Você está na página 1de 2

Published in Literatura Russa

Literatura Russa
Jul 29, 2015 · 5 min read

Dois Karamázovs: Schnaiderman e Bezerra

Get started Sign In

Search

Boris Schnaiderman

A história da tradução de Os irmãos Karamázov (Братья Карамазовы, 1880)


Literatura Russa
por Boris Schnaiderman é bem conhecida pelo público interessado,
429 Followers
principalmente pelo esforço quase hercúleo do tradutor, conforme relatado em
Artigos e notas de leitura sobre literatura russa.
matéria de Paula Scarpin:

Em 1943, sem experiência nenhuma, ele oferecera as suas traduções do russo para Follow
algumas editoras. Recebeu de pronto uma resposta positiva da Vecchi. Eles sabiam
que a José Olympio havia encomendado a tradução de Os Irmãos Karamázov, do
More from Medium
francês, a Rachel de Queiroz, e queriam sair na frente com uma edição traduzida
diretamente do russo. “Eu só tinha 27 anos e nunca tinha lido o livro. Se tivesse, não Chieh-Cheng Yang

Analyze fundamental 2D and 3D


aceitaria de jeito nenhum”, conta. Na época ainda não havia dicionários russo-
tolerance stacking up with the
português, e o jovem tradutor precisou fazer o tortuoso caminho de consultar as Direct Linearization Method

palavras que não dominava em dicionários russo-francês e russo-inglês na


0xOrbit
Biblioteca Nacional. “A tradução acabou sendo muito bem recebida na época, pela Operation RED ORBIT ($RED)
crítica inclusive. Mas eu não a aceito mais, ela tem muitos defeitos. Até hoje eu acho
Geoff Anders
Os Irmãos Karamázov um livro muito difícil de traduzir. Eu me esforcei, mas não
Rationality, Levels of Intervention,
tinha o preparo necessário”, diz. and Empiricism

Karl
Apesar de renegada, a tradução ficou famosa graças ao plágio de uma editora
A Friendly Cabin — Part 2
paulistana “especializada” em livros de bolso, que transformou Boris Solomonov
em Alexandre Boris Popov, popularizando Os Karamázov em sua forma mais
escusa.

Mais de meio século depois, em 2008, superadas a russofilia da ditadura e a


ausência de novas traduções de romances russos, Paulo Bezerra lança sua
tradução, dando sequência ao projeto de encarar os cinco elefantes de
Dostoiévski. Desta maneira, o leitor brasileiro tem acesso à uma das parcas
oportunidades de comparação entre traduções diretas de um mesmo grande
romance russo, sendo Os Karamázov, primeira e única investida de
Schnaiderman pelos clássicos volumosos, preterindo-os em favor de escolhas
menos óbvias.

Portanto, por mero exercício de leitura (além de teste da nova plataforma),


oferecemos o parágrafo inicial de cada tradução do primeiro capítulo do
romance, além do original e uma tradução inglesa recente.

Boris Schnaiderman (Solomonov), 1944

Livro primeiro: História de uma família

Alexei Fiodorovitch era o terceiro filho de Fiodor Pavlovitch Karamazov,


fazendeiro de nosso distrito, muito conhecido outrora e ainda hoje
frequentemente lembrado pelo seu trágico e obscuro fim, ocorrido há trinta anos
exatamente e sobre o qual escreverei em ocasião oportuna. Por enquanto, direi
apenas que este “fazendeiro” (ele foi assim apelidado, apesar de quase não ter
residido em sua propriedade) era um tipo esquisito, porém muito encontradiço,
isto é, o tipo de homem não apenas mau e pervertido, mas também pobre de
espírito — destes pobres de espírito que sabem, entretanto, resolver muito bem
os seus problemas financeiros e, segundo parece, apenas estes. Fiodor
Pavlovitch, por exemplo, começou com quase nada. Ele era um fazendeiro sem
importância, que geralmente procurava almoçar em mesa alheia e chegara, até a
viver à custa de outrem, mas, depois de sua morte, verificou-se que tinha deixado
perto de cem mil rublos líquidos. Apesar disso, durante toda a sua vida não
deixou de ser um dos maníacos mais pobres de espírito de nosso distrito. Direi
mais vez: não se tratava de tolice — estes maníacos são geralmente bem ativos e
espertos — mas justamente pobreza de espírito de um tipo especial e bem russo.
(Os irmãos Karamazov v. 1, p. 11. São Paulo: Editora Vecchi, s/d)

Paulo Bezerra, 2008

Livro 1: História de uma família

Alieksiêi Fiódorovitch Karamázov era o terceiro filho do fazendeiro de nosso


distrito Fiódor Pávlovitch Karamázov, muito famoso em sua época (aliás, ainda
hoje é lembrado entre nós) por seu fim trágico e obscuro, ocorrido há exatos
treze anos, e sobre o qual relatarei no devido momento. Agora, porém, direi a
respeito desse “fazendeiro” (como o chamavam entre nós, embora durante toda
sua vida ele quase não morasse em sua fazenda) apenas que era um tipo
estranho, desses encontrados, todavia, com bastante frequência, justamente um
tipo de homem não só reles e devasso, mas ao mesmo tempo bronco — contudo,
daqueles broncos que, não obstante, sabem arranjar magistralmente seus
negocinhos com propriedades e, parece, só e unicamente estes. Fiódor
Pávlovitch, por exemplo, começou quase do nada, era um fazendeiro
insignificante, vivia a correr atrás de almoços em mesas alheias, empenhava-se a
fundo na condição de comensal, mas ao morrer deixou uma quantia que beirava
os cem mil rulos em dinheiro sonante. E ao mesmo tempo, passou toda a vida,
apesar de tudo, sendo um dos mais broncos extravagantes de todo o nosso
distrito. Torno a repetir: aí não se trata de tolice; em sua maioria esses
extravagantes são bastante inteligentes e ladinos: trata-se precisamente de
bronquice, e ainda por cima de uma bronquice algo peculiar, nacional. (Os
irmãos Karamázov v. 1, p. 17. São Paulo: Editora 34, 2008)

Fiódor Dostoiévski, 1880

Книга первая: История одной семейки

Алексей Федорович Карамазов был третьим сыном помещика нашего


уезда Федора Павловича Карамазова, столь известного в свое время (да и
теперь еще у нас припоминаемого) по трагической и темной кончине
своей, приключившейся ровно тринадцать лет назад и о которой
сообщу в своем месте. Теперь же скажу об этом «помещике» (как его у нас
называли, хотя он всю жизнь совсем почти не жил в своем поместье)
лишь то, что это был странный тип, довольно часто, однако,
встречающийся, именно тип человека не только дрянного и развратного,
но вместе с тем и бестолкового, — но из таких, однако, бестолковых,
которые умеют отлично обделывать свои имущественные делишки, и
только, кажется, одни эти. Федор Павлович, например, начал почти что
ни с чем, помещик он был самый маленький, бегал обедать по чужим
столам, норовил в приживальщики, а между тем в момент кончины его у
него оказалось до ста тысяч рублей чистыми деньгами. И в то же время он
все-таки всю жизнь свою продолжал быть одним из бестолковейших
сумасбродов по всему нашему уезду. Повторю еще: тут не глупость;
большинство этих сумасбродов довольно умно и хитро, — а именно
бестолковость, да еще какая-то особенная, национальная. (Wikisource)

Pevear & Volokhonsky, 2002.

Book I: A nice little family

Alexei Fyodorovich Karamazov was the third son of a landowner from our
district, Fyodor Pavlovich Karamazov, well known in his own day (and still
remembered among us) because of his dark and tragic death, which happened
exactly thirteen years ago and which I shall speak of in its proper place. For the
moment I will only say of this “landowner” (as we used to call him, though for all
his life he hardly ever lived on his estate) that he was a strange type, yet one
rather frequently met with, precisely the type of man who is not only worthless
and depraved but muddleheaded as well — one of those muddleheaded people
who still handle their own little business deals quite skillfully, if nothing else.
Fyodor Pavlovich, for instance, started with next to nothing, he was a very small
landowner, he ran around having dinner at other men’s tables, he tried to foist
himself off as a sponger, and yet at his death he was discovered to have as much
as a hundred thousand roubles in hard cash. At the same time he remained all his
life one of the most muddleheaded madcaps in our district. Again I say it was not
stupidity — most of these madcaps are rather clever and shrewd — but precisely
muddleheadedness, even a special, national form of it. (Brothers Karamazov, p.
24. New York: Farrar, Straus and Giroux, 2002)

23

Help Status Writers Blog Careers Privacy Terms About


Knowable

Você também pode gostar