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ESPAÇOS INFORMAIS E EDUCAÇÃO BÁSICA

Yvonne P. Mascarenhas
Organizadora

Thais Cardoso
mediadora

V Seminário da Agência CiênciaWeb


São Carlos, Outubro 2016

Instituto de Física de São Carlos


Instituto de Estudos Avançados
São Carlos

2018
Instituto de Fisica de São Carlos/USP
Prof. Dr. Vanderlei Salvador Bagnato
Diretor

Prof. Igor Polikarpov


Vice Diretor

Instituto de Estudos Avançados/USP


Prof. Dr. Renato Anelli
Coordenador do Polo de São Carlos

Prof. Dr. Paulo Hilario Saldiva


Diretor do IEA/USP

Diagramador
Rafael Campelo

Ficha catalográfica elaborada pelo Serviço de Biblioteca e Informação IFSC/USP

E471 Espaços informais e educação básica. V Seminário da


Agência CiênciaWeb (outubro, 2016:São Carlos, SP.)/
Organizado por Yvonne P. Mascarenhas. São Carlos:
IFSC/IEA, 2018.
138p.

1.Educação básica. 2. Espaços informais. I. Mascare-


nhas, Yvonne P. org. II. Cardoso, Thais, med. III. Titulo.
ISBN 978-85-61958-22-0 CDD 370

Apoio Institucional
Instituto de Estudos Avançados/USP

Apoio
CNPq (Contrato No. 472364/2013-8)
Centro de Difusão Científica e Cultural, Campus de São Carlos da USP
SUMÁRIO
Introdução ....................................................................................................5

Primeira palestra
Parque CienTec: Um Museu de Ciências a Céu Aberto ............................7
Fábio Ramos Dias de Andrade

Primeira Mesa Redonda


Pesquisa em Educação Não Formal
O Museu Itinerante PONTO UFMG ........................................................23
Profa. Tânia Margarida Lima Costa

Aprendemos nos Museus? .........................................................................29


Alessandra Bizerra

Segunda Palestra
Catavento Cultural......................................................................................43
Gabriel Giannini Furruel

Terceira Palestra
A Contribuição dos Zoológicos à Educação e à Cidadania. ..................71
Kátia G. de Oliveira Rancura

Quarta Palestra
Museu da Língua Portuguesa ....................................................................95
Marina Sartori de Toledo

Segunda Mesa Redonda


Interação entre Espaços Não Formais e Escolas em São Carlos

O Laboratório Aberto de Interatividade (LAbI) da UFSCar................107


Adilson Oliveira

Interação das Escolas da Rede Estadual de São Carlos


com Espaços Não Formais .......................................................................115
Daniela Isabel Taipeiro

O Centro de Divulgação Científica e Cultural, CDCC,


Campus de São Carlos da USP ................................................................121
Valter Líbero

O Museu da Ciência Prof. Mario Tolentino ..........................................125


Paulo Milanez

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Introdução
Estamos muito acostumados a associar os museus a ideias de
conservação de patrimônio histórico e cultural. Entretanto, se pen-
sarmos que cada vez mais, como afirma J. Amado Mendes que
...a educação continua a ser fator decisivo para o
desenvolvimento das pessoas e da sociedade, com o
conceito de aprendizagem ao longo da vida – muito
em voga em nossos dias e que constitui uma das ima-
gens de marca das políticas educativas do século XXI
–, o papel dos museus tem vindo a reforçar-se, como
complemento da educação formal, atribuída às es-
colas, mas principalmente como fatores decisivos, no
âmbito da educação não formal.1

A realização deste Seminário visou à discussão e elaboração de


sugestões visando o uso efetivo dos espaços não formais com a fina-
lidade de apoiar as atividades educacionais formais e envolver cada
vez mais os Museus de São Paulo e dos demais Estados Brasileiros
nessas ações. Baseados nos resultados alcançados por esse evento
pretende-se apresentar às autoridades educacionais e culturais mu-
nicipais, estaduais e federais os resultados deste Seminário com so-
licitação de medidas adequadas para o cumprimento dos objetivos
ora almejados.
Entende-se como espaços científico-culturais não formais mu-
seus, planetários, jardins botânicos, zoológicos, aquários, unidades
de ciência móvel e associações que atuam na popularização da ciên-
cia e tecnologia no País.
Foi nosso objetivo principal reforçar o papel desses espaços tanto
na ampliação das possibilidades educacionais de crianças e jovens
como no aprimoramento das oportunidades educacionais de todas
as esferas sociais. Para tanto, os museus e espaços de divulgação
científica existentes deverão aprimorar os recursos educacionais à
disposição de seus visitantes.
No decorrer do Seminário procurou-se explorar opções de mu-
seus e espaços interativos de ciências exatas, biológicas e humanas
para que os professores do ensino básico conheçam formas de com-
1  MENDES, J. A. Museus e Educação. Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra,
2013. p.7. Disponível em: <https://digitalis.uc.pt/files/previews/90697_preview.pdf>.
Acesso em 6.mar.2016.
5
plementar, explorar, aprofundar e ilustrar o conteúdo estudado em
sala de aula. Procurou-se divulgar e apresentar iniciativas desenvol-
vidas por esses espaços na área de difusão científica e tecnológica e
como as pessoas envolvidas com a educação formal podem aprovei-
tar essas ferramentas em sala de aula. Buscou-se também criar uma
área de interação entre representantes desses espaços e os professo-
res da rede pública visando a troca de informações sobre como os
papéis de ambos podem se complementar e de que forma poderiam
desenvolver projetos em conjunto.
Não podemos deixar de mencionar que esforços nessa direção
vêm sendo realizados no Brasil desde meados do século XX e que
em novembro de 1990 foi criada no Rio de Janeiro a Rede de Popula-
rização da Ciência e da Tecnologia da América Latina e Caribe (Re-
dPOP) para incentivar a popularização da ciência através de vários
meios inclusive através de Museus. Tal Rede foi criada com apoio
e estímulo do Escritório Regional de Ciências da Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e
vem desempenhando importante papel no incentivo dessas ativida-
des nos países membros (Brasil, Argentina, México, Colômbia, Cuba
e Uruguai). Desejamos que a realização deste Seminário possa con-
tribuir para avançar mais um degrau na difícil escalada do desenvol-
vimento científico de nosso país que tem sido procurado através de
inúmeras atividades por nossas Sociedades Científicas, tanto indivi-
dualmente como junto com a Sociedade Brasileira para o Progresso
da ciência em suas importantes Reuniões Anuais.

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Primeira palestra
Parque CienTec: Um Museu de Ciências a
Céu Aberto

Fábio Ramos Dias de Andrade

Geólogo, pela Universidade Federal do Paraná,


Mestre e Doutor em Geociências, Geologia regional, pela Unesp,
Professor associado da Universidade de São Paulo,
Desde 2012 é Diretor do Parque CienTec da USP

O Parque de Ciência e Tecnologia da USP, Parque CienTec, é um


museu de ciências plenamente gratuito, focado na interatividade, na
interdisciplinaridade e no protagonismo do público.
Localiza-se na zona sul da Região Metropolitana de São Paulo,
no Parque Estadual das Fontes do Ipiranga, uma Unidade de Con-
servação instituída no final do século XIX, a primeira no Estado de
São Paulo, conhecida popularmente como Parque do Estado e con-
cebida para proteger os mananciais de água das nascentes do Riacho
do Ipiranga. A Figura 1 mostra o vale do Ipiranga de montante para
jusante, ao fundo a cidade de São Paulo. Os cerca de 540 hectares do
Parque Estadual das Fontes do Ipiranga representam uma das maio-
res reservas de mata do Município de São Paulo (Figura 2).

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Figura 1. Vista da Cidade de São Paulo a partir do Parque CienTec, ao longo do Vale do
Ipiranga.

Figura 2. Imagem de satélite da Região Metropolitana de São Paulo, destacando o Parque


Estadual das Fontes do Ipiranga (Google Earth).

Uma notícia de jornal não datada (Figura 3), anterior a 1930,


anunciava o início das obras do Observatório de Astronomia e Geo-
física, com uma concepção artística do futuro prédio. O mesmo ob-
servatório que hoje abriga o planetário no local do Parque CienTec
(Figura 4). No final do século XIX e início do XX, o Observatório
de Astronomia e Geofísica estava situado na Avenida Paulista, mas
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a urbanização trouxe problemas como trepidações do solo e a ilumi-
nação pública, prejudicando as observações sísmicas e astronômi-
cas. Por este motivo o observatório foi realocado na zona sul de São
Paulo, local desabitado à época. Após a fundação da USP, em 1934,
o Instituto de Astronomia e Geofísica (IAG) passou a fazer parte da
Universidade. O IAG funcionou neste campus avançado por várias
décadas e, no final da década de 1990, foi transferido para a Cidade
Universitária no Butantã, quando foi então criado, em 2001, o Par-
que CienTec.

Figura 3. Anúncio do início das obras do Observatório de Astronomia.

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Figura 4. Planetário do Parque CienTec durante Feira USP e as Profissões, em 2016.

O Parque Estadual das Fontes do Ipiranga (PEFI) abriga, além


do CienTec, outras instituições públicas e concessionárias privadas
(Figura 5), sendo as maiores o Instituto de Botânica, o Jardim Bo-
tânico de São Paulo, a Fundação Jardim Zoológico de São Paulo. O
PEFI é uma Unidade de Conservação incomum, cortada por uma
avenida com tráfego intenso e linhas de ônibus, tangenciada por
uma rodovia de grande porte, e cercada por bairros e comunidades
de alta densidade demográfica. Essa situação gera uma pressão do
ambiente urbano sobre o Parque, o que requer constante atenção,
principalmente ao longo do perímetro do Parque. Em 2012, a Supe-
rintendência de Gestão Ambiental da USP publicou uma Resolução
que considera os 122 hectares o Parque CienTec como uma Reserva
Ecológica da USP.

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Figura 5. Parque Estadual das Fontes do Ipiranga (imagem aérea, Google Earth).

O Parque CienTec é um órgão da Pró-reitoria de Cultura e Exten-


são Universitária (PRCEU) da USP. A PRCEU conta com 11 órgãos,
três deles dedicados à divulgação científica. Além do Parque Cien-
Tec, há o Museu de Ciências, com projetos de exposição no espaço
virtual, e a Estação Ciência, que tinha sede no bairro da Lapa, em
São Paulo, e que atualmente passa por uma remodelagem, para vol-
tar a funcionar em outro local.
O Parque detém cerca de 30 edificações, sendo dez prédios histó-
ricos da época de fundação do Observatório. Os prédios históricos
são construídos em torno de uma praça central, com vias que se-
guem as direções dos pontos cardeais, em função das observações
astronômicas ali realizadas. Há duas cúpulas astronômicas preser-
vadas, sendo que uma delas conta com telescópio de refração da
década de 1920, ainda em operação, onde são feitas sessões abertas
de observação do céu. Há, ainda, uma estrutura tensionada com ca-
pacidade para abrigar centenas de pessoas, inserida em um nicho
na mata e usada no atendimento às escolas e em grandes eventos,
como a Feira USP e as Profissões (Figura 6). O prédio principal, em
estilo art déco, com vitrais, mosaicos e escadarias de mármore, espa-
ço ocupado pela administração do Parque e que tem sido usado em
parte para exposições temporárias (Figura 7).
Há também valioso acervo de instrumentos de época, em especial
no Museu de Meteorologia. A meteorologia é parte integrante deste
espaço desde a fundação do IAG e funciona no local a mais antiga
estação meteorológica em atividade ininterrupta em São Paulo.

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Figura 6. Vista panorâmica do Parque CienTec (Fonte: Google Earth)

Figura 7. Vista do prédio da administração e da exposição temporária “O tempo e as plan-


tas” (2016), onde plantas fósseis foram contextualizadas no tempo e comparadas com plan-
tas atuais existentes no Parque CienTec.

Nas visitas de grupos de estudantes, buscamos diluir os limites


entre as disciplinas, mesclando conteúdos de várias áreas do conhe-
cimento em uma mesma visita, combinando atividades em labora-
tórios e ao ar livre. Ao ar livre temos equipamentos lúdicos de física,
como giroscópio, gangorra, bicicleta suspensa, conchas acústicas,
uma maquete do Sistema Solar, além dos laboratórios de física, geo-
física, microbiologia, solos, música e matemática. As trilhas ecoló-
gicas têm graus de dificuldades e duração variados, de acordo com
a faixa etária do público, desde crianças de 5 a 6 anos até grupos de
terceira idade, incorporando conteúdos variados. Quanto aos for-
matos de visita: (i) temática, duas atividades em duas horas, com
intervalo para lanche, com um mediador para cada 20 pessoas, (ii)
exploratória, percurso por todos os ambientes do parque, com 20
minutos ou menos em cada espaço, e com uma mediação menos
intensiva por parte do Setor Educativo, (iii) aberta, visita não-me-
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diada, disponível em áreas restritas do Parque, com atividades livres
e autoexplicativas.
A mata é um importante ambiente de observação e aprendiza-
gem, onde podem ser feitas observações discussão de conteúdos
multidisciplinares de biodiversidade, ciclos da natureza, mudanças
climáticas, ocupação urbana, entre outros. As observações em cam-
po podem ser retomadas e contextualizadas em laboratório, permi-
tindo a construção de conceitos.
Uma de nossas principais metas é a formação de público, já que
não temos uma tradição de incluir a visita a museus nas opções de
lazer, especialmente os museus de ciências. O público que visita o
CienTec é predominantemente escolar, através de contatos com as
Secretarias de Educação Municipal e Estadual, e com as agências
que atendem as escolas particulares. Procuramos conhecer as mo-
tivações do público através de questionários on-line e de entrevistas
com os visitantes. Nestes levantamentos, identificamos o planetário
como um ponto importante de atração de público, assim como e as
trilhas na mata e as ‘Tardes Científicas’, que são ciclos de conversas
com pesquisadores sobre temas de interesse geral, realizadas quin-
zenalmente aos sábados e que têm se mostrado importantes na fide-
lização do público.
Os dados de público mostram um salto a partir de 2014 (Figu-
ra 8), quando a Feira USP e as Profissões passaram a acontecer no
CienTec. Além do grande número de visitantes da Feira, este evento
tem gerado aumento de público ao longo do ano.

Figura 8. Número de visitantes do Parque CienTec, entre 2009 e 2016.


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A formação de público exige, entre outras coisas, a persistência
em repetir eventos ano a ano, formando ciclos que acabam se fixan-
do na memória coletiva. Este é o caso da Feira “USP e as Profissões”,
que ocorre todos os anos na mesma época, atingindo grande sucesso
de público, estando já inserido no calendário escolar dos anos finais
do Ensino Médio. A participação na Semana Nacional de Ciência e
Tecnologia, promovida anualmente pelo Ministério de Ciência, Tec-
nologia, Inovação e Comunicação, é igualmente prioritária.
A aproximação com o entorno é outra meta importante desta
gestão, em especial porque o CienTec está em uma região carente
em termos de urbanização, saneamento, segurança e, claramente, de
equipamentos culturais. Dispomos de um valioso acervo público e
gratuito, e gostaríamos que a população do entorno usufruísse deste
espaço. Enquanto as portarias e a estrutura de atendimento estão
voltadas para uma avenida com boa estrutura de transporte e acesso,
a parte dos fundos, limítrofe com as comunidades mais carentes, é
fechada por um muro. Seria importante ampliar o acesso ao Parque,
ampliando sua infraestrutura de atendimento e segurança.
Uma das vias de aproximação com o entorno tem sido a Secreta-
ria Estadual de Educação, que tem incentivado as Escolas Estaduais
mais próximas a fazerem uso mais intensivo do Parque.
Outra aproximação relevante se dá entre a divulgação científica
e a pesquisa científica. Procuramos fomentar o desenvolvimento de
projetos de pesquisa nas áreas de educação não formal, comporta-
mento animal, biodiversidade, meteorologia, entre outras. Os pes-
quisadores que desenvolvem suas pesquisas no Parque têm a opor-
tunidade de compartilhar sua experiência com o público nas ‘Tardes
Científicas’.
Todas as metas convergem para a formação de público e inserção
do Parque no roteiro cultural da cidade de São Paulo.

Mediadora:

Inicialmente gostaríamos de comunicar que o Prof. Fábio e a Prof.


Alessandra trouxeram 20 exemplares do livro “Parque de Ciência e
Tecnologia da USP: restauração do conjunto arquitetônico de im-
portância histórica para abrigar atividades de difusão da ciência e da
tecnologia”, que sortearemos entre s presentes.

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Nós agradecemos o Prof. Fábio pela palestra, e agora nós vamos
abrir o espaço para perguntas, dúvidas ou comentários da audiência.
Participante Gislene: “Bom dia, me chamou a atenção quando
você está descrevendo as metas, a questão do reconhecimento e da
aproximação do não-público, como é que isso se dá”.
Prof. Fábio: “A Alessandra é uma pessoa mais habilitada para res-
ponder essa questão, mas basicamente, a gente procura através de
questionários, vou dar um exemplo prático, nós fizemos um ques-
tionário online que foi enviado para toda população da USP, pro-
fessores, funcionários, há um ano e meio atrás, e nós coletamos aí
um certa população, 4 mil e 500 respostas, da comunidade uspiana,
em relação ao Parque CienTec, e também em relação aos espaços de
divulgação cientifica, aos museus, aos acervos etc.
O resultado desse questionário revelou como o Parque CienTec
é pouco conhecido pela própria da USP. Alessandra poderia falar
melhor sobre isso”.

Alessandra:

“Gislene, a nossa preocupação é tentar entender quais as motiva-


ções que levariam as pessoas a irem a um espaço como nosso, então
nesse questionário que enviamos para comunidade interna uspiana,
tínhamos uma questão para isso: se você não conhece, nunca ouviu
falar, mas se a pessoa já tinha ouvido falar, e não tinha ido, o porquê
que ela não tinha ido.
Verificamos que para comunidade uspiana o problema era o aces-
so. Mas não podemos acreditar que essa é uma questão para a cidade
de São Paulo, porque o zoológico tem um público numeroso a ponto
dos carros, para parar no estacionamento chegarem até a Bandeiran-
tes no transito e formare 3km de fila para ir parar no estacionamento
do zoológico. Nós, agora, estamos tentando descobrir o que motiva-
ria as pessoas a visitarem o museu.
Estou com uma aluna de mestrado que está investigando as mo-
tivações que levam as pessoas para o zoológico, para o jardim bo-
tânico, e para o CienTec, e uma aluna de IC, que já terminou a IC
dela e tentou compreender das famílias que já estão lá aos sábados, o
porquê que elas não iam antes e porque que vão agora.

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Então a gente viu por exemplo, que o planetário é um ponto im-
portantíssimo, muitas famílias vão ao final de semana, por causa do
planetário, e um outro movimento motivador que tem levado a um
aumento do número de visitantes são as nossas tardes cientificas,
quando fazemos um ciclo de palestras, e conversas entre especialis-
tas e público. Outro fator que levou a maior número de visitantes foi
o ter aberto o Museu aos sábados. Começamos a acompanhar esse
público e entender quais são as demandas desse potencial público.
Porque em alguns países latino americanos, como o México, a
cultura de visitação aos espaços não-formais é bastante intensa? No
Brasil nós estamos construindo isso, e eu acho que no governo an-
terior, com 15 anos de investimento em políticas públicas para isso,
tivemos um ganho considerável. Eu sou otimista nesse sentido, esta-
mos num caminho positivo, de ampliação de público.

Participante não identificado:

“Bom dia, gostaria de saber se esses monitores, esses mediadores,


eles têm uma formação, pelo menos uma base pedagógica, quero
dizer, a parte didática, psicológica em relação a contornar problemas
comportamentais dos alunos, porque isso é um problema, quando
você interage com pessoas de várias comunidades, não importa que
tipo de comunidade, a diversidade comportamental, exige uma for-
mação para lidar com isso. ”.

Prof. Fábio:

“É uma pergunta dificílima, porque a situações difíceis não se re-


petem, elas são quase sempre únicas, é quase tudo inédito quando
temos uma crise. O Museu tem um setor educativo e a chefe des-
se setor é uma educadora, que trabalhou por mais de 20 anos na
Estação Ciência, no espaço original, que era no bairro da Lapa em
São Paulo. Essa pessoa tem muita experiência com um público mais
carente, então ela fez um projeto que ficou muito famoso, acho que
até internacionalmente conhecido, que é o ‘Projeto Clicar’, que é
uma história linda, que a gente gostaria de repetir essa história lá
no parque e que é o seguinte, a Estação Ciência ficava num prédio
histórico, que era uma tecelagem, senão me engano, próximo a um
terminal de ônibus, de trem, um mercado municipal, um local de
grande circulação, e as crianças de rua, iam lá usar o banheiro, usar
o bebedouro, iam correr lá dentro e tal. O Prof. Hamburguer, que foi
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um visionário, que criou a Estação Ciência, ele falou ‘poxa, a gente
tem que achar um formato para eles se apoderarem disso aqui e não
serem o ruído aqui dentro, para que isso seja deles’.
E esse Projeto Clicar, teve patrocínios também, senão me engano,
de grandes empresas de computação, que doaram computadores e
programas, e as crianças passam a ir diariamente lá, para usar aquilo
como se fosse propriedade deles.
Então, eu não posso dizer que a gente tem todos os elementos
para lidar com todos os problemas. Posso citar, por exemplo, que
certa vez fazendo uma trilha longa no parque com colegas e estando
com o pessoal de segurança, depois de quase 1hora e meia andando
no mato, nos deparamos com pessoas consumindo drogas, pessoas
que provavelmente estavam armadas. Eles se assustaram conosco e
nós nos assustamos com eles.
Então, quando orientamos o público para não circular por tudo
livremente, é porque não queremos expor o público a esse tipo de
risco, de ser confrontado com uma situação tão inesperada como
um grupo numa situação ilícita, que pode ter algum risco.
Mas o que a gente percebe é que não temos tido situações extre-
mas com o público, nem o espontâneo e nem o agendado. Apren-
demos muito com o público para aperfeiçoar o nosso atendimento.
Um exemplo que eu acho interessante, é que a gente recebe pou-
cos cadeirantes, por exemplo, para pegar um grupo de pessoas com
algum tipo de dificuldade, o que acontece é que às vezes o banheiro
adaptado fica semanas sem uso, e as próprias pessoas às vezes da
equipe acham que aquilo não vai ser usado nunca, e alguém tranca,
ou usa para guardar alguma coisa.
Então esse tipo de visão a gente vai aperfeiçoando, no momento
que alguém fica furioso, ‘poxa, o meu aluno precisou ir ao banheiro
e estava trancado’, isso já cria um alerta para que essa situação não se
repita, vamos fazendo um polimento das coisas, mas sempre lidando
com o imponderável. ”

Prof. Alessandra:

“Eu acho que é uma questão bastante importante que você está
trazendo, a formação de mediadores é crucial para esses espaços.
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Vemos nos nossos encontros diários, que é necessária uma formação
mais contundente, mais coesa, mais contínua, e não tão pontual, tão
momentânea, ainda mais que reconhecemos que os mediadores, são
alunos de graduação, tem um tempo de bolsa limitado.
E como poderíamos pensar numa formação mais continua dos
mediadores? Temos feito esforços junto a pró-reitoria de graduação
da USP visando ter um modelo mais integrado de formação entre
a licenciatura e os nossos órgãos de divulgação científica visando
aproveitar os nossos espaços para que os alunos possam, também,
desenvolver os seus estágios obrigatórios articulados a esses locais.
Existe uma resistência a essa proposta alegando-se que a legisla-
ção não permitiria que os estudantes desenvolvessem seus estágios
fora da escola, mas foram encontradas possíveis interpretações na
legislação que permitem que estudantes façam parte dos seus está-
gios nos espaços educacionais não-formais.
Então por exemplo, lá na faculdade de educação, a Profa. Mar-
ta Marandino já faz isso com os alunos, permitindo que no estágio
obrigatório dos cursos de licenciatura os alunos façam uma parte
dele em museus. Entretanto, no Instituto de Biociências, onde eu
dou aula, não conseguimos porque legalmente é na escola que o es-
tágio tem que ser realizado.
Atualmente estamos tentando que a Pró-reitoria de graduação,
junto com a Pró-reitoria de cultura e extensão da USP, montem um
programa institucional em que fique muito claro, junto as comissões
de graduação, que o aluno pode sim, contar horas de estágio obri-
gatório em Museus. Isto levaria a uma formação inicial, articulada
a uma formação continuada durante a prática de mediação. Mesmo
essa solução não pode ser considerada definitiva e todo o processo
é muito complicado, inclusive pela grande rotatividade de mediado-
res. Esse é um desafio, um ponto crucial. Tanto assim que em todo
encontro que participamos, a formação é um ponto nevrálgico de
discussão. ”

Comentário do Prof. Valter Líbero, diretor do CDCC:

“Boa apresentação, foi bom conhecer um pouco mais o parque,


embora já tenha estado lá algumas vezes. Você, às vezes, se refere
ao parque zoológico como referência, ou talvez, não sei, como uma

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referência para ser alcançada. Nós também, tanto pela restrição de
espaço que temos, como pelo tamanho da cidade, às vezes nos refe-
rimos ao CienTec como o espaço que nós gostaríamos de ter. Então,
todos temos alguma limitação, e isso é pelo anseio, de cada dia poder
fazer melhor e mais para comunidade.
Entretanto, acho que há uma diferença muito grande entre aquilo
que o zoológico faz, e aquilo que nós fazemos. O zoológico é um
lugar em que você se diverte, é um show, você vai ver o macaco pu-
lando, admirar os grandes mamíferos e a grande variedade de aves
e répteis. Talvez até dentro do zoológico possa ter algum progra-
ma educacional que explore questões envolvendo os bichos, mas as
famílias vão lá, não é, suponho eu, pelo programa educacional do
zoológico, mas é mesmo para olhar os bichos, enquanto nós não fa-
zemos um show nesse sentido, não é uma diversão, não vou botar
uma gangorra aqui no CDCC, para os alunos se divertirem nela. Se
eu colocar a gangorra aqui, provavelmente nós vamos dizer que tem
uma força de um lado, uma reação do outro, um peso, uma coisa
desse tipo, e aí é que vem, às vezes, o desinteresse na hora que você
transformou a gangorra num instrumento de ensino e não numa
diversão.
Então a gente não vai conseguir competir com lugares que são
pura diversão, enquanto que nós temos uma missão um pouco mais
nobre, eu diria, embora, é óbvio que na divulgação cientifica, você
também não pode ser tipo escola, por isso nós chamamos de espaços
não-formais. Você tem que também explorar o aspecto lúdico, mas
na medida certa. ”

Participante não identificado:

A minha pergunta para você é o seguinte: dadas as dimensões do


Parque CienTec, a diversidade de programas, com quantas pessoas
você trabalha, com quantos monitores, ou mediadores, que rodam
a cada ano pelos programas? E quantos são fixos? Quem você diria
que são os responsáveis pela formação desses mediadores, ou moni-
tores? ”

Prof. Fábio:

“Eu também tenho essa percepção e evito ao máximo usar a pa-


lavra entretenimento. O CienTec não é um espaço de diversão, é um
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espaço de uma outra coisa, mais serena, de uma coisa diferente, não
é um espaço de diversão.

Precisamos achar uma linguagem que torne esse espaço mais vol-
tado para o conhecimento cientifico, não divertida, mas instigante.
Não queremos que as pessoas vejam um equipamento e deem garga-
lhadas e achem aquilo um máximo, mas que elas fiquem fascinadas.
Também a gente não tem dado muita ênfase em explicar todos os
fenômenos para as pessoas, a gente fica feliz se alguém for ao parque
e sair cheio de dúvidas, e ir até angústias e perguntas: ‘mas caramba,
por que que aquilo acontece daquele jeito? ’, ‘então, tal coisa não era
assim, como será que é? ’, e provocar dúvida. Isso não é uma coi-
sa simples de fazer, mas a gente tem exemplos pelo mundo que são
muito bem-sucedidos, tem o CDCC, tem vários lugares que fazem
isso muito bem, e a gente vai aprendendo e tentando fazer.

A nossa equipe é enxuta, e se enxugou muito nesses programas


da USP de incentivo a demissão. O parque tem um setor educati-
vo, com quatro funcionários, dos quais apenas um é educador e três
são funcionários fixos de apoio. Nos primeiros 10 anos de vida do
Parque CienTec, nós não tínhamos nenhum educador, apenas uma
equipe de manutenção, e o setor educativo era auto organizado de
um jeito meio caótico, com o apoio mais ou menos engajado de um
professor que simpatizava com a causa. Então, por um golpe de sor-
te, conseguimos uma educadora, que deu um formato mais formal
para nossa ligação com as escolas e é responsável pela formação e
agendamento dos mediadores no atendimento aos grupos.

O número de mediadores oscila atualmente entre 30 e 40 mais ou


menos, e eles têm resumidamente, três tipos de bolsas dependendo
do tempo de participação: apenas aos sábados, 10 horas por semana
e 30 ou 20 horas (estas em geral para alunos de curso noturno e po-
dem durar até 2 anos).

O que é difícil nesse formato de equipe, é fazer a formação conti-


nuada dos mediadores ao longo do semestre, porque tem aluno que
só pode ir no sábado, outro só pode na terça, etc.”

Participante Adeilson:

“Olá professor, meu nome é Adeilson, eu venho de Barueri, da


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grande São Paulo, são duas perguntas, uma bem rápida, e uma um
pouco mais longa.
A primeira pergunta é se o parque do CienTec está no programa
de privatização que o novo prefeito de São Paulo anunciou recen-
temente. A segunda é se as vias dos programas de pós-graduação,
são vias diretas com vocês ou pelos programas de pós-graduação da
USP. ”

Prof. Fábio:

“Adeilson, obrigado pelas perguntas. Em relação a primeira per-


gunta, o Parque Estadual das Fontes do Ipiranga, não entrou nesse
programa de privatização. Acredito que ele não vai entrar, porque
ele é um parque muito complexo atravessado por uma avenida e,
além disso, uma parte pertence à USP e já tem uma certa exploração
com fundação privada, que é o caso da Fundação do Zoológico, e
ainda cede, em concessão por 20 anos renováveis, o uso de terrenos
para o zoológico, para o botânico, para a polícia ambiental e para o
hospital psiquiátrico.
Quanto à segunda, o CienTec não tem um programa de pós-gra-
duação próprio, porque ele não é uma unidade de ensino. Os pro-
gramas de pós-graduação são vinculados às unidades de pesquisa, o
que pode ocorrer é que um aluno por exemplo, faça o seu projeto de
mestrado usando o Parque CienTec. ”

Participante Silvia:

“Professor, eu sou Silvia, eu gostaria de saber, já que o planetário


é um dos principais atrativos do parque, se vocês desenvolvem essas
seções de planetário, e como essas seções de planetário se relacio-
nam com o restante da visita. ”

Prof. Fábio:
“O planetário é um ponto nevrálgico nosso, porque ele é a pri-
meira coisa que as pessoas se lembram, em perguntas espontâneas.
Quando fazem uma visita ao planetário, as pessoas adoram, mas o
planetário é um equipamento muito caro e complexo e, infelizmen-
te, tivemos um dano elétrico num projetor e estamos no processo de
repara-lo ou mesmo adquirir um novo modelo.

21
Comentário do Prof. Valter:

“Bom, como foi mencionado duas vezes o que é o CDCC, gosta-


ria de esclarecer que ele não é um órgão da Pró-Reitoria de Cultura e
Extensão (ProCEx), tal qual o CienTec, ou a Estação Ciência, ou ou-
tros, mas temos uma vinculação muito forte com esse órgão, presta-
mos contas a esse órgão. No organograma da USP estamos pendura-
dos diretamente na ProCEx, mas dependemos administrativamente,
por causa da nossa origem, dos Institutos de Física e de Química e
participamos do Conselho de Cultura e Extensão da USP.”

Comentário da Prof. Yvonne:

“Fábio, eu acho que sua palestra foi um estímulo para todos con-
tinuarem até o fim, pois levantou muito interesse e suscitou tantas
perguntas. Agradeço e o parabenizo pela qualidade da sua apresen-
tação, e também por revelar sinceridade de propósitos, que a meu
ver, é a coisa mais importante. Obrigada por ter vindo. ”

Mediadora:

Bom pessoal agora eu vou pedir para as bolsistas que nos auxi-
liam na recepção venham aqui para frente para fazermos o sorteio
dos livros e a seguir teremos uma pausa de 30 minutos para o café.

22
Primeira Mesa Redonda
Pesquisa em Educação Não Formal
Primeira expositora

O Museu Itinerante PONTO UFMG

Profa. Tânia Margarida Lima Costa

Graduada em Matemática pelo


Instituto Cultural Newton Paiva Ferreira,
Mestre em Educação Matemática pela
Universidade Santa Úrsula do Rio de Janeiro
Doutora em Educação Matemática pela PUC de São Paulo.
Diretora geral da Escola de Educação Básica e Profissional da
Universidade Federal de Minas Gerais,
Coordenadora do museu itinerante de Ciência e
Tecnologia da UFMG.

O Museu Itinerante Ponto CP-UFMG é uma estratégia educacio-


nal que tem como missão a disseminação da cultura e do conheci-
mento científico e tecnológico, produzidos nas universidades e cen-
tros de pesquisas. Ele foi concebido para ser itinerante, dinâmico,
e trabalhar de forma interativa em diversas áreas da Ciência e Tec-
nologia (C&T), sempre considerando a realidade da comunidade a
ser visitada. Trata-se de um espaço dedicado a alunos e professores
da Educação Básica, que objetiva promover estímulos a favor do co-
nhecimento, do método científico e da opinião científica, em que a
ciência seja trabalhada como processo em construção, despertan-
do vocações científicas e contribuindo para a formação acadêmica
e profissional de estudantes de graduação participantes do projeto.
23
Figura 1- Museu Itinerante Ponto UFMG

Imagem 2: Museu Itinerante Ponto UFMG na 66ª SBPC/Acre

Desde sua inauguração, em julho de 2012, o Museu Itinerante


Ponto UFMG já participou de vários eventos pelo país e em Belo
Horizonte e já atendeu a aproximadamente 300.000 pessoas, entre
alunos de todas as idades, professores, pesquisadores e comunidade
em geral. Foram visitadas as cidades mineiras, como Ouro Branco,
Uberlândia, Ituiutaba, Teófilo Otoni, Conselheiro Lafaiete, Januária,
Janaúba, Araçuaí, Conceição do Mato Dentro, Montes Claros, Ra-
posos, Ribeirão das Neves, Pirapora, Simonésia, Almenara, São Se-
bastião do Paraíso, além de Pernambuco, São Paulo, Paraná, Bahia,
Rio de Janeiro, Acre e Brasília. Vários eventos foram realizados em
Belo Horizonte.
O Museu é constituído por uma carreta baú especialmente
adaptado para ser um museu de ciência e tecnologia. Seu espaço in-
terior foi adaptado em seis ambientes distintos que abordam temas
de ciência e tecnologia, sendo elas: sala do Útero, sala dos Sentidos,
sala dos Biomas, sala de Projeção 3D, sala do Submarino e sala das
Cidades. Além dessa estrutura, o Museu transporta experimentos e
modelos científicos para montagem de exposições externas, atrações
e oficinas, em um total de aproximadamente 500 m², ele oferece ati-
vidades que utilizam aparatos artísticos tecnológicos nos ambientes
internos do baú, sempre integrando a comunidade escolar, a comu-
nidade universitária e o público geral das cidades visitadas.
24
Um dos grandes desafios é aliar arte, ciência e educação a
fim de implantar salas que ambientadas proporcionem aos visitantes
experiências estéticas e científicas inéditas.
O Museu Ponto tem como proposta visitas mediadas às ex-
posições científicas interativas e interdisciplinares nos municípios.
Em cada localidade selecionada para a instalação da exposição, re-
cebemos por dia em torno de 2.000 visitantes. Em cada viagem, a
exposição permanece na localidade por cinco dias. Assim, o nú-
mero de visitantes previsto corresponde a 10.000 visitantes. Além
da carreta o Museu ainda possui a exposição externa composta de
experimentos que abordam três temáticas: ser vivo, energia e física e
desafios lógicos e matemáticos, além de habilitar as demais funcio-
nalidades da exposição interna. A exposição é interativa, possibili-
tando experiências multissensoriais únicas, através de uma vivência
de experimentação.
A equipe que trabalha conosco é composta por alunos bolsistas
de todos os cursos porque nos interessa um perfil amplo e dinâmi-
co, com autonomia e com uma boa participação em tudo tanto no
trabalho de criação e manutenção como participando das viagens.
Além de eventos e cursos, também é responsável pela produção de
jogos e material de divulgação científica no formato de álbum de
figurinhas. A preocupação em acompanhar as discussões da área e
fazer uma reflexão mais teórica do trabalho desenvolvido no mu-
seu nos motiva a participar de diversos eventos científicos. Desde a
inauguração produziu-se artigos para participação em eventos na-
cionais e internacionais e de divulgação científica, sendo resultado
das inúmeras pesquisas realizadas pela equipe do Museu.

Imagem 3: Alunos durante visitação da exposição externa

Com esses materiais é possível que se tenha uma ampla ideia de


como o museu está preparado para agir em prol da ciência e tecno-
25
logia em diferentes áreas do conhecimento e a real necessidade de
tê-los como auxílio para manuseio.
Implantado pela Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG), o projeto conta com o apoio do Ministério da Ciência,
Tecnologia e Inovação (MCTI), Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), Fundação de Desenvolvimen-
to e Pesquisa (FUNDEP), Medicina Molecular – Faculdade de Medi-
cina da UFMG (INCT) e da Secretaria de Estado de Educação (SEE).
Outros recursos que viabilizam o trabalho do Museu são edi-
tais do MEC, do CNPq, da CAPES, da FAPEMIG e do MCTI em
que concorremos para ofertar cursos, comprar experimentos para
compor a exposição e realizar feiras e outros eventos científicos, nos
quais o Museu está incluído para visitação. Temos também o apoio
de Secretarias e das Prefeituras das cidades visitadas pelo Museu que
arcam com a infraestrutura necessária para a exposição e a alimen-
tação e hospedagem da equipe durante a permanência na cidade.
A UFMG disponibiliza 06 bolsistas do programa de bolsas da
Pró-reitoria de Extensão para compor a equipe do Museu. Também
faz parte da equipe 04 servidores administrativos e a equipe de pro-
fessores do CP.
E esse ano foi ofertada a disciplina da graduação que visa conhe-
cer um pouco da vivência, da experiência num espaço não formal
de aprendizagem. Foram 22 alunos de engenharia, biologia, pedago-
gia, museologia. Esta é a nossa primeira experiência oferecendo uma
disciplina da graduação chamada Formação Transversal na UFMG
que está criando e mudando o modelo na graduação com uma parte
básica. Cada aluno faz seu percurso a partir de um leque de discipli-
nas diferentes entre as quais os alunos fazem a sua escolha.

26
Imagem 4: Aula da Disciplina de Formação Transversal.

A manutenção da pesquisa permitiu que desde a inauguração


produziu-se artigos para participação em eventos nacionais e inter-
nacionais e de divulgação científica, sendo resultado das inúmeras
pesquisas realizadas pela equipe do Museu. Artigos como: Curso de
Educação Científica para alunos da Educação Básica: repensando o
Currículo escolar (II Congresso ibero-americano de humanidades,
ciências e educação); Between fantasy and reality: the conceptions of
antarctica on first years of middle school (pcst – public communica-
tion of science and tecnology); Parcerias museus e escola: uma abor-
dagem CTS na formação de professores ( SBPC – Sociedade Brasi-
leira para o Progresso da Ciência); Contextual Model of Learning in
Science Museums – an experience in Ponto UFMG Itinerant Museum
(International Technology, Education and Development Conferen-
ce) e As Tecnologias Da Informação E Comunicação E A Formação
Docente Em Educação A Distância: Mídias De Armazenamento On-
-Line E Blogs (Congresso Brasileiro Ensino Superior a Distância).
O museu mantém as seguintes plataformas na mídia eletrônica:
Canais do YouTube: Museu Itinerante Ponto - https://www.you-
tube.com/channel/UCvupIFDuCq8bcHwkDqg4g6Q
Site: www.museu.cp.ufmg.br
Facebook: https://www.facebook.com/MuseuItinerantePontoUfmg/
Instagram: @pontoufmg
27
Assim os interessados em nos receber por favor nos contatem por
e-mail no endereço museuufmgponto@gmail.com que teremos o
maior prazer em agendar nossa participação em eventos ou outras
comemorações.

28
Primeira Mesa Redonda
Pesquisa em Educação Não Formal
Segunda expositora

Aprendemos nos Museus?

Alessandra Bizerra

Bacharel e Licenciada em Ciências Biológicas,


Mestre em Ciências Biológicas (Zoologia) e
Doutora em Educação, pela Universidade de São Paulo.

Docente do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo e coor-


denadora do grupo de pesquisa CHOICES (Culture and Historicity in
Out-of-school Innovations for Communication and Education in Science).

Agradeço o convite da Professora Yvonne para participar deste


seminário. Considero bastante importantes esses espaços de diálo-
go. Podermos conversar um pouco sobre pesquisa nessa área é fun-
damental. Quando me refiro à pesquisa, não estou usando o sentido
de uma avaliação de práticas educativas como as que o Fábio e a
Tânia apresentaram tão bem, e aquelas que ainda serão apresentadas
durante o dia hoje. Não é nessa perspectiva. Minha fala aqui sobre
pesquisa remete à ideia de tentarmos encontrar os elementos que
a investigação sobre essas ações educativas podem levantar e como
esses elementos contribuem não somente para as ações analisadas
mas ainda para uma gama de outras ações educativas relacionadas.
Então não abordarei a avaliação de ações educativas isoladas, mas
sim a construção de conhecimento que pode dialogar com as ações
que estamos desenvolvendo em diferentes instituições.

29
Eu sou bióloga de formação, mas em um determinado momento,
no mestado, especificamente quando trabalhei com filogenia e his-
tória natural de serpentes, ensei: ‘Não, tem algo errrado. Eu gosto
de fazer pesquisa, mas não é exatamente esse tipo de pesquisa que
eu quero fazer’. Logo após o mestrado, visitei um museu, junto com
uma prima, em que havia um celacanto. Para quem é biólogo, o cela-
canto é um lindo exemplo para entender a evolução. Eu já havia visto
réplicas de celacantos em outros museus, mas quando me deparei
com um espécime original comecei a chorar em plena exposição.
Minha prima questionou ‘Alê, isso é um peixe, porque você está cho-
rando?’. E eu: ‘não, não é qualquer peixe, é um celacanto! Olha isso
aqui’.
Eu voltei tão impactada com aquela experiência, indagando-
me como esses espaços podem promover interações tão intensas e
diversas. Obviamente, depende do background de cada um. Minha
prima é fisioterapeuta, para ela aquele peixe não fazia sentido ne-
nhum, para mim fazia todo sentido. Pensar nesses espaços como um
local de significação cultural foi revelador. Eu adorava os museus,
mas eu nunca tinha pensado em um museu nessa perspectiva. Então
é desse lugar que eu estou falando com vocês, do lugar de uma pes-
soa que vê os museus pelos bastidores tentando compreender como
se dá construção desse discurso exposto e como que o público inte-
rage com esse recurso.
Falar sobre Educação Não Formal é muito amplo e seria muito
difícil fazer uma fala coerente em tão pouco tempo. Então, vou focar
na área em que trabalho, que são as pesquisas sobre aprendizagem.
Na minha opinião, a aprendizagem em museus é uma moeda políti-
ca muito importante porque somos sempre questionados sobre nos-
sos impactos, sobre o que o museu é capaz de gerar, as ações que a
divulgação científica é capaz de promover. Assim, vou tentar trazer
aqui munição para brigarmos politicamente por esses espaços.
Então, qual é minha proposta hoje? É trazer para vocês algumas
pesquisas, internacionais e nacionais, voltadas para educação, com
foco na aprendizagem. Mas quero trazer as principais questões des-
sas pesquisas e não somente seus resultados. Nós criticamos muito
que a divulgação científica se pauta só na apresentação de resultados
para o público, mas acabamos fazendo o mesmo nas pesquisas em
educação e divulgação científica. Então, quero trazer um pouco do
processo das pesquisas para vocês, das metodologias, das perguntas.
Os resultados são consequência disso. Tudo isso, obviamente, a
30
partir da minha leitura, do meu local de fala.
Um primeiro trabalho que trago é a livre-docência da Martha
Marandino, professora da Faculdade de Educação da USP, em que
ela traça um olhar mais panorâmico na área de educação em mu-
seus e traz perspectivas e dimensões diferentes da pesquisa na área,
adaptadas para esta apresentação. Uma delas é a dimensão socioló-
gica, que inclui os estudos que vão tentar revelar os jogos de poder,
as forças políticas que se manifestam na elaboração dos discursos
expositivos. E quando eu falo em discurso expositivo, estou falando
tanto da ação que o Ponto fez, do dispositivo apresentado no Cien-
Tec, da fala do mediador, da exposição que montamos, da ação edu-
cativa que é específica, por exemplo, de um museu acessível. Esses
são discursos expostos ao público. Em uma dimensão sociológica da
pesquisa em educação em museus, buscamos compreender como
essa construção se dá socialmente.
Para a Martha, há também uma dimensão mais epistemológica
das pesquisas que busca entender como esses conhecimentos são
postos no museu, trabalhando a partir da transposição didática e da
recontextualização. Essa dimensão refere-se a pesquisar, por exemplo,
como vamos trabalhar a física quântica nos museus ou como se dá
a construção do conhecimento sobre expografia. Relaciona-se a
entender a construção de conhecimento dentro desses espaços.
Já em uma dimensão psicológica da pesquisa na área, que é onde
eu trabalho mais, o foco está na análise dos processos de apropriação
e recriação cultural nesses espaços, está na interface entre o discur-
so expositivo e os públicos. Minha linha de pesquisa situa-se nessa
dimensão.
Mas quais são as principais questões de pesquisa nessa dimensão?
Tem uma que é básica, acho que a gente já superou, mas tem muita
gente que ainda não consegue responder: “aprendemos nos museus?”.
Vocês concordam que a gente aprende nos museus? Sim? Muitos de
vocês concordam, mas há numerosas pesquisas afirmando que não
aprendemos nos museus. Se pegarmos pesquisas das décadas de 80,
90, que faziam pré-teste e pós-teste - testa o conhecimento da pessoa
no início, faz a visita, testa no final, era comum o resultado de que
não se aprende nada durante uma visita ao museu. Certamente,
considerar se aprendemos ou não em museus depende de nossa
concepção do que é aprendizagem.
31
Então, precisamos entender qual a perspectiva de aprendizagem
que está sendo considerada nessas pesquisas, em que se conclui que
não ocorre aprendizagem em museus As pesquisas inicias de apren-
dizagem tinham uma proposta muito cognitivista, pautada na ideia
de aprendizagem enquanto produto. Nessa perspectiva, o visitante
participa da atividade, aprende coisas e o produto final poderá ser
medido pelo pesquisador. A aprendizagem é vista como um produto
mensurável.
São comuns, assim, as brincadeiras que vemos sobre aprender em
museus. Há uma piada que diz: ‘então você chega lá, você põe a mão
na esfera, o cabelo arrepia e pronto, aprendeu ciências’. Essa é uma
crítica à ideia de que basta manipular, agir, para aprendermos ciên-
cias. É comum ouvirmos também a crítica de que o visitante passa
15 minutos no museu, clica em um vídeo e não assiste até o final,
mexe em tudo e vai embora. A gente sabe que isso acontece, mas isso
significa que o visitante não aprende? Temos que discutir então o
que é aprendizagem em museus.
Vamos contextualizar essa questão: vocês conhecem os corvos e
as galinhas? Conhecem? Vocês conhecem, gente! Quais as diferenças
evidentes entre um corvo e uma galinha, fora as diferenças morfoló-
gicas? Uma é doméstica, a outra não. Uma é comestível, o outro não.
Em relação aos hábitos, as crenças, como a galinha é vista? A gen-
te fala que ela cisca para trás. Por que falamos que ela cisca para trás?
Porque é considerada “burra”, é comum ouvirmos que a galinha é
burra e o corvo, inteligente. A galinha não consegue resolver tantos
problemas como o corvo consegue. Por que será que essas diferenças
ocorrem?
Em um experimento, que pode ser visto em https://youtu.be/
bXQAgzfwuNQ, feito com uma gralha (parente muito próximo
dos corvos), é oferecido alimento a ela em (um recipiente cilíndri-
co fundo o bastante para que ela não consiga alcançar com o bico.
Entretanto, ela encontra a lado um arame e sabe o que ela faz com o
arame? Ela consegue retirar o alimento moldando o arame em for-
ma de gancho. Ela resolveu um problema com o qual não havia tido
contato até então. Como podemos explicar isso?
Tem gente que vai explicar de forma biológica. O corvo tem uma
maior massa cerebral proporcionalmente à massa corpórea então,

32
biologicamente, ele teria maior capacidade cognitiva. Outras pessoas
vão falar que não é este o ponto central, pois o corvo tem cuidado
parental, são meses em que a mãe e o pai do corvo ficam cuidando
de seus filhotes, diferentemente da galinha.
Então o que eu queria trazer com esse exemplo, enfatizando que
não estou transpondo diretamente para a espécie humana, é que te-
mos formas diferentes de encarar a aprendizagem. Muitos dos traba-
lhos e pesquisas que falam que as pessoas não aprendem nos museus,
em geral veem a aprendizagem como uma perspectiva mais inata,
em que já nascemos com capacidades biológicas que vão permitir
aprendermos mais ou menos. Outras vão defender que nascemos
imersos em uma cultura, e essa cultura interfere no nosso modo de
aprendizagem e naquilo que construímos de conhecimento.
Essa é só uma das questões que diferenciam as teorias de apren-
dizagem, e poderia trazer muitas outras aqui. A aprendizagem é in-
dividual ou social? Aprendemos por acúmulo ou por construção?
Então, dependendo de como eu respondo a essas questões e como
encaro a aprendizagem, vou fazer a minha pesquisa de forma dife-
rente e vou ter resultados diferentes.
A aprendizagem é um processo ou produto? Se eu encaro como
produto eu posso fazer um pré e pós-teste, se eu encaro como pro-
cesso eu tenho que ver o que as pessoas fazem ao longo da vida
delas, ou em um momento da vida delas. Isso remete a formas
diferentes de encarar o processo de aprendizagem dentro dos mu-
seus. E a minha crítica em relação as pesquisas iniciais que fala-
vam que não aprendemos nos museus é que elas estavam em uma
visão mais comportamentalista. Eu não estou desmerecendo o
comportamentalismo, mas questiono a conclusão de que não se
aprende pautando-se somente em uma abordagem do que é aprender
dentro dos museus. A partir do momento em que estabelecemos ou-
tras formas de fazer pesquisa, temos outras compreensões de apren-
dizagem em museus.
Além da concepção de aprendizagem, encontramos diferenças
nas metodologias de pesquisa. Há pesquisas, por exemplo, que se
utilizam de surveys, são pesquisas mais horizontais, mais quantita-
tivas, que vão analisar uma grande amostra. Há também pesquisas
mais verticais, geralmente qualitativas. Vou trazer aqui alguns exem-
plos dessas duas possibilidades.
33
Um exemplo de survey horizontal que considero importante é
uma pesquisa de percepção pública sobre hábitos culturais dos pau-
listas, que o Instituto Datafolha fez junto com Joao Leiva, em que
investigam o engajamento das pessoas para irem às instituições mu-
seais, entre outros aparatos culturais (relato de pesquisa disponível
em http://www.pesquisasp.com.br/ .
Nesse survey, foram entrevistadas cerca de 8 mil pessoas no esta-
do de São Paulo, numa proporção representativa dos dados censitá-
rios do IBGE, considerando gênero, etnias, idade, residência, entre
outros dados. Uma das perguntas se referia a que o entrevistado faz
nas suas horas livres. Nesta nuvem de palavras que representa as res-
postas dos entrevistados, não é possível visualizar os museus.
Quando a pessoa espontaneamente é chamada para falar o que
ela faz em seu tempo livre, ela não coloca os museus como uma pos-
sibilidade de lazer. Mas quando é perguntado sobre o interesse que
as pessoas têm por museus, o quadro é diferente. Se considerarmos
quem tem médio ou grande interesse, vemos que os museus tem
uma porcentagem grande de interessados e ganha de outras ativida-
des culturais.
Vemos que há um público frequentador e também um potencial
para participar desses espaços. Mas entre os frequentadores, vemos
que ainda é um público bastante elitizado, com nível superior com-
pleto, classes A e B. Agora, é o fator econômico que leva a pessoa ao
museu? Não, não é.
Se olharmos para a visitação, em função da renda e da escolarida-
de, veremos que quem é considerado como classe C e tem ensino su-
perior vai mais a teatros e museus do que quem pertence às classes A
e B, com Ensino Médio. Então, a escolarização é bastante importante
para levar as pessoas a esses espaços.
E aqui, trazendo o que a Gislaine tinha perguntado sobre aque-
la pesquisa do não-público, trago uma outra pesquisa quantitativa
que inclui o CDCC. Quando mandamos, pelo Parque CienTec, um
survey para mais de 100 mil pessoas pertencentes à comunidade
USP (alunos, funcionários e docentes), recebemos 4.500 respostas.
Desses, 8,3% já conhecem o CDCC. Vemos que a Estação Ciência é
bastante conhecida pela comunidade uspiana, um grande número
de pessoas frequentava esse espaço intensamente. Mas, perto do

34
público que poderia visitar órgãos e museus da USP, o número de
visitantes ainda é reduzido.
Como já falei, temos também as pesquisas que possuem uma
perspectiva de profundidade. Não estou falando que elas são melho-
res por serem mais profundas, mas que são mais verticais e buscam
compreender os fenômenos com mais densidade. Investigam um
público menor e analisam com maior detalhamento. E aí eu trago
outra concepção de percepção, que não é a mesma dos grandes sur-
veys, porque os surveys que o MCTI faz sobre percepção pública da
ciência referem-se a opiniões que os visitantes manifestam sobre os
museus e centros de ciências. Abro aqui um parêntesis: quando falo
em museus de ciências, eu estou considerando uma definição que
o ICOM já utilizou, de qualquer instituição sem fins lucrativos que
tem patrimônio natural, arqueológico, histórico, arquitetônico. Essa
definição inclui zoológicos, science centers, jardins botânicos, unida-
des de conservação... Minha visão de museu é, portanto, bem ampla.
Quero discutir percepção e concepção a partir dessa imagem
(peixe em um aquário sendo observado por uma criança e um gato).
Ela nos ajuda a pensar em relação a como percebemos e podemos
ter compreensões diferentes a partir de um mesmo objeto, nos faz
lembrar que temos um público muito diverso, e o objeto que a gente
coloca em exposição vai ser interpretado de formas diferentes por
esses públicos.
É desse tipo de percepção que eu estou falando. Dependendo
das características desse público, da formação dele, do que ele já
sabe, ele vai dar um significado diferente ao que percebe do objeto.
A gente fala ‘como vamos trabalhar então com essa complexidade
toda?’. É complexo? É complexo. E para a pesquisa então! Imagine
abarcarmos toda essa complexidade. Hoje, vêm crescendo as pesqui-
sas com mega-dados que tem outras perspectivas e que vão tentar
trazer essa complexidade para o estudo.
Um exemplo, que talvez seja até mais horizontal, é o trabalho que
Falk (autor de Learning from Museums: visitor experiences and the
making of meaning, John H Falk and Lynn D Dierking) fez nos
Estados Unidos, em que ele queria ver qual é o papel de uma ex-
posição específica, de um módulo específico de um museu de Los
Angeles. Ele fez, antes da exposição ser implantada, uma pesquisa
de percepção sobre homeostase. Ele perguntou para uma amostra
35
da população de Los Angeles se sabiam o que era homeostase ‘vocês
sabem o que é homeostase?’, ‘quem poderia definir homeostase?’.
Nesta pesquisa, foi escolhido o termo homeostase para análise,
já que correspondia a um termo raramente abordado na divulga-
ção científica em geral. Na coleta de dados inicial, 7% das pessoas
sabiam definir homeostase. Depois de 4 anos dessa exposição imple-
mentada, 20% da população de Los Angeles conseguia definir ho-
meostase. Essa é uma evidência indireta de que a exposição do mu-
seu, frequentada recorrentemente por moradores da cidade, pode
influenciar a aprendizagem conceitual de seus visitantes.
Eu trago também as ideias do Vigotski, principalmente a de que
os significados não estão prontos, mas que damos significado para
as coisas em interação social, como a imagem de um peixe. É im-
portante lembrarmos que, para Vigostki, peixe tem um significado
compartilhado continuamente construído socialmente, este é rela-
tivamente estável. Já o sentido que atribuímos a ele tem um cará-
ter mais instável, e pode variar dependendo das interações de um
sujeito em grupo em um dado momento. Vigotski nos ainda apre-
senta uma ideia bastante interessante, quando afirma que a espécie
humana tem uma característica básica que é conseguir integrar o
pensamento e a linguagem. Quando integramos o pensamento com
a linguagem, temos o significado da palavra. E os museus têm um
papel bastante importante nisso, eu vou mostrar para vocês em quê.
Para ilustrar, apresento uma pesquisa do Deb Roy, do MIT, em
que gravou o filho dele recém nascido em sua própria casa. Ele colo-
cou uma câmera em cada cômodo da residência, coletando as falas
que a criança fazia ao longo dos primeiros anos de vida. Vou apre-
sentar uma descrição do trecho do vídeo que ele produziu:
[...]And with that, let me take you now for a first tour into the data.
So you’ve all, I’m sure, seen time-lapse videos where a flower will blos-
som as you accelerate time. I’d like you to now experience the blosso-
ming of a speech form. My son, soon after his first birthday, would say
“gaga” to mean water. And over the course of the next half-year, he
slowly learned to approximate the proper adult form, “water.” So we’re
going to cruise through half a year in about 40 seconds. No video here,
so you can focus on the sound, the acoustics, of a new kind of trajec-
tory: gaga to water.

36
[Audio Bebê:] Gagagagagaga Gaga gaga gaga guga guga guga
wada gaga gaga guga gaga wader guga guga water water water water
water water water water water.
He sure nailed it, didn’t he?
O vídeo completo está em: https://www.ted.com/talks/deb_roy_
the_birth_of_a_word?language=pt-br&utm_campaign=tedspread-
--a&utm_medium=referral&utm_source=tedcomshare).
Ele fez isso com as 533 termos em que conseguiu localizar o nas-
cimento da palavra, nesses dois anos. Esse é um gráfico do que acon-
tece quando essas palavras nascem. Olha que interessante, no eixo y,
temos a complexidade da fala do adulto, a mãe, o pai e a babá, e aqui,
no eixo x, o tempo de nascimento da palavras. O que podemos inter-
pretar? Que simplificamos a nossa linguagem até a criança conseguir
se apropriar daquele termo e depois a complexificamos novamente.
Isso é o que fazemos enquanto espécie humana, e como esta-
mos fazendo isso em relação à Educação e à Divulgação? Temos
o discurso de que a divulgação científica tem que simplificar as
ciências para o público, mas como ficaria a parte de complexificar?
Um movimento como esse pode ajudar, como no caso do filho de
Deb Roy, em que as palavras nascem a partir da interação entre a
criança e os adultos responsáveis com o ambiente em que vivem, a
desenvolver o processo de internalização e externalização.
Talvez essa ideia esteja relacionada ao que Vigotski afirmava
sobre a reprodução da cultura. Aprender não é só adquirir, é tam-
bém expressar. Para o pesquisador bielorrusso, aprender possui um
momento de internalização da cultura, mas também um momento
de externalização, em que a cultura é re-criada. Em um processo
de aprendizagem, a gente adquire e se expressa. Se montamos uma
exposição, por exemplo, que em um momento o visitante possa
articular um conceito e no segundo momento tenha um novo contato
com esse mesmo conceito e que ele possa também se expressar, em
outro contexto, essa talvez seja uma ferramenta que possamos criar
para facilitar que o visitante faça a transferência de um contexto para
o outro. Nessa perspectiva, esse movimento de internalizar e exter-
nalizar corresponde à aprendizagem.
Compreender, então, como as pessoas podem aprender nos
museus foi minha maior inquietação em meu doutorado. Entre as
possibilidades teóricas para estudar a aprendizagem, pautei-me em
referências da perspectiva histórico-cultural.
37
Resolvi me aprofundar na Teoria da Atividade, desenvolvida por
teóricos como Davidov e Leontiev, que analisei em minha tese dis-
ponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/
tde-15092009-132843/pt-br.php) que navegam por águas vigotskia-
nas, e bastante aceita como um referencial da aprendizagem es-
colar. Segundo essa teoria, há uma diferença entre Aprendizagem
e Atividade de Aprendizagem. No primeiro caso, a aprendizagem
ocorre dentro de nossas Atividades, como um epifenômeno, como
uma consequência. Aprendemos ao brincar, trabalhar, ao jogar…
No segundo caso, estamos em Atividade de Aprendizagem quando
realmente nos engajamos em aprender, quando temos a intenção de
aprender. Nesse processo, partimos do nível empírico de observa-
ção, do concreto sentido, de tocar, manusear, cheirar e começamos a
fazer abstrações e a traçar um novo concreto, agora o concreto pen-
sado, um conceito ou uma prática construídos a partir da realidade.
Foi o que Davidov chamou de ascenção do abstrato ao concreto.
Será que esse processo acontece nos museus? Essa era minha
principal pergunta de Doutorado. Então eu usei as ideias do Enges-
tröm, que desenvolve esse ciclo de ascensão do abstrato ao concreto,
com etapas detalhadas. Gravei 15 famílias interagindo no Museu
Biológico do Instituto Butantan e conseguimos perceber ciclos de
aprendizagem expansivas ocorrendo nos tempos curtos de uma visi-
ta museal. (BIZERRA, A. F. Atividade de Aprendizagem em Museus
de Ciências. Doutorado em Educação. 274p. Faculdade de Educa-
ção/USP. 2009. Disponível em http://www.teses.usp.br/teses/dispo-
niveis/48/48134/tde-15092009-132843/pt-br.php
Uma família que tinha, por exemplo, uma forma de identificar
serpentes, uma prática social de identificar serpentes, construiu um
novo modelo de identificação que foi testado ao final da exposição.
A gente consegue ver isso em 40 minutos de visitação.
Então, sim, nós aprendemos nos museus mesmo na perspectiva
da Teoria da Atividade. Sempre? Não... Como também não acontece
na escola. Agora, o que eu acho que é o diferencial dos museus? Em
geral, as pessoas querem ir para o museu para se divertir, e também
para aprender, e nesses espaços, temos boas alternativas para não
separarmos os aspectos cognitivos e afetivos da aprendizagem.
As pessoas se divertem e aprendem ao mesmo tempo. E o afetivo
é fundamental para a aprendizagem. Nosso desafio, aqui, é organizar
uma exposição que, ao mesmo tempo, seja lúdica, divertida e inte-
ressante, mas que permita às pessoas terem níveis de abstrações dife-

38
rentes, caso elas queiram. Sem dúvida, as pessoas podem não querer
se engajar em uma Atividade de Aprendizagem, mas temos que dar
a possibilidade de o visitante fazer isso, caso queira.
Para finalizar, lembro que, para além da Teoria da Atividade,
muitas outras teorias de aprendizagem, incluindo os modelos ori-
ginados a partir dos espaços museais, nos ajudam a compreender
como aprendemos nesses espaços. Esse entendimento é crucial para
pensarmos na interação entre públicos e museus.
Tentei mostrar que pesquisas e práticas em educação museal já
resolveram questões como “se aprendemos” e “como aprendemos”
nos museus, mas ainda nos resta o desafio de organizarmos uma
práxis educativa que realmente otimize o processo de aprendizagem
nesses espaços. Penso que, a partir desse aporte teórico e de nossas
experiências, podemos pensar em novas formas de organizar expo-
sições e promover novas relações com os diversos públicos.

Moderadora:

“Nós agradecemos a Alessandra. Vamos abrir para duas pergun-


tas, comentários...”

Participante Gabriela:

“Na verdade, é um pedido, eu gostaria que a professora disponi-


bilizasse os slides para a gente, porque eu achei bastante interessante
essa perspectiva que você traz do Vygotsky, com essas questões me-
nos relacionadas a uma apreciação quantitativa e mais qualitativa,
nesse sentido de transformação da sociedade, e esse é um instru-
mento que pode fazer isso, então achei muito interessante. Eu fiquei
muito frustrada porque foi muito rápido, mas assim, se puder dispo-
nibilizar. E parabéns porque a pesquisa está maravilhosa. ”

Profa. Alessandra:

“Gabriela, agradeço as palavras carinhosas, fico muito feliz que a


gente tenha tido um diálogo bacana. E eu disponibilizo, claramente.
Só não queria deixar em tese que as pesquisas quali são mais im-
portantes que as quanti, acho que estamos até no momento funda-
mental de fazermos pesquisas mistas, que incluamos uma perspec-
tiva quanti e uma perspectiva quali, porque acho que as duas visões
trazem elementos importantíssimos para pensarmos sobre as nossas
ações. Desculpa se eu deixei essa imagem que a quali é mais impor-
39
tante, eu gosto mais, mas eu não acho que ela é mais importante,
acho que ela tem um peso tão importante quanto a quanti. Mas mui-
to obrigada pelas palavras. ”

Moderadora:

“Mais uma pergunta...”

Participante Monalisa:

“Eu sou professora, e eu queria saber se vocês já pensaram em


fazer uma pesquisa em como convencer nossos colegas de que o es-
paço não formal pode ensinar tudo e não apenas a matéria especifica
dele? ”

Profa. Alessandra:

“Uma cosia que eu queria falar, a gente não é um complemento da


escola, essa visão de que o museu é complemento da escola precisa
acabar. Nós não somos complemento, nós temos nossa personalida-
de, temos propostas pedagógicas que são próprias dos museus. Nós
somos parceiros da escola.
Eu estou lembrando aqui que o público escolar é metade do nosso
público, ele é fundamental, mas a gente é parceiro. Um ponto que es-
tamos conversando agora, estamos desenvolvendo um projeto a ser
submetido ao CNPq, mas que dificilmente vai ser aprovado - para
pensarmos em espaços de articulação entre a universidade, os es-
paços não formais e a escola. Que sejam espaços de criação, que as
pessoas coloquem a mão na massa, desenvolvam seus projetos e que
isso seja articulado em rede no estilo dos formulários.
O ponto central, que o Fábio falou ‘como a gente vai estimular o
professor para ir? ’, mas tem professor interessado, é com esses que
começamos, tem muito professor engajado. Temos uma rede de con-
tatos e podemos começar por aí, com aqueles que já vão normal-
mente a essas instituições.
E aí é um convencimento Monalisa, que não é só da escola, é da
academia, é do próprio museu. Mostrar que a nossa atividade não
é menor, de que o tripé não é manco, mas se ele é manco agora, te-
mos que colocar politicamente que não é manco e que não deve ser
manco. ”

40
Profa. Tânia:

“Nós da UFMG vamos fazer essa pesquisa entre as instituições,


porque as políticas públicas têm que valorizar, reconhecer e favore-
cer as condições para que os professores comecem a perceber esses
espaços como um espaço de uso, de apropriação mesmo. ”

Moderadora:

“Última pergunta...”

Participante não identificado:

“Tânia, na sua fala você disse que um museu não quer ser só um
evento na cidade, e eu queria saber o que vocês fazem para isso acon-
tecer. ”

Profa. Tânia:

“É difícil. Para tentar fazer essa aproximação ser mais efetiva, a


primeira é que quando planejamos a visita, já informamos através
de um flyer que os alunos e professores podem fazer o curso de edu-
cação cientifica a distância. Abrimos inscrição depois que passa a
visita e oferecemos duas vezes por ano um curso de três meses, é
uma ação.
A outra é que antes de chegar à cidade, fazemos um curso de me-
diadores para as pessoas da cidade trabalharem no museu durante
aquela semana. Geralmente são alunos da graduação, professores,
pessoal que trabalha na secretaria. Já vimos, é superinteressante, as
pessoas chegarem e falarem ‘nossa, mas você está aqui’, então come-
çam a achar que aquele espaço é deles também, é da cidade. Procu-
ramos trazer algumas pessoas que são ícones da cidade para estarem
junto conosco.

Moderadora:

Nós agradecemos mais uma vez a participação das professoras


Alessandra e Tânia, e disponibilizaremos o contato delas a quem
precisar se nos mandarem uma mensagem usando o endereço agen-
ciacienciaweb@gmail.com.
Muito obrigada e até depois do almoço.

41
42
Segunda Palestra
Catavento Cultural

Gabriel Giannini Furruel

Licenciado em física pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnolo-


gia de São Paulo, IFSP campus São Paulo.
Educador responsável pelas áreas de Astronomia, o Universo, e Físi-
ca, o Engenho assim como responsável pela equipe de manutenção do
setor educativo e pelas ações extramuros do Catavento Cultural.

“Boa tarde! Eu vou falar sobre o museu Catavento, como traba-


lhamos lá, como pensamos o nosso espaço para poder receber os
diversos públicos, e quais são esses públicos; como são os nossos
experimentos e o que precisamos fazer para manter tudo atualizado.
Essa aqui é uma foto da frente do prédio. O prédio é o Palácio das
Indústrias, vamos ver um pouco da sua história em breve.
E o que é o Catavento? O Catavento Cultural Educacional na ver-
dade é uma Organização Social de Cultura que cuida de duas fren-
tes: o Museu Catavento e as Fábricas de Cultura.
As Fábricas de Cultura são espaços criados para levar cultura às
periferias na cidade de São Paulo. Nós cuidamos de 5, ficam na Zona
Leste. Mas, nessa apresentação vamos nos restringir ao Museu Ca-
tavento. Para operar o museu temos um contrato com a Secretaria
de Cultura do Estado de São Paulo, e aqui temos a nossa missão, a
missão do museu.

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Então, vamos agora falar um pouco do prédio, o Palácio das In-
dústrias. Ele foi inaugurado em 1924, levando cerca de 20 anos para
ser construído, até porque a arquitetura vivia outro momento, não
tão evoluído quanto hoje, bem como a engenharia civil, então se le-
vou um bom tempo para chegar ao término do prédio. A foto mostra
como foi a exposição de automobilismo em 1924.
O prédio ficou vários anos recebendo exposições daquela indús-
tria que começava a crescer na cidade de São Paulo, sendo que ele
foi financiado principalmente pelos barões do café, que na época es-
tavam em declínio, enquanto a indústria começava a emergir; dessa
maneira e nesse cenário nasceu o prédio que hoje abriga o Cataven-
to.
Esse prédio já foi Prefeitura de São Paulo, também já recebeu
ocupação por parte da polícia, já foi sede da Polícia Civil durante
muitos anos e já recebeu uma série de exposições, uma história bas-
tante rica.
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Nessa foto temos a visão aérea do prédio estamos muito próximo
ao Mercado Municipal, a zona cerealista e ao Parque Dom Pedro; o
bairro é o Parque Dom Pedro. A localização nos favorece bastante,
pois estamos em uma região muito central de São Paulo, então o
acesso do público é fácil, tem metrô perto e passam muitos ônibus
na região.

45
Nesses 7 anos de vida do Catavento a gente tem sido bastante vi-
sitado. O Museu foi inaugurado em 2009, sendo que em outubro
desse ano (2016) chegamos a 3.370.000 visitantes. Essas pessoas são
visitantes espontâneos, visitantes de grupos agendados de escolas,
de ONGs, de tudo quanto é tipo. E isso não foi só de uma vez, a
gente tem a seguir um gráfico de como foi essa visitação, de 2009 até
setembro de 2016, quando tivemos a última atualização. Em azul a
gente tem o público agendado, em laranja os públicos espontâneos.

O público agendado já teve vários períodos no Catavento. Os dois


primeiros anos foram mais fracos, a gente não tinha uma política
no governo de incentivo a visita ao museu. Aí criou-se o FDE, por
parte da Secretaria de Educação, que infelizmente depois foi extinto,
e hoje as escolas tem que procurar como ir ao Catavento. Antes a
gente tinha um pouco mais de facilidade, nós mesmos podíamos ir
atrás das escolas, tínhamos como fazer isso, porém, hoje em dia a
dinâmica é outra.
Isso mostra que nos últimos anos nosso público agendado decli-
nou, porém, o público espontâneo - até porque o museu é mais co-
nhecido hoje em dia - ele cresce cada vez mais, então cada vez mais
recebemos o público espontâneo.
Consideramos público espontâneo todo tipo pessoa que acorda
de manhã e vai ao museu porque quer, sozinha, ou com a família, sei
lá, por ‘N’ motivos. Essencialmente o público espontâneo são aque-
las pessoas que não vão ao museu com um grupo agendado, é basi-
camente assim que a gente define, e a gente tem o gráfico anterior
que mostra como tem sido isso.

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Nos meses de janeiro e julho (férias escolares) temos um boom
de visitação, em geral de público espontâneo. Em julho desse ano
(2016) recebemos 94.249 pessoas, visitantes espontâneos, nesses
meses praticamente não temos agendamento, e o museu fica bem
cheio. Os grupos agendados são bem fortes nos períodos escolares.
E o que é o Catavento? A gente poderia definir de várias formas. É
um museu de ciência, é um museu ligado à tecnologia, é um espaço
de educação não formal, temos várias definições.
Eu trabalho no Catavento há vários anos. Eu comecei lá como
monitor, eu era estagiário da área de física, do Engenho - daqui a
pouco a gente vai ver o que é o Engenho -, mas basicamente o que
nós tentamos é trazer para o público um espaço dinâmico que pro-
picie outras experiências que vão além da sala de aula. Em sala de
aula a gente consegue garantir uma série de coisas, a gente consegue
garantir uma série de experiências, mas o museu tenta trazer essas
outras experiências que a sala de aula não vai conseguir garantir.
Obviamente que não vamos complementar a escola. O cara que
não for ao Catavento vai deixar de viver, não vai se formar como um
cidadão tão bem quanto o outro? Não, na verdade a gente quer que
quem vá lá possa aproveitar e ter experiências únicas. Como essa da
foto de uma monitoria no estúdio, por exemplo, com o monitor e o
visitante.
Eu sou educador atualmente no museu. Eu cuido, entre outras
coisas, de exposições externas, mostras itinerantes, manutenções do
educativo, que são manutenções nas instalações, ou seja, cuidamos
para que esses equipamentos se mantenham e sejam preservados,
mas não iremos entrar nesse mérito agora, vamos focar na parte
educativa.
Enquanto educador, qual é o meu trabalho? Eu tenho que garantir
que os meus monitores estejam atualizados em termos de conteúdo.
Mas não só em termos de conteúdo, também em termos de lingua-
gem, temos que garantir que a linguagem seja acessível ao público,
que é uma dificuldade grande. Porque se pensarmos que temos inú-
meros tipos de público, como garantir que esse monitor consiga ter
uma linguagem acessível a todos esses públicos? É uma das maiores
dificuldades que temos no dia a dia, conseguir trabalhar isso com os
monitores para que eles tenham uma linguagem acessível a todos os
públicos.

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Outro ponto é a necessidade de atualizar nossos equipamen-
tos, porque enquanto o grupo agendado está no museu, podemos
receber esse grupo e o monitor irá guia-los por essa visita. Só que
quando recebemos o público espontâneo, que é de outra natureza, e
por exemplo às vezes temos 5 mil pessoas em um dia, não teremos
quantidade suficiente de monitores para atender todas essas pessoas
e muitas vezes essas pessoas não querem ser atendidas, elas querem
ficar livres para poder visitar o museu tranquilamente.
Por conta disso o espaço também deve ser interativo, com uma
linguagem que garanta que pessoas leigas nos assuntos científicos
entendam o que queremos passar para elas. Se tivermos uma expe-
riência de física, por exemplo, temos que garantir a instalação de
física se traduza a todos os públicos, desde o técnico, uma pessoa
formada em física, um engenheiro que teve muito contato com físi-
ca, até uma pessoa que não frequentou uma escola e simplesmente
nunca viu nada parecido com aquilo. Isso é parte do meu trabalho
também.
A estrutura museológica do Catavento, como que ela é?
Temos basicamente quatro grandes áreas: o Universo, a Vida, o
Engenho e a Sociedade.
A estrutura está ligada a história cronológica do universo. Então
primeiro era o nada, aí o Big Bang...

48
O Universo surge, depois a Vida, o Engenho seria, na verdade o
desenvolvimento das engenhocas humanas, as máquinas que a cons-
truímos para o nosso dia a dia, e a Sociedade na verdade, representa
o desenvolvimento dessas relações sociais.
Aqui eu vou trazer um pouquinho para vocês de cada uma das se-
ções. Eu preparei essa palestra imaginando que tenham pessoas aqui
que nunca foram ao Catavento, então é também para vocês entende-
rem o que é o Catavento. O Catavento não é só um prédio maravilho-
so de 100 anos, e também não é só um museu de ciência e tecnologia
dos sonhos, e o que ele tem dentro dele?
Cada uma das 04 grandes áreas é subdividida em seções.
Essa aqui é a primeira seção do Universo, a Astronomia, e na se-
ção da Astronomia temos mais de uma sala. Essa aqui, por exemplo,
é a sala do Sol.

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Temos um asteroide e aí aparece um monitor fazendo atendi-
mento a um grupo, por exemplo, nessa dinâmica o monitor senta
os alunos. Em cima, no teto, replicou-se o céu estrelado da noite da
inauguração do Museu e os visitantes são convidados, junto a esse
monitor, a observar o céu e falar um pouco sobre as constelações,
estrelas e tudo o que está ali naquele teto. Apesar de a gente viver em
São Paulo, que é um local péssimo para observações astronômicas
devido a ‘N’ fatores de poluição de todos de todos os tipos tentamos
aproximar os visitantes da observação astronômica. Isso é um pou-
quinho da seção da Astronomia.
Essa é a seção Terra, dentro da grande seção Universo. A seção
Terra vai falar um pouco do desenvolvimento do nosso planeta.
O Universo nasceu ali no Big Bang, uma grande explosão, se ex-
pandiu, e num dado momento dessa expansão nasceu nosso planeta,
e esse planeta segue uma série de lógicas para estar como está hoje, e
é o que exploramos nessa seção.
Falamos um pouco do núcleo, as lógicas da movimentação de
magma, a crosta, formação de rochas. E aqui temos um equipamen-
to chamado Sandbox (caixa de areia). O Sandbox na verdade é um
equipamento que permite a você formar picos de areia que são tra-
duzidos em curvas de nível 3D em uma TV. Dá para fazer inclusive
chover.

50
Essa outra seção é a Nave, ela foi uma das últimas inauguradas e
não é exclusividade do Catavento, existe uma também no CienTec.
Percebemos, ao longo do tempo, que o Museu precisaria se adequar
um pouco mais às tecnologias. O nosso público estava pedindo isso,
vimos que fazia falta, nos últimos anos tivemos grandes avanços na
área de tecnologia, chega a ser quase assustador, portanto, tivemos
que nos adequar.

Essa seção, na verdade, convida o visitante a entrar em uma sala e


nessa sala os visitantes farão uma viagem ao espaço, eles vão visitar
o Hubble, visitar a Estação Espacial Internacional, ver outros plane-
tas e até passar pela Lua. Tudo isso para mostrar como seria sair da
Terra; quais os problemas e quais as dificuldades. Nossos visitantes
vivem um dia de manutencistas e vivenciam como que é manter um
telescópio ou uma estação em órbita fora do nosso planeta.
Saindo da grande seção Universo, temos a seção da Vida. A gran-
de seção Vida, tem uma seção que chama Vida também, cuidado
para não se confundirem.

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Essa é a seção Vida e ela vai falar um pouco do desenvolvimen-
to do ser humano, mas não só o ser humano. Vai falar também do
desenvolvimento dos outros animais. Aqui, por exemplo, temos um
Albatroz, que é um pássaro maravilhoso, ele fica muitos meses no ar
sem pousar, e aqui ele estaria copulando com a fêmea. Temos tam-
bém um Tigre Dente de Sabre um pouco mais ao afundo, que é um
animal que viveu na mesma época da Preguiça Gigante e do Tatu
Gigante, durante o período que chamamos de Mega fauna, então,
nesse espaço exploramos um pouco de tudo isso e falamos também
sobre Darwin e sua teoria da evolução.
Temos outra seção também voltada à imersão tecnológica que é
o Submarino. O Submarino possui a mesma dinâmica da Nave, po-
rém, a viagem dos visitantes é ao fundo do mar. O submarino viaja
ao fundo do mar, a fundo mesmo, ao ponto de chegar a Fossas das
Marianas que é o lugar mais fundo do planeta conhecido até hoje. A
ideia é que esses visitantes sejam cientistas que vão pesquisar e des-
cobrir os segredos do fundo do mar, quais bichos vivem ali, até que
ponto podem ter seres vivos ou não, o que propícia a vida ou o que
não propicia nesse ambiente inóspito.

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E aqui temos a Seção do Macaco ao Homem, que é uma seção
sobre evolução que também abrimos recentemente. Ela foi desenvol-
vida em paralelo com a USP.

E para terminar a grande seção Vida, temos o Borboletário, onde


algumas borboletas se desenvolvem o que é extremamente difícil,
sendo que borboletas só são encontradas em locais que tenham uma
fauna e flora muito bem reguladas. Não foi simplesmente um pro-
cesso de fechar um espaço e colocar as borboletas, na verdade, se
você fizer isso elas vão morrer em poucos dias. O Borboletário foi a
53
última seção a ser inaugurada inclusive.

Passamos então para a grande seção “Engenho” que, inclusive


dentro dela, tem uma seção também chamada Engenho. Apesar
desse nome essa é a parte que fala da física, inclusive tem algumas
instalações parecidas com o que a gente tem aqui na sala da frente.
Falamos das diversas áreas da física como: mecânica, eletromagne-
tismo, óptica, som e por aí vai.
Observamos na imagem da direita abaixo o público espontâneo
de um dia de final de semana bem cheio na Seção do Engenho.

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E a esquerda, na parte superior observamos o Van der Graaf, que
é um equipamento que arrepia os cabelos, super sensação do museu,
de qualquer museu de ciência na verdade, ele é muito conhecido, o
pessoal já chega perguntando dele, ele é meio que um astro. Não que
a gente queira isso, mas ele se tornou isso, foi meio natural. No caso
vemos o atendimento a um grupo agendado.

Em seguida, a Sala Lego, onde trabalhamos com uma linha da


Lego, que é uma linha ligada a robótica, que inclusive algumas es-
colas já estão trabalhando em sala de aula. Na seção não realizamos
apenas a montagem do robozinho, os visitantes também conseguem
programar esse robozinho e fazer com que ele execute uma série de
ações. Isso é muito bacana porque conseguimos dar os primeiros
passos em direção ao ensino de robótica, que não estão em todas as
escolas, na verdade pouquíssimas escolas têm isso hoje em dia.

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Temos agora a nossa última grande Seção, a Sociedade, que co-
meça com uma foto da Ecologia; para quem não sabe isso aqui é
um grande Terrário. O Terrário está em bastante foco hoje em dia, a
gente vê ele bastante, em vários lugares por aí na internet. As pessoas
descobriram que dá para fazer Terrários para enfeitar a casa e que
ficam lindos. O Terrário é um sistema fechado, além de bonito faz
você se indagar como isso funciona? Um recipiente fechado poder
ter vida? A montagem dele é bem simples, colocamos terra, pedras
e areia para simular nosso o solo, aí basta plantar, borrifar água e
deixar oxigênio. Você fecha e ele se mantém lá por muito tempo. O
nosso tem 2 metros de altura, o pessoal fica maravilhado.

Essa é a seção Jogos do Poder, e essa é a escalada, as pessoas são


convidadas a escalar e conhecer os grandes cientistas que estão nes-
sas telas, quando você alcança algum deles, você toca na tela e o
grande cientista fala com você, conta um pouco de sua história.
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Temos nessa sala, a instalação “Política” onde se realizam debates
sobre questões polêmicas. Por exemplo, se começarmos a falar de
aborto, surgirão opiniões divergentes, então a ideia desse espaço é
propiciar essas discussões e mostrar quais os pontos a favor e contra
o tema, sem induzir ‘escolham isso’, mas esclarecer o cenário.
Em seguida a seção Nanotecnologia que foi criada em parceria com o
pessoal da Unicamp, para falar sobre nanotecnologia, como o nome
já diz, que inclusive é uma área da ciência bem recente também, in-
clusive o prêmio Nobel de química desse ano.

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O Laboratório de química é de fato laboratório onde realizamos
alguns experimentos. Como por exemplo uma bomba de hidrogênio
que explode e faz um barulhão, é bem bacana.

Aqui observamos a seção Alertas: Conhecer para prevenir, nesse


espaço é discutido sobre o uso de drogas principalmente na adoles-
cência. Quais os problemas que o tabaco, o álcool e outras drogas
podem oferecer ao seu corpo, e como o seu corpo irá reagir a essas
drogas. Não é simplesmente ‘não use droga porque não é pra usar’,
mas a visão ligada a ciência sobre a relação do corpo e a droga.

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Em seguido, o Estúdio de TV, que é uma sala de chroma key verde
basicamente e nele onde um telejornal ou então algum outro pro-
grama, e depois editamos e passamos para os visitantes entenderem
como funciona um Estúdio de TV e todo o processo de gravação.

Então isso foi basicamente uma pincelada, de como é nosso Mu-


seu, onde estamos instalados, quais as nossas seções, qual é a estru-
tura museológica e como pensamos a montagem desse espaço.
Qual seria o sentido de ter um espaço tão bacana se não conse-
guíssemos aproveitar tudo dele? Para recebermos as escolas temos
que estar preparados. Não é simplesmente as escolas chegarem, des-
cerem do ônibus, fazerem uma visita e irem embora, não teria lógi-
ca, até mesmo, pois, nem sempre o professor conhece totalmente o
espaço. Muitas vezes o professor de física vai e olha a sala de física,
ou então professor de química que vai lá antes e conhece a parte de
59
química, mas eles não conhecem o resto, e a visita não se restringe
apenas a uma área. Assim, se um deles passar, por exemplo, pela As-
tronomia, como ele vai fazer essa visita sem ser guiado? É também
muito complicado manter o grupo organizado dentro do espaço, as
crianças e adolescentes gostam de parar em todos os espaços, mas
conforme os monitores vão trabalhando e acompanhando o dia-a-
-dia, eles obtêm a prática.
Nossos monitores são estagiários de formação em geral de li-
cenciatura, e eles sentem bastante essa dificuldade, principalmente
quando começam a trabalhar no museu. Porque trabalhar em uma
sala de aula, por vezes você tem a lousa, a estrutura da sala, que fun-
ciona de um jeito, e aí você chega em um espaço desses, é completa-
mente diferente.
Pensamos muito em como estabelecer elos entre as seções e por
isso criamos roteiros pré-estabelecidos, por exemplo, o roteiro 2 ‘En-
genhos, Astronomia e Naves’, é um roteiro que fala de uma temática
mais ligada ao espaço. Nesse roteiro o grupo chegaria a Nave e faria
uma viagem no espaço, depois ele iria à seção de Astronomia falar
sobre o desenvolvimento desse universo infinito. E aí por fim o ro-
teiro passa pelo Engenho para falar sobre física, inclusive pode ser a
física dessa viagem, a física de uma estrela e por aí vai, o tema pode
variar bastante.

Roteiro 1 Roteiro 2 Roteiro 3 Roteiro 4 Roteiro 5


Do Macaco ao
Nanotecnologia Engenho Submarino Astronomia
Homem
Matéria Astronomia Borborletário Vida Vida
Vida Nave Lego Engenho Matéria
Roteiro 6 Roteiro 7 Roteiro 8 Roteiro 9 Roteiro 10
Astronomia Ecologia Jogos do Poder Engenho Terra
Do Macaco ao
Terra Engenho Estúdio Matéria
Homem
Vida Vida Alertas Jogos do Poder Jogos do Poder

De forma geral tentamos não engessar nosso monitor, para ele


poder se adaptar ao grupo. Muitas vezes o grupo chega lá e a pro-
fessora fala ‘ah, a gente estava conversando sobre ecossistema, tem
como você falar disso?’, então nosso monitor estará apto a falar sobre
ecossistema. Com os grupos tentamos sempre nos adaptar para dar
continuidade ao trabalho do professor.
60
O Catavento Acessível foi criado para tentar suprir a demanda
de acessibilidade (que é um termo muito grande e compreende uma
série de especificidades), mas basicamente o que esse núcleo faz é
atender visitantes idosos, que em geral andam mais devagar, que tem
algumas dificuldades, eles também atendem grupos de pessoas com
qualquer tipo de deficiência física, e também grupo de crianças mui-
to pequenas, 2 ou 3 anos de idade.
Esse núcleo também auxilia no preparo dos outros monitores
para esse tipo de atendimento mais focado, justamente por não que-
rer excluir ninguém, não colocamos todo atendimento ligado a aces-
sibilidade a esse núcleo, mas priorizamos o pessoal que tem mais
treinamento nessa área, com esse foco, e eles acabam sendo peça
chave no treinamento do resto dos monitores nesse assunto.
E como contratamos nossos monitores? Não achamos o monitor
pronto, na verdade procuramos alguém que esteja disposto a traba-
lhar com educação não formal e que seja, em geral, de licenciatura.
O pessoal da licenciatura é geralmente também o que a gente mais
recebe nas seleções, mas também recebemos pessoal da engenha-
ria, por exemplo, entre outras áreas, em geral a gente acaba optando
mais pelos de licenciatura, porque são pessoas que já estão vivendo
na área da educação, o licenciando aprende a lidar com o espaço for-
mal, então vamos treiná-lo para o espaço não formal de educação.
O Catavento, na verdade, acaba auxiliando esses monitores e tor-
na-se uma via de mão dupla, pois esses estagiários terão acesso a
uma formação com um diferencial, e em geral encontramos nesses
jovens um potencial muito bacana. Temos aqui, por exemplo, uma
monitoria na máquina que produz raios. Esses raios são de mesma
61
natureza aos que aparecem em dias de chuva, pode-se ver a luz do
raio e depois ouvir um pequeno barulho, que não é um trovão, mas
dá para ouvir um estalo. O monitor que está trabalhando com esse
grupo vai explicar o funcionamento da máquina e depois convidar
essas crianças a participar da experiência; nessa máquina em parti-
cular nós damos um choque nas crianças, elas costumam gostar, na
verdade os adultos sofrem muito mais do que as crianças. A questão
do medo ao longo do tempo vira um problema, quando você é crian-
ça você não tem muita noção de medo das coisas, então quanto mais
jovem mais eles se aventuram.

Mas não podemos pensar nossas instalações só para os grupos


agendados, pois recebemos muitos grupos e continuamente nos pre-
paramos para recebê-los, mas cada dia mais pensamos o atendimen-
to ao público espontâneo, e é isso que nos faz criar instalações que
buscam cada vez mais a autonomia dos diferentes públicos espontâ-
neos.

62
Essa instalação, por exemplo, Tubos Sonoros - é bem parecida
com os tubos sonoros que existe aqui na entrada – fizemos uma co-
municação visual bem bacana, o rapaz da imagem mostra como usar
esse equipamento, atualmente buscamos cada vez mais usar imagens
como essa, porque senão acabamos prendendo nosso visitante ao
monitor, ou impedindo que o visitante utilize o equipamento de for-
ma correta. Aprendemos, com o tempo, como aparece no gráfico ini-
cial, que precisamos cada vez mais trabalhar nossa linguagem visual
e adequá-la aos nossos visitantes espontâneos para que eles possam
ter a mesma qualidade na visita ao espaço que os grupos agendados.
Com o tempo percebemos que muitos alunos das escolas (dos
grupos agendados) voltam ao nosso museu por vontade própria e le-
vam os pais e a família, pois fica uma vontade ‘de quero mais, quero
conhecer um pouco mais o espaço’. Tem muitos adultos que não co-
nhecem esse tipo de espaço, porque não tiveram contato com isso na
escola e não tem no dia-a-dia; se essas crianças desde cedo já estão
vendo isso, elas vão levar suas famílias futuramente e vão mantendo
um ciclo.
Continuando na questão do espaço, trago um pouco sobre nossas
instalações imersivas. Essa aqui é a Nave por dentro, nos televisores
os visitantes podem ver a torre do Catavento antes de partir para
viagem, os alunos ficam sentados a frente dos televisores.

63
As outras instalações selecionadas para essa apresentação são
instalações sem tecnologia, nesses casos abrimos mão da tecnologia
para mostrar que toda imersão é necessariamente tecnológica. Tec-
nologias propiciam muitos avanços, mas não necessariamente são
obrigatórias para instalações imersivas.
Já no alto desse slide temos uma pessoa que está visitando um
pedaço do sistema digestivo, no caso esse é o intestino gigante.

E mais abaixo temos uma pista que chama Pista de Embriaguez


onde a pessoa é convidada a colocar um óculo que simula o efeito
da embriaguez no visual, realmente embaraça tudo e a pessoa deve
tentar andar na pista sem bater nos obstáculos, essa dinâmica ocorre
na sala dos alertas que vimos anteriormente, lá debatemos as pro-
blemáticas em beber e dirigir, sendo que a visão embaçada é apenas
um dentre vários efeitos que a ingestão de álcool causa. A ideia é
começar desde cedo o debate.

64
Por fim, temos algumas fotos de nossas oficinas que geralmente
ocorrem no período de férias escolares, e eventualmente durante o
período letivo. Nas fotos observa-se a oficina de mini terrário.

Temos também o registro da oficina de light paint, que trata de


uma técnica de fotografia.

65
E no slide mais acima, vemos a oficina de construção de câmara
escura que é um artifício antigo, mas que ainda causa maravilha.

Esse é basicamente um pouquinho do Catavento. Trabalhamos


diariamente na busca de um espaço acessível ao nosso público agen-
dado e espontâneo, para poder recebê-los da melhor maneira. Perce-
bemos o interesse das crianças, adolescentes e adultos; os que nunca
foram passam a gostar muito e os visitantes que já foram muitas ve-
zes voltam com a família, vão de novo com a escola, temos muitas
escolas que voltam várias vezes. Sabemos que existem certas difi-
culdades, principalmente no âmbito público para contratar ônibus,
para fazer esse passeio acontecer, mas prezamos pelas experiências.
Estamos construindo um espaço para isso.
Espero que vocês nos visitem, se alguém tiver alguma pergunta...”.

Mediadora:

“Nós agradecemos o Gabriel pela palestra e agora nós abrimos o


espaço para dúvidas do público. Como nós temos uma agenda bem
apertada, vou abrir espaço para duas perguntas, ok? Quem gostaria?

Participante Monalisa:

“Deixa eu perguntar, além daqueles roteiros que vocês fazem, vo-


cês também têm roteiro livre para a gente escolher o que a gente
quer, ou são só esses roteiros fechados? E se tem como rever uma

66
política que o Catavento tem para visitação de escolas, porque tem
um limite de quantas turmas a gente pode levar e isso trava uma es-
cola grande como a minha. Estou falando porque já levei esse ano no
Catavento minhas turmas e a gente teve problema com isso, com o
roteiro e com a quantidade, como a gente faria diferente? Tem como
fazer diferente? Como funcionaria? ”

Gabriel:

“A questão do roteiro: não estamos engessados naqueles roteiros,


que são 10, já foram mais roteiros e foram reduzidos, eles são sempre
repensados, mas nem sempre existiram aqueles 10 roteiros. Já tive-
mos outros tipos de roteiro e você pode conhecer o museu sem ser
obrigado a usar um roteiro. Normalmente fica a cargo do professor
organizar toda a visita, porém a visita monitorada funciona somente
dessa forma. Eventualmente, se der algum problema, a gente acaba
abrindo outros roteiros, mas é uma questão emergencial, não é algo
que funciona no dia a dia.
A outra questão, a quantidade, isso é um problema de várias es-
feras que se entrelaçam. Basicamente o número de roteiros de esco-
las que a gente pode receber no dia a dia está vinculado ao número
de monitores que a gente tem, porque não dá para eu colocar mais
roteiros do que a quantidade de gente que tenho para atender esse
público. ”

Participante Monalisa:

“Eu tinha, não lembro se era 10 ou 12 turmas para levar, e eu não


podia levar todas no mesmo mês, eu tive que dividir em dois meses
e isso, para uma rotina da escola, é horrível. Você já para uma sema-
na para fazer aquela atividade e aí no outro mês você tem que parar
uma semana de novo.”

Gabriel:
“Eu não sou do agendamento, então alguém do agendamento po-
deria responder essa pergunta com mais propriedade, mas, a meu
ver, isso acaba sendo integrado à questão de que não podemos ter
exclusividade de uma escola em um dia. Eu não posso fechar para
uma escola para ela ficar com todo o meu roteiro ocupado, eu tenho
que receber no mesmo dia várias escolas, até por termos contratuais
e outras questões, então eu enxergo dessa forma, acho que deve ser
67
isso.
Não posso em um dia falar que vou receber uma escola com 12
turmas, tem várias escolas que nos visitam no mês várias vezes, jus-
tamente por essa questão, por ter que dividir os grupos em dias se-
parados. Tem escolas realmente muito grandes, que levam todas as
turmas de ensino fundamental por exemplo. ”
Participante Monalisa:
“A gente teve dividir em dois meses, esse foi o problema”
Gabriel:

“Infelizmente esse tipo de coisa não dá para mudar muito, bem


como o roteiro. Seria muito mais interessante se eu pudesse ter 20
roteiros, mas aí também eu tenho que aumentar o corpo de monito-
res, e isso mexe com questões financeiras, que não são as melhores
no momento no país”.
Marina:

“Só para completar o que o Gabriel já falou. Meu nome é Mari-


na e eu sou do Museu da Língua Portuguesa, e a gente tinha muito
essa reclamação. Só que assim, a primeira coisa, e que o Gabriel já
respondeu, a gente é um museu público, então todos tem que ter os
mesmos direitos. As escolas, muitas vezes vem com 10, 12 ou 15 tur-
mas, e a gente teria que fechar ou o dia ou mês para ela, e aí os outros
ficam prejudicados.
Qualquer regra tem sempre problemas, o que a gente coloca é que
cada escola pode trazer X pessoas naquele mês, porque senão real-
mente a gente acabaria fechando o ano para 6 ou 7 escolas, só porque
os grupos são muito grandes mesmo. ”
Participante Graziele:
“Oi Gabriel, aqui é Graziele, e eu queria saber quais pesquisas
vocês estão desenvolvendo em relação ao público. Você afirmou que
as crianças vão com as escolas e depois voltam com as famílias, isso
são dados oficiais, ou são dados que você tem de comunicação, de a
criança te falar que voltou? Quais pesquisas vocês estão desenvol-
vendo em âmbito do educativo mesmo? Queria entender mais. ”

Gabriel:

“Temos várias pesquisas, de várias naturezas, pesquisas vincula-


das às faculdades, por exemplo. Recentemente, tivemos uma aluna

68
de mestrado da USP, que fez uma pesquisa de como funcionava a re-
lação dos pais com o espaço no Catavento. Foi muito bacana porque
ela ficou ao longo de 2 ou 3 meses acompanhando visitas de finais
de semana para ver como que a mãe interagia com o filho e os espa-
ços, e como o pai interagia com o filho e os espaços, e quando tinha
um casal de pai e mãe, como eles interagiam com esses espaços, ou
então pai e pai, mãe e mãe, independente do casal. Isso é um tipo de
pesquisa que a gente tem.
Não sou eu no Catavento, nem o Educativo que desenvolve, isso
na verdade é uma universidade que tem uma pessoa que nos procura
para realizar projetos de mestrado, doutorado e até de licenciaturas.
O Educativo, por si só, desenvolve outras pesquisas, algumas
ligadas a Secretaria, que giram mais em torno de qualidade, dessa
monitoria, se o meu monitor está realmente conseguindo fazer essa
linguagem ser acessível, se o meu espaço está bom e que vai desde se
o banheiro estava limpo, até a qualidade da monitoria. E, além disso,
pesquisas sobre se esse público está retornando ou não. A gente tem
mais de um tipo de pesquisa, tem pesquisa inclusive digitalizada,
que é da Secretaria, os dados vão para a Secretaria, e temos pesquisas
que ficam no Catavento.
A gente não consegue, por exemplo, precisar a faixa etária dos
nossos visitantes, isso é uma coisa que ainda não conseguimos fazer,
até por ser um museu novo, esse tipo de coisa ainda não aconte-
ceu, mas sabemos que o nosso público volta bastante. Então nesse
3.370.000 de pessoas, tem bastante gente que já retornou.
É isso gente, muito obrigado, espero que vocês nos visitem! ”

Mediadora:

“Nós agradecemos mais uma vez o Gabriel pela palestra, agrade-


cemos a todos que participaram. ”

69
70
Terceira Palestra
A Contribuição dos Zoológicos à Educação
e à Cidadania.

Kátia G. de Oliveira Rancura

Chefe da Divisão de Educação e Difusão


da Fundação Parque Zoológico de São Paulo
Docente do programa de pós-graduação em con-
servação da fauna da UFSCar

Boa tarde. Na palestra de hoje vou apresentar para vocês um pou-


co do panorama geral dos zoológicos, mostrando como essas ins-
tituições podem ser uma ferramenta para educação e qual contri-
buição podem dar para o ensino formal. Não vou focar somente no
Zoológico de São Paulo, porque acredito que não se aplicaria ao caso
da maior parte de vocês, que talvez não sejam da cidade de São Pau-
lo, ou não possam levar seus alunos até o zoológico. Pensei em falar
das instituições zoológicas de um modo geral, para que se aplicasse
a todos. Mas antes de começar, eu queria contextualizar o que vem
acontecendo nesse século.
É um século de grandes transformações, políticas, sociais,
culturais, tecnológicas e, em decorrência dessas transformações,
também temos vivenciado uma crise socioambiental muito grande,
que muitas vezes nos leva a refletir se trata apenas de uma crise eco-
lógica, ou se é uma crise de valores. Da forma como nos encontra-

71
mos no mundo, da forma como nos enxergamos diante da natureza.
Então o grande desafio para superarmos essa crise é principal-
mente esse distanciamento que foi criado entre o ser humano e a
natureza. Parece que deixamos de fazer parte e passamos a nos ver
à parte dela. Esse é um grande desafio: trabalhar essas questões com
as pessoas, uma vez que essas não se veem como seres integrantes da
própria natureza.
Outra dificuldade também para se falar em conservação é tratar
desse assunto quando, às vezes, as necessidades básicas das pessoas
não estão sendo supridas. Como você vai falar de conservação do
verde, de conservação do meio ambiente, se a pessoa não tem sanea-
mento básico, se ela não tem acesso à alimentação, se ela não tem a
mínima qualidade e condição de vida? É complicado para mim, por
exemplo, ir até uma comunidade que tem inúmeras deficiências e
problemas e falar que eles devem conservar um fragmento de Mata
Atlântica ou uma determinada espécie que está ameaçada de extin-
ção.
Percebemos que o problema é muito maior do que simplesmente
um trabalho de uma escola, ou de um zoológico, por isso precisamos
dessa integração de todos os meios possíveis onde possamos traba-
lhar a educação, para que essa transformação realmente ocorra, e a
educação ambiental vem exatamente para suprir essa necessidade.
Existem alguns pontos principais que se destacam nas definições
de educação ambiental. Primeiro que é um processo contínuo, não
se faz educação ambiental em um dia, você não transforma as ati-
tudes das pessoas em um dia, é algo contínuo e que converge para
formação integral das pessoas, visa transmitir informações e conhe-
cimentos sim, mas também construir valores e atitudes. Isso tudo
em prol de uma convivência mais harmônica do ser humano com o
meio ambiente.
Daí se destaca o conceito de educação ambiental crítica, que traz
exatamente essa questão, de compreendermos um pouco melhor
essa relação do ser humano com o meio ambiente e criarmos estra-
tégias, refletirmos sobre como podemos transformar as nossas ati-
tudes, as nossas ações para efetivamente haver uma mudança nesse
panorama.
Nesse sentido foram criados diversos documentos oficiais, para
valorizar a educação ambiental e para garantir que ela fosse inserida
nos mais diversos contextos e espaços, como por exemplo, a Políti-
ca Nacional de Educação Ambiental, que é de 1999, e que coloca a
educação ambiental como um componente essencial e permanente
da educação nacional.
72
Porém sabemos que a legislação educacional ainda é bem frágil
nas questões relacionadas à educação ambiental. Normalmente ela é
trabalhada dentro de temas transversais e de uma forma bem super-
ficial nas escolas. Apesar disso, um senso escolar feito pelo INEP em
2001 considerando escolas de ensino fundamental, indicou que qua-
se 95% das instituições de ensino declararam ter educação ambiental
de alguma forma inserida dentro do seu currículo, em projetos ou
até mesmo como disciplinas específicas da instituição.
No mesmo ano também foi verificado que 25 milhões de crianças
tinham acesso à educação ambiental através das escolas. Em 2004
esse número passou para 32 milhões. Diante desses números, é cla-
ro que temos que parar para pensar “qual será o tipo de educação
ambiental que as pessoas que responderam essa pesquisa estão con-
siderando? Talvez algumas pessoas considerem que simplesmente
trabalhar a reciclagem com os alunos já é suficiente para considera-
rem que fazem educação ambiental na escola. Essa não deixa de ser
uma atividade de educação ambiental, mas será que isso por si só
vai criar toda aquela transformação que a educação ambiental prevê,
para que haja realmente uma mudança desse contexto que vivemos
hoje?
Um outro ponto importante também é que se coloca sobre o ensi-
no formal toda a responsabilidade de discutir as consequências des-
se desafio, desse problema socioambiental que vivenciamos. Então
será que é obrigação só da escola discutir isso com os alunos? Será
que só a escola tem que trazer essas questões? Não, a educação esco-
lar não é a única fonte de aprendizado do ser humano, ela faz parte
de um conjunto de espaços, de contextos, com os quais convivemos
e interagimos cotidianamente. Ela é um dos espaços onde a educa-
ção ambiental pode ser discutida, mas não a única responsável por
trabalhar essas questões.
Temos os espaços formais, os informais e os não-formais, todos
eles, com grande potencial para discutir a temática ambiental. Em
casa, em uma conversa com os pais, uma criança pode aprender
muito mais sobre questões ambientais do que, às vezes, na escola. Na
escola é possível trabalhar diversos assuntos, desenvolver projetos
ambientais que vão levar a uma reflexão, e os espaços de educação
não formal também são muito propícios a essas discussões, porque
eles vão trazer elementos que colaboram para que isso aconteça.
Quais espaços seriam esses? Parques, zoológicos, museus, praças,
estações de metrô, jardins botânicos, centros culturais...

73
Foto 1- Zoológicos: espaços para a discussão de questões ambientais

Vamos focar nesta palestra em zoológicos porque é minha área


de atuação. É sobre isso que eu vou falar um pouquinho com vocês,
sobre o potencial dos zoológicos, mas qualquer um desses espaços
pode ser propício para a discussão dessas questões. Só que para isso
precisa haver também uma mudança de paradigmas, a educação em
espaços não formais não pode ser simplesmente um complemento
do que é visto em sala de aula, então a gente não pode trabalhar sim-
plesmente as práticas do que foi visto em teoria em sala de aula, ou
seja, ter uma aula ao ar livre.
Esses espaços vão muito além disso, eles podem dar uma contri-
buição muito maior ao permitir a união de estratégias com o intuito
de gerar uma reflexão sobre um determinado assunto, sobre uma
certa questão. Eles promovem e possibilitam a experimentação, o
despertar de sentimentos, de emoções e aí sim podem levar a um
pensamento crítico, que vai proporcionar ações que poderão ser
transferidas para o dia-a-dia, para o cotidiano daquelas pessoas.
E onde entram os zoológicos em tudo isso? Na aproximação das
pessoas com a natureza. Lembra que falamos sobre aquele distancia-
mento do ser humano com a natureza, que hoje em dia está cada vez
mais evidente? Vamos pensar um pouquinho.... Quando vocês eram
crianças, do que vocês gostavam de brincar? Pega-pega, peão, jogar
bola, eram diversas as brincadeiras da nossa infância e geralmente
74
elas ocorriam ao ar livre, onde interagíamos com o meio natural,
dificilmente uma criança ficava dentro de casa o dia todo, a gente
estava sempre em outros espaços interagindo com a natureza e com
as pessoas.
E hoje em dia, o que as crianças gostam de fazer? Quem tem fi-
lhos? O que os filhos de vocês, ou irmãos mais novos, sobrinhos,
gostam de fazer, do que eles gostam de brincar? Computador, vídeo
game, tablet, celular. Então o que a gente vê é isso, as crianças estão
cada vez mais confinadas dentro de ambientes que não tem nada a
ver com a natureza e cada vez mais voltadas para questões tecnológi-
cas e que, muitas vezes, além de criar um distanciamento delas com
os ambientes naturais, criam um distanciamento entre as próprias
pessoas, porque elas mesmas quase não interagem mais.
Em compensação os zoológicos têm um potencial para criar essa
conexão de pessoas e natureza. Aqui coloco uma frase que acho que
demonstra bem isso ‘os animais de zoológicos são as melhores fer-
ramentas que a natureza tem para fazer propaganda do seu valor em
um mundo tão cheio de estímulos’.

Foto 2 – Animais: ferramentas para conectar as crianças à natureza

Como as crianças hoje são cada vez mais incentivadas a ter hábitos
de consumo inadequados e estimuladas a sentir necessidade do “ter”
para ser feliz, a proximidade com um animal ou a experiência em um
ambiente natural pode ser uma das melhores estratégias para desper-
75
tar nela o interesse e a conexão com a natureza.
Os zoológicos e outros espaços promovem experiências que po-
dem propiciar essa conexão, e nós temos que saber aproveitar essas
oportunidades para trabalhar e para discutir essas questões.
Um outro ponto muito importante para a promoção da educação
em zoológicos diz respeito ao seu público. Dizemos que o público
de zoológicos é muito democrático, porque ele é composto por pes-
soas de todas as idades, de todas as classes sociais e de todas as áreas
de interesse. No Zoo de São Paulo, por exemplo, atendemos desde
crianças do ensino infantil, com 2 anos de idade, que estão começan-
do a andar e já vão ao parque, já começam a ter essa vivência desde
pequenos, até idosos, pessoas com deficiências, grupos escolares,
grupos espontâneos, de todos os tipos.

Foto 3: Público de zoológicos – altamente diversificado

São muitos visitantes. Para vocês terem uma noção, o levanta-


mento da Associação Mundial de Zoológicos e Aquários demons-
trou que cerca de 700 milhões de pessoas passam por zoológicos e
aquários todos os anos, isso equivale a aproximadamente 10% da
população mundial. Se uma pequena parcela dessas pessoas for sen-
sibilizada nesses espaços, podemos fazer uma grande diferença no
mundo. Só no Brasil são cerca de 20 milhões de visitantes por ano.
Eu trouxe um dado comparativo para vocês: o Zoológico de São Pau-
lo, que é considerado um dos maiores zoológicos do Brasil, recebe
cerca de 1,5 milhão de pessoas todos os anos, sendo que em alguns
dias específicos, como finais de semana, feriados, Dia das Crianças,
76
chegamos a receber mais de 20 mil pessoas em um único dia. É um
público em potencial para a Educação Ambiental, você só tem que
ter as estratégias certas para envolve-lo.
E quais são os pilares dessas instituições? Tenho certeza de que
muitos de vocês acreditam que os zoológicos são vitrines de animais,
que são espaços criados simplesmente para o lazer da população.
Essa ideia vem de um conceito antigo dessas instituições, porque
realmente elas se originaram de coleções particulares, que tinham
esse objetivo simples de expor os animais. Manter animais em ca-
tiveiro era até uma questão de status da nobreza no passado, que
mantinha essas coleções que depois se tornaram públicas, mas hoje
em dia, de acordo com os conceitos de zoológicos modernos, essas
instituições tem outro papel.
Mas o lazer continua sendo um dos seus pilares? Continua, pois
são espaços importantes para a população, para o entretenimento,
para passar momentos agradáveis em família ou entre amigos. Mas
é um lazer diferenciado, não é o mesmo tipo de lazer que você bus-
ca quando resolve visitar um shopping, por exemplo. Além disso,
atualmente os zoológicos também são locais para pesquisa. Hoje se
desenvolvem diversas pesquisas nestes locais que contribuem dire-
tamente para um outro papel dessas instituições que é o de conser-
vação.

Foto 4 – Pesquisa em zoológicos – ferramenta para a conservação

77
Os zoológicos trabalham muito com conservação em cativeiro,
que chamamos de conservação ex situ, mas algumas instituições
também contribuem diretamente com a conservação em natureza,
em trabalhos in situ. O trabalho das equipes de cativeiro e de natu-
reza se complementam, se integram, porque o objetivo é um só: con-
servar as espécies. Às vezes tem coisas que descobrimos em cativeiro
que os pesquisadores não teriam condição de estudar em vida livre,
e vice-versa, então elas se conversam e são fundamentais, é uma ten-
dência dos zoológicos que os trabalhos in situ e ex situ cada vez mais
sejam integrados.

Foto 6: Integração de trabalhos in situ e ex situ – articulação para a conservação

Por fim, a conservação não existe sem a educação ambiental,


então esse é um pilar fundamental dessas instituições, porque não
adianta termos um programa excelente de conservação, conseguir-
mos reproduzir uma espécie super ameaçada e até reintroduzi-la na
natureza se as pessoas não estiverem conscientes da importância da-
quela espécie, da sua função ecológica e da necessidade de preserva-
ção dos ambientes naturais.

78
Foto 7 – Educação Ambiental: fundamental para a conservação da biodiversidade

Essas coisas estão totalmente entrelaçadas, não se faz conservação


sem educação, porque quase todas as ameaças à conservação das es-
pécies estão direta ou indiretamente ligadas a interferências huma-
nas, então a educação é fundamental nesse processo de conservação.
Pensando nessa articulação entre as escolas e os zoológicos, esse
potencial educativo dos zoológicos está relacionado a um elemento
central que essas instituições possuem e que gera um interesse muito
grande das pessoas, provavelmente até maior do que outros elemen-
tos que também estão ligados à natureza: os animais.
As pessoas, em sua grande maioria, têm muito interesse em as-
suntos relacionados a animais, então temos que aproveitar o animal
como uma ferramenta para gerar discussões. Por meio de uma apre-
sentação com um animal você pode, por exemplo, gerar discussões
relativas à política, ao meio ambiente, à sociedade, à educação... Você
consegue usar o animal como uma ferramenta para abordar qual-
quer tema, por isso os zoológicos não são espaços específicos para
trabalhos apenas nas áreas de biologia e ciências, qualquer professor
pode aproveitar esses espaços para trabalhar conceitos referentes às
suas disciplinas, as problemáticas referentes à sua área dentro de um
zoológico.

79
Foto 8 – Animais: geradores de discussões e reflexões

E quais são as principais atividades que as instituições promovem e que os


professores podem aproveitar e explorar? Os próprios recintos dos animais
são uma ferramenta educativa. Quando o recinto é bem construído, bem
elaborado, traz elementos que remetem ao habitat natural dessas espécies.
Então um professor, por exemplo, de geografia pode trabalhar diversas
questões referentes à sua matéria através do recinto de um animal.

Foto 9 - Recintos bem planejados: ferramenta educativa

80
As placas educativas. Os zoológicos possuem também um apara-
to muito grande em termos de comunicação visual. As placas edu-
cativas podem ser exploradas por professores, assim como as visitas
monitoradas que fazem parte dos Programas de Educação Ambien-
tal da maior parte das instituições e são dirigidas especialmente para
o público escolar. Os zoológicos ainda possuem exposições e espa-
ços educadores e realizam apresentações didáticas, que permitem
uma aproximação ainda maior com o animal, possibilitando a sensi-
bilização das pessoas que, por estarem vivendo uma experiência que
não é comum à elas, tornam-se muito mais abertas para a aquisição
de novos conhecimentos e a reflexão.

Foto 10 – Placas educativas e espaços educadores em Zoológicos: fonte de conhecimento


para os visitantes

Os zoológicos também promovem diversas campanhas que po-


dem ser utilizadas no ambiente escolar, fornecem diversos materiais
didáticos e informativos e possuem hoje em dia cada vez mais uma
interação virtual com seus visitantes e com a população de um modo
geral, através de seus sites, redes sociais e tantas outras ferramentas
que permitem o acesso a informações que muitas vezes as pessoas
não teriam durante uma visitação simples, como conhecer melhor
os bastidores, o funcionamento dessas instituições e a biologia, o
comportamento, a ecologia e os manejo dos diversos animais.
Outra coisa que investimos muito no Zoo - falando agora espe-
cialmente sobre o Zoo de São Paulo - são os cursos de formação para
professores. Porque entendemos que quem visita o Zoológico de São
Paulo permanece em média 4 horas no parque, porém como foi
mencionado, a educação ambiental é um processo contínuo. Se eu
fizer uma visita monitorada com um grupo em 3 horas, eu não vou
conseguir trabalhar tudo o que seria necessário para que houvesse
81
uma transformação daquelas pessoas, eu posso conseguir despertar
algo, mas provavelmente não será o suficiente para uma mudança
efetiva.
Por isso, enxergamos o professor como uma peça chave do nosso
trabalho, então uma experiência, uma reflexão que começa no zoo-
lógico pode ser desdobrada pelo professor, ou vice-versa, o professor
pode começar uma discussão em sala de aula e se aprofundar nisso
através dos elementos que o zoológico dispõe. Por isso investimos
muito na formação desses profissionais no Zoo e eu vou comparti-
lhar com vocês algumas de nossas experiências.
Temos o curso ‘O zoológico como instrumento de ensino’ que
foi uma das primeiras atividades dentro do Programa de Educação
Ambiental do Zoológico de São Paulo. Esse curso tem duração de
um único dia e acontece quatro vezes ao ano, duas vezes no primeiro
semestre e duas vezes no segundo semestre, sendo teórico-prático,
desenvolvido com base em dois eixos temáticos, que são revezados
ao longo do ano. Um eixo temático é o “Animais em foco”, cujo obje-
tivo é demonstrar como explorar os animais como uma ferramenta
educativa. O outro eixo temático é “Sustentabilidade e conservação”,
que tem como proposta mostrar como esses assuntos podem ser
abordados durante uma visita ao zoológico.

Foto 11 – Curso “O zoológico como instrumento de ensino”: atividades práticas

Uma outra experiência já bem consolidada é o Programa ‘ZooEs-


cola’. Esse programa ocorre desde 2010 e conta uma parceria com

82
a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. Essa parceria foi
fundamental para garantir a adesão dos professores, uma vez que
através dela os professores pontuam ao realizar esse curso de forma-
ção no zoológico. O ZooEscola tem um ano de duração e seu tema
central é a Mata Atlântica, porque o zoológico está inserido em uma
Unidade de Conservação de Mata Atlântica, é o bioma da nossa ci-
dade e de grande parte do nosso Estado. Por essa razão trabalhamos
muitas questões da realidade local, aspectos gerais do bioma e um
subtema a cada ano.
Por exemplo, em 2014, ano em que houve a crise da água em São
Paulo, que foi muito grave, estávamos trabalhando coincidentemen-
te a água e a Mata Atlântica com os professores. Ano passado, 2015,
trabalhamos a sustentabilidade e este ano estamos trabalhando as
ameaças à biodiversidade.
E qual o objetivo dessa formação? É promover a discussão e o
desenvolvimento de projetos ambientais nas escolas, permitindo a
construção de valores e formação cidadã de professores e de alunos.
Como fazemos isso? O Programa envolve quatro etapas: AA primei-
ra delas é a capacitação de professores no início do ano, em três en-
contros presenciais no Zoológico, de 8 horas cada. Nessa etapa, eles
são capacitados para o desenvolvimento de projetos ambientais nas
escolas e para trabalharem aspectos relativos a Mata Atlântica e ao
subtema do ano.

Foto 12 – ZooEscola: formação de professores da rede municipal

83
Na segunda etapa, eles agendam uma visita monitorada ao zooló-
gico com seus alunos. Para os professores que participam do Progra-
ma essa visita, para até 40 alunos, é totalmente gratuita, porque ela
faz parte de um projeto educativo.

Foto 13 – ZooEscola: visita monitorada ao Zoológico

Depois de participar dessa visita monitorada, que tem um roteiro


específico para o Programa, eles retornam para a escola para desen-
volver os projetos ambientais referentes a temática do Programa. No
final do ano, os professores têm um novo encontro no Zoológico
para apresentar os projetos que foram desenvolvidos nas escolas ao
longo de todo o período letivo uns para os outros, compartilhando
os desafios, os sucessos, as dificuldades, enfim as experiências que
eles vivenciaram. Depois de tudo isso, a gente faz em conjunto a es-
colha dos trabalhos de maior destaque e realizamos uma cerimônia
de encerramento com uma premiação simbólica dos melhores pro-
jetos daquele ano. Mas a parte mais importante é esse compartilha-
mento de experiências.
De forma resumida, esse é o Programa ZooEscola. Os relatos dos
professores a respeito da participação e da mudança que esse progra-
ma proporciona e os desafios que eles enfrentam na escola, nos dão
forças para acreditar e investir cada vez mais nesse tipo de formação.
E por último, uma experiência mais nova que temos também
com formação, é um projeto que começou esse ano e tem como pú-
84
blico–alvo as escolas do entorno da Unidade de Conservação onde
o Zoológico está inserido, o PEFI - Parque Estadual das Fontes do
Ipiranga, que é um fragmento de Mata Atlântica localizado na área
urbana de São Paulo, é um resquício desse bioma no meio da cidade.

Foto 14 – ZooEscola: troca de experiências após o desenvolvimento dos projetos ambien-


tais nas escolas

Foto 15 – PEFI: fragmento de Mata Atlântica em meio à cidade

Imaginem o tanto de problemas que temos nessa área por estar

85
rodeada pela cidade, e imaginem também a importância desse frag-
mento para a flora e a fauna local e para toda essa comunidade do
entorno, já que ela faz o controle hidrológico e climático da região,
abriga diversas espécies, melhora a qualidade do ar, mantém a umi-
dade, além de proporcionar qualidade de vida para a população. Nós
temos um problema grande com os animais de vida livre dessa área,
em decorrência desse contato muito próximo com o meio urbano,
como caça, atropelamento, eletrocussão, abandono de animais do-
mésticos que acabam se tornando invasores nessa área, predando
animais silvestres, transmitindo doenças...

Foto 16: Professores de escolas do entorno do PEFI: diagnóstico para implantação de curso
de formação

Por isso, em parceria com um projeto de mestrado profissional,


estamos começando um trabalho piloto com duas escolas, uma de
ensino fundamental I e a outra de ensino fundamental II e médio
para que, nos mesmos moldes do ZooEscola, possamos propiciar
uma formação para esses professores e contribuir para o desenvolvi-
mento de projetos para a valorização dessa área que muitas vezes os
próprios moradores do entorno desconhecem.
Como essa UC inclui diversas instituições, as pessoas a enxergam
como o Zoológico, ou o Zoo Safari, o Parque CienTec, o Jardim Botâ-
nico, mas não reconhecem o PEFI. Se você falar do Parque Estadual,
as pessoas nem sabe que moram ao lado dele, então estamos queren-
do fazer um trabalho de valorização dessa área e principalmente que
vise minimizar os impactos da comunidade do entorno sobre esse
86
fragmento de Mata Atlântica, contribuindo para sua conservação.
Já realizamos um diagnóstico nas escolas e o projeto de formação
dos professores começa no ano que vem, então só poderei apresentar
os resultados dele numa próxima palestra, mas estamos muito con-
fiantes de que vai dar certo.
Espero ter esclarecido qual é o potencial dos zoológicos para a
educação e a articulação que esses espaços podem ter com as escolas
no intuito de promover uma reflexão sobre as questões ambientais e
contribuir para a mudança dessa realidade que vivemos hoje. Qual-
quer dúvida fico a disposição. Muito obrigada!”
Créditos das fotos: Acervo/FPZSP

Mediadora Jornalista Thais Cardoso:

Nós agradecemos a professora Kátia pela palestra e vamos abrir


agora espaço para questões do público. Quem gostaria de fazer uma
pergunta? ”

Participante Adriana:

“Olá Kátia, meu nome é Adriana. E tenho duas questões. A pri-


meira, com relação ao primeiro tópico de educação ambiental na
sociedade, de que forma você acha que os pais poderiam ter acesso a
conteúdos de educação ambiental em casa?
A segunda é se já houve alguma pesquisa, algum questionamento
buscando, nas crianças que visitam o zoológico, qual o sentimento
delas em relação aos animais mantidos em cativeiro. Enfim, acho
que a gente não precisa aprofundar, mas sabemos que a sociedade
está vivendo uma transformação e um dos grandes questionamentos
está sendo o zoológico, a existência dos zoológicos. Eles têm que ser
repaginados, se não, não há possibilidade de educarmos para um
futuro sustentável, não tem conexão uma coisa com a outra? ”

Profa. Kátia:

“Sobre o primeiro assunto, de como acessar, os pais poderiam ter


acesso de casa à educação ambiental, existem algumas plataformas,
programas de TV e sites que poderiam contribuir para levar esse
conhecimento. Mas eu concordo com você que isso não é tão di-

87
fundido para o público em geral, ficando muitas vezes mais restrito
às pessoas que trabalham na área da educação. A Profa. Alessandra
depois pode até complementar minha fala, pois ela tem mais expe-
riência a respeito desse tema.
Sobre o segundo ponto, como dizer que os zoológicos têm esse
potencial todo de educação se muitos deles, às vezes, não represen-
tam isso que eu mostrei? Realmente, algumas instituições ainda tra-
balham com estruturas ultrapassadas, que representam conceitos
do passado, de simples exposição de animais. Outras instituições
estão sucateadas, ou não apresentam a qualidade que deveriam ter
para propiciar uma experiência que seja realmente positiva para o
visitante e isso dificulta trabalhar questões de conservação, se o seu
discurso não é coerente com a prática. Mas temos que entender que
os zoológicos estão passando por um processo de modernização de
conceitos, e isso leva tempo. Então teremos instituições que ainda
não contribuem para esse trabalho de reflexão, e outras instituições
que já estão em um patamar mais avançado e que podem ser explo-
radas nesse sentido.
Porém, existe uma questão que muitas vezes as pessoas não pa-
ram para refletir quando criticam a existência dos zoológicos, por-
que essas instituições às vezes não tem o aporte financeiro suficiente
para se manter em condições adequadas para os animais ou para
desenvolver projetos e pesquisas. A maior parte dos zoológicos que
estão em condições decadentes não tem praticamente nenhum tipo
de arrecadação própria que lhes garanta o investimento em melho-
rias, como o Zoológico de São Paulo, por exemplo, que depende
praticamente da sua bilheteria para se manter e se modernizar. A
maior parte das instituições são municipais e sabemos que nem to-
das prefeituras valorizam esse espaço como um espaço de educação
não formal, há outras prioridades...
Às vezes o repasse de verbas para que essas instituições possam
melhorar sua qualidade, os serviços que prestam para os animais,
para o meio ambiente e para as pessoas é insuficiente, então não
significa falta de dedicação ou de esforço técnico. ”

Participante Adriana:

“Seria como se eu fosse um animal preso, essa seria a questão.”

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Profa. Kátia

“Antigamente, os animais de zoológicos vinham da natureza, en-


tão tinha esse impacto muito grande em relação a adaptação ao cati-
veiro e ao bem-estar desses indivíduos. Como um animal que vivia
num território enorme e era levado para um zoológico poderia viver
bem? O que justificava isso, a promoção de entretenimento para a
população?
Mas, considerando os outros papéis dos zoológicos, por que esses
animais estão presos? Muitas vezes porque, devido a algum moti-
vo, não é possível devolver esses animais à natureza. Outras vezes
porque são animais já reproduzidos em cativeiro com a finalidade
de educação e pesquisa, para compreendermos melhor o comporta-
mento daquela espécie, a sua biologia, realizar estudos importantes
para a sobrevivência dessas espécies na natureza. As pessoas acabam
pensando no indivíduo, elas não pensam na conservação da espécie
pois, às vezes, aquele indivíduo que está no zoológico é um símbolo
para a espécie. Quando uma pessoa, por exemplo, teria condição de
ver e se sensibilizar ao se aproximar de um elefante? Talvez nunca na
natureza. Os zoológicos permitem esse contato e quando você ofere-
ce isso com qualidade, você garante o bem-estar para o animal, que
talvez tenha sempre vivido em cativeiro e permite uma experiência
positiva para as pessoas, que poderão se conectar e passar a ter atitu-
des que reflitam na conservação daquela espécie.
Temos que ver os animais de zoológicos, principalmente os nas-
cidos em cativeiro, que nunca tiveram esse contato com a natureza,
como embaixadores de sua espécie. ”

Participante Adriana:

“Kátia, primeiro ponto eu acho que é uma vaidade muito grande


do ser humano ter que limitar um espaço de um elefante, por exem-
plo, ou de uma girafa, para algumas crianças poderem ter aquele
toque. Eu já acho que estamos sendo demais, a gente está invadindo
muito essa natureza selvagem que ama viver livre, tanto quanto nós.
Segundo, eu acho que não é um espaço propício para pesquisa
nesse sentido. Espaço de pesquisa é um outro espaço, já predefinido
com as suas burocracias, tem todo um suporte por trás que a gente
sabe que é necessário.
Terceiro, eu não acredito que seja o melhor lugar para preserva-
89
ção da espécie, ela precisa ser livre para viver sem estresse, e ter bons
frutos fortes e sobreviver a adaptações. Enfim, você é bióloga, a gente
sabe. ”

Profa. Alessandra:

“Adriana, eu acho fundamental essa discussão que você está tra-


zendo, a gente pondera exatamente qual é o valor que a gente dá para
a vida animal em geral, inclusive a nossa.
Por que a nossa espécie tem mais direito do que outras? Eu con-
cordo que temos que parar para pensar sobre isso sim. Eu acredito
que a sociedade ideal é aquela em que os zoológicos não fossem ne-
cessários, eu acredito nisso, mas eu vejo que hoje eles ainda são. Eu
ainda tenho essa visão de que, a sociedade que eu almejo é aquela
que não necessite. Agora, se você quer falar da liberdade do animal,
tem muitas situações de fragmentos de mata, por exemplo, em que
esses animais estão extremamente ameaçados.
No Zoológico de São Paulo, por exemplo, há um trabalho muito
bacana com as pererecas de Alcatrazes. São sapinhos que só vivem
na Ilha-de-Alcatrazes, são endêmicos de lá, e que estão ameaçados
porque a marinha brasileira fica bombardeando a ilha como lugar
de teste. Os testes geram incêndios que acabam com a vegetação e a
fauna desse local, como ficaria a espécie? Acabaria. Essa espécie só
existe lá e o zoológico captura alguns indivíduos, visando manter e
reproduzir em cativeiro para poder devolver, se necessário na ilha. ”

Participante Adriana:

“Mas eu acho que o foco tem de ser maior dentro da interdição


dessa atitude, entende? ”

Profa. Alessandra

“Exatamente. ”

Profa. Kátia

“Mas é muito difícil você agora reverter uma situação, a gente está
remediando uma coisa que já acontece. Os animais foram retirados
da natureza no passado porque não existia essa preocupação com
bem-estar, com nada. Os zoológicos foram criados, como eu falei
90
para vocês, a partir de coleções de animais particulares.

Profa. Alessandra:

“Só lembrando que essas coleções Adriana - acho que é funda-


mental a gente tocar nesse assunto - incluía também a espécie hu-
mana. Não sei se vocês já viram, e eu recomendo fortemente, o fil-
me ‘Vênus Negra’, um filme chocante para alertar a gente do que é a
nossa sociedade, que vai dentro daquela lógica da sociedade que tem
defesas, mas que gera isso. Os tupiniquins brasileiros foram levados
para a Europa, africanos foram levados para a Europa para serem
exibidos em exposições zoológicas, ao ar livre, na rua, até no inverno
europeu.
E eu acho que isso que você sente em relação aos animais tam-
bém, eu vejo como um momento transitório. Os zoos têm um papel
hoje que tem que ser transitório, é como as cotas na educação, eu
defendo as cotas hoje porque a gente não tem a comunidade negra
participativa nas universidades brasileiras, e eu acho que a gente tem
que garantir a entrada, mas ela não pode ser uma medida que seja
para sempre. Para mim a cota é algo que é paliativo, é o momento
que necessita desse tipo de medida paliativa.

Profa. Kátia:

“Na verdade, o que não se justifica, é um zoológico que exista hoje


em dia simplesmente para exposição de animais. Nisso eu concordo
perfeitamente com você, não se justifica a existência de zoológicos
para isso, para essa função que ele tinha no passado.
Mas hoje em dia eles são necessários, como a Alessandra falou,
porque a gente não tem o que fazer com muitas espécies que são
retiradas da natureza com o avanço do desmatamento, da degra-
dação ambiental, você não tem como manter algumas espécies em
fragmentos muito pequenos de espaço, eles precisam de territórios
grandes.
Muitas espécies não convivem com outras, são territorialistas, en-
tão não é em qualquer fragmento que você pode reintroduzir qual-
quer animal. Hoje a gente ainda convive com o tráfico de animais, há
muitas apreensões, muita coisa que, se os zoológicos e os centros de
reabilitação não existissem para receber esses animais, não teríamos

91
o que fazer, seria um caos, um colapso ainda maior para a conserva-
ção das espécies. Os zoológicos se justificam desde que eles contri-
buam com outros pilares, como a educação, para as pessoas entende-
rem que é necessário preservar os ambientes naturais, para que essas
espécies ainda possam continuar existindo na natureza. Se justifi-
cam quando você desenvolve pesquisas com os animais em cativeiro
que vão reverter para a conservação daquela espécie na natureza,
tanto que existem mais de 30 ou 40 espécies que melhoraram o seu
status de conservação na natureza em decorrência da contribuição
dada por zoológicos. Isso é resultado de uma pesquisa da Associação
Mundial de Zoológicos que apresenta esses dados, o quanto as ati-
vidades de zoológicos já beneficiaram ativamente a conservação de
espécies na natureza. (WAZA Magazine, vol13/2012). ”

Mediadora:

“Eu tenho mais uma pergunta, que ele solicitou primeiro, sei que
tem mais gente, mas vou ter que cortar por conta do tempo. ”

Participante não identificado:

“Dois pontos de vista. Como eu participei do projeto Tamar por


alguns anos, eu vejo que das espécies, boa parte delas estão hoje fora
de perigo por conta de trabalho feito em cativeiro. Parabéns pelo
trabalho.
Sobre capacidade de suporte aos zoológicos, há pesquisas que
revelam que existem um milhão e meio de pessoas por ano consu-
mindo o zoológico, por exemplo, fazendo um bom trabalho e tudo
o mais, como vocês vem fazendo. Mas como fica a relação suporte
versus estresse animal com o número de pessoas que frequentam
anualmente, vocês estão preparados? Vocês estão preparados para
meio milhão a mais de pessoas, fazendo esse vínculo com o estresse
animal e a estrutura de vocês? Obrigado. ”

Profa. Kátia:

“Em relação a capacidade e suporte, realmente os zoológicos,


como eu falei, enquanto em alguns momentos a gente chega a re-
ceber 20 mil pessoas em um dia, que seria um limite do nosso par-
que, em outros dias a gente tem mil visitantes. Essas instituições,
elas estão se preparando para que esse nível de visitação não influa

92
diretamente no bem-estar dos animais, investindo cada vez mais em
recintos que criem um isolamento, especialmente acústico, que é a
principal coisa que afeta os bichos, o barulho que é produzido pela
grande quantidade de pessoas, e em programas de bem-estar animal.
Existem estudos comportamentais que os zoológicos fazem com
equipes específicas para desenvolver esses trabalhos, como é o caso
do Zoo de São Paulo, e outros que tem funcionários que fazem isso
paralelamente ao seu trabalho de veterinária e de biologia, para pro-
mover o bem-estar dos animais. Eles estudam o comportamento da-
quela espécie, como ela está interagindo no ambiente em cativeiro,
vendo os níveis de estresse e introduzem técnicas, como as de enri-
quecimento ambiental, social e cognitivo, para diminuir esses níveis
de estresse.
O cuidado que muitos zoológicos têm tido em relação a isso, para
que o público não influencie tanto na qualidade de vida do bicho é
propiciar bons recintos, que representem bem os seus respectivos
habitats naturais, cada vez melhor ambientados, com pontos de fuga,
para que, quando o animal não quiser ficar exposto ele tenha essa
opção, com vidros que façam o isolamento acústico, e trabalhando
paralelamente com o comportamento do bicho através desses estu-
dos comportamentais que mencionei.
Basicamente, em poucas palavras, é isso, porque não dá para se
alongar muito, temos trabalhado dessa forma, lembrando também
que existem picos de horários de visitação, ou seja, as pessoas não
estão todas no parque ao mesmo tempo, isso é rotativo. Então 20 mil
pessoas passam ao longo do dia pelo Zoológico, por isso fica difícil
estimar a capacidade limite desses parques, essa capacidade estaria
mais relacionada a prestação, com qualidade, de serviços para os vi-
sitantes do que ao bem-estar animal. Obrigada. ”

Mediadora:

“Nós agradecemos mais uma vez a professora Kátia. Peço des-


culpas, mas tem debates que se alongariam muito, tem muita coisa
interessante para discutir, mas realmente o tempo é um problema
aqui. Agradeço todo mundo que participou da discussão.

93
94
Quarta Palestra
Museu da Língua Portuguesa

Marina Sartori de Toledo

Licenciada em Artes pela Fundação Armando


Alvares Penteado, a FAAP, e Mestre em Artes e
Teatro pela Escola de Comunicação e Artes da USP.

Coordenadora do Núcleo Educativo do Museu da Língua Portuguesa.

Foi professora de artes, teatro, história da arte


em diversos colégios de São Paulo.

Atua na área de exposições e museus desde 2004, coorde-


nando projetos educativos e formação de mediadores e pro-
fessores em exposições temporárias e itinerantes.

Trabalhou ainda como Assistente Educativo do Museu Afro Brasil.

Gostaria de agradecer o convite. É um prazer estar aqui, é sempre


muito bom trocar ideias com as pessoas, eu gosto muito disso.
Quando eu recebi o convite para falar sobre por que é importan-
te os professores levarem os alunos ao Museu da Língua Portugue-
sa, eu falei ‘não vai rolar’, porque o incêndio chegou antes de vocês,
de quem não visitou ainda. O Museu está fechado para restauro e
reconstrução do prédio porque, em termos físicos, foi bem grande

95
o prejuízo, mas como nós tratamos da língua, que é imaterial, não
perdemos a língua, nem o acervo. E por isso posso estar aqui conver-
sando sobre o tema com vocês.
Aliás, uma das coisas que o nosso diretor costuma sempre falar é
que talvez o Museu da Língua Portuguesa seja único em que cada vi-
sitante é também parte do acervo, pelo que traz da língua portuguesa
dentro de si. Eu então escolhi focar em como é que nós trabalhamos
com a língua portuguesa, porque um pouco como a Alessandra ti-
nha dito, também não acredito que um seja complementar do outro,
pelo menos não da maneira como é colocada, mas eu acredito que
todo espaço é um espaço educativo, antes de mais nada, a rua é um
espaço educativo, a diferença desses espaços é como eles trabalham
e de que forma você potencializa essa educação.
A experiência de alguém com um objeto, por exemplo, um smar-
tphone hoje, uma pessoa pode simplesmente pegar aquele objeto e
usar como um telefone, teclar como discava antigamente e falar, ao
passo que a gente pode cutucá-la, desafiá-la a descobrir a imensa
potencialidade que tem dentro daquele micro aparelho, acho que é
muito nesse sentido que a gente trabalha a questão da educação.
Dentro disso, o museu trabalha a partir de três premissas. Uma
premissa é a língua como um objeto cultural, a língua como algo
normativo - esse já tem espaços formais de aprendizagem que tra-
balham - então optamos por trabalhar com a língua como objeto
cultural.
A segunda premissa é a questão da experiência. Jorge Larrosa
Bondia é uma pessoa que vale a pena conhecer, ele fala que a expe-
riência é o que nos passa, o que nos toca, o que nos acontece, que
é diferente do que passa, do que acontece, do que toca. Um pou-
co já foi falado aqui, por exemplo, quando a Alessandra trouxe essa
questão da relação com o animal. Claro que existem N maneiras de
trabalhar essa relação, a informação é importante, mas a experiência
ainda é uma coisa fundamental, acreditamos nisso.
E a terceira premissa, é a questão do lúdico. Quando cheguei hoje
cedo alguém estava falando que o conhecimento não é brincadeira,
que a visita não pode ser brincadeira. Lúdico não é brincadeira, lúdi-
co é um estado. O homem é lúdico praticamente por natureza, é cul-
tural, mas a gente pode dizer que é quase por natureza. O sexo entre

96
os homens é lúdico, você não copula para reprodução simplesmente,
então ele é lúdico, é um estado, é um clima que se forma.
Neste momento a gente está aberto, muito mais do que quando
estamos sentados, por exemplo, numa sala de educação formal, e
essa foi uma das coisas que eu aprendi com as ciências. A minha
área é de artes e de teatro, mas lendo um livro, quando eu dava aula
para pré-escola, que fala sobre o conhecimento físico na pré-escola
e que traz isso, o lúdico nas experiências infantis. A partir daí eu
comecei a desenvolver todo o meu trabalho em cima do lúdico e da
experiência.
Hoje tenho um ex-aluno que é um chefe de cozinha, que começou
seu desenvolvimento quando ele tinha 4 anos de idade. Ele ia para
oficina de artes, que eu tinha e trabalhávamos com diversas lingua-
gens e uma delas era a culinária, exatamente por causa de química e
física, que eu achava importante. A gente trabalhava para fazer um
bolo, eu contava uma história, onde a farinha tinha uma personali-
dade que era diferente do ovo e do leite, e todos eles junto criavam
o bolo. Só para simplificar, o fermento, por exemplo, não gostava de
ir na montanha-russa com os outros, então os outros iam no chapéu
mexicano e na montanha-russa, mas ele ficava quieto, ele só entrava
na brincadeira depois. Tudo isso para dizer que há dois meses atrás
eu encontrei esse chefe e ele falou ‘eu faço experiências hoje em dia
na culinária, na gastronomia, por causa das brincadeiras que nós
fazíamos na sua oficina, eu acho que exploro e me desafio hoje a
buscar novas soluções na gastronomia por causa daquilo’. Isso tudo
para defender o lúdico, o lúdico não é inconsequente, ele é um es-
tado muito importante para se trabalhar o conhecimento também.
Então esses são os três pilares que trabalhamos no museu. O pró-
prio espaço do museu já foi concebido como um espaço lúdico e
muito próximo de como a gente aprende o português. Nós sempre
perguntamos para as pessoas quando chegam lá ‘onde você apren-
deu o português? ’. ‘Ah, na escola’. ‘Mas antes disso você não falava
português?’.
Claro que a escola é fundamental para trabalhar a norma, o que
permite a gente brincar com a língua é exatamente porque ela tem,
usando uma metáfora, uma espinha dorsal e um corpo de músculos
que a sustenta, por isso podemos brincar com ela como um ginasta
pode fazer o que faz em uma ginástica olímpica e tudo o mais.

97
Proporcionamos para as pessoas vivências que as façam refletir
sobre a língua, porque nós, como acabei de falar, aprendemos a lín-
gua no dia a dia, e o museu procura sempre em suas expografias com
que a pessoa possa ler, ver e ouvir, porque isso também são formas
de como percebemos a língua.

Qual então o papel do educador? É fazer com que as pessoas pa-


rem para refletir sobre essa língua que ele está usando, e perguntar,
‘mas por que isso acontece dessa maneira? Por que esse fenômeno é
assim? Qual a relação entre língua e cultura, que vão se construindo
o tempo todo? ’. Esse é o nosso trabalho e para mostrar isso, como
não temos o museu, eu trouxe a nossa plataforma educativa na inter-
net - http://estacaoeducativomlp.com.br/

A primeira coisa: ‘Como fazer uma página na internet que seja


para criança, pesquisador, professor, visitante espontâneo, estrangei-
ros? ’ Tem muito estudantes dos Estados Unidos, da Rússia – atual-
mente o segundo maior público da plataforma é da Rússia - pessoas
que querem aprender o português. Nós optamos então por um mapa
de metrô onde cada linha discute alguns assuntos. A linha de jogos,
da língua portuguesa, a linha do educativo, linha de vídeos, e cada
uma tem algumas estações.

Só para dar uma ideia dessa questão do jogo, um jogo bem sim-
ples. A língua se aprende primeiro pela oralidade, concordam? Como
é que uma criança pode perceber isso, e mesmo um adolescente ou
adulto? A gente brinca de telefone sem fio. A palavra ‘bagunça’ veio
do Kikongo, uma língua africana onde se pronuncia bulum ungum
unzá, como é que vira ‘bagunça’? É só brincar de telefone sem fio!
E as pessoas vão percebendo isso. Uma das questões, não é a única,
mas é um começo para daí se trazer a conversa e reflexão.

Vou mostrar rapidinho a partir do jogo ‘Na Mosca’, nós começa-


mos com ele fisicamente no museu. Deu tão certo para as pessoas
entenderem essa relação entre língua e cultura que levamos para a
internet. http://estacaoeducativomlp.com.br/jogos/namosca/

Vou fazer um jogo rápido com vocês. Por exemplo, ‘pendurar as


chuteiras’, ‘chutar o balde’ são expressões populares para representar
ideias de forma figurativa, são expressões geralmente deslocadas de
contexto, que ganham novos significados. ‘Pendurar uma chuteira’
98
não tem a ver com futebol só, quer dizer se aposentar ou desistir de
um jogo.
Então vamos lá. É um jogo da forca. O jogo é randômico e caiu
um dos mais difíceis. É uma expressão popular. Quem vai brincar?
Tem dica: as nuvens. ‘Estar com a cabeça nas nuvens’. Mais um só.
‘Cartas na mesa’.
Alguém já parou para pensar por que ‘cartas na mesa’? Ou por
que ‘estar com a cabeça nas nuvens’ foi escolhido por tanta gente
para querer dizer ‘estar distraído’? Tem um outro ‘chá de cadeira’, se
você fala isso para um estrangeiro ele chora de rir. ‘Chá de cadeira’
não faz sentido, não é verdade? Mas tem um sentido: alguém sabe
a origem do ‘chá de cadeira’? Numa festa ninguém te tira para dan-
çar, isso é de uma época onde as pessoas esperavam ser tiradas para
dançar, hoje em dia todo mundo dança junto. Olha como é cultural,
e tem essa relação, e, no entanto, as pessoas usam essas expressões e
não sabem de onde vem.
A ideia do jogo é sempre mostrar isso, que relação sempre tem
entre a língua e a cultura. Nós temos outro jogo, com toponímias,
sobre a influência do Tupi. http://estacaoeducativomlp.com.br/jo-
gos/tupituba/
Por que repetimos muito nesse jogo palavras com ‘ita’ ou com
‘pira’? Pensando nas crianças principalmente, na fixação. Aí temos,
por exemplo, Itarema. Itá é pedra. Então aqui tem pedras, no plural.
E ‘rema’, alguém sabe? Rema é fedorenta - ‘Pedras fedorentas’. Itare-
ma é o nome de um município do Ceará. Vamos escolher uma outra
palavra no jogo que tenha ‘rema’. Ibirarema – já sabemos que ‘rema’
é ‘fedorenta’. O que seria ‘ibiá’? Árvore. Ibirarema quer dizer árvore
fedorenta e é o nome de um município aqui do estado de São Paulo.
Então com esse jogo e a repetição, vamos trazendo para as pessoas
essa relação forte da língua Tupi com o espaço geográfico e com a
natureza, na criação das toponímias e a influência dessa língua na
língua portuguesa.
Novamente, é claro que o jogo é só um princípio. Por exemplo,
pensando no Tupi, ele representa principalmente qual universo de
palavras da língua portuguesa? Flora e fauna. Por quê? Porque os
índios habitavam aqui e eles quem sabiam os nomes das plantas,
animais e nomeavam os locais. Essa reflexão que fazemos com as

99
crianças pequenas inclusive, e eles vão aprendendo essa relação en-
tre língua e cultura.
Agora pergunto a vocês. Palavras do universo cotidiano, vou falar
algumas e vocês vão me dizer da onde vem e porquê. Cafuné, den-
go, moleque, quindim e bunda? São africanos. Por que esse universo
cotidiano veio das línguas africanas? Por que essas entraram para
o português brasileiro? Era a ama de leite, aquela que cuidava das
crianças, conversava com elas, ela que passava a língua e a linguagem
para a criança, e também na cozinha, com a dona de casa. Essa rela-
ção é muito imbricada entre língua e cultura, e isso o Museu conse-
gue trabalhar, esse é um espaço para essas discussões.
Último exemplo na plataforma, mais relacionado à própria língua.
http://estacaoeducativomlp.com.br/linguaportuguesa/vocesabia/
No ‘Você Sabia’ cada um destes posts - já trazendo uma palavra que
nós já incorporamos na língua portuguesa - são do nosso facebook
e são feitos por educadores do Museu, cada um saía num dia da se-
mana, e depois colocamos na plataforma. Nós discutimos a língua
assim: ‘O que é uma língua? Nessa sequência vamos chamar você
para refletir sobre essa questão’. Isso no Museu conversávamos com
o visitante e adaptamos para a internet.
‘Vamos começar pensando o português falado no Brasil como
uma língua viva em constante transformação. A cada novidade entre
os seus falantes, uma novidade aparece na língua. ’
1. ‘A língua é um fenômeno mental, é difícil a gente imaginar algo
sem ter uma palavra que o denomine, ela também tem a personali-
dade daquele que a usa. Preste atenção ao jeito das pessoas falando,
feche os olhos e escute, tente reconhecer as pessoas pelo seu modo
de falar. ’
2. ‘A língua é comunicação, formal, informal, com gírias, expres-
sões idiomáticas, palavrões etc., língua é comunicação. Já percebeu
que na internet muitos brincam com a língua e nem por isso prejudi-
cam o que querem comunicar. ‘Gente, o que tá aconteceno na minha
vida? ’
As influências, que acabamos de falar, por exemplo, a influência
africana: acarajé, bagunça, cafuné, dengo, quindim etc. A língua
como um fato social, ela é nosso melhor retrato, conversamos sobre
isso, também com o s jovens.
100
Evanildo Bechara, linguista e filólogo membro da Academia Bra-
sileira de Letras, diz que ‘língua. ’. É você saber falar com o código do
grupo com o qual está se relacionando. Se eu vou à uma entrevista
de emprego ou a uma reunião formal dentro da universidade, o meu
código é um, se eu estou sentado em um bar, batendo papo com
amigos, o código é outro, se eu estou na internet, ou no WhatsApp,
o código é ainda um terceiro ou quarto, por isso ele diz ser poliglota
em nossa própria língua.
Como tínhamos pouco tempo, eu trouxe só algumas provocações
para mostrar porquê museus, escolas e centros culturais, entre ou-
tros são espaços de aprendizagem, mas que dependem sem dúvida
nenhuma de uma proposta educativa, e de pessoas formadas para
isso. Formadas eu digo, em formação continuada também, o Gabriel
acabou de falar isso aqui, de ir formando pessoas no trabalho, além
da formação inicial.
Então é isso, eu acho que temos que saber usar esses espaços de
aprendizagem e tem uma coisa fundamental, são sim espaços de la-
zer como a Kátia falou. E isso é uma coisa que discutimos constan-
temente com educadores dos museus, os mediadores, é um espaço
de lazer cultural, mas é um espaço de conhecimento e que a gente
pode aprender e muito, só depende de como a gente trabalha isso
também. Obrigada! ”

Mediadora:
“Nós agradecemos a Marina pela palestra e vamos agora às ques-
tões. Quem gostaria? ”

Participante Pablo:
“Oi, eu sou o Pablo, e eu fiquei com uma dúvida de que você falou
o que é exposto no Museu é a língua, que é um bem imaterial, só que
aí tem muita coisa que você poderia colocar a respeito da língua.
Como vocês fazem essa seleção? ”

Marina:
“Isso foi uma forma bem enxuta de falar. Qualquer museu, qual-
quer espaço é sempre um recorte. O que o museu procurou fazer foi
trabalhar a partir do enfoque de que a língua é identidade.
Ele tem algumas linhas curatoriais. Primeiro a língua como iden-
tidade e diversidade, o que nos une como língua, desde a forma-
ção e o que nos diferencia, os regionalismos. Tínhamos uma linha
101
do tempo que era mais tradicional, com leituras, imagens e vídeos,
mostrando a construção da língua. E um mapa dos falares que se
você clicava por região, você ouvia as pessoas falando, e elas também
estavam, por exemplo, comendo tacacá, e nisso eu estou falando da
diversidade, os sotaques culturais e os sotaques da língua.
Outra linha curatorial, a da universalidade da língua, de como
ela contém outras também nessa construção, para isso tínhamos o
Beco das Palavras, um jogo de etimologia, que você tinha que juntar
partes, formando uma palavra que existia e era mostrado de onde ela
veio, como ela havia se formado. A antiguidade da língua também
podia ser percebida nesse jogo.
Também tínhamos a parte de literatura, a ‘Praça da Língua’, um
espaço que muita gente comparava com um planetário porque era
uma imersão na língua que trazia o som, o ritmo da língua portu-
guesa, com trechos de obras de nossos escritores, músicas etc.
Enfim, o museu abordava de várias formas a questão da língua
como um objeto cultural. Não trabalhávamos na exposição do museu
a abordagem normativa, mas com os visitantes, às vezes quando apa-
recia, sim.
Muita gente fala, ‘mas como você vai congelar uma língua, e a
língua que está na rua hoje? ’, esse era o papel do educador. O Mu-
seu mostrava as gírias da década de 20, 30, 60 e nós, nas mediações,
trazíamos para o dia a dia, para a fala do cotidiano. Nós também
fazíamos intervenções no saguão da Estação da Luz, a estação de
trem onde o Museu se localiza, e de lá coletávamos essa fala cotidia-
na, contemporânea e a diversidade, os regionalismos. Por exemplo,
íamos com uma provocação - ‘bolacha ou biscoito’? E as pessoas nos
diziam como falavam em sua cidade ou região e traziam outras ex-
pressões. Então isso já traz a língua do dia a dia, deu uma discussão
imensa no hall da Estação da Luz, onde passa gente de tudo quanto
é lugar do país. ”

Participante Monalisa:

“Meu nome é Monalisa. Sempre fui muito fã do Museu da Língua


Portuguesa. Tem também aquelas exposições temporárias dos gran-
des da língua portuguesa. Eu queria saber se por acaso vocês têm
uma ideia de fazer, ou já estão fazendo, alguma exposição itinerante
do Museu da Língua Portuguesa, para levar para algum lugar e a
gente ir. Era muito rico, eu lembro das imagens, dos vídeos, como se
fosse hoje, eu fecho os olhos e consigo ver aquele museu inteiro, e eu
102
chorei muito quando ele pegou fogo. Queria saber se vocês têm essa
ideia, se já existe, como é que está funcionando. ”

Marina:

“As exposições temporárias traziam esse diálogo com a literatura,


sempre homenageando um autor ou um aspecto da língua portu-
guesa. Mas, temos sim exposições itinerantes. Em abril nós ficamos
um mês em Araraquara com uma exposição chamada ‘Estação da
Língua’. Essa exposição já foi para nove cidades de São Paulo, e o que
procuramos é ir para uma cidade e fazer com que toda a região saiba
que estamos naquele lugar e as escolas das outras cidades possam
trazer seus alunos.
Ela acabou em Campinas, onde recebemos 11.700 visitantes em
um mês, porque a região, não só Campinas, conseguiu mobilizar a
população e as escolas. Aqui nessa região, em Araraquara, foi gran-
de também, eu acho que foram por volta de 7.000 pessoas. Não sou
muito fã de números, mas acho que eles são importantes para dar
uma dimensão.
Temos duas exposições itinerando no momento, a ‘Estação da
Língua’, e a outra chama-se ‘A Origem dos Nomes dos Municípios
Paulistas’. Onde mostramos muitos desses topônimos de Tupi que
falamos há pouco no jogo Tupituba, mas também as outras origens
dos nomes, como personalidades e a questão da fé que nomeia mui-
tas cidades.
Isso, Monalisa, também depende de uma outra questão, a verba.
Essas exposições em especial são incentivadas pelo Proac, mas tem
que ter empresas que queiram patrocinar. Esse é o lado bom dessas
leis de incentivo, as empresas poderem escolher o que querem pa-
trocinar. Qual é o lado ruim? Praticamente nenhuma empresa pa-
trocina com dinheiro próprio, só com isenção de imposto. Com isso
este ano, por exemplo, acabou essa nossa cota das itinerâncias e eu
não sei se continuamos no ano que vem, porque temos também que
buscar patrocínio para a reconstrução.
É certo que ano que vem não teremos, mas sou uma defensora das
exposições itinerantes. Não é fácil itinerar, vocês viram a Tania Cos-
ta falando do museu itinerante da UFMG com o caminhão. Como
ela disse, abre um edital e todo mundo corre atrás, porque é o único

103
jeito que temos de conseguir recursos. Além da própria montagem,
sempre vai uma equipe para fazer formação dos mediadores no lo-
cal. Sempre preferimos formar pessoas no local, porque eu acredito
nisso também, nesse irradiar, no fator multiplicador desses conheci-
mentos que as itinerâncias propiciam.
Enfim, eu acho fundamental que aconteça, mas por enquanto
acho que vamos parar um pouco, pelo menos um ano.

Participante Adilson:
“Boa tarde Marina, excelente a sua apresentação do Museu. Meu
nome é Adilson, eu sou da Universidade Federal de São Carlos e
também sou um fã do Museu da Língua Portuguesa. Posso dizer que
o Museu também foi muitas vezes inspiração para alguns dos pro-
jetos que a gente realiza de divulgação científica, acho que foi uma
ideia sensacional, uma coisa eu diria inédita, a nível de Brasil, não
sei a nível mundial, mas uma coisa que é tão chata às vezes para as
pessoas, a questão da língua. Da mesma forma que as pessoas acham
a matemática chata para ensinar, gramática também não precisa ir
longe que também fica no mesmo pé. E mostrar o lado belo da nos-
sa língua que é única, fantástica, com diferentes sonoridades é uma
imersão fantástica naquele espaço. Espero que logo vocês consigam
voltar, mais modernos, mais avançados. Tem aqueles males que vem
para o bem. ”

Marina:
“Não deixa de ser um privilégio, quantas instituições depois de
10 anos podem parar para olhar para si novamente? Fazemos isso
caminhando, e nesse caso pudemos parar, avaliar e rever, para re-
construir. ”

Participante Adilson:
“A minha pergunta é a seguinte, no Museu algumas destas expo-
sições físicas, a Praça da Língua realmente é uma experiência fan-
tástica, é o lugar que eu mais gostei, acho que é o melhor lugar do
Museu. Mas o Museu tenta trabalhar com uma espécie de narrativa
da própria língua quando você monta a exposição contando a histó-
ria da língua, a própria origem da língua e depois chegando algumas
coisas com elementos culturais mais recentes.
Acho que a última vez que estive lá era perto da época da Copa do
Mundo e acho que o Museu tinha feito alguma coisa especial falando
da linguagem com o futebol, não me lembro bem da exposição. Eu

104
queria saber na sua opinião, como você encara essa questão de fazer
essa divulgação dentro de uma narrativa, dentro de contar uma his-
tória, essa é uma preocupação ou isso surge normalmente das pro-
postas de exposições que vocês fazem? ”

Marina:
“O próprio Museu, como eu estava respondendo aqui, tem sem-
pre uma curadoria e com isso existia uma preocupação didática
também de mostrar um pouco como a língua se constrói. Quando
a gente trabalha com a linha do tempo da língua portuguesa, mas
começando lá no indo-europeu, ela tem, sem dúvida nenhuma, uma
narrativa que está lá colocada e não dá para trabalhar todas porque
é um universo imenso.
A intenção é, como nunca se esgota uma narrativa, você nunca
consegue abarcar o todo, a ideia é sempre que, tanto as exposições
temporárias quanto o trabalho do educativo, crie essas outras dis-
cussões e narrativas. Por exemplo, uma discussão que estamos tendo
agora, algumas pessoas criticavam, educadores inclusive, que a lín-
gua nunca é tão passiva assim. Há conflitos, guerras, tem poder, a
língua é poder, e muita gente questionava isso não ser colocado.
Tem uma outra coisa que é linda também quando pensamos em
discursos narrativos, se a gente conseguir fazer um diálogo entre
museus. Um museu de história e o museu da língua, que fala da lín-
gua e da relação entre os dois acervos, se constrói o conhecimento.
Mas, é um trabalho do educativo ou das exposições que trazemos.
Por isso é que queria mostrar que nós temos no Educativo essa nar-
rativa de “atualização” da língua, a gente traz na ponta da língua
discussões, mimimi, streaming, ‘vida longa e prospera’, ‘delação pre-
miada’ ... Estamos sempre atentos ao que acontece nas redes sociais,
por exemplo. Assim que surge uma expressão, algo que virou meme,
os educadores incorporam em sua mediação, discutindo significado,
criação, esse processo cultural e dinâmico da língua. Isso é o que eu
acho que são as narrativas que a gente vai criando e é fundamental
que se crie essas outras narrativas, exatamente para você não con-
gelar a língua dentro do museu, mas ela depende do trabalho do
educativo e das exposições. ”

Mediadora:
“Nós agradecemos a professora Marina pela sua palestra. Peço
desculpas, mas infelizmente temos nosso horário.
Gostaria de agradecer também a todos que participaram da dis-
cussão e agora nós vamos fazer uma pausa para o coffee break.
105
106
Segunda Mesa Redonda
Interação entre Espaços Não Formais e
Escolas em São Carlos
Primeiro expositor

O Laboratório Aberto de Interatividade (LAbI)


da UFSCar

Adilson Oliveira (LAbl/UFSCar)

Doutor em Ciências, Física da Matéria Condensada, UFSCar.


Fundador e coordenador do Laboratório
Aberto de Interatividade, o LAbI da UFSCar,
Professor titulas do Departamento de Física da UFSCar
Vice-reitor da UFSCar, com o mandato até novembro de 2016.

“Boa tarde a todos, com grande prazer eu volto hoje ao CDCC.


Eu comecei a fazer divulgação científica aqui na CDCC quando
eu era estudante de graduação da UFSCar. Fui trabalhar no Obser-
vatório da USP, hoje Observatório Dietrich Schiel. Tenho que lem-
brar da importante influência do Prof. Schiel naquela época em que,
ainda como estudante de graduação, iniciei a minha trajetória na
divulgação científica no Observatório. Eu vim fazer o curso de Física
porque queria me tornar astrônomo e a oportunidade de trabalhar
com isso em São Carlos foi uma benção para mim. Graças também
ao Prof. Valter, que era o coordenador do Observatório na época,
que foi sempre um grande incentivador desde a primeira vez que
cheguei lá, me orientando a como fazer uma boa palestra. Fui aco-
lhido de braços abertos e posso considerar que isso foi muito impor-
107
tante para toda a minha carreira, principalmente nas minhas ativi-
dades de divulgação científica.
Gostaria de começar mostrando para vocês um pouco do nosso
trabalho no Laboratório Aberto de Interatividade (LAbI/UFSCar),
onde desenvolvemos diversas metodologias de divulgação científi-
ca. São muitas atividades que lá realizamos desde a sua criação em
2006, mas não vou ter tempo para apresentar tudo isso para vocês
e também porque foge do escopo do encontro de hoje. Contudo, eu
queria apenas mostrar alguns dos nossos projetos realizados nos úl-
timos 10 anos. O ponto principal sempre foi fazer uma ponte entre
artes, ciência e, principalmente, com a cultura científica. Ao longo
do tempo trabalhamos com instalações interativas, programas de rá-
dio, vídeos, mídias sociais entre outras atividades.
O LAbI faz parte do projeto CDMF - Centro de Desenvolvimen-
to de Materiais Multifuncionais, que é um dos CEPIDs da Fapesp,
sendo o LAbI é um dos laboratórios associados a esse Centro, pois
uma das principais missões dos CEPIDs é fazer a difusão e divulga-
ção do conhecimento. O LAbI desenvolve diversos projetos simulta-
neamente como a produção de vídeos como Click Ciência, Ciência
Explica, Quebra-Cabeça. Esses vídeos são produzidos em um estúdio
de TV, que foi um investimento do CDMF. Além disso, trabalha-
mos com instalações interativas, programas de rádio e o museu a céu
aberto Caminhos do Conhecimento, que é uma importante e inova-
dora proposta que estamos desenvolvendo na UFSCar.
As instalações interativas têm o propósito de fazer com que o in-
divíduo tenha uma imersão no espaço não formal, e a partir disso,
tentar despertar do interesse pela ciência.
A primeira instalação interativa que fizemos foi Escalas: uma jor-
nada entre infinitos, montada em 2007. A partir da metáfora da luz
como a forma de vermos o mundo, o indivíduo conseguia fazer uma
viagem das galáxias até o universo nanométrico. Essa exposição foi
montada a primeira vez em 2007, na praça Coronel Salles e depois
tivemos a oportunidade de mostrá-la em outros lugares, inclusive no
Parque do Ibirapuera em São Paulo. A ideia dessa instalação é fazer
as pessoas saírem das galáxias que estão na escala de 10 24 metros e
chegar na escala de 10-10 m, que é a escala dos átomos e da mecânica
quântica. A partir disso o indivíduo interage com o vídeo projetado
com uma lanterna viajando entre diferentes escalas e fenômenos que
108
estão na natureza e em criações humanas. Enquanto a lanterna subia
e descia, em terminais de computadores pequenos links eram aber-
tos para que outras pessoas acessassem conteúdos específicos. Por
exemplo, quando aparecia no vídeo um ‘caramujo’ os links podiam
exibir uma receita de escargot.[1]

Figura 1 – Instalação Escalas: uma jornada entre infinitos – apresentada a primeira vez em
outubro de 2007

Após essa instalação desenvolvemos mais algumas e a última que


realizamos foi a “Memória de um Carbono”. A ideia dessa instalação
foi fazer uma narrativa ao longo de 6 bilhões de anos. O carbono
narra em primeira pessoa o seu nascimento numa estrela há bilhões
de anos e vai contando toda a sua história, toda a sua evolução até o
momento em que ele acabou de sair do nosso nariz, quando expira-
mos o CO2. O mesmo átomo de carbono que acabamos de expirar
foi criado há 6 bilhões de anos em uma estrela que já morreu.
O conceito dessa instalação partiu de um texto que escrevi para
a Ciência Hoje[2]. A narrativa foi construída de forma que quando
o indivíduo adentra na instalação, por meio da tecnologia interativa
109
do Kinect, que capta os movimentos, principalmente das mãos per-
mitindo que se controle um jogo no qual uma espaçonave que parte
da praça Coronel Salles de São Carlos e vai para o espaço buscar o
Carbono nos corpos celestes. Depois ao voltar para a Terra os indi-
víduos fazem uma viagem no tempo, procurando encontrar o átomo
de carbono ao longo da História, desde da época dos dinossauros até
os dias de hoje.

Figura 2 – Instalação Memórias de um Carbono apresentada pela primeira vez em outubro


de 2011

A primeira exposição da instalação foi em outubro de 2011 e nas


suas diversas apresentações atingiu mais de 20 mil visitantes. A úl-
tima vez que foi exibida foi na SBPC que ocorreu em São Carlos em
julho de 2015. Durante a SBPC ela teve mais de 1.500 visitantes ao
longo de toda a semana em que ela foi exposta.
Como uma outra alternativa de um espaço não formal de divul-
gação e de aprendizado, temos trabalhado o uso do rádio como veí-
culo para divulgação científica. Temos desenvolvendo programas de
rádio desde 2009. Está no ar, desde essa época, o programa Paideia
na rádio UFSCar em 95.3 MHz, que vai ao ar todas as terças-feiras,
das 18h às 19h, que a partir de maio de 2017 também é veiculado na
forma de videocast nas redes sociais do LAbI e do CDMF [3]. E esse
110
programa é onde discutimos a cultura científica, tratando temas de
ciências e tecnologia.
Dentre as nossas experiências de divulgação, que considero uma
das mais interessantes já realizadas pelo LAbI foi a criação radio-
novelas. A nossa experiência melhor sucedida foi “Verdades In-
ventadas”. O roteiro de Verdades Inventadas ganhou o prêmio Ro-
quette-Pinto de Rádio dramaturgia que financiou a produção dessa
radionovela. Verdades Inventadas conta as histórias de Laura, uma
garota de 15 anos de idade, do primeiro ano do ensino médio, que
no primeiro episódio tem um novo professor de língua portuguesa
e literatura. Esse professor estimula os seus alunos a realizarem via-
gens imaginárias a partir da sua leitura ou mesmo das suas histórias.
A radionovela tem 37 episódios de 10 minutos, em que a Laura
vai visitar os mais diferentes personagens da história da ciência como
Einstein, Newton, Kepler, Oswaldo Cruz, Clarice Lispector entre
tantos outros. As histórias dos episódios formam um arco, dentro
da temática do tempo. O primeiro episódio fala justamente do en-
contro dela com o viajante do tempo e no último episódio ela vai
fechar essa história toda do tempo encontrando Einstein, Newton e
Stephen Hawking, que podem ser ouvidos no site do LAbI. Verda-
des Inventadas é uma rádio dramaturgia que também se desenvolve
na internet, pois a Laura relata as suas viagens imaginárias em um
blog, www.viagensdalaurawordpress.com. No blog as pessoas con-
versavam com a Laura, mandavam mensagens, trocavam ideias so-
bre as suas viagens imaginárias. No blog a Laura tem uma amiga,
a Patrícia. A Laura tem um amiguinho chamado Marquinhos que
paquera um pouco a Laura. Tem um pouco de tudo nessa história e
foi uma experiência muito interessante porque teve uma repercus-
são muito boa. Primeiro porque a gente estava ressuscitando uma
forma de narrativa antiga; segundo porque nós estávamos colocan-
do o tema sobre ciência; e terceiro, com a tecnologia que você tem
hoje no computador, você cria um ambiente sonoro, permitindo um
exercício da criatividade para ver isso.
O blog “Viagens da Laura” em 2013 concorreu como melhor blog
de língua português num prêmio da Deutsche Welle, ficando em se-
gundo lugar, com quase 150 mil votos na competição, justamente
por causa dessa narrativa diferenciada que a gente fez [4].
Finalmente, o nosso último projeto foi transformar a UFSCar em
111
um museu de ciência a céu aberto. O conceito se baseia em transfor-
mar o local no qual se produz Ciência em também um local no qual
se divulga a Ciência.
O museu “Caminhos do Conhecimento”, desenvolvido pelo LAbI/
UFSCar, oferece outras possibilidades de mediação entre diferentes
públicos e o conhecimento científico, para além das já consolida-
das em museus e centros de ciência tradicionais [5]. Para tanto, o
projeto propõe itinerários sobre as ciências a serem percorridos no
campus da Universidade. Tais itinerários são indicados por placas de
sinalização do projeto que, além de apresentarem textos de grandes
cientistas e pensadores, contêm QR code (códigos gráficos que dire-
cionam a sítios na Internet) que permitem o acesso – com o uso de
dispositivos móveis, como celulares e tablets – a conteúdos em vídeo
e textos produzidos exclusivamente para o museu, relacionados às
áreas científicas dos locais onde se encontram. Ao acessar o código
pela primeira vez, o aplicativo do projeto inicia um guia pelo itinerá-
rio escolhido, indicando os próximos pontos a serem visitados.
O museu também prevê o oferecimento de visitas guiadas, nas
quais os participantes podem visitar os laboratórios da Universida-
de, conhecendo, para além de onde e de como a ciência é produzida,
também quem a produz. O primeiro itinerário, já em funcionamen-
to, é denominado “Trilha Epistemológica” e passa por 17 pontos
narrando a história das diversas áreas de conhecimento presentes na
Universidade.
O próximo itinerário a entrar em funcionamento será a “Trilha
da Luz” que foi financiado por meio de um edital do CNPq/TIM,
onde os professores da rede estadual do ensino fundamental vão fa-
zer o que a gente chama de ACIEPE (Atividade Curricular Integrada
de Ensino, Pesquisa e Extensão). Eles irão fazer essa atividade conos-
co e vão aprender a produzir vídeos sobre ciência, que vão construir
uma trilha da luz dentro do nosso museu.

112
Figura 3 – Museu “Caminhos do Conhecimento” da UFSCar outubro de 2011

Finalizando, no LAbI usamos diferentes estratégias de divulgação


científica, ligando elementos culturais como vídeos, artes, progra-
mas de rádio, levando a perspectiva interessante para a dissemina-
ção do conhecimento, sempre tentando fazer uma construção disso
de maneira colaborativa com diferentes atores de todas as áreas do
conhecimento.
No site do LAbI pode se encontrar quase todos os projetos cita-
dos, além de outros como o Click Ciência, que são entrevistas sobre
divulgação científica, Quebra-Cabeças são vídeos pequenos sobre
ciência, Ciência Explica são agora pequenos vídeos voltados para
crianças nas séries iniciais.
Essas atividades são realizadas por uma equipe multidisciplinar
que envolve jornalistas, profissionais de imagem e som, e estudantes
de computação, de física e de biologia entre outros, permitindo que
o nosso laboratório seja um ambiente jovem e animado.
Todas essas atividades somente são possíveis de se realizar com o
apoio financeiro principalmente da Fapesp, dentro do projeto CE-
PID/CDMF, CNPq e a Pró-Reitoria de Extensão da UFSCar.

Referências
[1] Instalação Escalas: Uma Jornada entre infinitos – Laborató-
rio Aberto de Interatividade para a Disseminação do Conhecimento
Científico e Tecnológico –http://www.labi.ufscar.br/2016/06/17/ins-
talacao-escalas/ - acessado em 18/07/2017

113
[2] A. J. A. de Oliveira – Memórias de um Carbono – Ciência Hoje
on-line - http://www.cienciahoje.org.br/noticia/v/ler/id/2823/n/me-
morias_de_um_carbono. acessado em 18/07/2017
[3] Programa Paideia - Laboratório Aberto de Interatividade para
a Disseminação do Conhecimento Científico e Tecnológico – http://
www.labi.ufscar.br/category/conteudos/paideia-conteudos/
[4] https://viagensdalaura.wordpress.com/escute-aqui-minhas-
-aventuras/ acessado em 18/07/2017
[5] www.caminhos.ufscar.br - acessado em 18/07/201

114
Segundo expositor

Interação das Escolas da Rede Estadual de São Carlos


com Espaços Não Formais

Daniela Isabel Taipeiro

Graduada em Letras, Unesp Araraquara


Mestre em Educação, UFSCar.
Assistente técnico pedagógica da Diretoria
de Ensino da região de São Carlos (formação de professores na área de lín-
gua portuguesa e alfabetização)
Tutora virtual da Universidade Aberta do Bra-
sil no curso de Pedagogia pela UAB UFSCar.

“Boa tarde, primeiramente eu gostaria de agradecer o convite.


Em nome da professora Debora, que a dirigente regional de ensino
aqui da região de São Carlos, ela é membro do conselho estadual de
educação que se reúne regularmente toda a quarta-feira, então hoje
ela está em São Paulo nessa reunião, pediu desculpas por não poder
estar aqui e pediu para que eu a representasse para falar um pouco
sobre como as escolas da rede estadual de São Carlos interagem com
esses espaços não formais
Vou partir do pressuposto que vocês não conhecem a diretoria,
ok? Vou falar um pouco da Diretoria de Ensino para vocês.
A Diretoria de Ensino de São Carlos abrange os seguintes muni-
cípios: Corumbataí, Descalvado, Dourado, Ibaté, Itirapina, Ribeirão
Bonito e São Carlos. Sendo que o número a frente é o número de
escolas estaduais nesses munícios, o maior número está concentra-
do na cidade de São Carlos com 34 escolas. Nós temos também três

115
centros de estudos de línguas, conhecidos popularmente como CEU.
Os segmentos de ensino atendidos por essas escolas vão desde os
anos iniciais do ensino fundamental, as crianças de 6 anos ingressam
no ensino fundamental passando pelo ensino fundamental dos anos
finais, que correspondem do sexto ao nono ano. O ensino médio que
corresponde da primeira à terceira série, e também educação de jo-
vens e adultos que atende tanto o ensino fundamental EJA, quando
ao ensino médio EJA.
A Secretaria de Estado da Educação tem um currículo oficial.
Não sei vocês têm o conhecimento disso, mas ali tem o currículo da
área de ciências da natureza, que abrange as disciplinas de ciências,
biologia, física e química. Esse currículo oficial organiza o ensino
da área de ciências da natureza em quatro eixos temáticos que são:
vida e ambiente, ciência e tecnologia, ser humano e saúde, terra e
universo.
Esse currículo está organizado na forma em que nós chamamos
em espiral, portanto esses eixos se repetem desde os anos iniciais até
o ensino médio mudando a abordagem e o grau de complexidade, o
aprofundamento, o vocabulário mais específico.
Por que estou dizendo tudo isso para vocês? Porque para imple-
mentação desse currículo oficial na rede, há materiais de apoio ao
currículo de subsídio para implementação desse currículo que são
os cadernos do aluno, conhecidos também como as apostilas, e o
caderno do professor onde tem as orientações para o desenvolvi-
mento das atividades que constam no caderno do aluno. Esse é um
dos materiais de apoio.
A Secretaria do Estado da Educação também faz parte do PNLD,
então também tem conta com livros e manuais didáticos, com textos
paradidáticos, além da sala ambiente de informática que todas as
escolas da rede estadual tem, onde é bastante incentivado e estimu-
lado a utilização e acesso a sites, e também um outro instrumento de
incentivo e de apoio a execução desse currículo, é exatamente a visita
a museus, centrais de energia, instalações de interesse científico e
tecnológico que possam constituir importantes estímulos e reforços
a aprendizagem das disciplinas científicas. Aqui está uma foto para
quem não conhece, os cadernos do professor e cadernos do aluno.
Falando especificamente dessas visitas que as escolas fazem a
116
esses espaços que foram citados anteriormente, e outros que vocês
verão que vou citar logo mais, isso tem uma tramitação dentro da
escola, acho importante vocês saberem disso. Não é simplesmente
o professor decidir sair com os alunos e no dia seguinte sair. Nós
temos uma legislação, é tudo pautado no ECA, Estatuto da Criança
e do Adolescente, nós estamos lidando com crianças e adolescentes,
por isso todos os cuidados necessários são tomados para que essas
saídas do ambiente escolar sejam feitas com a maior segurança pos-
sível para os alunos. Tem todo um expediente, um procedimento
que as escolas têm que montar, e elas são devidamente orientadas
para que façam isso da forma correta que aí fica tudo mais rápido.
Chegando para nós essa solicitação de saída com os alunos, é coisa
de um ou dois dias no máximo e eles já tem autorização para sair.
Sempre orientamos e solicitamos que essas visitas estejam pre-
vistas na proposta pedagógica da escola, que não seja a visita pela
visita, ou o passeio pelo passeio, como já foi citado aqui a questão do
lúdico. O lúdico não é a brincadeira por si só, então mesmo que seja
uma visita com essa intenção, tem uma intencionalidade.
Nós solicitamos que essas visitas sejam previstas desde o início
do ano para que haja uma organização por parte da escola e também
para que haja uma interface com o currículo, com os conteúdos que
tem que ser trabalhados. Só para vocês terem uma ideia do que tem
que constar dessa solicitação. Como eu disse para vocês todo esse
procedimento está pautado no Estatuto da Criança e do Adolescen-
te.
Nós chegamos agora a um recorte, quanto ao convite para vir
aqui conversar, algumas escolas de livre e espontânea vontade me
passaram alguns dados. Nós temos aqui um recorte de mais ou me-
nos 10 ou 12 escolas que contaram um pouco dos lugares de onde
elas estiveram entre o ano de 2015 e 2016.
Como 2016 ainda está em curso, então pedimos que elas contas-
sem um pouco das experiências no ano passado também. E aqui es-
tão os locais, podemos dizer um ranking dos lugares visitados pelos
alunos da rede nos anos de 2015 e 2016.
O Parque Ecológico de São Carlos ganha disparado, está aqui
pertinho, acaba tendo essa facilidade do acesso. Feira de Ciências da
USP, o Zoológico de São Paulo, Fazendo Conde do Pinhal, Visita ao
Mineirinho, Fazendo Santa Maria, a Bienal do Livro de São Paulo, o
próprio CDCC, exposições e feiras, principalmente feiras de profis-
sões em universidades aqui da região, Museu Mário Tolentino, Ob-
servatório da USP, Museu da Memória de São Carlos, Caravana da
117
CPFL, Museu da Língua Portuguesa, Museu Catavento, Museu Afro,
Museu Monteiro Lobato, Museu da Imigração e outros.
Por que ‘e outros’? Como eu disse para vocês isso é só um recorte,
não é a totalidade das escolas, então tem outros lugares que foram
visitados também.
Os componentes curriculares dos professores envolvidos, aqui a
gente pode viajar e tirar uma série de conclusões e fazer uma série de
inferências, mas quase sempre, via de regra, é liderado pelos profes-
sores das áreas de ciências da natureza mesmo. Ou professor de ciên-
cias, ou professor de química ou física, são os que mais solicitam são
os que mais solicitam esse tipo de visita/excursão pedagógica como
nós dizemos. Seguidos pelos professores de língua portuguesa e ma-
temática, que uma suposição é, com exceção do Museu da Língua
Portuguesa que acaba tendo essa afinidade com a própria disciplina
de língua portuguesa, quase sempre são os próprios professores de
língua portuguesa que solicitam essa visita, por serem as disciplinas
que tem o maior número de aulas.
São professores que acabam criando um vínculo maior com
a classe por estarem mais tempo com eles e acabam criando esse
vínculo e daí isso de levá-los para outros ambientes. E também os
professores de história e geografia, que tem bastante afinidade com
a área de ciências, essa questão de contextualização, a sociedade e
tudo o mais que está por trás de toda a produção científica. Lem-
brando sempre que é do recorte.
E o que as escolas falaram que perceberam e puderam observar e
até mesmo aferir em termos de avaliação e observação do impacto
dessas visitas, a esses locais, na aprendizagem dos alunos? E aqui são
palavras das próprias escolas:
‘Uma participação mais efetiva dos alunos nas aulas; maior inte-
resse e comprometimento com a disciplina curricular; contextuali-
zação da aprendizagem; envolvimento do aluno com as atividades
práticas, o que gera aprendizado em todos os componentes curri-
culares e não simplesmente aquele alvo da visita; ampliação e apro-
fundamento do currículo; contribuição para o desenvolvimento do
projeto de vida dos alunos; discussão sobre as formas de energia re-
nováveis e não-renováveis, redução de consumo entre outros; cons-
cientização por parte dos alunos quanto aos hábitos em relação ao

118
desperdício; maior interesse pelos alunos em ciências, experimentos
e pesquisa; constatação da importância das ciências em suas vidas; e
estimulação dos docentes e alunos envolvidos a desenvolverem mais
projetos ampliando sua percepção de mundo, história, evolução e
tecnologia.
Eu gostei muito dessa última colocação. E aqui deixo para vocês
também uma frase do Paulo Freire, que na minha humilde concep-
ção, não sou da área das ciências, que diz ‘o que move a humanidade
é a curiosidade’. Então sem a curiosidade que me move, que me in-
quieta, que me insere na busca, não aprendo e nem ensino.
Aqui tem o nosso contato, caso vocês queiram entrar em contato
com a Diretoria de Ensino para estabelecer parcerias. A Debora é
muito aberta, as escolas também podem nos procurar, é algo que nós
fazemos com muito gosto, com muita convicção que é estimular es-
sas parcerias tanto com a instituições formais de fomento à pesquisa
e a ciência, quanto as não formais também.
Muito obrigada! ”

119
120
Terceiro expositor

O Centro de Divulgação Científica e Cultural, CDCC,


Campus de São Carlos da USP

Valter Líbero

Bacharel, mestre e doutor em Física pelo


Instituto de Física de São Carlos/ USP.
Professor do Departamento de Física e
Ciências Interdisciplinares/IFSC/USP.
Atual Diretor do Centro de Divulgação
Científica e Cultural, o CDCC da USP.

“Boa tarde e meus cumprimentos a todos pelo dia de atividades,


que foi realmente muito bom, desses que a gente tem horas e horas
para pensar depois de ouvir tantas pessoas empolgadas com a divul-
gação científica.
Isso nem sempre foi assim. Eu sou de uma época em que divulga-
ção científica não era algo visto com tanto gosto como é hoje, nem
com a importância que ela de fato tem. Na verdade, eu diria que não
se dava importância e nem era vista com bons olhos. O Prof. Adilson
lembrou bem, ao docente que se envolvesse com esse tipo de ativi-
dade, dir-se-ia que ele estaria perdendo tempo! Uma visão que, gra-
ças a Deus, não perdurou, não se sustentou, por uma simples razão
ao meu ver: para você se tornar um pesquisador, ou um professor,
você precisa fundamentalmente de motivação. Em um momento da
vida, principalmente dos jovens, há uma escolha pela carreira a se-
guir. Como é que se faz uma escolha se você não tem informação,
ou exemplos, que permitam que você possa fazer uma boa escolha?
121
A divulgação científica, ou a extensão universitária de um modo
geral, é a melhor forma para se mostrar à comunidade linhas de tra-
balho, ou incentivar jovens a uma carreira profissional, seja na pes-
quisa científica ou na educação básica, particularmente em ciências
em nosso caso, já que em São Carlos as universidades são voltadas
às áreas científicas.
Não sei ao certo como um dia eu escolhi trilhar o caminho da
Física, porque na minha época não havia divulgação científica, ou
pelo menos não numa escala que pudesse chegar até mim, em uma
escola do interior. Hoje nós estamos vivendo, de uma certa maneira,
um momento privilegiado no ensino, apesar de todas as dificuldades
que enfrentamos, pois cada vez mais temos melhores grupos de pes-
soas voltadas a essa atividade.
Mas de qualquer maneira temos que reconhecer que devido ao
esforço de todos nós, hoje temos condições de estimular jovens ou
de mostrar a eles que o caminho do cientista não é aquele do sujeito
que vai colocar o avental branco e se enfurnar dentro de uma sala e
ficar fazendo uma pesquisa que poucos vão saber do que se trata. Ao
contrário, ele poderá partir para uma direção em que ele vai fazer
uma coisa muito importante para a sociedade. Hoje a gente tem essa
capacidade de mostrar aos jovens todas as direções possíveis que ele
pode trilhar e aí o gosto dele é que vai decidir para onde ele quer ir.
Eu me sinto assim hoje, de certa forma muito feliz, que ideais do
passado tenham sido bastante modificadas, graças, como eu disse,
ao trabalho às vezes até muito difícil de todos nós. Eu aqui gostaria
muito de lembrar dois nomes importantes nessa caminhada, que eu
diria que são responsáveis por essa mudança. Uma dessas pessoas
é a professora Yvonne Mascarenhas aqui do meu lado, que poderia
muito bem ser uma dessas pessoas com avental branco dentro do la-
boratório, mas ela, além do laboratório, também sempre esteve pre-
sente nas iniciativas de divulgação científica, haja vista, o programa
Ciência Web e outros que ela se envolve.
Não poderia deixar de citar também o professor Dietrich Schiel,
responsável por toda evolução do Centro de Divulgação Científica
e Cultural, CDCC, pessoa de extrema coragem porque na época de
criação do CDCC era visto com esses olhos de quem está perden-
do tempo fazendo divulgação ou extensão universitária, e a gente
vê hoje que não foi perda de tempo, ao contrário, seu trabalho tem
ajudado muitas pessoas a decidirem o que fazer na sua vida profis-
122
sional.
Gostaria de lembrar que hoje à noite nós teremos aqui no CDCC
o lançamento de um livro que conta a história do CDCC, com de-
poimentos daqueles que ajudaram a construir este Centro. É interes-
sante ver e sentir que instituições são feitas por pessoas, pela história
de cada um, pelo envolvimento e esforço de cada um! Algumas des-
sas pessoas estão aqui presentes no auditório. Acredito que hoje te-
remos uma dessas noites memoráveis com o lançamento desse livro.
Em termos de proposta para a mesa redonda, colocaria a seguin-
te questão: todos nós aqui somos muito entusiasmados com o seu
campo de trabalho e nós temos feito todo o possível para que a di-
vulgação científica seja cada vez melhor. Fazemos o impossível as ve-
zes, dada as circunstâncias orçamentárias das instituições, para que
a gente possa ter um ambiente propício à transferência de conhe-
cimentos. Apesar de todas as dificuldades, acho que a gente evolui
muito bem, todos aqui mostraram uma capacidade bastante grande
em seus trabalhos. Às vezes a gente consegue colocar dispositivos,
caminhões, televisores, etc., a disposição da comunidade, como fo-
ram os exemplos aqui mencionados. O empenho pessoal ficou claro
nas apresentações. Acho que essa parte a gente faz muito bem, mas
eu pergunto o seguinte: será que, mesmo com toda preparação logís-
tica que a gente faz nos centros, como a comunidade está nos vendo?
Vocês entendem que a comunidade hoje nos olha como agentes bem
preparados para fazer a divulgação cientifica, ou não? Será que para
a comunidade é muito importante que sejamos extremamente tec-
nológicos ao fazer a divulgação científica, ou não? Às vezes eu penso
que o esforço que nós fazemos na divulgação científica ou extensão
universitária é enorme perto da resposta que a comunidade nos dá.
Não que isso nos desestimule, mas questiono se os nossos esforços
estão sendo de fato feitos na direção certa. Nós temos o gosto por
fazer divulgação e muitas vezes apelamos para a tecnologia e explo-
ramos até ambientes universitários para implementar as ideias. Será
que isso tudo está na direção certa para a comunidade que vem aqui
esperando alguma coisa de nós? Estamos satisfazendo essa comu-
nidade quando apresentamos resultados ou novidades geradas nos
ambientes universitários? Logicamente, em um dia tão rico como o
de hoje, outras perguntas poderão ser suscitadas também.

123
124
Quarto expositor

O Museu da Ciência Prof. Mario Tolentino

Paulo Milanez

Formado em magistério pelo Instituto de Educação Álvaro Guião,


Foi professor na rede municipal de São Carlos e Ibaté.
Atualmente é coordenador do Museu de Ciência Mário Tolentino.

“Boa tarde. Gostaria de fazer dois agradecimentos muito espe-


ciais. Um à professora Yvonne que me deu a chance de escutar tudo
isso. Não de participar como palestrante, mas de escutar. Como é
gratificante vermos como as pessoas ainda pensam da mesma forma
que pensamos. E segundo, agradecer ao Valter pela acolhida tão ge-
nerosa que nos fez.
Valter, você falou uma coisa no começo que me toca muito. Você
falava que quando chega uma sala a gente se excita, e é verdade.
Quando chega uma sala visitando o CDCC ou o Museu da Ciência,
de fato ficamos excitados, porque isso faz parte da nossa vocação.
Acho que aqui a maioria trabalha com museus ou é professor. E
tanto em uma como a outra a gente tem duas vocações que não po-
dem ser dissociadas. Primeiro temos que amar o que fazemos, e de
fato amamos, porque se não, não faríamos isso. E quem é professor
também ama, porque se não estaria longe, não é Adilson?
E a segunda é ser louco, porque é impossível uma pessoa em ple-
na consciência fazer tudo o que a gente quer fazer. Quando você
perguntava se a sociedade vê com bons olhos isso e está pronta, não
sei.... Talvez até não. Mas se não fizermos agora, as próximas gera-
125
ções vão ser da mesma forma, então fazemos o trabalho de formiga,
começando agora, plantando nessas crianças para que possam de
aqui a alguns anos transformar essa realidade. Alguma hora tem que
mudar isso.
Gostaria também de falar um pouco do Museu da Ciência, por-
que ele é o primo mais novo de tudo isso. O Museu da Ciência está
há quatro quarteirões daqui, para quem não conhece, uma área mui-
to grande, de 2.200 metros quadrados, é um órgão público ligado à
Secretaria Municipal de Educação, e nós recebemos as pessoas sem
cobrar nada. Temos apenas 4 anos.
Há muitas coisas interessantes no Museu da Ciências, apesar de
ter 4 anos, já recebemos quase 130 mil pessoas. Hoje a média é de
120 pessoas por dia, é bastante, considerando o que a gente vê. Eu
diria que 60% das visitas são espontâneas, não de escolas ou agenda-
do, e isso fala muito.
Na verdade, deveria ser o inverso, estamos pronto e somos muito
preparados. No nosso caso, por exemplo, todos os nossos educado-
res são professores. São pessoas que estão acostumadas a lidar com
salas de aula, preparados para receber pessoas de universidades, for-
mandos, doutores, mas também crianças de 4 e 5 anos, que na ver-
dade são os visitantes que mais temos visto surtir efeito. São essas
crianças que entram com uma ânsia tão grande no museu e saem de
lá de olhos brilhantes. Acho que é isso que faz a verdadeira diferença.
Alguns não conhecem a importância de museus e não vão conhe-
cer. Outros vão ver a importância e vão poder mudar a vida de fato
escolhendo a profissão, mudando o rumo da sua vida.
Me lembro, e isso sempre me marca, de uma vez que um senhor
de 60 anos de idade, pedreiro, entrou no museu. Para a contextuali-
zação, faço um parêntese e falo de nossas exposições permanentes.
Uma com 150 experimentos de física, onde as pessoas podem
aprender um pouco de física de forma interativa. Outra, uma expo-
sição de paleontologia, parceria com a UFSCar, que já é referência
nacional, e outra de acessibilidade onde ensinamos ótica para defi-
cientes visuais, em parceria com a USP. Na verdade, o Museu vive de
parcerias, com todos.
No museu prezamos três vertentes: primeiro, mostrar o que nor-
126
malmente não seria visto de ciência e tecnologia; segundo, desmis-
tificar a ciência, porque as pessoas acham que é difícil fazer ciência,
‘física é para louco’, mas hoje mostramos um pouco aqui, o CDCC
faz muito isso também, o que é física no dia a dia, que vivenciamos
física sem perceber; e o terceiro, como a Kátia falava, formação de
professores, nossa obrigação enquanto entidades e museus é a de
ajudar a formar o professor.
O professor sai despreparado para ensinar ciência, ele não sabe
o potencial que tem nas mãos quando tem um museu, zoológico,
Museu da Língua Portuguesa... Ele não tem esse preparo. Não estou
falando mal não, porque eu também sou professor, estou falando da
realidade. Temos obrigação de ajudar a formar o professor.
Voltando, aquele senhor, um pedreiro de 60 anos, esteve na expo-
sição de física e começou a usar um experimento de polias, que tira o
peso dos objetos, apresentado a El pela Educadora. No fim da apre-
sentação ele falou ‘nossa, mas eu não posso usar isso para levar a lata
de massa para cima do telhado quando eu construo alguma coisa?’.
Ele tinha 60 anos e aprendeu. A gente vê que o museu, além de estar
propiciando a mudança de vida à algumas crianças, está ensinando
também as pessoas de mais idade.
É importante atentar para que mesmo que achemos que nosso
trabalho não vai surtir efeito nenhum, acaba surtindo. Há um
problema sério entre nós: às vezes trabalhamos sozinhos. Deveríamos
trabalhar mais unido pensando nos benefícios que isso traria para
todos. O CDCC é um parceiro fantástico, a Universidade Federal
e a USP também. Nós não temos problemas, mas acho que se nos
uníssemos mais teríamos muito mais força, a voz seria muito maior.
Uma outra situação que preciso colocar, porque nosso tema era
mais ou menos isso, é a interação com escolas e centros não formais.
Como somos um órgão ligado à Secretaria de Educação, somos con-
siderados até uma unidade educacional dentro do município, e so-
fremos constantemente com a falta de verba.
A verba advinda do município praticamente não existe. Passamos
o ano inteiro quase sem receber uma visita de escolas municipais por
conta de contenção de gastos. Tínhamos uma parceria muito bacana
com o FDE, mas há dois anos eles deixaram de financiar as visitas
das escolas do estado aos museus de forma geral. Há dois anos que

127
nós não temos mais isso.
Hoje temos 60% ou 70% de visitas não agendadas por causa disso.
Os órgãos públicos, municipais, estaduais e federais estão tirando
bastante verba desta vertente e isso afeta bastante a visitação. Quem
perde não são os museus, quem perde são as pessoas, as escolas. É
muito triste ter todo esse aparelhamento, e friso que fiquei muito
triste agora em saber, que a equipe do Museu da Língua portuguesa
pode ser dispensada porque está em reforma. Não podemos ver isso
acontecer porque quem perde de fato não somos nós enquanto mu-
seus, quem perde é a população.
Essas situações acontecem e precisamos de fato colocar nossa voz,
e a melhor forma de fazer isso é buscando no potencial que temos,
que é muito grande. Nós somos capazes de mudar toda uma geração
porque a escola atua em um segmento importante, como professor
eu sei disso, mas ela não engloba a tudo, e o restante tem que ser
complementado por nós, por nossas entidades.
Acho que isso é fundamental, Professora Yvonne, obrigado nova-
mente, e espero que esse seja um primeiro passo, que possamos de
verdade mostrar aos governantes a importância disso, e conseguir
que cada vez mais possamos levar à população o que é direito dela.
Hoje, na situação tecnológica que vivemos, é inadmissível as pessoas
não terem acesso a isso.
Só vendendo um pouco o peixe, a quem não conhece, o Museu da
Ciência fica a quatro quarteirões daqui. Hoje, infelizmente, abrimos
apenas de segunda à sexta até 18h. Esperamos uma visita. ”

Mediadora:

“Agora nós abrimos as perguntas do público para gente fazer a


interação com a mesa redonda. Quem gostaria de fazer alguma ob-
servação? ”

Participante Gabriela

“Daniela, quando você mostra para nós esse material apostilado,


muito fechado, e o tema é a educação não formal e as escolas, como
esse material permite ao educador a possibilidade de inserir esses
espaços? Porque é muito fechado, para mim é um desafio, eu sou
totalmente contra, eu acho que o educador perde autonomia e para
128
tentar diversificar, levar o aluno já tem toda essa questão orçamentá-
ria que barra e ainda tem um material que é super reducionista que
fecha essas possibilidades.
Acho que me chamou muito a atenção e uma das coisas que vol-
tam ao tema da mesa redonda para gente entender como se dá essa
possibilidade, sendo que o professor tem um material até com as
orientações de como ele deve fazer as coisas. Eu já dei uma folheada
nesse material e é ‘você vai fazer assim, é desse jeito’, como articular
essas coisas? ”

Profa. Daniela

“Gabriela, a intenção de colocar a foto do material era justamente


uma provocação, porque esse material é bastante polêmico, é bas-
tante discutido e questionado desde sempre. Só que, como eu disse,
ele é um material de apoio, os professores não são obrigados a utili-
zar esse material. Há outros materiais que podem ser utilizados, esse
é uma operacionalização, é uma das alternativas para a execução do
currículo, o currículo é oficial, ele está posto, tem os seus problemas
que constantemente são discutidos e tudo o mais.
Essa é uma situação. Existe um currículo, tem toda uma defesa
e um contraditório por trás desse currículo, mas esse currículo tem
que acontecer já que nós falamos em uma rede tão gigante quanto
é a rede do estado de São Paulo em número de escolas e alunos etc.,
além de ser um movimento nacional, a questão da base nacional co-
mum que está sendo discutida, que está em vias de fato e tudo o
mais. Então esse currículo existe.
O material de apoio aos currículos que são os cadernos, ou as
apostilas como eu disse, que é o apelido dele por aí, é uma das pos-
sibilidades desse currículo acontecer em sala de aula. O professor
pode usar outro material? Pode. E esse item que coloquei a respei-
to das visitas aos espaços está dentro do currículo, é uma sugestão,
orientação do currículo, que outros espaços sejam utilizados, assim
como os sites.
Vamos imaginar um tema qualquer da área de ciências, no ca-
derno de orientação do professor, ele não tem uma camisa de forças,
mas possibilidades de como tratar aquele tema em sala de aula com
o seu aluno, que pode ser através daquele material que é distribuído

129
como pode ser utilizando, citando alguns exemplos, um filme, ou
música, ou museu e outras coisas. “
Então não são excludentes, o fato de existir um material didatica-
mente organizado, em uma sequência, e tudo o mais, não exclui as
outras possibilidades do professor, muito pelo contrário. Está pos-
to em um material que é para o professor utilizar outros espaços e
outros materiais, até porque se não, não teríamos esse número que
apresentei para vocês, que é representativo, não é nem a totalidade
da nossa DE, nós não teríamos tantos alunos indo para tantos luga-
res, se esse material não possibilitasse isso. Não sei se respondi sua
questão...”

Gabriela:

“Esse discurso, que você acabou de falar, é corrente. Mas acho que
um material, para ser opcional, é muito caro. ”

Participante Marcos:

“Boa tarde, meu nome é Marcos, sou professor da UFSCar. E eu


queria falar duas coisas rápidas aqui, vou tentar ser o mais rápido
possível.
A primeira é que eu presenciei alguns momentos quando o pú-
blico se manifestou, são muito interessantes esses momentos porque
as pessoas mostram que elas têm postura, tem questionamentos a
serem feitos, enquanto a academia costuma organizar os eventos de
uma forma às vezes não muito participativa. Em geral ela estabelece
os discursos, as falas, são muito auto defensivas, porque elas tentam
se fundamentar mostrar que elas são importantes.
Nós estamos ainda nessa etapa de fazer um discurso de mostrar
para as pessoas que nós somos importantes, eu acho que a gente pre-
cisa passar para uma outra etapa porque se não, ficamos falando com
nós mesmos. Talvez se a gente estivesse falando com a sociedade di-
retamente seria diferente, mas a gente está falando entre a gente.
A segunda questão que eu queria colocar é a seguinte. São Carlos
é uma cidade, eu estou aqui há 10 anos, que tem muitas peculiari-
dades em relação a divulgação científica e ao ensino de ciências por
conta das instituições, inclusive dos acervos, dos centros, das fazen-
das, museus, várias coisas. Eu acho que, como o professor Paulo co-
130
locou, nos últimos anos, particularmente nos últimos quatro anos, a
coisa se degringolou, porque nos outros 6 anos que eu estava aqui, o
trabalho que a prefeitura e as instituições estavam fazendo eram no
sentido e naquela direção, que eu acho que seria muito importante
nós discutirmos, que é a tal da cidade educadora.
Se tem uma cidade que tem esse potencial de ser uma cidade edu-
cadora em ciência e tecnologia no Brasil, eu diria que é São Carlos. E
isso ainda não aconteceu, pelo menos no período que eu estou aqui.
O que não significa que não existam diversas iniciativas aqui, mas eu
acho que elas precisam ser mais discutidas, e como diz o Paulo aqui
do Museu Mario Tolentino, mais articuladas entre si.
Nós fizemos um projeto, há uns 3 ou 4 anos atrás, que nós roda-
mos pelas escolas. São Carlos tem as escolas do futuro que foram
implantadas, que tem bibliotecas em cada uma. Nós fomos em todos
esses espaços atendemos crianças de 3 a 7 anos, 3 mil crianças no
final, com um projeto que foi financiado pelo CNPq e não custou
nem 100 mil reais incluindo a compra de materiais, o transporte das
crianças, dos materiais. Tudo isso não custou 100 mil reais.
Então eu acho que nós estamos sim em uma época de escassez
financeira, mas o problema é político, ideológico.... De falta de ação
da sociedade, vamos dizer assim. Embora a gente tem visto, como
vemos aqui e em outros lugares, uma resistência, as pessoas se po-
sicionam, não ficam simplesmente quietas, mas isso não tem sido
suficiente.
Isso é em uma escala, não só aqui, por exemplo, a Estação Ciên-
cia em São Paulo, que representa para São Paulo o que o CDCC re-
presenta para São Carlos, foi completamente desmantelada, é um
centro histórico na área de divulgação cientifica desde 1987, eu fui
na inauguração da Estação Ciência em 1987, e ela foi desmantelada.
Nós temos outros espaços, o Museu do Ipiranga está fechado, o
Paulo falou aí do museu que passou o ano sem verba. Esse museu foi
instalado por uma administração e a outra administração não deu
continuidade ao processo, a gente sente isso. Então ainda tem muita
coisa para se fazer aqui em São Carlos, e já se faz bastante coisa, mas
eu acho que ainda falta muito.
A gente vai na periferia, tem projetos nas escolas, e a periferia
ainda está distante dessas atividades que a cidade oferece. O próprio
131
festival Contato que a universidade faz, que é uma coisa fantástica,
mas vai lá e vê o público. Eu vou em todos esses lugares quando tem,
o povo de São Carlos está longe dessas atividades no geral. Tem algu-
mas exceções, mas no geral ainda as atividades são para uma classe
média. ”

Participante Pietra:

“Boa tarte, eu sou a Pietra, sou educadora chefe no Museu da


Ciência, vou complementar uma coisa que o Paulo falou e o Marcos
comentou, dessa questão de você conseguir trazer o público para o
seu museu.
Nós tivemos, em parceria com a Ciência Web, a Dona Yvonne, a
Thais, no ano passado inteiro, o ciclo de palestras, ‘ciências e riqueza
social’, nós chamamos pessoas de renome, cientistas, para falar para
a população em geral dos que eles faziam na universidade que tinha
a ver com o cotidiano, porque esse é um dos grandes pilares nosso
do museu, a ciência no cotidiano, e mostrar que a ciência não é um
bicho de sete cabeças.
Fizemos uma divulgação enorme, a Thais que o diga. Muito nas
redes sociais e quanto ao público, tivemos que entrar em contato
com escolas, chamar salas de EJA, de educação de jovens e adultos,
para que a gente pudesse garantir o mínimo de público para assistir
as palestrar, porque assim, tinha dias que apareciam 5 pessoas.
Às vezes eu fico pensando, nós como espaços não formais. Nós
sozinhos somos poucos, os recursos são poucos, e nós precisamos
realmente de políticas públicas, a gente precisa muito de apoios dos
governantes, das universidades que são gigantes perto da gente e é
por isso que a gente faz tantas parcerias com USP e UFSCar.
Uma das coisas que eu também sou representante da região cen-
tral do SISEM, que é o Sistema de Museus da Secretaria da Cultura
do Estado, e o que a gente faz? A gente articula todos os museus da
nossa região central aqui. A gente fez um chamamento para uma
palestra do educativo do Museu do Futebol, porque o educativo do
Museu do Futebol é um brilho nos olhos dos educativos que existem.
Foram dois lugares que falaram de interesse, e um deles foi a gente
do Museu da Ciência.
132
Então você abre a possibilidade de ter na cidade uma palestra su-
perinteressante, que você vai chamar público para ir no seu espaço,
e de repente ninguém aparece. As pessoas não estão abertas, e aí vai
também da motivação. Por isso quando a gente ouve a Tânia falar é
até gostoso, porque a empolgação dela é algo gostoso de ouvir. Quem
dera que todo mundo que está acima da gente também fosse desse
jeito. Então eu não sei, eu fico me perguntando ‘o que a gente faz?’. ”

Prof. Adilson:

“Eu queria comentar um pouco sobre essas falas. Até sobre a pro-
vocação inicial do Valter sobre essa questão. Uma coisa que nós pre-
cisamos prestar muita atenção é qual é o público que nós estamos
lidando?
A geração que vem hoje é uma geração que vem com ponto de
vista muito diferente. O Valter mesmo lembrou, como eu, não havia
espaço de divulgação cientifica que motivava a gente, por exemplo, a
fazer física. Mas onde eu fui encontrar a minha motivação para fazer
física? Eu fui encontrar na mídia.
Eu tinha 10 ou 12 anos de idade e tinha o programa do Cosmos
na televisão, passava na Rede Globo, sábado e domingo de manhã,
em um horário ótimo para assistir, não era às 5h da manhã, igual
quando se fala tem Globo Ciência e passa às 4h da manhã, onde que
isso vai atingir o público, não é verdade?
Hoje nós temos uma juventude que vem muito diferente do que
nós fomos, certo? A gente tem uma dificuldade principalmente da
linguagem, o que a gente fala para essa pessoa se interessar? Então
isso é um desafio, fazer com que as pessoas se interessarem pela ciên-
cia, elas tem um monte de outras coisas que talvez sejam muito mais
interessante do que ciência. O grande desafio é a gente tentar mos-
trar que ciência pode ser uma coisa legal, a ciência pode ser uma
coisa fascinante.
Nessa semana mesmo, eu li na Folha de São Paulo a matéria onde
a professora Helena Nader fazia uma crítica sobre a questão da PEC
241 que está sendo aprovada e se continuar do jeito que está, vai
congelar a verba da ciência brasileira em um patamar extremamente
baixo o que significa que nós vamos ter um enorme retrocesso.
Não é nenhum problema com a notícia, mas sim os comentários
133
que apareciam no site, uma pessoa escreveu ‘mas o que a ciência
brasileira fez de relevante nos últimos 10 anos? Por que eu vou gastar
dinheiro com a ciência, o que a ciência fez de relevante nos últimos
10 anos?’. É o leitor comum, do site da Folha que tem acesso à inter-
net, se interessou pela notícia e coloca um comentário como esse.
Quando eu vi esse comentário eu fiquei preocupado, falei ‘realmente
estamos em perigo’, porque a gente precisa de alguma forma de al-
guma maneira, fazer com que esse conhecimento se transforme em
uma coisa que as pessoas achem interessante.
Vou dar um outro exemplo para vocês. Na década de 90 os Es-
tados Unidos estavam construindo o maior acelerador de partícula
do mundo que competir com LHC, até aquele momento os Estados
Unidos eram o líder mundial em pesquisa de física de partículas.
Os Estados Unidos gastaram dois bilhões de dólares cavando um
buraco para fazer o acelerador de partículas. Chegou o Congresso
americano e ‘por que eu vou montar um equipamento que vai custar
bilhões de dólares para saber a origem do universo? O que eu ganho
com isso? Ah, corta esse projeto’. Desde aquele momento os Estados
Unidos perderam a liderança mundial na física de partículas em re-
lação ao CERN na Europa.
Foi naquele momento que caiu a ficha de muito cientista ameri-
cano falando em não se conseguir traduzir para a população que é
importante isso. O político é movido em função da vontade popular,
o povo que coloca ele lá, se aquilo não virar uma pauta importan-
te a ciência para. Por isso em todo o projeto aprovado na National
Science Foundation dos Estados Unidos o pesquisador tem um com-
prometimento de fazer divulgação cientifica, porque não adianta re-
ceber 10 bilhões de dólares para fazer projeto se as pessoas daqui a
pouco vão falar, mas para que serve esse projeto.
Então há uma necessidade de a academia se comprometer a fazer
isso. Como o Valter falou no começo, quando começou esse projeto
do CDCC, quando eu estava lá trabalhando no Observatório, fala-
vam ‘nossa, você está perdendo tempo fazendo divulgação científica,
você pode publicar mais dois ou três artigos’. Isso não é importante,
o problema é que se a gente só pensar em publicar os artigos, daqui
a pouco ninguém mais vai nos pagar para publicar artigos, porque a
população vai questionar, como fez o leitor do jornal da Folha ‘o que
a ciência brasileira fez relevante nos últimos 10 anos?’.

134
Nesse papel, os espaços não formais são um desafio para levar
essa informação. Vamos pegar o exemplo da NASA, Agência Espa-
cial Americana. Eles são as pessoas que conseguem fazer o maior
estardalhaço por qualquer coisa. Vocês lembram há uns anos atrás
que foi achado um meteorito na Antártida que tinha duas ou três
bactérias no meteorito e aí era ‘ah, provamos a existência de vida
extraterrestre’. Fizeram um carnaval e não era nada, as bactérias que
estavam no meteorito eram daqui da Terra mesmo.
A sonda Juno que chegou agora em Júpiter, o vídeo que eles lan-
çaram no dia 4 de julho quando ela chegou, foi um vídeo que eles
encomendaram para um diretor de cinema de Hollywood. O vídeo
parecia aqueles trailers de filmes de ficção científica de ponta, tipo
Star Trek, Star Wars, até com aquela expressão ‘e agora, a sonda vai
conseguir parar e fechar?’. Você assiste um vídeo daquele e fica entu-
siasmado, ou seja, é buscar um espaço de uma linguagem para fazer
isso.
Quando falamos das redes sociais, por exemplo, é um espaço
muito rico para a gente fazer divulgação científica. Ali é um espaço
que a gente tem que estar presente, temos que estar no facebook, no
twitter, porque é lá que essas pessoas se encontram.
Quando a gente fez o projeto das viagens da Laura, Verdades In-
ventadas, foi impressionante a quantidade e-mails e posts que rece-
bemos do Brasil todo, porque a hashtag ‘viagens da Laura’ começou
a subir em Twitter, Facebook etc., isso é algo exponencial na web. Um
post replicado por outro cai lá nos seus duzentos amigos e assim vai
embora.
A gente tem que ter algumas estratégias, tem que conciliar a co-
municação. Eu acho que isso falta um pouco na área da divulgação
científica, a gente se conciliar um pouco com as próprias estratégias
de comunicação.
Acho que espaços não formais, museus de ciências etc. são luga-
res para despertar a curiosidade. Toda a vez que um dos projetos que
temos financiados pela Fapesp o parecerista falava ‘como você con-
segue medir a eficiência do seu projeto? Qual o resultado objetivo?
Eu não quero o número de visitantes’. Tem muitas metodologias que
se trabalha para isto, mas o Museu Cosmocaixa de Barcelona fala ‘o
que paga é o brilho nos olhos’. Como o professor Paulo aqui falou, o
pedreiro que você falou que descobriu que com roldanas ele faz me-
nos força para levantar um objeto é aí que está o grande resultado:
aquela hora que dá o brilho nos olhos e isso é imensurável.
135
Há duas semanas atrás a UNESCO publicou um estudo em que
existe atualmente no mundo 200 milhões de crianças em idade es-
colar fora da escola. Duzentos milhões é a população do Brasil. Es-
tamos no século XXI, nós mandamos sonda para Marte, fazemos
coisas com átomos e tem gente que não consegue ser alfabetizada no
mundo. E outro dado importante, faltam 50 milhões de professores
no mundo, e principalmente professores de ensino de ciências, do
ensino médio, esse é o que mais faz falta.
Para falar em termos de uma política pública que consiga abran-
ger tudo, a gente tem que colocar isso em uma agenda do país que
envolva todos os níveis. A formação do professor, o fortalecimento
desses espaços, trazer a ciência de uma maneira mais interessante,
para que isso avance.
Em maio desse ano eu participei de uma reunião na USP em São
Paulo que estava o ministro da ciência, tecnologia, inovação e co-
municação, o Kassab. Lá na mesa redonda que a gente participou eu
cobrei justamente sobre essa questão da divulgação cientifica, pois, o
Ministério dele tem uma Secretaria específica para isso. Essa Secre-
taria está sem dinheiro nenhum, dado que não teve edital nenhum
esse ano. E o que ele me respondeu: ‘não, agora essa união que nós
fazemos com a comunicação vai potencializar a divulgação científi-
ca, agora tem a comunicação aqui junto etc.’. Vocês viram que poten-
cializou mesmo a divulgação cientifica, né? Então isso acaba sendo
exatamente um problema das próprias políticas públicas que estão
sendo colocadas aqui no Brasil, a gente precisa realmente avançar
isso, e isso tem que partir de nós.
Nós temos que colocar, protestar e levar essas demandas para fa-
zer isso, porque senão a ciência vai ficar cada vez menos interessante
para as pessoas, você não terá mais alunos, e sem gente interessada
em ciência não tem desenvolvimento do Brasil. Sem cientistas, sem
engenheiros, sem educadores, você não faz essa nação desenvolver.
Qualquer projeto de desenvolvimento que esqueça disso, do cientis-
ta, do educador, e das pessoas que trabalham com a tecnologia é um
projeto de país que não vai dar certo. ”

Mediadora:

“Eu agradeço a participação de todo mundo. Vou passar agora


para a senhora, professora, para fazer o encerramento do evento. ”

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Profa. Yvonne

“Uma coisa que o Adilson mencionou, e que é notória inclusive, é


a falta de professores. Na área científica mais do que nas outras, e o
que isso mostra? Mostra o que nós temos que fazer - ou deveríamos
- em vez de usar um regime em que nós temos escolas iguais para
todos, nós deveríamos ter escolas em que o ensino de ciências fosse
priorizado com alunos selecionados de acordo com seu desempe-
nho.
São as famosas escolas americanas de High School, que eles cha-
mam de Science High School, e que são muito valorizadas inclusive
pela população. A população americana pelo menos tem consciên-
cia de que a elite intelectual, cultural e tecnológica é responsável pela
evolução no mundo cientifico e tecnológico que garante a lideran-
ça econômica mundial do país. Nós precisamos não deixar perder
aquelas crianças e jovens que sem dúvida existem em nossa popu-
lação, mas que não tem chance de ter um ensino bom mesmo. Eles
entram em uma escola em que todos têm que aprender as mesmas
coisas.
Então isso parece uma coisa muito democrática, mas é uma coisa
muito ruim para o país, não existe todo mundo com vocação para
ciência. Dentro da sua família, da nossa família, você olha as pessoas
e elas são diferentes. Tem uma que quer fazer Artes Cênicas, eu não
sou contra, acho que precisa ter gente que quer fazer artes cênicas
e de repente tem um que quer fazer física, tem um que quer fazer
engenharia, tem um que fica louco por computação e informática,
então não podemos fazer essas escolas iguais para todos, isso é fora
de dúvida. Nós temos que privilegiar em cada município pelo menos
uma Science High School, com os melhores professores que nós pu-
dermos encontrar. Esses professores estão nos cursinhos, em escolas
particulares porque ganham um pouco mais, ensinando apenas para
passar em exame vestibular e não realmente educando para desper-
tar as vocações.
Nosso sistema peca por não se preocupar em não garimpar as vo-
cações, seja ela para o que for, e dirigi-las de uma maneira razoável,
de modo que elas possam produzir tão cedo quanto possível. É mui-
to triste ver alunos, que passam no vestibular e lá pelo meio do curso
vêm que não é isso que querem, eles deveriam ter pensado nisso lá
no curso de segundo grau.
Se ele entrar em um Science High School e ele perceber que não é o
que ele quer ele muda sem grande prejuízo, nem para vida dele, nem
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desperdiçando um grande custo econômico para a educação, por-
que educação custa caro. Não tem numa torneira que solta dinheiro
para a educação, tudo é limitado. O uso razoável dos recursos finan-
ceiros que vão ser usados na educação tem que visar e priorizar as
vocações dos jovens e não simplesmente dar uma escola que parece
que é igual para todos e é, de fato, em geral ruim para todos.
A minha opinião, e o que gostaria de lembrar, é que esses espa-
ços de educação informal que nós temos e que parece que serem
tão limitados, que tem tão pouco resultado, na realidade servem
para fazer essa garimpagem, alguns jovens de repente percebem que
gostam de ciência e se envolvem. Eu me lembro do professor Mario
Tolentino, que não tinha apoio governamental nem nada, mas era
um ótimo professor e com boa situação econômica, quando ele dava
aula no Álvaro Guião, ou no Colégio Diocesano, ele tinha no porão
da sua casa um clube de ciências. Ele pegava todos os alunos e co-
locava no clube de ciências? Absolutamente não. Ele pegava aqueles
alunos que mostravam interesse, que mostravam desejo e com esses
alunos ele fazia pesquisas arqueológicas, experimentos químicos.
Gerou-se muita gente que foi motivada naquela época, que foi
despertada pelo Mario Tolentino com uma atividade interessante e
criativa. Então, não é ser antidemocrático, é ser muito democrático,
porque você não vai pegar uma pessoa que tem muito jeito para jo-
gar futebol e querer que ele jogue tênis.
Entre os alunos, tem uns que tem muito jeito para ciências e tem
outros que não tem. Não sei se isso é genético, se isso é ambiental,
se é o genótipo ou se é fenótipo, sem dúvida é de todas essas coi-
sas juntas, mas que nós temos que fazer essa garimpagem dos que
são vocacionados para ciências. Eles são tão bons quanto os outros e
dirigi-los de uma maneira preferencial, oferecendo o ensino de pri-
meira qualidade, como tem em Nova York, como tem em muitas
cidades americanas aumenta muito a chance de formarmos recursos
humanos para as áreas de ciência, tecnologia engenharia e matemá-
tica essenciais para o desenvolvimento econômico do pais.
Obrigada, e quero mais uma vez, já que é para encerrar, agradecer
muito a participação de todos. Tenho certeza que essas discussões
vão ficar lá fundo da cabeça de cada um e, quem sabe, quando nós
tivermos novas ocasiões de nos manifestarmos, que nos manifeste-
mos a favor da educação, a favor da ciência. ”

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