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Espacos Informais e Educacao Basica Final
Espacos Informais e Educacao Basica Final
Yvonne P. Mascarenhas
Organizadora
Thais Cardoso
mediadora
2018
Instituto de Fisica de São Carlos/USP
Prof. Dr. Vanderlei Salvador Bagnato
Diretor
Diagramador
Rafael Campelo
Apoio Institucional
Instituto de Estudos Avançados/USP
Apoio
CNPq (Contrato No. 472364/2013-8)
Centro de Difusão Científica e Cultural, Campus de São Carlos da USP
SUMÁRIO
Introdução ....................................................................................................5
Primeira palestra
Parque CienTec: Um Museu de Ciências a Céu Aberto ............................7
Fábio Ramos Dias de Andrade
Segunda Palestra
Catavento Cultural......................................................................................43
Gabriel Giannini Furruel
Terceira Palestra
A Contribuição dos Zoológicos à Educação e à Cidadania. ..................71
Kátia G. de Oliveira Rancura
Quarta Palestra
Museu da Língua Portuguesa ....................................................................95
Marina Sartori de Toledo
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Introdução
Estamos muito acostumados a associar os museus a ideias de
conservação de patrimônio histórico e cultural. Entretanto, se pen-
sarmos que cada vez mais, como afirma J. Amado Mendes que
...a educação continua a ser fator decisivo para o
desenvolvimento das pessoas e da sociedade, com o
conceito de aprendizagem ao longo da vida – muito
em voga em nossos dias e que constitui uma das ima-
gens de marca das políticas educativas do século XXI
–, o papel dos museus tem vindo a reforçar-se, como
complemento da educação formal, atribuída às es-
colas, mas principalmente como fatores decisivos, no
âmbito da educação não formal.1
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Primeira palestra
Parque CienTec: Um Museu de Ciências a
Céu Aberto
7
Figura 1. Vista da Cidade de São Paulo a partir do Parque CienTec, ao longo do Vale do
Ipiranga.
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Figura 4. Planetário do Parque CienTec durante Feira USP e as Profissões, em 2016.
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Figura 5. Parque Estadual das Fontes do Ipiranga (imagem aérea, Google Earth).
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Figura 6. Vista panorâmica do Parque CienTec (Fonte: Google Earth)
Mediadora:
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Nós agradecemos o Prof. Fábio pela palestra, e agora nós vamos
abrir o espaço para perguntas, dúvidas ou comentários da audiência.
Participante Gislene: “Bom dia, me chamou a atenção quando
você está descrevendo as metas, a questão do reconhecimento e da
aproximação do não-público, como é que isso se dá”.
Prof. Fábio: “A Alessandra é uma pessoa mais habilitada para res-
ponder essa questão, mas basicamente, a gente procura através de
questionários, vou dar um exemplo prático, nós fizemos um ques-
tionário online que foi enviado para toda população da USP, pro-
fessores, funcionários, há um ano e meio atrás, e nós coletamos aí
um certa população, 4 mil e 500 respostas, da comunidade uspiana,
em relação ao Parque CienTec, e também em relação aos espaços de
divulgação cientifica, aos museus, aos acervos etc.
O resultado desse questionário revelou como o Parque CienTec
é pouco conhecido pela própria da USP. Alessandra poderia falar
melhor sobre isso”.
Alessandra:
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Então a gente viu por exemplo, que o planetário é um ponto im-
portantíssimo, muitas famílias vão ao final de semana, por causa do
planetário, e um outro movimento motivador que tem levado a um
aumento do número de visitantes são as nossas tardes cientificas,
quando fazemos um ciclo de palestras, e conversas entre especialis-
tas e público. Outro fator que levou a maior número de visitantes foi
o ter aberto o Museu aos sábados. Começamos a acompanhar esse
público e entender quais são as demandas desse potencial público.
Porque em alguns países latino americanos, como o México, a
cultura de visitação aos espaços não-formais é bastante intensa? No
Brasil nós estamos construindo isso, e eu acho que no governo an-
terior, com 15 anos de investimento em políticas públicas para isso,
tivemos um ganho considerável. Eu sou otimista nesse sentido, esta-
mos num caminho positivo, de ampliação de público.
Prof. Fábio:
Prof. Alessandra:
“Eu acho que é uma questão bastante importante que você está
trazendo, a formação de mediadores é crucial para esses espaços.
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Vemos nos nossos encontros diários, que é necessária uma formação
mais contundente, mais coesa, mais contínua, e não tão pontual, tão
momentânea, ainda mais que reconhecemos que os mediadores, são
alunos de graduação, tem um tempo de bolsa limitado.
E como poderíamos pensar numa formação mais continua dos
mediadores? Temos feito esforços junto a pró-reitoria de graduação
da USP visando ter um modelo mais integrado de formação entre
a licenciatura e os nossos órgãos de divulgação científica visando
aproveitar os nossos espaços para que os alunos possam, também,
desenvolver os seus estágios obrigatórios articulados a esses locais.
Existe uma resistência a essa proposta alegando-se que a legisla-
ção não permitiria que os estudantes desenvolvessem seus estágios
fora da escola, mas foram encontradas possíveis interpretações na
legislação que permitem que estudantes façam parte dos seus está-
gios nos espaços educacionais não-formais.
Então por exemplo, lá na faculdade de educação, a Profa. Mar-
ta Marandino já faz isso com os alunos, permitindo que no estágio
obrigatório dos cursos de licenciatura os alunos façam uma parte
dele em museus. Entretanto, no Instituto de Biociências, onde eu
dou aula, não conseguimos porque legalmente é na escola que o es-
tágio tem que ser realizado.
Atualmente estamos tentando que a Pró-reitoria de graduação,
junto com a Pró-reitoria de cultura e extensão da USP, montem um
programa institucional em que fique muito claro, junto as comissões
de graduação, que o aluno pode sim, contar horas de estágio obri-
gatório em Museus. Isto levaria a uma formação inicial, articulada
a uma formação continuada durante a prática de mediação. Mesmo
essa solução não pode ser considerada definitiva e todo o processo
é muito complicado, inclusive pela grande rotatividade de mediado-
res. Esse é um desafio, um ponto crucial. Tanto assim que em todo
encontro que participamos, a formação é um ponto nevrálgico de
discussão. ”
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referência para ser alcançada. Nós também, tanto pela restrição de
espaço que temos, como pelo tamanho da cidade, às vezes nos refe-
rimos ao CienTec como o espaço que nós gostaríamos de ter. Então,
todos temos alguma limitação, e isso é pelo anseio, de cada dia poder
fazer melhor e mais para comunidade.
Entretanto, acho que há uma diferença muito grande entre aquilo
que o zoológico faz, e aquilo que nós fazemos. O zoológico é um
lugar em que você se diverte, é um show, você vai ver o macaco pu-
lando, admirar os grandes mamíferos e a grande variedade de aves
e répteis. Talvez até dentro do zoológico possa ter algum progra-
ma educacional que explore questões envolvendo os bichos, mas as
famílias vão lá, não é, suponho eu, pelo programa educacional do
zoológico, mas é mesmo para olhar os bichos, enquanto nós não fa-
zemos um show nesse sentido, não é uma diversão, não vou botar
uma gangorra aqui no CDCC, para os alunos se divertirem nela. Se
eu colocar a gangorra aqui, provavelmente nós vamos dizer que tem
uma força de um lado, uma reação do outro, um peso, uma coisa
desse tipo, e aí é que vem, às vezes, o desinteresse na hora que você
transformou a gangorra num instrumento de ensino e não numa
diversão.
Então a gente não vai conseguir competir com lugares que são
pura diversão, enquanto que nós temos uma missão um pouco mais
nobre, eu diria, embora, é óbvio que na divulgação cientifica, você
também não pode ser tipo escola, por isso nós chamamos de espaços
não-formais. Você tem que também explorar o aspecto lúdico, mas
na medida certa. ”
Prof. Fábio:
Precisamos achar uma linguagem que torne esse espaço mais vol-
tado para o conhecimento cientifico, não divertida, mas instigante.
Não queremos que as pessoas vejam um equipamento e deem garga-
lhadas e achem aquilo um máximo, mas que elas fiquem fascinadas.
Também a gente não tem dado muita ênfase em explicar todos os
fenômenos para as pessoas, a gente fica feliz se alguém for ao parque
e sair cheio de dúvidas, e ir até angústias e perguntas: ‘mas caramba,
por que que aquilo acontece daquele jeito? ’, ‘então, tal coisa não era
assim, como será que é? ’, e provocar dúvida. Isso não é uma coi-
sa simples de fazer, mas a gente tem exemplos pelo mundo que são
muito bem-sucedidos, tem o CDCC, tem vários lugares que fazem
isso muito bem, e a gente vai aprendendo e tentando fazer.
Participante Adeilson:
Prof. Fábio:
Participante Silvia:
Prof. Fábio:
“O planetário é um ponto nevrálgico nosso, porque ele é a pri-
meira coisa que as pessoas se lembram, em perguntas espontâneas.
Quando fazem uma visita ao planetário, as pessoas adoram, mas o
planetário é um equipamento muito caro e complexo e, infelizmen-
te, tivemos um dano elétrico num projetor e estamos no processo de
repara-lo ou mesmo adquirir um novo modelo.
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Comentário do Prof. Valter:
“Fábio, eu acho que sua palestra foi um estímulo para todos con-
tinuarem até o fim, pois levantou muito interesse e suscitou tantas
perguntas. Agradeço e o parabenizo pela qualidade da sua apresen-
tação, e também por revelar sinceridade de propósitos, que a meu
ver, é a coisa mais importante. Obrigada por ter vindo. ”
Mediadora:
Bom pessoal agora eu vou pedir para as bolsistas que nos auxi-
liam na recepção venham aqui para frente para fazermos o sorteio
dos livros e a seguir teremos uma pausa de 30 minutos para o café.
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Primeira Mesa Redonda
Pesquisa em Educação Não Formal
Primeira expositora
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Imagem 4: Aula da Disciplina de Formação Transversal.
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Primeira Mesa Redonda
Pesquisa em Educação Não Formal
Segunda expositora
Alessandra Bizerra
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Eu sou bióloga de formação, mas em um determinado momento,
no mestado, especificamente quando trabalhei com filogenia e his-
tória natural de serpentes, ensei: ‘Não, tem algo errrado. Eu gosto
de fazer pesquisa, mas não é exatamente esse tipo de pesquisa que
eu quero fazer’. Logo após o mestrado, visitei um museu, junto com
uma prima, em que havia um celacanto. Para quem é biólogo, o cela-
canto é um lindo exemplo para entender a evolução. Eu já havia visto
réplicas de celacantos em outros museus, mas quando me deparei
com um espécime original comecei a chorar em plena exposição.
Minha prima questionou ‘Alê, isso é um peixe, porque você está cho-
rando?’. E eu: ‘não, não é qualquer peixe, é um celacanto! Olha isso
aqui’.
Eu voltei tão impactada com aquela experiência, indagando-
me como esses espaços podem promover interações tão intensas e
diversas. Obviamente, depende do background de cada um. Minha
prima é fisioterapeuta, para ela aquele peixe não fazia sentido ne-
nhum, para mim fazia todo sentido. Pensar nesses espaços como um
local de significação cultural foi revelador. Eu adorava os museus,
mas eu nunca tinha pensado em um museu nessa perspectiva. Então
é desse lugar que eu estou falando com vocês, do lugar de uma pes-
soa que vê os museus pelos bastidores tentando compreender como
se dá construção desse discurso exposto e como que o público inte-
rage com esse recurso.
Falar sobre Educação Não Formal é muito amplo e seria muito
difícil fazer uma fala coerente em tão pouco tempo. Então, vou focar
na área em que trabalho, que são as pesquisas sobre aprendizagem.
Na minha opinião, a aprendizagem em museus é uma moeda políti-
ca muito importante porque somos sempre questionados sobre nos-
sos impactos, sobre o que o museu é capaz de gerar, as ações que a
divulgação científica é capaz de promover. Assim, vou tentar trazer
aqui munição para brigarmos politicamente por esses espaços.
Então, qual é minha proposta hoje? É trazer para vocês algumas
pesquisas, internacionais e nacionais, voltadas para educação, com
foco na aprendizagem. Mas quero trazer as principais questões des-
sas pesquisas e não somente seus resultados. Nós criticamos muito
que a divulgação científica se pauta só na apresentação de resultados
para o público, mas acabamos fazendo o mesmo nas pesquisas em
educação e divulgação científica. Então, quero trazer um pouco do
processo das pesquisas para vocês, das metodologias, das perguntas.
Os resultados são consequência disso. Tudo isso, obviamente, a
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partir da minha leitura, do meu local de fala.
Um primeiro trabalho que trago é a livre-docência da Martha
Marandino, professora da Faculdade de Educação da USP, em que
ela traça um olhar mais panorâmico na área de educação em mu-
seus e traz perspectivas e dimensões diferentes da pesquisa na área,
adaptadas para esta apresentação. Uma delas é a dimensão socioló-
gica, que inclui os estudos que vão tentar revelar os jogos de poder,
as forças políticas que se manifestam na elaboração dos discursos
expositivos. E quando eu falo em discurso expositivo, estou falando
tanto da ação que o Ponto fez, do dispositivo apresentado no Cien-
Tec, da fala do mediador, da exposição que montamos, da ação edu-
cativa que é específica, por exemplo, de um museu acessível. Esses
são discursos expostos ao público. Em uma dimensão sociológica da
pesquisa em educação em museus, buscamos compreender como
essa construção se dá socialmente.
Para a Martha, há também uma dimensão mais epistemológica
das pesquisas que busca entender como esses conhecimentos são
postos no museu, trabalhando a partir da transposição didática e da
recontextualização. Essa dimensão refere-se a pesquisar, por exemplo,
como vamos trabalhar a física quântica nos museus ou como se dá
a construção do conhecimento sobre expografia. Relaciona-se a
entender a construção de conhecimento dentro desses espaços.
Já em uma dimensão psicológica da pesquisa na área, que é onde
eu trabalho mais, o foco está na análise dos processos de apropriação
e recriação cultural nesses espaços, está na interface entre o discur-
so expositivo e os públicos. Minha linha de pesquisa situa-se nessa
dimensão.
Mas quais são as principais questões de pesquisa nessa dimensão?
Tem uma que é básica, acho que a gente já superou, mas tem muita
gente que ainda não consegue responder: “aprendemos nos museus?”.
Vocês concordam que a gente aprende nos museus? Sim? Muitos de
vocês concordam, mas há numerosas pesquisas afirmando que não
aprendemos nos museus. Se pegarmos pesquisas das décadas de 80,
90, que faziam pré-teste e pós-teste - testa o conhecimento da pessoa
no início, faz a visita, testa no final, era comum o resultado de que
não se aprende nada durante uma visita ao museu. Certamente,
considerar se aprendemos ou não em museus depende de nossa
concepção do que é aprendizagem.
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Então, precisamos entender qual a perspectiva de aprendizagem
que está sendo considerada nessas pesquisas, em que se conclui que
não ocorre aprendizagem em museus As pesquisas inicias de apren-
dizagem tinham uma proposta muito cognitivista, pautada na ideia
de aprendizagem enquanto produto. Nessa perspectiva, o visitante
participa da atividade, aprende coisas e o produto final poderá ser
medido pelo pesquisador. A aprendizagem é vista como um produto
mensurável.
São comuns, assim, as brincadeiras que vemos sobre aprender em
museus. Há uma piada que diz: ‘então você chega lá, você põe a mão
na esfera, o cabelo arrepia e pronto, aprendeu ciências’. Essa é uma
crítica à ideia de que basta manipular, agir, para aprendermos ciên-
cias. É comum ouvirmos também a crítica de que o visitante passa
15 minutos no museu, clica em um vídeo e não assiste até o final,
mexe em tudo e vai embora. A gente sabe que isso acontece, mas isso
significa que o visitante não aprende? Temos que discutir então o
que é aprendizagem em museus.
Vamos contextualizar essa questão: vocês conhecem os corvos e
as galinhas? Conhecem? Vocês conhecem, gente! Quais as diferenças
evidentes entre um corvo e uma galinha, fora as diferenças morfoló-
gicas? Uma é doméstica, a outra não. Uma é comestível, o outro não.
Em relação aos hábitos, as crenças, como a galinha é vista? A gen-
te fala que ela cisca para trás. Por que falamos que ela cisca para trás?
Porque é considerada “burra”, é comum ouvirmos que a galinha é
burra e o corvo, inteligente. A galinha não consegue resolver tantos
problemas como o corvo consegue. Por que será que essas diferenças
ocorrem?
Em um experimento, que pode ser visto em https://youtu.be/
bXQAgzfwuNQ, feito com uma gralha (parente muito próximo
dos corvos), é oferecido alimento a ela em (um recipiente cilíndri-
co fundo o bastante para que ela não consiga alcançar com o bico.
Entretanto, ela encontra a lado um arame e sabe o que ela faz com o
arame? Ela consegue retirar o alimento moldando o arame em for-
ma de gancho. Ela resolveu um problema com o qual não havia tido
contato até então. Como podemos explicar isso?
Tem gente que vai explicar de forma biológica. O corvo tem uma
maior massa cerebral proporcionalmente à massa corpórea então,
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biologicamente, ele teria maior capacidade cognitiva. Outras pessoas
vão falar que não é este o ponto central, pois o corvo tem cuidado
parental, são meses em que a mãe e o pai do corvo ficam cuidando
de seus filhotes, diferentemente da galinha.
Então o que eu queria trazer com esse exemplo, enfatizando que
não estou transpondo diretamente para a espécie humana, é que te-
mos formas diferentes de encarar a aprendizagem. Muitos dos traba-
lhos e pesquisas que falam que as pessoas não aprendem nos museus,
em geral veem a aprendizagem como uma perspectiva mais inata,
em que já nascemos com capacidades biológicas que vão permitir
aprendermos mais ou menos. Outras vão defender que nascemos
imersos em uma cultura, e essa cultura interfere no nosso modo de
aprendizagem e naquilo que construímos de conhecimento.
Essa é só uma das questões que diferenciam as teorias de apren-
dizagem, e poderia trazer muitas outras aqui. A aprendizagem é in-
dividual ou social? Aprendemos por acúmulo ou por construção?
Então, dependendo de como eu respondo a essas questões e como
encaro a aprendizagem, vou fazer a minha pesquisa de forma dife-
rente e vou ter resultados diferentes.
A aprendizagem é um processo ou produto? Se eu encaro como
produto eu posso fazer um pré e pós-teste, se eu encaro como pro-
cesso eu tenho que ver o que as pessoas fazem ao longo da vida
delas, ou em um momento da vida delas. Isso remete a formas
diferentes de encarar o processo de aprendizagem dentro dos mu-
seus. E a minha crítica em relação as pesquisas iniciais que fala-
vam que não aprendemos nos museus é que elas estavam em uma
visão mais comportamentalista. Eu não estou desmerecendo o
comportamentalismo, mas questiono a conclusão de que não se
aprende pautando-se somente em uma abordagem do que é aprender
dentro dos museus. A partir do momento em que estabelecemos ou-
tras formas de fazer pesquisa, temos outras compreensões de apren-
dizagem em museus.
Além da concepção de aprendizagem, encontramos diferenças
nas metodologias de pesquisa. Há pesquisas, por exemplo, que se
utilizam de surveys, são pesquisas mais horizontais, mais quantita-
tivas, que vão analisar uma grande amostra. Há também pesquisas
mais verticais, geralmente qualitativas. Vou trazer aqui alguns exem-
plos dessas duas possibilidades.
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Um exemplo de survey horizontal que considero importante é
uma pesquisa de percepção pública sobre hábitos culturais dos pau-
listas, que o Instituto Datafolha fez junto com Joao Leiva, em que
investigam o engajamento das pessoas para irem às instituições mu-
seais, entre outros aparatos culturais (relato de pesquisa disponível
em http://www.pesquisasp.com.br/ .
Nesse survey, foram entrevistadas cerca de 8 mil pessoas no esta-
do de São Paulo, numa proporção representativa dos dados censitá-
rios do IBGE, considerando gênero, etnias, idade, residência, entre
outros dados. Uma das perguntas se referia a que o entrevistado faz
nas suas horas livres. Nesta nuvem de palavras que representa as res-
postas dos entrevistados, não é possível visualizar os museus.
Quando a pessoa espontaneamente é chamada para falar o que
ela faz em seu tempo livre, ela não coloca os museus como uma pos-
sibilidade de lazer. Mas quando é perguntado sobre o interesse que
as pessoas têm por museus, o quadro é diferente. Se considerarmos
quem tem médio ou grande interesse, vemos que os museus tem
uma porcentagem grande de interessados e ganha de outras ativida-
des culturais.
Vemos que há um público frequentador e também um potencial
para participar desses espaços. Mas entre os frequentadores, vemos
que ainda é um público bastante elitizado, com nível superior com-
pleto, classes A e B. Agora, é o fator econômico que leva a pessoa ao
museu? Não, não é.
Se olharmos para a visitação, em função da renda e da escolarida-
de, veremos que quem é considerado como classe C e tem ensino su-
perior vai mais a teatros e museus do que quem pertence às classes A
e B, com Ensino Médio. Então, a escolarização é bastante importante
para levar as pessoas a esses espaços.
E aqui, trazendo o que a Gislaine tinha perguntado sobre aque-
la pesquisa do não-público, trago uma outra pesquisa quantitativa
que inclui o CDCC. Quando mandamos, pelo Parque CienTec, um
survey para mais de 100 mil pessoas pertencentes à comunidade
USP (alunos, funcionários e docentes), recebemos 4.500 respostas.
Desses, 8,3% já conhecem o CDCC. Vemos que a Estação Ciência é
bastante conhecida pela comunidade uspiana, um grande número
de pessoas frequentava esse espaço intensamente. Mas, perto do
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público que poderia visitar órgãos e museus da USP, o número de
visitantes ainda é reduzido.
Como já falei, temos também as pesquisas que possuem uma
perspectiva de profundidade. Não estou falando que elas são melho-
res por serem mais profundas, mas que são mais verticais e buscam
compreender os fenômenos com mais densidade. Investigam um
público menor e analisam com maior detalhamento. E aí eu trago
outra concepção de percepção, que não é a mesma dos grandes sur-
veys, porque os surveys que o MCTI faz sobre percepção pública da
ciência referem-se a opiniões que os visitantes manifestam sobre os
museus e centros de ciências. Abro aqui um parêntesis: quando falo
em museus de ciências, eu estou considerando uma definição que
o ICOM já utilizou, de qualquer instituição sem fins lucrativos que
tem patrimônio natural, arqueológico, histórico, arquitetônico. Essa
definição inclui zoológicos, science centers, jardins botânicos, unida-
des de conservação... Minha visão de museu é, portanto, bem ampla.
Quero discutir percepção e concepção a partir dessa imagem
(peixe em um aquário sendo observado por uma criança e um gato).
Ela nos ajuda a pensar em relação a como percebemos e podemos
ter compreensões diferentes a partir de um mesmo objeto, nos faz
lembrar que temos um público muito diverso, e o objeto que a gente
coloca em exposição vai ser interpretado de formas diferentes por
esses públicos.
É desse tipo de percepção que eu estou falando. Dependendo
das características desse público, da formação dele, do que ele já
sabe, ele vai dar um significado diferente ao que percebe do objeto.
A gente fala ‘como vamos trabalhar então com essa complexidade
toda?’. É complexo? É complexo. E para a pesquisa então! Imagine
abarcarmos toda essa complexidade. Hoje, vêm crescendo as pesqui-
sas com mega-dados que tem outras perspectivas e que vão tentar
trazer essa complexidade para o estudo.
Um exemplo, que talvez seja até mais horizontal, é o trabalho que
Falk (autor de Learning from Museums: visitor experiences and the
making of meaning, John H Falk and Lynn D Dierking) fez nos
Estados Unidos, em que ele queria ver qual é o papel de uma ex-
posição específica, de um módulo específico de um museu de Los
Angeles. Ele fez, antes da exposição ser implantada, uma pesquisa
de percepção sobre homeostase. Ele perguntou para uma amostra
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da população de Los Angeles se sabiam o que era homeostase ‘vocês
sabem o que é homeostase?’, ‘quem poderia definir homeostase?’.
Nesta pesquisa, foi escolhido o termo homeostase para análise,
já que correspondia a um termo raramente abordado na divulga-
ção científica em geral. Na coleta de dados inicial, 7% das pessoas
sabiam definir homeostase. Depois de 4 anos dessa exposição imple-
mentada, 20% da população de Los Angeles conseguia definir ho-
meostase. Essa é uma evidência indireta de que a exposição do mu-
seu, frequentada recorrentemente por moradores da cidade, pode
influenciar a aprendizagem conceitual de seus visitantes.
Eu trago também as ideias do Vigotski, principalmente a de que
os significados não estão prontos, mas que damos significado para
as coisas em interação social, como a imagem de um peixe. É im-
portante lembrarmos que, para Vigostki, peixe tem um significado
compartilhado continuamente construído socialmente, este é rela-
tivamente estável. Já o sentido que atribuímos a ele tem um cará-
ter mais instável, e pode variar dependendo das interações de um
sujeito em grupo em um dado momento. Vigotski nos ainda apre-
senta uma ideia bastante interessante, quando afirma que a espécie
humana tem uma característica básica que é conseguir integrar o
pensamento e a linguagem. Quando integramos o pensamento com
a linguagem, temos o significado da palavra. E os museus têm um
papel bastante importante nisso, eu vou mostrar para vocês em quê.
Para ilustrar, apresento uma pesquisa do Deb Roy, do MIT, em
que gravou o filho dele recém nascido em sua própria casa. Ele colo-
cou uma câmera em cada cômodo da residência, coletando as falas
que a criança fazia ao longo dos primeiros anos de vida. Vou apre-
sentar uma descrição do trecho do vídeo que ele produziu:
[...]And with that, let me take you now for a first tour into the data.
So you’ve all, I’m sure, seen time-lapse videos where a flower will blos-
som as you accelerate time. I’d like you to now experience the blosso-
ming of a speech form. My son, soon after his first birthday, would say
“gaga” to mean water. And over the course of the next half-year, he
slowly learned to approximate the proper adult form, “water.” So we’re
going to cruise through half a year in about 40 seconds. No video here,
so you can focus on the sound, the acoustics, of a new kind of trajec-
tory: gaga to water.
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[Audio Bebê:] Gagagagagaga Gaga gaga gaga guga guga guga
wada gaga gaga guga gaga wader guga guga water water water water
water water water water water.
He sure nailed it, didn’t he?
O vídeo completo está em: https://www.ted.com/talks/deb_roy_
the_birth_of_a_word?language=pt-br&utm_campaign=tedspread-
--a&utm_medium=referral&utm_source=tedcomshare).
Ele fez isso com as 533 termos em que conseguiu localizar o nas-
cimento da palavra, nesses dois anos. Esse é um gráfico do que acon-
tece quando essas palavras nascem. Olha que interessante, no eixo y,
temos a complexidade da fala do adulto, a mãe, o pai e a babá, e aqui,
no eixo x, o tempo de nascimento da palavras. O que podemos inter-
pretar? Que simplificamos a nossa linguagem até a criança conseguir
se apropriar daquele termo e depois a complexificamos novamente.
Isso é o que fazemos enquanto espécie humana, e como esta-
mos fazendo isso em relação à Educação e à Divulgação? Temos
o discurso de que a divulgação científica tem que simplificar as
ciências para o público, mas como ficaria a parte de complexificar?
Um movimento como esse pode ajudar, como no caso do filho de
Deb Roy, em que as palavras nascem a partir da interação entre a
criança e os adultos responsáveis com o ambiente em que vivem, a
desenvolver o processo de internalização e externalização.
Talvez essa ideia esteja relacionada ao que Vigotski afirmava
sobre a reprodução da cultura. Aprender não é só adquirir, é tam-
bém expressar. Para o pesquisador bielorrusso, aprender possui um
momento de internalização da cultura, mas também um momento
de externalização, em que a cultura é re-criada. Em um processo
de aprendizagem, a gente adquire e se expressa. Se montamos uma
exposição, por exemplo, que em um momento o visitante possa
articular um conceito e no segundo momento tenha um novo contato
com esse mesmo conceito e que ele possa também se expressar, em
outro contexto, essa talvez seja uma ferramenta que possamos criar
para facilitar que o visitante faça a transferência de um contexto para
o outro. Nessa perspectiva, esse movimento de internalizar e exter-
nalizar corresponde à aprendizagem.
Compreender, então, como as pessoas podem aprender nos
museus foi minha maior inquietação em meu doutorado. Entre as
possibilidades teóricas para estudar a aprendizagem, pautei-me em
referências da perspectiva histórico-cultural.
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Resolvi me aprofundar na Teoria da Atividade, desenvolvida por
teóricos como Davidov e Leontiev, que analisei em minha tese dis-
ponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/
tde-15092009-132843/pt-br.php) que navegam por águas vigotskia-
nas, e bastante aceita como um referencial da aprendizagem es-
colar. Segundo essa teoria, há uma diferença entre Aprendizagem
e Atividade de Aprendizagem. No primeiro caso, a aprendizagem
ocorre dentro de nossas Atividades, como um epifenômeno, como
uma consequência. Aprendemos ao brincar, trabalhar, ao jogar…
No segundo caso, estamos em Atividade de Aprendizagem quando
realmente nos engajamos em aprender, quando temos a intenção de
aprender. Nesse processo, partimos do nível empírico de observa-
ção, do concreto sentido, de tocar, manusear, cheirar e começamos a
fazer abstrações e a traçar um novo concreto, agora o concreto pen-
sado, um conceito ou uma prática construídos a partir da realidade.
Foi o que Davidov chamou de ascenção do abstrato ao concreto.
Será que esse processo acontece nos museus? Essa era minha
principal pergunta de Doutorado. Então eu usei as ideias do Enges-
tröm, que desenvolve esse ciclo de ascensão do abstrato ao concreto,
com etapas detalhadas. Gravei 15 famílias interagindo no Museu
Biológico do Instituto Butantan e conseguimos perceber ciclos de
aprendizagem expansivas ocorrendo nos tempos curtos de uma visi-
ta museal. (BIZERRA, A. F. Atividade de Aprendizagem em Museus
de Ciências. Doutorado em Educação. 274p. Faculdade de Educa-
ção/USP. 2009. Disponível em http://www.teses.usp.br/teses/dispo-
niveis/48/48134/tde-15092009-132843/pt-br.php
Uma família que tinha, por exemplo, uma forma de identificar
serpentes, uma prática social de identificar serpentes, construiu um
novo modelo de identificação que foi testado ao final da exposição.
A gente consegue ver isso em 40 minutos de visitação.
Então, sim, nós aprendemos nos museus mesmo na perspectiva
da Teoria da Atividade. Sempre? Não... Como também não acontece
na escola. Agora, o que eu acho que é o diferencial dos museus? Em
geral, as pessoas querem ir para o museu para se divertir, e também
para aprender, e nesses espaços, temos boas alternativas para não
separarmos os aspectos cognitivos e afetivos da aprendizagem.
As pessoas se divertem e aprendem ao mesmo tempo. E o afetivo
é fundamental para a aprendizagem. Nosso desafio, aqui, é organizar
uma exposição que, ao mesmo tempo, seja lúdica, divertida e inte-
ressante, mas que permita às pessoas terem níveis de abstrações dife-
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rentes, caso elas queiram. Sem dúvida, as pessoas podem não querer
se engajar em uma Atividade de Aprendizagem, mas temos que dar
a possibilidade de o visitante fazer isso, caso queira.
Para finalizar, lembro que, para além da Teoria da Atividade,
muitas outras teorias de aprendizagem, incluindo os modelos ori-
ginados a partir dos espaços museais, nos ajudam a compreender
como aprendemos nesses espaços. Esse entendimento é crucial para
pensarmos na interação entre públicos e museus.
Tentei mostrar que pesquisas e práticas em educação museal já
resolveram questões como “se aprendemos” e “como aprendemos”
nos museus, mas ainda nos resta o desafio de organizarmos uma
práxis educativa que realmente otimize o processo de aprendizagem
nesses espaços. Penso que, a partir desse aporte teórico e de nossas
experiências, podemos pensar em novas formas de organizar expo-
sições e promover novas relações com os diversos públicos.
Moderadora:
Participante Gabriela:
Profa. Alessandra:
Moderadora:
Participante Monalisa:
Profa. Alessandra:
40
Profa. Tânia:
Moderadora:
“Última pergunta...”
“Tânia, na sua fala você disse que um museu não quer ser só um
evento na cidade, e eu queria saber o que vocês fazem para isso acon-
tecer. ”
Profa. Tânia:
Moderadora:
41
42
Segunda Palestra
Catavento Cultural
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Então, vamos agora falar um pouco do prédio, o Palácio das In-
dústrias. Ele foi inaugurado em 1924, levando cerca de 20 anos para
ser construído, até porque a arquitetura vivia outro momento, não
tão evoluído quanto hoje, bem como a engenharia civil, então se le-
vou um bom tempo para chegar ao término do prédio. A foto mostra
como foi a exposição de automobilismo em 1924.
O prédio ficou vários anos recebendo exposições daquela indús-
tria que começava a crescer na cidade de São Paulo, sendo que ele
foi financiado principalmente pelos barões do café, que na época es-
tavam em declínio, enquanto a indústria começava a emergir; dessa
maneira e nesse cenário nasceu o prédio que hoje abriga o Cataven-
to.
Esse prédio já foi Prefeitura de São Paulo, também já recebeu
ocupação por parte da polícia, já foi sede da Polícia Civil durante
muitos anos e já recebeu uma série de exposições, uma história bas-
tante rica.
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Nessa foto temos a visão aérea do prédio estamos muito próximo
ao Mercado Municipal, a zona cerealista e ao Parque Dom Pedro; o
bairro é o Parque Dom Pedro. A localização nos favorece bastante,
pois estamos em uma região muito central de São Paulo, então o
acesso do público é fácil, tem metrô perto e passam muitos ônibus
na região.
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Nesses 7 anos de vida do Catavento a gente tem sido bastante vi-
sitado. O Museu foi inaugurado em 2009, sendo que em outubro
desse ano (2016) chegamos a 3.370.000 visitantes. Essas pessoas são
visitantes espontâneos, visitantes de grupos agendados de escolas,
de ONGs, de tudo quanto é tipo. E isso não foi só de uma vez, a
gente tem a seguir um gráfico de como foi essa visitação, de 2009 até
setembro de 2016, quando tivemos a última atualização. Em azul a
gente tem o público agendado, em laranja os públicos espontâneos.
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Nos meses de janeiro e julho (férias escolares) temos um boom
de visitação, em geral de público espontâneo. Em julho desse ano
(2016) recebemos 94.249 pessoas, visitantes espontâneos, nesses
meses praticamente não temos agendamento, e o museu fica bem
cheio. Os grupos agendados são bem fortes nos períodos escolares.
E o que é o Catavento? A gente poderia definir de várias formas. É
um museu de ciência, é um museu ligado à tecnologia, é um espaço
de educação não formal, temos várias definições.
Eu trabalho no Catavento há vários anos. Eu comecei lá como
monitor, eu era estagiário da área de física, do Engenho - daqui a
pouco a gente vai ver o que é o Engenho -, mas basicamente o que
nós tentamos é trazer para o público um espaço dinâmico que pro-
picie outras experiências que vão além da sala de aula. Em sala de
aula a gente consegue garantir uma série de coisas, a gente consegue
garantir uma série de experiências, mas o museu tenta trazer essas
outras experiências que a sala de aula não vai conseguir garantir.
Obviamente que não vamos complementar a escola. O cara que
não for ao Catavento vai deixar de viver, não vai se formar como um
cidadão tão bem quanto o outro? Não, na verdade a gente quer que
quem vá lá possa aproveitar e ter experiências únicas. Como essa da
foto de uma monitoria no estúdio, por exemplo, com o monitor e o
visitante.
Eu sou educador atualmente no museu. Eu cuido, entre outras
coisas, de exposições externas, mostras itinerantes, manutenções do
educativo, que são manutenções nas instalações, ou seja, cuidamos
para que esses equipamentos se mantenham e sejam preservados,
mas não iremos entrar nesse mérito agora, vamos focar na parte
educativa.
Enquanto educador, qual é o meu trabalho? Eu tenho que garantir
que os meus monitores estejam atualizados em termos de conteúdo.
Mas não só em termos de conteúdo, também em termos de lingua-
gem, temos que garantir que a linguagem seja acessível ao público,
que é uma dificuldade grande. Porque se pensarmos que temos inú-
meros tipos de público, como garantir que esse monitor consiga ter
uma linguagem acessível a todos esses públicos? É uma das maiores
dificuldades que temos no dia a dia, conseguir trabalhar isso com os
monitores para que eles tenham uma linguagem acessível a todos os
públicos.
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Outro ponto é a necessidade de atualizar nossos equipamen-
tos, porque enquanto o grupo agendado está no museu, podemos
receber esse grupo e o monitor irá guia-los por essa visita. Só que
quando recebemos o público espontâneo, que é de outra natureza, e
por exemplo às vezes temos 5 mil pessoas em um dia, não teremos
quantidade suficiente de monitores para atender todas essas pessoas
e muitas vezes essas pessoas não querem ser atendidas, elas querem
ficar livres para poder visitar o museu tranquilamente.
Por conta disso o espaço também deve ser interativo, com uma
linguagem que garanta que pessoas leigas nos assuntos científicos
entendam o que queremos passar para elas. Se tivermos uma expe-
riência de física, por exemplo, temos que garantir a instalação de
física se traduza a todos os públicos, desde o técnico, uma pessoa
formada em física, um engenheiro que teve muito contato com físi-
ca, até uma pessoa que não frequentou uma escola e simplesmente
nunca viu nada parecido com aquilo. Isso é parte do meu trabalho
também.
A estrutura museológica do Catavento, como que ela é?
Temos basicamente quatro grandes áreas: o Universo, a Vida, o
Engenho e a Sociedade.
A estrutura está ligada a história cronológica do universo. Então
primeiro era o nada, aí o Big Bang...
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O Universo surge, depois a Vida, o Engenho seria, na verdade o
desenvolvimento das engenhocas humanas, as máquinas que a cons-
truímos para o nosso dia a dia, e a Sociedade na verdade, representa
o desenvolvimento dessas relações sociais.
Aqui eu vou trazer um pouquinho para vocês de cada uma das se-
ções. Eu preparei essa palestra imaginando que tenham pessoas aqui
que nunca foram ao Catavento, então é também para vocês entende-
rem o que é o Catavento. O Catavento não é só um prédio maravilho-
so de 100 anos, e também não é só um museu de ciência e tecnologia
dos sonhos, e o que ele tem dentro dele?
Cada uma das 04 grandes áreas é subdividida em seções.
Essa aqui é a primeira seção do Universo, a Astronomia, e na se-
ção da Astronomia temos mais de uma sala. Essa aqui, por exemplo,
é a sala do Sol.
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Temos um asteroide e aí aparece um monitor fazendo atendi-
mento a um grupo, por exemplo, nessa dinâmica o monitor senta
os alunos. Em cima, no teto, replicou-se o céu estrelado da noite da
inauguração do Museu e os visitantes são convidados, junto a esse
monitor, a observar o céu e falar um pouco sobre as constelações,
estrelas e tudo o que está ali naquele teto. Apesar de a gente viver em
São Paulo, que é um local péssimo para observações astronômicas
devido a ‘N’ fatores de poluição de todos de todos os tipos tentamos
aproximar os visitantes da observação astronômica. Isso é um pou-
quinho da seção da Astronomia.
Essa é a seção Terra, dentro da grande seção Universo. A seção
Terra vai falar um pouco do desenvolvimento do nosso planeta.
O Universo nasceu ali no Big Bang, uma grande explosão, se ex-
pandiu, e num dado momento dessa expansão nasceu nosso planeta,
e esse planeta segue uma série de lógicas para estar como está hoje, e
é o que exploramos nessa seção.
Falamos um pouco do núcleo, as lógicas da movimentação de
magma, a crosta, formação de rochas. E aqui temos um equipamen-
to chamado Sandbox (caixa de areia). O Sandbox na verdade é um
equipamento que permite a você formar picos de areia que são tra-
duzidos em curvas de nível 3D em uma TV. Dá para fazer inclusive
chover.
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Essa outra seção é a Nave, ela foi uma das últimas inauguradas e
não é exclusividade do Catavento, existe uma também no CienTec.
Percebemos, ao longo do tempo, que o Museu precisaria se adequar
um pouco mais às tecnologias. O nosso público estava pedindo isso,
vimos que fazia falta, nos últimos anos tivemos grandes avanços na
área de tecnologia, chega a ser quase assustador, portanto, tivemos
que nos adequar.
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Essa é a seção Vida e ela vai falar um pouco do desenvolvimen-
to do ser humano, mas não só o ser humano. Vai falar também do
desenvolvimento dos outros animais. Aqui, por exemplo, temos um
Albatroz, que é um pássaro maravilhoso, ele fica muitos meses no ar
sem pousar, e aqui ele estaria copulando com a fêmea. Temos tam-
bém um Tigre Dente de Sabre um pouco mais ao afundo, que é um
animal que viveu na mesma época da Preguiça Gigante e do Tatu
Gigante, durante o período que chamamos de Mega fauna, então,
nesse espaço exploramos um pouco de tudo isso e falamos também
sobre Darwin e sua teoria da evolução.
Temos outra seção também voltada à imersão tecnológica que é
o Submarino. O Submarino possui a mesma dinâmica da Nave, po-
rém, a viagem dos visitantes é ao fundo do mar. O submarino viaja
ao fundo do mar, a fundo mesmo, ao ponto de chegar a Fossas das
Marianas que é o lugar mais fundo do planeta conhecido até hoje. A
ideia é que esses visitantes sejam cientistas que vão pesquisar e des-
cobrir os segredos do fundo do mar, quais bichos vivem ali, até que
ponto podem ter seres vivos ou não, o que propícia a vida ou o que
não propicia nesse ambiente inóspito.
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E aqui temos a Seção do Macaco ao Homem, que é uma seção
sobre evolução que também abrimos recentemente. Ela foi desenvol-
vida em paralelo com a USP.
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E a esquerda, na parte superior observamos o Van der Graaf, que
é um equipamento que arrepia os cabelos, super sensação do museu,
de qualquer museu de ciência na verdade, ele é muito conhecido, o
pessoal já chega perguntando dele, ele é meio que um astro. Não que
a gente queira isso, mas ele se tornou isso, foi meio natural. No caso
vemos o atendimento a um grupo agendado.
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Temos agora a nossa última grande Seção, a Sociedade, que co-
meça com uma foto da Ecologia; para quem não sabe isso aqui é
um grande Terrário. O Terrário está em bastante foco hoje em dia, a
gente vê ele bastante, em vários lugares por aí na internet. As pessoas
descobriram que dá para fazer Terrários para enfeitar a casa e que
ficam lindos. O Terrário é um sistema fechado, além de bonito faz
você se indagar como isso funciona? Um recipiente fechado poder
ter vida? A montagem dele é bem simples, colocamos terra, pedras
e areia para simular nosso o solo, aí basta plantar, borrifar água e
deixar oxigênio. Você fecha e ele se mantém lá por muito tempo. O
nosso tem 2 metros de altura, o pessoal fica maravilhado.
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O Laboratório de química é de fato laboratório onde realizamos
alguns experimentos. Como por exemplo uma bomba de hidrogênio
que explode e faz um barulhão, é bem bacana.
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Em seguido, o Estúdio de TV, que é uma sala de chroma key verde
basicamente e nele onde um telejornal ou então algum outro pro-
grama, e depois editamos e passamos para os visitantes entenderem
como funciona um Estúdio de TV e todo o processo de gravação.
62
Essa instalação, por exemplo, Tubos Sonoros - é bem parecida
com os tubos sonoros que existe aqui na entrada – fizemos uma co-
municação visual bem bacana, o rapaz da imagem mostra como usar
esse equipamento, atualmente buscamos cada vez mais usar imagens
como essa, porque senão acabamos prendendo nosso visitante ao
monitor, ou impedindo que o visitante utilize o equipamento de for-
ma correta. Aprendemos, com o tempo, como aparece no gráfico ini-
cial, que precisamos cada vez mais trabalhar nossa linguagem visual
e adequá-la aos nossos visitantes espontâneos para que eles possam
ter a mesma qualidade na visita ao espaço que os grupos agendados.
Com o tempo percebemos que muitos alunos das escolas (dos
grupos agendados) voltam ao nosso museu por vontade própria e le-
vam os pais e a família, pois fica uma vontade ‘de quero mais, quero
conhecer um pouco mais o espaço’. Tem muitos adultos que não co-
nhecem esse tipo de espaço, porque não tiveram contato com isso na
escola e não tem no dia-a-dia; se essas crianças desde cedo já estão
vendo isso, elas vão levar suas famílias futuramente e vão mantendo
um ciclo.
Continuando na questão do espaço, trago um pouco sobre nossas
instalações imersivas. Essa aqui é a Nave por dentro, nos televisores
os visitantes podem ver a torre do Catavento antes de partir para
viagem, os alunos ficam sentados a frente dos televisores.
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As outras instalações selecionadas para essa apresentação são
instalações sem tecnologia, nesses casos abrimos mão da tecnologia
para mostrar que toda imersão é necessariamente tecnológica. Tec-
nologias propiciam muitos avanços, mas não necessariamente são
obrigatórias para instalações imersivas.
Já no alto desse slide temos uma pessoa que está visitando um
pedaço do sistema digestivo, no caso esse é o intestino gigante.
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Por fim, temos algumas fotos de nossas oficinas que geralmente
ocorrem no período de férias escolares, e eventualmente durante o
período letivo. Nas fotos observa-se a oficina de mini terrário.
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E no slide mais acima, vemos a oficina de construção de câmara
escura que é um artifício antigo, mas que ainda causa maravilha.
Mediadora:
Participante Monalisa:
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política que o Catavento tem para visitação de escolas, porque tem
um limite de quantas turmas a gente pode levar e isso trava uma es-
cola grande como a minha. Estou falando porque já levei esse ano no
Catavento minhas turmas e a gente teve problema com isso, com o
roteiro e com a quantidade, como a gente faria diferente? Tem como
fazer diferente? Como funcionaria? ”
Gabriel:
Participante Monalisa:
Gabriel:
“Eu não sou do agendamento, então alguém do agendamento po-
deria responder essa pergunta com mais propriedade, mas, a meu
ver, isso acaba sendo integrado à questão de que não podemos ter
exclusividade de uma escola em um dia. Eu não posso fechar para
uma escola para ela ficar com todo o meu roteiro ocupado, eu tenho
que receber no mesmo dia várias escolas, até por termos contratuais
e outras questões, então eu enxergo dessa forma, acho que deve ser
67
isso.
Não posso em um dia falar que vou receber uma escola com 12
turmas, tem várias escolas que nos visitam no mês várias vezes, jus-
tamente por essa questão, por ter que dividir os grupos em dias se-
parados. Tem escolas realmente muito grandes, que levam todas as
turmas de ensino fundamental por exemplo. ”
Participante Monalisa:
“A gente teve dividir em dois meses, esse foi o problema”
Gabriel:
Gabriel:
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de mestrado da USP, que fez uma pesquisa de como funcionava a re-
lação dos pais com o espaço no Catavento. Foi muito bacana porque
ela ficou ao longo de 2 ou 3 meses acompanhando visitas de finais
de semana para ver como que a mãe interagia com o filho e os espa-
ços, e como o pai interagia com o filho e os espaços, e quando tinha
um casal de pai e mãe, como eles interagiam com esses espaços, ou
então pai e pai, mãe e mãe, independente do casal. Isso é um tipo de
pesquisa que a gente tem.
Não sou eu no Catavento, nem o Educativo que desenvolve, isso
na verdade é uma universidade que tem uma pessoa que nos procura
para realizar projetos de mestrado, doutorado e até de licenciaturas.
O Educativo, por si só, desenvolve outras pesquisas, algumas
ligadas a Secretaria, que giram mais em torno de qualidade, dessa
monitoria, se o meu monitor está realmente conseguindo fazer essa
linguagem ser acessível, se o meu espaço está bom e que vai desde se
o banheiro estava limpo, até a qualidade da monitoria. E, além disso,
pesquisas sobre se esse público está retornando ou não. A gente tem
mais de um tipo de pesquisa, tem pesquisa inclusive digitalizada,
que é da Secretaria, os dados vão para a Secretaria, e temos pesquisas
que ficam no Catavento.
A gente não consegue, por exemplo, precisar a faixa etária dos
nossos visitantes, isso é uma coisa que ainda não conseguimos fazer,
até por ser um museu novo, esse tipo de coisa ainda não aconte-
ceu, mas sabemos que o nosso público volta bastante. Então nesse
3.370.000 de pessoas, tem bastante gente que já retornou.
É isso gente, muito obrigado, espero que vocês nos visitem! ”
Mediadora:
69
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Terceira Palestra
A Contribuição dos Zoológicos à Educação
e à Cidadania.
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mos no mundo, da forma como nos enxergamos diante da natureza.
Então o grande desafio para superarmos essa crise é principal-
mente esse distanciamento que foi criado entre o ser humano e a
natureza. Parece que deixamos de fazer parte e passamos a nos ver
à parte dela. Esse é um grande desafio: trabalhar essas questões com
as pessoas, uma vez que essas não se veem como seres integrantes da
própria natureza.
Outra dificuldade também para se falar em conservação é tratar
desse assunto quando, às vezes, as necessidades básicas das pessoas
não estão sendo supridas. Como você vai falar de conservação do
verde, de conservação do meio ambiente, se a pessoa não tem sanea-
mento básico, se ela não tem acesso à alimentação, se ela não tem a
mínima qualidade e condição de vida? É complicado para mim, por
exemplo, ir até uma comunidade que tem inúmeras deficiências e
problemas e falar que eles devem conservar um fragmento de Mata
Atlântica ou uma determinada espécie que está ameaçada de extin-
ção.
Percebemos que o problema é muito maior do que simplesmente
um trabalho de uma escola, ou de um zoológico, por isso precisamos
dessa integração de todos os meios possíveis onde possamos traba-
lhar a educação, para que essa transformação realmente ocorra, e a
educação ambiental vem exatamente para suprir essa necessidade.
Existem alguns pontos principais que se destacam nas definições
de educação ambiental. Primeiro que é um processo contínuo, não
se faz educação ambiental em um dia, você não transforma as ati-
tudes das pessoas em um dia, é algo contínuo e que converge para
formação integral das pessoas, visa transmitir informações e conhe-
cimentos sim, mas também construir valores e atitudes. Isso tudo
em prol de uma convivência mais harmônica do ser humano com o
meio ambiente.
Daí se destaca o conceito de educação ambiental crítica, que traz
exatamente essa questão, de compreendermos um pouco melhor
essa relação do ser humano com o meio ambiente e criarmos estra-
tégias, refletirmos sobre como podemos transformar as nossas ati-
tudes, as nossas ações para efetivamente haver uma mudança nesse
panorama.
Nesse sentido foram criados diversos documentos oficiais, para
valorizar a educação ambiental e para garantir que ela fosse inserida
nos mais diversos contextos e espaços, como por exemplo, a Políti-
ca Nacional de Educação Ambiental, que é de 1999, e que coloca a
educação ambiental como um componente essencial e permanente
da educação nacional.
72
Porém sabemos que a legislação educacional ainda é bem frágil
nas questões relacionadas à educação ambiental. Normalmente ela é
trabalhada dentro de temas transversais e de uma forma bem super-
ficial nas escolas. Apesar disso, um senso escolar feito pelo INEP em
2001 considerando escolas de ensino fundamental, indicou que qua-
se 95% das instituições de ensino declararam ter educação ambiental
de alguma forma inserida dentro do seu currículo, em projetos ou
até mesmo como disciplinas específicas da instituição.
No mesmo ano também foi verificado que 25 milhões de crianças
tinham acesso à educação ambiental através das escolas. Em 2004
esse número passou para 32 milhões. Diante desses números, é cla-
ro que temos que parar para pensar “qual será o tipo de educação
ambiental que as pessoas que responderam essa pesquisa estão con-
siderando? Talvez algumas pessoas considerem que simplesmente
trabalhar a reciclagem com os alunos já é suficiente para considera-
rem que fazem educação ambiental na escola. Essa não deixa de ser
uma atividade de educação ambiental, mas será que isso por si só
vai criar toda aquela transformação que a educação ambiental prevê,
para que haja realmente uma mudança desse contexto que vivemos
hoje?
Um outro ponto importante também é que se coloca sobre o ensi-
no formal toda a responsabilidade de discutir as consequências des-
se desafio, desse problema socioambiental que vivenciamos. Então
será que é obrigação só da escola discutir isso com os alunos? Será
que só a escola tem que trazer essas questões? Não, a educação esco-
lar não é a única fonte de aprendizado do ser humano, ela faz parte
de um conjunto de espaços, de contextos, com os quais convivemos
e interagimos cotidianamente. Ela é um dos espaços onde a educa-
ção ambiental pode ser discutida, mas não a única responsável por
trabalhar essas questões.
Temos os espaços formais, os informais e os não-formais, todos
eles, com grande potencial para discutir a temática ambiental. Em
casa, em uma conversa com os pais, uma criança pode aprender
muito mais sobre questões ambientais do que, às vezes, na escola. Na
escola é possível trabalhar diversos assuntos, desenvolver projetos
ambientais que vão levar a uma reflexão, e os espaços de educação
não formal também são muito propícios a essas discussões, porque
eles vão trazer elementos que colaboram para que isso aconteça.
Quais espaços seriam esses? Parques, zoológicos, museus, praças,
estações de metrô, jardins botânicos, centros culturais...
73
Foto 1- Zoológicos: espaços para a discussão de questões ambientais
Como as crianças hoje são cada vez mais incentivadas a ter hábitos
de consumo inadequados e estimuladas a sentir necessidade do “ter”
para ser feliz, a proximidade com um animal ou a experiência em um
ambiente natural pode ser uma das melhores estratégias para desper-
75
tar nela o interesse e a conexão com a natureza.
Os zoológicos e outros espaços promovem experiências que po-
dem propiciar essa conexão, e nós temos que saber aproveitar essas
oportunidades para trabalhar e para discutir essas questões.
Um outro ponto muito importante para a promoção da educação
em zoológicos diz respeito ao seu público. Dizemos que o público
de zoológicos é muito democrático, porque ele é composto por pes-
soas de todas as idades, de todas as classes sociais e de todas as áreas
de interesse. No Zoo de São Paulo, por exemplo, atendemos desde
crianças do ensino infantil, com 2 anos de idade, que estão começan-
do a andar e já vão ao parque, já começam a ter essa vivência desde
pequenos, até idosos, pessoas com deficiências, grupos escolares,
grupos espontâneos, de todos os tipos.
77
Os zoológicos trabalham muito com conservação em cativeiro,
que chamamos de conservação ex situ, mas algumas instituições
também contribuem diretamente com a conservação em natureza,
em trabalhos in situ. O trabalho das equipes de cativeiro e de natu-
reza se complementam, se integram, porque o objetivo é um só: con-
servar as espécies. Às vezes tem coisas que descobrimos em cativeiro
que os pesquisadores não teriam condição de estudar em vida livre,
e vice-versa, então elas se conversam e são fundamentais, é uma ten-
dência dos zoológicos que os trabalhos in situ e ex situ cada vez mais
sejam integrados.
78
Foto 7 – Educação Ambiental: fundamental para a conservação da biodiversidade
79
Foto 8 – Animais: geradores de discussões e reflexões
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As placas educativas. Os zoológicos possuem também um apara-
to muito grande em termos de comunicação visual. As placas edu-
cativas podem ser exploradas por professores, assim como as visitas
monitoradas que fazem parte dos Programas de Educação Ambien-
tal da maior parte das instituições e são dirigidas especialmente para
o público escolar. Os zoológicos ainda possuem exposições e espa-
ços educadores e realizam apresentações didáticas, que permitem
uma aproximação ainda maior com o animal, possibilitando a sensi-
bilização das pessoas que, por estarem vivendo uma experiência que
não é comum à elas, tornam-se muito mais abertas para a aquisição
de novos conhecimentos e a reflexão.
82
a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. Essa parceria foi
fundamental para garantir a adesão dos professores, uma vez que
através dela os professores pontuam ao realizar esse curso de forma-
ção no zoológico. O ZooEscola tem um ano de duração e seu tema
central é a Mata Atlântica, porque o zoológico está inserido em uma
Unidade de Conservação de Mata Atlântica, é o bioma da nossa ci-
dade e de grande parte do nosso Estado. Por essa razão trabalhamos
muitas questões da realidade local, aspectos gerais do bioma e um
subtema a cada ano.
Por exemplo, em 2014, ano em que houve a crise da água em São
Paulo, que foi muito grave, estávamos trabalhando coincidentemen-
te a água e a Mata Atlântica com os professores. Ano passado, 2015,
trabalhamos a sustentabilidade e este ano estamos trabalhando as
ameaças à biodiversidade.
E qual o objetivo dessa formação? É promover a discussão e o
desenvolvimento de projetos ambientais nas escolas, permitindo a
construção de valores e formação cidadã de professores e de alunos.
Como fazemos isso? O Programa envolve quatro etapas: AA primei-
ra delas é a capacitação de professores no início do ano, em três en-
contros presenciais no Zoológico, de 8 horas cada. Nessa etapa, eles
são capacitados para o desenvolvimento de projetos ambientais nas
escolas e para trabalharem aspectos relativos a Mata Atlântica e ao
subtema do ano.
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Na segunda etapa, eles agendam uma visita monitorada ao zooló-
gico com seus alunos. Para os professores que participam do Progra-
ma essa visita, para até 40 alunos, é totalmente gratuita, porque ela
faz parte de um projeto educativo.
85
rodeada pela cidade, e imaginem também a importância desse frag-
mento para a flora e a fauna local e para toda essa comunidade do
entorno, já que ela faz o controle hidrológico e climático da região,
abriga diversas espécies, melhora a qualidade do ar, mantém a umi-
dade, além de proporcionar qualidade de vida para a população. Nós
temos um problema grande com os animais de vida livre dessa área,
em decorrência desse contato muito próximo com o meio urbano,
como caça, atropelamento, eletrocussão, abandono de animais do-
mésticos que acabam se tornando invasores nessa área, predando
animais silvestres, transmitindo doenças...
Foto 16: Professores de escolas do entorno do PEFI: diagnóstico para implantação de curso
de formação
Participante Adriana:
Profa. Kátia:
87
fundido para o público em geral, ficando muitas vezes mais restrito
às pessoas que trabalham na área da educação. A Profa. Alessandra
depois pode até complementar minha fala, pois ela tem mais expe-
riência a respeito desse tema.
Sobre o segundo ponto, como dizer que os zoológicos têm esse
potencial todo de educação se muitos deles, às vezes, não represen-
tam isso que eu mostrei? Realmente, algumas instituições ainda tra-
balham com estruturas ultrapassadas, que representam conceitos
do passado, de simples exposição de animais. Outras instituições
estão sucateadas, ou não apresentam a qualidade que deveriam ter
para propiciar uma experiência que seja realmente positiva para o
visitante e isso dificulta trabalhar questões de conservação, se o seu
discurso não é coerente com a prática. Mas temos que entender que
os zoológicos estão passando por um processo de modernização de
conceitos, e isso leva tempo. Então teremos instituições que ainda
não contribuem para esse trabalho de reflexão, e outras instituições
que já estão em um patamar mais avançado e que podem ser explo-
radas nesse sentido.
Porém, existe uma questão que muitas vezes as pessoas não pa-
ram para refletir quando criticam a existência dos zoológicos, por-
que essas instituições às vezes não tem o aporte financeiro suficiente
para se manter em condições adequadas para os animais ou para
desenvolver projetos e pesquisas. A maior parte dos zoológicos que
estão em condições decadentes não tem praticamente nenhum tipo
de arrecadação própria que lhes garanta o investimento em melho-
rias, como o Zoológico de São Paulo, por exemplo, que depende
praticamente da sua bilheteria para se manter e se modernizar. A
maior parte das instituições são municipais e sabemos que nem to-
das prefeituras valorizam esse espaço como um espaço de educação
não formal, há outras prioridades...
Às vezes o repasse de verbas para que essas instituições possam
melhorar sua qualidade, os serviços que prestam para os animais,
para o meio ambiente e para as pessoas é insuficiente, então não
significa falta de dedicação ou de esforço técnico. ”
Participante Adriana:
88
Profa. Kátia
Participante Adriana:
Profa. Alessandra:
Participante Adriana:
Profa. Alessandra
“Exatamente. ”
Profa. Kátia
“Mas é muito difícil você agora reverter uma situação, a gente está
remediando uma coisa que já acontece. Os animais foram retirados
da natureza no passado porque não existia essa preocupação com
bem-estar, com nada. Os zoológicos foram criados, como eu falei
90
para vocês, a partir de coleções de animais particulares.
Profa. Alessandra:
Profa. Kátia:
91
o que fazer, seria um caos, um colapso ainda maior para a conserva-
ção das espécies. Os zoológicos se justificam desde que eles contri-
buam com outros pilares, como a educação, para as pessoas entende-
rem que é necessário preservar os ambientes naturais, para que essas
espécies ainda possam continuar existindo na natureza. Se justifi-
cam quando você desenvolve pesquisas com os animais em cativeiro
que vão reverter para a conservação daquela espécie na natureza,
tanto que existem mais de 30 ou 40 espécies que melhoraram o seu
status de conservação na natureza em decorrência da contribuição
dada por zoológicos. Isso é resultado de uma pesquisa da Associação
Mundial de Zoológicos que apresenta esses dados, o quanto as ati-
vidades de zoológicos já beneficiaram ativamente a conservação de
espécies na natureza. (WAZA Magazine, vol13/2012). ”
Mediadora:
“Eu tenho mais uma pergunta, que ele solicitou primeiro, sei que
tem mais gente, mas vou ter que cortar por conta do tempo. ”
Profa. Kátia:
92
diretamente no bem-estar dos animais, investindo cada vez mais em
recintos que criem um isolamento, especialmente acústico, que é a
principal coisa que afeta os bichos, o barulho que é produzido pela
grande quantidade de pessoas, e em programas de bem-estar animal.
Existem estudos comportamentais que os zoológicos fazem com
equipes específicas para desenvolver esses trabalhos, como é o caso
do Zoo de São Paulo, e outros que tem funcionários que fazem isso
paralelamente ao seu trabalho de veterinária e de biologia, para pro-
mover o bem-estar dos animais. Eles estudam o comportamento da-
quela espécie, como ela está interagindo no ambiente em cativeiro,
vendo os níveis de estresse e introduzem técnicas, como as de enri-
quecimento ambiental, social e cognitivo, para diminuir esses níveis
de estresse.
O cuidado que muitos zoológicos têm tido em relação a isso, para
que o público não influencie tanto na qualidade de vida do bicho é
propiciar bons recintos, que representem bem os seus respectivos
habitats naturais, cada vez melhor ambientados, com pontos de fuga,
para que, quando o animal não quiser ficar exposto ele tenha essa
opção, com vidros que façam o isolamento acústico, e trabalhando
paralelamente com o comportamento do bicho através desses estu-
dos comportamentais que mencionei.
Basicamente, em poucas palavras, é isso, porque não dá para se
alongar muito, temos trabalhado dessa forma, lembrando também
que existem picos de horários de visitação, ou seja, as pessoas não
estão todas no parque ao mesmo tempo, isso é rotativo. Então 20 mil
pessoas passam ao longo do dia pelo Zoológico, por isso fica difícil
estimar a capacidade limite desses parques, essa capacidade estaria
mais relacionada a prestação, com qualidade, de serviços para os vi-
sitantes do que ao bem-estar animal. Obrigada. ”
Mediadora:
93
94
Quarta Palestra
Museu da Língua Portuguesa
95
o prejuízo, mas como nós tratamos da língua, que é imaterial, não
perdemos a língua, nem o acervo. E por isso posso estar aqui conver-
sando sobre o tema com vocês.
Aliás, uma das coisas que o nosso diretor costuma sempre falar é
que talvez o Museu da Língua Portuguesa seja único em que cada vi-
sitante é também parte do acervo, pelo que traz da língua portuguesa
dentro de si. Eu então escolhi focar em como é que nós trabalhamos
com a língua portuguesa, porque um pouco como a Alessandra ti-
nha dito, também não acredito que um seja complementar do outro,
pelo menos não da maneira como é colocada, mas eu acredito que
todo espaço é um espaço educativo, antes de mais nada, a rua é um
espaço educativo, a diferença desses espaços é como eles trabalham
e de que forma você potencializa essa educação.
A experiência de alguém com um objeto, por exemplo, um smar-
tphone hoje, uma pessoa pode simplesmente pegar aquele objeto e
usar como um telefone, teclar como discava antigamente e falar, ao
passo que a gente pode cutucá-la, desafiá-la a descobrir a imensa
potencialidade que tem dentro daquele micro aparelho, acho que é
muito nesse sentido que a gente trabalha a questão da educação.
Dentro disso, o museu trabalha a partir de três premissas. Uma
premissa é a língua como um objeto cultural, a língua como algo
normativo - esse já tem espaços formais de aprendizagem que tra-
balham - então optamos por trabalhar com a língua como objeto
cultural.
A segunda premissa é a questão da experiência. Jorge Larrosa
Bondia é uma pessoa que vale a pena conhecer, ele fala que a expe-
riência é o que nos passa, o que nos toca, o que nos acontece, que
é diferente do que passa, do que acontece, do que toca. Um pou-
co já foi falado aqui, por exemplo, quando a Alessandra trouxe essa
questão da relação com o animal. Claro que existem N maneiras de
trabalhar essa relação, a informação é importante, mas a experiência
ainda é uma coisa fundamental, acreditamos nisso.
E a terceira premissa, é a questão do lúdico. Quando cheguei hoje
cedo alguém estava falando que o conhecimento não é brincadeira,
que a visita não pode ser brincadeira. Lúdico não é brincadeira, lúdi-
co é um estado. O homem é lúdico praticamente por natureza, é cul-
tural, mas a gente pode dizer que é quase por natureza. O sexo entre
96
os homens é lúdico, você não copula para reprodução simplesmente,
então ele é lúdico, é um estado, é um clima que se forma.
Neste momento a gente está aberto, muito mais do que quando
estamos sentados, por exemplo, numa sala de educação formal, e
essa foi uma das coisas que eu aprendi com as ciências. A minha
área é de artes e de teatro, mas lendo um livro, quando eu dava aula
para pré-escola, que fala sobre o conhecimento físico na pré-escola
e que traz isso, o lúdico nas experiências infantis. A partir daí eu
comecei a desenvolver todo o meu trabalho em cima do lúdico e da
experiência.
Hoje tenho um ex-aluno que é um chefe de cozinha, que começou
seu desenvolvimento quando ele tinha 4 anos de idade. Ele ia para
oficina de artes, que eu tinha e trabalhávamos com diversas lingua-
gens e uma delas era a culinária, exatamente por causa de química e
física, que eu achava importante. A gente trabalhava para fazer um
bolo, eu contava uma história, onde a farinha tinha uma personali-
dade que era diferente do ovo e do leite, e todos eles junto criavam
o bolo. Só para simplificar, o fermento, por exemplo, não gostava de
ir na montanha-russa com os outros, então os outros iam no chapéu
mexicano e na montanha-russa, mas ele ficava quieto, ele só entrava
na brincadeira depois. Tudo isso para dizer que há dois meses atrás
eu encontrei esse chefe e ele falou ‘eu faço experiências hoje em dia
na culinária, na gastronomia, por causa das brincadeiras que nós
fazíamos na sua oficina, eu acho que exploro e me desafio hoje a
buscar novas soluções na gastronomia por causa daquilo’. Isso tudo
para defender o lúdico, o lúdico não é inconsequente, ele é um es-
tado muito importante para se trabalhar o conhecimento também.
Então esses são os três pilares que trabalhamos no museu. O pró-
prio espaço do museu já foi concebido como um espaço lúdico e
muito próximo de como a gente aprende o português. Nós sempre
perguntamos para as pessoas quando chegam lá ‘onde você apren-
deu o português? ’. ‘Ah, na escola’. ‘Mas antes disso você não falava
português?’.
Claro que a escola é fundamental para trabalhar a norma, o que
permite a gente brincar com a língua é exatamente porque ela tem,
usando uma metáfora, uma espinha dorsal e um corpo de músculos
que a sustenta, por isso podemos brincar com ela como um ginasta
pode fazer o que faz em uma ginástica olímpica e tudo o mais.
97
Proporcionamos para as pessoas vivências que as façam refletir
sobre a língua, porque nós, como acabei de falar, aprendemos a lín-
gua no dia a dia, e o museu procura sempre em suas expografias com
que a pessoa possa ler, ver e ouvir, porque isso também são formas
de como percebemos a língua.
Só para dar uma ideia dessa questão do jogo, um jogo bem sim-
ples. A língua se aprende primeiro pela oralidade, concordam? Como
é que uma criança pode perceber isso, e mesmo um adolescente ou
adulto? A gente brinca de telefone sem fio. A palavra ‘bagunça’ veio
do Kikongo, uma língua africana onde se pronuncia bulum ungum
unzá, como é que vira ‘bagunça’? É só brincar de telefone sem fio!
E as pessoas vão percebendo isso. Uma das questões, não é a única,
mas é um começo para daí se trazer a conversa e reflexão.
99
crianças pequenas inclusive, e eles vão aprendendo essa relação en-
tre língua e cultura.
Agora pergunto a vocês. Palavras do universo cotidiano, vou falar
algumas e vocês vão me dizer da onde vem e porquê. Cafuné, den-
go, moleque, quindim e bunda? São africanos. Por que esse universo
cotidiano veio das línguas africanas? Por que essas entraram para
o português brasileiro? Era a ama de leite, aquela que cuidava das
crianças, conversava com elas, ela que passava a língua e a linguagem
para a criança, e também na cozinha, com a dona de casa. Essa rela-
ção é muito imbricada entre língua e cultura, e isso o Museu conse-
gue trabalhar, esse é um espaço para essas discussões.
Último exemplo na plataforma, mais relacionado à própria língua.
http://estacaoeducativomlp.com.br/linguaportuguesa/vocesabia/
No ‘Você Sabia’ cada um destes posts - já trazendo uma palavra que
nós já incorporamos na língua portuguesa - são do nosso facebook
e são feitos por educadores do Museu, cada um saía num dia da se-
mana, e depois colocamos na plataforma. Nós discutimos a língua
assim: ‘O que é uma língua? Nessa sequência vamos chamar você
para refletir sobre essa questão’. Isso no Museu conversávamos com
o visitante e adaptamos para a internet.
‘Vamos começar pensando o português falado no Brasil como
uma língua viva em constante transformação. A cada novidade entre
os seus falantes, uma novidade aparece na língua. ’
1. ‘A língua é um fenômeno mental, é difícil a gente imaginar algo
sem ter uma palavra que o denomine, ela também tem a personali-
dade daquele que a usa. Preste atenção ao jeito das pessoas falando,
feche os olhos e escute, tente reconhecer as pessoas pelo seu modo
de falar. ’
2. ‘A língua é comunicação, formal, informal, com gírias, expres-
sões idiomáticas, palavrões etc., língua é comunicação. Já percebeu
que na internet muitos brincam com a língua e nem por isso prejudi-
cam o que querem comunicar. ‘Gente, o que tá aconteceno na minha
vida? ’
As influências, que acabamos de falar, por exemplo, a influência
africana: acarajé, bagunça, cafuné, dengo, quindim etc. A língua
como um fato social, ela é nosso melhor retrato, conversamos sobre
isso, também com o s jovens.
100
Evanildo Bechara, linguista e filólogo membro da Academia Bra-
sileira de Letras, diz que ‘língua. ’. É você saber falar com o código do
grupo com o qual está se relacionando. Se eu vou à uma entrevista
de emprego ou a uma reunião formal dentro da universidade, o meu
código é um, se eu estou sentado em um bar, batendo papo com
amigos, o código é outro, se eu estou na internet, ou no WhatsApp,
o código é ainda um terceiro ou quarto, por isso ele diz ser poliglota
em nossa própria língua.
Como tínhamos pouco tempo, eu trouxe só algumas provocações
para mostrar porquê museus, escolas e centros culturais, entre ou-
tros são espaços de aprendizagem, mas que dependem sem dúvida
nenhuma de uma proposta educativa, e de pessoas formadas para
isso. Formadas eu digo, em formação continuada também, o Gabriel
acabou de falar isso aqui, de ir formando pessoas no trabalho, além
da formação inicial.
Então é isso, eu acho que temos que saber usar esses espaços de
aprendizagem e tem uma coisa fundamental, são sim espaços de la-
zer como a Kátia falou. E isso é uma coisa que discutimos constan-
temente com educadores dos museus, os mediadores, é um espaço
de lazer cultural, mas é um espaço de conhecimento e que a gente
pode aprender e muito, só depende de como a gente trabalha isso
também. Obrigada! ”
Mediadora:
“Nós agradecemos a Marina pela palestra e vamos agora às ques-
tões. Quem gostaria? ”
Participante Pablo:
“Oi, eu sou o Pablo, e eu fiquei com uma dúvida de que você falou
o que é exposto no Museu é a língua, que é um bem imaterial, só que
aí tem muita coisa que você poderia colocar a respeito da língua.
Como vocês fazem essa seleção? ”
Marina:
“Isso foi uma forma bem enxuta de falar. Qualquer museu, qual-
quer espaço é sempre um recorte. O que o museu procurou fazer foi
trabalhar a partir do enfoque de que a língua é identidade.
Ele tem algumas linhas curatoriais. Primeiro a língua como iden-
tidade e diversidade, o que nos une como língua, desde a forma-
ção e o que nos diferencia, os regionalismos. Tínhamos uma linha
101
do tempo que era mais tradicional, com leituras, imagens e vídeos,
mostrando a construção da língua. E um mapa dos falares que se
você clicava por região, você ouvia as pessoas falando, e elas também
estavam, por exemplo, comendo tacacá, e nisso eu estou falando da
diversidade, os sotaques culturais e os sotaques da língua.
Outra linha curatorial, a da universalidade da língua, de como
ela contém outras também nessa construção, para isso tínhamos o
Beco das Palavras, um jogo de etimologia, que você tinha que juntar
partes, formando uma palavra que existia e era mostrado de onde ela
veio, como ela havia se formado. A antiguidade da língua também
podia ser percebida nesse jogo.
Também tínhamos a parte de literatura, a ‘Praça da Língua’, um
espaço que muita gente comparava com um planetário porque era
uma imersão na língua que trazia o som, o ritmo da língua portu-
guesa, com trechos de obras de nossos escritores, músicas etc.
Enfim, o museu abordava de várias formas a questão da língua
como um objeto cultural. Não trabalhávamos na exposição do museu
a abordagem normativa, mas com os visitantes, às vezes quando apa-
recia, sim.
Muita gente fala, ‘mas como você vai congelar uma língua, e a
língua que está na rua hoje? ’, esse era o papel do educador. O Mu-
seu mostrava as gírias da década de 20, 30, 60 e nós, nas mediações,
trazíamos para o dia a dia, para a fala do cotidiano. Nós também
fazíamos intervenções no saguão da Estação da Luz, a estação de
trem onde o Museu se localiza, e de lá coletávamos essa fala cotidia-
na, contemporânea e a diversidade, os regionalismos. Por exemplo,
íamos com uma provocação - ‘bolacha ou biscoito’? E as pessoas nos
diziam como falavam em sua cidade ou região e traziam outras ex-
pressões. Então isso já traz a língua do dia a dia, deu uma discussão
imensa no hall da Estação da Luz, onde passa gente de tudo quanto
é lugar do país. ”
Participante Monalisa:
Marina:
103
jeito que temos de conseguir recursos. Além da própria montagem,
sempre vai uma equipe para fazer formação dos mediadores no lo-
cal. Sempre preferimos formar pessoas no local, porque eu acredito
nisso também, nesse irradiar, no fator multiplicador desses conheci-
mentos que as itinerâncias propiciam.
Enfim, eu acho fundamental que aconteça, mas por enquanto
acho que vamos parar um pouco, pelo menos um ano.
Participante Adilson:
“Boa tarde Marina, excelente a sua apresentação do Museu. Meu
nome é Adilson, eu sou da Universidade Federal de São Carlos e
também sou um fã do Museu da Língua Portuguesa. Posso dizer que
o Museu também foi muitas vezes inspiração para alguns dos pro-
jetos que a gente realiza de divulgação científica, acho que foi uma
ideia sensacional, uma coisa eu diria inédita, a nível de Brasil, não
sei a nível mundial, mas uma coisa que é tão chata às vezes para as
pessoas, a questão da língua. Da mesma forma que as pessoas acham
a matemática chata para ensinar, gramática também não precisa ir
longe que também fica no mesmo pé. E mostrar o lado belo da nos-
sa língua que é única, fantástica, com diferentes sonoridades é uma
imersão fantástica naquele espaço. Espero que logo vocês consigam
voltar, mais modernos, mais avançados. Tem aqueles males que vem
para o bem. ”
Marina:
“Não deixa de ser um privilégio, quantas instituições depois de
10 anos podem parar para olhar para si novamente? Fazemos isso
caminhando, e nesse caso pudemos parar, avaliar e rever, para re-
construir. ”
Participante Adilson:
“A minha pergunta é a seguinte, no Museu algumas destas expo-
sições físicas, a Praça da Língua realmente é uma experiência fan-
tástica, é o lugar que eu mais gostei, acho que é o melhor lugar do
Museu. Mas o Museu tenta trabalhar com uma espécie de narrativa
da própria língua quando você monta a exposição contando a histó-
ria da língua, a própria origem da língua e depois chegando algumas
coisas com elementos culturais mais recentes.
Acho que a última vez que estive lá era perto da época da Copa do
Mundo e acho que o Museu tinha feito alguma coisa especial falando
da linguagem com o futebol, não me lembro bem da exposição. Eu
104
queria saber na sua opinião, como você encara essa questão de fazer
essa divulgação dentro de uma narrativa, dentro de contar uma his-
tória, essa é uma preocupação ou isso surge normalmente das pro-
postas de exposições que vocês fazem? ”
Marina:
“O próprio Museu, como eu estava respondendo aqui, tem sem-
pre uma curadoria e com isso existia uma preocupação didática
também de mostrar um pouco como a língua se constrói. Quando
a gente trabalha com a linha do tempo da língua portuguesa, mas
começando lá no indo-europeu, ela tem, sem dúvida nenhuma, uma
narrativa que está lá colocada e não dá para trabalhar todas porque
é um universo imenso.
A intenção é, como nunca se esgota uma narrativa, você nunca
consegue abarcar o todo, a ideia é sempre que, tanto as exposições
temporárias quanto o trabalho do educativo, crie essas outras dis-
cussões e narrativas. Por exemplo, uma discussão que estamos tendo
agora, algumas pessoas criticavam, educadores inclusive, que a lín-
gua nunca é tão passiva assim. Há conflitos, guerras, tem poder, a
língua é poder, e muita gente questionava isso não ser colocado.
Tem uma outra coisa que é linda também quando pensamos em
discursos narrativos, se a gente conseguir fazer um diálogo entre
museus. Um museu de história e o museu da língua, que fala da lín-
gua e da relação entre os dois acervos, se constrói o conhecimento.
Mas, é um trabalho do educativo ou das exposições que trazemos.
Por isso é que queria mostrar que nós temos no Educativo essa nar-
rativa de “atualização” da língua, a gente traz na ponta da língua
discussões, mimimi, streaming, ‘vida longa e prospera’, ‘delação pre-
miada’ ... Estamos sempre atentos ao que acontece nas redes sociais,
por exemplo. Assim que surge uma expressão, algo que virou meme,
os educadores incorporam em sua mediação, discutindo significado,
criação, esse processo cultural e dinâmico da língua. Isso é o que eu
acho que são as narrativas que a gente vai criando e é fundamental
que se crie essas outras narrativas, exatamente para você não con-
gelar a língua dentro do museu, mas ela depende do trabalho do
educativo e das exposições. ”
Mediadora:
“Nós agradecemos a professora Marina pela sua palestra. Peço
desculpas, mas infelizmente temos nosso horário.
Gostaria de agradecer também a todos que participaram da dis-
cussão e agora nós vamos fazer uma pausa para o coffee break.
105
106
Segunda Mesa Redonda
Interação entre Espaços Não Formais e
Escolas em São Carlos
Primeiro expositor
Figura 1 – Instalação Escalas: uma jornada entre infinitos – apresentada a primeira vez em
outubro de 2007
112
Figura 3 – Museu “Caminhos do Conhecimento” da UFSCar outubro de 2011
Referências
[1] Instalação Escalas: Uma Jornada entre infinitos – Laborató-
rio Aberto de Interatividade para a Disseminação do Conhecimento
Científico e Tecnológico –http://www.labi.ufscar.br/2016/06/17/ins-
talacao-escalas/ - acessado em 18/07/2017
113
[2] A. J. A. de Oliveira – Memórias de um Carbono – Ciência Hoje
on-line - http://www.cienciahoje.org.br/noticia/v/ler/id/2823/n/me-
morias_de_um_carbono. acessado em 18/07/2017
[3] Programa Paideia - Laboratório Aberto de Interatividade para
a Disseminação do Conhecimento Científico e Tecnológico – http://
www.labi.ufscar.br/category/conteudos/paideia-conteudos/
[4] https://viagensdalaura.wordpress.com/escute-aqui-minhas-
-aventuras/ acessado em 18/07/2017
[5] www.caminhos.ufscar.br - acessado em 18/07/201
114
Segundo expositor
115
centros de estudos de línguas, conhecidos popularmente como CEU.
Os segmentos de ensino atendidos por essas escolas vão desde os
anos iniciais do ensino fundamental, as crianças de 6 anos ingressam
no ensino fundamental passando pelo ensino fundamental dos anos
finais, que correspondem do sexto ao nono ano. O ensino médio que
corresponde da primeira à terceira série, e também educação de jo-
vens e adultos que atende tanto o ensino fundamental EJA, quando
ao ensino médio EJA.
A Secretaria de Estado da Educação tem um currículo oficial.
Não sei vocês têm o conhecimento disso, mas ali tem o currículo da
área de ciências da natureza, que abrange as disciplinas de ciências,
biologia, física e química. Esse currículo oficial organiza o ensino
da área de ciências da natureza em quatro eixos temáticos que são:
vida e ambiente, ciência e tecnologia, ser humano e saúde, terra e
universo.
Esse currículo está organizado na forma em que nós chamamos
em espiral, portanto esses eixos se repetem desde os anos iniciais até
o ensino médio mudando a abordagem e o grau de complexidade, o
aprofundamento, o vocabulário mais específico.
Por que estou dizendo tudo isso para vocês? Porque para imple-
mentação desse currículo oficial na rede, há materiais de apoio ao
currículo de subsídio para implementação desse currículo que são
os cadernos do aluno, conhecidos também como as apostilas, e o
caderno do professor onde tem as orientações para o desenvolvi-
mento das atividades que constam no caderno do aluno. Esse é um
dos materiais de apoio.
A Secretaria do Estado da Educação também faz parte do PNLD,
então também tem conta com livros e manuais didáticos, com textos
paradidáticos, além da sala ambiente de informática que todas as
escolas da rede estadual tem, onde é bastante incentivado e estimu-
lado a utilização e acesso a sites, e também um outro instrumento de
incentivo e de apoio a execução desse currículo, é exatamente a visita
a museus, centrais de energia, instalações de interesse científico e
tecnológico que possam constituir importantes estímulos e reforços
a aprendizagem das disciplinas científicas. Aqui está uma foto para
quem não conhece, os cadernos do professor e cadernos do aluno.
Falando especificamente dessas visitas que as escolas fazem a
116
esses espaços que foram citados anteriormente, e outros que vocês
verão que vou citar logo mais, isso tem uma tramitação dentro da
escola, acho importante vocês saberem disso. Não é simplesmente
o professor decidir sair com os alunos e no dia seguinte sair. Nós
temos uma legislação, é tudo pautado no ECA, Estatuto da Criança
e do Adolescente, nós estamos lidando com crianças e adolescentes,
por isso todos os cuidados necessários são tomados para que essas
saídas do ambiente escolar sejam feitas com a maior segurança pos-
sível para os alunos. Tem todo um expediente, um procedimento
que as escolas têm que montar, e elas são devidamente orientadas
para que façam isso da forma correta que aí fica tudo mais rápido.
Chegando para nós essa solicitação de saída com os alunos, é coisa
de um ou dois dias no máximo e eles já tem autorização para sair.
Sempre orientamos e solicitamos que essas visitas estejam pre-
vistas na proposta pedagógica da escola, que não seja a visita pela
visita, ou o passeio pelo passeio, como já foi citado aqui a questão do
lúdico. O lúdico não é a brincadeira por si só, então mesmo que seja
uma visita com essa intenção, tem uma intencionalidade.
Nós solicitamos que essas visitas sejam previstas desde o início
do ano para que haja uma organização por parte da escola e também
para que haja uma interface com o currículo, com os conteúdos que
tem que ser trabalhados. Só para vocês terem uma ideia do que tem
que constar dessa solicitação. Como eu disse para vocês todo esse
procedimento está pautado no Estatuto da Criança e do Adolescen-
te.
Nós chegamos agora a um recorte, quanto ao convite para vir
aqui conversar, algumas escolas de livre e espontânea vontade me
passaram alguns dados. Nós temos aqui um recorte de mais ou me-
nos 10 ou 12 escolas que contaram um pouco dos lugares de onde
elas estiveram entre o ano de 2015 e 2016.
Como 2016 ainda está em curso, então pedimos que elas contas-
sem um pouco das experiências no ano passado também. E aqui es-
tão os locais, podemos dizer um ranking dos lugares visitados pelos
alunos da rede nos anos de 2015 e 2016.
O Parque Ecológico de São Carlos ganha disparado, está aqui
pertinho, acaba tendo essa facilidade do acesso. Feira de Ciências da
USP, o Zoológico de São Paulo, Fazendo Conde do Pinhal, Visita ao
Mineirinho, Fazendo Santa Maria, a Bienal do Livro de São Paulo, o
próprio CDCC, exposições e feiras, principalmente feiras de profis-
sões em universidades aqui da região, Museu Mário Tolentino, Ob-
servatório da USP, Museu da Memória de São Carlos, Caravana da
117
CPFL, Museu da Língua Portuguesa, Museu Catavento, Museu Afro,
Museu Monteiro Lobato, Museu da Imigração e outros.
Por que ‘e outros’? Como eu disse para vocês isso é só um recorte,
não é a totalidade das escolas, então tem outros lugares que foram
visitados também.
Os componentes curriculares dos professores envolvidos, aqui a
gente pode viajar e tirar uma série de conclusões e fazer uma série de
inferências, mas quase sempre, via de regra, é liderado pelos profes-
sores das áreas de ciências da natureza mesmo. Ou professor de ciên-
cias, ou professor de química ou física, são os que mais solicitam são
os que mais solicitam esse tipo de visita/excursão pedagógica como
nós dizemos. Seguidos pelos professores de língua portuguesa e ma-
temática, que uma suposição é, com exceção do Museu da Língua
Portuguesa que acaba tendo essa afinidade com a própria disciplina
de língua portuguesa, quase sempre são os próprios professores de
língua portuguesa que solicitam essa visita, por serem as disciplinas
que tem o maior número de aulas.
São professores que acabam criando um vínculo maior com
a classe por estarem mais tempo com eles e acabam criando esse
vínculo e daí isso de levá-los para outros ambientes. E também os
professores de história e geografia, que tem bastante afinidade com
a área de ciências, essa questão de contextualização, a sociedade e
tudo o mais que está por trás de toda a produção científica. Lem-
brando sempre que é do recorte.
E o que as escolas falaram que perceberam e puderam observar e
até mesmo aferir em termos de avaliação e observação do impacto
dessas visitas, a esses locais, na aprendizagem dos alunos? E aqui são
palavras das próprias escolas:
‘Uma participação mais efetiva dos alunos nas aulas; maior inte-
resse e comprometimento com a disciplina curricular; contextuali-
zação da aprendizagem; envolvimento do aluno com as atividades
práticas, o que gera aprendizado em todos os componentes curri-
culares e não simplesmente aquele alvo da visita; ampliação e apro-
fundamento do currículo; contribuição para o desenvolvimento do
projeto de vida dos alunos; discussão sobre as formas de energia re-
nováveis e não-renováveis, redução de consumo entre outros; cons-
cientização por parte dos alunos quanto aos hábitos em relação ao
118
desperdício; maior interesse pelos alunos em ciências, experimentos
e pesquisa; constatação da importância das ciências em suas vidas; e
estimulação dos docentes e alunos envolvidos a desenvolverem mais
projetos ampliando sua percepção de mundo, história, evolução e
tecnologia.
Eu gostei muito dessa última colocação. E aqui deixo para vocês
também uma frase do Paulo Freire, que na minha humilde concep-
ção, não sou da área das ciências, que diz ‘o que move a humanidade
é a curiosidade’. Então sem a curiosidade que me move, que me in-
quieta, que me insere na busca, não aprendo e nem ensino.
Aqui tem o nosso contato, caso vocês queiram entrar em contato
com a Diretoria de Ensino para estabelecer parcerias. A Debora é
muito aberta, as escolas também podem nos procurar, é algo que nós
fazemos com muito gosto, com muita convicção que é estimular es-
sas parcerias tanto com a instituições formais de fomento à pesquisa
e a ciência, quanto as não formais também.
Muito obrigada! ”
119
120
Terceiro expositor
Valter Líbero
123
124
Quarto expositor
Paulo Milanez
127
nós não temos mais isso.
Hoje temos 60% ou 70% de visitas não agendadas por causa disso.
Os órgãos públicos, municipais, estaduais e federais estão tirando
bastante verba desta vertente e isso afeta bastante a visitação. Quem
perde não são os museus, quem perde são as pessoas, as escolas. É
muito triste ter todo esse aparelhamento, e friso que fiquei muito
triste agora em saber, que a equipe do Museu da Língua portuguesa
pode ser dispensada porque está em reforma. Não podemos ver isso
acontecer porque quem perde de fato não somos nós enquanto mu-
seus, quem perde é a população.
Essas situações acontecem e precisamos de fato colocar nossa voz,
e a melhor forma de fazer isso é buscando no potencial que temos,
que é muito grande. Nós somos capazes de mudar toda uma geração
porque a escola atua em um segmento importante, como professor
eu sei disso, mas ela não engloba a tudo, e o restante tem que ser
complementado por nós, por nossas entidades.
Acho que isso é fundamental, Professora Yvonne, obrigado nova-
mente, e espero que esse seja um primeiro passo, que possamos de
verdade mostrar aos governantes a importância disso, e conseguir
que cada vez mais possamos levar à população o que é direito dela.
Hoje, na situação tecnológica que vivemos, é inadmissível as pessoas
não terem acesso a isso.
Só vendendo um pouco o peixe, a quem não conhece, o Museu da
Ciência fica a quatro quarteirões daqui. Hoje, infelizmente, abrimos
apenas de segunda à sexta até 18h. Esperamos uma visita. ”
Mediadora:
Participante Gabriela
Profa. Daniela
129
como pode ser utilizando, citando alguns exemplos, um filme, ou
música, ou museu e outras coisas. “
Então não são excludentes, o fato de existir um material didatica-
mente organizado, em uma sequência, e tudo o mais, não exclui as
outras possibilidades do professor, muito pelo contrário. Está pos-
to em um material que é para o professor utilizar outros espaços e
outros materiais, até porque se não, não teríamos esse número que
apresentei para vocês, que é representativo, não é nem a totalidade
da nossa DE, nós não teríamos tantos alunos indo para tantos luga-
res, se esse material não possibilitasse isso. Não sei se respondi sua
questão...”
Gabriela:
“Esse discurso, que você acabou de falar, é corrente. Mas acho que
um material, para ser opcional, é muito caro. ”
Participante Marcos:
Participante Pietra:
Prof. Adilson:
“Eu queria comentar um pouco sobre essas falas. Até sobre a pro-
vocação inicial do Valter sobre essa questão. Uma coisa que nós pre-
cisamos prestar muita atenção é qual é o público que nós estamos
lidando?
A geração que vem hoje é uma geração que vem com ponto de
vista muito diferente. O Valter mesmo lembrou, como eu, não havia
espaço de divulgação cientifica que motivava a gente, por exemplo, a
fazer física. Mas onde eu fui encontrar a minha motivação para fazer
física? Eu fui encontrar na mídia.
Eu tinha 10 ou 12 anos de idade e tinha o programa do Cosmos
na televisão, passava na Rede Globo, sábado e domingo de manhã,
em um horário ótimo para assistir, não era às 5h da manhã, igual
quando se fala tem Globo Ciência e passa às 4h da manhã, onde que
isso vai atingir o público, não é verdade?
Hoje nós temos uma juventude que vem muito diferente do que
nós fomos, certo? A gente tem uma dificuldade principalmente da
linguagem, o que a gente fala para essa pessoa se interessar? Então
isso é um desafio, fazer com que as pessoas se interessarem pela ciên-
cia, elas tem um monte de outras coisas que talvez sejam muito mais
interessante do que ciência. O grande desafio é a gente tentar mos-
trar que ciência pode ser uma coisa legal, a ciência pode ser uma
coisa fascinante.
Nessa semana mesmo, eu li na Folha de São Paulo a matéria onde
a professora Helena Nader fazia uma crítica sobre a questão da PEC
241 que está sendo aprovada e se continuar do jeito que está, vai
congelar a verba da ciência brasileira em um patamar extremamente
baixo o que significa que nós vamos ter um enorme retrocesso.
Não é nenhum problema com a notícia, mas sim os comentários
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que apareciam no site, uma pessoa escreveu ‘mas o que a ciência
brasileira fez de relevante nos últimos 10 anos? Por que eu vou gastar
dinheiro com a ciência, o que a ciência fez de relevante nos últimos
10 anos?’. É o leitor comum, do site da Folha que tem acesso à inter-
net, se interessou pela notícia e coloca um comentário como esse.
Quando eu vi esse comentário eu fiquei preocupado, falei ‘realmente
estamos em perigo’, porque a gente precisa de alguma forma de al-
guma maneira, fazer com que esse conhecimento se transforme em
uma coisa que as pessoas achem interessante.
Vou dar um outro exemplo para vocês. Na década de 90 os Es-
tados Unidos estavam construindo o maior acelerador de partícula
do mundo que competir com LHC, até aquele momento os Estados
Unidos eram o líder mundial em pesquisa de física de partículas.
Os Estados Unidos gastaram dois bilhões de dólares cavando um
buraco para fazer o acelerador de partículas. Chegou o Congresso
americano e ‘por que eu vou montar um equipamento que vai custar
bilhões de dólares para saber a origem do universo? O que eu ganho
com isso? Ah, corta esse projeto’. Desde aquele momento os Estados
Unidos perderam a liderança mundial na física de partículas em re-
lação ao CERN na Europa.
Foi naquele momento que caiu a ficha de muito cientista ameri-
cano falando em não se conseguir traduzir para a população que é
importante isso. O político é movido em função da vontade popular,
o povo que coloca ele lá, se aquilo não virar uma pauta importan-
te a ciência para. Por isso em todo o projeto aprovado na National
Science Foundation dos Estados Unidos o pesquisador tem um com-
prometimento de fazer divulgação cientifica, porque não adianta re-
ceber 10 bilhões de dólares para fazer projeto se as pessoas daqui a
pouco vão falar, mas para que serve esse projeto.
Então há uma necessidade de a academia se comprometer a fazer
isso. Como o Valter falou no começo, quando começou esse projeto
do CDCC, quando eu estava lá trabalhando no Observatório, fala-
vam ‘nossa, você está perdendo tempo fazendo divulgação científica,
você pode publicar mais dois ou três artigos’. Isso não é importante,
o problema é que se a gente só pensar em publicar os artigos, daqui
a pouco ninguém mais vai nos pagar para publicar artigos, porque a
população vai questionar, como fez o leitor do jornal da Folha ‘o que
a ciência brasileira fez relevante nos últimos 10 anos?’.
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Nesse papel, os espaços não formais são um desafio para levar
essa informação. Vamos pegar o exemplo da NASA, Agência Espa-
cial Americana. Eles são as pessoas que conseguem fazer o maior
estardalhaço por qualquer coisa. Vocês lembram há uns anos atrás
que foi achado um meteorito na Antártida que tinha duas ou três
bactérias no meteorito e aí era ‘ah, provamos a existência de vida
extraterrestre’. Fizeram um carnaval e não era nada, as bactérias que
estavam no meteorito eram daqui da Terra mesmo.
A sonda Juno que chegou agora em Júpiter, o vídeo que eles lan-
çaram no dia 4 de julho quando ela chegou, foi um vídeo que eles
encomendaram para um diretor de cinema de Hollywood. O vídeo
parecia aqueles trailers de filmes de ficção científica de ponta, tipo
Star Trek, Star Wars, até com aquela expressão ‘e agora, a sonda vai
conseguir parar e fechar?’. Você assiste um vídeo daquele e fica entu-
siasmado, ou seja, é buscar um espaço de uma linguagem para fazer
isso.
Quando falamos das redes sociais, por exemplo, é um espaço
muito rico para a gente fazer divulgação científica. Ali é um espaço
que a gente tem que estar presente, temos que estar no facebook, no
twitter, porque é lá que essas pessoas se encontram.
Quando a gente fez o projeto das viagens da Laura, Verdades In-
ventadas, foi impressionante a quantidade e-mails e posts que rece-
bemos do Brasil todo, porque a hashtag ‘viagens da Laura’ começou
a subir em Twitter, Facebook etc., isso é algo exponencial na web. Um
post replicado por outro cai lá nos seus duzentos amigos e assim vai
embora.
A gente tem que ter algumas estratégias, tem que conciliar a co-
municação. Eu acho que isso falta um pouco na área da divulgação
científica, a gente se conciliar um pouco com as próprias estratégias
de comunicação.
Acho que espaços não formais, museus de ciências etc. são luga-
res para despertar a curiosidade. Toda a vez que um dos projetos que
temos financiados pela Fapesp o parecerista falava ‘como você con-
segue medir a eficiência do seu projeto? Qual o resultado objetivo?
Eu não quero o número de visitantes’. Tem muitas metodologias que
se trabalha para isto, mas o Museu Cosmocaixa de Barcelona fala ‘o
que paga é o brilho nos olhos’. Como o professor Paulo aqui falou, o
pedreiro que você falou que descobriu que com roldanas ele faz me-
nos força para levantar um objeto é aí que está o grande resultado:
aquela hora que dá o brilho nos olhos e isso é imensurável.
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Há duas semanas atrás a UNESCO publicou um estudo em que
existe atualmente no mundo 200 milhões de crianças em idade es-
colar fora da escola. Duzentos milhões é a população do Brasil. Es-
tamos no século XXI, nós mandamos sonda para Marte, fazemos
coisas com átomos e tem gente que não consegue ser alfabetizada no
mundo. E outro dado importante, faltam 50 milhões de professores
no mundo, e principalmente professores de ensino de ciências, do
ensino médio, esse é o que mais faz falta.
Para falar em termos de uma política pública que consiga abran-
ger tudo, a gente tem que colocar isso em uma agenda do país que
envolva todos os níveis. A formação do professor, o fortalecimento
desses espaços, trazer a ciência de uma maneira mais interessante,
para que isso avance.
Em maio desse ano eu participei de uma reunião na USP em São
Paulo que estava o ministro da ciência, tecnologia, inovação e co-
municação, o Kassab. Lá na mesa redonda que a gente participou eu
cobrei justamente sobre essa questão da divulgação cientifica, pois, o
Ministério dele tem uma Secretaria específica para isso. Essa Secre-
taria está sem dinheiro nenhum, dado que não teve edital nenhum
esse ano. E o que ele me respondeu: ‘não, agora essa união que nós
fazemos com a comunicação vai potencializar a divulgação científi-
ca, agora tem a comunicação aqui junto etc.’. Vocês viram que poten-
cializou mesmo a divulgação cientifica, né? Então isso acaba sendo
exatamente um problema das próprias políticas públicas que estão
sendo colocadas aqui no Brasil, a gente precisa realmente avançar
isso, e isso tem que partir de nós.
Nós temos que colocar, protestar e levar essas demandas para fa-
zer isso, porque senão a ciência vai ficar cada vez menos interessante
para as pessoas, você não terá mais alunos, e sem gente interessada
em ciência não tem desenvolvimento do Brasil. Sem cientistas, sem
engenheiros, sem educadores, você não faz essa nação desenvolver.
Qualquer projeto de desenvolvimento que esqueça disso, do cientis-
ta, do educador, e das pessoas que trabalham com a tecnologia é um
projeto de país que não vai dar certo. ”
Mediadora:
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Profa. Yvonne
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