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APOGEU E DECLÍNIO DA ÁRVORE DOS FRUTOS DE OURO:

UMA ANÁLISE SOBRE A PRODUÇÃO CACAUEIRA DO SUL DA


BAHIA

Júlia de Oliveira Zumaeta Costa (juliazumaeta3@yahoo.com.br)


Luísa Maria Muniz de Oliveira (luisa.mmo@hotmail.com)

Resumo: O comércio internacional de cacau representa uma lucrativa modalidade


econômica, da qual diversos países se beneficiam, incluindo o Brasil. Neste, o Estado da
Bahia, durante muito tempo, foi responsável por grande parte da produção cacaueira, e
contribuiu enormemente para a economia local e nacional. Na região Sul do Estado, de
forma mais específica, essa cultura do cacau se alastrou por várias cidades, gerando
riqueza e prosperidade para a microrregião. Entretanto, com o surgimento de uma
doença que afetava os cacauais, conhecida como “vassoura-de-bruxa”, o cultivo da fruta
sofreu uma considerável queda, causando impactos socioeconômicos que podem ser
percebidos até hoje.
Palavras-chave: Agricultura. Cacau. Economia. Bahia.

APOGEE AND DECLINE OF THE GOLDEN FRUIT TREE: AN


ANALYSIS OF THE COCOA PRODUCTION IN SOUTHERN
BAHIA

Abstract: The international cocoa trade is a lucrative economic mode, from which
many countries benefit, including Brazil. The state of Bahia, for a long time, was
responsible for a big part of the cocoa production, and contributed greatly to the local
and national economy. In the southern region of said state, more specifically, the cocoa
cultivation had spread to several cities, generating wealth and prosperity to the micro
region. However, with the emergence of a disease that affected the cocoa tree, known as
“witches' broom”, the cultivation of this fruit suffered a considerable drop, causing
socioeconomic impacts that can be felt even today.
Keywords: Agriculture. Cocoa. Economy. Bahia.

1. Introdução
Desde tempos remotos, o Brasil apoiou sua economia na agricultura de
exportação, desde frutas até grãos diversos. Entretanto, um dos produtos que mais teve
destaque na história recente do país foi o cacau, que gerou enormes lucros para a receita
nacional, bem como o desenvolvimento das regiões que se dedicavam ao plantio dele.
O estudo da progressão do cultivo de cacau na região sul baiana tem por objetivo
a compreensão socioeconômica, política e histórica que a identificam. Por meio deste,
faz-se uma análise do que caracteriza a economia local, tendo em vista a produção
cacaueira como responsável pelo desenvolvimento regional, e o declínio dela como
fator preponderante no surgimento – ou melhor, agravamento de problemas
socioeconômicos.
Estabelece-se uma contextualização inicial, de forma que é exposta a progressão
histórica que proporcionou o cultivo do fruto regionalmente, ocasionando ainda um
entendimento maior sobre o que motivou tal cultura agrícola, bem como o
reconhecimento da região como caracterizada por esta. Aqui se faz relevante
compreender os aspectos que proporcionaram a implantação dessa cultura na região, e
suas implicações e vantagens.
Em seguida, se aborda o desenvolvimento do fruto na região, explorando a
formação, função e efetivação do mesmo, bem como os problemas que ocorreram
durante o processo, e, por fim, a realidade atual, decorrente já da crise da lavoura, por
conta da infecção desta pela “vassoura-de-bruxa”. Dessa maneira, propõe-se uma
exposição daquilo que é essencial para o conhecimento da realidade socioeconômica
rural do sul da Bahia.
Não por menos, justifica-se por meio deste artigo, a exploração dessa progressão
de maneira analítica e crítica, propondo um estudo social e econômico que beneficiam
quaisquer pesquisas posteriores com temática semelhante.

2. Apogeu e declínio da produção cacaueira do sul da Bahia

Desde os primórdios do comércio internacional, os diversos grãos representaram


sempre uma atividade de alto lucro para os países. Estes foram diversificando o cultivo
de grãos, cada qual com aquele que melhor se adaptava a suas condições ambientais. No
Brasil, o mais conhecido grão de exportação é o café; contudo, outro que teve grande
representatividade econômica e comercial foi o cacau, utilizado no mundo todo
principalmente para a produção de chocolates.
O fruto do cacaueiro, entretanto, depende muito de diversas variáveis climáticas
e ecológicas para se desenvolver. Anteriormente, ele era mais comum na região
amazônica e paraense; entretanto, acabou encontrando as condições mais adequadas na
região Sul do estado da Bahia:

O cacau é fruto que possui uma ecologia vegetal das mais exigentes, daí
explica-se a sua preferência e adaptação nas terras do sul da Bahia, onde as
suas necessidades são todas supridas. Gostando de umidade, tanto do ar,
quanto do solo, ambos requisitos são aí satisfeitos, pela abundância das
chuvas, presentes durante todo o ano e alcançando aproximadamente dois
metros anuais, com cerca de 202 dias chuvosos (SANTOS, 1957, p.47).

O descobrimento da possibilidade de cultivar cacau na região trouxe um impacto


muito positivo para seu setor agrícola, uma vez que se buscava uma alternativa
econômica para a lavoura açucareira, que não estava em uma situação demasiadamente
favorável e financeiramente vantajosa. Contudo, inicialmente, a experiência baiana com
o cultivo desse fruto foi medíocre, e somente a partir do século XIX, quando a
comunidade internacional passou a valorizá-lo mais, que aquela começou a ganhar mais
destaque – e adeptos.

As movimentações em torno das alternativas agrícolas, no Nordeste,


especificamente na Bahia, em função do declínio da lavoura açucareira no
Recôncavo, no entanto, continuavam. Assim foi que, na região sul baiana, o
plantio do cacau surgiu como uma opção econômica possível e, pouco a
pouco, foi se consolidando naquela que posteriormente seria denominada de
a “Região Cacaueira”. (ZUMAETA, 2004)

Gradativamente, o cacau foi se tornando um dos produtos mais importantes para


a economia não só regional, mas nacional. Por volta do ano de 1900, a Bahia já havia se
consolidado no mercado como um dos principais produtores de tal artigo, quando o
estado exportou cerca de 13 mil toneladas deste.
De forma não muito surpreendente, essa modalidade de plantio acabou
contribuindo enormemente para a receita nacional, como podemos constatar a partir dos
dados disponíveis a seguir.

O cacau é importante fonte de receita cambial, de renda e de emprego. As


exportações de cacau em amêndoas e de derivados produzem receita anual de
aproximadamente US$ 300 milhões, havendo alcançado, em 1979, a cifra de
US$ 1 bilhão. Como a maior porção da produção de cacau tem-se
concentrado no Estado da Bahia, ele [o cacau] é importante para seu
desempenho econômico, desde que grande parte de sua renda e emprego é
gerada pela produção e processamento do referido produto... O cacau já
representou cerca de 35% das exportações nordestinas. O excedente
econômico gerado pela lavoura se constituiu uma das principais fontes de
recursos para o financiamento da industrialização do país. Em 1985,
participou com 14% da arrecadação do ICMS da Bahia... (NASCIMENTO,
1994, p. 105).

No ano de 1957, contudo, a produção de cacau sofreu uma grave crise, e a falta
de um órgão que a regesse tornou-se um estorvo para a região. Em resposta a isso,
houve a criação da CEPLAC, Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira, com
o propósito de promover a sustentabilidade e a competitividade, tendo em vista a
progressão agropecuária do período, de maneira a dar apoio e oportunidades de
desenvolvimento à cacauicultura.

A missão da CEPLAC é promover a competitividade e sustentabilidade dos


segmentos agropecuário, agroflorestal e agroindustrial para o
desenvolvimento das regiões produtoras de cacau, tendo o cliente como
parceiro. Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira - CEPLAC,
órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, atua em seis
estados do Brasil: Bahia, Espírito Santo, Pará, Amazonas, Rondônia e Mato
Grosso. Criada em 20 de fevereiro de 1957, época em que a economia
cacaueira atravessava uma grave crise, teve sua atuação, nos seus primórdios,
centrada basicamente no apoio à cacauicultura (CEPLAC, 2012).

- Dados iniciais (ANTES DA CEPLAC)


(Introdução sobre a era dourada do cacau).
- Papel da CEPLAC pós 57
- 1980 – VASSOURA DE BRUXA

Por volta de 1996, o estado da Bahia ainda era um dos que mais produziam
cacau no Brasil, gerando riqueza não só para a região, mas para a economia nacional, de
forma que as fazendas de cacau começaram a se proliferar e expandir, a fim de obter a
maior lucratividade possível. No intuito de ilustrar a participação baiana no plantio dos
cacauais, apresentamos o seguinte gráfico, elaborado a partir de dados da CEPLAC.

Gráfico X – Participação baiana na produção de cacau em 1996.


Fonte: CEPLAC
Tendo em mente a noção de região cacaueira, vale ressaltar que esta não
compreende apenas os municípios que apresentam números maiores ou de maior
relevância econômica para a região, mas também as microrregiões circunvizinhas, ainda
que estas não tenham destaque em sua municipalidade (CEPLAC).
Dentro da região cacaueira (ainda com o foco sobre o estado da Bahia), as
cidades que mais se destacaram por uma produção significativa de cacau estão
representadas na tabela abaixo, que expõe a quantidade total colhida por município (em
arrobas), bem como as áreas referentes às várias fazendas que existiam naquele setor
territorial do estado.

Número de Fazendas Áreas médias (hectares) Produção (@)

Absoluto % regional Fazendas Cultivadas Total


Município

Ilhéus 1.131 9,1 73 35 1.164.297

Itabuna 615 5,0 70 51 811.777

Itajuípe 526 4,2 49 34 638.188

Camacan 639 5,1 69 33 602.406

Uruçuca 336 2,7 87 45 497.464

Fonte: Fichas cadastrais CACEX - CEPLAC (1965)

De modo geral, é possível inferir que essa bonança da lavoura perdurou por
várias décadas, mesmo sem a presença inicial da CEPLAC, mas foi entre 1980 e 1990
que esta teve seu ápice, e a produção (em toneladas) sofreu um aumento considerável
em relação aos anos anteriores, como pode ser observado no gráfico a seguir.
Gráfico X – Produção baiana de cacau ao longo de 1972 a 2005.
Fonte: CEPLAC

O declínio da lucrativa produção cacaueira se deu em decorrência do


aparecimento de uma doença altamente perigosa para os cacauais.
Os primeiros relatos de sintomas da vassoura-de-bruxa, uma das doenças dos
cacaueiros, aparecem nos diários do explorador português Alexandre
Rodrigues Ferreira, que a detectou, em 1785 e 1787, em cacaueiros da
Amazônia. Causada pelo fungo Moniliophthora perniciosa, deixa os ramos
do cacaueiro secos como uma vassoura de bruxa, reduzindo a produção em
50% a 90%. (FIORAVANTI, Carlos Henrique; VELHO, Léa. 2011)

Segundo Policarpo Junior (2006), numa matéria para a Revista Veja, “no dia 22
de maio de 1989, durante uma inspeção de rotina, um grupo de técnicos descobriu o
primeiro foco de uma infecção devastadora conhecida como vassoura-de-bruxa numa
plantação de cacau no sul da Bahia”. Este primeiro foco foi visto, na época, como um
caso isolado, entretanto, como será visto doravante, os casos de aparecimento desta
doença foram se alastrando rapidamente pela microrregião, trazendo consigo um grande
desastre socioeconômico.
- CEPLAC: ATITUDES TOMADAS PARA COMBATER A CRISE
Durante os tempos áureos da lavoura cacaueira, a população do sul e extremo sul
baiano era majoritariamente rural. Contudo, após a crise trazida pela infecção da
Moniliophtora perniciosa, este quadro se inverteu, posto que os trabalhadores das
fazendas produtoras de cacau perderam seus empregos, e foram forçados a migrar para a
área urbana.
Gráfico X – População rural e urbana entre os anos 1970 e 2000
Fonte: IBGE

Isso acarretou um enorme desequilíbrio social, uma vez que as cidades da época
não estavam preparadas para receber esse enorme contingente de pessoas
desempregadas. O inchaço urbano marginalizou os trabalhadores desempregados, e o
impacto disso pode ser sentido até os dias de hoje. O que antes era uma dádiva para a
região, trazendo lucro e desenvolvimento, agora passara a ser uma terrível avalanche de
dívidas e empobrecimento.
O declínio da lavoura cacaueira foi tão intenso e avassalador que somente após
um longo período de tempo algumas soluções realmente eficazes começaram a surgir.
Uma das técnicas mais empregadas nas fazendas é da clonagem de cacau, que ajuda a
combater a infecção, e é uma forma de finalmente começar a reconstruir aquilo que foi
destruído pela vassoura-de-bruxa.

A clonagem de mudas de cacau no sul da Bahia está ajudando a lavoura


cacaueira a recuperar as perdas causadas pela vassoura-de-bruxa.
Depois de dez anos em declínio, a produção brasileira de cacau começa a
mostrar sinais de retomada do crescimento, segundo Hilton Kruschewski
Duarte, 52, diretor da Ceplac (Comissão Executiva do Plano da Lavoura
Cacaueira). A safra esperada para 2002 é de 175 mil t, um aumento de 22%
em relação a 2001. (CARDOSO, 2002)

A técnica consiste em desenvolver sementes de cacau geneticamente fortalecidas


para se tornarem resistentes ao fungo, e então espalhá-las pela lavoura, de forma
metódica e bem organizada, a fim de evitar perdas.

Depois da germinação, os pedaços extraídos das novas plantas clonadas,


conhecidos como "garfos", estão prontos para serem enxertados nas árvores
atingidas pela praga. Em seis meses, a árvore clonada já possui copa própria,
e a infectada pela vassoura-de-bruxa pode ser decepada. Para o produtor, essa
técnica representa uma renovação mais rápida da lavoura. Em cerca de dois
anos a nova planta está pronta para produzir. (CARDOSO, 2002)

Ainda que o advento do cacau clonado tenha contribuído para melhorar a


situação “pós-vassoura-de-bruxa”, o cultivo precisava de outros métodos para o
combate da infecção. A CEPLAC então apresentou mais uma possível saída para o
problema, com um fungicida que é capaz de afetar e prejudicar o fungo.

O primeiro fungicida biológico para lavouras de cacau, o Tricovab, foi


lançado como produto comercial neste domingo, 16 de junho, em Itabuna
(BA), pela Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira, vinculada ao
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Ceplac/Mapa). O
lançamento foi feito durante o evento de comemoração ao Dia Internacional
do Cacau e contou com a participação de 400 pessoas, entre autoridades e
produtores. O controle biológico da doença conhecida como vassoura-de-
bruxa, que afeta plantações de cacau baianas há pelo menos 24 anos, foi
desenvolvido a partir de pesquisas dos engenheiros agrônomos da Ceplac,
Cleber Novais Bastos e João de Cássia de Bomfim Costa, que identificaram
potencial no fungo Trichoderma stromaticum para combater ao
Moniliophtora perniciosa, que provoca a doença. Nos testes em campo,
foram alcançados resultados de até 97% de eficácia contra o fungo em tecido
morto. Em matéria viva, nos galhos e frutos do cacaueiro, a taxa é de
aproximadamente 56%. (MOTA, 2013)

Deste modo, a região sul da Bahia começou a reconstruir seu papel de destaque
no cultivo de cacau, e, embora não tenha conseguido o reestabelecimento total deste,
ainda representa uma importante área de produção do fruto, e apresenta elementos
socioculturais provenientes dela.

3. Considerações finais
O cultivo do cacau foi uma das mais importantes atividades econômicas para a
região sul baiana, apresentando índices de produção altíssimos, e bastante lucratividade
– não só para a citada região, mas para todo o país, visto que a renda gerada
influenciava enormemente o PIB brasileiro.
Em escala local, o cultivo do fruto foi de extrema relevância tanto para o
crescimento das cidades quanto para o desenvolvimento de hábitos e fatores culturais
que influenciaram a sociedade da região.
O acompanhamento da cacauicultura baiana foi feito pela CEPLAC, uma
instituição que surgiu de uma crise, e então tomou para si a responsabilidade de
administrar aquela atividade econômica. O papel da CEPLAC teve destaque durante
algum tempo, mas logo começou a perder força e importância.
5. Referências Bibliográficas

http://veja.abril.com.br/210606/p_060.html

CARDOSO, Cíntia. “Cacau clonado combate vassoura-de-bruxa”, 2002. Acesso em


16 Maio 2014. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi0503200232.htm>

FIORAVANTI, Carlos Henrique; VELHO, Léa. Fungos, fazendeiros e cientistas em


luta contra a vassoura-de-bruxa. Sociologias,  Porto Alegre,  v. 13, n. 27, Aug.  2011.  
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-
45222011000200010&lng=en&nrm=iso>. Acesso em  03  Jun  2014.

http://www.ceplac.gov.br/paginas/ceplac/ceplac.asp

http://www.uesc.br/editora/livrosdigitais/a_regiao_cacaueira_da_bahia.pdf
http://www.agricultura.gov.br/vegetal/noticias/2013/06/ceplac-lanca-produto-
sustentavel-para-combater-vassoura-de-bruxa

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