Você está na página 1de 6

40 Enfoque

Ruy Jornada Krebs1


Universidade do Estado de Santa Catarina
e-mail: ruykrebs@brturbo.com.br

A Teoria Bioecológica do

Desenvolvimento Humano e o

contexto da educação inclusiva

Resumo Introdução do tema

O processo de inclusão das crianças que são identificadas como


A escola é um dos princi-
portadoras de alguma necessidade especial, no contexto escolar, tem sido
pais contextos do desenvolvimen-
amplamente enfatizado nas políticas públicas voltadas para a educação O
to infantil. Entre as grandes ques-
objetivo deste ensaio é discutir a Teoria Bioecológica do Desenvolvimento
tões que estão em evidência na
Humano, proposta por Bronfenbrenner, para fazer algumas reflexões acerca
discussão de políticas públicas
do contexto da educação inclusiva. Os seguintes tópicos são abordados: os
voltadas para a educação, pode-
elementos de sua teoria, e a sua relação com o contexto da educação inclusi-
se destacar o processo da inclu-
va e o professor como um mediador do processo da inclusão escolar. Como
são na escola das crianças que são
considerações finais, o texto destaca o potencial da Teoria Bioecológica do
identificadas como portadoras de
Desenvolvimento Humano para orientar questões pertinentes ao processo
alguma necessidade especial. Por
da inclusão escolar.
se tratar de uma questão extrema-

mente complexa, essa problemá-


Palavras-chave: Teoria Bioecológica, Inclusão, Educação Especial.

tica só pode ser discutida à luz de

Abstract
alguma teoria do desenvolvimen-

to humano. Assim, esse ensaio

The process of inclusion in to the school system of those children buscará suporte na Teoria Bioeco-

identified as bearers of some special need has been emphasized thoroughly lógica do Desenvolvimento Huma-

in the educational public policies. The objective of this essay is to discuss no, proposta por Bronfenbrenner,

the Bioecological Theory of the Human Development, proposed by para fazer algumas reflexões acer-

Bronfenbrenner, and to reflect on the context of inclusive education. The ca do contexto da educação inclu-

following topics are approached: the elements of the theory, the relationship siva.

between theory, the context of inclusive education and the teacher as a A opção pela teoria propos-

mediator in the process of inclusion in schools. As final remarks the text ta por Bronfenbrenner como su-

emphasizes the potencial that the Bioecological Theory of Human porte teórico para estas reflexões

Development has to deal with issues regarding public policies in the process justifica-se pelo potencial que a

of inclusion. teoria tem para explicar a indisso-

ciabilidade entre a pessoa em de-

Keywords: Bioecological Theory, Inclusion, Special Education. senvolvimento e os contextos em

1
Professor do Centro de Educação Física, Fisioterapia e Desportos da Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC

40 INCLUSÃO - Revista da Educação Especial - Jul/2006


que ela se insere. Mais especifica- Um microssistema é um padrão de sossistema é um sistema de micros-

atividades, papéis e relações inter- sis-temas.(p. 227).


mente, neste ensaio pretendemos
pessoais experienciado pela pessoa
apresentar uma breve descrição dos
em desenvolvimento em um dado
elementos que compõem a teoria e O exossistema é caracteri-
ambiente, face a face, com carac-
relacioná-la a teoria com o contexto zado pelos contextos onde a pes-
terísticas físicas e materiais particu-

da educação inclusiva. lares, contendo outras pessoas com


soa em desenvolvimento não par-

características distintas de tempe- ticipa, mas os eventos que lá ocor-

ramento, personalidade e sistema rem afetam essa pessoa, e vice-


Os parâmetros do contex-
de crenças.(p. 227). versa. Pode-se dizer que as forças
to como um conjunto de
que dinamizam o exossistema são
sistemas aninhados Ao definir o microssiste- as mesmas do mesossistema, ex-

ma, Bronfenbrenner destacou seus ceto as referentes à participação


Na sua obra de 1979, The três elementos principais: as ativi- multiambiental:
Ecology of Human Development: ex- dades, as relações interpessoais e

periments by nature and design (Eco- os papéis. A interação desses ele- O exossistema envolve a ligação e

logia do Desenvolvimento Humano: mentos é que qualifica o potenci- os processos que têm lugar entre

experimentos naturais e por delinea- al do microssistema para instigar dois ambientes ou mais, e no míni-

mento), Bronfenbrenner delineou mo um deles que não contenha


o desenvolvimento humano.
ordinariamente a pessoa em desen-
um modelo teórico que podia ser
Em relação ao mesossiste-
volvimento, mas no qual acontecem
visto como um conjunto de siste-
ma, Bronfenbrenner sugere a cria-
eventos que podem influenciar pro-
mas aninhados, e fez uma analogia
ção de uma rede social, em que a
cessos dentro do ambiente imedia-
desse seu modelo com as tradicio-
pessoa em desenvolvimento é a to que contém a pessoa.(p. 227).
nais bonecas russas. Nesse mode-
referência principal. Essa rede é
lo, ele identificou quatro parâme-
formada tanto pelas pessoas que
O último parâmetro do
tros do contexto: o microssistema,
interagem diretamente com a pes-
modelo ecológico de Bronfenbren-
o mesossistema, o exossistema e o
soa em desenvolvimento, quanto
ner é o macrossistema. Esse parâ-
macrossistema. Esses quatro parâ-
pelas que, de uma forma ou de
metros foram redefinidos por Bron- metro é, na verdade, a abrangência
outra, podem influenciar esse pro-
fenbrenner em 1992. Na definição da cultura ou do sistema social que
cesso de desenvolvimento.
de microssistema, ele acrescentou está servindo como referência para

a relevância da participação de ou- a pessoa em desenvolvimento. Essa


O mesossistema compreende as li-
tras pessoas no microssistema, definição também foi ampliada na
gações e processos que têm lugar
mesmo quando elas não estejam obra de 1992, quando Bronfebren-
entre dois ou mais ambientes, que

em uma interação direta com a pes- contêm a pessoa em desenvolvi- ner revisou suas definições originais

soa em desenvolvimento: mento... em outras palavras, o me- de 1979:

INCLUSÃO - Revista da Educação Especial - Jul/2006 41


O macrossistema consiste de todo O primeiro tipo são as disposições integridade do organismo. São
um padrão externo de microssiste- que podem colocar os processos
exemplos disso os defeitos con-
mas, mesossistemas e exossistemas proximais em movimento, em um
gênitos, o baixo peso ao nascer, a
característicos de uma determinada domínio particular do desenvolvi-
deficiência física, as doenças se-
cultura, subcultura ou outro con- mento, e continuar sustentando

essa operação. O próximo tipo são veras e persistentes, ou os danos


texto social maior com um particu-
os recursos bioecológicos de habili- no cérebro, resultantes de aciden-
lar referencial desenvolvimental-
dade, experiência, conhecimento tes ou processos degenerativos
instigativo para o sistema de cren-
e destreza, necessários para o fun-
ças, recursos, riscos, estilos de vida, (BRONFENBRENNER, 1995;
cionamento efetivo dos processos
estruturas, oportunidades, opções BRONFENBRENNER & MOR-
proximais em um dado estágio de
de vida e padrões de intercâmbio
RIS, 1998).
desenvolvimento. Finalmente, há
social, que estão incluídos em cada
as características de demanda, as Em 1998, Bronfenbrenner,
um desses sistemas. O macrossiste-
quais convidam ou desencorajam em co-autoria com Morris, reno-
ma pode ser visto como a arquitetu-
reações a partir do ambiente social, meou o paradigma como Modelo
ra societal de uma cultura particu-
de um modo que podem fomen-
lar, subcultura ou outro contexto Bioecológico. Nessa nova versão, os
tar ou romper as operações dos pro-
social maior.” (p. 228). autores incluíram as demandas
cessos proximais.(p. 995).
como a terceira categoria dos atri-

Os quatro parâmetros do butos pessoais. Os autores enfati-


No que diz respeito às dis-
contexto, anteriormente descritos, zaram que essas características afe-
posições, o modelo mostra que elas
mostram as dimensões do ambi- tam o desenvolvimento por terem
tanto podem colocar os processos
ente onde o desenvolvimento ocor- um potencial de convidar ou de-
proximais em desenvolvimento
re, desde a mais imediata, o mi- sencorajar reações de pessoas no
quanto interferir, retardar e, até
crossistema, até a mais abrangen- ambiente em que a pessoa em de-
mesmo, evitar que eles ocorram. As
te, o macrossistema. No entanto, senvolvimento encontra-se, e essa
disposições que desencadeiam os
em seu modelo original, Bronfen- atração ou rejeição pode fomen-
processos proximais foram chama-
brenner (1979) não incluiu uma tar ou romper processos de desen-
das de desenvolvimentalmente ge-
descrição mais elaborada para in- volvimento. As demandas podem
radoras. Como exemplo dessas dis-
vestigar-se as características da pes- ser interpretadas como um poten-
posições, os autores citam a curio-
soa em desenvolvimento. cial que a pessoa em desenvolvi-
sidade, tendência a iniciar e enga-
mento tem para receber atenção e
jar-se em atividades, tanto sozinho
afeto, por um lado, ou despertar
Os atributos da pessoa quanto acompanhado, disposição
sentimentos negativos, por outro
em desenvolvimento para responder às iniciativas de ou-
lado, das pessoas que fazem parte
tros, e prontidão para abster-se de
do contexto social da pessoa em
Inicialmente Bronfenbren- gratificação imediata ao buscar ob-
desenvolvimento (COPETTI &
ner usou o termo competências jetivos em longo prazo. Aquelas que
KREBS/2004).
quando se referia aos atributos da interferem negativamente para que

pessoa em desenvolvimento. No os processos proximais ocorram

foram denominadas de desenvolvi- As dimensões do tempo


entanto, as suas definições para

competências pessoais estavam mentalmente disruptivas (COPET-

TI & KREBS, 2004). Ao discutir as perspectivas


mais restritas às características cog-
O segundo tipo de atribu- de pesquisa relacionadas com o
nitivas, ao temperamento, ao cará-

ter e à personalidade. Dessa forma tos pessoais que influenciam os contexto da família, Bronfenbren-

não ficava explícito como identifi- processos proximais foi denomi- ner (1986) identificou claramente

car competências de outros domí- nado de recursos. Assim como os duas abordagens. Uma que consi-

nios que não o psicossocial. Essa atributos relativos às disposições derava o tempo apenas em relação

lacuna foi preenchida quando ele foram identificados como gerati- à pessoa objeto da investigação (um

propôs o Paradigma Bioecológico vos ou disruptivos, os atributos exemplo disso são as pesquisas que

(1995). Esse Paradigma Bioecoló- foram identificados como positi- comparavam diferenças entre ida-

gico foi renomeado como Modelo vos ou negativos. Os recursos as- des cronológicas e/ou tempo de ex-

Bioecológico, em 1998, quando sociados com competência são periência), e a outra, que enfatiza-

Bronfenbrenner publicou, junto identificados como habilidades, va a necessidade de olhar-se o tem-

com Morris, The Ecology of Develo- conhecimento, destreza e as ex- po como uma variável da interação

pmental Processes (A Ecologia dos periências que a pessoa em desen- pessoa e contexto.

Processos Desenvolvimentais). volvimento vai tendo ao longo da

Nesse novo modelo, os atributos vida. Os recursos associados às Para distinguir tais investigações da-

foram subdivididos em três tipos: disfunções limitam ou rompem a queles estudos longitudinais mais

42 INCLUSÃO - Revista da Educação Especial - Jul/2006


tradicionais, focalizando exclusiva- atividades, relações interpessoais

mente o indivíduo, eu tenho pro- e papéis, em relação ao micros-

posto o termo cronossistema, para sistema, participação multiambi-

designar um modelo de pesquisa ental, ligações indiretas, comuni-

que permita investigar a influên- cação e conhecimento, inerentes

cia no desenvolvimento da pessoa, ao mesossistema e ao exossiste-

de mudanças (e continuidades) ao ma (exceto a participação multi-

longo do tempo, no ambiente no ambiental), e sistema de crença,

qual a pessoa está vivendo. (p. 724). oportunidades, riscos, valores,

etc., para o macrossistema. Para

O Modelo do Cronossistema o tempo, além da subdivisão em

permite identificar o impacto de microtempo, mesotempo e ma-

eventos anteriores, de forma isola- c r o t e m p o, Bronfenbrenner


da ou em seqüência, no desenvolvi- (1995) refere-se ao tempo de
mento da pessoa. Para caracterizar vida e ao tempo histórico. Isso
esse modelo, Bronfenbrenner nos permite refletir que o proces-
(1998) classificou os eventos em
so seja o fator de interação dos
dois tipos, os normativos e os não-
outros três fatores, e dessa inte-
normativos. Esses eventos podem
ração resultam as mudanças e es-
ter sua origem tanto no organismo,
tabilizações que acontecem ao
quanto no ambiente externo. Na pri-
longo da vida de uma pessoa e,
A inclusão como um pro-
meira categoria, estão os eventos
também, através de gerações.
que, de certa forma, já eram espera- cesso proximal
Em referência ao micros-
dos que ocorressem e, na segunda,
sistema, o processo envolve for-
aqueles cuja ocorrência não pode ser Ao caracterizarmos a inclu-
mas particulares de interação en-
antecipada. Em 1998, Bronfenbren- são escolar como um processo
tre a pessoa e o contexto, denomi-
ner e Morris atribuíram três dimen- proximal, devemos estar atentos
nadas como processos proximais.
sões ao fator tempo. A primeira, de- às mudanças e estabilizações não
Os processos proximais operam
nominada como microtempo, deve apenas nos atributos da criança in-
numa dimensão temporal e são
ser observada na persistência da pes- cluída, mas também em todas as
soa em engajar-se em atividades vistos como os mecanismos pri-
características dos contextos em
molares. A segunda, referida como mários produtores do desenvolvi-
que ela participa ativamente,
mesotempo, diz respeito à periodi- mento humano. Dessa forma, eles
como, por exemplo, a sala de aula,
cidade com que um evento persiste, variam em função das caracterís-
o pátio da escola, o ambiente fa-
mesmo quando a pessoa transita de um ticas da pessoa, do contexto e do
miliar, a vizinhança, etc. Essa in-
microssistema para outro. Finalmente, tempo. Essa ênfase no processo
teração dinâmica entre a criança
o macrotempo, entendido como o tem- não é uma preocupação recente de
e as outras pessoas em seu entor-
po histórico e social, e pode estender- Bronfenbrenner. Já em 1943, ao
no social deve ser vista numa
se através de gerações (COPETTI & propor um quadro de referências
perspectiva temporal que inclua
KREBS, 2004). para pesquisas sociométricas, ele
as transições ecológicas que a cri-
comentou que:
ança vivencia e os eventos signi-
O processo como
ficativos que ocorrem ao longo
As variações ocorrem não apenas
construto central dos microtempos e mesotempos.
no status social de uma pessoa es-
Modelo Bioecológico Para melhor discutirmos
pecífica dentro do grupo, mas tam-
a relação dos elementos do Pa-
bém na própria estrutura do grupo

Se observarmos os quatro – sendo isso na freqüência, na for- r a d i g m a B i o e c o l ó g i c o, c r i a m o s

construtos do Modelo Bioecoló- ça, no padrão, nas bases do relacio- algumas indagações, para as

gico, podemos perceber que ape- namento, que mantêm o grupo quais apresentaremos algumas
unido lhe dão um caráter distinto. possíveis respostas. A primeira
nas para o processo não há uma
O status social e a estrutura são,
identificação específica de ele- questão diz respeito à dicotomia
naturalmente, interdependentes,
mentos constitutivos. Pa r a o entre a legislação e a realidade da
mas é preciso que seja dada uma
construto pessoa, esses elemen- escola onde ocorrerá o processo
atenção a essas variáveis para que o
tos são identificados como dis- de inclusão. Toda e qualquer lei
processo do desenvolvimento soci-

posições, recursos e demandas. al seja adequadamente compreen-


origina-se de uma discussão po-

Para o contexto, os elementos são dido. (p. 363). lítica no Congresso Nacional, nas

INCLUSÃO - Revista da Educação Especial - Jul/2006 43


secretarias vinculadas ao Ministé- uma maior probabilidade de que conhecimento. Essa disfunção po-

rio de Educação e assim sucessi- todos os envolvidos com as crian- derá transformar-se, também, numa

vamente. Esses exemplos repre- ças criem expectativas positivas demanda negativa. O aluno que

sentam microssistemas onde são em relação a si próprios, podendo possuir uma demanda negativa será

discutidos os decretos e as dire- colaborar de forma mais significa- rejeitado ou excluído das atividades

trizes que norteiam a política na- tiva no processo da inclusão. em grupo. A mediação do profes-

cional da educação e, conseqüen- sor deverá amenizar o impacto da

temente, a inclusão escolar. Para disfunção e, para isso, ele deverá


O professor como um
que essas diretrizes e decretos se identificar no aluno especial algum
mediador no contexto
efetivem, faz-se necessário ter- recurso gerativo (atributo pessoal
da inclusão escolar
mos um macrossistema que in- positivo) para que os demais alu-

tegre todos os microssistemas nos não o rejeitem. Esses recursos

onde a criança vivenciará o pro- Dentre todos os contextos gerativos poderão não estar associ-
vinculados ao processo da inclu- ados diretamente à aprendizagem
cesso da inclusão. Essas conside-

rações reforçam a idéia de que as são, o ambiente da aula é aquele de habilidades específicas. Talvez,

políticas públicas dependem dos onde o professor tem a sua ação o primeiro recurso que o professor
mais efetiva. Ao descrever os pro- deverá desenvolver em seus alunos
valores que permeiam a cultura

e as oportunidades existentes nos cessos proximais, Bronfenbrenner é a disposição para o engajamento

contextos onde elas serão imple- (1995) tomou como base os con- em atividades de grupo. Durante
ceitos de Vygotski para as três zo- essas atividades, o professor deve-
mentadas. A inclusão de uma cri-

ança na escola não diz respeito nas de desenvolvimento: real, pro- rá mediar as relações entre todos

apenas a ela e sua família, mas a ximal e potencial. Se entendermos os alunos, no sentido de assegurar

que o aluno com necessidades edu- que haja entre eles reciprocidade,
todas as crianças que conviverão

com ela no contexto da escola e cacionais especiais desenvolve-se equilíbrio de poder e afetividade.

suas respectivas famílias. de uma zona real para uma zona Em relação ao segundo

potencial, através da zona proximal, tipo de dificuldades, que diz respei-


A implementação de uma

política inerente à escola inclusiva o professor será o principal medi- to às diferentes formas de comuni-

deve começar pelas relações inter- ador nesse processo. No entanto, cação, pode-se dizer que essa limi-

pessoais entre as crianças e o pro- para mediar o processo de desen- tação não inclui apenas os alunos es-

volvimento, o professor deverá es- peciais. A Teoria Bioecológica inse-


fessor ou professora responsável

pela classe, com ênfase na recipro- tar ciente das principais dificulda- re a comunicação não apenas nas re-

cidade, equilíbrio de poder e afeti- des do aluno com necessidades lações interpessoais que se estabe-

educacionais especiais. As Diretri- lecem no microssistema, mas tam-


vidade. Em relação aos alunos, é

importante enfatizar as disposições zes Nacionais para a Educação bém como uma das forças do me-

para o engajamento e a permanên- Especial (BRASIL, 2003) identifi- sossistema e do exossistema. Nesse

cam três grupos de dificuldades que caso, o professor deverá ter conhe-
cia em atividades conjuntas, gra-

dativamente mais complexas, com esses alunos apresentam: (a) difi- cimento do comportamento do alu-

a orientação de professor ou pro- culdades acentuadas de aprendiza- no com deficiência em outros am-

gem ou limitações no processo de bientes que não o de aula. Se o pro-


fessora que tenha recursos para
desenvolvimento, (b) dificuldades fessor conseguir identificar as estra-
mediar os processos proximais.
de comunicação e sinalização di- tégias que aquelas pessoas signifi-
Outra questão que pode-
ferenciadas dos demais alunos e cantes para esse aluno usam para
mos discutir é o papel dos pais e
(c) dificuldades relacionadas às comunicar-se com ele, essas estra-
amigos das crianças que freqüen-
altas habilidades/superdotação da- tégias poderiam ser trazidas para o
tam uma escola inclusiva. Para
queles alunos que têm grande fa- ambiente da aula. Ao mesmo tem-
Bronfenbrenner, um papel não en-
cilidade de aprendizagem. po em que o aluno especial estiver
volve apenas as expectativas da so-
Em relação ao primeiro se adaptando para comunicar-se
ciedade em relação à pessoa que
tipo de dificuldades, estão incluí- com o professor e colegas, esses
desempenha esse papel, mas prin-
dos aqueles alunos com disfunção também estarão se adaptando para
cipalmente o que essa pessoa es-
de alguma natureza, orgânica ou comunicar-se com o aluno especial.
pera que os outros esperem dela.
não. Na Teoria Bioecológica, a dis- No terceiro grupo de difi-
Nesse sentido, é importante uma
função é classificada como um re- culdade estão incluídos os alunos
maior aproximação entre a escola
curso negativo, que limita ou im- com altas habilidades. Consideran-
e as famílias dos alunos, pois, se
pede o acesso da pessoa a um de- do-se que, de acordo com a Teoria
reforçando os mesossistemas en-
terminado nível de habilidade ou Bioecológica, esses alunos não pos-
tre a escola e as famílias, haverá

44 INCLUSÃO - Revista da Educação Especial - Jul/2006


suem recursos negativos, sua difi- portante que as atividades ocorram BRONFENBRENNER, Urie. A Constant

Frame of Reference for Sociometric Re-


culdade estará relacionada com a com bases na reciprocidade, equi-
search. Sociometry. V. 6 pp.363-397,
disposição para participar de ativi- líbrio de poder e afetividade. A cri-
1943.
dades de aprendizagem que estão ança precisa vivenciar tanto os con-
BRONFENBRENNER, Urie. The Ecology

em níveis inferiores ao de sua zona textos em que ela adquire novas of Human Development: Experiments by

real de desenvolvimento. Nesse habilidades quanto aqueles em que Nature and Design.

ela tem a autonomia para vivenciar Cambridge,MA:Harvard University


caso, o professor poderá estimular
Press, 1979.
esse aluno especial a ser mediador, as habilidades já adquiridas.
BRONFENBRENNER, Urie. Ecology of
junto com ele, nas atividades com Em relação aos atributos
the Family a Context for Human Deve-
os demais alunos e, ao mesmo tem- pessoais, normalmente, a criança é
lopment: Research Perspectives. Develo-

po, atribuir-lhe tarefas diferenciadas avaliada por seus recursos que, por pmental Psychology, v. 32, n. 6. pp. 723-

que sejam instigadoras ao seu de- sua vez, facilitam ou dificultam a 742, 1986.

sua capacidade de desempenho. No BRONFENBRENNER, Urie. Ecological


senvolvimento. Um aluno com al-
System Theory. In: ROSS, Vasta. Six The-
tas habilidades poderá não ter difi- entanto, esses recursos estão, ain-
ories of Child Development: revised for-
culdade em relação à aprendizagem da, em fase de transformações.
mulations and current issues, London:
de alguma habilidade nova, mas Qualquer julgamento em relação à
Jessica Knigsley Publishers, pp. 187-249,

isso poderá dificultar o seu relacio- competência da criança com neces- 1992.

namento com os demais colegas. sidade educativa especial para uma BRONFENBRENNER, Urie. The Bioeco-

logical Model from a Life Course Pers-


Para que isso não ocorra, o profes- determinada tarefa, com base ape-
pective: reflections of a participant ob-
sor deverá incluir no ambiente de nas em seus recursos pessoais, não
server. In: MOEN, Phyllis, ELDER, Glen
aula, atividades que favoreçam o deve ser estimulado. A disposição
H. & LÚSCHER, Kurt (Eds). Exami-

fortalecimento dos laços sociais é uma força que tanto pode ser ge-
ning Lives in Context: perspectives on

entre todos os alunos. Essas ativi- radora quanto disruptiva, e poderá the ecology of human development,

dades deverão enfatizar mais os determinar a significância que a cri- Washington,DC: American Psychologi-

cal Association. pp. 599-649, 1995.


emocionais do que os cognitivos. ança atribuirá à atividade, bem
BRONFENBRENNER, Urie. Making Hu-
como a sua persistência para ten-
man Being Human: biecological pers-
tar melhorar o seu grau de profici-
Considerações finais pectives on human development. Thou-
ência nessas atividades. sand Oaks: SAGE, 2005.

Um dos obstáculos que BRONFENBRENNER, Urie. & CROU-


No início deste ensaio,
uma criança com necessidades TER, Anne. Evolution of Environmen-
anunciamos o objetivo de discutir a
tal Models in Developmental Research.
educacionais especiais encontra
teoria de Bronfenbrenner como um In: KESSEN W. & MUSSEN, Paul H.
no momento da inclusão diz res-
novo paradigma para a inclusão de (Eds) Handbook of Child Psychology,
peito ao fato dos currículos escola-
crianças com necessidades educaci- New York, NY: Wiley, 1983.
res serem estratificados em fun- BRONFENBRENNER, U. & MORRIS, Pa-
onais especiais no contexto escolar.
ção de uma seqüência gradativa de mela A. The Ecology of Developmental
Vamos concluir essas reflexões a
dificuldade, como se todas as cri- Process. In: I. DAMON (Org. Série) e
partir dos parâmetros do contexto,
R.M. LERNER (Org. Volume) Handbook
anças de uma mesma faixa de ida-
passando pelos atributos da pessoa of child psychology: Theoretical models
de aprendessem no mesmo tempo
e pelas dimensões do tempo para, of human development. New York, NY:
que as demais que pertencem ao
então, enfatizarmos os processos John Wiley & Sons, V. 1, pp. 992-1027,

seu grupo. É importante que numa 1998.


desencadeados pelo envolvimento
política de inclusão seja observado COPETTI, Fernando & KREBS, Ruy J. As
da criança na escola inclusiva.
tanto o tempo vital quanto o tem- propriedades da pessoa na perspectiva
Para a criança que ingres-
do Paradigma Bioecológico. In: KOL -
po histórico de cada criança e, com
sa numa escola inclusiva, cada con- LER, S. Ecologia do Desenvolvimento
base nisso, o adulto seja um medi-
texto novo que ela encontra (um Humano: pesquisa e intervenção no Bra-
ador que facilite as transições eco- sil. São Paulo: Casa do Psicólogo, pp.67-
microssistema) determina uma
lógicas que a criança enfrenta. 89, 2004.
transição ecológica. É importante
KREBS, Ruy J. Urie Bronfenbrenner e a Eco-
que os adultos entendam a impor-
logia do Desenvolvimento Humano. San-

tância de que esses contextos ofe- Referências ta Maria: Casa Editorial, 1995

reçam aos participantes a oportu- KREBS, Ruy. J., COPETTI, Fernando. &
Bibliográficas
nidade tanto de se engajarem com BELTRAME, Thais S. Uma Releitura

da Obra de Urie Bronfenbrenner: a Teo-


também de observarem as ativida-
BRASIL, Ministério da Educação. Secreta- ria dos Sistemas Ecológicos. In: KRE-
des, pois as relações interpessoais
ria da Educação Especial. Diretrizes na- BS, Ruy J. Teoria dos Sistemas Ecológi-
são construídas a partir das díadas cionais para a educação especial na edu- cos: Um Novo Paradigma para a Educa-

de observação. Para que essa tran- cação básica. 3ª Edição. Brasília: MEC/ ção Infantil. Santa Maria,RS: Kinesis,

sição se torne menos difícil, é im- SEESP, 2002. pp. 17-40, 1997.

INCLUSÃO - Revista da Educação Especial - Jul/2006 45

Você também pode gostar