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Herói.
Estrutura mítica para escritores.
"Existem apenas duas ou três histórias humanas, e elas vão se repetindo sem parar,
teimosas, como se nunca tivessem acontecido antes." Willa Cather, em O Pioneers!
Quem escreve profissionalmente sabe que, às vezes,
recorrer a certas técnicas de escrita ajuda a estruturar e
desenvolver um texto, ou pelo menos a encontrar um
ponto de partida para se começar a colocar uma ideia
no papel.
Na criação de histórias de ficção, uma técnica bastante
usada é a famosa Jornada do Herói, um padrão narrativo
identificado pelo estudioso de mitologia Joseph
Campbell. Esse padrão pode ser encontrado em
histórias populares, contos de fada, mitos, rituais
religiosos, e até mesmo no desenvolvimento psicológico
do ser humano. Ele descreve a aventura típica do
arquétipo conhecido como O Herói, uma pessoa
corajosa que enfrenta grandes desafios para alcançar
algo importante na sua vida..
A partir disso, Joseph Campbell definiu as 17 etapas do percurso de
transformação do homem comum em herói, ressaltando os conflitos que
ele enfrenta ao longo do caminho. O resultado pode ser encontrado
no livro “O Herói de Mil Faces”.
Ao ter contato com essa obra nos anos oitenta, Christopher Vogler, o
analista de roteiros dos estúdios Walt Disney, percebeu que a estrutura
narrativa que ele tinha criado a partir da análise de diversos filmes era a
mesma da Jornada do Herói de Campbell.
Tentando entender os princípios de uma boa história, daquelas que
deixam o público com a sensação de ter vivido uma experiência
significativa, Vogler aplicou a estrutura de Campbell a roteiros de cinema,
reduziu a jornada para 12 etapas, e escreveu o livro “A Jornada do
Escritor – Estrutura Mítica para Escritores”.
No Brasil, o primeiro a utilizar a metodologia foi o professor do Núcleo de
Epistemologia do Jornalismo da USP, Edvaldo Pereira Lima. Quando
conheceu o trabalho de Vogler, na década de noventa, ele viu potencial
de aplicação da Jornada do Herói na construção de textos jornalísticos
sobre a vida de pessoas reais. Ainda que os passos da Jornada do Herói
sejam apresentados em uma sequência, não é preciso segui-los em uma
ordem específica para que a narrativa funcione. Também não é necessário
que todas as etapas estejam presentes na história.
A Jornada do Heróis não é um modelo
fechado. Ela apresenta possibilidades que
servem como ponto de apoio e orientação
para a criação de histórias e personagens
mais envolventes.
Joseph Campbell
Influenciado por Carl Jung, o antropólogo Joseph Campbell enxergou um dia o
que tinha passado despercebido por incontáveis gerações de seres humanos:
que todo os mitos e todas as lendas e todos os épicos e todas as narrativas
sagradas de todas as culturas da humanidade contam essencialmente uma
mesma história. Intuiu, maravilhado, que todas as narrativas com peso
universal, de Adão a Homer Simpson, passando por Dom Quixote, o Homem-
Aranha, Abraão, Dante, Darth Vader, Buda, Frodo, Jesus, Gandhi, Osíris,
Harry Potter, João Grilo, etc, descrevem incessantemente a mesma trajetória
primordial do mesmo herói primordial – figura que esconde-se por trás de
diferentes máscaras mas aponta na eternidade para uma mesma verdade
espiritual: a nossa.
Para Campbell, havia um excelente motivo por trás da onipresença do
“monomito" e da universal paixão humana pelas narrativas heróicas: a
trajetória do herói das lendas reflete em idioma coletivo os desafios, as
armadilhas e as possíveis recompensas do desenvolvimento psíquico de cada
ser humano. Freud concluíra que os sonhos trazem revelações essenciais
sobre a trajetória da psique e valiosas pistas para o seu avanço; Jung e
Campbell concluíram que os mitos são os sonhos coletivos da humanidade, e
descrevem o arco completo da inocência à maturidade/auto-descoberta.
A jornada externa do herói reflete, naturalmente, a viagem interior do
indivíduo rumo – se tudo der certo – à maturidade espiritual. O terreno
de perigos, trevas e armadilhas em que o herói é forçado a penetrar
são as regiões ameaçadoras e desconhecidas do inconsciente. Os
ajudantes e objetos mágicos que ele encontra pelo caminho
representam nossos próprios recursos interiores, que nem
imaginávamos que estavam lá. O inimigo que o herói precisa matar
para sobreviver e salvar o mundo (e essa é a reviravolta inevitável de
todas as histórias) somos sempre nós mesmos; na narrativa do
herói o momento da vitória é o preciso momento da sua morte: o
momento da auto-descoberta (o inimigo sou eu), da morte do ego e da
passagem para a maturidade com o elixir da vida eterna. O herói que
recusa-se a morrer recusa-se a crescer; recusa-se a ressuscitar e, por
ser incapaz de conhecer e ajudar a si mesmo, é incapaz de conhecer
e ajudar os outros.
Arquétipo: O conceito de arquétipos, do jeito que conhecemos hoje, surgiu em 1919 com o suíço
Carl Gustav Jung.
A palavra arquétipo, derivada do arché, significa “ o primeiro modelo de alguma coisa”. O termo foi
proposto em 1919 por Jung, mas a primeira ideia de arquétipo remonta Platão, com o conceito de
ideias eternas, “imagens primordiais guardadas como formas eternamente transcendente”. (Jung,
2008. p. 42).
Jung destacou-se no uso das técnicas de estudos de desenhos e sonhos, ou seja, o estudo do
inconsciente humano.
Segundo ele, os arquétipos são conjuntos de “imagens primordiais” originadas de uma repetição
progressiva de uma mesma experiência durante muitas gerações, armazenadas no inconsciente
coletivo. ( O inconsciente coletivo é como o ar: é o mesmo em todo lugar, é respirado por todos e
não pertence a ninguém. Jung C.)
Os arquétipos da Morte, do Herói e do Fora de Lei são exemplos de algumas figuras que todos nós
temos no imaginário desde criança. Independente de onde fomos criados, do país que vivemos e
das nossas religiões e crenças, essas imagens são muito parecidas para todos.
É por isso que os arquétipos estão presentes nos mitos, lendas e contos de fadas. São eles que dão
o verdadeiro significado para as estórias que passamos de geração em geração. Afinal de contas,
as pessoas criam estas estórias para externar o que existe no inconsciente. Hoje os arquétipos
podem ser encontrados nos filmes, na publicidade e em quase tudo que está ao nosso redor.
Os arquétipos nos ajudam a satisfazer algumas de nossas principais necessidades, como a
necessidade de realização, pertença, independência e estabilidade.
Até mesmo quando consumimos produtos e serviços, somos influênciados pelos arquétipos. Uma
cerveja, por exemplo, além de “matar a sede”, também pode satisfazer a necessidade de pertencer
a um grupo, já que, para muitas das pessoas, o simples fato de sair para beber cerveja significa
estar com os amigos, familiares ou colegas de trabalho. Portanto, nesse caso, a marca de cerveja
que souber usar o arquétipo certo, vai conseguir transmitir essa mensagem muito melhor.
• O conceito de arquétipo é uma ferramenta
indispensável para se compreender o propósito ou
função dos personagens em uma história. Se você
descobrir qual a função do arquétipo que um
determinado personagem está expressando, isso pode
lhe ajudar a determinar se o personagem está jogando
todo o seu peso na história. Os arquétipos fazem parte
da linguagem universal da narrativa. Dominar sua
energia é tão essencial ao escritor como respirar.
• Assim que entramos no mundo dos contos de fadas e dos
mitos, observamos que há tipos recorrentes de personagens e
relações: heróis que partem em busca de alguma coisa,
arautos que os chamam à aventura, homens e mulheres velhos
e sábios que lhes dão certos dons mágicos, guardiões de
entrada que parecem bloquear seu caminho, companheiros de
viagem que se transformam, mudam de forma e os confundem,
vilões nas sombras que tentam destruí-los, brincalhões que
perturbam o status quo e trazem um alívio cômico. Ao
descrever esses tipos comuns de personagem, símbolos e
relações, o psicólogo suíço Carl G. Jung empregou o termo
arquétipos para designar antigos padrões de personalidade
que são uma herança compartilhada por toda a raça humana.
• O conceito de arquétipo é uma ferramenta indispensável para se
compreender o propósito ou função dos personagens em uma
história. Se você descobrir qual a função do arquétipo que um
determinado personagem está expressando, isso pode lhe ajudar
a determinar se o personagem está jogando todo o seu peso na
história. Os arquétipos fazem parte da linguagem universal da
narrativa. Dominar sua energia é tão essencial ao escritor como
respirar.
• Para quem conta histórias, certos arquétipos são uma espécie de ferramenta indispensável ao ofício. Não
é possível contar histórias sem eles. Os arquétipos que ocorrem com mais freqüência nas histórias (logo,
os mais úteis para que um escritor conheça) são:
• HERÓI
• GUARDIÃO DE LIMIAR
• ARAUTO
• CAMALEÃO
• SOMBRA
• PÍCARO
• ALIADO
• É evidente que existem muitos outros arquétipos — tantos quantas são as qualidades humanas que
podem ser dramatizadas numa história. Os contos de fadas estão repletos de figuras arquetípicas: o
Lobo, o Caçador, a Mãe Boa, a Madrasta Má, a Fada-Madrinha, a Bruxa, o Príncipe ou Princesa, o
Estalajadeiro Cobiçoso e assim por diante, que desempenham funções altamente especializadas. Jung e
outros identificaram muitos arquétipos psicológicos, como o Puer Aeternus, ou o eterno menino, que
pode ser encontrado em mitos como o do sempre-jovem Cupido, em histórias de personagens como a de
Peter Pan, e na vida, como homens que nunca querem crescer.
1 – O Herói: como figura que desenvolve uma jornada de mudança e realiza sacrifícios.
Esse arquétipo seria capaz de aderir a quaisquer outros;
- O herói é um ser altruísta, disposto a sacrificar suas próprias necessidades em
benefício dos outros.
FUNÇÃO PSICOLÓGICA
-Inicialmente, o herói é puramente ego, com uma identidade pessoal que se difere do
restante do grupo.
https://www.youtube.com/watch?v=JAPyXSIgYsY
Durante sua jornada, o herói muda seu pensamento e jeito para, assim, no final, se
tornar um ser capaz de transcender os limites e ilusoes do ego.
O arquétipo do herói representa a busca da identidade e totalidade do ego.
"No processo de nos tornarmos seres humanos completos e integrados, somos todos
heróis, enfrentando guardiões e monstros internos, contando com a ajuda de aliados.”
FUNÇÃO DRAMÁTICA
- O propósito dramático do herói é de dar a plateia uma janela para a história.
Identificação com o herói: características universais e únicas.
Ao se identificar com o herói, o espectador passa a ver o mundo com os seus olhos.
A combinação de impulsos contraditórios parece mais realista.
https://www.youtube.com/watch?v=R7ygoQRaWYY
"Queremos histórias sobre gente de verdade.”
O herói pode ter qualidades admiráveis ou desprezíveis.
• FUNÇÕES DRAMÁTICAS DO HERÓI
• Crescimento https://www.youtube.com/watch?
v=772UlkDZSPY
• Ação https://www.youtube.com/watch?
v=TJznECaHIcU
Função psicológica:
• Sombrios
• Fracassados
• Contínuos
• Múltiplos
• Cômicos
• Xamãs
3 – Guardião do Limiar: é o arquétipo que se interpõe entre o Mundo
Comum e o Mundo Especial, não é o principal obstáculo, mas deve
ser transposto, vencido, enganado ou tornado aliado;
femme fatale
https://www.youtube.com/watch?v=KnQlMh0piYM
"A sombra é a imagem de nós próprios que desliza em nossa
esteira quando caminhamos em direção a luz" .Stein (2006, p.
97)
6 – Sombra: representação oposta ao herói, mesmo que faça parte dele ou não seja
propriamente seu inimigo;
Função Psicológica
https://www.youtube.com/watch?v=FuaJmwighyI
Função Dramática
Humanizando a Sombra
O vilão não necessariamente é mau sempre. Isso faz com que nos identifiquemos com
ele.
7 – Pícaro: movimento e contraponto da seriedade do sacrifício
do herói, figura que pode tomar o lugar do herói (sem esquecer
que o herói pode ser simultaneamente pícaro) ao se sacrificar.
• 1. Mundo Comum
• 2. Chamado à Aventura
• 3. Recusa do Chamado
• 8. Provação
• 11. Ressurreição
Finalmente, o herói chega a fronteira de um lugar perigoso, as vezes subterra?neo e profundo, onde
está escondido o objeto de sua busca. Aqui ele percebe a fria onde ele se meteu, e de como ele é
pequeno diante do perigo iminente.
Aproximação da Caverna Oculta está representada quando Luke Skywalker e seus companheiros são
sugados para dentro da Estrela da Morte, onde vão enfrentar Darth Vader e libertar a princesa Leia.
8. Provação
Aqui se joga a sorte do herói, num confronto direto com seu maior medo. Ele enfrenta a possibilidade da
morte e e? levado ao extremo numa batalha contra uma força hostil. A Provação é um “momento
sinistro” para a platéia, pois ficamos em suspense e em tensão, sem saber se ele vive ou morre. O
hero?i, como Jonas, estão “no ventre da fera”.
Em Guerra nas estrelas, é o momento terrível, nas entranhas da Estrela da Morte, em que Luke, Leia e
seus amigos são aprisionados no gigantesco triturador de lixo. Luke é puxado para baixo pelos
tentáculos do monstro que vive no esgoto, e é mantido tanto tempo lá dentro que a plateia começa a se
perguntar se ele morreu.
Toda historia necessita de um momento de vida-ou-morte, no qual o herói ou seus objetivos estão frente
a um perigo mortal. Se o filme construiu bem a empatia do herói, o público sofre muito nessa hora.
9. Recompensa (Apanhando a Espada)
Apos sobreviver à morte, derrotar o dragão ou liquidar o Minotauro, o herói e a plateia tem motivos para
celebrar. O herói , então, pode se apossar do tesouro que veio buscar, sua Recompensa. Por vezes a
“espada” é o conhecimento e a experiência que conduzem a uma compreensão maior e a uma
reconciliação com as forcas hostis. Por muitas vezes, é a primeira noite de amor de um casal.
Em Guerra nas estrelas, Luke salva a princesa Leia e captura os planos da Estrela da Morte,
fundamentais para derrotar Darth Vader.
10. Caminho de Volta
Mas o herói ainda não saiu do bosque. Estamos passando agora para o terceiro ato, no qual ele começa a lidar
com as consequências de ter-se confrontado com as forcas obscuras da Provação. Se ainda nao conseguiu se
reconciliar com os pais, os deuses, ou as forças hostis, estes podem vir furiosos ao seu encalço. Algumas das
melhores cenas de perseguição surgem nesse ponto, quando o herói é perseguido no Caminho de Volta pelas
forças vingadoras que ele perturbou ao apanhar a espada, o elixir ou o tesouro.
Assim, Luke e Leia são furiosamente perseguidos por Darth Vader quando escapam da Estrela da Morte.
Aqui, o herói percebe a sua ‘falsa recompensa’. Se mente, é desmascarado. Se está em negação, é hora de
assumir de vez que ele tem ‘uma tarefa a cumprir’.
11. Ressurreição
Muitas vezes, este é um segundo momento de vida ou morte, quase uma repetição da morte e renascimento da
Provação. A morte e a escuridão fazem um ultimo esforço desesperado, antes de serem finalmente derrotadas. É
uma espécie de exame final do herói, que deve ser posto à prova, ainda uma vez, para ver se realmente aprendeu
as lições da Provação.
O herói se transforma, graças a esses momentos de morte e renascimento, e assim pode voltar à vida comum
como um novo ser, com um novo entendimento.
Os filmes da série Guerra nas estrelas brincam o tempo todo com esse elemento. Os três filmes da serie mostram
uma cena final de batalha, em que Luke quase morre, parece estar morto por um momento, e depois sobrevive
miraculosamente. Cada nova provação lhe dá mais conhecimento e mais domínio da Forca. Sua experiência o
transforma em um novo ser.
12. Retorno com o Elixir
O herói retorna ao Mundo Comum, mas a jornada não tem sentido se ele não trouxer de volta um Elixir, tesouro ou
lição do Mundo Especial. Algumas vezes, o Elixir é o tesouro conquistado na busca, mas pode ser o amor, a
liberdade, a sabedoria, ou o conhecimento de que o Mundo Especial existe, mas se pode sobreviver a ele. Outras
vezes, o Elixir é apenas uma volta para casa, com uma boa história para contar.
Luke Skywalker derrota Darth Vader (por enquanto) e restaura a paz e a ordem na galáxia.
A não ser que conquiste alguma coisa na provação que enfrenta na Caverna Oculta, o herói está fadado a repetir a
aventura. Muitas comédias usam esse final, quando um personagem tolo se recusa a aprender sua lição e embarca
na mesma bobagem que o meteu em trapalhadas da outra vez.
Em resumo, então:
1. Os heróis são apresentados no MUNDO COMUM, onde
2. recebem um CHAMADO À AVENTURA.
3. Primeiro, ficam RELUTANTES OU RECUSAM O CHAMADO, mas
4. num Encontro com o MENTOR são encorajados a fazer a
5. TRAVESSIA DO PRIMEIRO LIMIAR e entrar no Mundo Especial, onde
6. encontram TESTES, ALIADOS E INIMIGOS.
7. Na APROXIMAÇÃO DA CAVERNA OCULTA, cruzam um Segundo Limiar,
8. onde enfrentam a PROVAÇÃO.
9. Ganham sua RECOMPENSA e
10. são perseguidos no CAMINHO DE VOLTA ao Mundo Comum. Aqui
respiram, tentando entender o que houve.
11. Cruzam então o Terceiro Limiar, experimentam uma RESSURREIÇÃO são
transformados pela experiência.
12. Chega então o momento do RETORNO COM O ELIXIR, a benção ou o
tesouro que beneficia o Mundo Comum.