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LON L. FULLER
Professor de '']unsprudence'' da
Harvard Law,.J.ScubJ.Coic ou.1--------....,,,,., ~
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O CAS' -~----· i /
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DE CAVERNAS
Tradução do original inglês
e introdução por
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Título do original
"THE CASE OF THE SPELUNCEAN EXPL
ORERS"
IN TR OD UÇ ÃO
Fuller, Lon L
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Port o
Aleg re, Fabris, 1976 .
77 p. 16cm. i?:ii'.L; r. tTW~~
1. Filosofia do direi to. 2. Intro duçã 1
à ciência do direi to. I. Azev edo, Plau
Faraco de, trad. li. Títu lo.
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Nenhuma disciplina jurídica é tão
f,l problemát ica, tão suscetível de abor-
dagens diversas - o que, aliás, a própria
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discussão que até hoje persiste quanto a
,') seu objeto testemunh a - do que a
Introdução à Ciência do Direito, e, no
1'.): entanto, nenhum ensino é tão fecundo e
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VII
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nada mais fascinante ao professor do que peça-se, contudo, no ensino da Intro-
participar deste processo formativo que
dução à Ciência do Direito, na dificul-
não deve conduzir a uma concepção
dade de comunicá-lo ao estudante, so-
reduzida, mas completa, em que o
bretudo quando se cogita da variabilidade
Direito seja percebido e reconhecido
da noção de direito no curso da história.
dentro de uma totalidade cultural de qué
é a um tempo quadro e produto.
Jusnaturalismo, historicismo, positivis-
mo, "direito livre", realismo - (e aqui
Quer-se significar com isto que não se
também a enumeração não é eviden-
pode pretender exauri-lQ na dogmática
temente exaustiva) - e a correspectiva
jurídica e muito menos que se possa esta
atitude ou papel do juiz em conformi-
restringir ao .c__Qnceptualismo puro, sem
dade com cada uma destas concepções,
dúvida muitas vezes atraente ao espírito,
ensejando o problema, não menos re-
mas despido de importância e mesmo
levante, da criatividade maior ou menor
nocivo - porque alienante - ao re-
do Direito pela via jurisprudencial -
gramento da realidade social. É de todo
tudo isto são noções que necessitam de
imperioso que a dogmática jurídica e a
çoncretude, indispensável ao iniciante no
pesquisa em geral, representada pela
estudo do Direito. Fecundada deste modo
Filosofia, pela História, pela Sociologia
sua inteligência, fácil lhe será, ao depois,
Jurídica, pela Ciência Política (e aqui a
alçar-se das noções apreendidas aos
enumeração é meramente exemplifi- grandes temas da Filosofia do Direito,
cativa), guardem aquela íntima vincula-
disciplina tradicionalmente colocada em
ção sem a qual não se poderá verdadei-
etapa mais avançada nos currículos ju-
ramente apreender o jurídico.
rídicos.
Dando por assente a premência deste Justamente na realização deste objetivo
relacionamento, pena de desvirtuar o temos comprovado a importância ines-
objeto do conhecimento buscado, tro- timável do trabalho do Professor Lon L.
VIII IX
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práticos - o advogado, o juiz, o consultor tampouco podem ser formuladas como
jurídico, o representante do Ministério ''demonstrações", pertencendo, em
Público que, buscando solução aos casos contrapartida, à argumentação''. E é esta
concretos, deparam com a possível ina- ''precisamente o tipo de raciocínio
dequação das normas jurídicas aos fatos a
que são prepostas (2). E apenas mediante .\ empregado pelo jurista ... A tradição car-
tesiana, que busca acima de tudo a
adequada formação, que se deve iniciar evidência, desdenha qualquer proposição
nos \primórdios do curso jurídico, é que que não possua o caráter do óbvio, do
poderão solver tais dificuldades, não indiscutível, do exato, do preciso.
confundindo o Direito com a Lei, e nem Todavia, esta concepção logicista ou
esta com ajustiça.
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XIV
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mensagens. Instalou-se prontamente um demais, indagou se eles seriam capazes de ~
aparelho semelhante no acampamento, sobreviver por mais dez dias se se alimen- '.i
1,
estabelecendo-se deste modo a comu- tassem da carne de um dentre eles. O
nicação com os desafortunados homens presidente da comissão respondeu, a
. no interior da montanha. Pediram estes contragosto, em sentido afirmativo. 1
que lhes informassem quanto tempo seria Whetmore inquiriu se seria aconselhável
necessário para liberá-los. Os engenheiros que tirassem a sorte para determinar qual 1
respdnsáveis pela operação de salvamento dentre eles deveria ser sacrificado.
responderam que precisavam de pelo Nenhum dos médicos se atreveu a
menos de~ dias, à condição que não enfrentar a questão: Whettnore quis saber
ocorressem novos deslizamentos. Os então se havia um juiz ou outra auto- !
exploradores perguntaram então se havia ridade governamental que se dispusesse a li
algum médico no acampamento, tendo responder à pergunta. Nenhuma das pes-
sido postos em comunicação com a comis- soas integrantes da missão de salvamento
são destes, à qual descreveram sua con- mostrou-se disposta a assumir o papel de
dição e as rações de que dispunham, conselheiro neste assunto. Whetmore insis-
solicitando uma opinião acerca da pro- tiu se algum sa_c~rdote poderia responder
babilidade de subsistirem sem alimento àquela interrogação, mas não se encontrou 1
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por mais dez dias. O presidente da comis- nenhum que quisesse fazê-lo. Depois disto
são respondeu-lhes que havia escassa não se receberam mais mensagens de den-
possibilidade de sobrevivência por tal
lapso de tempo. O rádio dentro da caver-
tro da caverna, supondo-se (erroneamente
como depois se evidenciou) que as pilhas
1
na silenciou a partir daí durante oito do rádio dos exploradores tinham-se descar- r
horas. Quando a comunicação foi res- regado. Quando os homens foram final- i~
tabelecida os homens pediram para falar mente libertados soube-se que, no trigési- {§
novamente com os médicos, o que con- mo terceiro dia após sua entrada na caver-
seguido, Whetmore, falando em seu
próprio nome e em representação dos
na, Whetmore tinha sido morto eservidode
alimento a seus companheiros.
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Das dedarações dos acusados, aceitas pelo mesmo tempo em que se lhe pediu para
júri,. evidencia-se que Whetmore foi o levantar quaisquer objeções quanto à
primeiro a propor que buscassem alimento correção do lanço. Ele declarou que não
na carne de um dentre eles, sem o que a tinha objeções a fazer. Tendo-lhe sido
sobrevivência seria impossível. Foi tam- adversa a sorte, foi então morto.
bém Whetmore quem primeiro propôs a
forma de tirar a sorte, chamando a Após o resgate dos acusados e depois de
atenção dos acusados para um par de terem permanecido algum tempo em um
dadds que casualmente trazia consigo. Os hospital onde foram submetidos a um
acusados inicialmente hesitaram adotar tratamento para desnutrição e choque
um comportame nto tão desatinado, mas, emocional, foram denunciados pelo
após o diálogo acima relatado, concor- homicídio de Roger Whetmore. No
daram com o plano proposto. E depois de julgamento, depois de ter sido concluída
muita discussão com respeito aos pro- a prova, o porta-voz dos jurados (de
blemas matemáticos que o caso suscitava, profissão advogado) perguntou ao juiz se
chegaram por fim a um acordo sobre o os jurados podiam emitir um veredicto
método a ser empregado para a solução especial, deixando ao juiz dizer se, em
do problema: os dados. conformidad e com os fatos provados,
havia culpabilidad e ou não dos réus.
Entretanto, antes que estes fossem lan- Depois de alguma discussão, tanto o
çados, Whetmore declarou que desistia representant e do Ministério Público
do acordo, pois havia refletido e decidido quanto o advogado defensor dos réus,
esperar outra semana antes de adotar um manifestaram sua concordância com tal
expediente tão terrível e odioso. Os outros procediment o, o qual foi aceito pelo juiz.
o acusaram de violação do acordo e Em um longo veredicto especial o júri
! procederam ao lançamento dos dados. acolheu a prova dos fatos como acima a
Quando chegou a vez de Whetmore um relatei e ainda que se, com fundamento
i. dos acusados atirou-os em seu lugar, ao nos mesmos, os acusados fossem consi-
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derados culpados, deveriam ser conde- legal não permite nenhuma exceção
nados. Com base neste veredicto o juiz de aplicável à espécie, embora a nossa sim-
primeira instância decidiu que os réus patia nos incline a ter em consideração a
eram culpados do assassinato de Roger trágica situação em que esses homens
Whetmore. Em conseqüência sentenciou- foram envolvidos.
os à forca, não lhe permitindo a lei ne-
nhuma discrição com respeito à pena a ser
imposta. Dissolvido o júri, seus membros
enviaram uma petição conjunta ao chefe
do Poder Executivo pedindo que a sen-
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Em um caso desta natureza o princípio da
clemência exec.utivt parece admiravel-
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mente apropriado para mitigar os rigores
da lei, razão por que proponho aos meus
tença fosse comutada em prisão de seis colegas que sigamos o exemplo do júri e
meses. O juiz de primeira instância do juiz de primeira instância, solidarizan-
endereçou uma petição similar à mesma do-nos com as petições que enviaram ao
autoridade. Até o momento, porém, chefe do Poder Executivo. Há razão de
nada resolveu ô Executivo, aparentemen- sobejo para acreditar qt.t, estes reque-
te esperando pela nossa decisão no rimentos de clemência serão deferidos,
presente recurso. vindo como vêm daqueles que estudaram
o caso e tiveram a oponunidade de fa-
Parece-me que, decidindo este extraor- miliarizar-se .cabalmente com todos os
dinário caso, o júri e o juiz de primeira seus aspectos. É atualmente improvável
instância seguiram um caminho que era que o chefe do Poder Executivo denegue
não somente correto e sábio mas, além estas solicitações, a menos que ele próprio
disto, o único que lhes restava aberto em fosse realizar investigações pelo menos tão
face dos dispositivos legais. O texto da, extensas como aquelas efetuadas em
nossa lei é bem conhecido); 'Quem quer l primeira instância, que duraram três
qúeintencionalmente prlve a outrem da ) meses. A realização de cais investigações
vida será punido con:L__a __ morte''·) (que, de fato, equivaleriam a um novo
N.C.S.A.
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(n.s.) § 12-A.,/\Este dispositivo julgamento do caso) seria dificilmente
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Espanta-me que o presidente
éfó n unal, em um esforço para escapar
truosa conclusão de que estes homens são
assassinos. Creio, ao contrário, que ela os
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declara inocentes da prática de qualquer 1\1
às dificuldades deste trágico caso, tenha crime. Fundamenta-se a conclusão sobre 111
adotado e proposto a seus colegas uma duas premissas independent es, cada uma j!
solução simultaheam ente tão sórdida e das quais é por si própria suficiente para
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eles vivem juntos dentro. dos limite;;_Jde "estagQ_ cie_ s9çiedade civil" mas em um
UI])a dada área-da.superfície da terra.
~·· ~- A "estado natural", como se diria na sin-
premissa segundo a qual os homens gular linguagem dos autores do século
devem coexistir em um grupo encontra- XIX. A conseqüência disto é que a lei que
se, portanto, à base do princípio terri- lhes é aplicável não é a nossa, tal como foi
torial, bem como de todo o direito; Pois ,1 sancionada e estabelecida, mas aquela
bem, e.!!-Sllstento que um caso pode.ser I \ apropriada a sua condição. Não hesito em
subipúdo .. da esfera de abrangência dizer que segundo este princípio eles não
coercitiva de uma ordernj_urídica tanto são culpados de qualquer crime.
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por__iazões__sk __ ordem l!!_~gD.quanto-por O que estes homens fizeram realizou-se
razões de ordç_m ,_geográ:ficã) Atentando em cumprimento de u~-t~ato icei to
aos propósitos do direito e do governo e às por todos e proposto em pmneiro lugar
1
premissas subjacentes a nosso direito pela própria vítima. Desde o momen-
positivo, concluímos que_...estes-homens,
to em que se evidenciou que a situa-
quando tomaram suª_ trágica decisão, ção extraordinanamente difícil em que se
estava_.m__tãa distantes de nossa _ordç111 achavam tornava inaplicável os princípios
jurídica rumo __se_ estivessem a mil milhas usuais à regulação das relações entre os
aléri°L"de-nossasii:ontdrà.s. Mesmo em um homens, tornou-se necessário para eles
sentido físico, sua prisão subterrânea elaborar, por assim dizer, uma nova cons-
estava separada dos nossos tribunais e dos
tituição apropriada a sua peculiar situa-
nossos oficiais de justiça por uma sólida
ção.
cortina de rocha que só pôde ser removida
depois dos maiores dispêndios de tempo e Tem sido reconhecido desde a antigüi-
de esforço. · dade que o princípio fundamental do
direito ou governo deve ser encontrado na
(~~portanto, que no momento em noção de contrato 'ou convênio:-....Pensa-
quê- Rãger Whetmore foi morto pelos
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dores antigos, especialmente durante o
réus, eles se encontravam não em um período que medeia entre 1600 e 1900,
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mais além, rejeitando hipoteticamente / Commonwealth v. Staymore o acusado
todas as premissas que formulei até o _ foi condenado tendo em vista uma lei que
momento. Concedo, para fins de ar- / considera delituoso estacionar os auto-
gumentação, que eu esteja errado dizen- .) móveis, em certas áreas, por. um período
do que a situação destes homens os sub- 1 superior a duas horas. O réu tinha ten-
trai à incidência do nosso direito po- tado retirar o seu carro, mas foi impedido
si tivp, e suponho que nossas Leis de fazê-lo porque as ruas encontravam-se
' Consolidadas tenham o poder de penetrar obstruídas por uma demonstração política
quinhentos pés de rocha e impor-se sobre \ _ na qual ele não tomara parte, nem pudera
estes homens famintos e amontoados em ~ver. Este Tribunal reformou a senten-
sua prisã~ subterrânea. Nestas condições é ça, rejeitando a condenação, embora e
perfeitamente claro que estes homens caso se enquadrasse perfeitamente dentro
praticaram um ato que viola a expressão do enunciado literal da lei. Também no
literal da lei que declara que aquele que , caso de Fehler v. Neegas esteve perante
intencionalmente mata a outrem é um este Tribunal, para ser interpretado, um
ssino)MãsumctÜsmaismtigos-aro~Is':,) dispositivo legal em que a palavra "não"
a· sabedoria jurídica ensina g_ue um fora evidentemente transposta da posição
m pode infringir a letra daleÍ-se . ' em que devia estar. Esta transposição
~\ _.Y!OE;r a própría "iei. íroda proposiçã'o-~ encontrava-se em todas as redações suces-
direito positivo, quer contida em uma lei sivas do dispositivo legal, não tendo,
ou em um precedente. deve ser inter- aparentemente, sido notada pelos ela-
pretada de modo racional, segundo seu boradores ou pelos demais responsáveis
propósito evidente. Isto é uma verdade pela legislação. Embora ninguém fosse
tão elementar que é, a rigor, desneces- capaz de explicar como o erro ocorrera,
sário alongar-me a este respeito. Os era manifesto que, tendo em conta as
exemplos de sua aplicação são inume- disposições da lei em seu conjunto, um
ráveis e se encontram em todos os setores erro tinha sido cometido, uma vez que a
do ordenamento jurídico. No caso leitura literal de sua parte final tornava-a
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incompatível com tudo o que a precedia e cínio. Um dos principais objetivos sub-
com o objetivo deste texto tal como jacentes a qualquer legislação penal é o de
enunciado em seu preâmbulo. Este dissuadir os homens da prática do crime.
Tribunal recusou-se a aceitar a inter- Ora, é evidente que se a lei tivesse de-
pretação literal da lei, e, de fato, retificou clarado que o assassinato em legítima
sua linguagem, transpondo a palavra defesa constitui crime, tal regra não
''não'' para o seu lugar exato. poderia atuar de maneira preventiva. Um
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homem cuja vida é ameaçada repelirá seu
O dispositivo legal cuja interpretação agressor não importa o que qig, a lei.
devemos realizar nunca foi aplicado li- Atentando, pois, para os objetivos prin-
teralmente. Há séculos estabeleceu-se que cipais da legislação penal, podemos
matar em legítima defesa é escusável. Não seguramente declarar que esta lei não se
há nada no texto legal que sugira esta destinava a ser aplicada nos casos de le-
exceção. Várias tentativas têm sido feitas gítima defesa.
para conciliar a aceitação jurisprudencial
da legítima defesa com o texto da lei, Quando o fundamento lógico da
embora em minha opinião não consti- excludente da legítima defesa é assim
11
:1
tuam senão engenhosos sofismas. 'A explicado, torna-se evidente que, pre-
i11! verdade é que a exceção em favor da cisamente, a mesma razão é aplicável ao
íl legítima defesa não é conciliável com as caso sub judice. Se no futuro qualquer
palavras da lei, mas somente com seu grupo de homens venha a encontrar-se na
li propósito.
i! trágica situação dos acusados, nós po-
demos estar certos de que sua decisão de
A verdadeira conciliação da excludente da viver ou morrer não será refreada pelas
culpabilidade em razão da legítima defesa normas do Código Penal. Portanto, se nós
com o dispositivo legal segundo o qual lermos este texto legal inteligentemente,
constitui crime matar a outrem deve ser ..,
é manifesta a sua inadequação a este
encontrada na seguinte linha de racio- caso. A subtração desta situação da
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habitu ais. Sob o aspecto emocio nal sinto- '' lei da nature za'', em que mome nto isto
me dividid o entre a simpat ia por estes ocorre u? Foi quand o a entrad a da caverna
homen s e um sentim ento de aversão e se fechou ? Quand o a ameaç a de morte
revolta com relação ao monstr uoso ato por inaniçã o atingiu um grau indefin ido
que comete ram. Alime ntei a espera nça de
que seria capaz de pôr estas emoções
. de intensi dade? Ou quand o o contra to
para o lanço de dados foi celebra do? Estas
contra ditória s de lado como irrelev antes incerte zas que emerg em da doutri na
e, assim, decidir o caso com base em uma propos ta pelo meu colega são capazes de
demon stração convin cente e lógica do causar reais dificul dades. Supon ha-se, por
resulta do reclam ado por nossa lei. exemp lo, que um destes homen s tenha
Infeliz mente não alcancei esta liberação. feito seu vigésimo primei ro aniversário
Ao analisa r o voto que termin ou de enqua nto estava aprisio nado no interio r
enunci ar meu colega Poster, sinto que da monta nha. Em que data teríam os que
está minad o por contradições e falácias. consid erar que ele compl etou a maio-
Comec emos pela sua primei ra proposição: ridade - quand o atingiu os vinte e um
estes homen s não estavam sujeitos à nossa anos, no mome nto em que se achava, por
lei porque não se encont ravam em um hipóte se, subtra ído dos efeitos de nossas
'' estado de socied ade civil'' mas em um leis, ou quand o foi liberta do da caverna e
'' estado de nature za''. Não me parece voltou a subme ter-se ao impéri o do que o
claro porque isto seja assim, se em virtude meu colega denom ina nosso '' direito
da espessura da rocha que os aprisio nou positiv o''. Estas dificul dades, no entant o,
ou porque estavam famint os ou porque servem para revelar a nature za fantasiosa
tinham estabelecido uma '' nova cons- da doutri na que é capaz de originá-las.
tituiçã o", segund o a qual as regras usuais
de direito deviam ser suplan tadas por um Mas não é necessário explorar mais estas
lanço de dados. E outras dificul dades sutilez as para demon strar o absurd o da
fazem-se sentir. Se estes homen s passar am posição do meu colega . O senhor Ministro
da jurisdi ção da nossa lei para aquela da Foster e eu somos os juízes design ados do
26 27
Tribunal de Newgarth,' com º"' poder- efeito da rescisão unilateral do contrato
dever de aplicar as leis deste país. Com feita por Whetmore, esta é uma inferên-
que autoridade nos transformamos em cia necessária de sua argumentação.
um tribunal da natureza? Se esses homens
na verdade se encontravam sob a lei Os princípios expostos por meu colega
natural, de onde vem nossa autoridade contêm outras implicações que não
para estabelecer e aplicar aquela lei? podem ser toleradas. Meu colega argu-
Cer~amente nós não estamos em um menta que quando os acusados lançaram-
estado de natureza. se sobre Whetmore e o mataram (nós não
sabemos como, talvez golpeando-o com
Mas, examinemos o conteúdo deste pedras), eles estavam somente exercitan-
código de leis naturais que meu colega do o direito que lhes fora conferido pelo
propõe que adotemos e o apliquemos a contrato. Suponha-se, entretanto, que
este caso. Que código desordenado e Whetmore tivesse escondido sob suas
odioso é este! f: um código em que as roupas um revólver e que, quando visse os
normas reguladoras dos contratos réus lançarem-se sobre si para trucidá-lo,
assumem maior importância do que os tivesse matado a tiros a fim de salvar
aquela referente ao homicídio. f: um sua própria vida. O raciocínio de meu
código segundo o qual um homem pode colega aplicado a estes fatos transformaria
estabelecer um contrato válido, conferin- Whetmore em um homicida, de vez que
do poderes a seus semelhantes de comer a excludente da legítima defesa teria que
seu próprio corpo. Além disso, segundo ser-lhe denegada. Se seus atacantes
os seus dispositivos, uma vez feito, tal estavam atuando legalmente procurando
contrato é irrevogável, e, se uma das ocasionar sua morte, então, evidente-
partes tenta rescindi-lo, as outras podem mente, ele não mais poderia excusar-se
tomar a lei em suas próprias mãos e argumentando que estava defendendo
executá-lo pela força - pois embora meu sua própria vida, da mesma forma que
colega não refira, por conveniência, o não poderia fazê-lo um prisioneiro con-
28 29
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denado que abate o verdugo enquanto
tenta legalmente colocar o nó em seu objetivos de qualquer norma penal é a
pescoço. prevenção. A aplicação da lei, qualifi-
ficando como crime matar a outrem,
Todas estas considerações tornam neste caso peculiar contradiria seu pro-
impossível para mim aceitar a primeira pósito, pois é impossível crer que os
parte dos argumentos de meu colega. Não dispositivos do código penal pudessem
posfo nem aceitar sua noção de que estes atuar de maneira preventiva relativamen-
i: homens encontravam-se regidos por um te a homens colocados em face da alter-
1l ·
código de leis naturais, que este Tribunal nativa de viver ou morrer. O raciocínio
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estaria obrigado a aplicar-lhes, nem posso segundo o qual esta exceção é encontrada
admitir as regras odiosas e desnaturadas na lei é, segundo observa o meu colega, o
que ele pretende que este código con- mesmo que conduz à admissibilidade da
tenha. Chego agora à segunda parte do excludente da legítima defesa.
voto do meu colega em que ele busca
demonstrar que os réus não violaram os À primeira vista esta demonstração parece
dispositivos legais do N.C.S.A. (n.s.) § bastante convincente. A interpretação
12-A. Neste ponto o raciocínio, ao invés feita por meu colega do fundamento
de ser claro, parece-me nebuloso e lógico da excludente da legítima defesa
ambíguo, embora meu colega não pareça encontra-se, de fato, em conformidade
consciente das dificuldades inerentes às com a decisão deste Tribunal -
suas demonstrações. Commonwealth v. Parry - um prece-
dente que encontrei estudando este caso.
A essência da argumentação de meu Embora o caso de Commonwealth v.
colega pode ser enunciada nos seguintes Parry pareça ter sido geralmente omitido
termos: nenhuma lei, qualquer que seja nos textos e decisões subseqüentes,
seu texto, deveria ser aplicada de modo a encontra-se, sem dúvida alguma, de
contradizer seu propósito. Um dos ,."'i
1 acordo com a interpretação que meu
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30 31
1
fundamento jurisprudencial para a
colega deu à excludente da legítima interpretação dada por meu colega à
defesa. excludente da legítima defesa, também
há outro critério jurisprudencial conferin-
Entretanto, seja-me agora permitido do a esta excludente um fundamento
resumir rapidamente as perplexidades lógico diverso. Na verdade, até ter to-
que me ocorrem quando examino de mado conhecimento da decisão no caso de
modo mais atento o raciocínio de meu Commonwealth v. Parry eu nunca tinha
cole~a. É verdade que uma lei deve ser ouvido a explicação dada por meu colega.
aplicada segundo seu propósito e que um A doutrina ensinada em nossas escolas,
dos propósitos reconhecidos da legislação memorizada por gerações de estudantes
penal é a prevenção. A dificuldade é que de direito, diz o seguinte: a lei referente
outros objetivos são também imputados à ao homicídio requer um ato '' inten-
lei penal. Afirma-se que um de seus cional''. O homem que atuà para repelir
propósitos é assegurar uma descarga uma ameaça agressiva à sua própria vida
ordenada à instintiva necessidade de não age "intencionalmente", mas em
retribuição: Commonwealth v. Scape. resposta a um impulso profundamente
Também se afirma que o seu escopo é a enraizado na natureza humana. Suponho
reabilitação do delinqüente: Common- que dificilmente exista um jurista neste
wealth v. Makeover. E outras teorias têm país que não esteja familiarizado com esta
sido propostas. Supondo-se que nós linha de raciocínio, especialmente porque
devamos interpretar uma lei à luz de seu este é um dos pontos preferidos nos
propósito, o que deveremos fazer quando exames visando o exercício da advocacia.
tiver vários propósitos ou quando estes
forem questionados? Mas a explicação familiar para a excluden-
te da legítima defesa que terminei de
Uma dificuldade similar é apresentada expor obviamente não pode ser aplicada
pela circunstância de que, embora haja por analogia aos fatos deste caso. Estes
32 33
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homens não só atuaram '' intencional- :~
eia de que se encontrava em uma con-
mente" mas com muita resolução e
dição próxima da morte por inanição. O
depois de horas de discussão a respeito do
Tribunal recusou-se a aceitar esta defesa.
que fariam. Novamente nos encontramos
Se a fome não pode justificar o furto de
diante de um caminho bifurcado, com
• um alimento natural e saudável, como
uma linha de raciocínio conduzindo-nos
pode ela justificar que se assassine e se
em uma direção e outra em uma direção
1,
que! é exatamente a oposta. A dificuldade devore um homem? Pe outro lado, se nós
li olhamos I litígio em termos de preven-
situà-se na necessidade ·de contrastar duas
, interpretações, uma fundada em um ção, será provave que um homem morra
à mingua para evitar uma sentença de
precedente praticamente desconhecido e
a outra constituindo parte da tradição prisão pelo furto de um pão? As demons-
jurídica ensinada nas nossas faculdades de trações de meu colega nos compeliriam a
direito, mas tanto quanto eu sei jamais decidir em sentido contrário ao .disposto
adotada em qualquer decisão judicial. no caso de Commonwealth v. Va/jean e
de muitos outros precedentes construídos
Reconheço a relevância dos precedentes a partir deste caso.
citados por meu colega, concernentes ao
"não" deslocado e ao acusado que Ademais, tenho dificuldade em afirmar
estacionou além do tempo legal per- que nenhum efeito preventivo poderia ser
mitido. Mas o que faremos com os marcos atribuído a uma decisão segundo a qual
da nossa jurisprudência, sobre que meu estes homens fossem julgados culpados de
colega novamente silencia? Tal é o caso de homicídio. O estigma da palavra
Commonwealth v. Va/jean. Embora o "assassino" é tal que creio ser muito
caso esteja um tanto obscuramente provável que, se estes homens tivessem
transcrito, nele evidencia-se que o sabido que seu ato era considerado como
acusado foi processado pelo furto de um homicídio pela lei, teriam esperado mais
pão e ofereceu como defesa a circunstân- alguns dias pelo menos antes de levar a
cabo seu plano. Durante este tempo
34
35
1
algum auxílio inesperado talvez pudesse ficação diferente daquela aqui adotada,
1
ter chegado. Dou-me conta de que esta fosse seguido, como por exemplo se os
observação apenas reduz a distinção a outros fossem ateus e insistissem que
uma questão de grau, sem que a destrua Whetmore deveria morrer porque era o
completamente. :t certamente verdade único que acreditava na vida além da
que o elemento de prevenção seria menor morte. Estes exemplos poderiam ser
neste caso do que aquele que normal- multiplicados, mas já se sugeriu o su-
meóte decorre da aplicação da lei penal. ficiente para revelar as inúmeras dificul-
dades ocultas contidas no raciocínio de
Ainda há uma outra dificuldade na meu colega.
proposta de meu colega Foster de esta-
belecer uma exceção na lei em favor deste É claro que, refletindo, me dou conta de
caso, embora novamente nenhuma que estou lidando com um problema que
dúvida transpareça em seu voto. Qual será nunca mais ocorrerá, pois é improvável
o alcance da exceção? No caso, Os homens que outro grupo de homens seja levado a
tiraram a sorte e a própria vítima no início cometer novamente a terrível ação que ora
concordou com o que foi contratado. O julgamos. De qualquer forma, conti-
que decidiríamos se Whetmore tivesse nuando a reflexão, mesmo se nós estamos
recusado desde o começo a panicipar do certos de que um caso similar não ocorrerá
plano? Permitir-se-ia que uma maioria novamente, não é claro que os exemplos
decidisse contra a sua vontade? Ou su- que dei demonstram a falta de qualquer
ponha-se que nenhum plano fosse princípio coerente e racional na decisão
adotado e que os outros simplesmente que meu colega propõe? Não se deve
conspirassem para causar a morte de aferir a correção de um princípio pelas
Whetmore, e à guisa de justificativa conclusões que ele acarreta, sem que se
dissessem que ele estava em condição faça referência a eventuais problemas
física mais débil. Ou, ainda, que um decorrentes de um litígio futuro?
plano de seleção, baseado numa justi- Entretanto, se assim é, porque nós juízes
36 37
.,J
deste Tribunal, discutimos tão amiúde se ponto de vista de meu colega Foster,
é provável que tenhamos que aplicar no detém-me a impressão de que seus ar-
futuro um princípio que a solução do caso gumentos são intelectua lmente infunda-
que ora julgamos reclama? f: esta uma dos e completam ente abstratos. De ou-
situação em que uma linha de raciocínio, tro lado, quando me inclino no sentido
originariamente inadequad a, chegou a de mantera condenação, choca-me o absur-
sancionar-se por via de um precedente, de do de condenar estes homens à morte
mod~ que daí por diante estejamos quando a salvação de suas vidas custou as
obrigados a aplicá-la? de dez heróicos operários. Lamento que
ao Representante do Ministério Público
Quanto mais examino este caso e penso tenha parecido adequado acusá-los de
sobre ele, mais profundam ente envolvido homicídio. Se tivéssemos um dispositivo
emociona lmente me sinto. Minha mente legal capituland o como crime o fato de
fica enredada nas malhas das redes que eu comer carne humana, esta teria sido uma
próprio arremesso para salvar-me. Creio acusação mais apropriada. Se nenhuma
que quase toda consideração que interesse outra acusação adequada aos fatos deste
à solução do presente caso é contrabalan- caso podia ser formulada contra os
çada por outra oposta, conduzind o em acusados, teria sido preferível, penso, não
uma direção também oposta. Meu colega tê-los pronunci ado. Infelizme nte,
Foster não me propiciou, nem eu pude entretanto , estes homens foram proces-
descobrir por mim próprio, nenhuma sados e julgados e, em decorrência disto,
fórmula capaz de resolver as dúvidas que nós nos vemos envolvidos por este infeliz
por todos os lados me acossam. litígio.
Dei a este caso a maior atenção de que sou Uma vez que me revelei completam ente
capaz. Tenho dormido muito pouco incapaz de afastar as dúvidas que me
desde que nos foi apresentado à decisão. assediam, lamento anunciar algo que
Quando me sinto inclinado a aceitar o creio não tenha precedentes na história
38
39
li
~
!1
l'(i
deste Tribunal. Recuso-me a participar da creio que eles já sofreram o suficiente para
decisão deste caso. pagar por qualquer delito que possam ter
cometido. Quero que seja entendido que
Keen, J. - Eu gostaria de começar esta observação é feita na minha condição
deixando de lado duas questões que não privada, como cidadão que, em razão de
são da competência deste Tribunal. seu ofício, adquiriu um íntimo co-
nhecimento dos fatos deste caso. No
A çl,rimeira delas consiste em saber-se se cumprimento dos meus deveres como juiz
a demência executiva deveria ser con- não me incumbe dirigir instruções ao
cedida aos réus caso a condenação seja chefe do Poder Executivo, nem tomar em
confirmada. Esta é, porém, segundo o consideração o que ele possa ou não fazer,
nosso sistema constitucional, uma a fim de chegar à minha própria decisão
questão da competência do chefe do que deverá ser inteiramente guiada pela
Poder Executivo e não nossa. Desaprovo, lei desta Commonwealth.
portanto, aquela passagem do voto do
presidente deste Tribunal em que ele A segunda questão que desejo deixar de
efetivamente dá instruções ao chefe do lado diz respeito a decidir se o que estes
Poder Executivo acerca do que deveria homens fizeram foi "justo" ou "injus-
fazer neste caso e sugere alguns incon- to", "mau" ou "bom". Esta é outra
venientes que adviriam se tais instruções questão irrelevante ao cumprimento de
não fossem atendidas. Isto é uma con- minha função, pois, como juiz, jurei
fusão de funções governamentais - uma aplicar não minhas concepções de mo-
confusão em que o judiciário deveria ser o ralidade, mas o direito deste país. Pondo
último a incorrer. Desejo esclarecer que se esta questão de lado penso que posso
eu fosse o chefe do Poder Executivo, iria também excluir sem comentário a pri-
mais longe no sentido da clemência do meira e mais poética porção do voto do
que aquilo que lhe foi solicitado. Eu con- meu colega Foster. O elemento de fan-
cederia a estes homens perdão total, pois tasia contido nos argumentos por ele
40 41
,,----
_ _ _ _ _J_
incerteza que então reinava, nós agora
Tempo houve, neste país, em que os temos um princípio bem determinado
juízes efetivam-ente legislaram livremente consistente na supremacia do ramo le-
e todos nós sabemos que durante esse gislativo do nosso governo. Desse prin-
· período algumas de nossas leis foram cípio decorre a obrigação do Poder
praticamente reelaboradas pelo Poder Judiciário de aplicar fielmente a lei escrita
Judiciário. Isto ocorreu em um momento e de interpretá-la de acordo com seu
em 4ue os princípios aceitos pela ciência significado evidente, sem referência a
políuca não designavam de maneira nossos desejos pessoais ou a nossas con-
segura a hierarquia e a função dos vários cepções individuais da justiça. Não me
poderes do Estado. Todos conhecemos a cabe indagar se o princípio que proíbe a
trágica conseqüência desta indistinção revisão judicial das leis é certo ou errado,
através da breve guerra civil que resultou desejado ou indesejado; observo simples-
do conflito entre o Poder Judiciário, de mente que este princípio tornou-se uma
um lado, e os Poderes Executivo e Legis- premissa tácita subjacente a toda ordem
lativo, de outro. Não há necessidade de jurídica que jurei aplicar.
enumerar novamente aqui os fatores que
contribuíram para esta malsinada luta No entanto, embora o princípio da su-
pelo poder, embora seja sabido que entre premacia do Poder Legislativo tenha sido
eles se incluíam o caráter pouco represen- aceito em teoria durante séculos, tão
tativo da Câmara, resultante de uma grande é a tenacidade da tradição profis-
divisão do país em distritos eleitorais que sional e da força dos hábitos de pensa-
não mais correspondiam à real distri- mento estabelecidos, que muitos juízes
buição da população, bem como à forte ainda não se adaptaram ao papel restrito
personalidade e à vasta popularidade que a nova ordem lhes impõe. Meu colega
daquele que era então o presidente do Foster pertence a este grupo; sua maneira
Tribunal. É suficiente observar que de lidar com as leis é exatamente aquela
aqueles dias passaram e que, em lugar da de um juiz vivendo no século quarenta.
44 45
1
______....J._
--
,,j,
.
Nós estamos familiarizados com o proces- imperfeição em seu trabalho. Segue-se a
so segundo o qual se realiza a reforma dos parte final e mais reconfortante da tarefa
dispositivos legais que desagradam aos - a de preencher a lacuna assim criada.
juízes. Qualquer um que tenha seguido Quod erat /aciendum.
os votos escritos do ministro Poster terá
oportunidade de ver sua utilização em A inclinação de meu colega Foséer para
qualquer setor do direito. Pessoalmente, encontrar lacunas nas leis faz lembrar a
estou tão habituado com o processo que, história, narrada por um antigo autor, de
se meu colega se encontrasse eventual- um homem que comeu um par de sa-
mente impedido, estou certo de que patos. Quando lhe perguntaram se os
poderia escrever um voto satisfatório em havia apreciado, ele replicou que preferira ~_.J
seu lugar sem qualquer sugestão sua, os buracos. Não é outro o sentimento de
bastando conhecer se lhe agradaria ou não c:P Pa~
meu colega com respeito às leis; quanto _;;;- <(
o efeito da lei a ser aplicada ao caso em mais buracos (lacunas) elas tenham, mais -dó' u
w
questão. ele as aprecia. Em resumo, não lhe
agradam as leis.
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Q)
ot-
_/
O processo de revisão requer três etapas. .\ 0J
-~"' 1
\ ':',
A primeira delas consiste em adivinhar Não se poderia desejar um caso melhor .... , ") ~. . :J
~--
algum "propósito" único ao qual serve a para ilustrar a natureza ilusória deste ·'-:".•, ·. / r'
lei, embora nenhuma lei em uma centena ··- , u,
processo de preenchimento de lacunas do
tenha um propósito único e embora os que aquele ora pendente de julgamento.
objetivos de quase todas as leis sejam Meu colega pensa que sabe exatamente o
diferentemente interpretados pelos que se buscou ao declarar-se o assassinato
diferentes grupos nelas interessados. A um crime. Segundo ele seria algo que se
segunda etapa consiste em descobrir que denomina "prevenção". Meu colega
um ser mítico chamado "o legislador",
Tatting já mostrou quanto é omissa esta
na busca deste "propósito" imaginado,
interpretação. Mas penso que a dificul-
omitiu algo ou deixou alguma lacuna ou
dade jaz mais profundamente. Duvido
46
47
48 49
disso que nossos antepassados expres- irrelevantes pela simples razão que os
saram essa proibição de forma tão larga e professores e examinadore s ainda não têm
irrestrita. Tudo isto é, por certo, con- delegação de poderes para elaborar nossas
jetura, mas fica suficienteme nte claro que leis. Mas, insisto, o problema real é mais
nem eu nem meu colega Foster sabemos profundo. Tanto no que se refere à lei,
qual seja o propósito do § 12-A. Con- como no que respeita à exceção, a questão
siderações similares às que acabei de não está no suposto propósito da lei, mas
delihear são também aplicáveis à no seu alcance. No que concerne à
excludente da legítima defesa que desem- extensão da legítima defesa, tal como tem
penha um papel tão importante no ra- sido aplicada por este Tribunal, a situação
ciocínio dos colegas Foster e Tatting. É, é clara: ela se aplica aos casos de resistên-
sem dúvida, verdade que em Common- cia a uma ameaça agressiva à própria vida
wealth v. . Parry um ponto de vista de uma pessoa. É, portanto, bastante
expresso incidentalme nte, sem força de claro que este caso não se situa no âmbito
precedente, iustificou esta exceção, da exceção, posto que é evidente que
presumindo- se que o propósito da le- Whetmore não fez nenhuma ameaça
gislação penal é a prevenção. Também contra a vida dos réus.
pode ser verdade que se tenha ensinado a
várias gerações de estudantes que a ver- O caráter essencialmen te ardiloso da
dadeira explicação da excludente -reside tentativa do meu colega Foster de
na circunstância segundo a qual um encobrir sua reformulação da lei escrita
homem que atua em legítima defesa não com uma aparência de legitimidade
age ''intenciona lmente'', e que os mostra-se tragicamente no voto de meu
mesmos estudantes tenham sido con- colega Tatting. Neste, o juiz Tatting
siderados habilitados ao exercício da debate-se ardorosamen te para combinar o
advocacia repetindo o que os seus profes- vago moralismo de seu colega com seu
sores lhes ensinaram. Naturalment e, pude próprio sentimento de fidelidade à lei
rejeitar estas últimas observações como escrita. O resultado desta luta não podia
50 51
52 53
por que sinto de modo pro fun do que
meus colegas estão mu ito pouco conscie O que é que todas essas coisas têm a
n- ver
tes dos perigos implícitos nas concepçõe com o caso? O pro ble ma que temos
s que
sobre a magistratura defendidas pelo me decidir é o que nós, como funcionário
u s
colega Foster. púb lico s, devemos fazer com esse
s
acusados. Esta é um a questão de sab
e-
Minha conclusão é de que se deve con doria prática a ser exercida em um con
r
mar sentença condenatória.
fir-
to, não de teoria abstrata, mas de
lidades hum ana s> Qu and o o caso
tex-
rea-
é
Han dy. J. - Ouvi com estupefação exa min ado sob essa luz , torna-se. seg
os un-
ang usti ado s raciocínios que este caso do me parece, um dos mais fáceis
de
trouxe à tona. Nun ca deixo de adm irar decidir den tre os que já foram argüid
a os
hab ilid ade com que meus colegas lanç per ant e este Tri bun al.
am
um a obscura cortina de legalismos sob
re
qua lqu er problema que lhes seja aprese Antes de enu nci ar min has próprias con
n- -
tado para decidir. Nesta tarde ouvimo clusões acerca do mér ito, eu gostaria
s de
arrazoados sobre as distinções ent re discutir bre vem ent e alguns dos proble
di- mas
reito positivo e direito natural, a letra essenciais que o litígio traz à ton a
eo -
propósito da lei, funções judiciais questões sobre as quais meus colegas e
e eu
executivas, legislação oriu nda do jud temos estado divididos desde que
i- me
ciário e do legislativo. Minha úni tornei 1u1z.
ca
decepção foi que nin gué m levantou
a Nu nca fui capaz de convencê-los de que
questão da natureza jurídica do con trat o
o governo é um assunto hum ano , e
celebrado na caverna - se era uni late que
ral os hom ens são governados não por
ou bilateral, e se não se poderia conside pa-
rar lavras sobre o pap el ou por teor
que Wh etm ore revogou a sua anu ênc ias
ia abstratas, mas por outros homens.
antes que se tivesse atu ado com fun Eles
- são bem governados qua ndo seus gov
dam ent o nela. er-
nantes com pre end em os sen tim ent os
e
54
55
concepções do povo. E são mal gover- punhado de poeira. Percebo que, sem
nados quando não existe esta compreen- dúvida alguma, sempre que haja regras e
são. princípios abstratos, os juristas poderão
fazer distinções. Até cerro ponto esta
De todos os ramos do governo, é o espécie de coisas que estou descrevendo é
Judiciário o que tem maiores possibili- um mal necessário, ligado a qualquer
dades de perder o contato com o homem regulação formal dos negócios humanos.
comµm. As razões para isto são, natural- Todavia, penso que a área que realmente
mente, bastante óbvias. Ao passo que as necessita de tal regulação é grandemente
massas reagem diante de uma situação superestim ada. Há, naturalmen te,
conforme ela se apresenta em seus traços algumas regras de jogo fundamentai s que
mais salientes, nós juízes dividimos em devem ser aceitas como condição de
pequenos fragmentos cada situação que existência do próprio jogo. Eu incluiria
nos é apresentada. Juristas são contratados entre elas aquelas relativas à regulação das
pelos antagonistas a fim de analisar e eleições, à nomeação de funcionários
dissecar. Juízes e advogados rivalizam em públicos e ao tempo de exercício nos res-
ver quem é capaz de descobrir o maior pectivos cargos. Nestas matérias, eu
número de dificuldades e distinções em concedo que seja essencial cena restrição
um só conjunto de fatos. Cada litigante na discrição e na possibilidade de
tenta encontrar casos reais ou imaginários, excepcionar, cena adesão à forma, um 1
que irão causar embaraço às demons- certo escrúpulo quanto ao que cai e o que
trações do lado oposto. Para escapar a esta não cai na esfera de incidência da norma. tt
dificuldade, ainda outras distinções são
inventadas e introduzidas na situação. 1
Mas, fora destes domínios, acredito que
j Quando um conjunto de fatos é exposto a
tal espécie de tratamento por um tempo
todos os funcionários públicos, inclusive l
·, suficiente, toda sua vida e essência te-lo-á
os juízes, cumpririam melhor seus deveres
"
se considerassem as formalidades e os 1
abandonado , dele não restando senão um conceitos abstratos como instrumentos . !'
56 57 \
\
l j
1 !'
Penso que deveríamos tomar como nosso de Foster, nem a fidelidad e à lei escrita de
modelo o bom administ rador, que Keen, não servirão de mais nada.
adapta os métodos e princípios ao caso
concreto, selecionando dentre os meios de Aplicando estas concepções ao caso sub
que dispõe os mais adequad os à obtenção judice, sua decisão se torna, conforme
do resultado colimado. referi, bastante fácil. A fim de demons-
trar isso terei que divulgar certas reali-
A mais óbvia vantagem deste método de dades que meus colegas, como pudico
governo é que ele nos permite cumprir decoro, julgaram adequad o omitir, ainda
nossas tarefas diárias com eficiência e que delas tenham tanta consciência
senso comum. Minha adesão a esta fi- quanto eu próprio.
losofia tem, entretan to, raízes mais
profund as. Creio que apenas com o A primeira delas é que este caso desperto u
discernimento que ela propicia podemos um enorme interesse público tanto no
preservar a flexibilidade essencial se país quanto. no exterior. Quase todos os
quisermos manter nossas ações em uma jornais e revistas publicar am artigos a seu
conform idade razoável com os sentimen - respeito; colunistas partilhar am com seus
tos daqueles que se acham submetid os à leitores informações confidenciais re-
nossa autorida de. Mais governos soço- ferentes ao próximo passo do Poder
braram e mais miséria humana foi Executivo; centenas de cartas aos editores
causada pela ausência deste acordo entre foram publicadas. Uma das grandes
governantes e governados do que por cadeias de jornais fez uma sondage m de
qualque r outro fator que se possa discer- opinião pública acerca da questão -
nir na história. Desde o moment o em que " que pensa você que a Suprema Corte
se introduz uma cunha entre a massa do deveria fazer com os exploradores de
povo e aqueles que dirigem sua vida cavernas?'' Cerca de noventa por cento
jurídica, política e econômica, a sociedade expressaram a opinião de que os acusados
é destruíd a. Então nem a lei da natureza deveriam ser perdoados ou deixados em
58
59
~
l
liberdade, com uma espécie de pena
pos1t1vo legal fosse julgada necessária,
simbólica. Portanto, é perfeitamente
contertar-me-ia em fixar-me nos argu-
claro o sentimento da opinião pública mentos desenvolvidos na segunda e
frente ao caso. Aliás, poderíamos tê-lo
menos fantasiosa parte do voto do meu
sabido sem a sondagem, com base no 1
colega Foster .
senso comum ou mesmo observando que .)
neste Tribunal há manifestamente quatro
Estou convicto de que meus colegas se
homens e meio, ou seja noventa por cento,
1
horrorizarão por eu ter sugerido que este
que partilham da opinião comum.
Tribunal leve em conta a opinião pública.
Eles dirão que a opinião pública é
Isto torna óbvio não somente o que
emocional e caprichosa, que se baseia em
deveríamos, mas o que devemos fazer, se
meias verdades e que ouve testemunhas
desejamos preservar entre nós e a opinião que não estão sujeitas a novo interro-
pública uma harmonia razoável e decen-
gatório. Eles dirão ainda que a lei cerca o
te. O fato de declararmos estes homens
julgamento de um caso como este de
inocentes não nos envolve em nenhum
cuidadosas garantias, destinadas a
subterfúgio ou ardil pouco digno.
assegurar que a verdade será conhecida e
Tampouco é necessário qualquer prin- que qualquer consideração racional re-
cípio de interpretação legal que não esteja ferente às possíveis soluções do caso será
de acordo com o modo de proceder deste tomada em consideração. Advertirão que
Tribunal. Certamente nenhuma pessoa todas estas garantias de nada servem se for
leiga pensaria que, absolvendo estes permitido que a opinião pública, for-
homens, nós tivéssemos desvirtuado a lei mada fora deste quadro, tenha qualquer
mais do que nossos predecessores o fi- influência na decisão.
zeram quando criaram a excludente da
legítima defesa. Se uma demonstração Mas detenhamo-nos imparcialmente em
mais detalhada do método seguido para algumas das realidades da aplicação da
harmonizar nossa decisão com o dis- nossa lei penal. Quando um homem é
60 61
T
ac~ad,Qsfe_t~f cometido um crime há, de
pelo júri sob todos os seus aspectos. Se
maneira geral, quatro modos segundo os
isto tivesse ocorrido, podemos estar cer-
quais ele pode escapar da punição. Um
tos, de que teria havido uma absolvição
dçles consistç__ na decisão do juiz, de
ou pelo menos uma divisão que teria
acordo com a lei aplicável, de que ele não
, l impedido uma condenação. Se se tivesse
cometeu nenhum crime. Esta é, por certo,
dado instruções ao júri no sentido de que
uma decisão que tem lugar em uma
at~osfera bastante formal e abstrata. Mas
a fome dos réus e o convênio que fir-
maram não constituem defesa à acusação
consideremos os outros três modos segun-
de homicídio, seu veredicto as teria quase
do os quais ele pode escapar da punição.
Estes são: (1) uma decisão do Representàn-
que cenamente ignorado, torcendo a letra
·, da lei mais do que qualquer um de nós
i te do Ministério Público não solicitando a
seria tentado_ã_fuer:-tr evidente que a
i instauração do processo; (II) uma
! única razão que impediu-que isto sucedes-
absolvição pelo júri; (III) um indulto ou
se foi a circunstância fortuita de ser o
comutação da pena pelo Poder Executivo.
pona-voz do júri um advogado. Seus
Pode alguém pretender que estas decisões
conhecimentos capacitaram-no a ima-
sejam tomadas dentro de uma estrutura
ginar uma fórmula verbal que permitisse
formal; rígida, de regras que impeçam o
ao júri funar-se ae suas usuais respon-
erro de fato, excluam fatores emocionais e
sabilidades.
pessoais e garantam que todas as for-
malidades legais serão observadas? :Ê
Meu colega Tatting expressa contrarie-
verdade que no caso do júri procuramos
dade por não ter o Representante do
restringir suas deliberações ao âmbito
daquilo que é juridicamente relevante, Ministério Público decidido o caso por si,
mas não nos podemos iludir acreditando abstendo-se de requerer a instauração do
que esta tentativa seja realmente bem processo. Estrito como é no cumprimento
sucedida. Normalmente, o caso de que das exigências da teoria jurídica, ficaria
ora nos ocupamos deveria ter sido julgado satisfeito em ver o destino destes homens
1 decidido fora do Tribunal pelo Represen-
62
1 63
~"
1
l
__ _l_ _ ~- ~ -
i'.I
"
Ningué m lamenta mais do que eu a
nosso próprio pensamento e esquecer que necessidade de amparar-me, em um
estes esquemas freqüen tement e não assunto tão importa nte, em informação
projetam a mais tênue sombra sobre o que poderia ser caracterizada como fa-
mundo exterior. latório. Se dependesse de mim, isto não
ocorreria, posto que eu adotaria a condut a
Agora chego ao ponto mais decisivo deste sensata de reunir-me com o Executivo e
casó. Um ponto conhecido de todos nós examinar conjun tament e o caso, des-
neste Tribunal, embora meus colegas cobrindo quais são seus pontos de vista e
tenham julgado conveniente ocultá-lo sob talvez elaborando um programa comum
suas togas. Trata-se da probab ilidade para resolver o assunto. Entreta nto,
alarmante de que, se a solução do caso for natura lmente meus colegas jamais
deixada ao Chefe do Poder Executivo, ele acederiam em resolver-se o problem a
se recusará a perdoar estes homens ou desta maneira.
comutar sua sentença. Como todos nós
sabemos o Chefe do Poder Executivo é Seus escrúpulos em obter diretam ente
um homem hoje de idade avançada e de informações exatas não os impede de
princípios muito rígidos. O clamor estarem muito perturb ados com o que
público normalmente produz nele um souber am de maneira indireta. Seu
efeito contrário ao esperado. Como disse a conhecimento dos fatos que acabei de
meus colegas, acontece que a sobrinh a de relatar explica porque o presidente deste
minha esposa é íntima amiga de sua Tribun al, normal mente um modelo de
secretária. Fui informado por esta via decoro, julgou conveniente agitar sua
indireta, mas, segundo me parece, com- toga na face do Executivo e ameaçá-lo de
pletamente fidedigna, que ele está fir- excomunhão se não comutasse a sentença.
memen te determinado a não comuta r a Suspeito que por isso se explica a proeza
sentença se nós julgarmos que estes de levitação, empree ndida pelo meu
homens transgrediram a lei. colega Foster, pela qual toda uma bi-
66 67
- ,,,_,,__ , _ _ _ _ _ _J , _ ,- -
'~.·
·1
blioteca de livros jurídicos foi removida no primeiro caso que julguei como juiz de
de sobre os ombros dos acusados. E o que primeira instância do Tribuna l do con-
explica igualmente porque também meu dado de Fanleigh.
colega legalista j(een imitou Pooh-bah na
comédia antiga, caminha ndo até o outro Uma seita religiosa expulsara um sacer-
lado do palco para dirigir · algumas dote que, segundo se dizia, tinha se
observações ao Poder Executivo em sua convertido aos princípios e práticas de
l1
"copdição de cidadão privado" (permito- uma seita rival. O sacerdote difundiu
me; observar, incident almente, que o uma nota acusando os chefes da seita.
conselho do cidadão privado Keen será Certos membros leigos dessa igreja
publicado na coletânea de jurisprudência anunciaram uma reunião pública em que
deste Tribunal às expensas dos contri- se propunh am explicar a posição da
buintes). mesma. O sacerdote assistiu a essa reu-
ni ão. Alguns afirmar am ter-se ele
1' Devo confessar que, quanto mais velho introduz ido furtivamente, utilizando-se
;
'. t
1
me torno, mais perplexo fico ante a recusa de um disfarce; o sacerdote declarou em
dos homens em aplicar o senso comum seu testemun ho que tinha entrado nor-
aos problemas do direito e do governo; e malmen te como um membro do culto.
este caso verdade irament e trágico De qualque r forma, quando os discursos
aprofundou meu sentimen to de desâ- começaram, ele os interrom peu aludindo
nimo e consternação a este respeito. a certas questões respeitantes aos negócios
Desejaria apenas poder convencer meus do culto e fez algumas declarações em
colegas da sabedoria dos princípios que defesa de seus próprios pontos de vista.
tenho aplicado à função judicial desde Foi atacado por participantes da reunião
que a assumi. A propósito, por uma que lhe deram uma enorme surra, do que
espécie de um triste fechar de um círculo, lhe resultou, dentre outros ferimentos,
deparei-me com problemas semelhantes uma fratura na mandíbu la. O sacerdote
aos que ora aqui se esboçam, justamente intentou uma ação de indenização contra
68 69
i
rr -..i
H
i!
'"-
-- -·"---"----
~1
1
'T
e podia facilmente ter encontrado outro
lugar para exprimir seus pontos de vista. que acabam de ser enunciados, eu de-
Minha decisão foi amplamente aprovada sejaria reexaminar a posição que assumi
pela imprensa e pela opinião pública, as anteriormente. Quero expressar que
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quais não podiam tolerar as concepções e depois de ouvi-los sinto-me bastante
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Post scn'ptum
melhanças contemporâneas onde nada
Tendo o Tribunal pronunciado seu jul-
disso foi buscado ou q::msiderado, deveria
gamento, o leitor intrigado pela escolha
ser advertido de que se mete numa
da data pode desejar ser relembrado qu·e i
aventura sob sua própria responsabili-
os séculos que nos separam do ano 4300 ' 1
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