaim Paulista).

Destaca-se o espaço significativo das experiências construídas:

“Reconhece-se a importância dada


pela administração às práticas/experiências das Unidades
Educacionais, valorizando isso nos processos de
formação”
(C.E. Guaianases)

48
O processo de formação contribuiu para romper com os paradigmas:

“A prática educativa desta


Coordenadoria, com relação à formação permanente,
proporcionou a ruptura
do paradigma de multiplicadores,
isto é, todos educadores puderam participar de todos os
eventos”
(C.E. Cidade Tiradentes).

As formações nas diferentes instâncias integraram os temas presentes


na Revista EducAção nº 4 e no Caderno Temático de Formação 1 . Esses
temas constituíram-se em contextos para as discussões curriculares:

“As ações de formação, que têm


sido desenvolvidas pela Coordenadoria de Educação,
levam em consideração o eixo apontado na Revista
EducAção nº 4 e no Caderno Temático 1. Entendemos
que o planejamento e a execução dos trabalhos a respeito
das questões de gênero e sexualidade, etnias,
alfabetização, leitura de mundo, letramento e avaliação
fazem parte do trabalho específico da educação no
esforço de construção da Rede de Proteção Social no
contexto da Cidade Educadora”
(C.E. Pirituba)

“Percebemos a ampliação do olhar


dos educadores em relação às diversidades, elas existem,
não só em relação às diferenças econômicas, políticas e
sociais, mas também em relação ao gênero, à orientação
sexual e à etnia”.
(C.E. Vila Prudente/Sapopemba).

“... priorizar os seguintes temas:


letramento e as diferentes linguagens nas diferentes
áreas do conhecimento, atrelados às temáticas propostas
por SME – letramento, gênero, sexualidade, diversidade
cultural e etnia”
49
(C.E. Santo Amaro)

E provocaram discussões que também fortaleceram o Projeto Político


Pedagógico:

“...as ações promovidas pela


Coordenadoria de Educação da Subprefeitura da Mooca
propiciaram o fortalecimento do Projeto Político
Pedagógico e o trabalho coletivo, bem como uma maior
proximidade das equipes das escolas, havendo uma
sensibilização para o respeito à diversidade, à inclusão, à
alfabetização e para o letramento como responsabilidade
de todos”
(C.E. Mooca).

Buscou-se o fortalecimento do GAAE, tendo como foco o Projeto


Político Pedagógico da Unidade Educacional, aprofundando questões de
currículo.

O grupo de Acompanhamento da Ação Educativa integra diferentes


autores e atores da Coordenadoria de Educação, na perspectiva de atender à
complexidade dos movimentos da Unidade Educacional. Ele é a ponte entre as
intenções políticas e a formação.
Destaca–se a importância da dialogicidade na sua ação, procurando
uma apuração do olhar, do observar e do ler as manifestações e produções
culturais da Unidade Educacional, que é o caminho da intervenção/diálogo. O
registro da memória do GAAE na Coordenadoria de Educação assume um
papel essencial, trazendo as marcas da sua história.
A idéia de GAAE remete também à idéia de continuidade dos
encontros de pólo e inter-pólos.
As Coordenadorias de Educação das Subprefeituras apontam os
avanços alcançados em relação ao movimento provocado pelo GAAE nas
Unidades Educacionais:

“As Unidades apontaram que as


reuniões de pólo e o acompanhamento in locus
contribuem

50
para a construção coletiva do
Projeto Político Pedagógico, possibilitando que ele se
torne
um documento vivo para elas. As
atividades Propostas no GAAE fortaleceram o trabalho
coletivo das
unidades e contribuíram para a
reflexão sobre a prática e sobre o processo de ensino e
de aprendizagem”
(C.E. Penha).
“As nossas escolas apontam o
acompanhamento da ação educativa pela Supervisão e
STEs, bem como as oficinas e cursos de formação, como
passos importantes de revitalização do trabalho escolar,
da melhoria nas relações dos grupos (coletivos das
U.E.s.)”
(C.E. Cidade Ademar)

Frente aos avanços, as Coordenadorias de Educação propuseram a


continuidade do trabalho de integração das Unidades Educacionais, rompendo
com a fragmentação e possibilitando, assim, um sentido para o Projeto Político
Pedagógico.

“É nosso objetivo integrar as


escolas do pólo, consubstanciando as ações
anteriormente pensadas
de modo isolado, dando, assim,
sentido e significado às ações desenvolvidas no interior
da Unidade Educacional, referendando com isso o Projeto
Pedagógico das escolas”
(C.E. Butantã).

2. Gestão Democrática

A gestão deve ser alvo de atenção do sistema da SME à Unidade


Educacional. Houve um desencadeamento do Movimento de Gestão na Cidade
com a responsabilidade central e regional, considerando: o Grupo das
Unidades Educacionais como espaços de gestão; a consolidação da autoria da
Comunidade Educativa na discussão de Currículo e Projeto Político
Pedagógico; a ampliação das discussões e ações do Conselho de Escola, do

51
Conselho Regional dos Conselhos de Escola (CRECE) e dos Grêmios; a
Escola Aberta; o fortalecimento do coletivo dos diferentes segmentos:
envolvimento na Reunião Geral de Pólo (RGP) e nas ações do GAAE; a
participação de representantes de todas as Unidades Educacionais no
Conselho da Coordenadoria, fortalecendo a ampliação das discussões do
Conselho de Escola; a gestão dos CEU e suas relações intersecretariais e
com a comunidade.
Em vários espaços da cidade, as Coordenadorias de Educação das
Subprefeituras apontaram os avanços das Unidades Educacionais em relação
à gestão:

“É importante registrar que, com a


garantia das reuniões bimestrais dos Grêmios Estudantis,
ocorreu o fortalecimento dessas organizações e,
conseqüentemente, incentivou-se a participação dos
alunos nos diversos espaços das EMEF, nos diferentes
projetos desenvolvidos pela SME e pela Coordenadoria
da Juventude”
(C.E. Campo Limpo).

Entre eles, o diálogo com as famílias, na perspectiva da construção


curricular:

“... as Unidades Educacionais têm se


afirmado como um ponto de encontro, onde as famílias se
articulam, não apenas para conseguir uma vaga para
seus filhos, mas também para saborear suas alegrias,
socializar suas dores e construir, juntas, os caminhos que
desejam percorrer. Essa trajetória tem tornado o currículo
vivo na rotina das Unidades Educacionais: EMEF, EMEI,
CEI e CIEJA”
(C.E. São Mateus).

Foram explicitadas propostas de ação para 2004, em que as Unidades


Educacionais são compreendidas como espaços públicos privilegiados de
inclusão, pertencimento e gestão democrática:

52
“Estabelecer parcerias e ações
melhorando a ampliação e participação da comunidade na
escola... Estimular maior participação da comunidade no
Conselho de Escola”
(C.E. Jabaquara).

“Abrir os espaços com as escolas


que permita problematizar experiências, conhecer os
projetos desenvolvidos em cada Unidade Educacional,
como pensam as escolas e suas concepções de
educação são de suma importância para a destruição de
relações autoritárias no âmbito escolar e social e,
essencial, para uma gestão democrática
(C.E. Vila Mariana)

“A possibilidade de optar ou não por


algum projeto, permitiu o exercício da democracia nas
Unidades Educacionais, que puderam discutir e decidir
pela participação”
(C.E. Aricanduva)

3. Articulação intersecretarial nas Subprefeituras, tendo a Rede de


Proteção Social e a Cidade Educadora como projetos comuns.

As Coordenadorias de Educação iniciam um caminho para a


aproximação com outras Coordenadorias intra e inter Subprefeitura, ampliando
os espaços de discussão na perspectiva de construção da Cidade Educadora:

“A parceria entre as Coordenadorias


de Ermelino Matarazzo e de São Miguel Paulista, na
formação de professores, diretores e coordenadores, foi
muito valiosa para inclusão dos educadores dos CEI na
Educação e para todos os envolvidos na ação pedagógica
das Unidades Educacionais”
(C.E. Ermelino Matarazzo).

“... temos feito um trabalho de


aproximação e por algumas vezes, de integração com as
Coordenadorias de Saúde e Ação Social e
53
Desenvolvimento) (...) a busca por um equilíbrio neste
processo e por uma construção de fato, verdadeira, ainda
é maior do que os problemas e dificuldades vivenciados”
(C.E. Lapa).

“Em 2003, realizamos reuniões de


formação dos conselheiros do CRECE, focando o eixo
‘Cidade Educadora e Rede de Proteção Social’(...). Por
entender que o princípio da Cidade Educadora é algo
concebido no âmbito do governo local, uma vez que deve
envolver todas as Coordenadorias das Subprefeituras,
propusemos para 2004 a realização de um seminário
interno sobre o tema e o planejamento de ações comuns
rumo à Cidade Educadora”
(C.E. Itaquera).

E envolveram autores e atores da região, ampliando os espaços de formação e de


gestão:

“A participação de todos os
segmentos das Unidades Educacionais nos processos de
formação foram metas desta Coordenadoria. No
desenvolvimento do Fórum Regional de Educação demos
o grande salto quando trouxemos os movimentos sociais
organizados da região, as escolas particulares, o
Conselho da Coordenadoria e as demais Coordenadorias
da Subprefeitura de M’Boi Mirim para pensar a educação
na região, apontando a Cidade Educadora”
(C.E. M’Boi Mirim).
Aconteceram, no processo de integração dos espaços públicos da
cidade, ações de governo que romperam efetivamente com os muros das
Unidades Educacionais e têm contribuído para transformar o coletivo dos
diferentes segmentos e dialogar com o Projeto Político Pedagógico:
Educom.rádio, Escola Aberta, Recreio nas Férias, entre outros.

54
Nesse sentido, as Coordenadorias de Educação das Subprefeituras
manifestaram suas experiências em relação às repercussões desses projetos
nas Unidades Educacionais:

“Gostaríamos de chamar a atenção


sobre esses projetos, pois os mesmos ampliam um
processo educativo de participação e inserção da
comunidade local que vai além dos espaços
escolarizados, alcançando até mesmo as regiões onde
não existem espaços instituídos para tal (Comunidade
Engenheiro Marsilac, Ponte Seca e comunidades
indígenas)”
(C.E. Parelheiros)

As Coordenadorias de Educação das Subprefeituras apontam também


para a necessidade das reflexões curriculares em torno desses Projetos:

“Em relação aos Projetos


Educom.radio e Recreio nas Férias (...) O trabalho de
expansão está feito, há que se
efetivar sua consolidação na
dimensão da reorientação curricular que
potencialmente apresentam”
(Santana/ Tucuruvi)

E consideraram a apropriação dos espaços de decisão da cidade como


forma de constituição do sentimento de pertencimento e de inclusão de todos e
de todas:

“Nos deparamos diante de um


quadro de marcantes desigualdades sociais e uma das
propostas para mudança é a de nos incluirmos ao grupo
das Cidades Educadoras que acreditam na educação

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inclusiva como possibilidade de transformação social e
educação para a Paz”.
(C.E. Sé).

“Acreditamos que esse trabalho só


poderia ter sucesso com a participação de todos, com as
pessoas realmente envolvidas na discussão, expondo
suas idéias e sugestões sobre a” sua cidade...” Durante
esse processo, uma das falas mais constantes do grupo
era a de que estávamos sendo” chamados “para o” novo
“. Para nós, um” novo “olhar, um” novo “modo de viver,
agir, sentir... a cidade, na cidade e da cidade”
(C.E. Pinheiros).

A população tem avaliado positivamente a educação na cidade de São


Paulo, o que podemos perceber nas últimas pesquisas divulgadas pela
imprensa. Esse fato reafirma o nosso compromisso com a educação que
queremos para a cidade e que retomamos no texto da Revista Educ Ação nº 4
- Cidade Educadora, Educação Inclusiva: Um Sonho Possível.
Nesse sentido, propormo-nos a avaliar o impacto do Programa de
Formação assumido e que aponta fundamentalmente para: Educação Infantil -
“Cultura da Infância” e Ensino Fundamental, Médio, EJA: “Ler e Escrever –
desafio de todos”.

Que ações de formação deste programa foram desencadeadas?


Qual o impacto da realização do Programa na transformação das
práticas educativas e na manifestação e produção de saberes?

“Avaliação(...) é um ato político. É um processo permanente de


ação-reflexão- ação”(Jussara Margareth de Paula Loch)

Referências

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática


educativa.Rio de Janeiro: Paz e Terra. 2001.

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ESTEBAN, Maria Teresa (org). Avaliação: uma prática em busca de novos
sentidos. Rio de Janeiro: DP&A. 2001.

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