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0. Introdução

O presente ensaio encontra-se intitulado: os princípios de formação de professores e seu


contributo no processo de integração dos conteúdos locais na disciplina de ciências sociais: o
caso da 5ª classe na escola primária de nova Mambone (2018-2021).

Nos modelos de formação de professores há três aspectos que podem contribuir para uma melhor
clarificação do significado do conceito de currículo:

i) A identificação do conhecimento importante, essencial ou relevante a ser ensinado


ii) As razões que justificam a escolha desse conhecimento;
iii) Perfil do indivíduo que a comunidade espera que resulte da implementação desse
currículo, do ponto de vista de identidade e subjectividade.

Estes aspectos constituem os três pilares do currículo, que estão em estreita relação entre si, e
que correspondem ao saber, ao poder e à identidade, respectivamente (SILVA, 1999).

Os conflitos gerados na construção do currículo resultam, por um lado, da dinâmica das práticas
sociais resultantes das transformações políticas e tecnológicas.

O paradigma da escola como unidade de investigação docente em prol do desenvolvimento local


reconstituí a imagem do ensino primário. A escola passa a assumir o papel de centro de produção
de conhecimentos locais, bem como de assessoria na governação local. Um dos efeitos da
inteligência curricular pode ser a produtividade e a sustentabilidade escolar. Ademais, através de
seus alunos e de seus docentes, a escola pode ser um lugar de produção e de disseminação de
conhecimentos que sejam relevantes para o desenvolvimento local. Assim, sob o ponto de vista
teórico, um currículo local, quando orientado para a sustentabilidade, contribui em larga medida
no processo de emancipação comunitária (NHALEVILO, 2013). No entanto, encontramos
crianças no Distrito de Govuro, em particular, alunos da Escola Primária de Nova Mambone, 5ª
classe que não conhecem as lideranças locais, as danças comunitárias, as divisões administrativas
do distrito e as personalidades distritais que dirigem o distrito no seu todo.
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CAPÍTULO I

1. A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E SEU CONTRIBUTO NO PROCESSO DE


INTEGRAÇÃO DOS CONTEÚDOS LOCAIS NA DISCIPLINA DE CIÊNCIAS SOCIAIS: O
CASO DA 5ª CLASSE NA ESCOLA PRIMÁRIA DE NOVA MAMBONE (2018-2021).

1.1 Currículo e saber local

Antes de definir o currículo local como tal, importa contextualizar os conceitos Local ou o
Regional. Considera-se Local ou regional como sendo o espaço geográfico com alguma unidade
cultural, económica, social não livre de contradições internas e com outras regiões ou locais, isto
é, sempre não pode haver homogeneidade na sociedade.

A educação básica moçambicana está actualmente orientada para o reconhecimento das culturas
locais. Trata-se de uma estratégia de criação de diálogo entre as narrativas, ou melhor, entre as
racionalidades tradicional e moderna. Nesta ordem de ideias, tem-se estado a defender, ao nível
comunitário, a criação de condições para uma coexistência equitativa e activa entre as meta-
narrativas, que são os conhecimentos globalizantes, e as mini narrativas, que são os saberes
locais (CASTIANO, 2006).

Esta visão de diálogo entre narrativas, ou diálogo intercultural, permite a priorização de uma
educação básica inclusiva. É um desafio aos países em desenvolvimento para a reconstituição de
suas culturas, de modo a serem cada vez mais valiosas local e globalmente. A política curricular
deste país prescreve que no ensino básico, 20% do tempo de cada disciplina são para a
leccionação de conteúdos locais. Tem, pois, em consideração a necessidade de articulação dos
saberes formais, herdados e reconhecidos globalmente, com os saberes locais, em prol do
desenvolvimento sustentável de cada aluno, de sua família e da comunidade em que estiver
integrado (VARELA, 2013).

O currículo local foi introduzido no âmbito das mudanças políticas, sociais, e culturais ocorridas
em Moçambique como resultado do ganho da independência, após cinco séculos de colonização
portuguesa. O local não é um espaço que pode ser determinado apenas geograficamente.
Efetivamente, compreende o espaço em que se situa a escola, comportando consigo vivências e
anseios da comunidade em que está inserida, cabendo a mesma comunidade definir o que
gostaria que os seus filhos aprendessem. A seleção de conteúdos pode, pois, incluir material não
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meramente local do ponto de vista geográfico cuja aprendizagem se afigura relevante no


contexto da comunidade” (INDE, s/d. p.10).

Nesta sequência, SOUSA (2010) elucida que Currículo Local é uma componente do currículo
nacional que integra aspectos de cultura local. O currículo local constitui uma das inovações
fundamentais que vai perpassar todo o sistema do ensino moçambicano. O currículo implícito diz
respeito à mensagem que passamos com a nossa atitude em relação à escola, aos alunos ou
outros aspectos do contexto educacional. Os saberes locais são apropriações das construções das
experiências vividas. Eles constituem uma base para aprendizagem local e são fundamentais para
a redução da distância entre cultura científica e a cultura local. Em contextos de autonomia
curricular é imprescindível a acção escolar baseada na inteligência curricular. Autonomia
curricular significa, pois, que a escola tenha autorização, em certa medida, para o
desenvolvimento curricular. Nisso, é imprescindível a garantia de uma racionalidade escolar que
seja orientada para a produção de conhecimentos locais.

Neste contexto de articulação entre os saberes universais e locais, tem muita importância entre
outros aspectos, considerar os conhecimentos prévios dos alunos; propor uma aprendizagem
cooperativa; promover a metacognição; despertar a motivação; estimular a autonomia, a
criticidade e criatividade; estabelecer relações dialéticas entre pensamento e conhecimento.

A análise subjacente a formação integral de professores remete-nos a discussão sobre o currículo


que sustenta esta pretensão, tendo em conta as transformações actuais no mundo global, as quais
não se compadecem com saberes fechados em si mesmos, mas incita a unidade na diversidade
dos referidos saberes, para que de forma dialógica permitam a compreensão deste mundo
complexo.

A função de ensinar para fazer aprender tornou-se mais exigente, sobretudo no que tange ao
conhecimento desejável, sendo que a colaboração e troca recíproca de conhecimentos elevam o
intercâmbio e envolvimento dos professores, podendo contribuir para a construção da identidade
desta profissão.

Por isso, a formação integral do professor recomenda o reconhecimento e a integração no


currículo de saberes disciplinares que realcem as teorias e práticas sobre os problemas
educacionais e disciplinares sem descurar a necessidade de valorização da experiência dos
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formandos adquirida no quotidiano social e/ou na rotina escolar através de alguns modelos e ou
personagens de referência.

Estes são pressupostos que contribuem para aumentar a expectativa e motivação para a profissão
docente, bem para a construção da imagem do professor.

Para DA CRUZ (1993), o sentimento local também se apoia em manifestações menos


académicas e mais poéticas, como na letra da canção “Lugar”: “Quem diz seu lugar é seu povo;
Quem diz o seu povo é seu costume; Assim como o cheiro; É que baptiza o perfume.”

Segundo DA SILVA (s/d), Currículo Local é um campo curricular marcado por um paradoxo
curioso: desvalorizado ou subvalorizado por alguns sectores mas simultaneamente bem visto e
em grande pujança por outros, pois alguns menosprezam os saberes locais por entenderem que,
na maior parte dos casos, são escritos ou praticados por curiosos, sem escola, sem formação
universitária ou com formação universitária não específica.

1.2 Princípios de formação de professores e integração do saber local

São princípios de formação de professores: a formação é um processo continuo; integrar a


formação como um processo de mudanças, inovações e desenvolvimento cultural; ligar a
formação com o desenvolvimento organizacional da escola; integrar a formação em relação aos
conteúdos epistemológicos e os psicológicos; integrar a teoria à prática; e estabelecer uma
congruência entre o conhecimento didático do conteúdo e o conhecimento pedagógico mediado
ou, por outra, adequar a linguagem a idade cognitiva do aluno. Para articular estes princípios
com a integração do saber ou currículo local far-se-á a seguinte abordagem.

a) A formação é um processo continuo.

Quanto a este princípio, DONNER (2012), em: Cultura Local: discutindo conceitos e pensando
na prática, afirma que o alcance dos livros de história dos municípios, das regiões é significativo,
pois este material é utilizado nas escolas como um “manual”, é relembrado nas festas e datas
comemorativas da região e é ali que muitos dos mitos de fundação da cidade e do povoado estão
escritos. Os autores destes trabalhos podem ser historiadores amadores ou profissionais, mas, em
geral, são pessoas vinculadas com comunidade pesquisada. Pelo seu apelo junto à comunidade,
este material torna-se um espaço para formação de identidades e memórias colectivas.
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b) Integrar a formação como um processo de mudanças, inovações e desenvolvimento


cultural.

Neste princípio, todas atenções deverão estar centradas na necessidade do aprofundamento do


saber local que, pois quanto maior for a profundidade do conhecimento sobre a cultura e saberes
locais nos alunos, maior é possibilidade de torná-los conscientes da participação das suas
comunidades na construção e valorização da cultura nacional e a sua actuação como actores
activos no processo cultural. (TÉTARD, 1999)

c) Ligar a formação com o desenvolvimento organizacional da escola.

Neste contexto, ASSIS, BELLÉ & BOSCO (2006), na obra de título: O ensino da Cultura Local
e sua importância, defendem que ao se pensar no ensino de Cultura e Cultura local, deve-se
priorizar a pesquisa, o aluno não pode acreditar que o conhecimento que o professor lhe
transmitiu é único e incontestável. O professor em seu papel mediador, ou orientador, deve
possibilitar que o aluno construa, através da pesquisa direccionada, novos conhecimentos. O
processo de pesquisar faz com que o aluno armazene esse conhecimento, não é como na
memorização que pode ser esquecida conforme o tempo passa.

d) Integrar a formação em relação aos conteúdos epistemológicos e os psicológicos; integrar


a teoria à prática.

Entretanto, para NOGUEIRA & SILVA (2010), no seu trabalho: Os desafios para a construção
de uma cultura local, ensinar Ciências Sociais é um desafio enfrentado no dia-a-dia do professor,
pois cabe a ele socializar, em sua prática docente, os conhecimentos adquiridos durante sua
experiência profissional, frente aos obstáculos diários enfrentados nas salas de aula, criando a
possibilidade de tornar o ensino de Ciências Sociais mais próximo e interessante ao educando.
Não existem fórmulas preestabelecidas, mas um conjunto de habilidades que podem e devem ser
colocadas em prática pelo professor em suas aulas. A este profissional cabe a função de ensinar
e, ao mesmo tempo, produzir a História, principalmente aquela que possibilite ao educando
interagir mais directamente com o que é ensinado, como meio de aproximar cada vez mais o
aluno da História de sua localidade e da sua vivência.

O conhecimento desejável da profissão docente será então, aquele saber racional e, também
empírico que resulta de uma profunda tomada de consciência pela reelaboração e transformação
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epistemológica e didáctica, em torno das actividades práticas, devidamente contextualizadas no


processo educativo (RIVERO, 2012).

e) Estabelecer uma congruência entre o conhecimento didático do conteúdo e o


conhecimento pedagógico mediado ou, por outra, adequar a linguagem a idade cognitiva
do aluno.

Significa que há uma necessidade de enaltecer-se o papel do saber local para a vida do homem e
as formas como ele deve ser aprendido, a compreensão dos conceitos básico em Ciencias Sociais
como o tempo e espaço, onde a sua aprendizagem deve acompanhar os estágios do
desenvolvimento da criança, do mais simples ao complexo, desde o ontem, hoje e amanhã; antes,
agora e depois e depois; nos acontecimentos e factos seculares, por fim, conhecer o passado, o
presente e o futuro previsível e tantos outros autores. (PROENÇA, 1990)

Fazendo e refazendo a cultura local de uma comunidade, desenvolve a consciência cívica da


necessidade de integração e intervenção na vida da comunidade; na medida em que descobre e
valoriza aspectos comuns a outras comunidades, valoriza as diferenças e por esta via diminui as
rivalidades entre elas; conhecendo a sua própria identidade, descobrindo os aspectos menos
positivos ou até reprováveis , reconhecendo o valor dos intercâmbios, tendo como referência,
uma matriz comum que é matriz nacional, afasta bairrismos fanáticos; a cultura local deve
despertar o amor inteligente a terra e ajudar a explicar o sentido das coisas e das atitudes;
finalmente ajuda a perceber que uma nação é um todo feito de partes, não apenas uma
justaposição das partes mas outra coisa diferente e que o conhecimento da História do país
através da História das suas partes suscita manos euforias e triunfalismos mas é mais realista e
mais seguro. (Dos Santos, s/d)
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2. Referências bibliográficas

CASTIANO, P. (2006). O currículo local como espaço social de coexistência de discursos:


estudo de caso nos Distritos de Barué, de Sussundenga e da Cidade de Chimoio. Revista E-
Curriculum. São Paulo, v.1, nº1, p.1-33.
INDE. Sugestões para a abordagem do currículo local. Manual de apoio ao professor. Maputo,
s/d. 10p
NHALEVILO, E. A. Z. (2013). O currículo local: uma oportunidade para emancipação. Revista
E-Curriculum. São Paulo, v. 11, n. 1, p. 23-34.
NOGUEIRA, Natania Aparecida da Silva. O ensino da História local: um grande desafio para
os educadores. IV Seminário Perspectivas do Ensino de História: Ouro Preto, 2001.
PROENÇA, Maria Cândida, Didáctica de História: Guia de introdução didáctica, Atlântica
Editora, Coimbra, 1990.
SOUSA, F. (2010). Diferenciação curricular e deliberação docente. Porto: PortoEditora.
SPRICIGO, Antónia César, Sujeitos Esquecidos, Sujeitos Lembrados, Murialdo, São Paulo,
2007.
TERTARD, Philippe, Pequena História do historiador, Universalidade do Sagrado Coração, São
Paulo: Editorial, 1999.
VARELA, B. L. (2013). O currículo e o desenvolvimento curricular: concepções, praxis,
tendências. Praia: Edições Unicv.

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